RELATO DE CASO Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) em crianças: relato de três casos CASE REPORT Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) em crianças: relato de três casos(*) Fibrodysplasia ossificans progressive (FOP) in children: report of three cases Luciana Brandão Paim(1), Bernadete de Lourdes Liphaus(2), Lúcia Maria Mattei Arruda Campos(2), Chong Ae Kim(3), Maria Helena B. Kiss(4) e Clovis Artur Almeida da Silva(5) RESUMO ABSTRACT Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) é uma doença do tecido conectivo associada com ossificação endocondral, levando à imobilização permanente. Os autores descrevem as manifestações clínicas, alterações laboratoriais, achados radiológicos e terapêuticas utilizadas em três crianças com diagnóstico de FOP. O diagnóstico de FOP foi estabelecido quando o paciente apresentava malformações congênitas (hipoplasia de háluces e polegares e hálux valgus) associadas à ossificação de músculos estriados. Dois pacientes foram submetidos a biópsia cutânea e muscular. A idade do início da doença variou de 6 meses a 11 anos (mediana = 2 anos); dois pacientes eram do sexo feminino. Edema inicial ocorreu em todos os pacientes e precedeu as ossificações em todos os casos. Uma paciente evoluiu para imobilização permanente, após trauma (necessitando de cadeira de rodas). Não foram observadas alterações laboratoriais nos três pacientes. Um paciente apresentou doença pulmonar restritiva e dois casos evoluíram com litíase renal. As biópsias cutânea e muscular realizadas em dois casos mostraram fibromatose, e cursaram com ossificação no local da incisão cirúrgica. Apesar da terapêutica instituída (colchicina, EDTA, alendronato e/ou metotrexato), todos os pacientes evoluíram com novas ossificações. Edema pode ser uma manifestação inicial de FOP. O diagnóstico é clínico e radiológico, devendo-se evitar traumas e biópsias para prevenir novas ossificações. Nenhum medicamento foi eficaz nesses pacientes. Fibrodysplasia ossificans progressive (FOP) is a connective tissue disease associated with endochondral ossification leading to permanent disability. The authors describe clinical manifestations, laboratorial abnormalities, radiological findings and therapeutics used in three children with the diagnosis of FOP. The diagnosis of FOP was established when the patient presented congenital malformation (hypoplasia of hallux and thumbs and hallux valgus) and ossification of striated muscles. Two patients were submitted to cutaneous and muscle biopsies. The age at disease onset ranged from 6 months to 11 years old (median = 2 years); two patients were female. Initial edema occurred in all patients, and preceded the ossification in all of them. After trauma, one patient developed permanent immobility (making the use of a wheelchair necessary). Laboratorial abnormalities were not seen in all three patients. One patient presented restrictive lung disease and two presented urolithiases in evolution. The cutaneous and muscle biopsies showed fibromatosis in two cases, developing into ossification at the site of the surgical incision. Despite the therapeutics (colchicine, EDTA, alendronate and/or methotrexate), all patients developed further ossification. Edema can be an initial manifestation of FOP. The diagnosis is clinical and radiological, and any trauma and biopsies must be avoided in order to prevent new ossification. No drug was effective in these patients. Palavras-chave: Fibrodisplasia ossificante progressiva, miosite Keywords: fibrodysplasia ossificans progressiva (FOP), myositis ossificante progressiva, crianças, tratamento. ossificans progressiva, children, treatment. * Unidades de Reumatologia Pediátrica e Genética Clínica do Instituto da Criança, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICrHC-FMUSP). Recebido em 20/4/2002. Aprovado, após revisão, em 31/7/2002. 1. Médica complementanda da Unidade de Reumatologia Pediátrica do ICr-HC-FMUSP. 2. Mestre em medicina da FMUSP. Médico assistente da Unidade de Reumatologia Pediátrica do ICr-HC-FMUSP. 3. Doutora em medicina da FMUSP. Chefe da Unidade de Genética Clínica do ICr-HC-FMUSP. 4. Professora livre docente do HC-FMUSP. 