estado e políticas públicas: propositura de desenvolvimento

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ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS: PROPOSITURA DE DESENVOLVIMENTO
REDEFININDO RELAÇÕES SOCIAIS DE PRODUÇÃO E DE TRABALHO
STATE AND PUBLIC POLICIES: PROPOSAL OF DEVELOPMENT REDEFINING
WORKING AND PRODUCTION SOCIAL RELATIONS
Ingrid Michelle Coelho Sampaio Félix
[email protected]
Universidade federal de sergipe/UFS
Alexandrina Luz Conceição
[email protected]
RESUMO
As políticas públicas provocam profundas mudanças, transformando o espaço, redefinindo novas
relações sociais de produção e trabalho. Com o discurso de combate a pobreza, de desigualdade e de
melhoria das carências sociais, o Estado cumpre o papel de apaziguamento dos conflitos sociais,
aparecendo estrategicamente através de políticas públicas como mediador da reprodução do capital.
Objetiva-se analisar a referente problemática a partir do entendimento do método do materialismo
histórico dialético, tendo como fundamento epistemológico as leituras de Karl Marx, István Mészáros
e David Harvey. Compreendemos que, no caso do Brasil essa articulação está diretamente ligada ao
PAC que se beneficiou dos lucros provenientes da relação comercial estabelecida dentro dos BRIC e
posteriormente BRICS- bloco econômico formado por Índia, China, Rússia, Brasil e África do Sul,
enquanto política pública de desenvolvimento que promove e fortalece a produção de commodities.
Palavras-Chave: Capital. Estado. Políticas Públicas.
ABSTRACT
Public policies have caused deep changes transforming space, redefining new working and production
social relations. The discurse of fight against poverty, inequality and the improvement of the social
needs, pushes the State into a role of suppressing social conflicts. Through public policies it turns out
that the State is a strategic mediator of the reproduction of the capital. The aim of this work is to
analise the related issue using the historical dialectical materialism, having the epistemological
fundament in the works of Karl Marx, István Mészáros and David Harvey. We understand that in
Brazil this articulation is directly related to PAC (Growth Support Program) which has been benefited
from the profits resulting of the commercial relationships first established among the BRIC, which
later became the BRICS - the economic block formed by India, China, Russia, Brazil and South Africa
- as a public policy of development that promotes and strengthens commodity production.
Key-Words: Capital. State. Public Policy
Introdução
As políticas públicas normalmente são direcionadas para a classe subordinada, com o
discurso de combate a pobreza e de desigualdade, propondo melhoria das carências sociais,
entretanto intensifica a extração de mais valor e ou da renda da terra na subordinação do
trabalhado ao capital. As políticas públicas têm como função direcionar e estabelecer regras
para a relação mediadora entre Estado e capital. São diretrizes e princípios norteadores de
ação para a ampliação e reprodução do capital.
Nesse sentido, o capital sob a personificação do Estado, viabilização que se
produz à luz da lógica expansionista do capital via políticas públicas, por
meio de concessão de privilégios e não de direitos concebidos à alguns e
negado a muitos, apropria-se dos espaços de miséria, utilizando-se do
discurso ideológico que promete combater a pobreza pela mesma economia
iníqua, que fora patologicamente a causadora da miséria (RODRIGUES,
2015, p. 182).
De diferentes formas o Estado sempre esteve presente nas relações de produção
capitalistas, bem como em sua reprodução, possibilitando o andamento de todas as fases do
ciclo do capital.
O Estado moderno constitui a única estrutura corretiva compatível com os
parâmetros estruturais do capital como modo de controle sociometabólico.
Sua função é retificar – deve-se enfatizar mais uma vez: apenas até onde a
necessária ação coercitiva puder se ajustar aos últimos limites
sociometabólicos do capital [...] (MESZAROS, 2011, p. 107).
Nessa perspectiva, o papel do Estado sofre modificações para atender as diversas
formas de produção, para garantir os estágios e fases do capitalismo, permitindo que este se
realize em plenitude, tornando-se a base de sustentação e instrumento do modelo de
acumulação capitalista. Isso possibilita a consolidação de ampla expansão do capital, e novas
formas de exploração.
