Maria do Socorro Martins Lima (UnB)1

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Didática e Prática de Ensino na relação com a Escola
A DISCIPLINA EM SALAS DE AULAS DO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL – A VISÃO DOS PROFESSORES.
Maria do Socorro Martins Lima (UnB)1
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Resumo
O estudo teve por objetivo analisar a questão da disciplina e do controle de classe em turmas de 1º ano do ensino fundamental, destacando o papel do professor, das interações sociais, e das concepções e avaliações das professoras acerca do tema. Participaram da pesquisa quatro professoras do 1º ano do ensino fundamental, e suas classes, pertencentes a quatro diferentes escolas públicas do Distrito Federal, localizadas no Plano piloto. A metodologia utilizada foi qualitativa, com o uso da observação direta, gravações em vídeo das situações interativas ocorridas na sala de aula, e entrevistas com as quatro professoras. A análise dos dados baseou­se nos aspectos qualitativos extraídos do discurso das educadoras e confrontados com a prática pedagógica registrada nas gravações em vídeo e na observação direta. Os resultados apontam peculiaridades na forma como enfrentam a questão da disciplina na sala de aula e as estratégias que utilizam. As estratégias apontadas como as que melhor conduziram aos resultados dos alunos, esperados pelos professores foram aquelas que buscavam a negociação e o estabelecimento de regras claras, a explicação da necessidade de colaboração dos alunos e as consequências desta colaboração. Palavras chave: Disciplina – Prática Pedagógica – Professores
Introdução
O interesse pelo tema da disciplina na prática de professoras do Ensino Fundamental surgiu da diversidade de situações­problema vivenciadas no acompanhamento como professora e supervisora. Diante das queixas de professores sobre o desinteresse e indisciplina do aluno na sala de aula, relatados na sala dos professores, em reuniões pedagógicas, bem como em momentos informais. O desinteresse e a indisciplina dos alunos são apontados pelos professores, gerando angústias, preocupações e exigindo ações por parte daqueles que são responsáveis por sua educação. A escola, apesar de possuir um discurso inovador, tem sua prática muito voltada para os princípios norteadores da educação tradicional. A ideia de que o aluno chega à escola como se fosse uma folha em branco parece estar presente no discurso dos profissionais, que passam a executar um ensino embasado em valores culturais diferentes daqueles que o aluno possui. O aluno reage, e essa reação a escola, muitas vezes, chama de indisciplina. EdUECE- Livro 1
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Quando o aluno deixa de corresponder ao que a escola espera dele, ou que se desvia de alguma forma do que o professor idealiza, passa a ser visto como desinteressado, ausente e “indisciplinado”, e passa a ser alvo de preocupação e crítica na medida em que atrapalha o desenrolar da aula. Dessa forma as interações em sala de aula estarão marcadas por sentimentos contraditórios. Uma das preocupações da escola e dos seus professores, ao receber as crianças no início do ano, refere­se ao estabelecimento de regras, de modo que possa melhor conduzir os alunos àquilo que seria a função da escola, ensinar. Mesmo se estabelecidas em clima democrático, nem sempre são em termos daquilo que o aluno pode fazer, pois ele nem sempre as entende muito bem. Assim, muitas vezes o aluno é colocado em situações de obediência, apatia ou incompreensão daquilo que deveria cumprir, ou seja, da rotina da escola. Desenvolvimento do estudo
Estudiosos com os quais estabelecemos interlocução foram Silva 2010; Foucault (1987); D’Antola (1989); Estrela (1992); Tacca 2005, 2006; Gonzàlez Rey, 2008 citado em Tacca e Mitjans 2009 a fim de discutir questões relacionadas ao conceito de disciplina; compreensão dos aspectos da subjetividade dos alunos e da sua participação em sala de aula. À questão do estabelecimento de regras deve ser dada bastante atenção, pois, muitos estudiosos, como Silva (2010) têm chamado nossa atenção para o fato de que a disciplina escolar tem sido fortemente criticada no meio educacional brasileiro, como se quaisquer formas de controle das condutas dos estudantes fossem necessariamente autoritárias ou conservadoras. Isso explica a atual desconfiança de pesquisadores e educadores em relação aos conceitos de disciplina e indisciplina, termos que parecem não poder mais compor o vocabulário pedagógico contemporâneo. Assim, parece haver muitas vezes um entendimento errôneo de que a disciplina em si seria negativa, quando na realidade é necessário discutir de que concepção de disciplina nós estamos falando. Se embasadas na submissão ou no estabelecimento de acordos necessários à convivência e tranquilidade no ambiente escolar. A tendência em alguns destes trabalhos é os professores atribuírem a indisciplina às características psicológicas do aluno e da família, ao passo que os alunos EdUECE- Livro 1
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colocam a responsabilidade no professor. Alguns outros estão incluídos na perspectiva corretiva, apontando como solução a intervenção baseada nas práticas terapêuticas, e na resolução de problemas fundamentados nos princípios da aprendizagem social e psicologia social. Os estudos nesta área carecem de modelos de inspiração pedagógica (Estrela, 1992).
