Fascículo II – A importância da sedação na UTI

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Curso de Reciclagem
Sedação em Terapia
Intensiva
Fascículo II – A importância
da sedação em UTI
A Importância da Sedação em Terapia Intensiva
Este trabalho pôde ser desenvolvido devido à experiência dos autores em suas áreas de atuação, pesquisa e aplicação de
conhecimento nas Unidades de Tratamento Intensivo Neurológicas (UTIN), no Hospital da Beneficência Portuguesa de
São Paulo.
A Equipe responsável pelo gerenciamento das Unidades é composta pelos seguintes médicos: Dr. Cassio Morano Peluso,
Dr. Israel Ferreira da Silva, Dr. Luís Vicente Forte e Dr. Salomon Ordinola Rojas.
O presente trabalho foi elaborado pelos seguintes membros da Equipe:
Autor: Dr. Israel Ferreira da Silva
Diretor do Instituto de Tratamento Neurológico e Terapia Intensiva — INETI.
Diretor do Serviço de Anestesiologia do Hospital do Servidor Público Estadual do Estado de São Paulo (HSPE).
Presidente da Comissão de Residência Médica e Graduação do HSPE.
Anestesiologista da Equipe do Prof. Dr. Sergio Almeida de Oliveira no Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo
e no Hospital Sírio-Libanês.
Co-autor: Dr. Luís Vicente Forte
Diretor do Instituto de Tratamento Neurológico e Terapia Intensiva — INETI.
Neurocirurgião da Equipe do Prof. Dr. Roberto Godoy no Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Produzido por:
© 2001 AP Americana de Publicações Ltda.
Av. Eng. Luís Carlos Berrini, 936, 11o andar, Brooklin Novo – CEP 04571-000 – São Paulo – SP – Brasil
Tel./Fax: 5501-5999
e-mail: [email protected]
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial
sem autorização prévia por escrito dos editores.
3
Índice
I - Introdução .......................................................................................................................................3
II - Farmacocinética ............................................................................................................................4
III - Farmacodinâmica ........................................................................................................................8
IV - Interações medicamentosas .......................................................................................................8
V - O agente ideal ............................................................................................................................. 12
VI - Farmacologia ............................................................................................................................ 12
I — Introdução
O
emprego dos agentes farmacológicos na prática clínica é precedido por uma seqüência de estudos voltados para a avaliação da segurança, ação e reais benefícios que estes devem promover
aos pacientes.
Claude Bernard, há mais de um século, foi o precursor dos critérios para reunir informações na
medicina experimental.
O crescente avanço da medicina levou a uma drástica mudança conceitual no desenvolvimento de
novos fármacos, principalmente nas três últimas décadas.
Smith (1978), Kaitlin et al. (1987) e Young et al. (1988) listaram as fases de propagação das drogas nos
Estados Unidos que antecedem o emprego na prática clínica:
1. Avaliação pré-clínica – duração de um a cinco anos (estudos in vitro e testes em animais). Análise
a curto e a longo prazo (toxicidade crônica, reprodução, teratogenicidade e carcinogenicidade).
2. Avaliação clínica – duração de dois a dez anos:
• Fase 1 – Voluntários normais e populações especiais. Análise de segurança e efeitos biológicos, metabolismo, cinética e interações medicamentosas. Essa etapa é realizada por farmacologistas clínicos.
• Fase 2 – Pacientes selecionados. Comprovação da eficácia terapêutica, variação da dosagem, cinética
e metabolismo. Essa etapa é desenvolvida por farmacologistas e pesquisadores clínicos.
• Fase 3 – Grande amostra de pacientes selecionados. Comprovação da eficácia e da segurança. Essa
etapa é desenvolvida por pesquisadores clínicos.
3. Após a fase anterior é feita a apresentação da new drug aplication (NDA), seguida da revisão, que
4
dura de dois meses a sete anos. A aprovação da
NDA precede o lançamento e a vigilância do produto, seguindo-se a última etapa, ou fase 4.
4. Fase 4 – Pacientes que recebem o fármaco
para terapia. Vigilância das reações adversas, padrões de utilização farmacológica e indicações adicionais descobertas. Essa etapa é desenvolvida por
todos os médicos.
Em média, dez anos de estudos separam o início
da pesquisa em laboratório do emprego clínico de
cada agente. Neste período, serão determinadas as
ações, indicações, contra-indicações, efeitos
colaterais e possíveis interações medicamentosas.
O conhecimento reunido durante as fases de
estudos aumenta a segurança para o emprego do
agente, embora novas informações possam ser
verificadas posteriormente.
A administração de um fármaco deve ser
norteada pelo princípio básico da individualização
da terapia medicamentosa, considerando-se que vários fatores podem interferir na ação, desde a prescrição até a obtenção do efeito desejado.
Os fatores que determinam a relação entre a
dose prescrita do fármaco e o seu efeito (Koch
Weser, 1972) são:
Dose prescrita: obediência do paciente e possíveis erros de medicação.
Dose administrada: velocidade e grau de absorção, composição e tamanho corporal, distribuição nos líquidos corporais, ligação no
plasma e nos tecidos e taxa de eliminação.
Concentração no local de ação: variáveis fisiológicas, fatores patológicos, fatores genéticos,
interação com outros fármacos e desenvolvimento de tolerância.
Intensidade do efeito: interação fármaco-receptor, estado funcional e efeito placebo.
II – FARMACOCINÉTICA
Farmacocinética é o conjunto dos comemorativos que envolvem o processo de absorção, distribuição e eliminação dos fármacos. É necessário que o
agente esteja presente nos sítios de ação, em concen-
trações adequadas, para se obter o efeito desejado.
O efeito final está estreitamente relacionado à
massa do respectivo agente nos locais de ação, porém outras variáveis podem interferir, como grau
e taxa de absorção, distribuição, ligação protéica
ou localização dos tecidos, biotransformação e
excreção.
II.1 – Bioequivalência
Tem-se discutido amplamente esse conceito,
conhecendo-se a ampla campanha do Ministério da
Saúde, em relação aos medicamentos genéricos.
Do ponto de vista conceitual, são considerados
medicamentos equivalentes aqueles que contêm os
mesmos princípios ativos e são idênticos em concentração, potência, dose e via de administração.
Dois agentes são considerados bioequivalentes
quando os índices e as quantidades de biodisponibilidade da substância ativa são semelhantes em
condições adequadas de teste.
Atualmente, os testes de biodisponibilidade não
são realizados rotineiramente, devido ao elevado
custo e à dificuldade de realização. A simples análise físico-química dos agentes não é suficiente para
garantir sua disponibilidade nos locais de ação.
Tendo em vista essa realidade, deve-se levar em
conta a escolha adequada dos agentes empregados
em sedação e analgesia, no tocante aos reais benefícios que deverão propiciar aos pacientes.
II.2 – Absorção
As vias de administração constituem um importante fator para variações nos efeitos, devido às
diferentes taxas de absorção. Algumas características merecem destaque:
• Via intravenosa – evita a absorção, seus efeitos
são imediatos, permite o ajuste da posologia e
é adequada à administração de grandes volumes.
Tem maior risco de efeitos adversos, sendo imprópria para soluções oleosas ou insolúveis.
• Via subcutânea – a absorção pode ser imediata
(preparados em solução aquosa) ou lenta e
5
Quadro 1. Principais grupos de agentes
utilizados em sedação e analgesia
1.
•
•
•
Sedativos e hipnóticos
Alquilfenol – Propofol
Barbitúricos
Benzodiazepínicos
2. Analgésicos
• Antiinflamatórios não-esteróides (AINES)
• Opióides
•
•
•
3. Antipsicóticos e neurolépticos
4. Relaxantes neuromusculares
5.
•
•
•
Anestésicos
Locais
Endovenosos
Inalatórios
•
•
•
•
mantida (preparados de depósito). Absorvem-se
algumas suspensões insolúveis, mas a via é inadequada para grandes volumes e pode haver dor
ou necrose local devido a substâncias irritativas.
Via intramuscular – a absorção pode ser imediata (preparados em solução aquosa) ou lenta
(preparados de depósito). É adequada para volumes moderados, veículos oleosos e algumas
substâncias irritativas. Não deve ser utilizada
durante a anticoagulação e pode alterar o resultado de alguns exames.