Na década de 1980, a desregulamentação da economia, na égide do
neoliberalismo, anuncia medidas de minimização do Estado; todavia, o que
se constata é a minimização das ações governamentais para o setor social e a
maximização para o capital financeiro, favorecendo o pleno
desenvolvimento da especulação financeira (CONCEIÇÃO, 2012, p.141142).
Com o domínio do modelo neoliberal as políticas públicas sofrem modificações,
mais direcionadas e buscam como resultante o livre funcionamento do mercado. O Estado,
aparentemente apresentado como o Estado-mínimo cumpre a função de equilíbrio social e
aplicação das medidas e recursos que irão favorecer a reprodução do capital.
O livre mercado é apontado pelos neoliberais como o grande equalizador das
relações entre os indivíduos e das oportunidades na estrutura social. Defendendo esses
postulados, os neoliberais contraditoriamente “repudiam” a responsabilidade do Estado em
direcionar verbas de investimentos para o atendimento de políticas sociais, mascarando seu
real objetivo.
Em um Estado de inspiração neoliberal as ações e estratégias sociais governamentais
incidem essencialmente em políticas compensatórias, em programas focalizados, voltados
àqueles que não estão inscritos em projetos de desenvolvimento econômico. Ações públicas e
privadas que garantam a expansão do capitalismo na expropriação do trabalho para a a
extração de mais valor, ao tempo que se inscreve na escala do capital financeiro mundial.
Adequando-se aos princípios fundamentais do modelo neoliberal as políticas do
Estado incorporam de forma estrutural às necessidades da expansão do capital no mercado
mundial, ocupando lugar estratégico nas táticas via políticas de crédito e de desenvolvimento,
vislumbrando uma nova proposta de desenvolvimento nacional com a utilização da política
cambial, fiscal e creditícia, base necessária para a modernização da produção industrial e
fortalecimentos das commodities. Nessa perspectiva é que o agronegócio apresenta-se como
alternativa para o campo, representando a principal via para a agricultura sob o discurso
hegemônico comandado pelo Banco Mundial.
Nesses últimos anos o Estado tem garantido à infraestrutura necessária a expansão do
capital por meio de uma série de políticas e projetos de integração nacional, com a proposta
de difundir tecnologia e com o discurso de gerar desenvolvimento, voltadas para o
crescimento agrícola com o objetivo da produção para exportação, a fim de equilibrar a
balança comercial brasileira e paralelamente atender a dinâmica e as necessidades de
mobilidade do capital nacional associado ao capital internacional. O objetivo é atrair mais
investimentos e oferecer mercado e mercadorias para garantia do processo de acumulação
flexível.
Essa realidade pode ser evidenciada com o Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC), que trata de uma intervenção e projeto do Estado, mais direcionado para a economia
(mesmo que em direção aos setores sociais), atendendo em maior parte as necessidades da
produção de mercadoria e demandas do mercado de capital, seguindo o modelo neoliberal.
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e sua Propositura de Desenvolvimento e
Estabilidade Econômica
As argumentações que fundamentam o Programa de Aceleração do Crescimento
estão relacionadas a uma política de desenvolvimento e crescimento econômico, de modo a
integrar todo o país em um projeto de envergadura nacional com rebatimentos internacionais.
O que buscamos refletir é a relação estabelecida do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC), com o Estado e sua funcionalidade no processo de acumulação do capital, enquanto
política pública de desenvolvimento. Nesse interim emerge pontuar que o PAC foi criado em
20071, e teve como objetivo segundo suas diretrizes, retomar o planejamento, na execução de
grandes obras de infraestrutura social, urbana, logística e energética do país, com uma carteira
de mais de 40 mil empreendimentos e volume de investimentos expressivo (previsão inicial
de R$ 503 bilhões), com o propósito de contribuir para a elevação das taxas de crescimento
econômico no país.
