40 ARTIGO ORIGINAL Josele Rodrigues Freitas Patologias mamárias na adolescência A telarca é definida como o início do desenvolvimento mamário na mulher. A variação de idade normal para o seu início vai dos 8 aos 14 anos de idade, com média em torno dos 11 anos. Usualmente o primeiro sinal de puberdade, é seguida, dentro de seis meses, pela pubarca e, em dois a quatro anos, pela menarca(2). Não é incomum um desenvolvimento assimétrico, com a outra mama só começando seu desenvolvimento após seis meses. O aparecimento inicial da pubarca antes da telarca não é anormal nem incomum. Os estágios do desenvolvimento mamário foram descritos por Marshall e Tanner, que estabeleceram um excelente sistema para a avaliação do desenvolvimento mamário(3). O exame mamário deve fazer parte da rotina dos cuidados médicos, com inspeção e palpação das mamas, levando em conta o estadiamento de Marshall e Tanner em relação à idade cronológica. A técnica para o exame na adolescente não se diferencia da realizada na mulher adulta. Muitas adolescentes preferem que o exame seja feito sem a presença da mãe e/ou responsável. O médico, junto com a paciente, determina quem deve ficar durante o exame(1). Essa é uma oportunidade para explicar, tanto para a adolescente quanto para a acompanhante, o desenvolvimento mamário normal, identificar alguma anormalidade e rever alguns conceitos que a paciente possa ter. Nessa faixa etária deve-se ser prudente diante de uma patologia mamária(6). A observação e a contemporização por um tempo razoável serão benéficas. Somente cabe administrar tratamentos hormonais a casos em que essa terapia seja considerada imprescindível, o que raramente ocorre(5). As indicações de cirurgias devem ser bem pensadas, visto que o que pode parecer um tumor Professora-assistente da disciplina de Ginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Rio de Janeiro (FCM/UERJ); mestra em Endocrinologia pela UERJ; responsável pelo Setor de Ginecologia Infanto-Puberal da disciplina de Ginecologia da FCM/UERJ. 1 volume 4 nº 2 abril 2007 muitas vezes é o broto mamário em desenvolvimento glandular, que desaparecerá oportunamente. Deve-se acalmar a paciente e seus familiares(4). QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO • Exame clínico minucioso com inspeção e palpação das mamas, axilas e linha mamária embrionária; • punção/aspiração com agulha fina: serve para esvaziamento de cisto e pesquisa do material para cultura e citologia; • ultra-sonografia: excelente recurso para avaliação de cistos e nódulos sólidos; • mamografia nas adolescentes: não é rotineiramente indicada, visto que o parênquima mamário em desenvolvimento, ainda com pouco componente de tecido gorduroso, compõe-se normalmente de tecido denso fibroglandular, além do baixo risco para doença maligna. A Tabela 1 apresenta as principais patologias mamárias encontradas nessa faixa etária. Tabela 1 PRINCIPAIS PATOLOGIAS MAMÁRIAS NA ADOLESCÊNCIA Agenesia mamária Amastia mamária Assimetria mamária Deformidade tuberosa Atrofia mamária Hipertrofia juvenil ou virginal Mastalgia ou mastodinia Mastite ou abscesso mamário Galactorréia ou descarga papilar Fibroadenoma Cisto mamário Politelia (mamilos acessórios) Polimastia (mamas acessórias) Adolescência & Saúde Freitas AGENESIA MAMÁRIA A agenesia mamária congênita, condição clínica extremamente rara, consiste na ausência completa da mama, uni ou bilateralmente. Pode ser devida a alterações cromossomiais, deficiência de gonadotrofinas ou hiperplasia adrenal congênita. O tratamento é realizado por meio de cirurgia estética, com retalho miocutâneo, prótese artificial, criação de aréola e mamilos artificiais com os pequenos lábios vulvares, de forma adequada e harmônica. AMASTIA MAMÁRIA A amastia se caracteriza pela presença de aréola e mamilo e ausência do tecido mamário e do músculo peitoral, devendo ser pesquisadas alterações cromossomiais. O tratamento é realizado por cirurgia estética, com retalho miocutâneo, prótese artificial de forma adequada e harmônica. ASSIMETRIA MAMÁRIA Nesses casos a paciente deve ser acompanhada até o completo desenvolvimento mamário, que se dará aos 18 anos de idade, quando estiver no estágio V de Tanner. Devido aos problemas psicológicos que podem ocorrer, sugere-se o uso de prótese no sutiã para que haja equilíbrio estético. Mamoplastia com prótese cirúrgica pode ser realizada na época ideal. PATOLOGIAS MAMÁRIAS NA ADOLESCÊNCIA 41 ATROFIA MAMÁRIA O tamanho e a forma das mamas são controlados por algumas variáveis, incluindo fatores genéticos, sempre com o cuidado de aguardar a idade do completo desenvolvimento. Devido ao fato de as mamas serem compostas principalmente de tecido gorduroso, existe uma associação entre o tamanho da mama e o peso. Perda significativa de peso pode resultar em diminuição do volume mamário. A atrofia mamária pode ser devida a outras