Tacca (2012) nos desperta para a questão quando diz que aluno, professor e conteúdo precisam se encontrar para que se trabalhe na sala de aula com base nas possibilidades de aprendizagem e não no que falta ao aluno. Esta colocação também poderia ser feita em relação à indisciplina na medida em que se o aluno consegue entender o conteúdo e participar da dinâmica da aula terá menos necessidade de estabelecer estratégias outras para “estar na sala de aula”, para sentir­se de alguma forma parte daquele contexto, mesmo que de modo inadequado.
A análise dos dados foi realizada com base no discurso de quatro professoras do ensino público do Distrito Federal, com variados graus de experiência no magistério, na observação de episódios interativos entre estas professoras e seus alunos gravados em vídeo, e na observação direta de episódios registrados no ambiente da sala de aula. Selecionamos classes de 1º ano do ensino fundamental. A análise integrada das três fontes, observação direta, gravações em vídeo e entrevista teve por objetivo favorecer a visualização da riqueza de significados e concepções presentes nas falas e ações das professoras, conferindo uma maior clareza a respeito de suas concepções e práticas. Conclusões
O estudo revelou que cada professora emprega diferentes estratégias para lidar com as crianças, embora tenham sido registradas algumas similaridades em seus estilos interativos. As professoras empregaram estratégias que conduziram as crianças à colaboração, atenção e participação na sala de aula foram: falar baixo; estabelecer um clima de descontração, através de aulas com música, poesia, jogos; explicar claramente às crianças as razões pelas quais devem colaborar, quais as atitudes que são delas esperadas, e que resultado obterão, se colaborarem conforme solicitado; elogiar (o que pareceu deixar as crianças mais estimuladas a se empenhar em fazer bem uma determinada atividade); delegar responsabilidades tais como distribuir e recolher cadernos, livros, entregar ou pegar algo na secretaria ou na cantina; convidar as EdUECE- Livro 1
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crianças para se sentarem em círculo com a professora, para lhes apresentar um novo conteúdo; realizar tarefas escritas logo após a explicação do assunto; manter as crianças sempre ocupadas, realizando alguma atividade; passar em cada carteira para ver o que estão realizando; permitir que as crianças conversem, troquem ideias, e se ajudem mutuamente; falar com a criança agachando ou sentando para ficar mais próximo e olhando para ela (isto pareceu fazer uma grande diferença e produzir respostas mais positivas às solicitações e orientações da professora). Os resultados apresentaram exemplos de situações diferenciadas em cada sala de aula estudada. Em todas elas verificamos tanto o emprego de estratégias que favorecem interações propícias ao desenvolvimento como das que dificultam a criação do clima de confiança necessário para que as crianças tenham convicção de que podem se expressar e realizar tentativas, erros e acertos. A exigência de cuidados excessivos com a manutenção dos materiais da sala, as carteiras, por exemplo, causa uma preocupação a mais que a criança deve ter na hora de escrever ou realizar atividades que conduzam à aquisição da escrita, quando se sabe que este não é um processo simples, pois a aquisição da habilidade de escrita se desenvolve ao longo de um processo, é uma atividade complexa que envolve diversos níveis e tipos de atividades por parte da criança. Com relação à prática do professor apontou­se que deve ser realizada