O PAC é um programa de desenvolvimento que defende e segundo sua proposta visa
promover o crescimento econômico acelerado, o aumento do emprego e a melhoria das
condições de vida da população brasileira. Para tal proposta ele define um conjunto de
medidas destinadas a incentivar o investimento privado, aumentar o investimento público em
infraestrutura e remover obstáculos (burocráticos, administrativos, normativos, jurídicos e
legislativos) ao crescimento econômico. Defende a manutenção de determinados fundamentos
econômicos, principalmente a estabilidade monetária, a responsabilidade fiscal e a baixa
vulnerabilidade externa.
O PAC busca desenhar um ambiente favorável aos investimentos e a aplicações de
recursos, com medidas de curto, médio e longo prazo. Assim condiciona um clima de
estabilidade e segurança para a realização de investimentos. Para alcançar o proposto, as
medidas do PAC estão organizadas em cinco blocos: 1) Investimento em Infraestrutura; 2)
Estímulo ao Crédito e ao Financiamento; 3) Melhora do Ambiente de Investimento; 4)
Desoneração e Aperfeiçoamento do Sistema Tributário; 5) Medidas Fiscais de Longo Prazo.
Assim, acreditou-se ter o governo desenhado políticas para orientar e criar as condições
necessárias ao aumento do investimento privado.
1
O Programa de Aceleração do Crescimento teve sua 1ª edição entre os anos de 2007 a 2010, a sua segunda
edição entre os anos de 2010 a 2014, estando na terceira edição de 2014 – 2018 todas estas dando sequência e
ampliado o projeto inicial.
O PAC se coloca numa conjuntura de possibilidades reais de crescimento econômico
e de melhoria nos indicadores socioeconômicos do país (2003-2006), baseado em um modelo
de desenvolvimento neoliberal, onde os indicadores apontavam para um maior consumo de
bens e serviços. Momento em que o Brasil ocupava um lugar importante na venda de
commodities e era um dos principais importadores do mundo.
Trata-se de um conjunto articulado de medidas no setor econômico, pelas quais o
governo estabeleceu metas para o crescimento (5% ao ano), mas para alcançar tais metas o
próprio governo propôs a instalação de uma série de medidas que tem como propósito
enfrentar os chamados pontos de estrangulamento do crescimento. Os pontos de
estrangulamento se concentram na insuficiente infraestrutura, principalmente nos setores de
transporte e energia, além do “baixo” nível de crédito e recursos para o financiamento nas
áreas dos investimentos, dos aspectos regulatórios, ficais e tributários. Assim, cumpriria um
caráter econômico que vise à estabilidade e o cumprimento dos acordos internacionais.
Para Kupfer (2007), com o PAC o governo resolveu começar a governar,
assim como para Sucsú (2007), que acredita que os montantes indicados no
PAC para o investimento público não são absolutamente notáveis, mas são
muito superiores àqueles realizados nos últimos anos. As criticas se voltam
principalmente para a intervenção pontual na economia e pela não ruptura
com os ideais neoliberais (SANTOS et al., 2010) (RODRIGUES,
SALVADOR, p. 131, 2011).
Nesse sentido, observa-se a retomada e importância do papel do Estado como indutor
do crescimento econômico, fazendo movimentos estratégicos na infraestrutura econômica ao
mesmo tempo que também se percebe o evidente limite desse papel frente à manutenção do
modelo econômico neoliberal.
As políticas públicas traduzem mediações entre os interesses, diretamente ligadas ao
modelo econômico e a constituição de fundos públicos, que assumem aspectos estratégicos na
reestruturação produtiva. Trata-se de processos dinâmicos que envolvem negociações,
pressões e alianças (TEXEIRA, 2002). Nesse contexto é que o Banco Nacional e
Internacional tornam-se verdadeira autoridade.
Mészàros (2011) aponta o Estado como agente fundamental no processo de
reprodução e ampliação do capital, fazendo-se presente e ativo na aplicação de novas metas e
estratégias de mercado, assumindo ainda a garantia para que tais estratégias se realizem, e
assim fortalecendo ainda mais o capital internacional.
