TITULO: A TRAVESSIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA NO GOVERNO VARGAS: ESTADO E IGREJA CATÓLICA (1930 A 1945) FLÁVIO CÉSAR FREITAS VIEIRA E CARLOS HENRIQUE DE CARVALHO (Orientador) NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA DA EDUCAÇÃO FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INTRODUÇÃO No período republicano, entre 1891 a 1930, o processo educacional brasileiro desenvolveu-se sob os conflitos ideológicos: as elites liberais e anti-clericais de um lado e a liderança católica de outro. Esta última reage em busca da reinserção de seus princípios religiosos e morais, no processo político educacional. Ambos, ideologicamente, proclamaramse autênticos representantes das reivindicações da maioria da população, que apresentava um percentual de 75% de analfabetos. Ao considerar que a educação brasileira, neste período, encontra-se amalgamando os interesses das elites, principalmente, da oligarquia cafeeira, confirma-se que ambos os grupos em conflito estão distantes das reivindicações populares e empenhando-se para impor seus princípios como necessários à população. Tal conflito possibilita o fortalecimento do Estado, que proclama-se o mediador para o bem estar de toda população brasileira. Em 1930, Vargas assume o cargo de Chefe do Governo Provisório, com objetivo político-administrativo de reconstruir a pátria de todos os brasileiros. Nas palavras de Germano Jardim1, Vargas buscará governar para “sanear e a educar o Brasil,(...)[entretanto,] entre as reformas de maior vulto [está] a organização do Ministério da Educação e Saúde Pública” (IBGE, 1941: p. 230). Na Assembléia Nacional Constituinte, em 15 de novembro de 1933, Vargas declara que “(...) ao balancear, na primeira parte desta Mensagem, as realizações do regime monárquico, deixei acentuado que o país, depois de meio século de vida política independente, estava ainda com os dois problemas capitais da sua organização para resolver: o trabalho e a educação” (IBGE, 1941:p. 1). O Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP)2 surge com o propósito de encaminhar uma solução para o problema educacional, e por meio da educação, possibilitar mudanças sociais e econômicas, que iriam transformar a grande Pátria abalada pela crise 1 econômica de 19293. Em pronunciamento na Bahía, em 28 de agosto de 1933, Vargas afirma que, “Educado o povo, o sertanejo rude feito cidadão consciente, valorizando o homem pela cultura e pelo trabalho inteligente produtivo, o Brasil, terra maravilhosa por sua beleza natural, transformar-se-á na grande Pátria que nossos maiores visionaram e que as gerações futuras abençoarão” (IBGE, 1941: p. 230). RELAÇÃO ESTADO / IGREJA Neste cenário, a Igreja Católica assume uma posição de cautela, na pessoa de Dom Sebastião Leme, conhecendo que há opiniões favoráveis e contrárias ao novo governo, no próprio interior da Igreja. Leme se apresenta a Vargas, como elemento político de apoio, compreendendo que há outros adversários aos princípios católicos, como o comunismo, no qual deve-se centrar os ataques, pois conforme afirma Horta ( 1994), “(...) além disso, na medida em que o Estado laico se aproxima do fim, o aprofundamento da questão social, o crescimento e a radicalização política da pequena burguesia e do operariado farão com que o comunismo apareça no horizonte da Igreja como o novo adversário” (p. 96). Em 06 de dezembro de 1930, Vargas nomea, para assumir o comando do recém criado Ministério de Educação e Saúde Pública, o ex-secretário da Educação de Minas Gerais, Francisco Luís da Silva Campos, que permanece no cargo até 15 de setembro de 1932. O Ministro Francisco Campos terá rápida passagem no comando do MESP, porém com significativa e marcante presença, ao contribuir para a elaboração da nova estrutura do modelo educacional brasileiro. Em 30 de abril de 1931, Vargas promulga, a pedido do Ministro Campos, o Decreto-Lei 19.441, que estabelece a reintrodução do ensino religioso nas escolas públicas. O novo governo, em menos de seis meses, satisfaz, assim, a tão esperada reinvindicação católica, impedida legalmente, desde 1891 de ministrar o ensino