causas, incluindo sintomas de hipoestrogenismo e virilização. Quando doenças sistêmicas levam à atrofia mamária, ela pode estar associada a perda de peso, catabolismo e/ou hipoestrogenismo. HIPERTROFIA JUVENIL OU VIRGINAL Esse termo refere-se a um desenvolvimento patológico das mamas que pode ser uni ou bilateral, além de ter caráter familiar. Decidir quando as mamas estão muito grandes é subjetivo, porém algumas pacientes as desenvolvem de tal maneira, que chega a interferir em seu estado físico e psicológico. Desenvolvimento rápido e maciço das mamas resulta em dor, ferimento nos ombros, hipovascularização, cifose postural, intertrigo e estrias. A paciente será beneficiada tanto física quanto psicologicamente com a mamoplastia redutora. MASTALGIA OU MASTODINIA DEFORMIDADE TUBEROSA Essas pacientes têm volume mamário pequeno, com desenvolvimento e protuberância muito grande da aréola, uni ou bilateralmente. Nelas não é possível estabelecer o desenvolvimento mamário através do estadiamento de Tanner. Nesses casos, os critérios para determinar a época ideal para uma cirurgia estética devem levar em conta o estágio puberal, a menarca, o crescimento somático e a idade óssea. Adolescência & Saúde A dor mamária pode ser causada por terapia à base de estrogênio, trauma, hipertrofia, infecção e afecção funcional benigna das mamas (AFBM). Contraceptivos hormonais, principalmente os de dose alta, têm sido relacionados com a mastalgia, devendo-se nesses casos tentar o uso de baixa dosagem ou outro método anticoncepcional não-hormonal. Dores mamárias não-específicas têm sido tratadas com vitamina E, porém ainda não se demonstrou a eficácia real dessa terapia. Pacientes com mastalgia devido à AFBM têm-se beneficiado quando evitam volume 4 nº 2 abril 2007 42 PATOLOGIAS MAMÁRIAS NA ADOLESCÊNCIA consumir cafeína e derivados de leite. No tratamento, o uso de sutiã mais elevado (sustentando melhor as mamas), analgésicos e antiinflamatórios não-hormonais (AINHs) são atualmente a melhor opção. MASTITE OU ABSCESSO MAMÁRIO Embora a mastite seja mais comum nas pacientes que estão amamentando, essa infecção bacteriana pode ocorrer em mulheres não-lactantes, inclusive nas adolescentes. As causas mais comuns são trauma, retirada de pêlo ou ato de coçadura da região periareolar. Sinais de inflamação (dor, calor, rubor) com áreas endurecidas devem ser tratados com analgésicos, AINHs e antibiótico de largo espectro. Drenagem cirúrgica é indicada nos casos de abscesso. GALACTORRÉIA OU DESCARGA PAPILAR O diagnóstico diferencial de galactorréia deve ser feito com gravidez, lactação, hiperprolactinemia, hipotireoidismo e galactorréia benigna. Nos casos de galactorréia, descartar a ingesta de medicamentos hiperprolactinêmicos e dosar a prolactina (basal e/ou pool da prolactina). Se ela estiver alterada, pesquisar sela túrcica através de raios X de crânio e/ou tomografia computadorizada cerebral. Causas de descarga papilar: infecção, papiloma intraductal (geralmente produz um fluido serossanguinolento), cisto mamário e secreção das glândulas areolares. O tratamento será determinado com a etiologia. Freitas FIBROADENOMA É a mais comum alteração mamária nessa faixa etária. Clinicamente é um tumor benigno, bem delimitado, endurecido e móvel. Pode desaparecer espontaneamente, porém, se, depois de observado durante alguns meses, não desaparecer e até aumentar, está indicada a exérese cirúrgica. CISTO MAMÁRIO A presença de cisto pode ser detectada pela ultra-sonografia. O tratamento é realizado através de punção com estudo citológico. POLITELIA (MAMILOS ACESSÓRIOS) A politelia é a mais comum anomalia das mamas, com presença de mamilo e aréola ao longo da linha mamária embriológica, que vai da axila à virilha. Comumente aparece um complexo mamilo/ aréola pouco desenvolvido logo abaixo da mama, podendo ser uni ou bilateral. O único tratamento, quando necessário, é cirúrgico. POLIMASTIA (MAMAS ACESSÓRIAS) Polimastia, isto é, tecido mamário acessório, é menos comum e pode-se tornar um problema na puberdade ou durante a gravidez e a amamentação. Quando isso ocorre, devido ao crescimento desse tecido extramamário, torna-se necessária a exérese cirúrgica. REFERÊNCIAS 1. Emans SHJ, Goldstein DP. Pediatric & adolescent gynecology. Boston: Little, Brown and Company.1990. 2. Garden AS. Pediatric & adolescent gynecology. London: Arnold Publishers. 1998. 3. Kreutner AKK, Hollingsworth DR. Adolescent obstetrics & gynecology. Chicago: Year Book Medical Publishers. 1978. 4. Sanfilippo JS, Murram D, Dewhurst J, Lee PA. Pediatric and adolescent gynecology. Philadelphia: W.B. Saunders. 1994. 5. Tourinho CR, Bastos AC, Moreira AJ. Ginecologia da infância e adolescência. 2. ed. São Paulo: Byk-Procienx. 1980. 6. Zeiguer BK. Ginecologia infanto-juvenil. Buenos Aires: Ed. Med. Panamericana. 1977. volume 4 nº 2 abril 2007 Adolescência & Saúde