A tríade Política Pública – Capital – Trabalho, aparentemente perfeita e de caráter
democrática, tem em sua ordem a expressão do domínio de uma classe. As condições de
pobreza e exploração, em detrimento da elevação das taxas de crescimento econômico
demonstram que as desigualdades são fundamentais para a reprodução ampliada do capital.
Ao mesmo tempo em que o Estado é parte integrante e fundamental nas relações capitalistas
de produção, ele também é o grande defensor da manutenção das mesmas, criando condições
para minimizar o conflito entre classes. Ficando claramente evidenciado o Estado como forte
pilar de sustentação do capitalismo, garantindo as condições de produção e reprodução do
capital, assegurada pela sua legitimidade e controle social.
A associação do grande capital agroindustrial com a grande propriedade
fundiária realiza a estratégia econômica do capital financeiro com o objetivo
acumulativo do lucro e da renda da terra, associação possibilitada pelo
Estado ao assumir políticas estratégicas estruturadas em programas de
investimentos em infraestrutura territorial (CONCEIÇÃO, 2013, p.07).
Com o objetivo de expandir-se, o capital cria no seu sistema de exploração formas
destrutivas na tentativa de superar todas as barreiras que dificultem a sua reprodução, o seu
objetivo é a criação de mais valor absoluto e relativo. “No entanto, a criação de valor depende
da capacidade de realiza-la através da circulação. O insucesso da realização de valor significa,
simplesmente, a negação do valor criado potencialmente na produção” (HARVEY, 2005, p.
72/74).
Em 2007 ao anunciar o Programa de Aceleração e Crescimento da Economia, o
Governo Lula da Silva afirmou ser o PAC uma política em contraposição a política
econômica neoliberal. Entretanto o que se tem constatado é que, os programas do PAC, antes
de sinalizar desenvolvimento e melhoria da classe trabalhadora no padrão neokeynesiano, ele
se enquadra nos velhos esquemas de beneficiamento do setor bancário, afinando-se com as
antigas políticas neoliberais. O que se constata é um aumento exacerbado de lucros, com
elevadas taxas de juros sob o controle e influência de uma “dívida pública” e as taxas de
câmbio, controladas pelo capital comercial e financeiro.
Os investimentos em infraestrutura aparecem como um dos pontos centrais do
programa, do ponto de vista das prioridades direcionando os recursos para os gargalos, ou
seja, para os impedimentos do aumento do nível das atividades econômicas centrais,
estimulando o crescimento constante da economia brasileira e ampliando a capacidade
produtiva. Os gargalos principais apontados são o precário fornecimento de energia e a
infraestrutura e logística de transportes no geral. Mesmo sendo energia e transporte os pontos
fortes no setor de infraestrutura, essa ainda conta com as necessidades de investimentos
direcionados ao saneamento básico, habitação popular e infraestrutura urbana.
Sendo o PAC considerado o maior programa de investimentos estratégicos do Brasil
nas últimas quatro décadas2, a infraestrutura é apresentada com o objetivo de aumentar o
investimento, eliminar os principais gargalos que podem restringir o crescimento da
economia, reduzindo os custos e aumentando a produtividade das empresas, o que estimularia,
consequentemente, o aumento do investimento privado e provocaria uma redução nas
desigualdades regionais, ressalta-se que a maioria das obras é de caráter nacional. As
condições fiscais permitiria o aumento do investimento do Governo Federal sem comprometer
a estabilidade fiscal. Para atender tal questão foi criado um Comitê gestor para
acompanhamento e avaliação dos projetos de investimento do PAC. Salienta-se que, dentro
do bloco da infraestrutura se concentram a logística, energia e infraestrutura social.
As ações e metas de implantação do Programa estão direcionadas as medidas que
facilitam e incentivam o investimento privado, conjuntamente com um amplo investimento
público em setores de infraestrutura e desenvolvimento econômico. Essas medidas estão
unidas a redução da taxa de juros de longo prazo e a redução dos spreads dos bancos
(BNDES, Caixa...) para infraestrutura3. Assim estimulando o crédito e o financiamento
proposto pelo PAC. Além desses elementos, o Estado assume o papel de aperfeiçoar o marco
regulatório e o sistema de defesa da concorrência.