religioso nas escolas públicas. Horta (1994) detalha o processo pelo qual o decreto, antes de ser promulgado, passa pelo crivo da Igreja: “(...) por ordem de Dom Leme, o Padre Leonel Franca, Assistente Eclesiástico do Centro Dom Vital, consulta o Ministro da Educação sobre a oportunidade de uma ação imediata da Igreja neste sentido. A pedido do Ministro, o Padre Franca redige um projeto de decreto, que será aprovado por Dom Leme e entregue a Francisco Campos, em 15 de abril de 1931. O ministro da Educação introduzirá algumas modificações no projeto e encaminha-lo-á, três dias depois, acompanhado de uma exposição de motivos, a Getúlio Vargas” (p. 98). 2 Este fato se constitui no marco inicial de um novo governo, que rompe com anticlericalismo e estabelece um Estado, no qual a Igreja Católica passa ser aliada, reservando a ela o direito de novamente atuar em estabelecimentos educacionais públicos. Além da reintrodução do Ensino Religioso, Francisco Campos promove outras modificações no modelo educacional brasileiro. A promulgação do Decreto 19.851, de 11 de abril de 1931, o Estatuto das Universidades – Organização do Ensino Superior, que estabelece nova forma de estruturação das universidades, “(...) para que se funcionasse qualquer universidade no país, ‘a incorporação de pelo menos, três insititutos de ensino superior, entre os mesmos incluídos os de Direito, de Medicina e de Engenharia ou, ao invés de um deles, a Faculdade de Educação, Ciências e Letras” (Azevedo, 1976: p. 170). Uma semana depois, promulga-se a Reforma do Ensino Secundário, por meio do Decreto 19.890, de 18 de abril do mesmo ano, que segundo as considerações de Azevedo (1976) “(...) imprimiu ao ensino secundário a melhor organização que já teve entre nós, elevando-o de um simples ‘curso de passagem’ ou de instrumento de acesso aos cursos superiores a uma instituição de caráter eminentemente educativo” (pp.170-171). Este curso, a partir de agora, compunha-se de sete anos, sendo dividido em duas partes: uma de cinco anos, Curso Comum, e outra de dois anos, Curso Complementar, que diz respeito “a uma adaptação dos estudantes às futuras especializações profissionais” (Azevedo, 1976: p. 171). Horta (1994) registra que Francisco Campos, “no discurso de 1936 (...) apresenta o decreto do ensino religioso como uma verdadeira revolução no terreno da educação! Ao passo que as chamadas reformas educacionais significavam ‘apenas transformações no domínio da técnica, dos processos e dos métodos’” (p. 106). Isto significa recuperar os valores perdidos de Pátria, de Família e de Religião, sendo esta última a base dos dois primeiros. No período Campos, compreende-se que a Igreja Católica, ao alcançar a reintrodução do Ensino Religioso na Educação pública, fornece ao governo Vargas um instrumento fundamental para a divulgação dos ideais de autoritarismo e de nacionalismo, necessário para a implantação de um novo e governo forte. Horta (1994), afirma que, “No esquema político autoritário de Francisco Campos o ensino religioso era, ao mesmo tempo, um instrumento de formação moral da juventude, um mecanismo de cooptação moral da Igreja Católica e uma arma poderosa contra o liberalismo e no processo de inculcação dos valores que constituam a base de justificação ideológica do pensamento político autoritário” (p. 107). 3 Diante da nova aliança, entre Estado e Igreja, as demais forças sociais e políticas adequaram-se ao momento. As Forças Armadas, na figura do General Góes Monteiro, afirma que elas seriam as únicas instituições nacionais capazes de garantir a segurança e a ordem, porém “para cumprir estas funções,[as] Forças Armadas deverão ser fortes e disciplinadas, o que supõe um governo forte e um povo disciplinado” (Horta, 1994, p. 20). O governo forte estava em estado embrionário, reservando à educação a função de disciplinar o povo. Góes Monteiro, propõe a Criação do Conselho Superior de Defesa Nacional, como forma de garantir com mão firme a condução da ordem política-social no país, inclusive sobre a educação: “(...) [o] controle dos aprelhos ideológicos – imprensa e sistema educacional – para formação e