UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ RAQUEL SANTOS MONTE HANSENÍASE: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PESSSOAS ACOMETIDAS SOB A ÓTICA DE GÊNERO FORTALEZA - CEARÁ 2011 RAQUEL SANTOS MONTE HANSENÍASE: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PESSSOAS ACOMETIDAS SOB A ÓTICA DE GÊNERO Dissertação apresentada ao Curso Mestrado Acadêmico Cuidados Clínicos em Saúde, da Universidade Estadual do Ceará, para apreciação por Banca Examinadora, no Exame Geral de Conhecimentos. Área de Concentração: Enfermagem. Cuidados Clínicos e Linha de Pesquisa: Processo de Cuidar em Saúde e Enfermagem. Orientadora: Profa. Dra. Maria Lúcia Duarte Pereira FORTALEZA-CEARÁ 2011 RAQUEL SANTOS MONTE HANSENÍASE: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PESSSOAS ACOMETIDAS SOB A ÓTICA DE GÊNERO Dissertação apresentada ao Curso Mestrado Acadêmico Cuidados Clínicos em Saúde, da Universidade Estadual do Ceará, para apreciação por Banca Examinadora, como requisito parcial para a obtenção do grau de mestre em Cuidados clínicos em Saúde. Aprovada em: 05/12/2011 BANCA EXAMINADORA ________________________________________________ Profa. Dra. Maria Lúcia Duarte Pereira (Orientadora) Universidade Estadual do Ceará - UECE ________________________________________________ Profa. Dra. Elisabete Pimenta Araújo Paz Escola de Enfermagem Anna Nery - Universidade Federal do Rio de Janeiro – EEAN/ UFRJ ________________________________________________ Profa. Dra. Dafne Paiva Rodrigues Universidade Estadual do Ceará – UECE ________________________________________________ Profa. Dra. Jaqueline Caracas Barbosa Universidade Federal do Ceará – UFC Ao meu esposo, Stenio, por ser meu porto seguro, pelo apoio incondicional, paciência, sábios conselhos e pelas demonstrações de amor diárias. À minha filha, Beatriz, pelo estímulo que ela é na minha vida e por toda felicidade que me trouxe nos momentos mais difíceis. AGRADECIMENTOS A Deus, pois é essa dimensão espiritual que nos impulsiona em todos os momentos da vida. À minha família, Gorett, José e Ana por compreenderem os momentos de ausência. A todos os colegas do Curso de Mestrado, pela amizade e apoio para me dizerem que vai dar tudo certo no final. À minha orientadora, Maria Lúcia Duarte Pereira, com a qual aprendi a respeitar ao longo destes dois anos pela extrema capacidade de realizar com extrema competência ações simultâneas, e pela qual nutro, além de sincera admiração, uma amizade verdadeira. Aos professores do Curso de Mestrado, pelos seus saberes e por todos os ensinamentos recebidos. À Universidade Estadual do Ceará, por abrir seus braços para me receber de volta aos seus bancos sempre que necessito. A todos os sujeitos entrevistados por terem compartilhado comigo um pouco de suas histórias de vida, trazendo-me grande ensinamentos. “Meu cavaquinho/ foi sem segredo, quando eu tocava com a ponta dos meus dedos Hoje eu não toco/ está calado/ mas não adianta reclamar ou revoltar Meu cavaquinho encoroado/ Foi pendurado pois não posso mais tocar Ao perceber que meu tato eu perdia, duas lágrimas rolaram/ lá se foi minha alegria Logo pensei o que vou fazer? A vida segue, não resolve se eu chorar Nada me impede/ da música eu gosto, dela eu não vou deixar Meu cavaquinho não vai parar/ Se eu não toco outros deverão tocar Logo então eu passei a ensinar/ multipliquei o que era um/ hoje são muitos a tocar Se há semente o chão não morre/ dará bons frutos/ e muita gente dela irá saborear Meu cavaquinho/ pequenininho/ é a semente que Deus quis plantar No seu cantinho, enferrujado, coitadinho/ passa o dia lá no céu/ um dia Deus irá tocar”. (Paulo Luiz Domingues) Ex-interno e morador da Casa de Saúde Santa Izabel (CSSI) RESUMO A lepra, atualmente denominada hanseníase é uma doença milenar que sempre esteve associada ao estigma. Os objetivos deste trabalho foram: apreender as representações sociais sobre hanseníase elaboradas por seus portadores e analisar como se estruturam as representações sociais sobre hanseníase para seus portadores e suas significações, considerando as questões de gênero. Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva, com abordagem multimétodos, fundamentada pela Teoria das Representações Sociais. Foi desenvolvida em Fortaleza- CE, em um Centro de Referência Macrorregional Nordeste em Dermatologia. Participaram 100 sujeitos, divididos em dois grupos: masculino e feminino. As técnicas utilizadas para a coleta de dados foram: Teste de Associação Livre de Palavras (TALP), entrevista semiestruturada e observação livre. O período da coleta de dados foi de março à maio de 2011. Os dados resultantes das entrevistas foram submetidos à análise de conteúdo temática, tendo como base os pressupostos de Bardin. As informações coletados por meio do TALP foram analisados pelos softwares EVOC, SIMI e AVRIL, para acesso da estrutura da representação social. Na análise de conteúdo, emergiram cinco categorias: concepções sobre hanseníase, percepções sobre a doença, convivendo com a hanseníase, aspectos relacionados ao tratamento e enfrentamento da hanseníase. As representações sociais apreendidas permitiram identificar que aspectos as mulheres representaram como “doença nojenta”, que afasta as pessoas e gera preconceito, para si e para as demais pessoas da sociedade. Os homens a representaram como “doença rejeição” e relataram maior preocupação com as mudanças em suas rotinas, como o fato de não poder beber, expor-se ao sol e adaptarem-se a uma rotina de medicação e consultas de saúde. O núcleo central foi constituído pelas palavras cansaço, cuidado, cura, desconhecer, doença, dor, medo, preconceito e ruim. Estas corroboraram com a análise de similitude elaborada pelo AVRIL que na árvore máxima apresenta as palavras tratamento, mancha, cura, doença e preconceito. Para as mulheres, a palavra principal evocada foi família. Esta no teste de similitude obteve conexão com (a) exclusão. Para os homens, o núcleo central foi composto por família, trabalho e tratamento, palavras que possuem relação entre si, pois, por meio do tratamento, o portador pode manter-se trabalhando para prover a família. Concluiu-se que o modelo de saúde e, principalmente de enfermagem, deve buscar a compreensão do cotidiano do ser portador de hanseníase, aprendendo a lidar com as diferenças de gênero, utilizando ações educativas e avancem em direção à humanização do cuidado por meio de ações contextualizadas, sendo consideradas as diferenças de gênero. Palavras-chave: Hanseníase. Representações Sociais. Gênero. Enfermagem. ABSTRACT Leprosy, now called Hansen's disease is an ancient disease that has always been associated with stigma. The objectives of this study were to understand the social representations on leprosy elaborated by their carriers and analyze how social representations of leprosy are structured to their carriers and their meanings, considering gender issues. This is an exploratory and descriptive research, with multi-method approach, based on the Theory of Social Representations. It was carried out in Fortaleza-CE, Brazil, in a Reference Center on Dermatology of the Northeast Macro-regional. 100 subjects participated, divided into two groups: male and female. The techniques used for data collection were: Words Free Association Test (WFAT), semi-structured interviews and free observation. Data collection happened from March to May 2011. Data resulting from the interviews were submitted to thematic content analysis, based on Bardin assumptions. The information collected through the WFAT was analyzed by the softwares EVOC, SIMI and AVRIL, to access the structure of social representation. In content analysis, five categories emerged: concepts on leprosy; perceptions on the disease; living with leprosy; issues related to treatment; and coping with leprosy. Social representations apprehended in this study allowed identifying which aspects women represented as "disgusting disease", which puts people away and creates prejudice for themselves and others in the society. The men represented it as a "rejection disease" and reported greater concern about changes in their routines, such as not being able to drink, expose to the sun and adapt to a routine of medication and health consultations. The nucleus of the representation was formed by the words fatigue, care, healing, unaware, disease, pain, fear, prejudice and bad. These words corroborated with the similarity analysis prepared by AVRIL that presented in the maximum tree the words: treatment, rashes, cure, disease and prejudice. For women, the main word mentioned was family. This was connected with exclusion in the similarity testing. As for men, the core was composed of family, work and treatment, words that are related to each other, because, through treatment, the carrier can keep working to provide for his family. It was concluded that the health model, especially in nursing, must seek to understand the daily life of leprosy patients, learning to deal with gender differences, using transformative educational activities that advance toward the humanization of care through actions in context, considering the gender differences. Keywords: Leprosy. Social Representations. Gender Identity. Nursing. LISTA DE TABELAS TABELA 1 Características dos sujeitos constituintes da amostra de acordo com as variáveis sociais e demográficas ..................................................................... 42 TABELA 2 Características dos sujeitos constituintes da amostra de acordo com as variáveis clínicas ............................................................................................. 44 TABELA 3 Distribuição das categorias e subcategorias simbólicas sobre a hanseníase dos grupos feminino e masculino...................................................... 45 TABELA 4 Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de concepções sobre hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino............................................................................................................. 46 TABELA 5 Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de percepção sobre a doença, segundo os grupos feminino e masculino............................................................................................................. 53 TABELA 6 Distribuição das e percentuais da categoria e subcategorias de convivendo com a hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino .......... 56 TABELA 7 Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de aspectos relacionados ao tratamento, segundo os grupos feminino e masculino .......................................................................................... 60 TABELA 8 Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de enfrentando a hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino............................................................................................................. 64 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 Plano de análise ................................................................................ 39 FIGURA 2 Árvore máxima de seis coocorrências .............................................. 71 FIGURA 3 Árvore máxima de 11 coocorrência ................................................. 72 FIGURA 4 Árvore máxima de três coocorrências .............................................. 74 FIGURA 5 Árvore máxima de 2 coocorrências .................................................. 75 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Unidades de análise temática da subcategoria conhecimento sociocultural ........................................................................................................ 47 QUADRO 2 Unidades de análise temática da subcategoria sintomatologia clínica .................................................................................................................. 49 QUADRO 3 Unidades de análise temática da subcategoria Conhecimentos Técnicos e Científicos ......................................................................................... 51 QUADRO 4 Unidades de análise temática da subcategoria aspectos relacionados ao gênero ............................................................................................................. 52 QUADRO 5 Unidades de análise temática da subcategoria conhecimento heteropercepção ................................................................................................... 54 QUADRO 6 Unidades de análise temática da subcategoria conhecimento autopercepção ...................................................................................................... 55 QUADRO 7 Unidades de análise temática da subcategoria alteração na rotina . 57 QUADRO 8 Unidades de análise temática da subcategoria limitações profissionais......................................................................................................... 58 QUADRO 9 Unidades de análise temática da subcategoria educação em saúde como aderência ao tratamento ............................................................................. 60 QUADRO 10 Unidades de análise temática da subcategoria modelo espiritual 63 QUADRO 11 Unidades de análise temática da subcategoria promoção do cuidado é a saída.................................................................................................. 65 QUADRO 12 Unidades de análise temática da subcategoria aceitação da doença ............................................................................................................................. 66 QUADRO 13 Quadro de quatro casas ao termo indutor Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados ........................................................................................... 69 QUADRO 14 Quadro de quatro casas ao termo indutor Ser Mulher com Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados .................................................... 73 QUADRO 15 Quadro de quatro casas ao termo indutor Ser Homem com Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados .................................................... 74 SUMÁRIO 1 APROXIMAÇÃO COM O OBJETO DE PESQUISA ............................... 12 2 REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................... 18 2.1 Hanseníase: o presente de uma doença do passado.................................. 18 2.2 Gênero e hanseníase .................................................................................... 23 2.3 A teoria das representações sociais ............................................................ 27 3 DESENHO METODOLÓGICO ................................................................... 34 3.1 Tipo e natureza do estudo ........................................................................... 34 3.2 Campo de estudo ......................................................................................... 34 3.3 Sujeitos sociais ............................................................................................. 35 3.4 Técnicas e instrumentos para coleta das informações ............................. 35 3.5 Análise dos dados......................................................................................... 36 3.6 Aspectos éticos da pesquisa ........................................................................ 40 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................... 41 4.1 Características sociais e demográficas dos sujeitos .................................. 41 4.2 Características clínicas dos sujeitos ........................................................... 43 4.3 Representações sociais sobre hanseníase................................................... 45 4.4 Estrutura das representações sociais sobre hanseníase pelo teste de associação livre de palavras .............................................................................. 67 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................... 76 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 79 APÊNDICES ...................................................................................................... 88 12 1 APROXIMAÇÃO COM O OBJETO DE PESQUISA Desde os tempos bíblicos ao período moderno, a “lepra” foi descrita como uma doença que causava horror por conta da aparência física do doente não tratado, a saber, lesões ulcerantes na pele e deformidades nas extremidades, associando-se ao estigma, dos mais diversos. A marca de desonra fisicamente presente nas feridas e nos membros desfigurados do leproso e incorporada à sua identificação lançou a doença ao lado mais obscuro da sociedade. A epidemia de “lepra” no Brasil não decresceu com os Leprosários, e as estatísticas continuavam apontando o país como o segundo mais endêmico do globo, arás somente da Índia. Ela expandiu-se de maneira similar a países onde os doentes nunca foram presos e encarcerados. As estatísticas da década de 1960 evidenciaram que a endemia crescia a despeito do número de isolados. Não foi preciso a intervenção dos primeiros medicamentos para que este fosse abolido. Curi (2002) afirma que “o isolamento frustou-se por si próprio”. O mesmo fórum que instituiu o isolamento questionou sua legitimidade e demosntrou sua inutilidade (MACIEL, 2007). A partir de então, o movimento pela desestigmação da doença ganharia força. Ele é adotado por outros, como Fausto Castelo Branco, que passaria a usar o termo “Hansenose”. O movimento para mudar o nome de Lepra para Hanseníase se iniciaria no congresso de Havana, mas só se tornaria possível na década de 1970, impulsionado pelas mudanças conceituais da doença (MACIEL, 2007). Existem dois tipos de portadores de estigma: o indivíduo que possui um estigma não visível, o qual pode manipular ou não a informação sobre a marca que o diferencia o mesmo; e o indivíduo visivelmente estigmatizado, que constantemente se expõe às tensões geradas durante os encontros sociais, constituindo uma interação angustiante não só para o portador como também para as pessoas consideradas normais pela redução de oportunidades, pois o diferente tem o cunha de nocivo/incapaz (BITTENCOURT et al., 2010). Alguns mecanismos são desenvolvidos pelo ser portador de alguma característica que o faz estigmatizado pela sociedade, visando a aceitação do outro. Paradoxalmente, algumas reações emocionais de estigma podem manifestar-se em condutas de afastamento, tanto no que diz respeito ao portador como às pessoas de suas relações sociais (BITTENCOURT, 2010). Na atualidade, a hanseníase ainda representa um grave problema de Saúde Pública no Brasil e em países em desenvolvimento. Historicamente, a hanseníase foi associada à 13 pobreza, à falta de condições de higiene, a questões morais e religiosas e aos castigos divinos que envolviam responsabilidade e culpa pessoal (SANTOS; PARDO, 2006). A hanseníase é uma doença infecto-contagiosa, negligenciada, restrita ao ser humano. Diretamente ligada à pobreza, condições sanitárias e de habitação, visto que a aglomeração de pessoas é responsável pela maior disseminação do bacilo através da via respiratória. Seu diagnóstico é eminentemente clínico e tratamento não exige custos elevados nem instrumentos de maior complexidade tecnológica. Ducatti (2009) reforça que a distribuição da hanseníase pelo mundo só pode ser entendida se analisada na perspectiva de seus determinantes sociais, tais como condições sanitárias, de habitação e de educação sanitária. Diante deste cenário, a informação é uma ferramenta valiosa para o controle desta patologia, já que é plenamente curável. As conseqüências estão diretamente ligadas ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado, baseado