O desenvolvimento do mercado de crédito é parte essencial para esse tipo de
desenvolvimento econômico e social, por isso faz parte do projeto o estímulo ao Crédito e ao
Financiamento. Nos últimos anos o Governo Federal adotou uma série de medidas que
resultaram na expansão do volume de crédito (bancário e mercantil) e do mercado de capitais.
O objetivo desde o ano de 2008 e nos anos seguintes é dar continuidade ao aumento do
volume de crédito, sobretudo o crédito habitacional. e do crédito de longo prazo para
investimentos em infraestrutura, no entanto por conta da crise política e econômica esse
cenário sofre algumas alterações.
Para obter sucesso no projeto, novas medidas de estímulo ao crédito e ao
financiamento foram tomadas, a exemplo e com destaque a concessão pela União de crédito à
2
Caderno de Apresentação do PAC à Imprensa, Secretaria de Imprensa e Porta-Voz da Presidência da
República, Brasília-DF, Janeiro de 2007.
3
A redução de spreads do BNDES é uma medida que reduz o custo do financiamento em de projetos
especialmente nos setores de energia, ferrovias, rodovias, aeroportos, portos, terminais, transporte urbano
integrado e saneamento básico.
Caixa Econômica Federal (CEF) para aplicação em saneamento e habitação (R$ 5,2 bi – MP).
Além disso, ouve a ampliação do limite de crédito do setor público para investimentos em
saneamento ambiental e habitação (R$ 7,0 bi – Resoluções CMN) e a criação do Fundo de
Investimento em Infraestrutura com recursos do FGTS (R$ 5,0 bi – MP), destacando também
a elevação da liquidez do Fundo de Arrendamento Residencial (MP), como aponta o Relatório
de Medidas Institucionais do PAC (BRASIL, 2007).
Segundo Rodrigues e Salvador (2011), o PAC se apropria de parcela dos recursos do
Estado destinadas as politicas públicas sociais para direcioná-las a manutenção de uma
política econômica que prioriza o pagamento dos serviços de uma dívida (juros e
amortização), fragilizando os direitos sociais porque retiram recursos da Seguridade Social e
da Educação.
A pretensão do PAC foi de introduzir no país um novo conceito de investimentos em
infraestrutura,
fazendo
dessas
obras
estruturadoras
instrumentos
para
o
neo-
desenvolvimentismo. Sua meta é a de estimular a produção nos principais setores da
economia, acelerando as áreas que já estão em expansão no país e começando obras que estão
em estado de repouso, gerando segundo sua proposta, uma melhor integração dos diversos
estados da federação e atração de outros países, através de parcerias entre os vários poderes
executivos e os investimentos privados.
As medidas tributárias do PAC limitam-se a pequenas isenções fiscais à
determinados setores, muitos deles altamente oligopolizados (como por exemplo, os ligados
ao aço), que irão aumentar suas margens de lucros com tais isenções, não repassando as
desonerações para os preços de bens e serviços oferecidos ao consumidor final.
A alta taxa de juros o maior obstáculo a ser enfrentado tanto na execução do
PAC como para o próprio crescimento do país, pois eleva a dívida pública,
atrapalha o crescimento e reduz a disponibilidade de recursos para
investimento público. Mesmo que o PAC represente uma visão fiscal mais
desenvolvimentista, o governo ainda mantém uma política de estagnação
econômica com juros elevados, câmbio valorizado e gastos sociais limitados
(SICSÚ, 2007).
Em 2007, das 627 obras autorizadas, 348 (55%) tiveram entre 0,00% e 1% de
execução. Já em 2010 das 670 obras, 266 (39%) ficaram nessa faixa de execução, sendo que
muitos desses projetos se referem à área de saneamento e abastecimento de água. Segundo o
11º Balanço do PAC 1 (BRASIL, 2010) e o 10º Balanço do PAC 2 (2014), os investimentos
no setor de energia foram os que mais se aproximaram das metas iniciais, chegando a 87%
dos 12.386 MW de energia elétrica previstos, construídos 3.776 km dos 4.526 km de gasoduto
e instaladas 87 das 123 usinas de combustíveis renováveis esperadas, entre outras ações. Dos
2.518 km de ferrovias prometidos, apenas 909 km foram entregues.