difusão ‘de uma mentalidade nova e enérgica em torno do ideal nacional’, capaz de disciplinar as novas gerações e fazer desaparecer a luta de classes. Paralelamente, a intervenção do Estado na economia, de modo a impedir o colapso na produção e aumentar a riqueza” (Horta, 1994: p.25). A Educação torna-se, não só para a Igreja, com também na perspectiva dos militares, um instrumento ideológico útil para formação da mentalidade das massas, da consciência coletiva, disciplinado-as, condicionando-as, ao ponto de até mesmo conseguirem insensibilizá-las diante das lutas de classes. Por outro lado, o grupo dos liberais, que empenhava-se para participar do processo decisório, principalmente no âmbito da política educacional, buscava consubstanciar transformações qualitativas e quantitativas ao ensino público nacional, uma vez que muitos já estavam a frente das reformulações educacionais em vigor nos estados. Assim, depois da criação da Associação Brasileira dos Educadores, no final da década de 20, os educadores brasileiros reuniam-se em Conferências Nacionais, buscando contribuir para a melhoria da educação brasileira. No ano de 1931, foi realizada a IV Conferência Nacional de Educação, e conforme Ghiraldelli (1990) o encontro “serviu como um divisor de águas entre católicos e liberais” (: p. 42). O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, surgiu em seguida, como uma alternativa de divulgação dos ideais liberais sobre a educação. Causou controvérsias no meio intelectual, pois defendia claramente, a escola pública, obrigatória, laica e gratuíta, em confronto direto com o pensamento católico e com o novo governo, que buscavam distância dos ideais democráticos. 4 Verifica-se, deste modo, que tanto a Igreja Católica, como também o grupo dos liberais possuiam reivindicações distantes da grande massa populacional de mais de 75% de analfabetos. Os discursos da Igreja e dos liberais, somam-se ao discurso do Estado, que busca atuar como mediador dos conflitos, “entretanto nenhum grupo é satisfeito interiamente ou fica inteiramente satisfeito com o que o Estado estruturalmente lhes permite ou concede”(Cury, 1984: p.107), e acerca da educação popular, este autor ainda afirma, que “saiu-se pior a classe dominada. Estava longe o nascimento da ‘escola do povo’. A educação escolar continuou sendo agente das classes dominantes, e com o conflito de interesses na própria área dominante, a possibilidade desta escola mais distante ainda” (p. 189). A Igreja Católica, que demonstra habilidade ao promover concentrações populares para homenagear Nossa Senhora da Aparecida, criou em 1932, a Legião Eleitoral Católica (LEC), uma Instituição Suprapartidária Católica e “(...) poderoso instrumento de pressão que recomendava aos eleitores os candidatos de qualquer partido desde que se comprometessem com a defesa das’reivindicações’ católicas” (Arns, 1985: p.131), com vistas as eleições para a Constituinte em 1933. Estes instrumentos de mobilização popular abarcam um poder que interessa a Vargas, para a condução de seu governo. Essa relação de apoio mútuo, entre Estado e Igreja, não foi abalada mesmo com a nomeação para o MESP do professor Welington Pereira Pires4, em setembro de 1932, uma vez que desagradou os líderes católicos, todavia, ele permaneceu no cargo até o final do governo provisório. Contudo, o MESP, conforme afirma Dr. Salgado Filho, não muda sua proposta de promover a purificação “(...) do corpo e do espírito dos brasileiros” (Cury, 1984: p.107). O pacto entre Igreja e Estado, se consubstanciou, também, no processo das votações dos assuntos apreciados na Assembléia Constituinte, em grande parte favoráveis às reivindicações da Igreja Católica e do Estado. “(...) na votação da Assembléia, esses representantes dos Sindicatos votaram com os tenentes, e conseguiram aprovar um projeto para transformar a Assembléia Constituinte na primeira Câmara dos Deputados, com podêres para eleger o presidente da República (Skidmore, 1976: p.39), O governo de Vargas prossegue, a partir de agora, dentro de um governo contitucional. A vitória de Vargas, foi fruto das promessas tanto aos