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Artigo Original
Perfil nutricional de pacientes transplantados renais atendidos no ambulatório de nutrição
Perfil nutricional de pacientes transplantados
renais atendidos no ambulatório de nutrição de
um hospital de Recife-PE
Nutritional profile of kidney transplant patients treated at the nutrition clinic of a Recife-PE hospital
Flávia Erika Felix Pereira1
Heloisa Mirelle Costa Monteiro2
Marília Tokiko de Oliveira Tomiya3
Unitermos:
Estado nutricional. Avaliação nutricional. Transplante
de rim.
Keywords:
Nutritional status. Nutrition assessment. Kidney
transplantation.
Endereço para correspondência:
Flávia Erika Felix Pereira
Rua Francisco Pereira de Mendonça, 476 – Apt 302
– Cajueiros – Macaé, RJ, Brasil – CEP: 27915-290.
E-mail: [email protected]
Submissão:
12 de março de 2015
Aceito para publicação:
4 de agosto de 2015
RESUMO
Introdução: O transplante renal tem sido uma terapia substitutiva importante para os pacientes
com insuficiência renal crônica terminal. No entanto, o período pós-cirúrgico pode vir acompanhado de alterações nutricionais que podem comprometer a saúde. O monitoramento do estado
nutricional é importante para a manutenção da qualidade de vida do paciente transplantado.
O presente estudo objetivou descrever o perfil nutricional de pacientes transplantados renais no
período pós-operatório tardio de um hospital de Recife – PE. Método: Realizou-se um estudo
descritivo com pacientes adultos submetidos ao transplante renal. Foram obtidas informações
demográficas, dados bioquímicos (hemoglobina, hematócrito, albumina) e antropométricos (peso,
altura, prega cutânea tricipital, circunferência do braço, circunferência muscular do braço e circunferência da cintura). Resultados: A amostra foi composta por 21 pacientes, dos quais a maioria
era do sexo feminino (52,4%). A média de idade foi 38,9±10,75 anos e 61,9% procedentes da
capital e região metropolitana. O percentual de eutrofia e sobrepeso/obesidade pelo índice de
massa corporal foi de 57,1% e 28,6%, respectivamente. Através da dobra cutânea tricipital 81%
apresentaram desnutrição e 14,3%, sobrepeso/obesidade. O percentual de desnutrição e eutrofia
pela circunferência do braço foi 52,4% e 42,9%, respectivamente; 61,9% apresentaram eutrofia,
38,1%, desnutrição pela circunferência muscular do braço e 33,3% estavam com circunferência
da cintura elevada. Adicionalmente, 10,5% da população apresentaram hipoalbuminemia e
60%, anemia. Conclusões: Diante dos diferentes resultados, reforça-se a importância de uma
avaliação nutricional baseada em um conjunto de medidas objetivas e subjetivas, a fim de verificar
precocemente alterações nutricionais que possam estar presentes nessa população.
ABSTRACT
Introduction: Kidney transplantation has been an important replacement therapy for patients
with end stage renal failure. However, the post surgical period may be followed by nutritional
changes that can compromise health. Monitoring nutritional status is important to maintain life
quality in renal transplant patients. The present study describes the nutritional status of renal
transplant patients during the post surgical period of a hospital in Recife – PE. Methods: It has
been conducted a descriptive study with 21 adult patients undergoing kidney transplantation.
Demographic, biochemical data (hemoglobin, hematocrit, albumin) were obtained and anthropometric (weight, height, triceps skinfold, arm circumference, arm muscle circumference and waist
circumference). Results: The sample consisted of 21 patients, of which the majority were female
(52.4%). The mean age was 38.9±10.75 years and 61.9% of the sample lived at the Capital city
or the metropolitan area. The percentage of normal weight and overweight/obese by body mass
index was 57.1% and 28.6%, respectively. Through triceps skinfold 81% had malnutrition and
14.3%, overweight/obesity. The percentage of malnutrition and eutrophic arm circumference was
52.4% and 42.9%, respectively; 61.9% were eutrophic and 38.1% malnutrition by the arm muscle
circumference and 33.3% had increased waist circumference. Additionally, 10.5% of the population
presented hypoalbuminemia and 60% had anemia. Conclusions: Given the different results, it
reinforces the importance of nutritional status evaluation based on a set of objective and subjective
measures, in order to quickly verify nutritional changes that may be present in this population.
1.