5. Doutor em medicina da FMUSP. Chefe da Unidade de Reumatologia Pediátrica do ICr-HC-FMUSP. Endereço para correspondência: Clóvis Artur Almeida da Silva. R. Raul Pompéia, 303/43 Pompéia, CEP 05025-010, São Paulo, SP. Rev Bras Reumatol, v. 43, n. 2, p. 123-128, mar./abr., 2003 123 Paim et al. INTRODUÇÃO Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) é uma rara doença hereditária do tecido conectivo de herança autossômica dominante, na qual anormalidades esqueléticas estão associadas à ossificação endocondral progressiva da musculatura estriada, levando a imobilização permanente(1,2,3). O primeiro relato de FOP ocorreu em 1692, quando Gui Patin descreveu uma mulher que gradualmente ficou “dura como madeira”(1). Em 1868, Von Dush usou pela primeira vez a expressão miosite ossificante progressiva(2) e um ano após, Munchmeyer(3) fez sua clássica descrição, tornando essa patologia conhecida pelo nome deste autor. Atualmente, a nomenclatura preferencial utilizada é FOP, pois esta doença não acomete apenas o músculo, mas também qualquer tecido conjuntivo. Há descrição até o presente momento, de cerca de 700 casos na literatura(4). O objetivo deste trabalho foi descrever as manifestações clínicas, alterações laboratoriais, achados radiológicos e terapêuticas utilizadas em três crianças com diagnóstico de FOP. Esses pacientes foram diagnosticados e são acompanhados na Unidade de Reumatologia Pediátrica do Instituto da Criança, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICr-HC-FMUSP), no período de 1983 a 2002. RELATO DE CASOS Caso 1 Criança de 2 anos, sexo feminino, branca, apresentou edema inicial recorrente de face, não-inflamatório, com duração em cada episódio de uma semana a quinze dias (três episódios em três anos). Após três anos e oito meses apresentou edema e ossificação da escápula direita, sendo encaminhada à Reumatologia Pediátrica do ICr-HC-FMUSP (idade à admissão 5 anos e 8 meses). Ao exame físico inicial evidenciaram-se tumorações endurecidas em região escapular, ombro direito, regiões paravertebral cervical e lombar bilateralmente e coxa direita (no local da realização da biópsia); com limitação de coluna cervical. As malformações congênitas encontradas foram espinha bífida, hipoplasia de polegares e háluces, hálux valgus e clinodactilia das interfalangianas proximais do terceiro dedo de ambas as mãos. A história familiar evidenciou malformações congênitas de háluces em prima de terceiro grau. A investigação laboratorial inicial (hemograma, velocidade de hemossedimentação (VHS) e proteína C reativa 124 (PCR), função renal, transaminases, fosfatase alcalina, cálcio sérico e urinário, magnésio, proteínas totais e frações, dosagem sérica de paratormônio e teste de função pulmonar) foi normal. As biópsias cutânea e muscular, realizadas em outro serviço, evidenciaram fibromatose juvenil. As radiografias iniciais do esqueleto mostraram ossificações ectópicas em região paravertebral cervical e lombar, escápula e ombro direito. A tomografia computadorizada (TC) de coluna evidenciou massa paravertebral cervical entre C2 e C3 e dorsal à direita. A ressonância nuclear magnética (RNM) mostrou edema em partes moles entre planos musculares em transição cérvico-torácica. Apesar da terapêutica instituída (alendronato 10 mg/dia), a paciente evoluiu com edemas de couro cabeludo recorrentes, e após um ano e quatro meses apresentava novas ossificações (região frontal, coxa direita, joelhos, tornozelos e glúteo direito, este último, quatro semanas após a administração das vacinas tríplice e hepatite B). O tempo de seguimento foi de um ano e três meses. Atualmente apresenta classe funcional ²² do ACR. Caso 2 Criança de 9 anos, sexo masculino, pardo, sofreu trauma no joelho esquerdo, evoluindo com edemas recorrentes, claudicação e ossificação local após três anos. Sete meses após foi encaminhada a Reumatologia Pediátrica do ICr (idade à admissão 12 anos e 7 meses) com dor no membro inferior direito, região escapular e cervical, evoluindo para ossificações e limitações. As malformações congênitas encontradas neste caso foram hipoplasia dos polegares e háluces (Figura 1), hálux valgus e sindactilia completa dos pés (realizada cirurgia corretiva aos nove meses de idade). Ausência de história familiar de malformações esqueléticas. A investigação laboratorial inicial (hemograma, VHS, PCR, função renal, transaminases, fosfatase alcalina, cálcio sérico, magnésio, proteínas totais e frações, dosagem sérica de paratormônio e teste de função pulmonar) foi normal. A hipercalciúria inicial foi