militares, quanto à Igreja Católica, de atender às suas reivindicações. Associa-se a idéia de Poder Nacional aos militares, com o controle por meio do Conselho Superior de Segurança Nacional, “o qual ao definir a política 5 de segurança, teria ‘competência para regular, pelo menos a política de educação” e à Igreja, o controle indireto do MESP. A nomeação de Gustavo Capanema para o MESP, empossado em 26 de julho de 1934, e permanecendo por onze anos no cargo, até 30 de outubro de 1945, segundo as observações de Schwartzman (2000), são “(...) evidências que sugerem que Capanema assumiu o Ministério da Educação e Saúde como parte do acordo geral que então se estabelecera entre a Igreja e o regime de Vargas, proposto anos antes por Francisco Campos. A parte visível deste acordo foi a aprovação, pela Assembléia Constituinte de 1934, das chamadas ‘emendas religiosas’” (p. 65). Outrossim, restabelecida a legalidade do ensino religioso nas escolas públicas, pela Carta Constitucional, mesmo que em caráter facultativo, sela-se o novo de mútua cooperação entre o Estado e a Igreja, que pode ser confirmado pelas palavras de Arns (1985), “(...) com a Constituição de 1934 firma-se um novo pacto de colaboração entre a Igreja e o Estado, enquanto as reivindicões católicas ‘- ensino religoso facultativo nas escolas públicas, assistência religiosa às Forças Armadas, legislação familiar pautada pelos princípios da Igreja, nome de Deus na Constituição, liberdade sindical – são todas atendidas” (p. 131). O princípio de colaboração entre Igreja e Estado, “(...) traduzia-se por um ‘pacto’ segundo o qual a Igreja recebia do governo, em nome da ‘justiça distribuitiva’ ajuda (principalmente econômica) para as obras e instituições por elas mantidas (escolas, orfanatos, hospitais, missões entre os índios, etc.) em troca, a Igreja oferecia ao governo sua colaboração, em nome da ‘justiça social’” (Horta, 1994, p. 114). Diante disto, no final de 1936, “o Estado percebe a importância da educação e sua dimensão política de inculcar a ideologia e prática educacionais que lhe convém, especialmente a de impor a concepção da naturalidade na divisão do trabalho para a paz social. E como a ‘elite’ é a única capaz de educar a ‘massa ignorante’, e como a ‘elite verdadeira’ ‘e a que perfila com as linhas diretrizes do autoritarismo, será a esta atribuída a missão de educar” (Cury, 1984: p.124). A educação, torna-se a cada momento, mais importante para estas instituições, não como propósito exclusivo de propiciar o aprendizado da leitura e da escrita, do ensino das primeiras letras, de alfabetizar “o rude”, como referência à fala de Vargas, mas com a finalidade ideológica de impor verdades e padrões, em nome da Pátria, da Família e da Igreja, para torná-lo cidadão útil ao Estado e a Igreja. Neste período, as pessoas consideradas “diferentes”, aos padrões estabelecidos pela elite política e religiosa, são perseguidos. Como exemplo, católicos e integralistas se unem contra Anísio Teixeira, acusando-o de simpatizante do comunismo, promovendo, em seguida, a sua destituição da função de Secretário-Geral da Educação e Cultura do Distrito Federal. 6 Anísio Teixeira, torna-se um elemento considerado perigoso para o governo e para a Igreja, e durante o período do Estado Novo, afasta-se do cenário político educacional. Nesse contexto, o Plano Nacional de Educação consubstancia-se na intercessão dos interesses do Estado e da Igreja, com o apoio do Exército, e tardiamente com “(...)os ventos soprados pelas idéias dos autores de 32, que advogavam uma certa modernização da sociedade capitalista e, conseqüentemente a disseminação do ensino gratuíto e obrigatório pela rede pública” (Ghiraldelli, 1990, p. 85). A Igreja Católica busca garantir que sejam contempladas na elaboração do Plano Nacional de Educação, as suas reivindicações de liberdade de ensino e da autonomia das escolas. Uma vez que, “a igreja católica, responsável pela quase totalidade das escolas privadas do país, via com receio a subordinação da educação ao Estado, propondo, em seu lugar, a total liberdade de ensino e a autonomia das Escolas“ (Schwartzman, 2000, p. 