SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS REGIONAL GOIÁS CURSOS DE DIREITO E DE SERVIÇO SOCIAL PROJETO DE PESQUISA INTEGRADO Ontologia do Ser Social: dos direitos humanos à emancipação humana Cadastro SAP: 41023 Equipe executora: Dr. Alexandre Aguiar dos Santos (coordenador), docentes pesquisadores: Ms. Alison Cleiton de Araújo, Dra. Silvana Beline, Dra. Lucinéia Scremin Martins, Dr. Eduardo Gonçalves Rocha, Dr. Douglas Antonio Rocha Prinheiro, Ms. Luis Augusto Vieira, e Ms. Gustavo Henrique Petean. Discentes de graduação: Mateus Fernandes Soares, Raquel de Paula Sant' Ana, Marilya Paula Almeida Marques, Guilherme Aurélio Zalique de Oliveira Alves, Anne Beatrice Tizzo, e Rafael Assunção Godinho. Cidade de Goiás março, 2014 Sumário Título ....................................................................................................................................................................... 3 Introdução................................................................................................................................................................ 3 Objetivos ................................................................................................................................................................. 6 Objetivo Geral .......................................................................................................................................... 6 Objetivos Específicos................................................................................................................................ 6 Embasamento teórico .............................................................................................................................................. 7 Marco Teórico ....................................................................................................................................................... 19 Revisão bibliográfica preliminar ........................................................................................................................... 19 Conceitos Operacionais ......................................................................................................................................... 20 Metodologia .......................................................................................................................................................... 23 Estrutura preliminar da pesquisa integrada ............................................................................................................ 24 Resultados esperados ............................................................................................................................................. 27 Cronograma de execução ...................................................................................................................................... 27 Orçamento ............................................................................................................................................................. 28 Referências ............................................................................................................................................................ 28 2 Título Ontologia do Ser Social: dos direitos humanos à emancipação humana Introdução O estudo da ontologia do ser social, que tem como momento predominante a realidade, pode contribuir para um entendimento dos Direitos Humanos como expressão dos interesses de toda a humanidade em oposição à “universalização dos interesses particulares” de determinada classe social contribuindo para o processo de emancipação humana das poderosas estruturas de subordinação e alienação do sistema metabólico do capital? O filosofo Húngaro Georg Lukács (1885 – 1971) dedicou-se ao estudo aprofundado do marxismo durante mais de 50 anos – considerando a sua adesão ao partido comunista húngaro em 1919 até seus últimos dias de vida. Em particular os seus trabalhos a partir de 1956 representam uma profunda crítica ao marxismo da III internacional e culminaram numa crítica radical às concepções positivistas e neopositivistas das ciências e em particular da história. Na busca da formulação de uma Ética, fundamentada no materialismo histórico o dialético, Lukács desenvolve a Ontologia do Ser Social como trabalho preliminar a Ética. A ontologia do ser social busca abordar os fundamentos histórico-filosóficos da obra marxiana, desenvolvendo estudo sobre os principais complexos sociais integrantes da totalidade do ser social. A compreensão ontológica de lukács se caracteriza pela prioridade no estudo da realidade em que: A base para qualquer conhecimento da realidade, e não importa que se trate da natureza ou da sociedade, é o reconhecimento da objetividade do mundo exterior, isto é, da sua existência independente da consciência humana. Qualquer interpretação do mundo exterior nada mais é do que um reflexo, por parte da consciência humana, do mundo que existe independentemente da consciência.1 1 Lukács. Die Eigenart dês Asthetischen (Werk, Bd.11-12), Neuwied-Berlin, 1963.I, p. 35 (Estética, trad. Marietti Solmi e F. Codino, torino, 1970.I,p.5) Apud Oldrini, Guido. Em Busca das Raízes da Ontologia 3 O conhecimento das múltiplas interações entre os diferentes complexos que compõem a totalidade - esta por sua vez se apresenta como um complexo de complexidades – é determinante para a compreensão marxista dos direitos humanos. Tais direitos não se constituem apenas como esfera exclusivamente normativa, mas são expressão das contradições estruturais da totalidade social, cumprindo relevante função ideológica (para Lukács a ideologia cumpre uma função social) como intentio obliqua na constituição de uma determinada visão de mundo, “como necessidade de responder à necessidade de uma vida plena de sentido.”2 A fundamentação dos direitos humanos, a partir de um estudo da “Ontologia do Ser Social” de George Lukács, poderá contribuir para uma compreensão explanatória das múltiplas interações entre as relações jurídicas e as demais estruturas sociais componentes da totalidade social. Dentre os vários fundamentos da universalidade da sociedade burguesa – como expressão da “universalização dos interesses particulares” – os direitos humanos cumprem um papel contraditório: de um lado legitimam a ordem social vigente; e de outro indicam as potencialidades alternativas de extinção das condições desumanização da humanidade. Portanto, desenvolver a fundamentação dos direitos humanos a partir de uma perspectiva emancipatória em que os interesses do gênero humano se sobreponha a particularidade, como mecanismo de superação da humanidade desumanizada. A hipótese que orienta as pesquisas deste projeto integrado tem como referência os estudos forjados a partir da ontologia do ser social definem as categorias analíticas como “formas de ser, determinações da existência” (MARX, 2012), ou seja, a realidade como momento predominante na constituição do conhecimento. O trabalho é a categoria que fundamenta a distinção ontológica determinante entre a esfera da natureza e a esfera do ser social. O trabalho é a gênese e o elemento universal no desenvolvimento do ser social. O gênese dos distintos complexos da totalidade social, que se constitui como uma complexidade de complexidades tem no trabalho a estrutura medular da sua forma de ser-precisamente-assim. A categoria dos direitos humanos tem no trabalho a sua fundamentação. (Marxista) de Lukács, p. 61 In: Pinassi, M. O.; Lessa, S. (orgs), Lukács e atualidade do marxismo. S.P.: Boitempo, 2007. 