Nutricionista, Pós-Graduada em Nutrição Clínica pelo Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP); Pesquisadora do Núcleo
de Pesquisa em Saúde e Sociedade - IMMT/Universidade Federal do Rio de Janeiro – Campus Macaé, Macaé, RJ, Brasil.
2. Nutricionista, Mestre em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Especialista em Nutrição Clínica pelo Programa de Residência
do Hospital das Clínicas da UFPE (HC-UFPE), Professora Titular do Curso de Nutrição da Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil.
3. Nutricionista, Mestre em Nutrição pela UFPE, Especialista em Nutrição Clínica pelo Programa de Residência do HC-UFPE, Recife, PE, Brasil.
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Pereira FEF et al.
INTRODUÇÃO
estado nutricional12, o que permite a identificação dos
pacientes que possuem alguma alteração, direcionando intervenção apropriada. Apesar da não existência de um “padrão
ouro” de avaliação nutricional específica, é fundamental
conhecer, por meio de vários métodos utilizados na prática
clínica, o estado nutricional desses pacientes. O presente
estudo tem como objetivo descrever o perfil nutricional de
pacientes transplantados renais no período do pós-operatório
tardio, atendidos no ambulatório de nutrição de um hospital
de Recife – PE.
A doença renal crônica (DRC) é considerada, atualmente,
um problema de saúde pública no mundo. No Brasil, a
incidência e a prevalência da DRC estão aumentando e,
de acordo com o censo brasileiro de diálise publicado em
2014, a taxa de prevalência de tratamento dialítico em
2012 foi de 503 pacientes por milhão da população (pmp),
resultando em 97.586 pacientes em tratamento dialítico1.
Os tratamentos disponíveis não são curativos, mas substituem a função renal, amenizando os sintomas da doença
e podendo aumentar a sobrevida do paciente2. Segundo
Kaplan & Meier-Kriesche3, o transplante renal, realizado
com doadores vivos ou cadáveres, tem sido uma terapia
substitutiva importante para os pacientes com insuficiência
renal crônica terminal (IRCT).
MÉTODO
Foi realizado um estudo descritivo com 21 pacientes
adultos que estavam no período pós-transplante renal, a
partir de 4-6 semanas do transplante. A amostra foi constituída por pacientes atendidos na primeira consulta no
ambulatório de nutrição do Instituto de Medicina Integral
Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife, PE, no período
de outubro a dezembro de 2012.
Algumas alterações nutricionais podem acometer os
pacientes que se submetem ao transplante renal, entre
elas estão desnutrição, sobrepeso/obesidade, anemia e
hipoalbuminemia4. Os principais fatores que interferem
no aparecimento da desnutrição no transplantado são:
consequências gastrointestinais da cirurgia, anorexia, dietas
restritivas, toxicidade urêmica, infecção da cirurgia, terapia
imunossupressora, entre outros5. Neste sentido, a presença
de desnutrição calórico proteica tende a acontecer precocemente após o transplante e está fortemente associada com
caquexia e óbito6.
Participaram da pesquisa pacientes entre 18 e 59 anos,
de ambos os sexos, que estivessem aptos para aferição de
medidas antropométricas e em condições clínicas favoráveis
para responder o questionário feito pelo pesquisador. Os
pacientes com idade menor que 18 anos e maior que 60
anos, duplo ou retransplantados, os que possuíam alguma
impossibilidade física de participar das avaliações, bem como
os que faziam consulta de retorno foram excluídos.
Além da desnutrição, a obesidade parece ser um achado
frequente em pacientes transplantados renais. Sua etiologia
está concatenada com a alimentação após o transplante,
uma vez que os pacientes encaram o transplante como uma
fuga das restrições alimentares presentes no tratamento da
DRC4. Essa desordem nutricional pode influenciar diretamente
na diminuição da sobrevida do enxerto e no aumento do
número de complicações no pós-transplante, bem como
aumento do número de óbitos7.
No momento da consulta ambulatorial, foi realizada a
avaliação nutricional por meio das técnicas convencionais
para essa finalidade. O peso e a altura foram mensurados
em balança tipo plataforma marca Filizola com capacidade
de 150 kg e estadiômetro acoplado a mesma. A partir
desses dados, foram obtidos o índice de massa corporal
(IMC) e a classificação do estado nutricional segundo
OMS, 199713.
Outros achados nutricionais encontrados na população
de transplantados incluem a anemia e hipoalbuminemia.
A anemia é mais prevalente no pós-transplante imediato8.