de 7,6 mg/kg/dia e a ultra-sonografia evidenciou litíase renal à direita. As radiografias iniciais do esqueleto mostraram ossificações ectópicas em membro inferior direito, região escapular e cervical e malformações de C3-C6-C7. Apesar da terapêutica instituída (naproxeno, prednisona, colchicina, ácido etilenodiaminotetracético – EDTA e metotrexato), o paciente evoluiu com novas ossificações (masséter, ombros, cotovelos, punho direito, paredes torácica e abdominal, coxofemorais e joelho esquerdo). O tempo de seguimento foi de quatro anos e três meses. Atualmente apresenta classe funcional ²²² do ACR, sem nefrocalcinose e com níveis normais de cálcio urinário. Rev Bras Reumatol, v. 43, n. 2, p. 123-128, mar./abr., 2003 Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) em crianças: relato de três casos FIGURA 1 – Paciente com hipoplasia bilateral dos háluces. Caso 3 Criança de 6 meses de idade, sexo feminino, branca apresentou edema inflamatório recorrente em couro cabeludo por um ano, seguido por ossificação do couro cabeludo e região cervical, quando foi admitida na Reumatologia Pediátrica do ICr com 1 ano e 6 meses. As malformações congênitas encontradas foram: hipoplasia de polegares e háluces, hálux valgus e clinodactilia das interfalangianas proximais das mãos. Ausência de história familiar de malformações esqueléticas. A investigação laboratorial inicial (hemograma, VHS, PCR, função renal, transaminases, cálcio sérico e urinário, magnésio, proteínas totais e frações, fosfatase alcalina, dosagem sérica de paratormônio e teste de função pulmonar) foi normal. As biópsias cutânea e muscular da região cervical evidenciaram fibromatose coli. Apesar da terapêutica instituída (prednisona, colchicina, EDTA e metotrexato), a paciente evoluiu com novas ossificações (fronte, articulação têmporo-mandibular, cotovelos, escápula, parede torácica, retos abdominais, psoas direito, coxas e joelhos). Aos 11 anos de idade apresentou hematúria persistente, hipercalciúria de 4,6 mg/kg/dia; a ultra-sonografia e a TC abdominais evidenciaram litíase renal à esquerda e ossificação ectópica do músculo psoas. Aos 12 anos de idade, o teste de função pulmonar mostrou doença pulmonar restritiva, e atualmente, com 15 anos de idade, apresenta imobilização permanente após queda, com ossificação dos quadris (necessitando de cadeira de rodas desde os doze anos de idade). A Figura 2 mostra trave óssea entre fêmur e fíbula esquerdos. Rev Bras Reumatol, v. 43, n. 2, p. 123-128, mar./abr., 2003 FIGURA 2 – Trave óssea entre fêmur e fíbula esquerdos. DISCUSSÃO Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) é uma doença rara do tecido mesodérmico, caracterizada por inflamação inicial, subseqüente proliferação de tecido fibroso e formação de tecido ósseo ectópico(5,6). Sua incidência é de um caso a cada dois milhões de habitantes(6). A doença pode se manifestar desde a gestação até a idade adulta(7). O início dos sintomas ocorre antes dos dois anos de idade em 43% dos casos. Em geral, a doença se manifesta até os cinco anos e, excepcionalmente, após os vinte anos de idade(8). Não há prevalência de sexo ou de raça(7,8,9,10). Nessa casuística, a menor idade ao diagnóstico foi de um ano e seis meses e o paciente com início mais tardio da doença foi um adolescente de doze anos e sete meses. Os achados histológicos clássicos demonstraram ossificação do tecido conjuntivo com degeneração musculoesquelética. A lesão inicial foi caracterizada por nódulos multifocais, compostos por células espiculadas semelhantes a 125 Paim et al. fibroblastos na matriz do tecido conectivo com espículas ósseas centrais e lesão tardia composta de osso lamelar maduro com tecido adiposo e hematopoético entremeados(5). Gannon et al.