A dignidade humana e a alienação em decorrência do trabalho

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A dignidade humana e a alienação em
decorrência do trabalho
Texto por Fabiano ZavanellaEnviado por Diário da Manhã
Segundo Karl Marx o homem se relaciona com o trabalho por mera necessidade e imposição, em
vista da concentração da propriedade privada nas mãos de poucos. Com a produção industrial,
ele passa a alienar-se por completo do processo e do próprio objeto que produz. A força de
trabalho se transforma no seu bem e como tal o negocia a fim de garantir a subsistência.
Por óbvio que na visão capitalista, o lucro ocupa especial espaço e assim é o fator de busca das
empresas, muitas vezes a qualquer preço ou custo, levando assim a potencialização da chamada
alienação, já que em que pese a essência do trabalho apontar que é um processo de criação de
valores, mediante transformação ou utilização do meio, há um esvaziamento pela falta de
equilíbrio.
Quando se dá essa crescente prática, acentuada pela industrialização e seus avanços, onde cada
vez mais o homem operário se dedica a partes de um processo e assim se aliena, surge ou se
agrava o que muitos autores chamam de sofrimento do trabalhador.
Certamente que tais abstinências levam a reflexos e impactos físicos e psíquicos que se
manifestam ao longo do tempo e não imediatamente após o fato, como nas hipóteses de trauma.
Índices e estatísticas mostram que de 40 a 45% dos trabalhadores sofrem dos chamados
transtornos mentais (Ministério da Saúde) e no Brasil, segundo o INSS, em 2006, o custo com
auxílio-doença para quem sofria desse tipo de transtorno e males relacionados ao estresse, foi de
R$ 90 milhões!!
No modelo atual de gestão, ao menos das empresas sérias e comprometidas com o chamado
colaborador, há um traço de preocupação bastante grande com a motivação e o próprio bemestar dos empregados, percepção advinda da retomada da importância do individual e da sua
contribuição para o todo, afinal não há repetição de seres humanos, cada sistema vivo é marcado
por uma concorrência de fatores, experiências e carga genética única e quem melhor respeitar ou
valorizar essas diferenças, sem dúvida alguma chegará muito próximo do ideal em termos de
gestão.
Claro que o sistema jurídico não pode virar as costas para a problemática ou tampouco
distanciar-se sob o pretexto único do liberalismo ou então por se tratar de uma relação
pertencente ao direito privado. A dignidade humana é pilar de nossa Constituição e sem dúvida
alguma, no ambiente de trabalho é onde mais se coloca em conflito essa garantia, contraposta a
muitos outros princípios ou garantias até mesmo constitucionais, que não podem sobrepor ou
equiparar a essência da dignidade.
E neste sentido, segundo lições de Délio Maranhão, “a obrigação de respeitar a personalidade
moral do empregado na sua dignidade absoluta de pessoa humana,” é algo inegociável e não
permite flexibilização, caso não observado, é dever do Estado intervir e reequilibrar a relação
quer preventivamente ou até mesmo na ação corretiva advinda de seus órgãos de controle e
jurisdição.
Outro exemplo comum em épocas eleitorais e bastante atual foi objeto de um artigo escrito pela
mestra em Educação e Meio Ambiente e Juíza do Trabalho, Claudirene Andrade Ribeiro, se
refere à dignidade humana nos trabalhos de campanha (homens poste), que gera tamanha
indignação na autora, com o que comungo: “O trabalho precisa ser algo criativo, que promova a
interação entre o executor e o meio, sob pena de provocar o esgotamento físico e mental ante a
inatividade ou a repetição de movimentos, consistindo também numa fonte de humilhação que
pode caracterizar assédio moral.”
Certamente por situações como estas e muitas outras comumente verificadas em nossa
sociedade, Ricardo Sayeg desenvolveu a teoria do capitalismo humanista, buscando um
contraponto, um equilíbrio, não se contentando apenas com a premissa de que se algo é
inevitável, melhor juntar-se aquilo e assim propondo reflexões e maneiras outras de se olhar
para a questão da produção, do ganho financeiro, sem com isto eliminar o respeito às pessoas e
sobretudo seu bem-estar.
Desta feita, a teoria propõe o resgate da fraternidade, através de seu sentido original, que nada
mais é do que um sentimento de irmandade, de afeto e amor pelo próximo. O traço marcante é a
efetivação do mandamento preambular da Constituição Federal, que determina a construção de
uma sociedade fraterna sob a proteção de Deus.
A aplicação prática dessas premissas ainda mais em uma realidade globalizada e de extrema
competição, na qual sociedades tidas como fundamentalmente socialistas, a exemplo da China,
se caracterizam como gigantes de mercado e potenciais concorrentes em diversos setores,
exatamente por enraizar dentre seus cidadãos a ideia de que para se tornar diferente entre mais
de dois bilhões de habitantes, apenas a dedicação extrema ao que se faz é o caminho nem do
sucesso, mas da sobrevivência, e assim sendo, como concorrer com um indivíduo que encara
com normalidade uma jornada diária de trabalho de no mínimo 14 horas e que vê sua doação
como forma de compor o todo e assim garantir o Estado forte?
Talvez a conclusão sensata seja de que não devemos concorrer e sim olhar para nossa
característica cultural e social e buscar incessantemente preservar e manter o princípio basilar da
Constituição que é a Dignidade Humana sobreposta a toda e qualquer outra regra ou premissa
da Sociedade, afinal sua essência é estruturante do Estado que propõe a Constituição Cidadã,
pois certamente assim nos tornaremos uma nação evoluída e, por conseguinte uma potência
econômica e social.
(Fabiano Zavanella, consultor jurídico; advogado; pós-graduado em Direito Material e
Processual do Trabalho)
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