Via oral – a absorção é bastante variável, oferece maior facilidade e segurança, mas requer a
colaboração do paciente. Há menor absorção
das drogas pouco solúveis (diazepam), instáveis
ou metabolizadas rapidamente pelo fígado. Estão disponibilizadas várias preparações de liberação controlada que proporcionam menor
irritação da mucosa gástrica, absorção mais lenta no sistema gastrointestinal, menor incidência de “picos” e maior intervalo entre as doses.
Via sublingual – a absorção é rápida para algumas substâncias (nitroglicerina, midazolam) e
•
•
evita o fenômeno de primeira passagem no
fígado, que pode neutralizar até 100% de uma
substância ingerida por via oral (ex. nitroglicerina).
Via retal – a absorção é irregular, 50% é metabolizado no fígado e ocorre freqüente irritação
do reto.
Via transdérmica – a absorção é lenta e contínua, necessita de preparações específicas
(fentanil transdérmico, EMLA, nitroglicerina).
Via intra-arterial – geralmente é empregada
quando não se deseja que o fármaco tenha a
primeira passagem pelo pulmão (protamina),
evitando-se reações alérgicas, ou quando existe
falência circulatória franca (epinefrina na raiz
da aorta). É sempre conveniente ressaltar que
injeções acidentais podem ocorrer e que algumas talvez tenham conseqüências catastróficas
(barbitúricos, levando à dor lancinante e à necrose do membro).
Via intratecal – tem absorção variável, dependendo do agente e do seu perfil lipofílico ou
hidrofílico. A descoberta de receptores opióides
na medula espinhal permitiu o uso dessa via
para o tratamento da dor aguda e crônica. Através de um cateter, preferencialmente epidural,
é realizada a infusão contínua dos opióides. A
difusão para os receptores no corno posterior
da medula produz o efeito analgésico desejado.
O emprego da via intratecal para a administração de outros agentes, como antibióticos e
corticóides, é matéria controversa e ainda necessita de mais estudos.
Via intraperitoneal – embora o peritônio apresente uma grande superfície de trocas, o fato
de a absorção ser rápida e inicialmente ocorrer
através da veia porta leva a uma perda substancial devido ao efeito de primeira passagem pelo
fígado. Essa via é bastante empregada em laboratório, mas, devido aos riscos de infecção e aderências, tem pouca aplicação clínica em seres
humanos. Deve-se ressaltar a importância dessa
via em programas de diálise.
Via pulmonar – os fármacos gasosos e voláteis
6
administrados por essa via são rapidamente absorvidos e disponíveis na circulação, devido à
grande superfície de troca das mucosas do trato respiratório e do epitélio pulmonar. O emprego de aerossóis para tratamento de broncospasmo constitui o principal grupo de agentes utilizados por essa via, ressaltando-se a boa
absorção que outras drogas encontram (p. ex.,
epinefrina, lidocaína, atropina e naloxona).
Nos pacientes em pós-operatório que foram submetidos à anestesia geral com agentes halogenados,
é importante o conhecimento do perfil do agente
empregado, quanto a sua hepatotoxicidade,
biotransformação e eliminação. A eliminação do
agente por essa via é equivalente à dose administrada na cirurgia e ao biotipo do paciente (os halogenados são armazenados em tecidos ricos em gordura e depois liberados em ordem inversa). É bom lembrar que a equipe estará sujeita aos mesmos efeitos
tóxicos e/ou teratogênicos dos halogenados no período de recuperação pós-anestésica.
• Via tópica – as mucosas podem ser empregadas
com objetivos terapêuticos devido à absorção
rápida de soluções aquosas por via nasal (p. ex.,
DDAVP e midazolam).
As principais vias de administração parenteral
dos sedativos e analgésicos, em UTIs, são: intravenosa, intramuscular e subcutânea. Todos os
fármacos administrados por via parenteral estão sujeitos à eliminação de primeira passagem nos pulmões. Os relaxantes neuromusculares são utilizados exclusivamente por via venosa. Ressaltamos a
possibilidade do emprego da succinilcolina, por via
muscular, para facilitar a intubação traqueal em situações de emergência, quando não se dispõe de
um acesso venoso.
II.3 – Dis tribuição
Alguns compartimentos orgânicos podem servir como reservatórios de drogas.
A quantidade armazenada em cada compartimento pode variar, e o tempo necessário para atingir o ponto de equilíbrio determinará a dose de
ataque, de manutenção e a velocidade de infusão
de um agente. Esses fatos determinam diferentes
características quanto ao equilíbrio das concentrações das drogas.
São conhecidos vários reservatórios de medicamentos no corpo humano, destacando-se:
• Proteínas plasmáticas – a alta ligação protéica é
uma característica de muitos agentes empregados em sedação e analgesia, destacando-se como
exemplo os opióides. Os agentes ácidos se ligam, preferencialmente, à albumina, e os básicos às glicoproteínas ácidas alfa1. Essas ligações,
entretanto, são reversíveis, e a ação do fármaco
está na dependência da fração livre no plasma.
Essas características nos obrigam a rever as dosagens de todos os agentes nos pacientes desnutridos e hipoalbuminêmicos. A albumina representa
cerca de 0,4% do peso corporal.
• Reservatórios celulares – alguns agentes acumulam-se nos músculos ou em outras células orgânicas. Por exemplo, no tratamento da malária,
grandes quantidades de cloroquina podem se
acumular no fígado (milhares de vezes da concentração plasmática).
• Tecido adiposo – os agentes anestésicos
halogenados e os barbitúricos, por serem
lipossolúveis, acumulam-se nas gorduras. Podemos encontrar 70% do tiopental nos tecidos
gordurosos algumas horas após uma única dose.
Considerando-se que a gordura pode representar até 50% da massa corpórea no indivíduo obeso
e 10% no indivíduo desnutrido, esse tecido pode
se comportar como um importante depósito para
as substâncias lipossolúveis. No entanto, a extração dos fármacos desse tecido é lenta devido ao
baixo fluxo sanguíneo local.
• Tecido ósseo – não é um reservatório importante, ressaltando-se o tropismo do antibiótico
tetraciclina e outros agentes quelantes de íons
metálicos divalentes, assim como o acúmulo de
metais pesados como o chumbo e o rádio.
• Reservatórios transcelulares – o principal sítio
é o trato gastrointestinal. As bases fracas provenientes do sangue concentram-se no estôma-
Extra-Renal (99)
Hepática
0,9 (±0,2)
Lanexat® (IV)
3-5 min
1 min
Antagonista
Flumazenil
Variável
50
Renal
Renal
Renal (70)
Renal
Renal (70)
Biliar (30)
Hepática
Hepática
Hepática
Hepática
Hepática
12
7 - 13
30 - 56
10 - 20
1,3 - 2,5
1-4h
15 min
3 - 4 min
90 min
3 - 5 min
30 min
5 min
2 min
30 min
1 min
12 h
20 - 80 h
15 min
8h
15 - 80 min
70
95 - 98
98,5 - 99
78
93 - 97
Renal
Hepática
7 - 12
1 min
½ min
Barbitúricos
Tiopental
Tionembutal®
Benzodiazepínicos
Bromazepam
Lexotan® (VO)
Clordiazepóxido
Psicosedin® (VO)
Diazepam
Dienpax® (IV)
Flunitrazepam
Rohypnol® (VO)
Midazolam
Dormonid® (IV)
5 - 15 min
80 - 89
Renal (98)
Fecal (2)
Hepática
1-3
1 min
½ min
Diprivan®
3 - 8 min
97
Excreção (%)
Metabolização
Ligação
protéica (%)
Meia-vida
(horas)
Duração
Pico
Início
Nome
comercial
Nome
farmacológico
Alquilfenol
Propofol
Quadro 2. Farmacocinética dos hipnóticos e sedativos mais utilizados em UTI
7
go. Devido à grande diferença do pH, essas drogas são absorvidas lentamente, conferindo intensa capacidade de depósito.
Outros líquidos, como a linfa, o humor aquoso, o líquido cefalorraquidiano e líquidos articulares, não são importantes como reservatórios de drogas.