em uma poliquimioterapia de uso prolongado e por isto cercada de falhas de adesão (SAVASSI, 2010). O Brasil é o maior responsável pela endemia no continente americano, está entre os 12 países que registraram 90% dos casos no mundo, ocupando o primeiro lugar em incidência e prevalência entre os três países que ainda não eliminaram a doença no mundo (WORLD HEALT ORGANIZATION, 2008). Através das ações de controle o Brasil conseguiu reduzir importantes indicadores que refletem a gravidade da endemia, destacamos: o coeficiente de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos, baixou de 5,89 por 100.000 habitantes em 2008 para 5,43 por 100.000 habitantes em 2009, representando uma redução de 7,8%. A meta definida pelo Brasil foi uma redução de 10% até 2011. Este indicador epidemiológico é considerado o principal por expressar a força de transmissão recente e a tendência da endemia. Porém, Em 2010, o Brasil ainda possui 18,22/100.000 casos novos por habitante (BRASIL, 2010). Dados nacionais revelam que a doença apresenta tendência da estabilização dos coeficientes, mas ainda em patamares muito altos nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste. Classificando o Ceará em décimo lugar do país em número de casos e o terceiro do Nordeste com o índice de 25,34/100.000 habitantes (BRASIL, 2010). A magnitude e transcedência do problema em nosso país fizeram com que a eliminação da hanseníase fosse incluída nas prioridades de gestão do Ministério da Saúde através do Programa de Controle da Hanseníase (PCH). Nos estados brasileiros, na década de 1990, com a efetivação da descentralização, um dos requisitos básicos segundo a Norma 14 Operacional Básica de 1996 (NOB/96), o PCH, foi repassado para a responsabilidade dos municípios (BRASIL, 1996). Nesse contexto, a Estratégia Saúde da Família (ESF) passa a constituir um dos principais eixos responsáveis por realizar medidas preventivas e curativas, visto que a ESF prevê um atendimento multiprofissional à saúde da população de sua área adstrita, inserindose no primeiro nível de ações e serviços do sistema local de assistência à saúde: a atenção básica (CORTEZ; TOCANTINS, 2006). Essa nova estratégia nasce alicerçada em princípios que, se realmente respeitados, serão capazes de provocar a transformação necessária para reorganização das ações e serviços de saúde, em específico, promover a redução da prevalência de Hanseníase no Brasil. O Plano Estratégico para Eliminação da Hanseníase em nível municipal 20062010 está baseado no princípio da sustentabilidade proposto pela OMS. Este Plano apresenta como componente da estratégia a decisão política do Governo do Brasil em alcançar baixos níveis endêmicos dessa doença, assegurando que as atividades de controle da hanseníase estejam disponíveis e accessíveis a todos os indivíduos nos serviços de saúde mais próximos de suas residências. O Brasil vem trabalhando para descentralizar as ações de diagnósticos e de tratamento em grande escala na atenção básica. Os resultados desta iniciativa são demonstrados no aumento da cobertura das atividades de eliminação da hanseníase, o que tem levado muitos casos aos serviços de saúde para tratamento (BRASIL, 2006). Atualmente, o País está diante da necessidade de vencer novos desafios, como integrar as atividades de prevenção e de reabilitação nos serviços prestadores de outros agravos, além de reduzir, de evitar e de inibir ações e atitudes discriminatórias (BRASIL, 2006). A meta da atenção à hanseníase é a sua eliminação, que corresponde atingir taxa de prevalência inferior a 1 caso por 10.000 habitantes, conceito eminentemente epidemiológico, centrado na doença, em cujo o sujeito e seu sofrimento está excluído (LIRA et al., 2005). Trata-se de uma doença que traz representações que transcendem quaisquer definições técnico-científicas ou biomédicas, impregnada por um componente religioso e de crenças inerentes ao termo “lepra” por parte da população leiga e mesmo técnica (RAFFERTY, 2005). Pesquisa desenvolvida por Monte (2010) constatou que quando algumas pessoas são diagnosticadas com hanseníase, ocorre um impacto em suas vidas, traduzido em expressões de tristeza e angústia. Muitos usuários não querem aceitar que estão com a doença e não revelam para outras pessoas sua patologia. Realmente, ao se iniciar o tratamento 15 ocorrem mudanças em seu cotidiano e alterações emocionais, tanto em decorrência do estigma cultural, como também relativas ao tratamento prolongado, que pode durar de 6 a 12 meses, ou se estender até 24 meses em alguns casos. Sá e Paz (2007) corroboram este pensamento ao afirmarem que de modo geral nos serviços de saúde trata-se do portador de hanseníase sem, no entanto, atentar para a complexidade que é ser um portador da doença, como ele a vivencia, suas conseqüências físicas, sociais e psicológicas, o tratamento e os estados reacionais. Dificilmente dá-se conta da singularidade do outro, por mais tecnicamente correta que seja a assistência que se oferece. Parece que se está sempre na esfera da superficialidade, preocupada em tratar, curar e atingir a meta de eliminação, mas a despeito dos esforços técnicos a comunicação entre os doentes e os profissionais ainda não se dá de forma eficaz, e muitos doentes não compreendem as orientações oferecidas nos serviços, tampouco tem suas dúvidas esclarecidas. Assim, acredita-se que estudar as representações sociais da hanseníase, considerando a variável gênero, possibilita aos profissionais maior aproximação com a realidade do sujeito doente a fim de orientar as práticas em saúde no levantamento das reais necessidades de saúde dos usuários e superar as limitações do tratamento físico-biológico, considerando a problemática social agregada à doença (PEREIRA et al., 2008). Apesar de a oposição homem-mulher ser muito antiga nas mentalidades americanas e européias, os conceitos relacionados ao gênero são produtos históricos recentes. Em se tratando de saúde, as mulheres e homens apresentam diferenças significativas entre si, não apenas em termos de necessidades específicas mas também de acesso à proteção à saúde. A doença pode ser um fator desencadeante de mudanças na estrutura familiar, colocando a mulher acometida por hanseníase, em dupla desvantagem, pela discriminação em função do gênero e pelo fato de estar doente. Em 1970, iniciou nos Estados Unidos, o movimento feminista organizado, que denuncia tanto a violência física praticada contra o corpo da mulher, como a simbólica, que faz de seu sexo um objeto desvalorizado. Existe um conjunto de idéias, de imagens e de crenças, que legitima e dá continuidade às diferenças acirradas de papéis sexuais. O movimento vem travando uma luta a fim de acabar com o conceito de “masculino” e “feminino” na sua posição de “superior” e “inferior” (VIVAS, 2006). Face ao exposto e ao assumir o cargo de Enfermeira da Estratégia Saúde da Família (ESF), no município de Fortaleza na Regional V, atuando no Bairro do Bom Jardim, área hiperendêmica para hanseníase no município, deparei-me com uma realidade difícil, pois além do alto número de casos novos a unidade de saúde também possui grande número destes 16 usuários diagnosticados tardiamente, já com quadros instalados de incapacidades e deformidades físicas características da doença. Como agravante desta situação também encontrei casos em crianças menores de quinze anos, três multibacilares no mês de agosto de 2006, período em que fui lotada na referida unidade, evento relevante como anteriormente explicitado e raro, pois esta patologia apresenta um longo período de incubação. Desde então, venho junto com todas as equipes da unidade dando ênfase ao Programa de Controle da Hanseníase, porém a unidade registra números cada vez maiores de pacientes em tratamento. Este contexto me levou a desenvolver um estudo na área de especialização em saúde da família e comunidade (MONTE, 2010), em que se constata que quando algumas pessoas são diagnosticadas com hanseníase, ocorre um impacto em suas vidas, traduzido em expressões de tristeza e angústia. Muitos usuários não querem aceitar que estão com a doença e não revelam para outras pessoas sua patologia. Afirmam, ao se iniciar o tratamento ocorrem mudanças em seu cotidiano e alterações emocionais, tanto em decorrência do estigma cultural, como também relativas ao tratamento prolongado, que pode durar de 6 a 12 meses, ou se estender até 24 meses em alguns casos. Assim, propõe-se a realização do estudo da hanseníase sob a ótica de gênero, buscando nas representações sociais o embasamento para compreender o senso comum, ou seja, a realidade social do cotidiano dos doentes e a relação com a enfermidade. Portanto, a escolha das representações sociais como marco teórico deu-se por estas serem consideradas uma teoria que se aplica a estudar o pensamento social ou conhecimento do senso comum, seus conteúdos e sua relação com a construção social de um objeto, ou seja, como uma perspectiva teórica para orientar o estudo de fenômenos mais complexos, nos quais a unidade de análise já não é um objeto concreto, mas sim um conjunto de pessoas que compartilham cotidianamente um mesmo contexto psicossocial (BANCHS, 2007). A representação social da hanseníase deve servir como fonte de estudos e conhecimentos para a capacitação dos recursos humanos, capazes de reverter para os seus portadores ações educativas, buscando minimizar o quadro do doente e da doença (COELHO, 2008). Assim, conhecer as representações sociais sobre hanseníase das pessoas que tem a doença e o impacto desta nas relações de gênero contribuirá para maior adequação dos casos e sua trajetória dos serviços de saúde, desde o diagnóstico precoce, a abordagem inicial do paciente e sua família até o término do tratamento. 17 Desta maneira, poderemos ajustar as orientações em saúde para cada gênero interferindo assim na aderência e na qualidade de vida dessas pessoas e, enfraquecendo a cadeia de transmissão da doença. Assim, ter uma melhoria da qualidade da assistência prestada nos serviços de saúde pública a essa população, particularmente no aprimoramento do cuidado de enfermagem, visto que em nosso município uma grande parte dos casos de hanseníase são acompanhados por enfermeiros da ESF nas Unidades Básicas de Saúde. Neste estudo, as representações sociais envolvem percepções e sentimentos dos portadores de hanseníase. Adota-se gênero como uma categoria de análise por ter uma conotação social e na construção cultural das diferenças sexuais que serviram à formulação que opõe sexo e gênero, nas correntes pós-estruturalistas e pós-modernas, questiona-se a própria base material do sexo, argumentando-se ter sido o gênero que inventou a diferença sexual como ordem classificatória no mundo (AQUINO, 2006). Compreendemos este conceito importante para contextualizar o igual e desigual dos enfermos e como forma culturalmente elaborada que se manifesta nos papéis atribuídos a cada sexo. Assim, estes são culturalmente elaborados, não são inatos, mas adquirido, transformado e conservado. Face ao exposto questiona-se: como os sujeitos com hanseníase significam sua doença? Como os portadores de hanseníase se posicionam face à doença, considerando as questões de gênero? No intuito de responder aos questionamentos, esta investigação teve como objetivos: a) apreender as representações sociais sobre hanseníase elaboradas por seus portadores; b) analisar como se estruturam as representações sociais sobre hanseníase para seus portadores suas significações, considerando as questões de gênero. Assim, espera-se que os resultados desta investigação possam contribuir com uma proposta de modelo de cuidado de enfermagem adequado aos sujeitos portadores de hanseníase. Parte-se do pressuposto que a hanseníase traz repercussões diferentes para cada gênero. 18 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Hanseníase: o presente de uma doença do passado A hanseníase é uma das doenças mais antigas e mais referidas ao longo dos séculos, embora a descrição mais antiga da doença seja motivo de controvérsia entre pesquisadores e historiadores. No Brasil teve vários sinônimos, como morféia, “lepra”, elefantíase-dos-gregos, e o hanseniano era pejorativamente chamado lazarento, “leproso” ou morfético (SANTOS, 2007). A Bíblia traz diversas referências à “lepra” e aos “leprosos”. A pesquisa de Savasssi (2010) trás na tradução grega da palavra zarrath ou tsaraath a tradução como lepra ou leproso, que significa “algo que descama”. Maciel (2007), afirma que quem lê a bíblia vê que tsaraath foi traduzida para lepra na realidade tinha lepra, mas também outras doenças cutâneas como vitiligo e psoríase, que apresentavam alterações na pele, percebe-se, assim , uma multiplicidade de significados. Tsaraath representaria então uma gama de manifestações cutâneas ligadas a contangiosidade e, pela sua natureza estigmatizante, ao afastamento do meio social e da coletividade. Portanto, qualquer dermatose como pênfigo (fogo selvagem), escabiose (sarna), psoríase ou vitiligo, além da hanseníase, seria “tsaraath” que ganhou seu correspondente no idioma grego como “lepra” (MACIEL, 2007). Segundo Ducatti (2009), a processualidade do combate à doença oriunda da Antiguidade Clássica mostra que a “lepra” fora instalada no Brasil via colonizador europeu, especialmente o português. Antes da chegada dos portugueses ao Brasil, e de espanhóis à Ámérica espanhola, não havia relato da doença e que sua introdução foi registrada em cerâmicas Colombianas, além dos dialetos locais (Carvalho, 2008). Há registro da existência da “lepra” no Brasil desde 1600, no Rio de Janeiro (AGRÍCOLA, 1960). Agrícola (1960) atribui a primeira experiência de isolamento no Brasil à cidade de Salvador, Bahia, em 1640, no Campo dos Lázaros, obra da Igreja Católica. A partir de então vieram várias tentativas junto a Coroa Portuguesa de se fundar leprosários por todo o país. A manutenção dos abrigos e hospitais dos lázaros ficou por um longo período a cargo das ordens religiosas. Desde o Império, as autoridades declaravam que não tinham como arcar sozinhas com as despesas, acionando entidades particulares na manutenção e 19 criação de abrigos (SANTOS, 2007). Como visto, à exceção da Capital Federal, o auxílio do poder público era pontual e não sistematizado. A Proclamação da República, em 1889, não mudou a forma de lidar com a “lepra”, inclusive quanto à manutenção das instituições pelas ordens religiosas e filantrópicas. Até o século XIX, a assistência aos doentes dava-se especialmente através das Santas Casas (DUCATTI, 2009). Até as primeiras décadas do século XX, os estabelecimentos asilares eram destinados a protegera sociedade sadia do perigo representado pelos doentes; destinavam-se ao recolhimento e à assistência de todos aqueles que fossem identificados como “leprosos”, o que não se traduzia em serviços que promovessem a melhoria das condições de saúde do paciente (SANTOS et al., 2007). Maciel (2007) afirma que até o inicio do século XX, todos os hospitais e asilos existentes eram de manutenção particular, a maioria da Igreja, inexistindo instituições de responsabilidade plena do Estado. Mas a urbanização e a expansão da capital no final do século XIX obrigariam o poder público municipal e estadual a criar ou expandir os serviços de higiene e saúde (DUCATTI, 2009). No continente europeu, durante a idade média cita-se o ritual de exclusão do indivíduo acometido pela Hanseníase: o “suspeito” denunciado por um médico ou por rumores públicos deveria comparecer a um júri de prova composto por outros leprosos. A autoridade laica então pronunciava a sentença (CUNHA, 2005). Segundo o mesmo autor, reconhecido o leproso, ele deveria submeter-se a uma cerimônia que solenizava o dia de sua separação. O doente era levado à igreja em uma procissão que cantava como se fosse para um morto. Lá era celebrada uma missa, onde o padre deveria pôr terra retirada do cemitério na testa do leproso. Esse ritual representava que o leproso estaria, a partir daquele momento, morto para a sociedade. Ao final do ritual, eram lidas as proibições e entregues ao doente as luvas, a matraca e a caixa de esmolas, e ele era, então, levado a sua nova moradia. Foi somente com a Reforma Católica e com o desaparecimento da lepra na Europa que essa liturgia caiu em desuso. A Constituição Federal de 1891 definiria que os serviços de saúde pública seriam uma atribuição dos governos estaduais, que tinham de autonomia para sua organização e regulamentação. No nível federal, o órgão responsável era a Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP), criada em 1897 e subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Ducatti (2009) aponta como primeira referência oficial à doença no período repulicano, o Regulamento Sanitário de setembro de 1902, promulgado no governo de Francisco de Paula Rodrigues Alves (1848-1919), que estabeleceu a notificação compulsória de várias doenças, entre elas a “lepra”. 20 A partir da virada do século, haveria uma verdadeira revolução na maneira como o governo e a medicina tratariam a “lepra”, caminhando para políticas de isolamento e segregação que culminariam com práticas discriminatórias, eugênicas e centralizadoras (MONTEIRO, 2006). A reforma sanitária, proposta em 1903, pelo diretor-geral da saúde pública, Oswaldo Cruz (1872-1971), originou o Regulamento Sanitário da União. Nesse período, foram incorporados à DGSP os serviços de higiene defensiva, a política sanitária, a profilaxia das doenças infecciosas e as atividades de higiene domiciliar no Distrito Federal, o que trazia os doentes para o campo de ação do poder público (DUCATTI, 2009). Cerca de 30 anos depois, a política de isolamento compulsório desrespeitaria direitos civis e laços familiares ao expulsar os doentes para os Leprosários. Em 1915, a Associação Médica Cirúrgica do Rio de Janeiro organizou a “Comissão de Profilaxia da Lepra”, cujos trabalhos, concluídos em 1919, apontavam o isolamento compulsório em instituições próprias, e o domiciliar, em casos específicos; eles sugeriam a criação de colônias agrícolas com condições apropriadas para a segreção dos doentes, além de medidas para impedir os casamentos envolvendo as vítimas da doença, a proibição da entrada de imigrantes com “lepra”, o veto ao comércio de produtos industriais ou agrícolas manipulados por doentes (excetuados destinados ao consumo próprio nas colônias), assim como à oferta de trabalho aos doentes. Além de reafirmar a importância da notificação compulsória, a comissão recomendava medidas para evitar o êxodo de doentes pelo país (SAVASSI, 2010). A década de 1920 foi marcada pela maior atuação governamental na causa da “lepra”. As condições precárias de higiene e saúde pública da classe operária motivaram a política sanitária de Oswaldo Cruz para remover “as imundices”, os focos de infecção, recolher e expulsar dos centros urbanos os que eles consideravam “inaptos para o convívio social”, tais como os “doentes mentais”, “leprosos”, mendigos, saneando aas cidades (FIGUEIREDO, 2005). A epidemia da “lepra” permanecia alta. Salários insuficientes, alimentação de má qualidade e péssimas habitações eram causas do contagio do trabalhador pela hanseníase. O ano de 1941 foi um ano-chave para a “lepra”: além da inauguração de várias Colônias e do Serviço Nacional de Lepra, foi o ano da descoberta do poder das sulfonas no tratamento da doença. Foi também o ano da 1ª Conferência Nacional de Saúde, que normativava o “armamento anti-leprótico”, visando estreitar os laços entre União e Estados, para sistematizar as ações sanitárias (MACIEL, 2007). 