No entanto, com a recuperação das funções renais nos três
primeiros meses, há uma melhora nos níveis de hemoglobina,
que podem atingir os valores normais no primeiro ano8. A
diminuição da concentração de albumina sérica, por sua
vez, acomete, especialmente, pacientes nos primeiros 5
anos pós-operatório9. Esse achado ocorre, provavelmente,
pela inflamação associada ao estresse cirúrgico e às altas
doses de corticoides, principalmente porque nesse período
a ingestão dietética de proteína ainda está inadequada10.
Posteriormente, os níveis séricos de albumina tendem à
normalidade11.
A dobra cutânea tricipital (DCT) foi mensurada com auxílio
de um paquímetro cescorf, a circunferência do braço (CB)
e a circunferência da cintura (CC) foram medidas com fita
métrica inextensível de fibra de vidro com escala de 0-150 cm
e resolução de 0,1 cm. A circunferência muscular do braço
(CMB) foi obtida a partir da CB e da DCT. Os resultados
obtidos da CMB, CB e DCT foram relacionados com os
padrões de referência propostos por Frisancho14 e expressos
em percentual de desvio padrão. Em seguida, foram categorizados em desnutrição grave, moderada, leve, eutrofia,
sobrepeso ou obesidade, conforme classificação de Blackburn & Thornton, relatadas por Kamimura et al.14. Devido
ao número reduzido da amostra, as categorias sobrepeso
e obesidade foram agrupadas, e desnutrição foi agrupada
em desnutrição leve/moderada ou moderada/grave na
apresentação dos resultados de DCT e CB, respectivamente.
Diante das repercussões metabólicas que podem ocorrer
após o transplante renal, se faz relevante a avaliação do
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Perfil nutricional de pacientes transplantados renais atendidos no ambulatório de nutrição
Os parâmetros bioquímicos avaliados constituíram-se das
dosagens séricas de hematócrito (Ht), hemoglobina (Hb) e
albumina, e os resultados foram coletados no prontuário dos
pacientes. A obtenção da classificação econômica e a estratificação do nível socioeconômico foram realizadas através do
“Critério de Classificação Econômica Brasileira”, estabelecido
pela Associação Brasileira de Empresa e Pesquisa (ABEP).
Para fins de leitura, as Classes C, D e E foram agrupadas.
Tabela 1 – Características demográficas dos pacientes transplantados
renais no período pós-operatório tardio, atendidos no ambulatório de
nutrição de um hospital de Recife – PE.
Variável
N
Frequência (%)
65,02±15,15
76,66±7,69
Feminino
11
52,4
Masculino
10
47,6
Total
21
100
Capital
7
33,3
RMR
6
28,6
Agreste
1
4,8
Zona da Mata
3
14,3
Sertão
4
19,0
Total
21
100
Indeterminada
12
57,2
Glomerulonefrite
2
9,5
Síndrome Allport
2
9,5
GESF
1
4,8
HAS
2
9,5
Sexo
A análise estatística foi realizada no programa SPSS versão
13.0, em que as variáveis contínuas foram testadas quanto
à normalidade da distribuição, pelo teste de Shapiro-Wilk e
descritas nas formas de média e desvio padrão. Foi realizada
análise descritiva (univariada) para caracterizar a distribuição
da ocorrência dos eventos, incluindo a frequência de cada
variável do estudo e o respectivo intervalo de confiança.
Foi utilizado o nível de significância de 5% para rejeição de
hipótese de nulidade.
Procedência
Etiologia da doença renal
A pesquisa foi previamente aprovada pelo Comitê de Ética
em Pesquisa em Seres Humanos do Instituto de Medicina
Integral Professor Fernando Figueira – IMIP, sob o número
2924-12. A aplicação do questionário e as avaliações nutricionais descritas foram realizadas pelo próprio pesquisador
e os pacientes participantes foram informados acerca dos
objetivos e procedimentos a serem realizados e assinaram o
“Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”.
DRPC
2
9,5
Total
21
100
A
2
9,5
B (B1+B2)
4
19,1
C (C1+C2)
10
47,6
D
5
23,8
Total
21
100
Classificação Econômica
RESULTADOS
A Tabela 1 contempla as características demográficas
da população do estudo, a qual demonstra que a mesma
foi composta de 11 mulheres e 10 homens, com média de
idade de 38,9±10,75 anos, 62% eram procedentes da
capital Recife e da Região Metropolitana e 47,6% pertencentes a classe econômica C. Além disso, percebe-se que a
etiologia da doença renal foi na maioria dos casos de causa
indeterminada (57,2%).