Rodrigues e Salvador (2011), utilizando-se dos dados dos valores de investimentos
dos setores, desde as entradas e a execução das obras, estes afirmam que existe um hiato entre
a propaganda e a execução, pois o que se vê é um grande investimento na divulgação do PAC
e a tentativa de supervalorização de suas ações, e uma baixa efetividade das propostas.
Quando lançado em 2010, o PAC 2 tinha investimento previsto de R$1,59 trilhão,
sendo R$ 955 bilhões para o período de 2011-2014 e R$ 631,4 bilhões para o período pós
2014, no entanto chega a sua segunda edição com a mesma meta de compromissos que o PAC
1 – realizar a infraestrutura que eleve a competitividade do país; gerar empregos; resgatar o
papel do Estado como indutor do desenvolvimento; incentivar investimentos públicos e
privados; reduzir as desigualdades regionais do Brasil –, porem numa condição de obras mais
avançadas e numa mudança do quadro macroeconômico.
Acenava-se para um cenário econômico de crescimento e aparente estabilidade, até
então atrativo, com um poder de consumo crescente e robusto, mas com previsões de
desaceleramento. Justificavam que mesmo que o PAC 2 iniciasse com um índice de
exportação crescente e recuperação do comércio mundial com o aumento nas importações, a
perspectiva, para os próximos anos era muito otimista, haveria um crescimento moderado. A
economia mundial, nessa análise, representa o fator de moderação para o crescimento da
economia brasileira. Sendo os fatores que mais influenciavam:
a) forte concentração do PIB dos EUA, com o desequilíbrio financeiro; b)
desacelerações na China; c) lenta recuperação na área do EURO, significando um baixo
crescimento econômico.
A China iniciou o ano de 2014 com uma desaceleração econômica, resultante dos
problemas relativos ao sistema financeiro local, que se deteriorou após a crise de 2008. Mais
recentemente vem apresentando problemas com calotes corporativos e com enfraquecimento
do setor imobiliário. Essa desaceleração chinesa tem um significado de desaceleração para a
economia de toda a América Latina, tendo em vista que isso favoreceu uma piora na balança
comercial. Os países latinos são fortes dependentes das exportações de commodities para a
China, somado aos gargalos econômicos relacionados à infraestrutura e ao mercado de
trabalho bastante apertado.
O primeiro trimestre do ano de 2014 ainda apontava que o comércio mundial ainda
cresceria lentamente durante o ano, mas num contexto internacional de dificuldades.
Há em curso um período de transição da economia mundial, com melhores
perspectivas de crescimento nas principais economias desenvolvidas,
conjugado a um processo de normalização das condições monetárias e
financeiras, já iniciado nos Estados Unidos e prestes a começar no Reino
Unido. Os principais riscos à consolidação deste cenário estão relacionados:
(i) à normalização da política monetária norte-americana que, se não for bem
conduzida, poderá prejudicar a recuperação; (ii) ao risco de deflação na Área
do Euro; e (iii) ao risco de desaceleração mais forte da economia chinesa
(BRASIL, 2014, p. 10).
Onde se aponta para um crescimento favorável alerta-se também para os riscos de
consolidação desse cenário. Riscos esses que se concretizam, e que coloca o Brasil, por
exemplo, na mesma zona de risco, visto que não mais consegue manter os fundamentos
macroeconômicos estabelecidos para enfrentar a crise mundial e seus desdobramentos – bases
em metas para inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal. Ou seja, o tripé da política
econômica que mantinha um quadro de solidez, pelo elevado nível de reservas internacionais,
dívida pública líquida cadente, o sistema financeiro doméstico sólido e o mercado de trabalho
robusto, é arriscado e desestabilizado.