194). Para tanto, conta com duas figuras importantes no processo de redação final do Plano Nacional de Educação (que dos quatro membros incubidos de realizar a elaboração do mesmo, dois são defensores dos princípios católicos: Padre Leonel Franca e Alceu Amoroso Lima). No período do Estado Novo, o Ministro Capanema, busca seguir as orientações estabelecidas no Plano Nacional de Educação, apesar de não ter sido aprovado pelo legislativo. Constata-se que o Plano Nacional de Educação estabelece no primeiro capítulo, que a Educação Nacional é tarefa da família e dos poderes públicos, e apresenta como objetivo a formação do homem pleno para a vida social, para o aperfeiçoamento de suas faculdades morais, físicas e intelectuais. Verifica-se que os princípios católicos são norteadores desta definição. Outra análise que pode ser realizada, diz com respeito aos diversos níveis de ensino, que apresentavam expansão, porém destaca-se os níveis secudário, o feminino (Doméstico e Normal), o técnico profissional e o superior. Em princípio, o ensino primário “(...)com exceção da rede particular, nas mão de ordens religiosas,(...)estava em completo abandono na maioria dos Estados” (Ghiraldelli, 1990, p. 85), e o governo central não interviu, alegando o respeito dos Estados e Municípios para com o Ensino Primário. O Ensino Secundário foi reformulado com a preocupação de garantir a formação de “(...) uma nova elite para o país. Uma elite católica, masculina, de formação clássica e disciplina militar. A ela caberia a condução das massas e a ela estaria reservado o acesso ao ápice da pirâmide educacional” (Schwartzman, 2000, p. 218). E, mais tal ensino possuía “(...) um currículo extenso, com intenções de propiciar sólida cultura geral de base 7 humanística e, além disso, fornecer aos adolescentes um ensino patriótico e nacionalista” (Ghiraldelli, 1990, p. 86). Já o ensino profissionalizante foi instituido pela reforma do Ministro Capanema, que a princípio não atendeu de imediato o processo de industrialização, em razão de que “(...) as classes médias, que procuravam a escola pública, não estavam interessadas na profissionalização precoce. Alimentadas pelo desejo de ascenção social de modo individual, as classes médias se esforçavam por manter os filhos no ensino secundário, propedêutico ao ensino superior” (Ghiraldelli, 1990, p. 87). Nas considerações de Schwartzman (2000), a educação profissional “(...) continuou sendo uma educação para as classes baixas, e a regulamentação das profissões técnicas não foi conseguida” (pp. 267- 268). Segundo Capanema, o modelo educacional brasileiro “(...) deveria corresponder à divisão econômico-social do trabalho. A educação deveria servir ao desenvolvimento de habilidades e mentalidades de acordo com os diversos papéis atribuídos à diversas classes ou categorias sociais” (Schwartzman, 2000, pp.205). O ensino superior desenvolveu-se segundo o ideal de Capanema de “(...) centro de preparo técnico de aparelhamento de elite que vai dirigir a nação, resolveu-lhe os problemas, preservar-lhe a saúde, facilitar-lhe o desdobramento e a circulação de riquezas, fortalecer a mentalidade do povo, engrandecer sua civilização”(Schwartzman, 2000: p. 221). O modelo adotado de universidade nacional, foi a da Universidade do Brasil, implantada em 05 de julho de 1937, que surge na reestruturação da Universidade do Rio de Janeiro, que “(...) fora constituída em 1920 como uma reunião das escolas superiores da cidade, e em 1931 Francisco Campos, como primeiro Ministro da Educação de Vargas, havia baixado legislação minuciosa dando-lhe um caráter integrado, a partir de faculdade de educação, ciências e letras que, entretanto, aguendaria vários anos para ser criada” (Schwartzman, 2000: p. 222). A educação, no período de Capanema, foi estruturada nas Leis Orgânicas do Ensino, que “apresentaram-se como soluções às “questões que haviam caracterizado o debate educacional na década anterior, estabelecendo como que uma divisão de áreas de influência entre as instituições interessadas em aumentar o âmbito de sua ação educativa, Igreja, Exército e Estado” (Schwartzman, 2000: 216). 