2 LESSA, S., 1997. p. 56. 4 O reconhecimento dos direitos humanos como categoria mais ampla das relações jurídicas – por estar associada ao interesse de toda a humanidade – adquire um conteúdo fundamental de legitimação da ordem social. Mesmo que a concretização de tais direitos na sociedade capitalista seja tolerada apenas até o limite em que não questione os fundamentos desse sistema, os direitos humanos são fonte de legitimação da ordem social capitalista. Contraditoriamente, os direitos humanos como expressão da universalização da generalidade humana se opõem à “universalização dos interesses particulares” da classe social dominante e demonstra os limites de legitimação do sistema metabólico do capital. Por isso, os direitos humanos podem contribuir para a concretização do processo de emancipação humana. 5 Objetivos Objetivo Geral Verificar na ontologia do ser social em que medida a fundamentação dos direitos humanos (complexo parcial do direito) como expressão dos interesses da humanidade em oposição aos interesses particulares de determinada classe social podem contribuir com o processo de emancipação social. Objetivos Específicos 1) Estudar o trabalho como fundamento do ser social a partir da investigação ontológica da totalidade social constituída como complexo de complexidades. 2) Investigar os fundamentos ontológicos do desenvolvimento do ser social, captando suas determinações gerais e suas consequências para a análise do complexo singular do direito, da religião, da ideologia e do estado. 3) Debater com autores que realizam o diálogo entre o sistema metabólico do capital e os complexos dos direitos humanos, da religião, da ideologia e do estado na tradição marxista, buscando evidenciar as aproximações e diferenças diante da análise ontológica previamente apresentada. 4) Apresentar as bases ontológicas para o entendimento dos direito humanos, da religião, da ideologia e do estado estabelecendo as conexões entre cada complexo particular e os demais complexos sociais integrantes da totalidade social. 5) Propor uma compreensão dos direitos humanos, da religião, da ideologia e do estado a partir das necessidades do desenvolvimento do ser social, do processo de emancipação humana, diante das contradições da sociabilidade burguesa e do processo de transição socialista. 6 Embasamento teórico A trajetória política e teórica de Lukács apresenta como principal característica a práxis social, ou seja, a unidade entre a teoria crítica e a prática social. Georg Lukács nasce em 1884, em Budapeste, Filho de uma família abastada. Inicia sua atividade intelectual como crítico literário no início do século XX. Distante do processo revolucionário russo faz críticas aos bolcheviques. Na Hungria a Monarquia entra em crise, e Lukács se manifesta a favor da República. Em 24 de novembro de 1918 é fundado o Partido Comunista Húngaro (PCH). Lukács se filia ao PCH em 02 de dezembro de 1918. Em 11 de janeiro de 1919 é proclamada a República, dirigida pelo presidente Mihály Károly. Este, por pressão dos ingleses, ordena a prisão dos dirigentes comunistas em fevereiro de 1919. As pressões francesas e inglesas sobre o presidente inviabilizam seu governo e em 21 de março de 1919, é proclamada a República Popular dos Conselhos, em que os sociais democratas e comunistas entram em acordo sobre os pontos essenciais do programa político. Lukács é nomeado vice-comissário do Povo da Educação Popular. Em 01 de agosto de 1919, diante do avanço das tropas contra-revolucionárias romenas, orientadas segundo os interesses ingleses e franceses, é derrotada a República dos Conselhos, e seus dirigentes são obrigados a se exilar3. Lukács durante um breve período realiza trabalho clandestino em Budapest e em seguida vai para o exílio em Viena. No exílio continua militando no Partido Comunista Húngaro compondo um grupo minoritário em suas fileiras. Em 1923 publica a obra “História e Consciência de Classe”, que exercerá grande repercussão no movimento comunista e em decorrência de elementos filosóficos idealistas (inerentes a reflexão hegeliana) será duramente criticado pelos principais intelectuais do movimento comunista internacional. Não se pode deixar de citar a contínua perseguição policial que Lukács sofre. A revolução russa desencadeia na Europa um processo de extermínio da ameaça comunista nas demais nações, inclusive na Alemanha de Weimer. Exilado no inicio da década de 30 na Rússia, como membro pesquisador do instituto Marx-Engels, Lukács tem a possibilidade de investigar as obras filosóficas de Lênin e Marx, realizando uma importante reflexão autocrítica sobre a sua trajetória filosófica até aquele momento, estabelecendo um novo patamar de compreensão dos “a contra revolução vitoriosa executou 5 mil. E prendeu 75 mil (outros 100 mil escaparam para o exterior)”. (Konder, 1980, 42) 3 7 fundamentos teórico-metodológicos de Marx. É a partir deste período que as suas obras vão adquirindo um caráter peculiar de resgate dos fundamentos filosóficos de Marx. O momento histórico deste processo é um dos mais sombrios para a Europa e para o mundo, pois a ascensão fascista e nazista vai criando as condições para a segunda guerra mundial e a partir desta segue a ofensiva em 1941 contra a união soviética. Após a derrota dos nazistas pelo exército vermelho (URSS) a reconfiguração da Europa exige um grande esforço do movimento comunista internacional diante do desafio de dirigir e organizar um número expressivo de nações no pós-guerra. Neste contexto, Lukács é eleito deputado do povo na Hungria, sendo que ainda permanecia em território russo. Apesar de sua profunda compreensão do marxismo as posições teóricas de Lukács são alvo de ataques e calúnias por parte dos intelectuais oficiais do stalinismo. Mesmo sob estas condições Lukács não deixa de exercer seu papel de intelectual e de crítico das posições oficiais. Mas, em determinados momentos, esta postura crítica implica em ameaças efetivas a sua existência, sendo forçado, em nome da sobrevivência, a realizar autocrítica diante das posições oficiais. É esta condição que o conduz a uma crítica radical do marxismo tradicional hegemônico no período de Stalin. Entretanto, esta crítica só é possível após a morte de Stalin (1953) e fortalecida com a denúncia, dos