(11)observaram, nas biópsias musculares, um infiltrado linfocitário perivascular intenso anterior à ossificação endocondral. A lesão pré-óssea da FOP é histologicamente indistinguível da lesão proliferativa da fibromatose agressiva(12), como ocorreu nos casos 1 e 3 que apresentaram diagnósticos histológicos de fibromatose juvenil e fibromatose coli, respectivamente. Estudos genéticos confirmaram um caráter autossômico dominante com penetrância completa e expressão variável, porém a maioria dos pacientes apresenta mutação nova(13), como ocorreu nos dois casos do presente estudo. Apenas uma criança apresentou caso similar de malformação de háluces na família. Estudos evidenciaram maior expressão da proteína óssea morfogenética-4 (BMP-4) nos linfócitos dos pacientes com FOP(7) e nas lesões fibroproliferativas iniciais(14). O gene para proteína morfogenética-4 está localizado no cromossomo 14q22-q23(15). O tecido ósseo ectópico formado é semelhante ao normal, porém localiza-se em partes moles, principalmente no tecido conjuntivo da musculatura estriada, fáscias, ligamentos, cápsulas articulares, aponeuroses e tendões. As lesões iniciam-se na musculatura paravertebral e progridem para a cintura escapular, porção proximal dos braços, cintura pélvica, mandíbula e crânio. Há uma rigidez progressiva e difusa em virtude da ossificação extra-articular, como ocorreu em todos os casos do presente estudo. As musculaturas do diafragma, coração, língua, esfíncteres, extra-oculares e viscerais são geralmente poupadas(5,7). Em geral, na terceira década, o paciente encontra-se totalmente restrito ao leito. O processo de ossificação pode se intensificar na presença de traumas, cirurgias, queimaduras ou punções venosas. O caso 2 apresentou trauma associado ao início da doença e o caso 3 apresentou imobilização definitiva (necessitando de cadeira de rodas) após trauma de quadril, como descrito por Glaser et al.(16). A progressão da lesão parece seguir, geralmente, um curso típico. Durante as primeiras semanas, a lesão inicial pode ser inflamatória com dor, eritema, edema e calor. Na fase intermediária o edema regride e, tardiamente, desaparece por completo, permanecendo uma lesão endurecida(17). O edema de membros, como ocorreu em todos os pacientes desse estudo, é uma alteração comum explicada pela intensa angiogênese encontrada na lesão precoce da FOP. O edema pode durar de nove a doze semanas após o episódio agudo da lesão, regredindo quando o tecido fibrocarti126 laginoso transforma-se em osso. Raramente o edema é crônico, com duração acima de seis meses(18). Em todos os casos foi evidenciado edema recorrente, um a três anos antes do aparecimento das lesões ossificadas. As malformações congênitas simétricas de mãos e pés ocorrem em até 90% dos casos, sendo consideradas essenciais para o diagnóstico. As anormalidades congênitas mais freqüentes são: hipoplasia de polegares e háluces, hálux valgus; sendo estes em razão do encurtamento da primeira falange, como observado nos três pacientes do estudo em questão. Outras alterações descritas são: clinodactilia dos dedos (como nos casos 1 e 3); sindactilia (caso 2), microdactilia, adactilia e anquilose das articulações interfalangianas e metatarsofalangianas. Anormalidades adicionais incluem adelgaçamento da cortical na porção medial e proximal da tíbia, estreitamento do canal medular lombar, diminuição do ângulo epicôndilo-umeral, encurtamento e alargamento da cabeça femoral(19), hipoplasia do corpo vertebral, dos discos intervertebrais e pedículos, alargamento dos processos espinhosos das vértebras, fusão dos corpos vertebrais cervicais e espinha bífida, esta última evidenciada no caso 1(5,20,21). Na FOP não há alterações específicas laboratoriais. As provas de fase aguda são normais, assim como o metabolismo do cálcio, fósforo e paratormônio. Na presente casuística, dois pacientes apresentaram urolitíase associada à hipercalciúria (cálcio urinário acima de 4 mg/kg/dia), sugerindo cálculos de oxalato de cálcio. Houve regressão desse no caso 2 e manutenção do cálculo e hematúria microscópica no caso 3. Associação de litíase renal e FOP não foi encontrada na literatura. A radiografia de esqueleto é o exame preferencial para o diagnóstico e acompanhamento, evidenciando o surgimento de novas ossificações. As ossificações ectópicas na musculatura progridem para grandes traves e pontes ósseas em partes moles(10). A tomografia computadorizada evidencia lesões precoces de partes moles e lesões ósseas evolutivas, com radioluscência central circundada pela densidade periférica. Ressonância nuclear magnética, ultra-sonografia e cintilografia podem também auxiliar no diagnóstico(10,13,22). O diagnóstico diferencial da FOP inclui calcinose universalis da dermatomiosite juvenil, osteossarcoma e hiperparatireoidismo. Alguns autores recomendam a realização da biópsia, em todos os casos com FOP, para afastar a possibilidade de tumores, particularmente osteossarcoma(5,23). A osteodistrofia hereditária de Albright(24) e a