21 Nos anos de 1950, a expectativa era “demasiado otimista”, quanto às sulfonas e quanto à possibilidade de distribuí-las a pacientes novos, aliviando-os do temor do isolamento. A dapsona passou a ser utilizada no tratamento contra a hanseníase, possibilitando, tecnicamente, o tratamento ambulatorial e, teoricamente o fim do isolamento (DUCATTI, 2009). Os doentes seriam socialmente reabilitados, o público seria esclarecido e a rejeição acabaria. “Lepra, doença como outra qualquer” seria admitida em hospitais gerais. Na década de 1970 este modelo de descentralização foi adotado nacionalmente de forma permanente e não apenas durante a realização de campanhas (CURI, 2002). Neste novo contexto, o papel do Leprosário, a partir de 60, se modificaria em direção à pesquisa e à educação profissional. Os temerários Leprosários se tornariam hospitais de dermatologia ou de patologia tropical, com intensificação do ensino e convênios com escolas médicas. A ênfase passava a ser a prevenção da incapacidade física por técnicas simples nos centros de saúde, aplicação do BCG em conjunto com serviços tisiológicos e reforço intensivo nos focos hansênicos, redução dos riscos da gravidez, puerpério e talidomidoterapia com instruções e recursos anticoncepcionais (MACIEL, 2007). Em 1981, surgiria o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (MORHAN), entidade sem fins lucrativos, fundada em 6 de junho com sede administrativa no rio de Janeiro, cuja população-alvo eram justamente os pacientes exinternos das Colônias, e a base voluntária de trabalho era composta por pacientes, expacientes e pessoas interessadas no combate ao preconceito em torno da doença (MORHAN, 2009). A entidade assumiu o papel de instituição de empoderamento dos pacientes asilares, sob os preceitos dos ensinamentos de Paulo Freire (SAVASSI, 2010). Não havia para a maioria, a possibilidade de vida fora das instituições, sem opções exteriores, sem famílias para as quais pudessem retornar. O processo de liberalização e abertura destas instituições se confrontava com a possibilidade simplesmente de libertar as pessoas internadas em nome da “proteção dos sãos”. O processo de abertura dos Leprosários foi lento, cheio de retrocessos e surpresas (CURI, 2002). A despeito de o tratamento ser indicado para novos casos a partir da década de 60, os pacientes internados nos Hospitais-colônia somente seriam plenamente libertados na década de 80, medida tardia que levou os doentes a acionar o Estado em busca da reparação pelo dano causado. Em 2007, o Estado brasileiro reconhece seu erro, e através da Lei federal 11.520/2007 e medida Provisória nº 373 estabelece o pagamento de indenizações aos exinternos, fato que somente em 2009 começaria a se traduzir na prática (SAVASSI, 2010). 22 Assim, esta reconstituição histórica traz subsídios para o entendimento de como uma doença caracterizada pelo preconceito, pela segregação e por deformidades visíveis que expõem o paciente de maneira explícita, pode afetar de maneira definitiva toda a trajetória de vida de milhares de pacientes, servindo como reflexão acerca do papel do estado frente a doenças estigmatizantes. A estigmatização e rejeição afetam o Programa de Controle da Hanseníase, pois retardam a procura ao serviço pelo receio do diagnóstico e das medidas profiláticas. Dessa forma, existe uma grande massa de doentes ocultos, imersos na multidão que vem à tona quase que por acaso. Na grande maioria, a doença não é diagnosticada precocemente, alimentando assim a endemia (SANTOS et al., 2007).O modelo social vigente tem se utilizado de uma educação cada vez mais tecnicista, mais científica e regida por códigos de competição pessoal e grupal. Em contraposição, constata-se a necessidade de uma democratização profunda que supõe novas regras de relacionamento que vão ao encontro da integração e da multiculturalidade, tolerância e respeito pelas diferenças, dando resposta à enorme diversidade cultural e étnica. No momento em que toda essa diversidade não é valorizada, tampouco respeitada, surgem os estigmas e discriminações com aqueles indivíduos pertencentes a grupos vulneráveis. Tais grupos sofrem tanto materialmente como social e psicologicamente os efeitos da exclusão, seja por motivos religiosos, de saúde, opção sexual, etnia, cor de pele, por incapacidade física ou mental, gênero, dentre outras características (MONTE et al.,2009). Dificuldades no relacionamento podem vir a ser observadas tanto nas relações mais íntimas do estigmatizado com a família, amigos, vizinhos e colegas de trabalho, como nas relações sociais mais distanciadas. Tal situação é facilmente observada em portadores de hanseníase, principalmente quando esses apresentam as manifestações crônicas e visíveis da doença provocadas em sua maioria pelo tratamento inadequado por muitas décadas (BITTENCOURT et al., 2010). Como vimos até agora, as representações sociais sobre a lepra se expressaram, de modo geral, na forma de estigma, seja na Idade Média, seja no mundo moderno, embora com distintos argumentos. Neste sentido, seguindo o pensamento de Cunha (2005, p. 14): o passar dos séculos não teria conseguido alterar o significado dessas palavras e o verdadeiro doente de lepra, ou seja, aquele que, de fato, carregava o M. leprae em seu corpo, continuou a ser rejeitado e temido pela sociedade. O imaginário social fortemente enraizado não possibilitou que, após a definição da doença, seu agente causador, sua terapêutica e profilaxia, pusesse fim ao milenar estigma. 23 Portanto, como já foi visto, o estigma e a carga de preconceitos em relação à Hanseníase mostram-se bastantes presentes na vida de indivíduos acometidos pelas seqüelas da doença, acarretando em prejuízos psicológicos, familiares, sociais e profissionais, afetando diretamente a identidade e as questões de cidadania desses indivíduos. Em 2010 lançou-se uma nova portaria para o controle da hanseníase é baseado no diagnóstico precoce de casos, seu tratamento e cura, visando eliminar fontes de infecção e evitar seqüelas. A detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos foi adotada como principal indicador de monitoramento da endemia, com meta de redução estabelecida em 10%, até 2011 e está inserida no Programa Mais Saúde: Direitos de Todos – 2008-2011 / Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Programa Nacional de Controle da Hanseníase (PNCH) estabeleceu diretrizes operacionais para a execução de diferentes ações, articuladas e integradas, que pudessem em todas as frentes de trabalho propiciar às pessoas que adoecem sejam atendidas nas suas necessidades e direitos. Sem perder de vista o desafio da horizontalização e da descentralização, organizou-se as ações do PNCH, a partir de cinco componentes/áreas: vigilância epidemiológica; gestão; atenção integral; comunicação e educação e pesquisa (BRASIL, 2010). 2.2 Gênero e hanseníase A noção de dois sexos biológicos surgiu somente no século XVIII, quando os órgãos reprodutivos foram distinguidos em termos lingüísticos e ganharam centralidade absoluta na definição das diferenças entre homens e mulheres. Essas seriam mais frágeis e vulneráveis a todo tipo de influências, seja física, moral ou intelectual, graças à suposta sensibilidade que as tornaria prioritariamente aptas à maternidade (AQUINO, 2006). A perspectiva materno-infantil prevaleceu na literatura biomédica, onde a mulher era representada como mãe ou potencialmente grávida. Nesse sentido, a produção científica foi orientada para aspectos reprodutivos da saúde, privilegiando-se a saúde do feto (AQUINO, 2006). A influência do movimento feminista, nos anos 70, conduziu a investigação científica da relevância conceitual das noções de masculino e feminino, com o objetivo explicito ou implícito de tornar visível a especificidade do pensamento e da prática das mulheres, ao ponto de atribuírem diferentes modos de pensar e fazer ciência a homens e mulheres (AMÂNCIO, 1993). 24 Se os anos de 1970 ofereceram análises feministas críticas contra o essencialismo em relação ao gênero feminino, os anos de 1990 trouxeram análises e julgamentos contra esse modelo que funda o modelo hegemônico masculino. Esse campo em construção sustentou-se também dos estudos sobre sexualidade cuja legitimação foi favorecida pela necessidade de enfrentar a pandemia da Aids (AQUINO, 2006). Apesar do termo "gênero" substituir rapidamente o termo "sexo" nas pesquisas sobre saúde, esta mudança na forma não trouxe muita clareza sobre a contribuição dos fatores sociais na saúde de homens e mulheres (BIRD; RIEKER, 1999). Como esta diferença de sexo não está tão evidente na infância, podemos pensar em uma diferença importante de gênero, em que condições da vida adulta facilitariam o adoecimento, diferenças de gênero socialmente construídas mais que diferenças inerentes ao sexo biológico. Entendendo gênero, fundamentalmente como uma construção social e, portanto, histórica, teríamos de supor que esse conceito é plural, ou seja, haveria conceitos de feminino e masculino, social e historicamente diversos. A idéia de pluralidade implicaria admitir não apenas que sociedades diferentes teriam diferenças de homem e mulher, como também que no interior de uma sociedade tais concepções seriam diversificadas, conforme a classe, a religião, a raça, a idade, etc. Além disso, implicaria admitir que os conceitos de masculino e feminino se transformam ao longo do tempo. Assim, o conceito buscava se contrapor a todos os que apoiavam suas análises em argumentos essencialistas, ou seja, apontavam não para uma essência feminina ou masculina, mas para processos de construção ou formação histórica, lingüística e socialmente determinados, então, múltiplos (LOURO, 2003). Enquanto discurso que implementa e constrói significados para as diferenças sexuais, por meio de processos de diferenciação conflituosos e hierarquizados, gênero é a instância onde e por meio da qual os seres humanos aprendem a se converter em e a se reconhecer como homens e mulheres, nos diferentes contextos históricos, culturais e sociais. Porque referida a um corpo físico, portanto, natural, a diferença sexual assume um estatuto de fixidez e universalidade, que oculta as clivagens, reagrupamentos e ressignificações produzidas na dinâmica de relações de poder e resistência, específicas e particulares, que constroem e reconstroem o sujeito sexuado. Isto quer dizer que a diferença biológica não se inscreve em apenas um significado natural ou social que lhe é inerente. Ao contrário, seus significados são construídos e reconstruídos no entrecruzamento de uma gama de discursos (MEYER, 1993). 25 A objetivação do masculino e do feminino em entidades ontologicamente diferentes é regulada por uma assimetria que atravessa todos os processos sócio-cognitivos que participam para essa construção do “ser” homem e do “ser” mulher. Munidos deste “saber”, os indivíduos orientam a sua percepção dos atores homens e mulheres nas interações do cotidiano, de forma enviesada, uma vez que a atenção dedicada ao comportamento das mulheres não é orientada pelo reconhecimento da sua diferença, enquanto condição coletiva, ou destino. Além disso, esta assimetria desempenha também uma função reguladora dos efeitos das mudanças sociais sobre o universo simbólico que diferencia os dois sexos (AMÂNCIO, 1993). Apesar da complexidade e diversificação das formas e relações familiares, e apesar das numerosas mudanças que tem acontecido no grupo familiar, a família constitui a principal rede de relações e apoio para a maioria das pessoas, sendo um dos principais determinantes do ajustamento psicossocial da pessoa (FUSTER; OCHOA, 2000). Evidências transculturais indicam que o gênero é revestido com um considerável significado social em diferentes sociedades. Como um construto social, o gênero se refere a atitudes que uma determinada cultura considera como apropriadas para homens e mulheres. Existe estreita e contínua ligação do social e do biológico, e nossa compreensão de gênero considera tal união. Embora continuemos afirmando que a construção dos gêneros é, fundamentalmente, um processo social e histórico temos que admitir que esse processo envolve os corpos dos sujeitos. O corpo, conceito utilizado nesta pesquisa, é um objeto plural e um termo polissêmico – tratado por distintas disciplinas de distintos modos (DAMASCO, 2005). Até os anos 60 a sociologia e a antropologia não olhavam para este tema, como se apenas as ações dos homens fossem dignas de interesse (DERDERIAN; MELODY; OOMS, 2006). O que a antropologia do corpo aborda é tanto sua realidade biológica (antropologia física) quanto a sua realidade cultural (BOETSCH; CHEVÉ, 2000). A sociologia do corpo é, por exemplo, a análise dos comportamentos físicos e dos hábitos de utilização do corpo. Porém, concordamos aqui que se deve evitar reduzir o corpo inteiro a apenas uma de suas propriedades (BOLTANSKI; LOYOLA, 2004). De mãos dadas com este último conceito está o estudo da imagem corporal. Na teoria mais geral e recente, encontramos a definição da imagem corporal como uma experiência de quando a cultura se inscreve no corpo. A imagem corporal representa a intersecção do corpo físico (aquilo que se sente e se vive) com a atividade cognitiva e emocional (aquilo que se percebe). Tendo sido tratada como mecanismo neuropatológico e 26 processo psicodinâmico, a imagem corporal tem recebido, desde a década de 90, uma abordagem cognitivo-comportamental. Os trabalhos desde então têm privilegiado as desordens da imagem corporal, da percepção alheia à autopercepção. Assim, reconhece-se que tanto observador quanto observado se influenciam na construção da imagem (CASH; PRUZINSKY, 2004). Apesar da importância desta interação, poucos estudos têm sido feitos sobre isso. No que se refere à análise da imagem corporal em pacientes de hanseníase, o tema ganhou pouca atenção (RUBIO, 1999). De modo geral, os efeitos colaterais do medicamento e os episódios reacionais foram relatados como motivo de grande incômodo para os doentes; tais eventos podem afetar a autoestima, criando uma autoimagem negativa (FELICIANO; KOVACS, 1997). O ser humano, ao nascer, encontra-se inserido em um meio cultural repleto de significações socialmente definidas, que servem de referência para ele e para seu grupo social nas suas inter-relações. A internalização do universo cultural no qual os sujeitos se inserem não é um processo simples, pois não se restringe à simples transferência de práticas e conteúdos culturais do plano social/externo para o individual/interno, mas constitui-se em uma operação complexa de (re)constituição ou (re)criação de algo já construído socialmente (FAVA, 2008). Os papéis desempenhados pelas mulheres como cuidadoras da família é histórico e cultural, a mulher cabe ser a cuidadora principal nas etapas de desenvolvimento de vida. Elas têm conquistado espaços fundamentais à sua afirmação social e, principalmente, valorização perante a sociedade por meio dos papéis que vêm desempenhando com competência no seio da família e da comunidade (WEGNER; WATTLE, 2010). Ao tratarmos do homem como gênero uma primeira questão que devemos salientar é a necessidade de buscar a superação da reificação no feminino. O caráter histórico e cultural muitas vezes parece haver ainda pouca clareza quando se afirma que é a mesma sociedade que orienta a construção de elaborações consideradas masculinas e femininas. O caminho a ser percorrido para se compreender o que significa afinal falar-se em homens como sujeitos de direitos. Como pensar em direitos em relação a quem não só sempre usufruiu dos mesmos, como ainda impediu que outros – outras, as mulheres – assim se insurgissem? (NASCIMENTO, 2005). 27 Segundo o mesmo autor: O enfoque marcadamente materno-infantil da atenção básica em saúde faz com que serviços, que muitas vezes são deficitários para identificar as especificidades das mulheres, sequer reconheçam os homens como sujeitos de sua atenção. Ao fazer isto, cristaliza oposições construídas socialmente como se fossem dados da natureza: desestimula os homens a procurarem os serviços de saúde e enxerga as mulheres como essencialmente cuidadoras e as únicas responsáveis pela esfera da saúde (NASCIMENTO, 2005, p.27). . Nessa perspectiva, corre-se o risco de rotular os homens como descomprometidos com sua saúde, reconhecer a existência desses sujeitos não significa reivindicar aos homens um lugar de destaque. A percepção é de que a participação dos homens passa pela superação de imagens e perspectivas individualizantes e culpabilizantes, dando lugar a espaços de atenção, reconhecimento de demandas, abertura para identificar especificidades. Isto pressupõe ouvir os homens e convidá-los à participação. Porém, é importante que esta escuta e este convite aconteçam adequados pelos serviços. Assim, exercitando a autonomia deste e o cuidado de si próprio. Este rótulo mencionado anteriormente acaba sendo internalizado por estes, não se reconhecendo como um gênero diferenciado que possuem questões e experiências próprias do gênero masculino. De acordo com Gomes, Nascimento e Araújo (2007), os serviços de saúde têm uma deficiência em absorver a demanda apresentada pelos homens, proporcionada pela organização dos serviços que não estimula o acesso destes homens e, pelo fato das próprias campanhas de saúde pública não se voltarem para este segmento da população. Assim, são necessárias mudanças nas estratégias dos serviços de saúde e no enfoque relacionado ao gênero masculino. 