erros e desvios cometidos por Stalin durante os processos de moscou (1930) e do culto a personalidade, realizada por Nikita Khrushchov no XX Congresso do Partido comunista da União Soviética (23/02/1956). Durante o período de Stalin, Lukács constitui-se referência na crítica literária e no desenvolvimento do debate sobre a estética. A abordagem das questões políticas é permeada pelo debate da estética possibilitando que o autor permaneça integrado a ordem política soviética sem compartilhar das mesmas posições teóricas dos intelectuais oficiais, ao contrário, é freqüente sua crítica radical as posições do marxismo vulgar. A capacidade argumentativa e o desenvolvimento dos fundamentos teóricos de Lukács se constituem em grande obstáculo para seus adversários teóricos que, com grande dificuldade, conseguem estabelecer um diálogo com sua obra. Diante desta dificuldade seus críticos voltam-se contra os escritos de décadas anteriores e buscam estigmatizá-lo como um pensador anti-marxista. Tais posturas são de difícil sustentação, devido o caráter autocrítico de Lukács que compõe a sua trajetória intelectual, em especial quanto a sua formulação presente em “História e Consciência da Classe”, obra que impactou o movimento comunista nos anos 20. 8 O momento importante dessa autocrítica ocorre no início da década de 30, quando Lukács na condição de pesquisador do instituto Marx Engels, junto com Mikhail Lifschitz aprofunda sua investigação filosófica, constituindo as bases para toda a sua reflexão posterior. Deste período de investigação filosófica se destaca a obra “O Jovem Hegel” (1938). Outra obra sua de destaque no embate filosófico é “O Assalto à Razão” (1953), em que analisa criticamente a trajetória do irracionalista de Shelling até Hitler. Após a morte de Stalin (1953) e diante das denúncias ocorridas durante o XX Congresso do PCUS (1956), a situação política dos países do Leste europeu apresenta uma potencialidade de mudança que expressa os limites da forma política e econômica que se desenvolve nestes países no período do pós-guerra. Na Hungria este processo desencadeou a Revolução Húngara de 1956 (23 de outubro a 04 de novembro). Lukács, respeitado como intelectual e defensor de que o Partido Comunista Húngaro necessita reconstruir sua credibilidade diante do povo acompanha ativamente a revolução e é nomeado ministro da educação do breve governo revolucionário de Imre Nagy, que se afasta do Pacto de Varsóvia (com a oposição de Lukács). Em 04 de novembro de 1956 ocorre a ocupação das tropas russas que depõe o governo revolucionário e deporta para a Romênia todos os seus líderes. Lukács retorna a Hungria em 1957, porém afastado de suas atividades acadêmicas e políticas volta-se ao aprofundamento dos estudos sobre a “Estética” (1963). Neste período vai percebendo a necessidade de elaboração de uma obra voltada para a reflexão da Ética. E nos anos sessenta dá inicio a este projeto que apresenta como elemento preliminar de estudo a elaboração da “Ontologia do Ser Social”4. A Ontologia de Lukács se constitui na explanação dos fundamentos metodológicos utilizados por Marx. Esta obra apresenta as categorias centrais da realidade social, abordando a relação entre o mundo inorgânico, orgânico e o ser social. Três esferas ontológicas da Humanidade inelimináveis. Contudo, na relação entre estas esferas ontológicas cada uma apresenta uma dinâmica própria e com especificidades singulares constituindo-se em complexidades distintas, porém inelimináveis nas suas relações. É o desenvolvimento do ser social que possibilita o surgimento de categorias fundamentais para o entendimento da sociedade. O fundamento, o que distingue o ser 4 Esta obra não foi concluída pelo autor, são evidentes as distinções entre a parte que foi revisada pelo autor e a que é transcrição de seus manuscritos. 9 social do mundo orgânico e inorgânico, é o trabalho. Trabalho aqui compreendido como a mediação do sujeito com a natureza, tendo como objetivo a satisfação das necessidades humanas. O trabalho no ser social se distingue da atividade no ser orgânico (ex. abelhas) pelo fato do ser humano ter a capacidade de antever as suas ações antes de realizá-las5. Trata-se da capacidade teleológica, em que o indivíduo atua de acordo com determinada finalidade previamente formulada. Este processo de mediação do ser humano com a natureza, na medida em que altera as condições naturais, altera também as condições sociais e humanas, realizando um movimento de constante superação das barreiras naturais para o desenvolvimento do ser social; para o desenvolvimento das forças produtivas; e para a constituição do ser social cada vez mais social, com o aumento da sociabilidade. Em síntese, ao modificar a natureza através do trabalho o ser social modifica a si próprio, tornando-se cada vez mais ser social, sendo, porém, ineliminável a sua relação com o mundo orgânico e inorgânico. O trabalho, como fundamento do ser social, é a mediação do homem com a natureza. Esta mediação exige a capacidade de antecipação na mente humana dos atos de modificação da natureza para a satisfação das necessidades humanas, portanto, é fundamental para o ser social o conhecimento da realidade. Esta antecipação dos atos na mente humana voltados para a transformação da natureza é chamada de intentio recta6. A intentio recta, definida por Lukács, é o conhecimento da realidade exterior ao indivíduo, neste sentido ela se apresenta como reflexo da realidade que lhe é exterior. No ato singular do trabalho a intentio recta está caracterizada pela realização de sua finalidade, mas no processo histórico são os meios de transformar a natureza que “Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domínio. Não se trata aqui das primeiras formas instintivas, animais, de trabalho. O estado em que o trabalhador se apresenta no mercado como vendedor de sua própria força de trabalho deixou para o fundo dos tempos primitivos o estado em que o trabalho humano não se desfez ainda de sua primeira forma instintiva. Pressupomos o trabalho numa forma em que pertence exclusivamente ao homem. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colmeias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e portanto idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade e ao qual tem de subordinar sua vontade”. (MARX, K. O capital, 1985. Vol I, p.149-150) 6 A definição da intentio recta e intentio obliqua é originalmente exposta por Nicolai Hartman e incorporada por Lukács. 