de modo prioritário e constante uma ação efetiva de acompanhamento e apoio ao professor, através de reuniões de grupos de professores, acompanhados por um profissional capaz de oferecer­lhes subsídios teóricos para as suas indagações e conflitos oriundos de sua prática. A criação de oportunidades de intercâmbio com outras realidades escolares que pudessem conduzi­los à avaliação de suas ações torna­se relevante. Assim como a gravação em vídeo da atuação cotidiana do professor, para que ele próprio possa avaliar a sua atuação, em conjunto com alguém que o apoie, um assistente pedagógico por exemplo, permitindo­lhe buscar estratégias para redirecionar a sua ação pedagógica, durante um processo permanente de acompanhamento e formação em serviço. Destacamos a formação como um processo relevante, uma vez que favorece o aumento da capacidade de autocrítica, reflexão e de novas atitudes do professor diante de suas tentativas de acertos. Oportuniza a discussão, a troca de experiências acerca das dificuldades vividas no cotidiano e a vivência de situações semelhantes mais aproximadas daquelas vividas pelas crianças.. Experiências como estas talvez possam favorecer o colocar­se no lugar do outro, o EdUECE- Livro 1
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sentir­se par e, também, imaginar­se na situação de seus alunos, pois ao assumir o papel de professor, ele pode deixar de captar as situações na perspectiva do aluno, e por isso não consegue colocar­se em sintonia com ele.
Constituem­se requisitos para uma boa organização do ensino, a elaboração de um bom plano de aula, a estimulação da aprendizagem, o acompanhamento da aprendizagem e das ações dos alunos.
Muitos fatores contribuem para as dificuldades enfrentadas pelo professor: uma formação profissional inadequada, a perda de autonomia e do poder decisório sobre a própria ação pedagógica decorrentes da hierarquização e divisão de trabalho na escola, a burocratização e centralização das decisões educacionais, bem como, as péssimas condições de trabalho em grande parte das instituições. Não se pode pensar em maior eficácia do professor sem levar em conta fatores sociais, de ordem mais ampla, como as suas condições de vida e trabalho. Referências:
D’ANTOLA A. (Org.). Disciplina na escola: autoridade versus autoritarismo. São Paulo: EPU, 1989.
ESTRELA, M. T. Relação pedagógica, disciplina e indisciplina na aula. Portugal: Lisboa, Porto editora, 1992.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 15ª ed. Petrópolis: Vozes, 1987.
MITJÀNS MARTINEZ A. M. & TACCA M. C. V. R. (Org.) A complexidade da aprendizagem: destaque ao ensino superior. Campinas, sp: ed. Alinea, 2009.
MITJÀNS MARTÍNEZ A. M. & TACCA M. C. V. R. (Org.). Possibilidades de aprendizagem: ações pedagógicas para alunos com dificuldades e deficiência. Campinas, São Paulo: Ed. Alínea, 2011.
REY, F. GONZALÉZ Y MITJÁNS, A. La personalidad: su educacíon y desarrolo. La Habana: Editorial Pueblo y educación, 1989.
TACCA, M. C. Estratégias pedagógicas: conceituações e desdobramentos com o foco nas relações professor­aluno. In TACCA, M. C. (org.) (2006) Aprendizagem e trabalho pedagógico. Campinas, Alínea. TACCA, M. C. V. R. Aluno, professor e conteúdo precisam se encontrar. Entrevista ao Jornal Portal do professor/MEC, 2012, http://portaldoprofessor.mec.gov.br/conteudoJornal.html?idConteudo=2415> Acesso em 29 de maio de 2014.
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Doutoranda do Programa de Pós­Graduação em Educação da Universidade de Brasília. EdUECE- Livro 1
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