RMR = Região Metropolitana do Recife; GESF = Glomeruloesclerose focal e segmentar; HAS =
Hipertensão arterial sistêmica; DRPC = Doença renal policística.
A classificação do estado nutricional pelos parâmetros antropométricos e bioquímicos, contida na Tabela 2,
demonstra que a maioria dos pacientes avaliados estava
eutrófica (57,1%). Os resultados da DCT demonstraram
que a maioria da amostra (81%) apresentava desnutrição
no momento da consulta, entre estes, 61,9% apresentavam
forma mais grave com frequência estatisticamente maior que
sobrepeso/obesidade. Para CB, 52,4% também estavam
desnutridos. Entretanto, a CMB classificou como eutróficos
61,9% dos avaliados e essa frequência foi estatisticamente
maior que a de desnutridos no grau leve. Por meio das
medidas da CC, percebe-se que dois terços da amostra não
apresentaram risco para doença cardiovascular. Além disso, o
percentual de indivíduos com valores anormais de albumina
foi estatisticamente menor que a proporção de indivíduos
com valores séricos considerados dentro da normalidade.
Os valores de Ht estavam alterados em 75% da amostra,
estatisticamente maior que a proporção de pacientes com
valores normais desse indicador.
DISCUSSÃO
No presente estudo, foi demonstrado que os pacientes
transplantados renais atendidos no ambulatório de nutrição
do IMIP eram predominantemente procedentes da capital
Recife e região metropolitana, classe econômica C e com
etiologia de doença renal de causa indeterminada. A maioria
da amostra foi classificada como eutrófica pelo IMC e CMB,
desnutrida segundo DCT e CB e sem risco elevado para
doenças cardiovasculares. Além disso, mais da metade dos
pacientes apresentavam níveis reduzidos de Ht e Hb e níveis
normais de albumina sérica.
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Pereira FEF et al.
decorrido do transplante, uma vez que o ganho ponderal
ocorre com maior intensidade nos primeiros 6 meses4 e os
pacientes do presente trabalho estivessem entre 4-6 semanas
de pós-transplante.
Tabela 2 – Classificação e frequência do estado nutricional dos pacientes
transplantados renais no período pós-operatório tardio, atendidos no ambulatório de nutrição de um hospital de Recife – PE.
Parâmetro nutricional
N
Frequência (%)
IC95%
O presente estudo evidencia que a maioria dos indivíduos
faz parte do grupo sem risco para doença cardiovascular
quando analisado a CC. Estes resultados se corroboram com
os dados do IMC (eutrofia em 57,1%), comprovando a correlação entre estes parâmetros14. Além disso, esse resultado é
muito animador, se considerarmos que a circunferência da
cintura elevada parece estar associada à mortalidade por
doença cardiovascular nesta população, de acordo com
Kovesdy et al.16.
IMC
Desnutrição
3
14.3
3,0-36,3
Eutrófico
12
57.1
34,0-78,1
Sobrepeso/obesidade
6
28.6
11,2-52,1
Desnutrição grave
13
61.9
38,4-81,8
Desnutrição leve/
moderada
4
19,1
5,4-41,9
Eutrofia
1
4.8
0,1-23,8
Sobrepeso/obesidade
3
14.3
3,0-36,3#
Desnutrição moderada/
grave
6
28.6
11,2-52,1
Desnutrição leve
5
23.8
8,2-47,1
Eutrofia
9
42.9
21,8-65,9
Sobrepeso/obesidade
1
4,8
0,1-23,8
5
23,8
8,2-47,1
Desnutrição leve
3
14,3
3,0-36,3*
Eutrofia
13
61,9
38,4-81,8
Sem risco para doenças
cardiovasculares
13
61,9
40,7-84,6
Risco aumentado para
doenças cardiovasculares
7
33,3
15,3-59,2
≤3,5
2
10,5
1,3-33,1*
>3,5
17
89,5
66,8-98,6
<12
12
60,0
36,0-80,8
<12
12
60,0
36,0-80,8
<35
15
75,0
50,8-91,3*
>35
5
25,0
8,6-49,1
DCT
A CMB constitui um dos parâmetros antropométricos
utilizados para estimar as reservas de tecido muscular14.