5 10 adquirem relevância no desenvolvimento da intentio recta. O domínio de determinados meios de transformação da natureza se constitui na base para o desenvolvimento da ciência. “Em poucas palavras, o conhecimento requerido para a transformação do real no trabalho deve ser, em algum grau, reflexo do real e não reflexo da subjetividade individual: esse conhecimento poderá cumprir sua função social tanto melhor quanto mais desantropomorfizada for.” (Lessa, 1997, 36). Mas o ser social não se reduz ao processo de mediação com a natureza. Na medida em que transforma a natureza o homem transforma a si próprio, desenvolvendo com maior intensidade as relações entre si num processo em que as mediações sociais adquirem um caráter de orientação dos “atos cotidianos, com a mesma teleologia de cada indivíduo em cada momento com a mesma dureza das relações causais dadas, naturais” (Lessa, 1997, 40). Estas relações que tem como fundamento o Trabalho – mas não se reduzem a ele – ou seja, os complexos de relações sociais fundados no trabalho, mas distintos dele, Lukács apresenta como intentio obliqua. Na medida em que a natureza é transformada pelo homem, também a própria natureza humana vai sendo transformada. Este processo de afastamento das barreiras naturais desenvolve em grau crescente o papel das relações tipicamente sociais na formação do ser social que dão significação aos atos humanos na sua totalidade. Trata-se de um processo em que se forma a visão de mundo predominante em determinado momento histórico e que dá sentido para a vida dos indivíduos. Este é um processo em que a subjetividade humana se coloca em maior grau, constituindo-se num conhecimento antropormofizado da realidade, ao contrário da intentio recta. Dos complexos relativos à intentio obliqua inclui-se a ideologia que desempenha uma função social relevante na integração da visão de mundo dos homens e das suas relações sociais. Para Lukács a ideologia desempenha um papel de articulação das diferentes esferas do ser social. Trata-se de uma teleologia secundária – distinta da teleologia posta na mediação do homem com a natureza (teleologia primária) –, voltada para que os indivíduos se comportem de determinada maneira, diante das contradições dadas em determinado período histórico-social, de acordo com os interesses da classe dominante. Como caracteriza Lessa, o “desenvolvimento da sociabilidade é a crescente necessidade de respostas genéricas que permitam ao indivíduo não apenas compreender o mundo em que vive, mas também justificar a sua práxis cotidiana torná-la aceitável, natural, desejável. Essa função de fornecer tais respostas genéricas, (...) cabe a ideologia.” (Lessa, 1997, 53). 11 O despontar da sociedade de classes e suas contradições exige a complexificação da função social da ideologia, em que o complexo da ideologia também se complexifica. Além de uma função geral a ideologia passa a funções mais restritas. (Lessa, 1997, 54). Desta forma se verifica o surgimento de complexos sociais específicos que tem como função regulamentar a práxis social de modo a tornar possível a reprodução da sociedade. O direito se constitui num destes complexos específicos em que se faz necessária a regulação social. “A complexificação social e o surgimento das classes em contradições antagônicas termina por dar origem a um complexo social particular com função social específica: regular juridicamente os conflitos sociais.” (Lessa, 1997, 52). Como bem destaca Lukács, Somente quando a escravidão levou a cabo, na sociedade, a primeira divisão em classes, somente quando a circulação das mercadorias, o comércio, a usura, etc., introduziram, ao lado da relação entre escravo e patrão, também outros antagonismos sociais (credores e devedores, etc.), as controvérsias que daqui surgiram tiveram de ser regulamentadas socialmente e, na satisfação de tal necessidade, pouco a pouco surgiu a jurisdição conscientemente posta, não mais transmitida, tradicional. A história nos diz, além disso, que tais necessidades adquiriram, relativamente tarde, uma figura própria na divisão social do trabalho sob a forma de um estrato particular de juristas aos quais era exigido, como sua tarefa especial, a regulamentação deste complexo de problemas. (Lukács, 1986. p. 53) O complexo social do direito tem fornecido elementos importantes à constituição de uma visão de mundo em que, nas sociedades de classes, tem tornado “operativa” a práxis cotidiana dos indivíduos. Assim, o direito se apresenta como uma forma específica de ideologia (Lessa, 1997, p. 53). O direito como ideologia constitui-se também numa posição teleológica secundária, em que visa a persuasão de outros indivíduos para que ajam de determinada maneira, influenciando suas posições teleológicas primárias ou secundárias. A ideologia como posição teleológica secundária (onde se inclui o direito) se constitui numa forma de elaboração ideal da realidade que é utilizada para orientar a 12 prática cotidiana dos indivíduos indissociável do caráter antagônico da sociedade de classes, servindo como instrumento da luta social. Neste sentido, a ideologia como complexo social está vinculada a dinâmica das contradições sociais, podendo figurar como elemento de conservação de determinada ordem, interditando o processo de sociabilidade humana e sua emancipação, ou se constituindo como elemento de desenvolvimento da generalidade humana. O direito como “forma específica de ideologia” apresenta sua gênese na mudança qualitativa entre o comunismo primitivo – em que a regulação social se dava através do costume, da tradição e da solução prática dos conflitos – e a sociedade de classes, em que os conflitos tornam-se estruturais e exigem a generalização dos instrumentos de solução. Desta forma, ocorre paulatinamente o desenvolvimento do complexo jurídico, adquirindo contornos especiais na medida em que se aprofunda a divisão social do trabalho e determinados indivíduos passam a se ocupar da aplicação do direito. Desta maneira, um estrato particular de pessoas se torna, neste caso, o portador social de um complexo específico produzido pelo desenvolvimento da divisão social do trabalho. E imediatamente se observa que, simultaneamente ao surgimento da esfera jurídica na vida social, um grupo de pessoas recebe o mandato social de impor, através da força, os objetivos deste complexo (Lukács, 1986. P. 52) O desenvolvimento da esfera jurídica se fundamenta em última instância no antagonismo das classes sociais e nos conflitos daí decorrentes, mas não se restringe a isto, o complexo do direito vai mediar conflitos decorrentes dos diferentes interesses sociais expressos nas diferenças internas e externas da classe dominante. Para concretizar os interesses particulares de uma classe sobre as demais, constituindo-se em classe dominante, esta “deve levar em conta as circunstâncias externas e internas, chegando aos mais variados compromissos quando se trata de organizar o direito” (Lukács, 1986. P. 54). O complexo do direito pode expressar os interesses dominantes de determinada classe e ao mesmo tempo estar em contradição com os interesses singulares de determinado indivíduo representante desta mesma classe. Por isso, o direito vai 13 adquirindo uma característica de expressão dos interesses gerais em oposição aos interesses particulares, sem, contudo, deixar no âmbito das contradições estruturais de