AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA E A UNIVERSIDADE BRASILEIRA – COMO A UNIVERSIDADE BRASILEIRA DEVE COMPREENDER-SE NO PROCESSO DE INCLUSÃO VEIGA*, Marcelo da – PUCPR [email protected] BONETI**, Lindomar Wessler – PUCP [email protected] Resumo A proposta central deste trabalho é destacar o papel das universidades brasileiras no processo de inclusão social para a formação do indivíduo capaz de participar ativamente da sociedade, não apenas sob o ponto de vista profissional, mas político-social. Trata-se de reflexões teóricas resultantes de estudos realizados no Curso de Mestrado em Educação, sobre políticas públicas de educação, especificamente para analisar a universidade brasileira como agente fundamental para o crescimento sustentável do processo de inclusão no Brasil. Busca-se demonstrar como a universidade brasileira deve compreender-se diante do desafio de proporcionar aos indivíduos um acesso pleno à sociedade, como indivíduos capazes de modificar a atual situação da desigualdade social e formadores de políticas públicas mais justas e igualitárias. Para isso, será feita uma leitura do contexto universitário brasileiro, da noção de desigualdade e participação na formação de políticas públicas e o processo de participação pró-ativa. São discutidos temas como inclusão, exclusão, autonomia, acesso, acessibilidade e principalmente participação ativa, sendo este último tema fundamentado na proposta de Pedro Demo. Ainda é discutido o papel do Estado na formação de políticas públicas e destas políticas no processo de inclusão, além de analisar o contexto das universidades brasileiras, e como estas devem proporcionar um processo de inclusão efetivo. A metodologia utilizada busca um conhecimento dos conceitos intrínsecos ao processo de inclusão, através da análise crítica dos resultados encontrados para o fim de contribuir com os estudos realizados. Do ponto de vista científico contribui como referencial teórico para novos estudos, do ponto de vista social contribui para a conscientização e promoção do desenvolvimento da sociedade. Palavras-chave: Inclusão; Universidades Brasileiras; Participação. *Aluno do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) Mestrado e Doutorado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor nos cursos de Administração, Ciências Econômicas e Ciências Contábeis da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. ** Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) Mestrado e Doutorado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Pesquisador nas áreas de políticas públicas, educação e cidadania; políticas da educação superior; exclusão e inclusão social; a desigualdade social e a escola. 2412 Introdução O objetivo principal deste trabalho é destacar o papel universidades brasileiras no processo de inclusão social para a formação do indivíduo capaz de participar ativamente da sociedade, não apenas sob o ponto de vista profissional, mas político-social. Para isso, será feita uma leitura do contexto universitário brasileiro, da noção de desigualdade e participação na formação de políticas públicas e o processo de participação pró-ativa. Este trabalho decorre dos questionamentos propostos no mestrado em educação quando me proponho a compreender como o processo de inclusão no ensino superior ocorre e qual o papel da universidade brasileira. A questão central está em como a universidade brasileira se compreende no processo de inclusão escolar. A questão da desigualdade social vem sendo alvo das discussões sobre o futuro da América Latina, em termos de sustentabilidade, de dependência econômico-financeira e em termos de delineamento das políticas públicas adotadas. Autores, governantes, políticas sociais destacam a importância da inclusão social através do acesso aos diversos níveis educacionais. Ao mesmo tempo em que são discutidos temas como inclusão social, desigualdade e acesso à educação, percebe-se um processo de realinhamento do sistema de ensino superior brasileiro. Em minha prática profissional como docente de uma universidade comunitária, venho percebendo o ingresso de jovens provenientes de programas sociais, mas as organizações não têm encontrado estratégias de integração que favoreçam a sua inclusão. Sabe-se, no entanto, que uma vez que a desigualdade social é o principal entrave ao desenvolvimento sustentável, é necessário criar mecanismos igualitários que contribuam para a melhor adaptação dos atores envolvidos nas Instituições de Educação