2.3 Teoria das Representações Sociais A escolha da Teoria das Representações Sociais como referencial teórico tem uma relação próxima com a complexidade do tema abordado, pois estudar como os portadores de hanseníase convivem com a doença e como esta interfere em cada gênero, ainda é um tema pouco abordado, pois muitos estudos são de caráter biológico e epidemiológico. Buscamos as representações sociais como forma de aproximação do objeto em estudo para compreender o modo como a problemática é gerada, transformada e interpretada pelos sujeitos dentro de sua realidade. Concorda-se com Sá (1998) ao afirmar que a 28 construção do objeto de pesquisa é um processo pelo qual um fenômeno é simplificado e tornado compreensível pela teoria, para a finalidade da pesquisa. A expressão “representação social” foi usada inicialmente por Serge Moscovici, para designar especificamente o tipo de fenômeno ao qual a sua interpretação teórica se aplicava. Este empregou o termo “sociais” e não mais “coletivas”, em contrário a Durkheim, entretanto propõe as representações sociais não como forma de revogar as representações coletivas, e sim acrescenta outros fenômenos ao campo de estudos. Concebido de forma mais ampla decorrente da distinção entre diferentes tipos de representação em função de suas origens e respectivos âmbitos de inserção social (SÁ, 1998). Em 1961 a idéia de que o processo de representação é um processo criativo, traduzido na dialética entre percepção e conceito, está já bem presente e acentuado. Adquire mais vigor, todavia em 1976, onde Moscovici mais acertivamente sugere as limitações do pensamento representativo na acepção de cópia ou duplicação da realidade (JESUÍNO, 2011). Moscovici sempre resistiu a apresentar uma definição precisa das representações sociais, por acreditar que uma tentativa neste sentido poderia acabar resultando na redução do seu alcance: Por representações sociais, entendemos um conjunto de conceitos, proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso de comunicações interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa sociedade, dos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais, podem também ser vistas como a versão contemporânea do senso comum (MOSCOVICI, 1981, p. 181). A partir desta sugestão de conceito, podemos apreender que nem todos os grupos ou categorias sociais tenham que participar de uma representação social comum, podemos ter representações sociais diferentes em grupos sociais distintos para um mesmo objeto, pelo fato de dispor de uma dispersão desigual das informações. A relação entre representação social e ciência é duradoura, remontando ao texto que fundou o “movimento” das representações sociais. Em La psychanalysee, son image, son public (A psicanálise sua imagem e seu público), bem como em escritos subseqüentes, como o de Moscovici e Hewstone (1984) que delineiam sua visão segundo a qual a mudança na interpretação do mundo induzida pela circulação do conhecimento científico vai além da metáfora do impacto em favor de uma co-construção do significado. A co-construção do significado sente os efeitos, por um lado, das restrições das formas históricas e culturais que vêm a ter maior ou menor significância em contextos específicos. A teoria e pesquisa sócio- 29 cognitiva e sócio-cultural desenvolveram-se consideravelmente a partir de então (CONTARELLO, 2007). Cinquenta anos depois da teoria, ou talvez a metateoria, das representações sociais continua aberta a novos desenvolvimentos como a novas articulações interdisciplinares. Para nos reportar aos quinze anos que decorrem entre a 1ª e a 2ª edição da obra Psychanalyse, son image et son public, publicada em 1961, haverá que dá relevo à continuidade tanto no que se refere à analise dimensional das representações, que culmina no modelo das três dimensões – informação, campo, atitude – com as potencialidades heurísticas que o próprio estudo empírico sobre a imagem da psicanálise ilustra e que irá constituir o método, por excelência, para a comunidade de pesquisa que nele se inspira (JESUÍNO, 2011). Cada vez mais, profissionais da saúde, principalmente na saúde coletiva e na enfermagem, tem se valido do referencial teórico das representações sociais em suas pesquisas e, com alguma freqüência, se associado a psicólogos sociais, constituindo equipes multidisciplinares. Não apenas em relação à aids, mas também a diversos outros temas, como o câncer e a lepra (NASCIMENTO-SCHULZE, 1997; SÁ, 1998). Os fenômenos de representação social se encontram no cotidiano das pessoas, ou seja, na cultura, nas instituições, nas práticas sociais, nas comunicações interpessoais e de massa e nos pensamentos individuais. Porém, para gerar representações sociais o objeto de estudo deve ter suficiente “relevância cultural” ou “espessura social” (SÁ, 1998). De fato, uma explicação adequada dos fenômenos de representação social deve dar conta de suas origens, de seus fins ou funções e das circunstâncias de sua produção. Assim, Abric (2000) descreve quatro funções essenciais: - Função de saber: permite compreender e explicar a realidade. Consente aos atores sociais adquirir conhecimentos e integrá-los a um quadro assimilável e compreensível para eles, em coerência com seu funcionamento cognitivo e os valores aos quais aderem, sendo condição necessária à comunicação social; - Função identitária: define a identidade e permite a salvaguarda da especificidade dos grupos. As representações têm também por função situar os indivíduos e os grupos no campo social permitindo a elaboração de uma identidade social e pessoal; - Função de orientação: guia os comportamentos e as atitudes. A representação produz antecipações e expectativas, constituindo uma ação sobre a realidade por meio de seleção e filtragem de informações, interpretações visando tornar essa realidade conforme à representação; 30 - Função justificatória: permite justificar as tomadas de comportamentos, possibilitando aos atores explicar e justificar suas condutas em relação aos seus participantes. Para Wagner (1994), a representação e seu objeto são inseparáveis, na medida em que é o objeto que é constituído ele próprio como uma representação social. Assim, a teoria deve penetrar nas representações desvendando as relações dinâmicas que se mostrem compatíveis com as características sistematicamente evidenciadas do fenômeno. Ressalta-se que ainda que de acordo com a pesquisa Bauer e Jovchelovitch (1999), a abordagem das representações sociais necessita de pesquisa comparativa, pois não se faz pesquisa deste tipo só com um grupo social. Podendo ser comparativa em duas dimensões: (1) comparativa entre diferentes triângulos (comunidades) e também (2) comparativa no tempo, podemos pegar um grupo social e investigá-lo de forma longitudinal, historicamente. O conhecimento científico não entra na vida cotidiana de uma forma linear, mas é transformado de maneira contínua. A interdependência entre representações e ações é explicada por Wagner (1996), quando coloca que os seres humanos não participam na interação social com a intenção de construir objetos ou representações. A construção não é intencional, e sim um evento construtivo, o qual somente emerge da relação entre pessoas em um grupo ou contexto social definido e com representações compartilhadas acerca do que é importante ou não para seus membros. Jodelet (2001, p.22) caracteriza a representação social como "uma forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social". Apesar de se manifestarem como elementos cognitivos, as representações sociais não se limitam a esta característica, pois são elaboradas e compartilhadas socialmente, contribuindo desta forma para a construção de uma realidade comum, que possibilita a comunicação (JODELET, 1993). As representações sociais são ativadas em ações na vida social, e seus elementos constituem um saber que diz algo sobre a realidade, portanto se caracterizam como uma forma de conhecimento elaborado e partilhado socialmente que resulta em uma realidade comum a um grupo social e em um saber do senso comum que, apesar de diferenciado do conhecimento científico, pode ser influenciado por este (JODELET, 2001). Dentre as inúmeras proposições de sua criação, a fidelidade de Moscovici à sua perspectiva epistemológica o conduz a formular os conceitos de objetivação e ancoragem, referindo-se a dois processos fundamentais na formação de uma representação social. Ao mostrar que a gênese de uma representação implica em uma atividade de transformação do 31 não familiar em familiar, de um saber (no caso, um saber científico), em outro saber (no caso, um saber de senso comum útil ao grande público). Moscovici (1961/1976) elaborou estes dois conceitos para explicar como se processa esta atividade. Ou, como afirma Jodelet (1988, p. 367), “dois processos maiores que dão conta da forma pela qual esta representação transforma o social”. A objetivação torna concreto aquilo que é abstrato. Ele transforma um conceito em imagem de uma coisa, retirando-o de seu quadro conceitual específico. Trata-se de privilegiar certas informações em detrimento de outras, simplificando-as, dissociando-as de seu contexto original de produção e associando-as ao contexto do conhecimento imaginário do sujeito ou do grupo. A retenção das informações “salientes é acompanhada de um ajustamento”, onde algumas informações assumem papel mais importante que outras, ou diferente daquela que tinha sua estrutura original. Trata-se, enfim de transformar o que abstrato, complexo ou novo em imagem concreta e significativa, apoiando-se em concepções que nos são familiares (TRINDADE; SANTOS; ALMEIDA, 2011). A ancoragem corresponde exatamente à incorporação ou assimilação de novos elementos de um objeto em um sistema de categorias familiares e funcionais aos indivíduos, e que lhes são facilmente disponíveis na memória. A ancoragem permite ao individuo integrar o objeto da representação em um sistema de valores que lhe é próprio, denominando e classificando-o em função dos laços que este objeto mantém com sua inserção social. Assim, um novo objeto é ancorado quando ele passa a fazer parte de um sistema de categorias já existentes, mediante alguns ajustes (TRINDADE; SANTOS; ALMEIDA, 2011). É interessante situar aqui os fenômenos eventos ou idéias que se constituem em objetos de representação, bem como os processos pelos quais as representações são produzidas pelos sujeitos e os conteúdos ou conhecimentos por eles elaborados. Objetos de representação e representações do objeto reivindicam para serem estudados pela TRS, entendida como uma teoria da Psicologia, as contribuições da História, da Antropologia e da Sociologia, por se tratarem, antes de tudo, de objetos culturais datados historicamente e produzidos por sujeitos marcados por suas inserções pessoais e sociais (TRINDADE; SANTOS; ALMEIDA, 2011). A partir de estudos posteriores, surgiram métodos complementares a conhecida grande teoria de Moscovici (1961/1976): a perspectiva de Jodelet correspondem os métodos ditos qualitativos ao mostrar que a gênese de uma representação implica em 32 dois processos maiores que dão conta da forma pela qual o social transforma um conhecimento em representação e a forma pela qual esta representação transforma o social (JODELET,1988, p. 367). Para Doise (1993, p. 161), os tratamentos estatísticos correlacionais onde a “teoria das representações sociais a qual não é somente heuristicamente útil para analisar complexos fenômenos sociais, mas também capaz de reorganizar teoricamente campos tradicionais de estudo na psicologia social” e Abric (1984), o método experimental, com o enfoque estrutural centro-periferia, propondo assim a teoria do núcleo central (SÁ, 1998; WAGNER; HAYES, 2005). Embora esses olhares possam nos mostrar diferentes dimensões, observa-se hoje uma importante interpenetração deles. Uma questão intimamente relacionada com a distinção entre as três categorias metodológicas supracitadas é a do número de sujeitos que devam ser contatados. Na estratégia que combina a coleta de dados através de questionário com seu tratamento estatístico e que pode ser aplicada a um grande número de sujeitos, e é desejável que estes constituam uma amostra representativa da população estudada. O problema se resolve com o emprego de técnicas de amostragem já consagrada (SÁ, 1998). No caso das entrevistas em profundidade, o tempo necessário tanto para a coleta quanto para a análise dos dados impede que este requisito amostral seja cumprido. Argumenta-se que ele não seja necessário, visto que a representação manifestada por um certo número de pessoas seria a mesma de um número maior, através da saturação podemos chegar a este número, ou seja, quando as informações começam a se repetir significaria que entrevistar mais pessoas pouco acrescentaria de significativo ao conteúdo da representação (SÁ, 1998). As técnicas priorizadas pela teoria do núcleo central, embora não demandem tanto tempo quanto as entrevistas, devem também, várias delas, ser aplicadas individualmente e com freqüência em duas etapas. Assim, temos que o número de sujeitos se situam entre poucas entrevistas e muitos questionários (SÁ, 1998). Neste estudo, utilizaremos a teoria do núcleo central, deste modo seguiremos aprofundando as discussões referentes a esta abordagem. Os pesquisadores seguidores desta proposta estão interessados em conhecer não apenas os conteúdos da representação, mas também sua estrutura ou organização interna (SÁ, 1998). A teoria do núcleo central foi proposta pela primeira vez, em 1976, através da tese de Jean-Claude Abric, “Jeux, conflits et représentations sociales” (Jogos, conflitos e representações sociais), na Université de Provence. Sendo assim formulada: 33 a organização de uma representação apresenta uma característica particular: não apenas os elementos da representação são hierarquizados, mas além disso toda representação é organizada em torno de um núcleo central, constituído de um ou de alguns elementos que dão à representação o seu significado (ABRIC, 2000, p. 19). Ainda segundo Abric (2000), o núcleo central é uma subcategoria da representação, composto de um ou de alguns elementos cuja ausência desestruturaria a representação ou lhe daria uma significação diferente. Assim, o núcleo central desempenha duas características essenciais: uma função geradora que cria e transforma o significado dos outros elementos constitutivos da representação e uma função organizadora que une entre si os elementos da representação (ABRIC, 2000). Para atingir estas características o núcleo central deve estar ligado à memória do grupo, sendo coletivamente compartilhada e definindo a homogeneidade de uma comunidade social, assim ele é estável, coerente e resistente à mudança, sendo relativamente independente do contexto social (SÁ, 1998). Ao imaginarmos o sistema central admitimos existir um sistema periférico que o complementa, constituído pelos elementos fronteiros que provem da interface entre a realidade concreta e o sistema central. “Se o sistema central é normativo, o sistema periférico é funcional, quer dizer que graças a ele que a representação pode se ancorar na realidade do momento” (ABRIC, 2000, p.79). O sistema periférico assume, portanto as seguintes funções integrantes ao central: função de concretização deste em termos de condutas, sendo mais flexível assegura a função de regulação e adaptação do núcleo central, enfim, permite certa modulação individual da representação (ABRIC, 2000). Porém, a representação apenas sustenta sua força pelos alicerces de seu núcleo central que direciona e organiza em único sentido as práticas de um conjunto de sujeitos. Desta forma, cremos que conhecer o núcleo central da representação de hanseníase em relação ao gênero na visão de seus portadores permitirá, não só aos enfermeiros como a todos os profissionais de saúde que assistem essa clientela uma adequação das orientações realizadas em que será valorizada a prática social como forma de transformar o cotidiano destes indivíduos. 34 3 DESENHO METODOLÓGICO 3.1 Tipo e natureza do estudo A pesquisa foi do tipo exploratória e descritiva, com uma abordagem de multimétodos, fundamentada na Teoria das Representações Sociais, no que diz respeito a abordagem de Abric. Pesquisas exploratórias são desenvolvidas com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. Esse tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular hipóteses precisas ou operacionalizáveis (GIL, 2009). As pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis (GIL, 2009). Quanto à abordagem multimétodos ou triangulação de métodos, é uma estratégia que propicia meios para o desenvolvimento do processo de investigação e de análise, dos que implementam ações de compreensão de dados quantitativos e qualitativos gerados pelo trabalho e assim, recolhem subsídios para as mudanças necessárias (MINAYO, 2007). 3.2 Campo de estudo A pesquisa foi realizada na cidade de Fortaleza, capital do estado do Ceará, em um Centro de Referência Macrorregional Nordeste em Dermatologia. O Centro de Referência em Dermatologia é uma unidade da Secretaria de Saúde do Estado Ceará, credenciado pelo Ministério da Saúde como Centro de Referência Macrorregional Nordeste em Dermatologia, com ênfase em Hanseníase. Foi selecionado por ser o local onde é atendida a maior demanda de pacientes do Ceará. O Centro dispõe de equipe multidisciplinar capacitada para assistência em dermatologia sanitária, com ênfase nas ações de controle da Hanseníase e outras dermatoses de interesse sanitário; presta assessoria técnica às demais unidades de saúde da rede do SUS; esclarece diagnósticos; desenvolve e apóia pesquisas de interesse do Programa de Eliminação da Hanseníase, entre outros (CEARÁ, 2010). 35 3.3 Sujeitos sociais Participaram da investigação 100 sujeitos, divididos em dois grupos: GMmasculino e GF-feminino, cada um com 50 participantes, a fim de comparar as Representações Sociais a partir da variável gênero. Foram obedecidos aos seguintes critérios de inclusão: -ser do sexo masculino ou feminino; -ter idade maior ou igual a 18 anos; -ter iniciado o tratamento há pelo menos três meses. Foram excluídos os indivíduos com disfunções físicas e/ou emocionais que impossibilitassem a comunicação. 3.4 Técnicas e instrumentos para coleta das informações Foram utilizadas três técnicas para coleta de dados: Teste de Associação Livre de Palavras (TALP); entrevista semiestruturada; e observação livre, com uso de diário de campo. O teste de associação livre de palavras é também conhecido como técnica da evocação livre ou teste por associação de palavras. Caracteriza-se como um teste projetivo que teve origem na Psicologia Clínica, e que tem por objetivo ajudar a localizar as zonas de bloqueamento (entendidas como detenção súbita e transitória do curso do pensamento, sem comprometimento intelectual ou sensorial), e de recalcamento de uma pessoa, isto é, a exclusão do campo da consciência, de certas idéias, sentimentos e desejos, que o indivíduo não quer admitir, e que, no entanto, continuam a fazer parte da vida psíquica (BARDIN, 1977). Assim, metodologicamente, este teste tem por objetivo apreender a percepção da realidade de um grupo social a partir de uma composição semântica preexistente. No campo das representações sociais a técnica de associação livre de palavras consiste em pedir ao individuo que produza todas as palavras ou expressões que possa imaginar a partir de um ou mais termos indutores, ou ainda em solicitar um número específico de palavras, seguindo-se de um trabalho de hierarquização dos termos produzidos, do mais para o menos importante (OLIVEIRA et al., 2005). Neste estudo foram usados como estímulos indutores: hanseníase, ser mulher com hanseníase e ser homem com hanseníase. 36 Para Minayo (2007), a entrevista semiestruturada difere de sentido tradicional por visar aprender o ponto de vista de atores sociais previstos na pesquisa, ampliação e aprofundamento da comunicação. A entrevista foi escolhida como técnica porque a mesma pode ser utilizada com facilidade em todas as classes sociais, independente da população ser alfabetizada ou não; por permitir flexibilidade, podendo o entrevistador repetir ou escrever perguntas, formular de maneira diferente, especificar alguns significados, como garantia de estar sendo compreendido; por oferecer maior oportunidade para avaliar atitudes, condutas, podendo o entrevistado ser observado naquilo e como diz registrar reações e gestos (MENDES, 2004). Participaram da entrevista 40 sujeitos. Destes foram escolhidos aleatoriamente, 20 do sexo feminino e 20 do sexo masculino. O total de entrevistas deu-se pela saturação teórica. A mesma foi constituída em duas partes: a primeira, com dados referentes à identificação sócio-demográfica e clínica dos participantes, e a segunda, composta de questões referentes ao objeto de estudo. Foram gravadas utilizando MP3, após anuência dos participantes. O tempo para cada entrevista foi em media 20 minutos. Quanto à observação livre, entende-se como aquela em que o pesquisador, permanecendo alheio à comunidade, grupo ou situação que pretende estudar, observa de maneira espontânea os fatos que aí ocorrem. Neste procedimento, o pesquisador é muito mais um espectador que um ator. Embora a observação simples possa ser caracterizada como espontânea, informal, não planificada, coloca-se num plano científico, pois vai além da simples constatação dos fatos (GIL, 2009). Os dados coletados pela observação livre (silêncio, choro etc.) foram anotados em diário de campo e serviram para complementar a análise das entrevistas. 