ser um direito de classe. “A imposição intransigente do interesse global da classe dominante pode, perfeitamente, se encontrar em contradição com muitos interesses de pessoas que pertencem àquela mesma classe” (Lukács, Repro. P.54). Para Lukács a posição teleológica dos indivíduos frente ao direito exerce papel relevante para a compreensão deste complexo social. “As leis e as sentenças, (...) não podem mais se limitar a vetar determinadas ações, para o direito os motivos das transgressões se tornam cada vez mais importantes e são fixados em formas jurídicas.” (Lukács, Repro. P. 55) O direito é uma forma específica de reflexo e reprodução na consciência daquilo que acontece de fato na vida econômica. O termo reconhecimento especifica, posteriormente, a peculiaridade desta reprodução colocando em primeiro plano o caráter não puramente teórico, contemplativo, mas antes de tudo prático. (...) O reconhecimento só pode ter um sentido real e racional no contexto prático, isto é, quando se enuncia como necessidade a reação a um fato que é reconhecido, quando nele estão contidas indagações de quais posições teleológicas os homens devam seguir ou, então como deve ser avaliado o fato em questão enquanto resultado das posições teleológicas. Este princípio se concretiza depois, posteriormente, com o adjetivo “oficial”. Deste modo, aparece socialmente definido com exatidão, o sujeito deste dever, justamente o Estado, cujo poder, determinado quanto ao conteúdo pela estrutura de classe, consiste, neste caso, em substância na posse do monopólio do juízo sobre os vários resultados da práxis humana, de forma a estabelecer se são lícitos ou proibidos, criminais, etc., e que fatos da vida social e de que modo eles têm relevância jurídica. (Lukács, Reprodução, p. 58) Para Lukács a esfera jurídica é um complexo que adquire relativa autonomia, por isso, é possível ser estudado e compreendido como complexo particular. O 14 desenvolvimento desta autonomia relativa faz com que o direito cumpra a função social da regulamentação dentro da totalidade do ser social. Neste sentido, ocorrem movimentos contraditórios internos à esfera jurídica e na sua relação com os demais complexos singulares e com a totalidade social. Dentro das contradições inerentes ao complexo jurídico e a sua relação com os demais complexos sociais a questão dos Direitos Humanos se constitui numa busca de substantivação ampla do direito, na medida em que tais direitos são de interesse de toda humanidade, adquirindo um caráter de generalidade fundamental para o ser social. Os direitos humanos, como todo o complexo singular do direito, correspondente aos interesses da humanidade estão permeados pelas contradições estruturais da sociedade de classes. Estas contradições não excluem as “determinações reais que emergem do próprio sistema jurídico e afetam as atividades vitais de todos os indivíduos. (...) agem também, como determinantes poderosas no sistema global de interações complexas”. (Mészáros, 1993, p. 208-209). Os direitos humanos representam conteúdos históricos sociais específicos de determinada sociedade. O fundamento dos direitos humanos a partir da compreensão da totalidade do ser social constitui a base para a formulação da crítica de Marx aos direitos do Homem decorrentes da Revolução Francesa. Essa crítica de Marx à declaração dos direitos do Homem tem como fundamento a forma contraditória de estruturação e apresentação destes direitos pela classe dominante e pelo Estado, em que o interesse particular da classe dominante é apresentado como “interesse de todos”. O objeto da crítica de Marx não é dirigido aos direitos humanos em si, mas as construções teórico-ideológicas dos supostos “direitos dos homens” como racionalização a priori das estruturas de desigualdade e de dominação. Sua crítica a “declaração dos direitos do homem” tem o objetivo de demonstrar a precariedade de significação prática desta declaração. Nenhum dos chamados direito humanos ultrapassa, portanto, o egoísmo do homem, do homem como membro da sociedade burguesa, isto é, do indivíduo voltado para si mesmo, para seu interesse particular, em sua arbitrariedade privada e dissociado da comunidade. Longe de conceber o homem como um ser genérico, estes direitos, pelo contrário, fazem da própria vida genérica, da sociedade, um marco exterior aos indivíduos, uma limitação de sua independência primitiva. O único nexo que os 15 mantém em coesão é a necessidade natural, a necessidade e o interesse particular, a conservação de suas propriedades e de suas individualidades egoístas. (Marx, 2000, pgs. 35-37) Este processo em que o interesse particular de determinada classe é apresentado abstratamente como interesse de todos está vinculado ao processo de estruturação da superestrutura jurídica e política da sociedade de classes. Trata-se de um mecanismo em que o Estado como instrumento de dominação define as condições de funcionamento sociais adequadas à produção e reprodução da ordem. Nessa sociedade o “interesse de todos” é definido como funcionamento tranqüilo de uma ordem social que deixa intactos os interesses dominantes, e circunscreve as possibilidades de uma admissível mudança social nesta perspectiva. Observando como as coisas funcionam nesta sociedade, é tentador concluir que o “interesse de todos” é um conceito ideológico vazio, cuja função é a legitimação e perpetuação do sistema de dominação dado. Entretanto, concordar com esse ponto de vista significa ser aprisionado pela contradição que estabelece, permanentemente, um interesse particular contra outro e nega a possibilidade de escapar do círculo vicioso das determinações particulares. (Mészáros, 1993, 214-215) A crítica ao caráter dos Direitos Humanos como expressão dos interesses particulares de determinada classe social – que busca sua legitimidade se apresentando como “interesses de todos” – não deve se limitar a negação de tais direitos, restringindoos a uma ordem particular. Ao contrário, os Direitos Humanos devem expressar a generalidade humana, potencializando o processo de emancipação social. O complexo parcial do direito, integrante da superestrutura jurídica e política da sociedade, não pode ser compreendido em si, numa espécie de isolamento laboratorial para sua identificação. As principais correntes teóricas sobre o direito buscam este isolamento artificial. A identificação do direito como uma realidade singular (e parcial) do metabolismo social só é possível de ser efetivada na medida em que este se relaciona com outros complexos parciais que articuladamente formam um complexo de complexidades, uma totalidade historicamente dada e dinâmica em que as interconexões 16 entre os diferentes complexos parciais (estruturas sociais) passam a ser determinantes para a compreensão das funções de um complexo singular. Neste sentido, uma compreensão substantiva do direito exige o entendimento de uma imbricada rede de conexões entre os