Superior - IES. Desafios de manutenção do atual modelo universitário surgem, em termos de financiamento do ensino, pesquisa e extensão, ao mesmo tempo em que surge também a necessidade de redistribuir as condições de acesso aos excluídos sociais, onde o governo repassa a responsabilidade para as instituições de educação superior. A Educação Inclusiva, ainda pouco conhecida no Brasil, vem desencadeando no mundo todo uma mudança de paradigmas na Educação, transformando a visão estigmatizadora do excluído. A Educação Inclusiva privilegia o caráter plástico da capacidade de aprendizagem dos seres humanos e revela que todos podem aprender, desde que sob condições necessárias. 2413 As crescentes exigências da sociedade moderna, as inovações tecnológicas, as instituições científicas, refletem e modelam com grande intensidade as estruturas de gerenciamento do sistema educacional brasileiro, que nas últimas décadas tem sido palco de expressivos indicadores de desenvolvimento social bem como, de análises reflexivas sobre a inclusão e permanência de jovens e adultos na sociedade do conhecimento. Para Choo (2003, p. 32), “a principal atividade de informação é resolver a ambigüidade das informações sobre o ambiente: o que está acontecendo lá fora? Por que isso está ocorrendo? O que isso significa?” Essa forma de criação de significado deve ser feita de maneira retrospectiva, haja vista apenas poder-se dar sentido a ações ou fatos que já aconteceram. Somente assim se pode olhar para trás e construir seu significado. Choo (2003) afirma: Os fatos presentes são comparados com a experiência passada, com o objetivo de construir significado: “O objetivo das organizações, vistas como sistemas de criação de significado, é criar e identificar fatos recorrentes, de modo a estabilizar o ambiente e torná-los mais previsíveis. Um fato perceptível é aquele que lembra algo que já aconteceu antes. Para Amaral (2003, p. 12) “não há possibilidade de nação soberana, sem autonomia científica e tecnológica. Não há possibilidade de inserção justa na sociedade internacional, na globalização, como se diz agora, sem soberania”. O contexto universitário no Brasil Inseridas em um contexto de vulnerabilidade, alto grau de competitividade, novas exigências e pressões do mercado e governamentais, as instituições de educação superior devem ter a capacidade de se reconstruir continuamente. A organização voltada para o futuro “não verá o cliente como um consumidor de produtos pré-fabricados, mas como um ser humano total, com aspirações, desejos e necessidades e uma grande capacidade de contribuição” (MOTTA, 1999, p. 29). Ao gestor da área educacional, faz-se como pressuposto conciliar a gestão administrativa, pedagógica, acadêmica e científica. Neste cenário em construção, a gestão das organizações de ensino para Finger (1997) deveria estar centrada no seu plano estratégico e servir como elemento facilitador de processo educacional. A gestão, os seus processos e recursos devem estar a serviço do objetivo fim institucional, que é a qualidade de ensino oferecida a seus alunos. Conforme Finger (1997), deixar de enfatizar as hierarquias estruturais 2414 e incorporar mais a coordenação e a motivação como métodos de trabalho, substituindo a tradicional chefia e supervisão. O atual contexto aponta a expansão do ensino superior, consolidada pelo segmento privado, ao mesmo tempo em que a qualidade do ensino é questionada. A concorrência na educação aumenta e a relevância social da educação é exigida. O foco da educação superior está no mercado, que busca qualidade e competência. O modelo de universidade empresarial está se disseminando, e contratos de gestão vêm sendo propostos. Estes fatores agem em conjunto no interior dos sistemas educacionais, perturbando os pactos implícitos de acomodação e ingerência recíprocos que costumam predominar em seu interior. A escassez crescente de recursos orçamentários, a busca de critérios mais adequados em sua distribuição, a obsolescência de práticas educacionais estabelecidas, o surgimento de novas demandas e fontes potenciais de recursos em um mercado muito mais amplo de interesses, tudo isto faz com que os setores mais dinâmicos das universidades tendam a se mover com mais determinação, questionando o seu entorno, aceitando com menos complacência a acomodação e a estagnação, e procurando novos caminhos. A UNESCO no documento “O ensino superior no século XXI: visão e ações”, resultante da Conferência Mundial sobre o Ensino Superior realizada