II.4 – Transferência placentária
O conhecimento dessa característica é de extrema relevância devido à possibilidade dos efeitos
teratogênicos no primeiro trimestre de gravidez e
às reações que certos agentes podem produzir no
feto durante o trabalho de parto e os efeitos residuais após o nascimento.
De maneira geral, as drogas atravessam a placenta por difusão simples. A lipossolubilidade e a
não-ionização são fatores que predispõem a passagem dos agentes para a circulação fetal, a partir da
circulação materna.
II.5 – Biotransformação
De modo geral, os fármacos com propriedades
lipofílicas têm mais dificuldade de ser metabolizados e eliminados do que os hidrofílicos. A
metabolização dos agentes, normalmente, produz
compostos inativos. Existem exceções, como por
exemplo a normeperidina, que é metabólito ativo
da meperidina.
O sistema microssomal hepático é o sítio mais
importante de metabolização dos agentes. As principais reações de biotransformações dos agentes são
a oxidação, a hidrólise e a conjugação.
O principal catalisador das reações de biotransformação é o citocromo P450. Para a realização
das reações oxidativas, o sistema necessita do
citocromo P450, do NADPH citocromo, do P450
redutase, do NADPH e do oxigênio molecular.
Existem outros órgãos que têm capacidade de
biotransformação, porém em menor intensidade,
tais como pulmões, rins, sistema gastrointestinal e
pele.
8
II.6 – Excreção
III – FARMACODINÂMICA
O principal órgão de eliminação do corpo humano é o rim. Os agentes podem ser eliminados
inalterados ou metabolizados. Os compostos polarizados são eliminados com maior eficiência
quando em sua forma lipofílica.
A excreção renal depende, fundamentalmente,
de três etapas, que são filtração glomerular, secreção tubular ativa e reabsorção tubular passiva.
Uma quantidade expressiva de metabólitos formados no fígado é excretada no trato gastrointestinal
por meio da bile, mas a maioria é reabsorvida no
sangue e posteriormente excretada pelos rins.
A excreção através do suor, da saliva, das lágrimas, do cabelo e da pele não tem importância significativa. Pode-se destacar a aplicação forense na
detecção de algumas substâncias, como por exemplo arsênico e mercúrio nos cabelos.
Considerando-se as inúmeras variáveis fisiológicas que podem interferir na posologia dos agentes, os seguintes parâmetros merecem destaque:
meia-vida plasmática (t1/2 α), depuração, volume
de distribuição e biodisponibilidade.
Esse conceito envolve a relação dos efeitos
bioquímicos e fisiológicos dos agentes com seus
mecanismos de ação.
Os mecanismos de ação das drogas e a relação
entre sua concentração e seu efeito dependem de
um grande número de receptores, específicos ou
não, de mensageiros biológicos e dos efeitos agonista
e antagonista.
O conhecimento do perfil de cada droga e de
seus locais de ação é importante aliado para o bom
resultado terapêutico. Dessa forma, o emprego de
um agente agonista fraco, como por exemplo a
nalbufina, pode antagonizar um efeito exacerbado
de um opióide mais potente (depressão respiratória ou prurido) sem que haja a neutralização completa de seus efeitos desejáveis (analgesia).
A ação seletiva dos benzodiazepínicos, em receptores gabaérgicos no sistema límbico, confere
os efeitos específicos de ansiólise e amnésia desses
agentes.
II.7 – Meia-vida plasmática
Outro tópico de importância no estudo da terapêutica é a ocorrência de possíveis interações
medicamentosas entre dois ou mais agentes.
O conhecimento da farmacocinética e da farmacodinâmica dos agentes empregados não é suficiente para evitar possíveis interações, mas pode
prevenir reações catastróficas.
Cientes dessa problemática, alguns centros já
mantêm disponíveis arquivos acoplados aos programas de prescrição, onde estão listadas possíveis interações medicamentosas e opções terapêuticas para
cada situação.
A Divisão de Farmacologia Clínica da Universidade de Stanford utiliza um grande banco de dados (Drug Interaction Facts) que está disponível para
hospitais. O sistema MEDIPHOR de Stanford
passa por atualizações freqüentes e contém mais
de 5 mil itens cadastrados.
Sabemos que a maioria dos hospitais não dis-
É o tempo necessário para que a concentração
plasmática do agente diminua 50%.
II.8 – Depuração
É a medida da capacidade do organismo para
eliminar o agente.
II.9 – Volume de dis tribuição
É a medida do espaço disponível no organismo
para conter a droga.
II.10 – Biodisponibilidade
É o percentual do fármaco absorvido inalterado
e disponibilizado para a circulação sistêmica.
IV – INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
Renal
Hepática
20 - 25
2-3
2-4
½-1h
10 - 15
Acetaminofeno (VO)
Aminofenol
Renal
Hepática
99
2
1-2
1-2h
Cetoprofeno (IV)
Ácido propiônico
5
Renal/Biliar
Hepática
99
1-2
1-3
20 min
Diclofenaco (IM)
Fenilacéticos
5
Renal
Hepática
20 - 25
2-5
4-6
3-5
Dipirona (IV)
Pirazolônicos
Renal/Biliar
Hepática
99
42 - 98
> 12
15 min
5
Tenoxicam (IV)
Benzotiazínicos
Intestinal
Hepática/
49
0,22 - 0,28
< 30
AAS (VO)
Ácido acetilsalicílico
farmacológico
farmacológico
(min)
2h
3-4
protéica (%)
(horas)
(horas)
Ligação
Meia-vida
Duração
Pico
Início
Nome
Grupo
Quadro 3. Farmacocinética dos AINE mais utilizados em UTI
Metabolização
Renal
Excreção
9
põe de programas de ajuda tão elaborados, motivo
pelo qual são necessários a observação cuidadosa e
o seguimento criterioso quando as prescrições envolvem sedativos, analgésicos, relaxantes neuromusculares, antibióticos, betabloqueadores e outros agentes.
Os princípios gerais devem estar norteados no
conhecimento de farmacologia clínica, na história
pregressa cuidadosa, na busca de possíveis reações
adversas, valorizando todas as informações disponíveis e restringindo ao mínimo necessário o número de fármacos na prescrição.
De acordo com De Smith, o índice de reações
tem uma relação direta com o número de fármacos
administrados. Esta ocorrência seria de 4,2% para
até cinco drogas administradas, saltando para 45%
quando o total de agentes administrados ultrapassa 21 itens.
Devido ao crescente avanço tecnológico e à
complexidade de patologias que são atendidas
atualmente em UTIs, é previsível que existam
muitas interações evitáveis e outras absolutamente
imprevisíveis.
Didaticamente, podemos dividir as interações
medicamentosas dos sedativos, analgésicos e
relaxantes neuromusculares em físico-químicas,
farmacocinéticas e farmacodinâmicas.
As interações físico-químicas são decorrentes
de armazenamento ou preparo inadequado ou da
associação com outros agentes quimicamente incompatíveis.
Algumas dessas incompatibilidades são relacionadas a seguir:
• Tiopental + cetamina = inativação do sal resultante.
• Tiopental + succinilcolina = inativação por
hidrólise.
• Propofol + ringer lactato = quimicamente incompatíveis.
• Diazepam + furosemida = quimicamente incompatíveis.
As interações farmacocinéticas ocorrem desde
a administração até a chegada ao local de ação. Durante esse trajeto, os agentes podem sofrer modifi-
10
cações que alterarão o efeito final pretendido.
Essas modificações podem ocorrer na absorção,
na distribuição e no metabolismo:
•
1) Absorção
Anestésico local + epinefrina = maior tempo de
duração do efeito.
Anestésico local + hialuronidase = menor tempo de latência, para instalação de bloqueios oftálmicos.
Anestésico local + bicarbonato de sódio = menor tempo de latência, para início da analgesia.
Lidocaína 5% + prilocaína (EMLA) = creme
para anestesia transdérmica.
•
2) Distribuição: as possíveis interações no plasma dependem da fração livre, que tem ação efetiva
Diazepam + heparina = aumento da hipnose por
aumento da fração livre.
Diazepam + bupivacaína = toxicidade por aumento da fração livre de bupivacaína.
• Meperidina + bupivacaína = toxicidade por aumento da fração livre da bupivacaína.