diferentes complexos sociais, sem deixar de identificar estas relações como integrantes de uma totalidade. Portanto, o reconhecimento dos direitos humanos como categoria mais ampla das relações jurídicas, por estar associada ao interesse de toda a humanidade, adquire um conteúdo fundamental de legitimação de determinada ordem social. Mesmo que a concretização de tais direitos na sociedade capitalista seja tolerada apenas até o limite em que não questione os fundamentos de todo o sistema, os direitos humanos se constituem em fonte de legitimação relevante desta ordem social. As relações da superestrutura política e jurídica e a base material devem ser compreendidas como determinadas e determinantes, num processo de interrelacionamento íntimo e contínuo. Assim como as formas de consciência social e as formas de pensar individuais não podem ser expressões mecânicas da base material ou da estrutura econômica; mas mediadas através da superestrutura política e jurídica, correspondendo a estas no nível das idéias sem, contudo, ser idênticas a elas. (Mészáros, 1993, p. 212). Da crítica dos direitos humanos da sociedade burguesa – em que os direitos humanos incorporam o interesse particular de determinada classe e o apresentam como interesse geral, da generalidade humana – é possível encontrar-se o fundamento para uma formulação emancipatória dos direitos humanos. A fundamentação de uma alternativa a ordem social do capital não pode ignorar a questão dos direitos humanos. Esta alternativa “deve provar a sua superioridade face ao capitalismo precisamente ao superar as contradições da parcialidade, liberando as energias reprimidas da realização humana de todos os indivíduos.” (Mészáros, 1993, p. 213). A suplantação do interesse particular pela generalidade humana está diretamente vinculada a condição de realização desta superação pelo proletariado. Para Marx, o proletariado é a única classe capaz de substituir a particularidade do interesse de uma classe pela universalização dos interesses de todos os indivíduos. O proletariado – como sujeito fundamental do processo de produção social – é a única classe capaz de realizar a mediação entre a particularidade e a universalidade, da classe em si para a classe para si, emancipando-se não apenas enquanto classe, mas abolindo as classes sociais, emancipando-se como humanidade. 17 A questão dos direitos humanos adquire para esta reflexão uma dimensão relevante, na medida em que na esfera das relações jurídicas a defesa dos interesses da humanidade em oposição aos interesses particulares de determinada classe são fundamentais para a construção do processo de emancipação social frente aos interesses do capital. É possível, de forma sintética, indicar-se três momentos distintos em que a questão dos direitos humanos pode ser analisada. Num primeiro momento, sob o metabolismo social do capital a questão dos direitos humanos deve estar orientada para a contraposição entre os interesses da humanidade e os interesses particulares de determinada classe. É fundamental a denúncia dos estreitos limites em que a ordem burguesa admite tais direitos. Num segundo momento, no processo de transição socialista os direitos humanos, “promovem o padrão que estipula que, no interesse da igualdade verdadeira, ‘o direito, ao invés de ser igual, teria de ser desigual’, de modo a discriminar positivamente em favor dos indivíduos necessitados, no sentido de compensar as contradições e desigualdades herdadas” (Mészáros, 1993, 217). E por fim, num terceiro momento, numa fase mais desenvolvida da sociedade comunista, ...quando houver desaparecido a subordinação escravizadora dos indivíduos a divisão do trabalho e, com ela, o contraste entre o trabalho intelectual e o trabalho manual; quando o trabalho não for somente um meio de vida, mas a primeira necessidade vital; quando com o desenvolvimento dos indivíduos em todos os aspectos, crescerem também as forças produtivas e jorrarem em caudais os mananciais da riqueza coletiva, só então será possível ultrapassar-se totalmente o estreito limite do direito burguês e a sociedade poderá inscrever em suas bandeiras: de cada qual segundo as suas capacidades; a cada qual segundo as suas necessidades (Marx, 1875, 7-8). Neste sentido, a aplicação de um padrão igual (Direito) torna-se obsoleta na medida em que “o desenvolvimento completo de um indivíduo de modo algum interfere na auto-realização dos outros como indivíduos verdadeiros” (Mészáros, 1993, p. 217). A emancipação social passa necessariamente pela emancipação individual e, portanto, emancipação humana. Mas, diante da distância em que nos encontramos desta potencialidade humana, em que a extinção do direito torna-se uma possibilidade 18 concreta, a fundamantação dos direitos humanos – contrapondo a universalidade do interesse particular à generalidade dos interesses humanos – adquire uma relevância fundamental para a construção de uma alternativa de superação da ordem social do capital. Marco Teórico Dentro da vasta contribuição do marxismo sobre a esfera das relações jurídicas destacamos determinados autores que participaram ativamente contemporâneo sobre a necessidade de renascimento do marxismo. do debate Em especial destacamos Georg Lukács e István Mészásros como autores que dentro do marxismo desenvolvem críticas radicais aos fundamentos do sistema metabólico do capital, recolocando a análise fundamentada em Marx no centro do debate contemporâneo, sem deixar de reconhecer as contradições teóricas e práticas que surgiram nos países de transição socialista. Portanto para o estabelecimento do debate sobre os fundamentos dos direitos humanos dentro de uma perspectiva emancipatória é necessário o resgate do método materialista e dialético desenvolvido por Marx, Engels e Lenin, como condição para a compreensão do contraditório movimento do real, indicando as potencialidades alternativas para a emancipação humana. Revisão bibliográfica preliminar Dentro deste campo de investigação teórica o estudo preliminar das obras de Georg Lukács do último período de sua produção que vai de 1956 à 1971, em especial da obra “para uma ontologia do ser social” e as obras de István Mészásros sobre o relevante papel que a esfera jurídica desempenha no sistema metabólico do capital. Para a compreensão dos direitos humanos vamos cotejar com alguns autores que realizam o diálogo entre os direitos humanos e a tradição marxista os encontros e desencontros com a perspectiva teórico metodológica desenvolvida por Lukács, buscando identificar 19 os elementos de conservação e de superação no âmbito do desenvolvimento teórico marxiano sobre os direitos humanos. Conceitos Operacionais Totalidade social. Totalidade social como um complexo de complexidades, em que as diferentes esferas da totalidade social se desenvolvem com relativa autonomia das demais, mas mantêm permanentemente interações contraditórias dentro da totalidade social. Direitos