em Paris no ano de 1998 destaca a exigência da qualidade e de políticas que busquem a melhora da qualidade faz com que as instituições procurem melhorar simultaneamente cada um dos componentes individuais, formando um sistema coerente. Neste ponto vale destacar que a qualidade não fica restrita a estrutura da instituição, mas pessoal envolvido na prestação do serviço, alunos, programas e principalmente a gestão da instituição. Marcelo Freitas destaca que “O educador não é mais aquele que vende seu tempo para a escola, mas sim um detentor de competências que agregam valor para o alcance dos objetivos institucionais”. A UNESCO relata a importância da interação entre a relação do ensino superior com o mercado de trabalho, principalmente em países em desenvolvimento. A qualidade desejada deve ser capaz de contemplar o sucesso acadêmico em conjunto com o papel contemporâneo e estratégico que a educação deve desempenhar no desenvolvimento de uma nação. É neste ponto em especial que se analisam alguns conceitos relevantes. Sabe-se que a integração com o mercado de trabalho é importante. Mas a formação plena do indivíduo como agente participativo, como agente de mudança da sociedade onde está inserido é fundamental. 2415 Assim as políticas públicas devem estar voltadas não somente à inserção, mas a integração do indivíduo ao meio, e principalmente para torná-lo um sujeito pró-ativo. A noção de desigualdade social adotada pelas políticas públicas A classe dominante não enxerga a desigualdade social, imaginando ser possível atingir os direitos sociais por meio das instâncias judiciais. Primeiro se faz importante definir igualdade, desigualdade e pobreza. Marx ainda é o estudo mais próximo da desigualdade social. Rosseau examina a questão da desigualdade segundo a interpretação que o homem dá de si e dos outros após o aparecimento da sociedade civil. A noção de igualdade e desigualdade passa a ser extremamente jurídica. Fundamenta-se na relação entre a pessoa e a organização da sociedade civil, quem é, qual o papel exercido no grupo social, quanto ganha, etc. Não é levado em conta o aspecto histórico, nem um contexto social mais amplo. Pensar sobre desigualdade implica pensar a condição social; pensar sobre a condição social implica pensar sobre diferença. O desigual é o pobre e não o rico, apesar do número de pobres ser superior ao de ricos. Os pobres acabam por legitimar o poder dos ricos sobre eles. A essência do critério de construção da noção de desigualdade social é a capacidade individual de acesso aos bens sociais e culturais reconhecidos pela racionalidade burguesa. Os segmentos pobres assim se consideram quando dizem não ter acesso a escolha, ao trabalho, ao lazer, ao transporte coletivo e à serviços de saúde, entre outros. Autonomia, homogeneidade e normalização Para Piaget (1977), a constituição do princípio de autonomia se desenvolve juntamente com o processo de desenvolvimento da autoconsciência. No início, a inteligência está calcada em atividades motoras, centradas no próprio indivíduo, numa relação egocêntrica de si para si mesmo. É a consciência centrada no eu. Nessa fase a criança joga consigo mesma e não precisa compartilhar com o outro. É o estado de anomia. O estado de autonomia se constitui centrado no reconhecimento do outro como ele mesmo e no respeito mútuo. As regras são constituídas cooperativa e racionalmente. O indivíduo é sujeito de seus atos. As relações interindividuais estão presentes em todos os sentidos e as regras emanam no coletivo e são construídas nas relações, engendradas pelas relações, e não por este indivíduo ou por aquele grupo para os outros. Os indivíduos fazem 2416 parte da construção, do respeito e das reformulações das regas sempre que novas relações ou novas opções se fazem necessárias. É o estado de autoconsciência. A educação não pode ter como objetivo tornar o indivíduo apto para o convívio social e o trabalho, segundo normas preestabelecidas e condizentes com os interesses do mercado produtivo, e sim para formar o homem como cidadão ativo exercendo sua individualidade, deve contribuir para um indivíduo autônomo e capaz de redefinir a sociedade onde deseja conviver. Quanto à homogeneidade, para Durkheim (1952) a sociedade não poderia existir sem que houvesse em seus membros certa homogeneidade: a educação perpetua e reforça essa homogeneidade, fixando de antemão na alma da criança certas similitudes essenciais, reclamadas pela vida coletiva. Por outro lado, sem uma tal ou qual