3.5 Análise dos dados Os dados coletados por meio do TALP foram analisados pelo software EVOC – Ensemble de programmes permettant l’analyse des evocation (Conjunto de programas para análise de evocação) (VERGÈS, 1999), no intuito de identificar o núcleo central da representação social sobre hanseníase para cada gênero, software SIMI – Analyse de similitude de questionnaires et de données numériques e software Support logiciel graphique de création de graphiques (AVRIL) (SÁ, 1998; VERGÈS, 1997). O software Evoc fornece a frequência simples das palavras evocadas e a ordem de evocação média de cada uma delas, resultando em sua distribuição em quatro quadrantes, 37 através dos quais "se discriminam o núcleo central, os elementos intermediários (ou 1ª periferia), elementos de contraste e os elementos periféricos da representação (ou 2ª periferia)" (OLIVEIRA et al., 2005, p.581), de forma a determinar as palavras possivelmente pertencentes ao núcleo central da representação. Esse recurso informático representa um grande auxílio na organização dos dados, particularmente na identificação de discrepâncias do material e na realização dos cálculos das médias para a construção do quadro de quatro casas (OLIVEIRA et al., 2005). Os passos do tratamento dos dados e do funcionamento do software EVOC são descritos por Oliveira (2000), e serão brevemente relatados a seguir: 1) O primeiro passo implica em digitar – em formato Word – todas as evocações em sua forma bruta, em tantos arquivos quantos termos indutores forem coletados. 2) Segue-se a isso a correção ortográfica das palavras por meio da supressão de artigos e verbos de ligação. 3) Procede-se a uma padronização das palavras e termos evocados, para que haja uma homogeneização do conteúdo. 4) Em seguida, os arquivos devem ser transformados em formato Somente Texto para serem processados pelo EVOC. Construídos os quadrantes, essas informações devem ser consideradas pela pesquisadora para construir o sistema de categorias, que deveriam ser definidas não apenas a partir da freqüência dos termos, mas também em decorrência do universo que elas mesmas abrangem. Flament (1986) buscou desenvolver um método de análise de dados das representações sociais que atendesse a uma base matemática, mas respeitasse o caráter qualitativo dos dados e, principalmente, a natureza do fenômeno representacional. Esse autor propõe classificar os termos de uma produção discursiva baseada em um coeficiente de semelhança, a análise de similitude (OLIVEIRA et al., 2005). Em função da análise de coocorrência de palavras ou categorias, obtém-se uma matriz de similitude, a partir da qual podem ser calculados os índices de similitude. Esses dados podem ser simplificados através da construção da “árvore máxima” do sistema (FLAMENT, 1986). A noção que lhe dá suporte decorre da teoria dos “grafos”, pela qual a árvore máxima é um grafo conexo e sem ciclo, ou seja, aquele no qual todos os elementos (formando os vértices do grafo), são ligados entre si, existindo um só caminho para ir de um elemento ao outro (FLAMENT, 1986; DOISE et al., 1992; SÁ, 1996). Os dados de uma matriz de similitude podem também ser analisados através da construção de um grafo 38 apresentando todas as ligações entre todas as categorias, que após a aplicação de um filtro, possibilita a visualização das ligações mais importantes apenas (OLIVEIRA et al., 2005). Para a realização deste tipo de análise, a partir dos dados da evocação livre, define-se, primeiramente, o conjunto de categorias semânticas pelas quais se distribuem as palavras evocadas. Esse material passa então por uma análise de co-ocorrências, na qual são quantificadas as freqüências de co-ocorrência de cada categoria em relação a todas as outras (OLIVEIRA et al., 2005). Para a realização da análise de similitude neste estudo usamos o software SIMI e AVRIL, que realiza a construção de “árvores representacionais” ou “gráficos com filtros”, que expressam graficamente a força das ligações existentes entre todas as categorias (OLIVEIRA et al., 2005). A análise desenvolvida por Flament (1986) aqui apresentada possibilita mais um nível de explicitação, tanto do conteúdo quanto da estrutura da representação, confirmando ou questionando a hipótese de centralidade resultante da construção do quadro de quatro casas (OLIVEIRA et al., 2005). Os dados resultantes das entrevistas foram submetidos à técnica de análise de conteúdo temática de acordo com os pressupostos de Bardin (2008). Para a referida autora: A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por procedimentos objetivos e sistemáticos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens (BARDIN, 1977, p.42). Para Bardin (2008), o ponto de partida da Análise de Conteúdo é o material. Tratar o material é codificá-lo. A codificação corresponde a uma transformação, efectuada segundo regras precisas, dos dados brutos do texto, transformação esta que por recorte, agregação e enumeração, permite atingir uma representação do conteúdo. Para isso, a técnica de análise de conteúdo engloba as seguintes etapas: 1. a pré-análise - constituída pelo corpus, conjunto de documentos necessários aos processos analíticos. Nessa pesquisa, foi constituída de 40 entrevistas, das quais, 20 do grupo de mulheres (GF) e 20 do grupo de homens (GM). Também faz parte desta etapa a leitura flutuante, que corresponde a uma primeira leitura, livre, de todo o material, sem maiores controles, para que, subsequentemente, o pesquisador se detenha em leituras mais orientadas e 39 concisas. Essa etapa possibilita que se identifiquem categorias em potencial para posterior levantamento, ou seja, preparação do material; 2. a exploração do material – corresponde a decomposição do corpus, composta pelo recorte, inventário, categorização, codificação e descrição das categorias. A composição da unidade de análise consiste no momento de imersão e definição das categorias emergentes (empíricas) a partir da decomposição do corpus, seguindo-se sua codificação. Nesse estudo, foram definidas as seguintes unidades de análise: a frase como unidade de registro e, o parágrafo como unidade de contexto. 3. o tratamento dos resultados obtidos e interpretação - constituída por validação, estatístico, inferência e interpretação. Os dados brutos são tratados de maneira a serem significativos e válidos. Operações estatísticas simples (percentagens), ou mais complexas (análise fatorial), permitem estabelecer quadros de resultados, diagramas, figuras e modelos, os quais condensam e põem em relevo as informações fornecidas pela análise (BARDIN, 1977). Apresenta-se a seguir o plano de análise de conteúdo dessa investigação (Figura 1): PROCEDIMENTOS ETAPAS Constituição do corpus: 40 entrev. Leitura flutuante Preparação do material PRÉ-ANÁLISE Recorte Inventário Categorização Codificação Descrição das categorias EXPLORAÇÃO DO MATERIAL TRATAMENTO Validação Estatístico Inferência Interpretação DOS DADOS Representação Social sobre Hanseníase Figura 1 - Plano de análise Fonte: Elaboração de Maria Lúcia Duarte Pereira 40 Os resultados da análise foram discutidos com base na teoria das representações sociais, bem como, na literatura vigente sobre hanseníase e gênero. 3.6 Aspectos éticos da pesquisa Foram cumpridas as determinações éticas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, que dispõe sobre pesquisas com seres humanos (BRASIL, 1996). A pesquisa foi devidamente submetida à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa - CEP do Centro de Referência Dermatológica Dona Libânia, que deu parecer favorável a realização da mesma, sob protocolo nº001/2011. 41 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Características sociais e demográficas dos sujeitos Na Tabela 1 constam as características sociais e dos 100 sujeitos participantes do estudo. Destes, 50 (50%) do sexo masculino e 50 (50%) do sexo feminino, com idade média de 41,7 e desvio padrão 14,4. De acordo com a faixa etária, observou-se que 13 (13%) sujeitos se encontram entre 18- 25 anos, 37 (37%) entre 26- 40 anos, 44 (44%) entre 41- 65 anos. A idade mínima foi de 18 anos e a máxima de 80 anos. Em relação à escolaridade, 7 (7%) foram considerados analfabetos, 27 (27%) tinham de 1 à 4 anos de estudos, 36 (36%) possuíam de 5 à 8 anos de estudo e 30 (30%) haviam cursado acima de 8 anos. Quanto ao estado civil, 43 (43%) eram solteiros, 52 (52%) declararam-se casados e 5 (5%) viúvos. Segundo a ocupação, 18 (18%) não trabalhavam, 64 (64%) trabalhavam e 18 (18%) afirmaram serem donas de casa. 42 Tabela 1 - Características dos sujeitos constituintes da amostra de acordo com as variáveis sociais e demográficas. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Variáveis Idade Anos de Estudo Estado Civil Ocupação Renda 18 a 25 anos 26 a 40 anos 41 a 65 anos Acima de 65 anos Total Analfabeto 1 a 4 anos 5 a 8 anos Acima de 8 anos Total Solteiro Casado Viúvo Total Não trabalha Trabalha Dona de Casa Total Menos de 1 sm 1 a 2 sm 3 a 4 sm Acima de 4 sm Total Feminino N % 5 10 18 36 25 50 2 4 50 100 4 8 13 26 19 38 14 28 50 100 19 38 27 54 4 8 50 100 5 10 24 48 18 36 50 100 1 2 35 70 8 16 6 12 50 100 Masculino N % 8 16 19 38 19 38 4 8 50 100 3 6 14 28 17 34 16 32 50 100 24 48 25 50 1 2 50 100 8 16 40 80 0 0 50 100 1 2 35 70 8 16 6 12 50 100 *s.m.= salário mínimo vigente (R$ 510,00) A hanseníase é uma doença que possui prolongado tempo de incubação e tem diagnóstico essencialmente clínico de baixa complexidade. Entretanto, muitos usuários ainda convivem com o diagnóstico tardio quando seqüelas físicas já se encontram instaladas. A maior parte dos indivíduos situaram-se entre 41 a 65, a fato que comprova o diagnóstico tardio por parte dos serviços de saúde. Acima de 65 anos ainda tivemos 6 idosos. A doença pode levar à limitações laborais, o que é ainda mais grave porque atinge a faixa etária economicamente ativa. A variável anos de estudo é um dado relevante, pois diante de uma população com baixa escolaridade, tanto os enfermeiros quanto profissionais de saúde devem dedicar maior atenção quanto às explicações referentes aos assuntos mencionados, para que os portadores de enfermidades possam compreender e ser agentes ativos durante o processo de tratamento. 43 Foi constatado que mais da metade dos sujeitos eram casados, sendo importante que os profissionais de saúde procurem envolver a família durante o tratamento, no sentido desta contribuir na adesão, bem como desmistificando conceitos culturais que podem estar embutidos, evitando maior sofrimento por parte do sujeito. Assim como outras doenças de origem socioeconômica, a hanseníase carrega o mito de ser uma doença tropical. Esse termo, doença tropical, sabe-se bem, esconde o fato de que a doença não está relacionada a condições climáticas dos países quentes. A “lepra existiu na Europa por muitos séculos, vencendo invernos rigorosos. As “doenças tropicais” como a malária, a tuberculose, a doença de chagas, dengue, “lepra”, esquistossomose, entre outras doenças são doenças esquecidas e atingem quase exclusivamente as populações pobres (MINUZZO, 2008). 4.2 Características clínicas dos sujeitos Apresentam-se na Tabela 2 as características clínicas dos 100 participantes. Quanto ao tempo de conhecimento do diagnóstico da hanseníase, mais da metade 51 (51%) referiu saber do diagnóstico de 1 à 6 meses, 42 (42%) de 7 meses à 1 ano e 7 (7%) acima de 1 ano. No referente à classificação operacional, 26 (26%) eram paucibacilares e 74 (74%) multibacilares. Segundo a presença das reações hansênicas, estavam ausentes em 55 (55%) participantes. 44 Tabela 2 - Características dos sujeitos constituintes da amostra de acordo com as variáveis clínicas. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Variáveis Sexo Feminino Tempo de Diagnóstico Classificação Operacional Reações Hansênicas Masculino Total N % N % n % 1 a 6 meses 24 48 27 54 51 51 7 meses a 1 ano 24 48 18 36 42 42 Acima de 1 ano 2 4 5 10 7 7 Total 50 100 50 100 100 100 Paucibacilar 17 34 9 18 26 26 Multibacilar 33 66 41 82 74 74 Total 50 100 50 100 100 100 Presentes 23 46 22 44 45 45 Ausentes 27 54 28 56 55 55 Total 50 100 50 100 100 100 A classificação operacional do caso de hanseníase é baseada no número de lesões cutâneas de acordo com os seguintes critérios: paucibacilar são os casos com até cinco lesões de pele e casos com mais de cinco lesões são multibacilares (BRASIL, 2010). A pesquisa corrobora com os dados epidemiológicos nacionais que demonstra que o diagnóstico da hanseníase continua sendo feito tardiamente, constatado pela disparidade entre a classificação operacional de paucibacilares e multibacilares, em que estes ainda se apresentam em elevado número e assim mantendo a cadeia de transmissão da doença (BRASIL, 2008). A falta de conhecimento da população ou o conhecimento precário retarda a procura ao serviço, contribuindo para o diagnóstico tardio e mantendo as fontes de infecção, que por sua vez aumentam o número de casos infectados (SANTOS et al. , 2007). As reações hansênicas são prejudiciais ao tratamento, pois são interpretadas pelos pacientes como piora e não cura da doença. O Ministério da Saúde considera como reações hansênicas ou estados reacionais como alterações do sistema imunológico, que se exteriorizam como manifestações inflamatórias agudas e subagudas que podem ocorrer mais frequentemente nos casos multibacilares (BRASIL, 2010). 45 4.3 Representações sociais sobre hanseníase a partir das entrevistas Mediante exploração do material e aplicação da técnica de análise de conteúdo, foram apreendidas um total de 2528 unidades de registro, constituindo 5 categorias e 12 subcategorias. Como categorias temos: concepções sobre hanseníase (conhecimento sóciocultural, sintomatologia clínica, conhecimentos técnicos e científicos, aspectos relacionados ao gênero); percepções sobre a doença (autopercepção e heteropercepção); convivendo com a hanseníase (alteração na rotina, limitações profissionais); aspectos relacionados ao tratamento (adesão ao tratamento como promoção do cuidado, espiritualidade; enfrentamento da hanseníase (aceitação da doença e baixa autoestima). Apresenta-se a seguir a tabela 3, com as categorias, e suas respectivas subcategorias, bem como a codificação e o total de unidades de análise. Tabela 3 - Distribuição das categorias e subcategorias simbólicas sobre a hanseníase dos grupos feminino e masculino. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Categorias Subcategorias Codificação I)Concepções sobre hanseníase - CSH 1. Conhecimento sociocultural CC - 78 2. Sintomatologia Clínica SM - 200 II)Percepções sobre a doença - PSD III)Convivendo com a hanseníase - CVH IV)Aspectos relacionados ao tratamento - ART V)Enfrentamento da hanseníase - EFH 3. Conhecimentos técnicos e científicos 4. Aspectos relacionados ao gênero 1. Autopercepção Nº de unidades de registro CSH - 697 CT - 242 AG - 177 AP - 107 PSD - 599 2. Heteropercepção 1. Alteração na rotina 2. Limitações laborais 1. Adesão ao tratamento HP - 492 AR - 154 LL - 195 CVH - 349 2. Busca da espiritualidade BE - 88 1. Aceitação da doença AD - 298 2. Baixa autoestima BA - 103 AT - 394 ART - 482 EFH - 401 46 Categoria 1: Concepções sobre hanseníase Esta categoria engloba as unidades de análise temáticas nas quais os participantes descrevem seus conhecimentos e opiniões acerca da hanseníase, assimilados por meio do convívio sócio-cultural, experiência da sintomatologia da doença, conhecimentos técnicos e científicos adquiridos com outros pacientes, profissionais de saúde ou por meio da mídia e aspectos relacionados ao gênero. Esta categoria é composta por 4 subcategorias: conhecimento sócio-cultural, sintomatologia clínica, conhecimentos técnicos científicos e aspectos técnicos científicos e aspectos relacionados ao gênero, com um total de 697 unidades de análise temática. A tabela 4 apresenta em destaque com maior número de unidades de análise as subcategorias sintomatologia clínica e conhecimentos técnicos científicos para os dois grupos. Tabela 4 - Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de concepções sobre hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Sexo GF - Feminino GM - Masculino Total Subcategorias N % N % N % Conhecimento sociocultural 31 8,6 47 13,9 78 11,2 Sintomatologia Clínica 135 37,6 65 19,2 200 28,7 99 27,6 143 42,3 242 34,7 94 26,2 83 24,6 177 25,4 359 100,0 338 100,0 697 100,0 Conhecimentos técnicos e científicos Aspectos relacionados ao gênero Total Subcategoria 1.1: Concepções ancoradas nos conhecimentos socioculturais Nesta subcategoria, os sujeitos apresentam concepções sobre hanseníase associadas ao conhecimento provenientes da sabedoria popular vinculada as histórias sócioculturais da doença e suas passagens na bíblia. 47 As representações sociais, entendidas como uma forma de conhecimento de senso comum e socialmente partilhado tem em seu bojo a idéia de um conhecimento construído por um sujeito ativo em íntima relação com o objeto culturalmente construído, que revela marcas tanto do sujeito como do objeto, ambos construídos social e historicamente (TRINDADE; SANTOS; ALMEIDA, 2011). Os dois grupos associam hanseníase à idéia de isolamento, doença horrível que faz cair os pedaços, também trazem a mudança de terminologia de lepra para hanseníase, mas essa foi uma estratégia que pouco avançou na superação do preconceito relacionado a enfermidade. A presença de explicações a partir do imaginário social surge no discurso para conferir significado para aspectos ignorados da doença. Assim, um mesmo discurso apresenta ambos os conteúdos: aquele oriundo do saber médico e aquele proveniente do imaginário popular (LUNA et al., 2010). Quadro 1 - Unidades de análise temática da subcategoria concepções ancoradas nos conhecimentos socioculturais. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Grupo das mulheres com hanseníase Grupo dos homens com hanseníase -Porque antes era uma doença que assim, o pessoal até isolava a gente. Agora já não ta uma doença mais, nem tão bicho? Agora todo mundo é tratado normal como se não teve aquela doença. - É uma doença como se fosse uma peste, né? que nem lembro mais o nome - Pensa que aquilo Não fica boa né? Que de primeiro era conhecido como lepra. Não tinha cura de primeiro, porque não tinha remédio para essas coisas. - É a doença que cai os pedaços da gente se a gente não se tratar. No começo, fica aquelas manchas, fica atacando os nervos da gente. Tudo isso. Os médicos disseram que eu tinha que tomar meus remédios pra ficar boa, só isso. - Porque...era antigamente se falava outro tipo, tinha um outro nome, pois é, eu achava que lepra era que as pessoas ficavam isoladas, caía dedo, ficava paralisada, essas coisas assim, mas eu realmente, não sabia o que era, mas hoje eu já sei. - A hanseníase diz na bíblia que é a lepra né? Se no tempo passado era de nominado de lepra eu fico com ela. É lepra pra todos os efeitos. - Na verdade já chegaram pessoas pra me falar que a hanseníase era aquela antiga lepra. Caía os dedos.Eu num sei não cheguei a conhecer a doença. Mas eu falo isso também. Então esse é o motivo que ainda tenho medo de falar, porque se for realmente essa doença que era antes?