humanos, religião, ideologia e estado como complexidades que interagem contraditoriamente com a estrutura de produção e reprodução do sistema sóciometabólico do capital. Fundamentação dos direitos humanos. A fundamentação dos direitos humanos como complexo singular da esfera jurídica que corresponde a determinada ordem social, tem como perspectiva análise das condições históricas e sociais da origem e desenvolvimento dos direitos humanos buscando compreender a essência de tais direitos, sem descuidar de seu caráter histórico, portanto transitivo. Relação dos complexos parciais com a totalidade social. O trabalho como fundamento ontológico do ser social é o fundamento de todo o processo de desenvolvimento social. A sociedade, tendo o trabalho como fundamento, vai se complexificando estabelecendo novas relações cada vez mais sociais em que estas relações dão origem a estruturas sociais próprias do ser social, com pouca ou nenhuma relação com a esfera natural (orgânico). O direito, da religião, da ideologia e do estado são estruturas sociais (complexos sociais parciais) que tem como função a regulação social. Estes complexos parciais da totalidade social (complexo de complexos) expressam as contradições estruturais da sociedade de classes e ao mesmo tempo esferas autônomas de regulação social. Esta autonomia relativa possibilita seu estudo específico, estabelecendo os nexos entre a particularidade e a totalidade social. Particularidade e generalidade no ser social. 20 A estruturação da sociedade em classes antagônicas em que a produção cada vez mais social é obstaculizada pela apropriação privada, ou seja, uma contradição estrutural e que a produção social é submetida à particularidade dos interesses de determinada classe dominante, estabelecendo a contradição entre o predomínio do interesse particular sobre os interesses do gênero humano. A sociedade burguesa estrutura-se de forma a universalizar os interesses particulares em permanente oposição ao caráter social do modo de produção material da vida. Legitimação de classe e superação da sociedade de classes. No processo de dominação de classe a esfera da regulação social desempenha relevância social na solução dos conflitos decorrentes das contradições estruturais do antagonismo de classes, bem como das contradições de interesses particulares nos seios das diferentes classes sociais. O direito como esfera regulatória da sociedade de classes tem como determinante o antagonismo das classes sociais, mas não se limita a sua regulação. Ao contrário, desenvolve vasta rede de regras voltadas para a solução de conflitos particulares constituindo-se num complexo em que a legitimidade da dominação se realiza na medida em que o direito corresponde às demandas singulares dos indivíduos de forma atomizada. Este complexo social adquire relativa autonomia diante das contradições decorrentes do modo de produção, mas preserva as características contraditórias do antagonismo de classe presente na totalidade social, cumprindo função social de regulamentar tais conflitos preservando e universalizando o interesse particular da classe social dominante. Portanto o direito não está imune as contradições sociais, ao contrário, diante da alteração da correlação de forças das classes sociais em conflito o conteúdo do direito, da religião, da ideologia e do estado sofrem modificações como expressão do tensionamentos dos conflitos sociais. Emancipação e direitos humanos. Para Marx, o proletariado é a única classe capaz de substituir a particularidade do interesse de uma classe pela universalização dos interesses de todos os indivíduos. O proletariado – como sujeito fundamental do processo de produção social – é a única classe capaz de realizar a mediação entre a particularidade e a universalidade, da classe em si para a classe para si, emancipando-se não apenas enquanto classe, mas abolindo as classes sociais, emancipando-se como humanidade. Os direitos humanos desempenham papel relevante, pois na esfera das relações jurídicas a defesa dos interesses da humanidade em oposição aos interesses particulares 21 de determinada classe, sendo fundamental para a construção do processo de emancipação social frente aos interesses do capital. 22 Metodologia A maior parte desse trabalho – sobretudo aquela que circunscreve o núcleo filosófico do tema em questão – depende do exame de fontes secundárias, basicamente, da discussão e sistematização de bibliografia secundária, em especial a obra “Ontologia do Ser Social” de Georg Lukács, bem como, manifestações de outros autores pertinentes a temática da pesquisa. Este abrangente campo de investigação do Direito em que se insere o específico problema dos Direitos Humanos, da religião, da ideologia e do estado serão investigados à luz dos instigantes ensaios de “negação e afirmação” sobre a filosofia, ideologia e ciência social, de Istvám Mészáros7. Estes ensaios articulam os elementos necessários para o esclarecimento das formas ideológicas e de seu papel de “consciência prática”, onde está inserida a forma jurídica. Sob a “consciência prática da ideologia" o autor apresenta o seguinte quadro de posições teóricas fundamentais: a) de afirmação da ordem e de sua continuidade; b) de crítica da ordem, porém subordinada aos seus horizontes e; c) que questiona radicalmente a persistência histórica do próprio horizonte de Classe, antevendo como objetivo de sua intervenção prática consciente, a superação de todas as formas de antagonismos de Classes. (1993, p. 14-15). Indicamos como perspectiva desta investigação o estabelecimento de um horizonte crítico que sem desconsiderar as diferentes posturas sociais da “consciência prática da ideologia” faz a opção pelo questionamento radical do sistema metabólico do capital e suas consequências para os direitos humanos, a religião, a ideologia e o estado. 7 MÉSZÁROS, István. Filosofia, ideologia e ciência social. Ensaios de negação e afirmação. São Paulo: Editora Ensaio, 1993. 23 Estrutura preliminar da pesquisa integrada 1) Núcleo de estudos comum dos pesquisadores. Todos os pesquisadores do projeto integrado estarão reunidos para debater e estudar conjuntamente os elementos fundamentais da ontologia do ser social, através da investigação dos autores que desenvolvem teoricamente os estudos ontológicos e por meio da elaboração de análises e produções intelectuais sobre o tema. Sugestão de reuniões quinzenais. 