diversificação, toda cooperação seria impossível: a educação assegura a persistência desta diversidade necessária, diversificando-se ela mesma e permitindo as especializações. Se a sociedade tiver chegado a um grau de desenvolvimento em que as antigas divisões, em castas e em classes não possam mais manter-se, ela prescreverá uma educação mais igualitária, como básica. Se, ao mesmo tempo, o trabalho se especializar, ela provocará nas crianças, sobre um primeiro fundo de idéias e de sentimentos comuns, mais rica diversidade de aptidões profissionais. O princípio da normalização diz respeito a uma colocação seletiva do indivíduo em uma classe à qual não pertence. No Brasil este processo é utilizado para incluir portadores de deficiência em classes comuns. Neste caso, o professor de classe comum não recebe um suporte do professor da área de educação especial. Os estudantes do processo de normalização precisam demonstrar que são capazes de permanecer na classe comum. O maior viés deste método é o determinante de que aquele indivíduo deve se adaptar ao grupo dito “comum”, sem a modificação deste para aceitá-lo. O indivíduo acessa o novo grupo, sem, no entanto, ter a oportunidade de agir sobre ele. Formação integral do indivíduo A educação inclusiva deve antes de tudo pressupor uma educação voltada a formação integral do indivíduo objeto da inclusão. A simples inclusão do indivíduo em um grupo do qual não pertence não basta, há de se contemplar uma ampla formação capaz de fazer dele um cidadão ativo e participativo naquele grupo. 2417 O homem deve ser concebido como um ser integral, o qual, que se relaciona com outros indivíduos, afirma a sua identidade social e política e reconhece as diferenças e semelhanças, reforçando os laços de convívio desenvolvendo sua identidade e sua socialibilidade. Essa concepção de homem resulta em pensar um “eu” socialmente competente, um sujeito político, um cidadão capaz de atuar sobre a realidade e, dessa forma, ter participação ativa na história da sociedade da qual faz parte e na construção de sua própria história. A importância de formar um cidadão pleno, ativo e participativo no processo cultural, político, econômico e social deve ser o enfoque da educação inclusiva. Segundo Freire (1996, p. 59) “as pessoas são seres condicionados, mas não seres determinados”. A formação vai muito mais além do que a preparação técnico-científica, conforme Freire (1996). Segundo o autor, infelizmente o que é válido atualmente é o “pragmatismo” pedagógico, ou seja, o treino técnico-científico, fundamentalmente voltado para a ditadura do mercado. O autor ainda cita que “...ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para sua própria produção ou a sua construção”, e que o conhecimento precisa ser vivido e testemunhado pelo agente pedagógico. Esse raciocínio existe por sermos seres humanos e, como tal, temos consciência que somos inacabados. Freire (1996, p 52). Demo (1988, pg. 49) enfoca a educação como agente de conscientização política: "acreditamos que a maior virtude da educação, ao contrário do que muitos pensam, está em ser instrumento de participação política." O termo "educação integral" também foi utilizado no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1984). A idéia de educação integral presente no Manifesto é a do direito do indivíduo a uma educação pública que alcance diversas dimensões de sua formação. Integração e acessabilidade Diferente do conceito de normalização a integração pressupõe participação de todos. Neste caso, se o indivíduo inserido não atende aos moldes de outro grupo social, tanto o indivíduo quanto o grupo devem trabalhar juntos para que ambos possam criar um meio de convivência harmoniosa e enriquecedora. A integração educacional deve ser avaliada não somente em si mesma, levando-se em conta se possibilita o desenvolvimento pessoal e social da criança com necessidades especiais, mas também se favorece a integração na sociedade e durante a vida adulta. Neste último ponto, é preciso levar em conta que o processo de integração depende em uma pequena parte das possibilidades do indivíduo e em 2418 grande parte da adaptação das instituições a essas possibilidades. Neste sentido, a integração comunitária pressupõe mudanças muito importantes na estrutura social e nas atitudes dos cidadãos, podendo, assim, ocorrer um processo satisfatório de integração escolar, seguido de uma difícil incorporação à sociedade (COLL e OUTROS, 1995). A acessibilidade, no entanto diferencia-se da