No presente trabalho, nota-se que quase 70% da amostra
apresentaram eutrofia e essa proporção foi estatisticamente
maior que a de desnutridos leves. Esses dados demonstram
uma possível preservação da massa magra. A PCT é utilizada para estimar a gordura corporal e deve ser investigada
quando valores anormais são encontrados, pois a maior
reserva de calorias localiza-se neste tecido14. Quando
analisado esse parâmetro, detectou-se um percentual estatístico elevado de indivíduos com desnutrição. A desnutrição
também foi o achado nutricional mais prevalente segundo
a CB, podendo indicar uma possível depleção energética
nesses pacientes, apesar de não ter sido observada diferença estatística para esse parâmetro. O maior comprometimento do tecido adiposo pode se justificar pela ingestão
calórico-proteica inadequada, uma vez que, em situação de
carência nutricional, o organismo utiliza a gordura corporal
como substrato energético, a fim de preservar as reservas
musculares17.
CB
CMB
Desnutrição moderada
CC
Albumina (g/dl)
Além dos parâmetros antropométricos de avaliação nutricional, os determinantes bioquímicos podem ser utilizados
para elucidar o perfil nutricional. Por meio do hemograma,
percebemos que 60% e 75% dos avaliados apresentavam
níveis de Hb e Ht abaixo da normalidade, respectivamente,
sugerindo um quadro de anemia nessa população. Tempo
transcorrido após a cirurgia e da função renal, terapia de
imunossupressão, uso de inibidor da enzima de conversão
e/ou bloqueador do receptor de angiotensina, metabolismo
do ferro (absorção intestinal) e níveis de folato, glóbulos
vermelhos e vitamina B12 são fatores que parecem colaborar com a ocorrência de anemia no pós-transplante, o
que pode justificar nossos resultados18-20.
Hemoglobina (g/dl)
Hematócrito (%)
IC95% = Intervalo de Confiança de 95%; IMC = Índice de massa corporal; DCT = Dobra
cutânea tricipital; CB = Circunferência do braço; CMB = Circunferência muscular do braço;
CC = Circunferência da cintura; *proporção estatisticamente diferente do seu correspondente
eutrófico ou valores normais. # proporção estatisticamente diferente do grupo desnutrido grave.
Segundo o IMC, 57,1% dos pacientes foram classificados
como eutróficos. Este resultado diverge do estudo realizado
por Bastos et al.15 no Hospital das Clínicas de Porto Alegre,
onde a maioria apresentava sobrepeso/obesidade (55%),
seguida de eutróficos (42%) e desnutridos (3%). Presumese que a divergência nos resultados aconteça pelo tempo
Os níveis séricos de albumina detectaram preservação
significativa da proteína visceral na maioria dos pacientes.
Resultados semelhantes foram encontrados por El Haggan et
al.11, que encontraram valor médio de albumina dentro da
faixa de normalidade (4,24 g/dl) no período pós-transplante
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32
Perfil nutricional de pacientes transplantados renais atendidos no ambulatório de nutrição
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tardio. A hipoalbuminemia geralmente ocorre no período
pós-transplante inicial, provavelmente pela inflamação
associada ao estresse cirúrgico, altas doses de corticoides
e, principalmente, porque nesse período a ingestão dietética
de proteína ainda está inadequada10. Posteriormente, os
níveis séricos de albumina tendem à normalidade11.
Diante do exposto, verificou-se no presente estudo, que
o diagnóstico nutricional variou de acordo com o parâmetro
utilizado. A maioria da população estudada apresentou
eutrofia pelo IMC e CMB, depleção de gordura corporal
quando avaliadas a CB e a DCT e não demonstrou risco para
doença cardiovascular de acordo com a CC. Nessa mesma
população, ocorreu presença de anemia, o que enfatiza a
necessidade da orientação alimentar e da dietoterápica, a
fim de prevenir essas e outras alterações que possam ocorrer
no pós-transplante.
Assim, para definição de um diagnóstico do estado de
nutrição, torna-se essencial uma avaliação nutricional que
considere todas as particularidades presentes no tratamento
da doença renal, incluindo a utilização de vários instrumentos
para tal finalidade. Ademais, estudos com amostras mais
representativas e que incluam o diagnóstico nutricional em
consultas posteriores são necessários para observar em longo
prazo como essas alterações metabólicas se comportam
em resposta ao transplante renal e ao acompanhamento
nutricional.
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Local de realização do trabalho: Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife, PE, Brasil.
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