• Tiopental + contraste iodado = efeito hipnótico exacerbado.
• Propofol + etomidato + fentanil = maior efeito
hipnótico.
• Morfina + esmolol = aumento da fração livre
do betabloqueador.
3) Metabolismo: alteração da taxa de biotransformação dos agentes em compostos hidrossolúveis ativos ou inativos, por indução e/ou
inibição enzimática no fígado
• Meperidina + IMAO = hiperpirexia, rigidez
muscular, convulsão e coma por aumento dos
níveis de normeperidina circulantes.
• Midazolam + fluconazol = maior duração do
benzodiazepínico.
• Midazolam + eritromicina = aumento da hipnose.
• Tiopental + opióide + ciclosporina = potencialização do efeito do barbitúrico por bloqueio
enzimático.
•
•
•
•
Meperidina + rifampicina = menor duração
analgésica por indução enzimática.
Diazepam + cigarro (benzopireno) = diminui a
meia-vida do benzodiazepínico.
Diazepam + opióide + cimetidina = potencialização da sedação e da analgesia.
Anticolinesterásico + hidrocortisona = inibição
da neostigmina.
Anticolinesterásico (neostigmina) + atropina =
descurarização.
Succinilcolina + ciclofosfamida, ou ecotiofato,
ou IMAO, ou trimetafan, ou pesticida organofosforado, ou procaína, ou azatioprina, ou
propranolol, ou metoclopramida = prolongam
o efeito do curare por inibição da colinesterase.
4) Eliminação: alteração na taxa de excreção
nos pulmões e nos rins
• Fenobarbital + bicarbonato = aumento da eliminação por alcalinização.
• Lidocaína + vitamina C = aumento da eliminação por acidificação.
• Galamina ou alcurônio + diurético = excreção
in natura do curare.
• Galamina ou alcurônio + ácido acetilsalicílico
ou ciclosporina = diminuição da excreção por
disfunção renal.
Do ponto de vista farmacodinâmico, o efeito
final pode estar modificado por interações de duas
ou mais substâncias, devido a mecanismos que envolvem receptores da membrana celular.
•
•
•
•
•
1) Gerais
Oxigênio a 100% + bleomicina = pneumonite.
Morfina + anestésico local (AL) = prurido, retenção urinária, vômitos e bradipnéia/apnéia tardia.
Anestésico local + cloreto de cálcio = diminuição da cardiotoxicidade do AL.
Bupivacaína + aminoglicosídeos ou insulina ou
halotano ou amiodarona = aumento da cardiotoxicidade do AL.
Flumazenil + meperidina = aumento da
toxicidade no SNC.
11
Quadro 4. Tipos de receptores opióides e os efeitos relacionados com sua ativação
EFEITO
Analgesia
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
RECEPTORES
µ/δ
κ
σ
supra-espinal e espinal
espinal
—-
Depressão respiratória
++
+
—-
Pupilar
constrição
—-
dilatação
Motilidade gastrointestinal
diminuição
—-
—-
Espasmos da musculatura lisa
++
—-
—-
Comportamental
euforia ++
sedação ++
disforia +
sedação +
disforia ++
efeito psicomimético
Dependência física
++
+
—-
2) Anestésicos venosos
Cetamina + propranolol = crise hipertensiva em
pacientes suscetíveis.
Cetamina + bloqueador neuromuscular adespolarizante = efeito prolongado.
Cetamina + diazepam, ou midazolam, ou
tiopental, ou droperidol = induzem a apnéia.
Cetamina + cocaína, ou halotano, ou aminofilina = predisposição à arritmia cardíaca.
Cetamina + enflurano = diminuição do limiar
convulsivo.
•
•
•
•
•
3) Opióides
Opióides + naloxona, ou nalorfina, ou naltrexona = antagonismo.
Nalbufina + outros opióides = efeito agonista
fraco (antagonismo parcial).
Fentanil + cloroprocaína espinhal = antianalgesia.
Opióides + etomidato, ou midazolam, ou
propofol, ou tiopental = potencialização da depressão respiratória.
Alfentanil, ou fentanil, ou remifentanil, ou
sufentanil + vecurônio, ou propranolol, ou
verapamil = bradicardia.
Alfentanil, ou fentanil, ou remifentanil, ou
sufentanil + midazolam = hipotensão arterial.
•
4) Benzodiazepínicos
Benzodiazepínicos + flumazenil = antagonismo
•
•
•
•
•
•
por mecanismo competitivo.
Benzodiazepínicos + aminofilina ou fisostigmina = antagonismo inespecífico.
Benzodiazepínico + hipnótico = potencialização
da depressão do SNC.
Midazolam + opióides = hipotensão arterial.
Midazolam + fluconazol = potencialização do
efeito hipnótico.
Diazepam + prometazina + atropina = síndrome
anticolinérgica.
5) Propofol
Propofol + alfentanil, ou fentanil, ou remifentanil, ou sufentanil = predisposição à apnéia.
Propofol + bloqueadores neuromusculares
adespolarizantes = sinergismo.
Propofol + epinefrina = predisposição à
arritmia cardíaca.
Propofol + hipotensores = potencialização da
hipotensão arterial.
6) Etomidato
Etomidato + opióides = apnéia e rigidez torácica.
7) Barbitúricos
Tiopental + IMAO = potencialização do efeito
hipnótico (inibição microssomal hepática).
Tiopental + carbonato de lítio = potencialização
da hipnose.
12
•
•
Tiopental + opióides = predisposição à apnéia.
Tiopental + doxapram = antagonismo/diminuição do limiar convulsivante.
Tiopental + alcoolismo agudo = potencialização
da depressão do SNC.
Tiopental + alcoolismo crônico = diminuição
da depressão do SNC (indução enzimática).
Tiopental + EDTA = depressão do músculo
cardíaco.
Tiopental + nitroprussiato de sódio = potencialização da hipotensão arterial.
•
8) Bloqueadores neuromusculares despolarizantes (succinilcolina)
• Succinilcolina + digital ou diurético tiazídico ou
beta2-agonista (hipocalemia) = disritmia cardíaca.
• Succinilcolina + betabloqueador, ou triantereno, ou
espironolactona (hipercalemia) = arritmia cardíaca.
• Succinilcolina + amiodarona = arritmia cardíaca.
• Succinilcolina + BNMA = antagonismo.
• Succinilcolina + ocitocina = potencialização do
relaxamento muscular.
• Succinilcolina + IMAO = apnéia prolongada
(diminuição da colinesterase plasmática).
•
•
•
•
•
9) Bloqueadores neuromusculares adespolarizantes (BNMA)
• Vecurônio + opióides = bradicardia.
• BNMA + opióides = potencialização da apnéia.
• Pancurônio + halotano = disritmia cardíaca.
• Mivacúrio + prostigmina = aumento da duração do relaxamento muscular.
• BNMA + aminoglicosídeos, ou colistina, ou
polimixina = aumento do relaxamento.
• BNMA + dantrolene (< Ca++) = aumento do
relaxamento.
• BNMA + furosemida (< volemia) = aumento
do relaxamento.
• BNMA + anticonvulsivante (hidantoína, crise
aguda) = aumento do relaxamento.
• BNMA + digital (hipocalemia) = aumento do
relaxamento.
• BNMA + sulfato de magnésio = aumento do
relaxamento.
•
•
•
•
•
BNMA + benzodiazepínico, ou propofol, ou
tiopental = potencialização do relaxamento
muscular.
BNMA + nitroprussiato = maior intensidade
de bloqueio (maior disponibilidade).
BNMA + prostigmina = descurarização.
BNMA + anticonvulsivantes (crônico) = menor relaxamento.
BNMA + corticóide crônico = menor relaxamento (modificação na placa motora).
BNMA + organofosforado = menor relaxamento (inibição da colinesterase).
BNMA + carbonato de lítio = aumento da duração do bloqueio muscular.