integração, como acesso entende-se o direito adquirido de usufruir de um direito comum à todos. Assim, é direito de todos a educação, e, portanto, é papel do Estado prover este acesso. Este indicador pode esconder muitas deficiências no sistema educacional. Uma comunidade onde todas as crianças em idade escolar freqüentam instituições de ensino não é necessariamente uma comunidade desenvolvida ou com uma participação mais igualitária nos meios de produção e renda. A visão dos filósofos sobre educação e cidadania Platão, em A República (1975), estabelece uma relação entre a educação e a cidadania. Delineia uma utopia pedagógica cuja realização depende de uma transformação radical do Estado. Nessa sociedade ideal, a educação corresponde ao desenvolvimento de faculdades e virtudes adequadas às funções que os indivíduos exercem e é essa adequação que produz a justiça, com cada um desempenhando, de maneira satisfatória, a função para a qual é mais apto. Aos filósofos, que cultivam a razão, caberia governar a sociedade. Acima da experiência, da arte e da ciência, Aristóteles (1973) destaca a filosofia como a mais alta de todas as ciências, reservada à formação do homem justo, o cidadão. Para Aristóteles (1977), somente o Estado poderá oportunizar o pleno desenvolvimento dos valores morais "uma vez que todos pertencem ao Estado de que cada um é parte". Portanto, a educação tem caráter público. O que Kant propõe para a educação deriva-se de suas concepções filosóficas e políticas. Ele afirma que "o homem não pode chegar a ser homem a não ser por intermédio da educação. Ele não é mais do que aquilo que a educação faz dele" (Kant, 1996a, p. 73). Educase para o exercício da razão por meio da disciplina, aspecto negativo da formação, no qual o homem aprende a dominar seus instintos, e por meio da instrução, aspecto positivo, no qual adquire cultura (Kant, 1996b). Para Hegel são direitos inerentes ao indivíduo: a) A individualidade da liberdade no ser-para-si puro. Este é o direito mais alto, mas ao mesmo tempo, enquanto superioridade só abstrata, é o completamente baixo. b) Ninguém pode ter sobre a pessoa o direito sobre ela, como sobre uma coisa. Ao indivíduo pertence o corpo e a vida e tudo que não seja exterior à pessoa. O indivíduo tem direito sobre as coisas.c) Como pessoas todos os homens são iguais. 2419 Hegel pensa em uma formação voltada para a vida pública, mais especificamente, para o serviço do Estado. Nesse sentido, a função da escola deve ser compreendida em relação a sua concepção de Estado sustentado por uma classe média constituída de funcionários competentes e por uma classe política situada acima das demais classes, com funções de governo. É, portanto, tarefa da escola preparar os indivíduos para serem membros desse Estado. A educação como formação à cidadania – sob o ponto de vista da obra de Pedro Demo Na obra de Pedro Demo “Participação é conquista” ele faz uma crítica ao processo de inclusão e educacional, tendo como principal argumento o fato da educação estar voltada aos interesses do exclusor, que não permite ao indivíduo excluído participar do processo político, que segundo o autor é o maior direito do indivíduo. A escolha de prover a inclusão social não é apenas um aspecto qualitativo, onde se espera o aumento do nível intelectual da população. Ao contrário, uma vez que estamos em um contexto onde a exclusão social é atrativa a muitos, a inclusão deverá ocorrer a medida em que contribui para a classe dominante. Toda nação necessita ter a sua disposição recursos para o desenvolvimento ou manutenção do poder. Entre estes recursos está o recurso humano, ou o insumo intelectual. A inclusão vem para capacitar os indivíduos da classe dominada para que tenham capacitação técnica, sem no entanto, descaracterizar a submissão ao atual modelo. Segundo DEMO (1988), o planejamento participativo está baseado em três componentes básicos: a) o processo inicial de formação da consciência crítica e autocrítica na comunidade; b) a necessidade de formulação de uma estratégia concreta de enfrentamento dos problemas; c) a necessidade de se organizar. Dessa forma, torna-se mister a criação de um senso crítico na população, incentivando a crítica quanto ao estado das coisas, inclusive no que tange as próprias iniciativas. Uma vez contextualizada a situação esta população pode extrair os problemas e criar mecanismos para enfrentá-los. Inclusão social, ou planejamento participativo para realizar estes dois pontos deve contar com uma população organizada, uma vez que um único indivíduo não terá poder para mudar o estado das coisas. Demo (1988, p. 23) nos relata que "... a redução das desigualdades só pode ser fruto de um processo árduo de participação, que é conquista, em seu legítimo sentido de defesa de interesses contra interesses adversos." 