2) Núcleo de estudos específicos dos pesquisadores. Cada grupo temático organizado dentro do projeto integrado desenvolverá de forma específica estudos e reuniões de pesquisa visando o aprofundamento do debate sobre os complexos parciais da totalidade social por meio da elaboração de análises e produções intelectuais sobre cada tema específico. Sugestão de reuniões quinzenais alternadas com o núcleo de estudos comum. Apresentamos a seguinte sugestão de temáticas para os núcleos específicos: A) Ontologia do ser social e Gênero. Esta Investigação se propõe a analisar a condição da emancipação humana em seus diferentes aspectos, para tanto faz necessário analise da condição da luta da mulher em diferentes esferas da sociedade, para entender o processo de formação do feminismo e sua relação com as lutas de classe tendo como base central as leituras das obras marxistas, dentre elas Alexandra KOLONTAI. A nova mulher e a moral sexual. A sagrada família de Karl MARX; ENGELS. A partir desse estudo podemos observar o modo como capitalismo potencializa as diferenças de gênero, pois tem nesta desigualdade socialmente construí a possibilidade de extração da mais valia, na exploração da força de trabalho de ambos, a exploração e apropriação do ser humano em seus por diferentes meios e aspectos. Com isso a mulher tem um importante papel nessa sociedade que se constitui, que cria, recria e que se transforma buscando assegurar direitos humanos à emancipação humana. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dra. Silvana Beline Tavares e Dra Lucinéia Scremin Martins. 24 B) Centralidade do Traballho Desde dos anos 80 do século passado o mundo do trabalho passou por uma forte reestruturação o modelo fordista- taylorista foi modificado para o modelo toyotista. Ocorreram vários avanços tecnológicos e um grande amento no processo de automação nas fabricas. Nessa perspectiva surgiram muitas teses contrariando a centralidade do trabalho como categoria fundante do ser social. O plano de trabalho visa dialogar com essas teses e compreender como essas mudanças afetam os trabalhadores e ameaça ganho sindicais e trabalhistas. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dra. Lucinéia Scremin Martins, Ms Alison Cleiton de Araújo, Luis Augusto Vieira e Ms. Gustavo Henrique Petean. C) Ideologia e Direitos Humanos A ideologia deve ter seu conceito compreendido como uma construção histórica pela qual houve acepções positivas e negativas acerca do termo. Há divergências quanto ao seu significado que evoluiu do simples estudos das ideias , com Destutt de Tracy á estabilização e reprodução do status quo, com Karl Manheim e em sua abordagem negativa de Napoleão, como estudo metafisico á Karl Marx que insere a como manutenção de status quo de exploração e crises sociais devido ao modo de exploração social capitalista. O intuito desta investigação e fazer a ligação do papel da ideologia nas acepções dos direitos humanos em um contexto histórico de contradições sociais assim como a sua importância para a emancipação humana. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dr. Alexandre Aguiar dos Santos e Dr. Douglas Antônio Rocha Pinheiro. D) A ordem punitiva do sistema sócio-metabólico do capital. Este pesquisa tem como finalidade estudar a realidade social do sistema carcerário, levando em conta as influências do sistema de economia de mercado nas punições; baseando-se nas vantagens que as classes mais abastadas têm em julgamentos e execuções de penas em razão de seus recursos financeiros, o que torna nosso sistema punitivo tão injusto e ineficaz. Desta forma, trata-se de um estudo crítico sobre a estrutura do nosso sistema punitivo, apontando as principais provas de sua submissão à nossa economia e sua 25 incapacidade de reeducar e reintegrar os indivíduos que cometeram alguma infração. Para isso serão analisados autores como Karl Marx, Freiderich Engels, Eugeny Pasukanis, Raul Eugênio Zaffaroni, Nilo Batista, Michel Foucault, Alessandro Baratta, entre outros. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dra. Silvana Beline Tavares e Dr. Douglas Antônio Rocha Pinheiro. E) Fundamentação Histórica dos Direitos Humanos Partindo de três grandes concepções que fundamentam filosoficamente os Direitos Humanos: a concepção idealista, a concepção positivista e a concepção crítica materialista; pretende-se buscar o motivo pelo qual estes direitos, embora estejam no cerne de todas as discussões jurídicas, políticas e filosóficas da modernidade, ainda estão longe de serem efetivados. Para assim, buscar uma fundamentação teórica que possa direcionar a prática jurídica a uma ação que busque contribuir para a emancipação social frente aos interesses do capital. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dr. Douglas Antonio Rocha Pinheiro, Dra. Silvana Beline Tavares e Dr. Eduardo Gonçalves Rocha. F) Direito e marxismo Esta investigação pretende realizar um exame crítico das pesquisas que analisaram o direito através das lentes fornecidas pelo marxismo. Tal resgate crítico passa: 1) As configurações teóricas assumidas pelo fenômeno jurídico na trajetória da obra de Marx e Engels; 2) Os desdobramentos da construção de uma teoria e filosofia do direito marxista no pensamento jurídico soviético; 3) As críticas marxistas do direito ou teorias críticas do direito inspiradas no "marxismo ocidental"; 4) As relações entre a crítica marxista do direito e os movimentos jurídicos críticos latino-americanos; 5) Análise das aproximações e limites da crítica marxista do direito com a crítica jurídica não-marxista. Docentes vinculados ao núcleo específico responsável Dr. Alexandre Aguiar dos Santos; Dr. Eduardo Gonçalves Rocha e Lucinéia Scremin Martins. 26 Resultados esperados O desenvolvimento do projeto integrado tem como perspectiva constituir uma base de desenvolvimento de pesquisa estruturada no âmbito da Regional Goiás, constituindo-se em uma experiência pioneira para a comunidade e possibilitando a incursão da mesma no universo da pesquisa institucional. A proposta visa articular um grupo de docentes para o trabalho coletivo de construção da pesquisa e potencializar os grupos de estudos e os projetos de extensão organizados na Regional Goiás. Individualmente a proposta visa instituir na vida do docente o discente a prática da pesquisa e a elaboração de produtos como artigos, painéis, comunicações entre outros. Cronograma de execução 08/14 ATIVIDADE 09/14 10/14 11/14 12/14 01/15 02/15 03/15 04/15 05/15 06/15 07/15 Revisão do Projeto X Reuniões núcleo X X X X X X X X X X X X Reuniões núcleos X X X X X X X X X X X X comum específicos Elaboração de X X X artigos Participação em X X X Eventos Elaboração de X X novos projetos Publicação X X X 27 Orçamento O presente projeto integrado de pesquisa não possui uma fonte de financiamento específico. O fomento a presente pesquisa ocorrerá por meio de apresentação de propostas de iniciação científica – BIBIC e da possibilidade do apoio institucional para a apresentação de trabalhos em eventos científicos. Referências ALVES, Alaôr Caffé; et al. Direito, sociedade e economia: leituras marxistas. 1. ed. Barueri SP: Manole, 2005. ANDERSON, Perry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir; GENTILI, Pablo. (Orgs.), Pós-neoliberalismo – as políticas sociais e o estado democrático. 3a ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. ANTUNES, Ricardo. 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