V – O AGENTE IDEAL
O agente ideal, do ponto de vista conceitual,
deve possuir as seguintes características:
1. Rápido início de ação.
2. Sedação adequada.
3. Rápido despertar.
4. Fácil administração.
5. Falta de acúmulo
6. Pouco ou nenhum efeito adverso.
7. Pouca ou nenhuma interação com outras drogas.
8. Baixo custo.
Os critérios para o emprego de agentes destinados a promover sedação e analgesia devem obedecer aos seguintes preceitos gerais:
1. Aliviar o medo e a ansiedade.
2. Controlar os estados confusionais agudos.
3. Facilitar a ventilação mecânica.
4. Facilitar a realização de procedimentos.
5. Minimizar a resposta fisiológica ao estresse.
VI – FARMACOLOGIA
Os principais grupos de agentes utilizados em
sedação e analgesia estão relacionados no Quadro 1.
A seguir, descreveremos as características
farmacológicas dos agentes sedativos e analgésicos
dentro de cada grupo.
Renal
Hepática
½ - 1½ h
½-1h
5 - 15 min (IV)
Imediato
Narcan®
Antagonista
µ+++ δ++ κ++
Naloxona
Renal
Hepática
2-3h
6-8h
5 - 15 min (IV)
Imediato
Nubain®
Nalbufina
Antagonista
Agonista
µ+
κ ++
Renal
Hepática
92
glicoproteína
ácida α1
1½ h
30 - 60 min
(50 µg/kg)
1 - 2 min (IV)
Imediato
Rapifen®
Agonista
potente
µ+++ δ+
κ+
Alfentanila
Renal/Biliar
Hepática
85
3-4h
5 - 20 min (IV) 30 - 60 min
(100 µg)
Imediato
Fentanil®
Agonista
potente
µ+++ δ+
Fentanila
Renal
Hepática
65
3-4h
3-5h
5 - 20 min (IV)
Imediato
Dolantina®
Demerol®
Agonista
potente
µ++ δ+
κ+
Meperidina
Renal
Hepática
35
2-3h
4-6h
5 - 20 min (IV)
1 - 4 h (VO)
Imediato
Dimorf®
MS long®
Agonista
potente
µ+++ δ+
κ++
Morfina
Renal
Hepática
7
2-4h
4-6h
½-1h
20 - 30 min
Tylex®
Belacodid®
Agonista fraco
(associação)
µ+ δ+ κ+
Codeína (VO)
Renal
Hepática
2-4h
4-6h
½ - 1½ h
20 - 30 min
Sylador®
Tramal®
Agonista
fraco
µ+ δ+ κ+
Tramadol (IM)
Ligação
Metabolização Excreção
protéica (%)
Meia-vida
plasmática
Duração
Pico
Início
Nome
comercial
Mecanismo
de ação
Nome
farmacológico
VI.1 – Sedativos e hipnóticos
Receptor
Quadro 5. Farmacocinética dos opióides mais utilizados em UTI
13
O propofol, os barbitúricos e os benzodiazepínicos são os representantes deste grupo (Quadro 2).
Alquilfenol – Propofol
Quimicamente, este agente não tem nenhuma
semelhança com os demais. É um derivado fenólico
(2,6 diisopropilfenol), liberado para uso em
anestesia em 1989 pelo FDA. Recentemente, passou a ser empregado com bastante entusiasmo em
sedação em UTI.
É apresentado como emulsão aquosa branca e
isotônica para uso exclusivo intravenoso.
Farmacodinâmica: é um agente de curta duração e de rápido início de ação.
Sistema nervoso central: o propofol reduz o fluxo sanguíneo cerebral, a pressão intracraniana e o
metabolismo cerebral.
Não se observou o fenômeno de hiperalgesia,
descrito para o tiopental.
A recuperação é rápida, com uma clareza notável do nível de consciência e com baixa incidência
de náuseas e vômitos.
Sistema cardiovascular: a queda da pressão arterial deve-se à diminuição da resistência periférica,
ocorrendo melhor estabilidade dos parâmetros
hemodinâmicos, quando comparados com o
tiopental. Verifica-se elevação do limiar para
arritmias cardíacas, mesmo na presença de
adrenalina ou de halogenados.
Seu emprego em pacientes hipovolêmicos ou
com instabilidade hemodinâmica deve ser precedido pelo ajuste da volemia (procedimento válido
para todos os agentes sedativos).
Sistema respiratório: pode ocorrer depressão respiratória, que é dose-dependente, havendo uma janela clínica para o emprego de sedação consciente
sob ventilação espontânea.
Sistema gastrointestinal: não foram observadas
alterações da secreção gástrica ou da motilidade intestinal com o uso do propofol. A menor incidência de náuseas e vômitos parece estar relacionada
com efeito antiemético, intrínseco desse agente.
Farmacocinética: após dose de 2 mg/kg ocorre
14
uma queda rápida da concentração plasmática
(meia-vida de 2 a 4 minutos), seguida de rápida
eliminação (de 30 a 60 minutos).
O propofol tem um elevado volume de distribuição e uma elevada depuração (1,5 a 2 litros/
minuto).
Metabolização: ocorre no fígado, formando
compostos inativos.
Excreção: urinária.
Cuidados especiais: pacientes debilitados,
hipovolêmicos, com insuficiência cardíaca ou hepática devem ter as dosagens revisadas.
Considerando-se que 1 ml de propofol contém
0,1 g de lipídios, devemos monitorizar os níveis
séricos, principalmente em pacientes com disfunções do metabolismo das gorduras ou que recebem
dieta com lipídios.
Se a emulsão contiver EDTA como conservante,
deve-se levar em conta a possibilidade de reposição
de zinco, se houver emprego prolongado do agente, principalmente nos pacientes com predisposição à deficiência desse oligoelemento, tais como
sépticos, diarréicos e queimados graves.
Pacientes obstétricas: devido ao fato de o
propofol atravessar a barreira placentária, não é
recomendado seu emprego em técnicas de sedação
que antecedam o parto.
Reações adversas: reações leves como eritemas
podem ocorrer, e os relatos de reações anafiláticas
são extremamente raros.
Para sedação em UTI, recomenda-se o uso em
infusão contínua nas dosagens de 0,3 a 4 mg/kg/h,
considerando-se o estado físico do paciente (classificação da ASA) e o nível desejado da sedação
(escala de Ramsay e/ou BIS).
Administrações em bolus podem ser empregadas
para a realização de exames e/ou procedimentos,
como por exemplo cardioversões elétricas, endoscopias, drenagens de tórax, de abscessos e outros.
Nesses casos, doses de 1 a 2 mg/kg, observando-se a velocidade de infusão de 20 a 40 mg a cada
10 segundos, de acordo com o estado físico do paciente, geralmente são suficientes para a obtenção
da sedação desejada. Doses adicionais podem ser
necessárias a cada 5 minutos.
Segundo os mesmos princípios dos outros agentes, o aumento da idade e da classificação da ASA
é inversamente proporcional às dosagens administradas.
Barbitúricos
O tiopental foi introduzido na prática clínica
por Lundy, em 1935. Outros barbitúricos de ação
ultracurta foram adotados posteriormente e, dentre esses, incluem-se o meto-hexital sódico e o
tiamilal sódico.
Após a administração de uma dose de tiopental,
observa-se a perda de consciência em 10 a 20 segundos (tempo de circulação braço-cérebro). O
pico plasmático máximo é atingido em 40 segundos e a consciência restabelecida após 20 a 30 minutos. Ao despertar, a concentração plasmática é
cerca de 10% do valor máximo.
A meia-vida plasmática, no período de distribuição, é em torno de 3 minutos. Quando ocorre
uma ampla redistribuição para todos os tecidos,
principalmente gordura, a queda da concentração
plasmática é mais lenta.
Após a administração de doses adicionais ou a
infusão contínua desse agente, a recuperação ocorre lentamente e pode demorar muitas horas.
O tiopental é metabolizado devagar no fígado.
No entanto, esse não é o único fator para a recuperação lenta, destacando-se a ligação protéica e as
alterações da fração não-ionizada e do fluxo sanguíneo nos reservatórios gordurosos.
A excreção é renal, após metabolização hepática. Cerca de 25% do fenobarbital pode ser excretado na urina de forma inalterada.
Sistema nervoso: os barbitúricos deprimem de
forma gradual e reversível todos os tecidos
excitáveis. Possuem também efeitos euforizantes, e
doses baixas podem induzir hiperalgesia. A ação
anticonvulsivante, encontrada no fenobarbital, não
é seletiva nos demais.