2420 O problema quanto ao uso da educação para provimento da inclusão social, está no fato de que a classe mobilizadora, representada neste contexto pelos professores, colegiados, gestores escolares, não representa a idéia do excluído, uma vez que se compõe por indivíduos provenientes da classe favorecida. A interiorização dos ideais da inclusão social, necessita que o professor compreenda a realidade do ponto de vista do excluído, e não do exclusor. Isso não quer dizer que o educador deve morar em um subúrbio, não ter comida à mesa ou não ter o que vestir, mas saber contextualizar a faceta de um contexto cujo pensamento não visita costumeiramente. Conclusões Compreender a educação como um fenômeno humano produzido em situações sóciohistóricas, num processo de conquistas e elaborações sociais de significados, permite compreender o verdadeiro sentido da educação inclusiva. É importante uma visão participativa de todos na área educacional, seja como discente, docente ou administrador universitário. Não basta compreender o processo de inclusão sem, no entanto, perceber-se como indivíduo comprometido. Torna-se mister a criação de um senso crítico na população, incentivando a crítica quanto ao estado das coisas, inclusive no que tange as próprias iniciativas. Uma vez contextualizada a situação esta população pode extrair os problemas e criar mecanismos para enfrentá-los. Inclusão social, ou planejamento participativo para realizar estes dois pontos deve contar com uma população organizada, uma vez que um único indivíduo não terá poder para mudar o estado das coisas. Neste sentido, diante do desafio de integrar os anseios financeiros de financiamento do ensino e os anseios políticos-sociais de um país em desenvolvimento, o papel das instituições de educação superior é criar mecanismos de gestão universitária capazes, mas principalmente o de criar nos seus agentes a noção de que todos devem estar comprometidos neste objetivo. As instituições de educação superior devem compreender seu papel na formação plena dos indivíduos, de agentes ativos na redução da desigualdade social. Para isso, devem compreender o verdadeiro sentido da exclusão e da inclusão. Apenas inserir indivíduos no contexto universitário não basta. Cada vez que isto ocorre estamos dando-lhes oportunidade de participar do mercado de trabalho, mas talvez, não estamos oferecendo a oportunidade para que se torne um cidadão pleno. 2421 A universidade brasileira necessita desenvolver programas internos de integração, onde o indivíduo compreenda o sentido da participação político-social. Programas de cooperação com a sociedade, de responsabilidade social, de participação nos movimentos políticos e sociais, cooperação na formação de políticas públicas deve fazer parte do currículo destas instituições. Além disso devem promover sistemas de avaliação destes programas, da eficácia e do impacto na cultura de seus alunos. No Brasil o papel das instituições de educação superior na formação de políticas públicas ainda é muito pequeno. Poucos são os exemplos de participação de instituições de caráter privado em ações comunitárias. Ademais, devem contribuir para que os indivíduos incluídos possam criar também, um senso de responsabilidade para diminuir a desigualdade, e que através dos conhecimentos adquiridos possam mudar a realidade daqueles que fazem parte da sua convivência social. Não há dúvidas que a universidade brasileira tem papel fundamental na redução da desigualdade social e no favorecimento do desenvolvimento sustentável do país. São elas os agentes capazes de criar o senso crítico, através da pesquisa, da compreensão e análise do contexto social. Para isso não podem promover apenas o desenvolvimento de um indivíduo tecnicista, mas principalmente devem promover a formação de um cidadão pró-ativo. REFERÊNCIAS AMARAL, ROBERTO; UNESCO. Ciência e tecnologia: desenvolvimento e inclusão social. Brasília: UNESCO, 2003. 127 p. ARISTÓTELES. Metafísica. Livro 1. Textos Selecionados. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Os Pensadores). ARISTÓTELES. Tratado da Política. Mira-Sintra: Europa-América, 1977. 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