A crise mundial que promoveu a variação de custos que afetou não só o agronegócio
e os produtos agropecuários em 2013/2014, mas também os custos de energia elétrica foi
vinculada pelo Comitê de Gestor do PAC, como sendo efeitos climáticos, associados às
pressões, nos primeiros meses de 2014, ao Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA). Os
picos de choque de preços (março de 2014) provocaram variações mensais que estão em
trajetórias de declínio, e provocaram pressões inflacionárias. O Governo Brasileiro afirmou,
naquele momento, que a economia brasileira convivia com custos financeiros historicamente
mais apropriados, que geram efeitos positivos para o desenvolvimento dos mercados de
capitais de longo prazo, em especial os ativos ligados ao investimento produtivo.
A emissão de debêntures4, consolidando uma maior participação da iniciativa privada
como fonte complementar de funding (financiamento) aos projetos de investimento, em
especial aos de infraestrutura. “Em junho de 2014, por exemplo, o Banco do Brasil e o Banco
Votorantim lançaram um FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios) de
debêntures de infraestrutura para financiar, em especial, projetos de concessões federais nas
áreas de energia elétrica, rodovias e aeroportos” (BRASIL, 2014, p. 12).
4
Debênture é um título de crédito representativo de empréstimo que uma companhia faz junto a terceiros e que
assegura a seus detentores direito contra a emissora, nas condições constantes da escritura de emissão. Ou seja,
são certificados ou títulos de valores mobiliários emitidos pelas sociedades representativas de empréstimos
contraídos pelas mesmas, cada título dando, ao debenturista, idênticos direitos de crédito contra as sociedades,
estabelecidos na escritura de emissão.
O governo atuou no campo com estratégias que priorizam o investimento, aplicando
vários incentivos concedidos para a ampliação da capacidade produtiva na economia, a
exemplo a facilidade das condições de financiamento do investimento privado por meio de
vários programas do BNDES, oferecendo condições favoráveis de financiamento para
aquisição de bens de capital.
O PAC se apresenta e constitui-se ainda como um instrumento essencial para garantir
o investimento e como força impulsionadora da política de desenvolvimento. O Programa de
Investimentos em Logística (PIL) – concessões em aeroportos, rodovias, ferrovias, portos e
energia – alinha-se à estratégia do PAC como peça fundamental para a superação dos
gargalos, aumentando a produtividade e competitividade da economia. Os investimentos em
infraestrutura acabam por promover, ainda mais, os investimentos privados em setores
estratégicos e dinâmicos da produção e circulação de mercadorias.
Considerações Finais
O programa é a materialização de uma ação governamental planejada, trata-se da
retomada do Estado como orientador de políticas públicas, para o crescimento econômico
incrementando nas chamadas áreas estratégicas investimentos públicos e estimulando
investimentos privados. O governo se colocou como “ator” no processo de crescimento do
país, com o papel de induzir e direcionar os investimentos que estimulem o crescimento da
economia, vislumbrando mudanças qualitativas no posicionamento e segurança no mercado
internacional.
Contraditoriamente, o que se observa é a manutenção de uma política de
favorecimento ao monopólio na indústria, na agricultura, no comércio. O
mercado instrumentaliza o Estado, e este o instrumentaliza para uma política
perversa de favorecimento das transnacionais. Sustentadas na justificativa da
necessidade da superação da crise as políticas agrícolas nacionais e locais
fazem coro às políticas internacionais sob o comando das instituições
financeiras internacionais que determinam a ampliação das monoculturas
para a produção de agrocombustíveis (CONCEIÇÃO, 2013, p. 85).
Dessa forma, o PAC, assim como outras políticas públicas, não se materializa em
ações deslocadas, mas envolve diversos setores da sociedade. As consequências e impactos da
sua execução não são pontuais, não se limitam apenas no aparente. A execução do programa
ocorre em meio à disputa de recursos do fundo público, seja por meio de desonerações
tributárias e/ou de priorização de ações orçamentárias em detrimento de outras, em um
contexto de crise do capitalismo marcado por décadas de política neoliberal e de predomínio
do capitalismo financeiro.
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