Observa-se queda do fluxo sanguíneo cerebral,
depressão do centro respiratório e depressão de forma seletiva dos gânglios autonômicos. É possível
15
Quadro 6. Equivalência das doses dos
opióides em relação à morfina
AGENTE
VIA ORAL
(mg)
VIA
INTRAMUSCULAR
(mg)
Morfina (sulfato)
60
10
Meperidina (HCI)
300
75
Codeína (fosfato)
200
130
Sufentanila (HCI)
Tramadol
Fentanila (citrato)
–
0,02
100
100
–
0,1
HCI = cloridrato
ocorrer efeito paradoxal com excitação e delírio em
alguns pacientes.
Sistema cardiovascular: podem promover
hipotensão arterial e/ou arritmias cardíacas na presença de adrenalina, halotano ou colapso cardiocirculatório nos pacientes com reserva cardíaca diminuída.
Trato gastrointestinal: a diminuição da motilidade
gástrica ocorre por ação central e é dose-dependente.
Fígado: promovem indução enzimática, principalmente com o uso crônico.
Rim: causam diminuição da filtração renal, observando-se oligúria grave nos casos de intoxicação.
Reações alérgicas: pacientes com história de
asma, urticária ou angioedema são mais suscetíveis.
Outros efeitos: devido ao fato de os barbitúricos
aumentarem a síntese de porfirina, estão formalmente contra-indicados aos pacientes portadores
de porfiria aguda intermitente.
Benzodiazepínicos
O clordiazepóxido foi o primeiro agente deste
grupo. Era utilizado para o tratamento da ansiedade no final da década de 50.
Atualmente, a lista de benzodiazepínicos disponíveis para uso clínico é composta por dez derivados. Seguindo a ordem de introdução, temos:
clordiazepóxido, diazepam, oxazepam, clorazepato,
lorazepam, prazepam, alprazolam, halazepam,
clonazepam e midazolam.
Devemos destacar a maior eficácia anticonvulsivante do clonazepam, assim como sua aplicação
para o tratamento da síndrome do pânico.
Embora todos os derivados tenham como resultado um marcante efeito ansiolítico, esses agentes têm sido empregados em UTI, em larga escala,
como sedativos, hipnóticos e anticonvulsivantes.
Outros efeitos atribuídos aos BZD são o relaxamento muscular e a amnésia anterógrada.
Dos BZD conhecidos, o diazepam e o midazolam são os mais utilizados.
Farmacocinética: tanto o diazepam quanto o
midazolam são bem absorvidos por via oral e atingem o pico plasmático em torno de 1 hora. Devido à sua maior hidrossolubilidade, o midazolam é
mais bem absorvido por via intramuscular. A injeção intravenosa do diazepam causa algum desconforto devido à sua menor hidrossolubilidade.
Após uma injeção de 0,5 mg/kg de diazepam,
ocorre rápida distribuição para o cérebro, mas, devido ao seu elevado volume de distribuição, o efeito hipnótico não é imediato.
A meia-vida de eliminação do diazepam é de 30
a 40 horas; e a do midazolam, de 1,5 a 2,5 horas.
A alta ligação protéica (95%) pode ser um fator limitante ao emprego da diálise para o tratamento das intoxicações.
A metabolização é preferencialmente hepática
e os metabólitos ativos (nordazepam) às vezes prolongam os efeitos por muitas horas.
Excreção: pode ser lenta, considerando-se o elevado volume de distribuição desses agentes.
Sistema nervoso: os BZD exercem depressão central sobre os reflexos medulares, elevam o limiar
convulsivo e são anticonvulsivantes.
A descoberta de locais específicos no cérebro,
notadamente no sistema límbico, no cerebelo e no
córtex cerebral, tem como principal fator a interação com o ácido gama-aminobutírico (GABA),
responsável pela neurotransmissão inibitória na
região anterior do cérebro. Pesquisas eletrofisiológicas demonstraram que os BZD potencializam
os efeitos inibitórios mediados pelo GABA.
16
Quadro 7. Efeitos colaterais dos agentes opióides
Agentes
Obstipação
Náuseas
Retenção urinária
Dependência
Outros
Codeína
+++
+++
++
+
—-
Tramadol
+
+
—-
—-
—-
Meperidina
++
++
++
+++
Disforia / Convulsões
Morfina
++
++
+++
+++
Hipotensão
Fentanila
++
+
++
—-
—-
Nalbufina
—-
—-
—-
—-
Sedação
Embora os BZD aumentem o tempo de duração
do sono, ocorre a supressão da fase REM, o que pode
ser útil para o tratamento de terrores noturnos.
Sistema respiratório: doses hipnóticas exercem
pouco efeito em indivíduos normais. Pacientes debilitados ou aqueles submetidos a dosagens elevadas podem necessitar de assistência ventilatória.
Sistema cardiovascular: em pessoas com a função cardíaca comprometida, pode ocorrer redução
de mais de 20% da pressão arterial, com aumento
reflexo da freqüência cardíaca. Isso se deve principalmente ao efeito bloqueador alfadrenérgico do
midazolam e à depressão miocárdica do diazepam,
sendo este último efeito atribuído ao aumento de
adenosina intersticial.
Trato gastrointestinal: os BZD reduzem a secreção gástrica e melhoram os distúrbios gastrointestinais oriundos do estresse.
Efeitos adversos: distúrbios cognitivos, descoordenação motora, turvação visual e amnésia anterógrada podem ser potencializados pelo etanol.
Devido à possibilidade de efeitos paradoxais, tais
como pesadelos, irritabilidade, euforia, sudorese,
taquicardia e síndrome de abstinência, alguns autores sugerem a retirada gradual desses agentes, principalmente após tratamento prolongado.
VI.2 – Analgésicos
As enzimas ciclooxigenase 1 (cox-1) e ciclooxigenase 2 (cox-2) estão intimamente relacionadas
com as sínteses de prostaglandinas e tromboxano.
A inibição da cox-2 está relacionada às ações analgésica, antipirética e antiinflamatória. A inibição
da cox-1 pode levar ao aparecimento de úlceras
gástricas e outros efeitos colaterais indesejáveis.
Analgésicos, antipiréticos e antiinflamatórios são
um grupo heterogêneo de compostos que têm a Aspirina® como principal representante (Quadro 3).
Salicilatos
Os salicilatos foram empregados pela primeira
vez em 1875, para o tratamento da febre reumática e como antipirético.
Em sedação e analgesia, esse grupo tem sido
usado para tratamento de cefaléia, artrite, mialgia
e neuralgia e como coadjuvante no tratamento da
dor, diminuindo os efeitos inflamatórios, do
estresse endócrino-metabólico e aumentando a ação
dos analgésicos mais potentes, principalmente os
opióides.
As dosagens adequadas do AAS, tanto para
analgesia quanto para tratamento da febre, variam
de 300 a 600 mg a cada 4 horas, por via oral, não
ultrapassando 3,5 g por dia.
Toxicidade dos salicilatos: doses agudas acima
de 10 g de Aspirina® podem causar a morte em adultos. A intoxicação crônica geralmente vem acompanhada de tontura, cefaléia, dificuldade auditiva, redução da visão, confusão mental, sonolência,
sudorese, sede, náusea, vômito e diarréia. Casos mais
graves podem evoluir para convulsões e coma.
17
Quadro 8. Farmacocinética dos neurolépticos mais utilizados em UTI
Grupo
Nome
farmacológico
Nome
comercial
Início
(min)
Clorpromazina
Amplictil® (IV)
30
Piperidinas
Tioridazina
Melleril® (VO)
Butirofenonas
Droperidol
Droperidol® (IV)
Haloperidol
Haldol (IM)
Pico Meia-vida
Ligação
Metabolização Excreção (%)
(h)
(horas) protéica (%)
Fenotiazinas
Alifáticos
®
2-4
20 - 40
95 - 98
Hepática
Renal / Biliar
2-4
10
95
Hepática
Fecal (60)
Renal (40)
3-4
-
20 - 40
-
Hepática
Renal / Biliar
10 - 30
-
10 - 40
92
Hepática
Fecal (60)
Renal (40)
Acetaminofeno
É um analgésico derivado do alcatrão.