heteroplasia óssea progressiva ou osteomatose displásica cutânea podem também evidenciar ossificações semelhantes à FOP; porém diferenciadas por apresentar braquidactilia, encurtamento Rev Bras Reumatol, v. 43, n. 2, p. 123-128, mar./abr., 2003 Fibrodisplasia ossificante progressiva (FOP) em crianças: relato de três casos dos metacarpos e face arredondada na primeira doença e ossificações progressivas da pele e tecido celular subcutâneo, exantema recorrente com ausência de malformações congênitas na segunda doença(5,10). A FOP é uma doença crônica com evolução variável. O curso da doença é caracterizado por períodos de remissões e exacerbações, já que as áreas ossificadas tendem a permanecer estáveis(9). As limitações e deformidades evolutivas mais freqüentes são: subluxação atlanto-axial, escoliose, cifose, torcicolos, limitação da abertura da boca por restrição do esternocleidomastóideo e da musculatura próxima da articulação têmporo-mandibular (semelhante ao caso 3), perda da acuidade auditiva por calcificações e fusões de ligamentos, tendões e ossos do ouvido médio(19). Algumas orientações profiláticas para novas ossificações são importantes nos pacientes com FOP. As biópsias musculares, cirurgias, injeções intramusculares e endovenosas devem ser evitadas pelo risco de novas ossificações ectópicas, como ocorreu no local da incisão da biópsia muscular, nos casos 1 e 3(25). As vacinas intramusculares devem ser, preferencialmente, aplicadas por via subcutânea(25). Os tratamentos dentários devem ser cautelosos, evitando-se anestesias, principalmente mandibular, para prevenir anquilose das articulações têmporo-mandibulares(6). A atividade física mais adequada ao paciente com FOP é a natação, mesmo com algumas limitações(26). A fisioterapia motora traz grandes benefícios ao fortalecer a musculatura não envolvida e a musculatura respiratória, melhorando, assim, a capacidade respiratória desses pacientes(8,9), uma vez que as principais causas de óbito são: insuficiência respiratória e pneumonia pela restrição da expansibilidade torácica(13). Até o presente momento, não há terapêuticas efetivas para impedir a progressão da doença. Várias drogas são sugeridas no tratamento da FOP como: quelantes do cálcio (EDTA), extratos de paratireóide(27), vitamina D(28), ácido ascórbico(26,29), ácido retinóico(30), warfarin, citrato de potássio(9) e bisfosfonatos(1,32). Os corticosteróides podem ser úteis no processo inflamatório agudo, na fase inicial da doença, mas não impedem a calcificação ectópica, e foram utilizados em dois pacientes, deste estudo, na fase aguda (edema doloroso). Portanto, o uso crônico desses medicamentos devem ser evitados em virtude de seus efeitos colaterais, como a osteoporose(13,31). Alguns autores têm demonstrado que o uso dos bisfosfonatos, por via oral ou endovenosa(31,32,33), associado ao ácido ascórbico(26,29) parece ser uma alternativa terapêutica para diminuir as calcificações ectópicas a longo prazo. Na presente casuística, apesar das terapêuticas instituídas (prednisona, colchicina, EDTA, alendronato e/ou metotrexato), todos os pacientes evoluíram com novas ossificações. A paciente do caso 1 foi a única tratada com alendronato (10 mg/dia) e, um ano após o início da terapêutica, evoluiu com novas ossificações ectópicas. A FOP é uma doença rara, deformante e progressiva. O edema de partes moles pode ser a manifestação inicial. O diagnóstico é clínico e radiológico, e deve-se evitar traumas e biópsias para prevenir novas ossificações. A litíase renal pode estar presente evolutivamente. Nenhuma terapêutica medicamentosa foi eficaz nesses três pacientes. REFERÊNCIAS 7. 1. 2. 3. 4. 5. 6. Lutwak L: Myositis ossificans progressiva. Mineral, metabolic and radioactive calcium studies of the effects of hormones. Am J Med 37: 269-293, 1964. Smith DM, Russel RGG, Woods CG: Myositis ossificans progressiva. Clinical features of eight patients and their response to treatment. J Bone Joint Surg 58: 48-57, 1976. Illingworth RS: Myositis ossificans progressiva (Munchmeyer’s disease). Brief review with report of two cases treated with corticosteroids and observed for 16 years. Arch Dis Child 46: 264-268, 1971. Baysal T, Elmali N, Kutlu R, et al: The stone man: Myositis ossificans progressiva. Eur Radiol 8: 470-481, 1998. Resnick D, Niwayama G: Soft tissues. 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