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Pela análise desses aspectos, verifica-se que as estreitas e profundas relações, entre Estado e a Igreja, com o apoio do Exército resultou na construção de um modelo educacional que reserva tipos específicos de ensino em correspondência às diversas classes sociais, que segundo Schwartzman (2000), serviu “ao desenvolvimento de habilidades e mentalidades de acordo com os diversos papéis atribuídos as diversas classes ou categorias socias” (p.205), em nome da Pátria, da Família e da Igreja. O Ensino Primário, reservado à camada popular, o Ensino Profissional, reservado ao sexo masculino da classe operária, com ressalva do Ensino Pedagógico e do Doméstico, destinados ao sexo feminino. O Ensino Secundário, que continuou propedêutico para o Ensino Superior, frequentado pelos segmentos médios, e o Ensino Superior, reservado ao sexo masculino dos setores dominantes. Conclui-se que, a educação brasileira, no período enfocado, recebeu atenção por parte do governo de Getúlio Vargas, no empenho de alicerçar um sistema educacional nacional formador do pensamento nacionalista, circunscrito ao modelo de moral e de valores religiosos, tão aspirados pela Igreja Católica. Verifica-se, ainda, diante do momento político e econômico que o país atravessava, a crescente demanda pela educação popular, que caracterizava-se por adequar-se as mudanças econômicas em andamento, deslocando o eixo agro-exportador-dependente para o eixo urbano-industrial. As ações governamentais foram direcionadas de modo a apresentar uma educação com matriz elitista, nacionalista, conservadora e católica, situação reforçada pelo dualismo educacional e corroborada pelas reformas dos Ministros Francisco Campos, no Plano Nacional de Educação e pelas Reformas promovidas por Gustavo Capanema, nas Leis Orgânicas do Ensino, com o propósito de estabelecer padrões, em nome da Pátria, da Família e da Igreja, para transfornar os indivíduos em cidadãos úteis aos princípios desejados pelo binômio Estado e à Igreja. NOTAS 1 Germano Jardim, Técnico do governo, apresentou estudo administrativo sobre a ações governamentais na eduacção, editado na publicação do IBGE e Educação, 1941. 2 O Ministério da Educação e Saúde Pública, criado pelo Decreto-Lei 19.402, de 14 de novembro de 1930. 3 A crise econômica de 1929, ocorreu a partir do desequilíbrio da economia dos EUA que, após a 1ª Guerra Mundial, continuava em alta produção, e o mercado consumidor interno e externo não absorveram esta produção. Provoca a queda da Bolsa de NY, que em reação em cadeia intervere na economia mundial. 4 Professor Welington Pereira Pires, Médico, formado na Faculdade de Medicina de Minas Gerais, conduz o MESP de 16/09/1932 à 23/07/1934 (Banco de Dados do Ministério da Educação e Desporto/ Julho de 2000. 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARNS, Paulo Evaristo. O QUE É IGREJA. São Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985. AZEVEDO, Fernado. A TRANSMISSÃO DA CULTURA. (Parte Terceira da 5ª edicação da Obra “A Cultura Brasileira”) São Paulo: Editora Melhoramentos, 1976. BRASIL. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA E A EDUCAÇÃO. “Elucidário apresentado na Primeira Conferência Nacional de Educação”. Rio de Janeiro: Setor Gráfico do IBGE, 1941. CURY, Carlos Roberto Jamil. IDEOLOGIA E EDUCAÇÃO: Católicos e Liberais. 2ed. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1984. FOLQUIÉ, Paul. A IGREJA E A EDUCAÇÃO: Com a Encíclica sobre a Educação. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1957. GHIRALDELLI Jr. Paulo. HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO. São Paulo: Cortez: Editora, 1991. HORTA, José Silvério Baía. O HINO, O SERMÃO E A ORDEM DO DIA: regime autoritário e a educação no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1994. SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria Bousquet, COSTA, Vanda Maria Ribeiro. TEMPOS DE CAPANEMA. São Paulo: Paz e Terra: FGV, 2000. SKIDMORE, Thomas E. BRASIL DE GETÚLIO VARGAS A CASTELO BRANCO (1930- 1964). 5ed. 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