Tem efeitos analgésicos e antipiréticos e ação
antiinflamatória muito fraca. As dosagens de 300
a 1.000 mg em intervalos de 6 horas são recomendadas, não ultrapassando um total de 4.000 mg/
dia em adultos.
Toxicidade: não são relatados casos de sensibilidade cruzada no uso com salicilatos.
Embora bem tolerado, as reações tóxicas do
acetaminofeno costumam ser graves, principalmente
com necrose hepática e necrose tubular aguda,
dose-dependente. Doses agudas acima de 20 g podem ser fatais.
Os sintomas de intoxicação aguda, nas primeiras 24 horas, são náuseas, vômitos, anorexia e dor
abdominal. Os sinais e sintomas de lesão hepática
costumam aparecer após dois a quatro dias da ingestão do medicamento, com elevação das enzimas
hepáticas, aumento das bilirrubinas e aumento do
tempo de protrombina.
Devido à importância dos efeitos analgésicos e
antiinflamatórios intrínsecos, aliados à disponibilidade das apresentações parenterais, daremos destaque a três compostos mais empregados nos protocolos de sedação e analgesia: diclofenaco,
cetoprofeno e tenoxicam.
Diclofenaco
Em comparação com os salicilatos, seus efeitos
analgésicos e antitérmicos são mais proeminentes.
A absorção é rápida, a meia-vida plasmática é
de 1 a 2 horas, com elevada ligação protéica (99%).
Metabolização: hepática, via sistema microssomal.
Excreção: urinária (65%) e biliar (35%).
Dosagens: estão disponíveis as apresentações
orais, liberação enteral lenta e intramuscular. O uso
de 50 a 75 mg por via muscular a cada 8 horas tem
sido recomendado para o tratamento de mialgias,
dores articulares, tendinites, bursites ou dor pósoperatória.
A administração venosa é proscrita, e uma única
dose de 50 a 75 mg pode levar a parada cardíaca.
Efeitos colaterais: é bastante conhecida sua capacidade irritativa do trato gastrointestinal, assim
como sua toxicidade hepática pode ocasionar o aparecimento de úlceras. Muitos pacientes têm o tratamento interrompido devido a reações colaterais.
A injeção intramuscular pode ocasionar lesões
neurológicas periféricas e necrose de pele no local
da aplicação.
Cetoprofeno
É um inibidor da ciclooxigenase, derivado do
ácido propiônico. Antagoniza as bradicininas e estabiliza as membranas lisossômicas.
Farmacocinética e metabolismo: é rapidamente absorvido, atingindo concentrações plasmáticas
máximas em 2 horas, com meia-vida de igual período e elevada ligação protéica (99%).
Metabolização e eliminação: é conjugado ao ácido glicurônico no fígado e eliminado pelos rins.
18
Dosagens: estão disponíveis as apresentações oral,
parenteral e retal. O emprego intravenoso tem sido
útil no tratamento da dor pós-operatória, com dose
inicial de 100 mg (infusão lenta = 15 a 30 minutos), seguida de 60 mg em intervalos de 8 horas.
Pacientes com função renal comprometida, retenção hídrica ou acima de 60 anos deverão ter esses
parâmetros monitorados, com ajuste da dosagem
ou interrupção do tratamento.
Tenoxicam
Pertence ao grupo dos ácidos enólicos e é um
dos derivados do oxicam. Apresenta notável ação
analgésica, antiinflamatória e antitérmica.
Mecanismo de ação: inibe a síntese de prostaglandinas e a ativação de neutrófilos na presença
de subprodutos da ciclooxigenase.
Farmacocinética e metabolismo: é totalmente
absorvido por via oral, atingindo concentração
plasmática máxima em 2 a 4 horas, com importante circulação enteroepática, alta ligação protéica
(99%), meia-vida plasmática elevada e metabolização hepática.
Excreção: principalmente na urina e nas fezes.
Terapêutica: devido à elevada meia-vida
plasmática, doses de 20 a 40 mg IV ou IM a cada
12 horas conferem concentrações plasmáticas adequadas.
Opióides
Estes são os principais compostos empregados
no tratamento da dor.
Desde a descoberta da papoula, por Theophrastus, no século III a.C., muitos agentes foram sintetizados e colocados em uso. Recentemente, o emprego de bombas de infusão contínua, possibilitando a liberação de dosagens adicionais acionadas pelo paciente (PCA), tem propiciado um controle bastante confortável e individualizado no tratamento da dor.
Em 1806, a morfina foi a primeira substância
pura a ser isolada, a partir de mais de vinte alcalóides do ópio, dando origem a outros compostos
sintéticos, como a meperidina e a metadona, por
ocasião da Segunda Guerra Mundial.
O termo “narcótico”, derivado do grego, significa torpor e foi associado no passado a toda droga
que induzia ao torpor ou ao sono e posteriormente aos opiáceos potentes. Atualmente, o termo tem
sido empregado em um contexto mais amplo, no
que concerne ao consumo abusivo de drogas.
Considera-se inadequado o emprego do termo
“narcose” para definir graus de sedação e analgesia.
Com a descoberta dos receptores opióides µ
(mu), κ (kappa), δ (delta) e σ (sigma) no SNC, foi
possível entender melhor os fenômenos de especificidade e otimização dos compostos nas diferentes
vias de administração (Quadro 4).
Devido a essas descobertas, os opióides podem
ser administrados por via epidural, subdural, venosa, muscular, transdérmica ou oral, de acordo
com as necessidades (Quadro 5).
Embora existam muitos derivados disponíveis,
a morfina continua sendo o mais efetivo para o
tratamento da dor, embora alguns efeitos colaterais
justifiquem o emprego de outros opióides (Quadro 6).
Propriedades farmacológicas: de maneira geral,
os opióides produzem seus efeitos principais através dos receptores µ.
Os efeitos gerais incluem analgesia, sonolência,
alterações do humor, depressão respiratória, diminuição da peristalse gastrointestinal, náusea, vômito e alterações nos sistemas nervoso autônomo
e endócrino.
Mecanismos de ação: a analgesia deve-se a ações
em vários locais do SNC, medulares e supramedulares. São descritos três mecanismos envolvidos:
1. A morfina e outros opióides agonistas µ inibem os reflexos nociceptivos no corno dorsal da
medula.
2. Os receptores opióides das terminações de
nervos aferentes primários inibem a liberação de
neurotransmissores, incluindo a substância P.
3. A morfina antagoniza os efeitos da substância P exógena, por ações inibitórias pós-sinápticas
dos neurônios que levam a informação nociceptiva
aos centros superiores.
19
Quadro 9. Comparação dos efeitos entre os principais neurolépticos
Grupo
Alifáticos
Piperidinas
Butirofenonas
Benzamidas modificadas
Nome farmacológico
Extrapiramidal
Sedação
Anticolinérgico
Hipotensão
Clorpromazina
++
+++
+++
+++
Tioridazina
+
+++
+++
++
Droperidol
+++
++
++
++
Haloperidol
+++
+
+
+++
Sulpirida
+
+
+
—-
Efeitos no SNC
Rigidez muscular: ocorre com mais freqüência
com altas dosagens ou injeção rápida, mas pode
acontecer também com dosagens baixas. Uma
forma útil de evitar esse efeito é a administração lenta do opióide, precedida de uma dose
hipnótica ou subipnótica de midazolam ou
propofol.
• Hipotálamo: os opióides modificam o ponto de
equilíbrio dos mecanismos termorreguladores
do hipotálamo, levando à diminuição da temperatura inicialmente. No entanto, após exposição e dosagens elevadas, levam à hipertermia.
• Neuroendócrinos: os opióides diminuem a liberação do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) e o fator liberador de corticotropina (CRF), diminuindo as concentrações
de LH, FSH, ACTH e das betaendorfinas.
• Miose: a contração da pupila é devida à ação
excitatória parassimpática do respectivo nervo.
Sistema respiratório: a depressão acontece por
ação direta nos centros respiratórios do tronco cerebral e progride com o aumento da dosagem.
Ocorre, de início, diminuição da freqüência e posteriormente do volume corrente. O reflexo da tosse também é diminuído ou abolido.
Sistema cardiovascular: a morfina induz a liberação de histamina, levando a diminuição da resistência periférica e a taquicardia reflexa com pouco
reflexo no desempenho cardíaco. Os opióides sintéticos, como alfentanil, fentanil, remifentanil e
sufentanil, não promovem alterações cardio•
circulatórias importantes, em doses clínicas, e por
isso são mais indicados para pacientes cardiopatas.
Trato gastrointestinal: a morfina diminui a secreção de ácido clorídrico e a motilidade gástrica e
intestinal, promovendo aumento da tensão do
esfíncter de Oddi. As náuseas e os vômitos são devidos à ação direta dos opióides em quimiorreceptores na “zona do gatilho”.
Os efeitos colaterais dos agentes opióides estão
demonstrados no Quadro 7.
Tolerância e dependência física: todos os
opióides levam a tolerância e dependência física;
no entanto, esse fato geralmente está relacionado
aos efeitos analgésicos benéficos desses agentes. A
retirada dos opióides, com redução de 50% da dose
em dias alternados, pode evitar a síndrome de abstinência, e, portanto, seu emprego para o alívio da
dor aguda ou crônica deve sempre levar em conta
os benefícios inerentes à terapêutica.
Farmacocinética e farmacodinâmica: os opióides são rapidamente absorvidos, ressaltando-se as
diferenças quanto à lipossolubilidade ou hidrossolubilidade conferidas aos agentes.
A morfina é hidrossolúvel e os compostos sintetizados posteriormente são lipossolúveis. Essa propriedade confere diferenças na habilidade do opióide
de atingir concentrações adequadas no SNC.
Dessa forma, os agentes mais lipossolúveis
(fentanil) têm início de ação mais rápido e tempo
de duração mais curto; os agentes hidrossolúveis
(morfina) têm início mais lento e duração mais
longa.
Renal (10-25)
Hepática/Biliar (75-90)
0,8 - 2
Hepática/Plasmática
-
Renal (< 30)
Hepática/Biliar (20-40)
Hepática/Biliar (>70)
Renal (60-80)
Plasmática (70-90)
4 - 12
8 - 12
Renal (10-30)
Hepática (10-40)
10 - 15
Renal (60-90)
Via de Hofmann (97)
2-4
Renal (3)
Via de Hofmann (97)
4 - 12
Renal (3)
Hepática (10-40)
-
Renal (60-90)
Metabolização (%)
Infusão
contínua
(µg/kg/min)
20 - 40
0,1 - 0,15
Adespolarizante
Vecurônio
2-3
3-5
1
Despolarizante
Succinilcolina
<1
45 - 75
0,6 - 1
Adespolarizante
Rocurônio
1 - 1½
> 150
0,08 - 0,12
Adespolarizante
Pancurônio
3-4
25 - 30
0,15 - 0,25
Adespolarizante
Mivacúrio
1½ - 2½
> 130
4-6
Adespolarizante
Galamina
2-3
20 - 30
0,06 - 0,15
Adespolarizante
Cisatracúrio
2-3
20 - 30
0,40 - 0,60
Adespolarizante
Atracúrio
2-3
> 150
0,20 - 0,30
Adespolarizante
Alcurônio
2-3
Tempo
de ação
(minutos)
Dose inicial
(mg/kg)
Início de ação
(minutos)
Metabolização e eliminação: o efeito de primeira passagem no fígado determina uma significativa diminuição (25%) da biodisponibilidade, a partir de uma dose oral. A morfina tem baixa ligação
protéica (33%), mas os outros derivados apresentam ligação superior a 80%.
Toxicidade: deve ser ressaltada a possibilidade
de excitação do SNC pela normeperidina (metabólito da meperidina), ocasionando tremores,
abalos musculares, crises convulsivas e outras reações citadas anteriormente no tópico “Interações
medicamentosas”.
Considerando-se a grande variação das dosagens dos opióides e a freqüente associação aos agentes hipnóticos e sedativos, estaremos fazendo a associação das dosagens no próximo fascículo, em
“protocolos desenvolvidos pelo autor”.
VI.3 – Antipsicóticos e neurolépticos
Tipo de ação
Agente
Quadro 10. Farmacocinética dos principais relaxantes neuromusculares usados em UTI
Excreção (%)
20
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o CID-10 define como Transtorno
Mental Orgânico (TMO) as doenças que atingem
o cérebro. Esses transtornos orgânicos podem ser
divididos em primário, quando acometem diretamente o cérebro, e secundário, quando o cérebro é
um dos órgãos acometidos.
Os princípios gerais de avaliação do nível e do
conteúdo da consciência já foram discutidos no fascículo I.
No Quadro 8, demonstramos a farmacocinética
dos neurolépticos mais utilizados em UTI e no
Quadro 9 comparamos os efeitos entre os principais representantes do grupo.
VI.4 – Relaxantes neuromusculares
No fascículo I, foram apresentadas as indicações e os mecanismos de ação dos relaxantes
neuromusculares em seus sítios de ação.
Devem-se considerar algumas propriedades
farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos relaxantes
neuromusculares, no tocante a distribuição,
biodisponibilidade, metabolização e excreção.
21
Distribuição: ao contrário dos agentes hipnóticos e dos analgésicos, os relaxantes neuromusculares têm um baixo volume de distribuição, sendo o conteúdo intravascular do paciente o sítio predominante de sua permanência no organismo, até
sua metabolização e excreção. Suas ações estão estritamente relacionadas à volemia do paciente.
Biodisponibilidade: alterações metabólicas e da
temperatura têm grande influência na biodisponibilidade dos relaxantes neuromusculares. Estados
de acidemia e hipotermia diminuem o efeito desses agentes. Contudo, a hipotermia pode potencializar o efeito dos relaxantes neuromusculares nos
pacientes que receberam o agente antes da instalação da hipotermia.
Metabolização e excreção: com exceção da
succinilcolina, do atracúrio, do cisatracúrio e do
mivacúrio, os demais agentes desse grupo têm
metabolização hepática e excreção renal.
A succinilcolina e o mivacúrio são metabolizados pela colinesterase plasmática, e a eliminação
de seus metabólitos inativos ocorre por via renal.
Cerca de 97% do atracúrio e do cisatracúrio são
metabolizados no plasma por um mecanismo conhecido como “eliminação de Hofmann”. Esse mecanismo ocorre exclusivamente no plasma em condições fisiológicas de pH e temperatura. Os restantes 3% são eliminados por via renal.
Esse processo resulta em dois metabólitos, a
laudanosina e o monoacrilato, que estão relacionados com a diminuição do limiar convulsivo.
Monitorização do bloqueio neuromuscular: o
emprego de métodos de monitorização pode evitar os possíveis bloqueios permanentes, devido ao
uso prolongado desses agentes.
Embora a capacidade do paciente em realizar
tarefas como protruir a língua, elevar a cabeça e
fletir o braço sobre a cabeça forneça informações
úteis no tocante à reversão do bloqueio, a manutenção do relaxamento muscular, principalmente
prolongado, necessita de monitorização específica, evitando-se altas dosagens e suas possíveis complicações.
Dentre os métodos de monitorização disponí-
veis, a estimulação de nervos periféricos tem sido
empregada com freqüência em anestesias e sua aplicação é crescente em UTIs.
Tecnicamente, qualquer nervo periférico pode
ser estimulado com esse método. No entanto, devido à facilidade de manuseio, o estímulo do nervo ulnar é o recurso que vem sendo mais utilizado,
tendo-se como controle a adução do polegar.
São empregados vários padrões de estímulos elétricos, a saber: tetânico, seqüência de quatro estímulos (TOF) e double burst (DB). O estímulo
tetânico é pouco tolerado pelos pacientes, estando
o TOF e o DB mais indicados na monitorização e
verificação de fadiga muscular. Embora o DB ofereça maior acuidade, o TOF tem sido o método
mais aplicado na prática, devido à facilidade de
leitura e à aceitação dos pacientes.
No Quadro 10 estão relacionadas as principais
características dos relaxantes neuromusculares
atualmente empregados.
No Fascículo III apresentaremos os protocolos
desenvolvidos pelos autores, assim como alguns
casos clínicos relacionados aos tópicos apresentados,
os cuidados na utilização concomitante dos anestésicos locais e algumas particularidades referentes
aos anestésicos gerais.
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