É uma coisa horrível. Constata-se nas falas uma importante relação com a história e os mitos referenciados na bíblia. Esta por sua vez traz a questão da lepra como uma pluralidade de doenças, porém para os sujeitos este é um aspecto que não ficou claro e eles continuam a mencionar a hanseníase como uma doença horrível. Na Antiguidade, os hansenianos eram vistos como vítimas de um mal enviado por Deus aos cristãos, mas a doença também era interpretada como uma praga divina que recaía 48 sobre os seres infames. Contudo, num ponto havia um consenso no olhar sobre os leprosos: eles inspiravam nojo, repugnância e medo (SAVASSI, 2010). Percebido pelo isolamento e pela simbologia que impregna a doença, apontada pela Bíblia Cristã como castigo divino, relacionada ao pecado pela Igreja Católica, e punida com a morte pela Europa Medieval. O preconceito é tema recorrente em hansenologia, e nem mesmo a mudança do nome da doença foi capaz de estancá-la, já que gerou ainda mais confusão em uma população leiga e desinformada (SAVASSI, 2010). Segundo o mesmo autor, esta reconstituição histórica traz subsídios para o entendimento de como uma doença caracterizada pelo preconceito, pela segregação e por deformidades visíveis que expõem, por várias vezes, o paciente de maneira explícita e podem afetar de maneira definitiva toda a trajetória de vida de milhares de pacientes (SAVASSI, 2010). Subcategoria 1.2: Concepções ancoradas na sintomatologia clínica Esta subcategoria está relacionada à vivência dos sintomas pelos sujeitos. Entretanto, o grupo de mulheres se refere aos sintomas como incapacitantes, a interpretação da gravidade das manchas e feridas. Também em uma das falas a doença foi compreendida como câncer. O grupo dos homens se refere às reações ao tratamento, porém amenizando-os apenas como incômodos, minimizando a sintomatologia da doença. 49 Quadro 2 - Unidades de análise temática da subcategoria concepções ancoradas na sintomatologia clínica. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Sintomatologia grupo das mulheres Sintomatologia grupo dos homens - É uma doença que a gente pega não sei de quem. Ela destrói a vida da gente. Porque é dor não sei aonde, é dor nas juntas, dor nos nervos. Eu não consigo dormir direito, mancha pra todo lado. É feio, ninguém vai nem a praia. - Assim, tenho dificuldade, já quebrei prato, quando eu vou pegar não tenho forças nas mãos. Então eu acho assim, pra uma dona de casa que precisa fazer tudo, tem dia... - A hanseníase pra mim é uma das piores doenças. Porque só o que o que eu entendia quando era mais nova. A hanseníase que era como se ela fosse o câncer. - O que eu senti foi assim, dores nas juntas, a dormência né? O tempo todim. Já vinha mais de 5 anos que eu vinha sentindo umas dor, mas, não sabia o que era. Fazia o exame e nunca dava, só dá reumatismo nos ossos. Aí em março do ano passado, fui fazer o exame, aí deu o resultado. - Eu to sentindo umas coisas muito estranhas, na verdade. Tipo um cansaço, indisposição e...algumas coisas que a gente vê. Tive reação também como já falei. Certas coisas que a gente fica assim...até um pouco desmotivado. - Já to melhor do que o que tava já. Antes eu tava todo inchado,todo... os pés todo inchado, as mãos...é complicado,é difícil pra gente, Nos discursos ficou evidente o quanto o processo patológico é relevante na alteração da rotina dos portadores de hanseníase. Principalmente por ser uma doença cuja sintomatologia, inicialmente, não prejudica a rotina do homem e associado ao desconhecimento sobre o assunto podem retardar a percepção que os doentes têm sobre a hanseníase e a busca a assistência à saúde. Há momentos em que as diferenças de papéis sociais entre o ser homem e o ser mulher contribuem para a existência de vivências distintas no campo da sexualidade dos portadores de hanseníase. No que se referem às atividades físicas em geral, ambos os sexos sentiram uma diminuição na disposição, algumas vezes levando ao isolamento social e outras por medo de contagiarem pessoas com quem convivem. O reconhecimento de qualquer sintoma corporal depende de dois fatores: primeiro, da percepção de algo incomum no corpo e, segundo, de um conhecimento que remeta esta percepção a uma situação de doença. No caso da hanseníase, a junção desses dois fatores é difícil de ocorrer uma vez que a percepção de um sintoma corporal depende em grande medida, de uma referência simbólica que o situe no interior de um sistema de conhecimento e crenças (FELICIANO; NOVAES, 1996). 50 A reação hansênica encontra-se como um grande problema no tratamento dos portadores de hanseníase. Na prática de campo, a carga de sofrimento produzido por esta morbidade reflete diretamente na incompreensão dos pacientes quanto à realidade de hoje que hanseníase tem cura (SOUZA, 2010). De acordo com Lahlou (2011) representação social é o meio pelo qual os seres humanos representam objetos de seu mundo. Ferramenta de pensamento, é também uma placa giratória: entre o indivíduo e o grupo, entre o material e o ideal. Subcategoria 1.3: Concepções ancoradas nos conhecimentos técnicos e científicos Alguns participantes além de manifestarem conhecimentos embasados em suas vivencias, relatam conhecimentos condizentes com a literatura, tendo obtido essas informações em fontes como livros, panfletos, cartazes e recursos da mídia e também pela interação com os profissionais de saúde. Os discursos nos mostraram que os sujeitos tinham um conhecimento rudimentar da doença, a comunicação entre profissionais e usuários se mostrou precária, pois alguns sujeitos relataram não crer na cura da doença. A hanseníase tem sido colocada como uma doença incurável e incapacitante em diversas sociedades e culturas e em diferentes períodos históricos. E afirmar que a doença tem tratamento e cura às vezes não é suficiente, dependendo do imaginário cultivado sobre a doença (BITTENCOURT et al., 2010). A linguagem técnica que em muitos casos se faz presente na relação entre os profissionais e portadores da hanseníase vai de encontro às possibilidades de apreensão dessas informações pelos portadores. Esta fragilidade no processo de cuidado impulsiona os portadores para o aprofundamento de um conhecimento/reconhecimento da doença, tendo-se em vista singularidades vivenciadas por cada um (NUNES; OLIVEIRA; VIEIRA, 2011). 51 Quadro 3 - Unidades de análise temática da subcategoria concepções ancoradas nos conhecimentos técnicos e científicos. Fortaleza, 2011. Concepções do grupo das mulheres Concepções do grupo dos homens - No meu caso, o meu tipo de hanseníase não pega, não é contagioso, mas eu acho que todo mundo ta sujeito a ser preconceituoso. - As pessoas pensam que foi pegado de alguém, ou de uma pessoa que...um namorado. Eu acho que foi assim, que foi pelo meu pai. Assim, eu não sei como ele pegou porque eu morava todos juntos. Como dizem que as pessoas que moravam tudo junto pode, até com a saliva, com qualquer coisa. -Não é que os remédios não sejam suficientes, faz o tratamento e apelar pra sorte. Terá pessoas que cura, terá as pessoas que não cura, que volta. De novo, eu tenho certeza disso. Eu conheci pessoas que eu converso que já fizeram o tratamento, quando chega mais velho começa a sentir as seqüelas, ficam as seqüelas, nunca é 100% o tratamento. O enfermeiro passou pra mim, nem sempre a doença é tão contagiosa, como o povo tem medo. - A hanseníase segundo os médicos, se você toma o medicamento com uma semana ou duas, eu não sei quanto tempo, ela não tem mais como transmitir, então você ta tranqüilo. Agora se as pessoas não são informadas disso vão ficar com receio daquelas pessoas que tão sofrendo por causa da hanseníase. - Eu nem sabia...assim...explicar desse jeito. Eu vi num papel, mas, era muito científico. É ...acho mesmo que é só...esse..tipo assim... uma doença tipo uma coceira...sei lá. Aí a pele tem umas manchas vermelhas. Essa coisas...assim. Fica ...onde tem a manchinha fica dormente, pouquinho dormente, e onde não tem, normal mesmo a sensibilidade, só isso mesmo eu acho. Dessa forma, a concepção social da patologia apenas poderá ser modificada se a educação em saúde for valorizada pelos profissionais de saúde, sendo imprescindível o estímulo a reflexão crítica do individuo para direcionar uma escuta qualificada e singular. Somente desta forma a prática avançará para a desmistificar conceitos equivocados por parte do sujeito e da comunidade onde este se encontra inserido. Subcategoria 1.4: Concepções sobre hanseníase ancoradas nos aspectos relacionados ao gênero De acordo com os discursos emergidos nesta subcategoria encontramos uma opinião divergente em relação aos aspectos relacionados ao gênero, pois enquanto para as mulheres ter hanseníase mostrou-se como um diferencial importante acerca da imagem corporal e dos cuidados com a família, os homens referenciaram não haver diferença no convívio com a doença. 52 Quadro 4 - Unidades de análise temática da subcategoria concepções sobre hanseníase ancoradas nos aspectos relacionados ao gênero. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 O gênero para o grupo das mulheres O gênero para o grupo dos homens -Mulher, é diferente né?Porque de primeiro eu não tomava medicamento, não tinha esse negócio de usar protetor, andar no sol. Eu sinto muita dor de cabeça. É diferente e eu ainda dou de mamar pra minha menina. É diferente. Mudou tudo. - Tem tudo de diferente, eu como mulher não posso mais ir pra certos lugar e, as pessoas do meu trabalho tem preconceito.Na hora de fazer sexo, não tenho vontade mais. Acho que é devido os comprimidos, eu não sou mais a mesma mulher sabe?O companheiro às vezes não quer porque acha que pega. Muito chato. - Eu acredito que para mulher é bem pior, porque a gente fica com o corpo todo manchado, olha a situação da minha orelha aqui. Muita coisa muda no corpo da gente, a medicação é muito forte, eu tinha muita náusea. Eu acho diferente, com certeza pra nós mulheres deve ser. - Pros homens, devido eles terem uma vida tão...não tão nem aí com nada. É mais fácil aceitar. Mas, a gente que se preocupa com filho se preocupa com trabalho, se preocupa com os parentes, tudo isso prejudica muito a gente. - Eu acho que não tem diferença, porque o que é que a mulher é?É gente. O que eu sou? No tocante ao homem. O que eu sou? Sou gente. A mulher é vida e eu também sou vida. Eu não acho nenhuma diferença não. Pra mim né, na minha concepção. -Não sei...acho que é normal, fazer o que né?A gente pega e outra pessoa pega. Eu acho que talvez tenha diferença, não sei...mas, no momento, não consigo pensar na diferença. - Tanto faz. Pra mim tanto faz, assim como prejudica um prejudica o outro né? Durante muito tempo, as diferenças em saúde entre homens e mulheres foram naturalizadas, com base em teorias biológicas pretensamente neutras. Muitos autores têm buscado mostrar que isso resulta de concepções de gênero, nas quais o homem é considerado modelo universal do humano e a mulher como outro, especial desviante (AQUINO, 2006). Em uma das falas no grupo das mulheres é mencionado a falta de vontade de fazer sexo relacionado ao tratamento. A sexualidade dos portadores de hanseníase pode ser afetada e deve ser mais valorizada pela equipe de saúde que presta os cuidados, talvez por desconhecimento, ou por dificuldades, uma vez que falar sobre esse assunto, implica conhecer as suas limitações e seus problemas. Os profissionais de saúde também fazem parte de um contexto sócio-econômico e cultural, onde os conhecimentos e as práticas que se voltam para o processo saúde-doença ligado à sexualidade quase sempre esbarram em questões morais e sociais, dificultando assim as discussões sobre o assunto. A aplicação da categoria gênero em estudos na área da saúde tem sido recente, e durante muito tempo houve uma tendência em considerar tudo que se refere ao corpo como “natural”, “a-histórico” e “imutável”. No entanto, a partir do final do século XX e do início do 53 XXI, diferentes áreas do conhecimento passaram a discutir a singularidade do corpo e do gênero na cultura brasileira (GOLDENERG, 2005). Partindo dessa prerrogativa, ser homem ou mulher, brasileiro ou chinês não depende de suas respectivas composições genéticas, mas sim, como esses, através e em razão de sua cultura, irão se comportar ou pensar. Estudos etnográficos sobre padrões de comportamento sexual, segundo os recortes de gênero, têm indicado que há grandes variações em comportamentos dos sexos e que essas variações se fundam no que as pessoas têm aprendido de sua cultura sobre o que é ser homem ou mulher (LANGDON; WIIK, 2010). A inclusão do gênero como categoria analítica é fundamental em estudos relacionados à saúde e ao corpo, uma vez que rejeitar o determinismo biológico e a idéia “naturalizada” da distinção sexual contribui para a compreensão das iniquidades calcadas nas relações hierárquicas de poder (MELO; OLIVEIRA, 2011). Categoria 2: Percepções sobre a doença Esta categoria mostra os sentimentos e percepções dos sujeitos sobre si mesmos e acerca do que os outros pensam deles. A mesma é composta por 2 subcategorias: autopercepção e heteropercepção, com um total de 599 unidades de análise. A Tabela 5 apresenta destaque para a heteropercepção nos dois grupos com 492 unidades temáticas (82,1%). Entretanto, destaca-se a maior contribuição no grupo de mulheres com 333 unidades de análise temática (77,6%). Tabela 5 - Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de percepção sobre a doença, segundo os grupos feminino e masculino. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Sexo Feminino Subcategorias Masculino Total N % N % N % Autopercepção 61 15,5 46 22,4 107 17,9 Heteropercepção 333 84,5 159 77,6 492 82,1 Total 394 100,0 205 100,0 599 100,0 54 Subcategoria 2.1: Percepções da hanseníase ancoradas na autopercepção Esta subcategoria mostra os sentimentos dos portadores de hanseníase sobre o que é a hanseníase para eles mesmos. Neste contexto, o processo construído pelos sujeitos a partir de suas experiências revela na sua grande maioria como negativos, emergindo o auto preconceito como algo muito presente em seus cotidianos. O grupo de mulheres refere o isolamento como estratégia para não agredir as pessoas. Essa atitude faz com que elas sintam-se tristes e sozinhas. O grupo de homens, por sua vez demonstram o auto preconceito pela negação de ser portador diante da sociedade. Quadro 5 - Unidades de análise temática da subcategoria percepções da hanseníase ancoradas na autopercepção. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Autopercepção para o grupo de mulheres Autopercepção para o grupo de homens -A pessoa mesmo se sente envergonhada, até de - Porque as pessoas, tipo assim, querem se afastar chegar numa igreja, todo mundo olha para seus pés. Num aniversário, todo mundo olha logo para suas pernas e hanseníase ta tão conhecido que as pessoas não tem mais dúvida. -É muito triste, muito triste.Porque a gente tem que se isolar de tudo. As pessoas que tem e tem a cabeça com pouco estudo como eu pra se isolar de tudo, pra não ofender a ninguém é triste, é muito triste a gente se achar sozinha. mais, por isso eu não falo pra ninguém. Só falo pros meus pais mesmo. O pessoal pergunta porque eu tava tão escuro e eu disse que eu tava pegando muito sol. Toda vez eu falo a mesma coisa. A hanseníase deve ser considerada em sua conjuntura política, cultural e técnica que favorece o preconceito e o sofrimento humano. As cicatrizes psicológicas herdadas de outros momentos históricos e a mudança eufêmica do nome lepra para hanseníase não conseguiu acabar com a discriminação social vivenciada por eles. Essas pessoas são vitimadas pelo preconceito em seu núcleo familiar e no seu contexto social (NEVES; RIVEMALES, 2010). Subcategoria 2.2: Percepção da hanseníase ancorada na heteropercepção Esta subcategoria emergiu nas falas dos entrevistados, ao serem interrogados sobre o que os mesmos pensam sobre o que é a hanseníase para as outras pessoas. A doença é 55 uma condição que afasta as pessoas. Assim, os indivíduos que convivem com estes pacientes expressam algumas vezes claramente e outras, disfarçadamente o medo de contraírem a doença. As mulheres a representam como “doença nojenta”, que suja o corpo e afasta as pessoas. Também gera preconceito, para si e demais membros da sociedade. Quanto aos homens, se referem a hanseníase como “doença rejeição” e para evitar tal feito evitam falar de sua condição para amigos e pessoas que não sejam pai ou mãe. Quadro 6 - Unidades de análise temática da subcategoria percepção da hanseníase ancorada na heteropercepção. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Heteropercepção para o grupo de Heteropercepção para o grupo de mulheres homens -Mas como eu já disse, quem me pergunta, tem as - As pessoas ficam com aquela rejeição da pessoa. pessoas que eu falo e tem outras que eu não falo. Porque aí não quer ficar perto da gente, isso dói na pessoa né?Não quer ficar perto da gente. Não quer comer...se a gente bebe água quer rebolar o copo. Então isso é muito chato, muito ruim. - É uma doença assim ,muito nojenta né?Que aparece de uma hora para outra no corpo da gente. Sem menos esperar, a gente tem um corpo limpim, com um pouco mais, o corpo fica cheio de mancha e as manchas custa pra ir se borá. Eu acho muito chato, eu não desejo o que eu tenho pra ninguém. - Eu acho assim como um terror, eu acho que as pessoas tem preconceito.Por não ter ou então é desinformação, né? O preconceito é grande. (pede para encerrar e começa a chorar) Isso trás , como é que se diz, trás uma preocupação pra pessoa que é vítima da hanseníase, mas se você colocar na sua mente que você é uma vítima e tem muitas pessoas que por dentro são vítimas. - É porque digamos assim, já aconteceu várias vezes, que eu ia pra uma festa e conhecia pessoas, aí quando a gente marca um encontro, vem aquela situação, ás vezes a gente não quer falar, às vezes fala. Aí a pessoa rejeita né?Aí fica difícil, agente fica rejeitado. Aí não acontece. - Rapaz, preconceito tem muito sabe. Que quando eu comecei o tratamento e contei pros meus amigos. Tinha amigo meu que não vinha nem em casa, chegava nem perto de mim. Dizia que pegava, que era um negócio de lepra sabe. E preconceito até no meu trabalho, do pessoal que morava lá sabe. Por isso que às vezes eu tenho receio de dizer que tenho hanseníase. Eu digo que é alguma coisa que apareceu. Mas não digo que é hanseníase não. É um preconceito medonho. Infelizmente é. Em uma realidade que exalta a beleza, principalmente para as mulheres, ter(em) o corpo manchado, como mostram as falas, é um sofrimento a mais ser considerado pois as exclui ou as coloca fora dos padrões de perfeição exigido pela sociedade. Assim, são portadores de um estigma, pois possuem alguma diferença que provoca(va) dificuldade de aceitação social. Por ter um estigma, é reduzida a possibilidade da plenitude de vida do sujeito, que passa a ser alvo de diversos tipos de discriminação, contribuindo para seu isolamento perante a sociedade (BITTENCOURT, 2010). 56 Face a essa realidade, a necessidade de se proteger da exclusão social, faz com que os doentes se afastem de suas atividades sociais comuns e até mesmo de familiares, com consequentes prejuízos ao tratamento adequado dos casos (SILVA; PAZ, 2010). Categoria 3: Convivendo com a hanseníase Esta categoria agrupa 349 unidades de análise, por meio das quais os sujeitos descrevem que o convívio com a doença altera o cotidiano, trás limitações profissionais e sociais. Esta categoria é composta por 3 subcategorias: alteração na rotina e limitações laborais. A tabela 6 apresenta como destaque a subcategoria limitações laborais com 195 (55,9%) das unidades de análise. Tabela 6 - Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de convivendo com a hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Sexo Feminino Subcategorias Masculino Total N % N % N % Alteração na rotina 113 47,7 41 36,6 154 44,1 Limitações laborais 124 52,3 71 63,4 195 55,9 Total 237 100,0 112 100,0 349 100,0 Subcategoria 3.1: Convivência com a hanseníase ancorada na alteração da rotina Os dois grupos relatam alterações em suas rotinas após o início do tratamento para hanseníase, corroborando com a pesquisa de Nunes, Oliveira e Vieira (2011) onde os participantes trazem a hanseníase como um problema que gera sofrimento e impacto em seus cotidianos. As falas dos dois grupos destacam algumas mudanças drásticas e até exageradas, atitudes que aumentam o sofrimento para seus portadores. Essas mudanças são associadas diretamente aos efeitos indesejáveis do tratamento medicamentoso, como por exemplo, o escurecimento da pele. Por ser uma doença incapacitante, alguns participantes manifestaram dores por todo o corpo, pondo em risco a harmonia de sua vida, impedindo-os de trabalhar e 57 realizar tarefas diárias, impondo assim limitações às suas atividades, acarretando verdadeiras mudanças em suas vidas, como também a diminuição das atividades de lazer e sociais. Quadro 7 - Unidades de análise temática da subcategoria convivência com a hanseníase ancorada alteração na rotina. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Alteração na rotina para o grupo das Alteração na rotina para o grupo dos mulheres homens - Minha rotina é normal, a única coisa diferente é que eu tinha alguns hábitos, que eu gostava, que eu saia pra beber com alguns amigos, hoje eu não posso mais devido aos remédios. Não posso mais pegar sol, uma coisa que eu gostava muito era de praia, até viajava pra praia, tipo Canoa Quebrada, alguma coisa assim. E eu me sinto mal com os remédios, eu sinto mal-estar, tonturas, mas, a rotina da minha vida continua normal, trabalho, estudo, namoro, minha família. - A minha vida tá sendo normal é..só uns cuidados a mais com o sol, alimentação também, porque eu não tô comendo todas as comidas que comia, porque às vezes eu sinto até falta de sono por causa desses remédios que eu tô tomando. - E ainda hoje to me tratando né? Meu rosto aqui era inchado, minha orelha era inchada, minhas mãos eu não podia nem pegar numa colher que doía, podia nem fechar a mão que era inchada, meus pés parecia pé de bêbado, inchado. Toda descamando mesmo. Aí eu pensava que não ia melhorar disso. Eu tomo muito remédio chega me da dor de cabeça. - Eu não sei não...a gente não pode sair, não pode jogar, não pode trabalhar, aí fica meio ruim pra gente. Dentro de casa ta bom também né? -Eu já tinha avisado pros meus amigos tudim que eu tava fazendo tratamento, que eu não podia assim, beber, tocar em álcool. Tinha falado pra minha namorada... - A mesma coisa é... fazer tratamento bem, se alimentar. Meus pais disseram que eu não posso jogar futebol, nem me ferir, e nem sai no sol muito. Que pode levar a reação e morte. Estudo que avaliou a qualidade de vida em pacientes com hanseníase concluiu que esta doença causa grande prejuízo para a vida diária das pessoas e as relações interpessoais, provocando sofrimento que ultrapassa a dor e o mal-estar vinculados ao prejuízo físico, o que provoca grande impacto social e psicológico. Esse prejuízo na qualidade de vida está associado de maneira mais importante às formas mais graves da doença, como a multibacilar, reação hansênica e incapacidades físicas (NUNES; OLIVEIRA; VIEIRA, 2011). Subcategoria 3.2: Vivência com a hanseníase ancorada nas limitações laborais Esta subcategoria relata que as atividades laborais são prejudicadas pela incapacitação que a hanseníase provoca. A mesma pode ser devido à sintomalogia bem como pelas reações hansênicas. 58 Quadro 8 - Unidades de análise temática da subcategoria vivência com a hanseníase ancorada nas limitações profissionais. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Limitações laborais para o grupo de Limitações laborais para o grupo de mulheres homens - Mudou muita coisa, no trabalho, a gente não tem uma assistência, vou ter que trabalhar do mesmo jeito e eu não posso trabalhar do mesmo jeito. Eu acho que deveria ter assim, um acompanhamento, uma ajuda de custo. - Sei lá ...acho que mulher pra ter hanseníase, a mulher não tem capacidade pra nada, nem pra arranjar serviço, porque o pessoal tem medo né? Acho que muito mais em mulher do que homem. - Já tô melhor do que o que tava já. Antes eu tava todo inchado, todo...os pés todo inchado, as mãos...é difícil pra gente porque a gente não consegue trabalhar. - Se eu não tivesse sido vítima dessa reação, taria trabalhando, tranquilo, tranquilo. Olha eu não vejo nenhum problema, a não ser esse, eu me impossibilitar de trabalhar. - Eu já parei o trabalho faz algum tempo porque to me tratando de outra coisa, da cabeça, aí eu parei. - Tá ótima, minha vida está boa, estou confiante, estou mais ativo. A respeito da doença, eu me sinto bem. Me sinto pra cima. Porque antes eu...é...uma espécie de depressão. Eu me preocupava muito, pensava muito em como isso iria sair da minha vida. Mas, a partir do tratamento e dos conselhos da minha filha e da doutora e de outros também que trabalham aqui no posto, eu me sinto que agora eu estou recuperado, tô bem. Alguns sujeitos do estudo relataram melhora na sua vida após a descoberta da hanseníase, pois além de finalmente obterem uma conclusão diagnóstica, com melhora da sintomatologia também mencionaram a valorização da vida, classificando-a como normal, devido estarem trabalhando. A doença também traz conseqüências sócio-culturais que podem interferir na recuperação. Às famílias hoje, devido às condições sócio-econômicas precárias, enfrentam grandes dificuldades. Ter alguém doente muitas vezes o faz repensar sua estruturação; terão que lidar com o novo podendo levar as pessoas, inicialmente a forte desgaste em suas relações, necessitando de tempo para se adaptar. Outras vezes, a relação que se estabelece é de um verdadeiro encontro de afeto e solidariedade com o indivíduo, fortalecendo-o, acolhendo-o e apoiando-o para superar e vencer juntos esse estrangeiro (a doença) que adentra na família (SILVA et al., 2008). A hanseníase não passa desapercebida na vida das pessoas, ela deixa sua marca, seja física ou emocional, durante um período de tempo limitado ao tratamento, mais longo ou por toda a vida, como no caso das incapacidades físicas. A doença, a sintomatologia, o 59 tratamento em si, as reações hansênicas e as sequelas físicas muitas vezes os restringem ao trabalho. A expectativa de não poder mais fazer o que se fazia antes, limitado pela doença, faz com que o sujeito se sinta inferior, diferente, desqualificado, situação que atinge sua esfera emocional interferindo em todo o quadro de saúde e possibilitando a existência de um círculo vicioso que, muitas vezes, precisa de auxílio profissional para ser rompido (SILVA et al., 2008). A hanseníase desencadeia, muitas vezes, um processo que envolve mentira e omissão na relação de trabalho. A necessidade de mentir ou omitir sua situação de saúde ainda torna-se necessária para a permanência ou obtenção de emprego (SILVA et al., 2008). O trabalho é fonte de realização de necessidades biopsicossociais e fonte de realização das expectativas individuais e coletivas. Assim, a transformação vem atingindo a população de maneira geral e, em especial, os que se encontram sem condições de competir em condições de igualdade com os demais (ROCHA; FRITSCH, 2002). O que confere especificidade às representações sociais não será tanto o maior ou menor número de sujeitos ou grupos a compartilharem, nem tampouco o caráter coletivo do seu modo de produção, mas, sobretudo, a função que desempenham, a saber, que as representações sociais “contribuem exclusivamente para os processos de formação das condutas e de orientação das condutas sociais” (MOSCOVICI, 1976, p. 75). Categoria 4: Aspectos relacionados ao tratamento Esta categoria trás as unidades de análise nas quais os sujeitos descrevem suas vivências em relação à adesão ao tratamento, tema extremamente relevante para a promoção do cuidado, pois este é um dos aspectos que podem levar ao controle da doença. Também foi abordada a busca da espiritualidade que foi mencionada em várias falas como apoio para o tratamento. Nesta categoria foram agrupadas 2 subcategorias: adesão ao tratamento e busca da espiritualidade, com um total de 482 unidades de análise temática. 60 Tabela 7 - Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de aspectos relacionados ao tratamento, segundo os grupos feminino e masculino. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Sexo Feminino Subcategorias Masculino Total N % N % N % Adesão ao tratamento 260 80,0 134 85,4 394 81,7 Busca da espiritualidade 65 20,0 23 14,6 88 18,3 Total 325 100,0 157 100,0 482 100,0 Subcategoria 4.1: Aspectos relacionados ao tratamento ancorados na adesão ao tratamento Nas falas o grupo de mulheres relata o conhecimento precário da doença e seu desejo de compreendê-la melhor, ressalta a importância do vínculo com o profissional de saúde que as acompanha, inclusive como instrumento para que possam esclarecer suas dúvidas. Em relação aos homens o discurso dá ênfase à adesão ao tratamento e ao conhecimento prévio da doença para o diagnóstico precoce. Quadro 9 - Unidades de análise temática da subcategoria aspectos relacionados ancorados na adesão ao tratamento. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Adesão ao tratamento para mulheres Adesão ao tratamento para homens - Tudo isso. Os médicos disseram que eu tinha que tomar meus remédios pra fica boa, só isso. Que eu também não podia pegar quentura, nem sol. Usar creme no meu corpo, porque fica a pele toda ressecada. - Pra mim é como eu lhe disse...é uma doença que tive medo, quando eu soube que ela era contagiosa, fiquei com muito medo. Mas, depois que eu comecei o tratamento, pronto, ela se tornou uma doença normal. - Pra se cuidar dela tem que ser com muito cuidado, porque se você for levar ao extremo de fazer certas extravagâncias, certas coisas que não deve, vai trazer conseqüências drásticas pra sua vida. Isso é o que eu vejo. - O problema que eu vejo é se a pessoa não fizer o tratamento correto, ou seja, segundo até o hospital aqui, ele mostra uns panfletos, tipo assim, que diz né... que se você notar alguma mancha, você procure logo o médico. Agora se você não procura e deixa ela se alastrar e tomar de conta do seu corpo com certeza vai trazer mais ainda desagradáveis. A adesão ao tratamento medicamentoso é um fator determinante no sucesso terapêutico. A adesão pode ser influenciada por múltiplos fatores ligados a doença, ao 61 tratamento, às condições sociais e econômicas, como também relacionada à assistência recebida, para conhecer qual pode ser o fator da não aderência é indispensável uma escuta qualificada por parte dos profissionais que atende este sujeito para conhecer suas dúvidas individuais e fazê-los se sentir corresponsáveis pela sua saúde, infelizmente não foi o que as falas mostraram. Compreende-se que o conhecimento das dificuldades encontradas na adesão ao tratamento da hanseníase é indispensável para subsidiar uma assistência mais humanizada e de qualidade, implicando na promoção de ações de saúde que se traduzam nas resoluções dos problemas identificados, na satisfação e na garantia de uma assistência integral (LUNA et al., 2010). A relação entre o profissional de saúde e o doente também passa pela representação que este tem da doença de acordo com sua crença e entendimento, a partir da sua classe social, cultural e econômica. Se o profissional não tiver disponibilidade para escutar poderá partir de premissas erradas em sua orientação e encontrará dificuldades para estabelecer vínculos com os sujeitos (SILVA et al., 2008). Em relação aos profissionais de saúde que atuam na assistência, a demora no diagnóstico é decisiva para o curso da vida destas pessoas no sentido de se evitar a instalação de incapacidades físicas. Uma possível saída para a promoção do cuidado de saúde talvez seja a priorização da escuta do nosso cotidiano de trabalho: escuta do outro, que é o sujeito do nosso cuidado e escuta do próprio “eu”, no sentido da produção de um projeto de cuidado que seja reflexivo e contrário a práticas realizadas no “piloto automático”, definidas a partir de prescrições e verdades descontextualizadas e autoritariamente impostas (OLIVEIRA, 2011). Ao se partir do pressuposto de que a cultura é um fenômeno total e que, portanto, provê uma visão de mundo às pessoas que a compartilham, orientando, dessa forma, os seus conhecimentos, práticas e atitudes, a questão da saúde e da doença está contida nessa visão do mundo e da práxis social (LANGDON; WIIK, 2010). Pensamento este que vem ao encontro de um dos componentes de definição da noção de representação social “vê-se então do que ele se trata: da formação de outro tipo de conhecimento adaptado a outras realidades, obedecendo a outros critérios (...) ele não reproduz um saber (...), mas retrabalha a sua conveniência, seguindo os meios encontrados” (MOSCOVICI, 1976, p.24). Pesquisas como a de Silva et al. (2008) reforçam que políticas públicas voltadas para a hanseníase ainda precisam avançar, encontrando ainda profissionais despreparados para 62 suspeitar e diagnosticar a doença, gerando inseguranças, angústias e dores desnecessárias, além da possibilidade de favorecer o agravo desta. Com baixa autoestima e desigualdade de competição fica difícil às pessoas atingidas pela hanseníase engajarem-se como cidadãos no sistema produtivo assim sugere o oferecimento de cursos de capacitação como modo deles sentirem-se membros de um grupo que contribui para o mercado de trabalho, desvelando situações estigmatizantes e discriminatórias e fortalecendo a troca de experiências (SILVA et al., 2008). Com o avançar das discussões sobre saúde, foi percebido que a garantia do cuidado mais individualizado e, consequentemente, a promoção da saúde, precisava ir além do discurso da “ausência de doença”. Tornou-se necessário um paradigma contextualizado com os “novos” conceitos que envolvem o processo dinâmico de vivenciar a saúde e a doença (SILVA, 2006). Subcategoria 4.2: Aspectos relacionados ao tratamento ancorados na busca da espiritualidade Os dois grupos destacaram a fé em Deus como meio para enfrentar e até mesmo se conformar com o diagnóstico da hanseníase, este é um dos aspectos presente em vários discursos coletados e em diversos casos realmente ajudou o usuário no percurso da doença, assim não deve ser um aspecto negligenciado pelo profissional de saúde. Este achado é confirmado na pesquisa de Luna et al. (2010) ao referirem que os pacientes ressaltaram a fé em Deus, o conhecimento sobre a doença, o autocuidado, a busca por um diagnóstico adequado, a obediência à orientação médica, as perguntas realizadas pelos médicos e o tratamento apropriado têm importância na luta contra a enfermidade. É necessário entender que os termos “espiritualidade” e “religião” estão relacionados, mas apesar de muitas vezes serem utilizados como sinônimo, esses conceitos não apresentam as mesmas características. A espiritualidade é mais ampla e pessoal, está relacionada a um conjunto de valores íntimos, completude interior, harmonia, conexão com os outros; estimula um interesse interior pelos outros e por si; uma unidade com a vida, independente de sua religião, e, dessa forma produz capacidade de suportar sentimentos debilitantes de culpa, raiva e ansiedade; além disso, os aspectos espiritualistas podem mobilizar energias positivas e melhorar a qualidade de vida das pessoas (GUERREIRO et al., 2011) . 63 Quadro 10 - Unidades de análise temática da subcategoria aspectos do tratamento ancorados na busca da espiritualidade. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Espiritualidade para o grupo de Espiritualidade para o grupo de homens mulheres - Graças a Deus eu tenho elas, eu nem tenho pai, nem tem mais mãe. Só tem Deus e as minhas irmãs. As minhas filhas não me ajudam porque elas nem trabalham, só os maridos delas que trabalham. - Só não entro em depressão mesmo porque eu tenho minha família que é do meu lado e Jesus. Depois dessa doença eu me entreguei pra Jesus. - Agora não, porque eu já tô bem melhor, graças a Deus, mas tinha dia que eu não tinha coragem nem de levantar pra fazer o café, pra merendar. Mas, agora eu to bem melhor. - Vou ter fé em Deus, ter força, vou pedir força a Deus pra ser curada. Primeiramente a Deus, depois vem os doutor né? - A minha vida atualmente, com toda honestidade,com toda sinceridade, está ótima. Viu? Tá ótima.E se você me perguntar, porque ótima?Eu direi... porque eu to na presença de Jesus. Viu?Eu graças a Deus, ele me resgatou. Me trouxe pra presença dele e a minha felicidade esta nele. - Tem muitos outros tipos que não conheço. Eu vejo elas aqui no posto, e fico analisando, pensando, oh meu Deus, como é que as pessoas podem viver com esse problema né. Graças a Deus que a minha é leve. As falas demonstram a importância da espiritualidade como uma maneira de enfrentar a doença de uma forma mais positiva, como em um discurso que fala sobre o resgate da felicidade. Atualmente existem centenas de artigos científicos mostrando uma associação entre espiritualidade/religião e saúde que é estatisticamente válida e possivelmente causal. Assim, os profissionais da saúde possuem indicações cientificas do beneficio da exploração da espiritualidade na programação terapêutica virtualmente de qualquer doença (PANZINI et al., 2007). A parede entre medicina e espiritualidade está ruindo, pois os profissionais de saúde tem descoberto a importância da prece, da espiritualidade e da participação religiosa na melhora da saúde física e mental, bem como para responder a situações estressantes de vida (PANZINI et al., 2007). Categoria 5: Enfrentando a hanseníase Esta categoria agrega as unidades de análise temáticas nas quais os sujeitos relatam maneiras de enfrentamento da doença, inclusive comparando com outras como a aids, bem como por meio da declaração de não serem as únicas pessoas que têm hanseníase. Assim, muitas aceitam a doença, outros acreditam ser uma lição de vida, mas também aceitam ajuda. 64 A esta pertencem 2 subcategorias: aceitação da doença e a auto-estima, com um total de 401 unidades de análise temática. A Tabela 8 destaca a subcategoria aceitação da doença com 334 (74,3%) unidades de análise temática, sendo importante para os dois grupos. Pode-se explicar tal fato no critério de inclusão onde os participantes tem no mínimo 3 meses de tratamento, dando-lhes tempo para superar outras reações emocionais como a negação e a revolta. Tabela 8 - Distribuição das frequências e percentuais da categoria e subcategorias de enfrentando a hanseníase, segundo os grupos feminino e masculino. Fortaleza- Ceará, 2011. Sexo Feminino Subcategorias Masculino Total N % N % N % Aceitação da doença 187 67,0 111 91,0 334 74,3 Baixa autoestima 92 33,0 11 9,0 103 25,7 Total 279 100,0 122 100,0 401 100,0 Subcategoria 5.1: Enfrentamento da hanseníase ancorado na aceitação da doença Constata-se que os indivíduos enfrentam a doença por meio de atitudes distintas, sendo estas influenciadas pelos fatores sociais onde eles encontram-se inseridos. A aceitação da doença aparece nos dois grupos sendo relatado por vários sujeitos inclusive referindo estar satisfeito por ter o diagnóstico de hanseníase, pois é uma doença curável em comparação com outras que ainda não a tem como a aids. Silva et al. (2008) enfatizam que o diagnóstico, a informação e a orientação podem causar um impacto emocional no individuo. Os usuários podem apresentar várias reações psicológicas: negar, revoltar-se, ocultar ou revelar, podendo chegar à aceitação através de um processo que para cada um varia no tempo e na intensidade. 65 Quadro 11 - Unidades de análise temática da subcategoria enfrentamento da hanseníase ancorado na aceitação da doença. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Aceitação da doença para o grupo das Aceitação da doença para o grupo dos mulheres homens -Eu acho que sou forte né? Porque eu já conheci várias mulheres que tem e elas entraram em depressão né?E eu não, eu não fiquei não. Eu boto o pé no caminho e vou. - É melhor do que ter outros tipos de doença né? Melhor do que ter Aids, outra coisa qualquer. Pelo menos, sabe que tem cura né? Eu ainda to mais feliz por isso, porque se fosse Aids seria pior. Esse aí, diz que tem cura, aqui acolá eu creio que pode ter cura mesmo. - Eu tô bem melhor, não tem diferença. Eu trabalho normal em casa, faço as minhas coisas normal, não tem diferença não. Continuo tocando minha vida pra frente, isso não vai mudar em nada, né? - Só sei que eu tenho, porque tenho que tomar os remédios. Pra mim não afetou em nada. É normal, meu marido também tem a mesma coisa que eu tenho, eu acho que peguei foi dele e ele ta se tratando normal. A única coisa que ele deixou de fazer foi beber, mas, continuou a vida dele normal, trabalhando, se divertindo. - A minha vida é o seguinte, em relação a todas as coisas, beleza eu não tenho nenhum problema não. Eu estou doente, isso pra mim é normal, ta um monte de gente doente. Então não é só eu que estou doente. -A minha vida, atualmente, agora ela ta mais calma. Depois que descobri a doença, que estou fazendo tratamento, ta entendendo? Eu já estou na 10ª dose, que o tratamento é até a 12ª dose. E graças a Deus ta tudo normal até agora. - As pessoas, por exemplo, às vezes não aceitam né?Às vezes no meio da pessoa. Ai já é um surto da lepra aqui no Brasil né. Então esse é um problema né. Têm outros problemas, outros tipos de doença que as vezes fica contrariado. mas, se for baixar a cabeça é pior né. - Depois que eu descobri que tava com essa doença eu fiquei mais animado ainda porque eu sabia que tava...eu sabia o que era a doença e fiquei mais feliz, satisfeito. A aceitação da hanseníase pelos sujeitos referindo inclusive estar satisfeito por ter esta doença é composta de figuras e expressões socializadas, “por não ter outras doenças”. Conjuntamente, uma representação social é organizada de imagens e linguagem, porque ela realça e simboliza atos e situações que se tornam comuns. Encarada de um modo passivo, ela é apreendida a título de reflexo, na consciência individual ou coletiva, de um objeto, de um feixe de idéias que lhe são exteriores (MOSCOVICI, 1976). Subcategoria 5.2: Enfrentamento da hanseníase ancorado na baixa autoestima O grupo de mulheres ressalta nas falas a baixa autoestima, principalmente nas mais próximas como as pessoas que compõe a família e o trabalho. No grupo dos homens, estes procuram o fortalecimento interior e o pensamento positivo como auxílio no enfrentamento da doença. 66 Quadro 12 - Unidades de análise temática da subcategoria enfrentamento da hanseníase ancorado na autoestima. Fortaleza, CE, Brasil, 2011 Baixa autoestima para o grupo das mulheres Baixa autoestima para o grupo dos homens - Todo mundo tem preconceito com a gente, é chato. No restante da minha vida ta tudo ruim, eu to estressada com tudo me zango, com tudo eu brigo, sabe? Que eu tenho pra mim que essa doença não vai sair de dentro de mim de jeito nenhum. Diz que com 1 ano eu vou ficar boa. Aí, sei lá se vou ficar boa. Aí eu fico preocupada, fico nervosa, fico agitada demais. Aí, tem que tomar Diazepan pra poder melhorar dos nervos. Porque eu sou meio perturbada, depois disso, eu fiquei mais perturbada ainda. Eu já era doidinha, agora to mais doidinha ainda. - Me sinto muito nervosa, e pelo fato de não trabalhar, sou eu que mantenho a renda da minha família né? Tive muito medo pelos meus filhos, porque eu não quero que eles sofram o que eu to sofrendo. Assim, por exemplo, meu corpo mudou muito, devido a medicação. Eu engordei muito, fiquei muito inchada. E por causa dessas manchas eu me sinto muito...sinto vergonha de me vestir pra ir pra praia, eu não posso ficar né?Esse fato de tomar sol, quando eu levo sol eu fico com o corpo muito irritado, essas manchas coçam muito. Muito mesmo, aí eu fico assim, acuada dentro de casa. Não saio, não trabalho, às vezes deixo até mesmo de ir pra igreja, eu ia muito a igreja. Diminui muito assim, as minhas saídas, lazer quase eu não tenho mais. Fico praticamente dentro de casa. - Eu era muito alegre e hoje eu sou muito triste. As dores...eu não podia dar nenhum movimento que doía meus ossos, ainda dói né. Acabou aquela alegria que eu tinha, que era uma menina muito alegre, animada, todo mundo gostava assim de mim.Eu passava me olhava,hoje eu não tenho capacidade de mais isso não por causa da doença, me envergonhou muito. - Eu sei que eu tenho que fazer por mim, eu não posso fazer por ninguém. Então, se você vai fica tranqüilo, é o meu caso, eu não posso fazer nada contra aquilo que eu sei. Entendeu? - A gente vai levando a vida da maneira como ela se apresenta.Muita tranqüilidade, se cuidando bastante né?Meio que a gente leva a vida com a fé, sem desanimar.Ter sempre pensamento positivo. Compreender como as pessoas encaram o binômio saúde-doença e como interfere na auto-estima é importante para o desenvolvimento de ações que contribuam para o resgate da saúde, o que apareceu na percepção de estar doente manifestada pelos sujeitos (SILVA et al., 2008). Quando uma pessoa recebe o diagnóstico de hanseníase e já tem uma baixa autoestima, isso agravará suas dificuldades em aceitá-lo, aderir ao tratamento e enfrentar situações cotidianas que, em outra condição, seriam de fácil superação dentro de um processo natural de crescimento (SILVA et al., 2008). 67 4.4 Estrutura das representações sociais sobre hanseníase pelo teste de associação livre de palavras A construção do objeto social é formada a partir de uma estrutura que é a sustentação da representação da social que possuem grande poder de articulação, pois é responsável por tornar o objeto social compreensível dentro de um grupo, podendo assim orientar condutas. Em torno desta estrutura sólida estão elementos mais flexíveis, mas se quebrada, é capaz de mudar toda a representação do objeto social. A teoria das representações sociais pode ser considerada uma grande teoria, em relação ao qual a teoria do núcleo central constituiu uma abordagem complementar que proporciona descrições mais detalhadas e explicações sobre o funcionamento de certas estruturas de forma compatível com a teoria geral (SÁ, 1998). O desafio proposto para este trabalho implicou na defesa de uma indicação, segundo a qual a identificação das representações sociais pode se revelar como uma a forma exitosa para o acesso a objeto e realidades sócias, contribuindo um cuidado holístico e individual, onde a enfermagem tenha desataque nessa contribuição. Como relata Moscovici (1961, p.26): Na verdade, devemos concebê-la (as representações sociais) de um modo ativo (...). Ela reproduz certamente. Mas esta reprodução implica uma re acomodação de elementos, uma verdadeira reconstrução do dado (o objeto de representação) em um contexto de valores, de noções e de regras dos quais ele se torna doravante solitário. Embora seja uma técnica relativamente simples sendo, inclusive, encarada algumas vezes pelos sujeitos como uma brincadeira (jogo de palavras), a análise do TALP exige cuidados técnicos e interpretativos importantes. Como por exemplo enumerar as evocações de acordo com a ordem de importância atribuída pelo sujeito, ou seja hierarquizar as palavras ou expressões ordenando da mais para a menos importante. Esse procedimento é de fundamental importância, uma vez que a hierarquia da produção se constituíram em um dos critérios para a determinação dos elementos centrais e periféricos (OLIVEIRA et al., 2005). Assim, se refere à organização da representação como a organização de uma representação apresenta uma característica particular: não apenas os elementos de zonas centrais e periféricas são hierarquizados, mas além disso toda representação é organizada em 68 torno de um núcleo central, constituindo de um ou de alguns elementos que dão à representação seu significado (ABRIC, 1998). O mesmo autor segue discutindo o caráter consensual e ao mesmo tempo dotado de diferenças individuais de uma representação social, o que, de acordo com o autor, é compreensível a partir do conhecimento da estrutura da representação social. "A homogeneidade de uma população não é definida pelo consenso entre seus membros, mas sim pelo fato que sua representação se organiza em torno do mesmo núcleo central" (p. 34). O núcleo central é composto por elementos ligados à memória coletiva e à história do grupo; é estável, coerente e rígido, resiste às mudanças e é pouco sensível ao contexto imediato. Por sua vez, o sistema periférico permite a integração de experiências e histórias individuais, é flexível e tolera contradições, está em constante evolução e é sensível ao contexto imediato (ABRIC, 1998). O tratamento dos dados adotado para a análise da estrutura da representação da hanseníase foi a do quadro de quatro casas, proposta por Pierre Vergès (1994). Cada quadrante traz uma informação essencial para a análise da representação, informações essas que especificadas por Abric (1993). O núcleo central abriga os elementos mais freqüentes e mais importantes, podendo ser acompanhados de elementos com menor valor significativo, de sinônimos e de protótipos associados ao objeto. Afirma o autor que “nem tudo o que se encontra nessa casa é central, mas o núcleo central está nesta casa” (ABRIC, 2003, p.64). Na 1ª periferia são encontrados os elementos periféricos mais importantes, superior direito; na zona de contraste são encontrados os elementos com baixa freqüência mas considerados importantes pelos sujeitos, quadrante inferior esquerdo, podendo revelar elementos que reforçam as noções presentes na 1ª periferia ou a existência de um sub-grupo minoritário portador de uma representação diferente. A 2ª periferia é constituída pelos elementos menos freqüentes e menos importantes (OLIVEIRA et al., 2005). A partir de um dicionário de palavras produzidas pela população de sujeitos, o software calcula e informa a freqüência simples de cada palavra evocada, a média ponderada de ocorrência de cada palavra em função da ordem de evocação e a média das ordens médias ponderadas do conjunto dos termos evocados (OLIVEIRA et al., 2005). No caso desta pesquisa definimos como ponto de corte para freqüência mínima a sugerida pelo próprio programa, ou seja, 5. A freqüência intermediária sendo 10, ou seja, o dobro da frequência mínima, este também é um parâmetro recomendável pelo programa. Utilizou-se como Rangmot nível 3, por ser o padrão mais representativo para o estudo. 69 No quadro 13 será a seguir apresentado, um panorama simplificado da ordenação inicial das produções provenientes da técnica de evocação livre. O produto das evocações constituiu-se de 500 palavras das quais 107 eram diferentes. Essas palavras foram distribuídas em quatro casas utilizando-se o critério de Vergès (1994): frequência média e ordem das evocações produzidas. Quadro 13 - Quadro de quatro casas ao termo indutor Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados. Fortaleza, CE, 2011 Os elementos centrais, constatados no quadro 13, retratam que o significado da hanseníase é fortemente marcado por elementos negativos, identificados pelas palavras cansaço, cuidado, cura, desconhecer, doença, dor, medo, preconceito e ruim. Destas a de maior freqüência foi a palavra preconceito resultado que representa a realidade dramática a que estes sujeitos são submetidos, também encontrado e discutido na análise de conteúdo. As palavras medo e cura, que aparecem com a mesma freqüência, o medo evidencia um contexto que expressa o sentimento de desmoronamento em relação à hanseníase e a cura emerge como 70 o objetivo a ser alcançado. Também mostram com a mesma freqüência de evocações as palavras desconhecer e doença, nitidamente relacionadas pelo fato do usuário ter déficit de conhecimento sobre sua patologia e neste contexto surge a importância da educação em saúde, não apenas como aumento das informações, mas como diálogo sobre quais as dúvidas do indivíduo que está sendo atendido. A palavra dor, assim como a queixa de cansaço, aparecem como elementos que devem ser avaliados com atenção pelo profissional de saúde que assiste este paciente, pois está intimamente relacionado com sua qualidade de vida. A palavra ruim pode estar associado à vulnerabilidade dos indivíduos em relação à doença. Nesta conjuntura, temos a palavra cuidado, que deve ser um alerta para nós profissionais de saúde e, principalmente enfermeiros para o quanto estas pessoas precisam da nossa atenção e, principalmente da nossa escuta para que recebam o tratamento holístico imprescindível a cada indivíduo. Os elementos periféricos aflição, dormência, mancha, tratamento e tristeza são flexíveis e possuem caráter individual, não sendo todas as palavras comuns ao grupo todo. Essas palavras assumem uma função de defesa do núcleo central, por seu caráter evolutivo, sofrem mudanças, novas interpretações e integração de novos elementos, de modo a preservar o núcleo central da representação. A palavra tratamento destaca-se no número de evocações refletindo que para esses sujeitos o tratamento realmente não é fácil, porém é valorizada por estes como o caminho para a cura. A palavra mancha pode estar relacionada ao fato de ser o sintoma principal atribuído a hanseníase, inclusive em relação à mídia. As palavras tristeza e aflição podem ser atribuída como conseqüência da doença, que trás atrelado a si elementos negativos como mencionado. Como elementos de contraste, surgiram exclusão, grave, lepra, normal e reação. Como elementos da 2ª periferia aparecem complexidade, inchaço, paciência, preocupação, trabalho, sintomas e vergonha. Ao estudar a conexidade dos elementos podemos visualizar a organização da representação. A conexidade é estabelecida a partir de um número mínimo de co-ocorrências em um grupo de evocações. A representação gráfica dos estudos de conexidade é chamada árvore máxima. Nos vértices encontramos as variáveis, e em suas ligações, a co-ocorrência entre os elementos. As categorias que se conectam ao final da aplicação de um filtro são as que apresentam um grau mais forte de conexão, e estão relacionadas ao número de pessoas que tratam tais elementos de maneira semelhante. Desta forma um elemento será tanto mais ligado ao outro quanto mais permanecer em um conjunto de filtros mais elevados (CAMARGO; BÁRBARA; BERTOLO, 2007). 71 O primeiro filtro utilizado foi de 6 co-ocorrência, escolhido por ser a metade do total de co-ocorrências apresentados 12. Como apresentamos na figura 2: Figura 2 - Árvore máxima de 6 coocorrências A palavra tratamento assume posição central o que evidencia seu papel organizador na representação social da hanseníase. Esta é uma palavra que aparece no núcleo periférico dos quadrantes, pois apesar de apresentar freqüência relevante várias vezes não foi prontamente evocada. Tratamento também aparece como maior conexão relacionado a mancha, apresenta-se fortemente ligada a preconceito, doença e cura. Em seguida se liga de forma intermediária com dor, desconhecer, aflição e cuidado. Cura proporciona união intermediária com aflição. Preconceito apresenta conexão forte com medo. Mancha ligação intermediária com dormência. Assim, nesta figura tratamento apenas não exibe ligação com as palavras medo e dormência. Para conhecer os elementos mais fortemente ligados à palavra tratamento foi aplicado um filtro de 11. Este foi um nível escolhido porque neste apreendemos 5 palavras número que foi solicitado aos sujeitos inicialmente, assim teremos os 5 termos mais representativos ao evocar o termo Hanseníase. Apresentado na figura 3: 72 Figura 3 - Árvore máxima de 11 coocorrências Com um nível de exigência mais alto (11 coocorrências), a ligação entre tratamento, mancha, cura, doença e preconceito se mantiveram fortemente ligadas. O que se pode concluir da coocorrência das categorias é a hipótese que tratamento representa fortemente ter hanseníase, baseado nas relações relevantes que esta teve com os elementos centrais. Com base na abordagem estrutural das representações sociais que, fornece conhecimento teórico e arsenal metodológico para a obtenção de indicações sobre o pensar de ser portador de hanseníase, buscou-se compreendê-la na relação estabelecida entre homens e mulheres e sua influencia sobre os valores, atitudes, opiniões e comportamentos. O produto das evocações das mulheres constituiu um corpus de análise com 250 palavras, destas 87 diferentes. Como se observa no Quadro 14. 73 Quadro 14 - Quadro de quatro casas ao termo indutor Ser Mulher com Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados. Fortaleza, CE, 2011 Como elemento de núcleo central contatou-se apenas a palavra família, reforçando o pressuposto inicial da pesquisa refletindo as mulheres como cuidadoras principais da família. Os elementos periféricos identificados foram trabalho e tratamento. A palavra tratamento aparece em destaque em relação à frequência em que foi citada podendo refletir o quanto este é valorizado pelas mulheres como meio para a obtenção do retorno a saúde. O trabalho pode estar relacionado à inabilidade que muitas vezes a hanseníase trás de se manter no trabalho ou obtê-lo como no quadro 1 quando foi mencionado diversos sintomas associados a doença como dor, cansaço e dormência, além das reações hansênicas que agravam o quadro ou as incapacidades físicas às vezes instaladas de forma irreversível quando o diagnóstico é feito tardiamente. 74 Como elementos de contraste, apareceram difícil, exclusão, mancha, preconceito, ruim e tristeza. Como elementos da 2ª periferia surgem contagiosa, cura e depressão. Para compreender as coocorrências dos elementos evocados organizou-se a figura 4. Nesta representação a árvore máxima se apresenta com conexões intermediárias onde a maior conexão foi máxima foi de 5 entre família e exclusão. Assim, optou-se por aplicar filtro de 3, seguindo o mesmo parâmetro anterior de usar a média de co-ocorrência. Como nas figuras anteriores esta também mostra tratamento no centro como palavra com maior número de conexão, porém entre as onze palavras apresentadas existem poucas co-ocorrências. Em seguida apresentamos a figura 4. Figura 4 - Árvore máxima de 3 coocorrências Em relação aos homens, o produto das evocações constituiu um corpus de análise com 250 palavras. Destas 144 são diferentes. O universo de palavras que não eram sinônimas é muito grande, fato que dificultou o trabalho para a elaboração do quadro e da figura. 75 Quadro 15 - Quadro de quatro casas ao termo indutor Ser Homem com Hanseníase do conjunto de sujeitos estudados. Fortaleza, CE, 2011 Constataram-se no quadro 15 as seguintes palavras constituintes do núcleo central família, trabalho e tratamento. A palavra tratamento apresentou maior freqüência como já comentado podendo estar relacionado ao retorno da saúde. O trabalho também foi mencionado e comentamos que ele pode estar relacionado às limitações que a hanseníase pode trazer. Porém, a palavra família aparece com melhor média ponderada, cogitando que os homens também se preocupam com a família nos permitindo fazer uma dupla conjectura que esta preocupação pode relacionar-se com o provimento da família ligado a limitação do trabalho ou também como preocupação com o cuidado dos demais membros. Como se percebe com estes níveis aplicados não apareceram elementos na 1ª periferia. Como elementos de contraste, surgiram exclusão, informação e ruim. Como elementos da 2ª periferia emergiram bebida, mancha, preconceito, problema e sol. 76 Para entender a conexidade dos elementos organizou-se a árvore máxima em relação aos homens com hanseníase, optou-se por um filtro menor, pois a maior conexão encontrada foi 3, ou seja, aplicou-se filtro 2 devido ao fato mencionado da diversidade de palavras evocadas as conexões mostraram-se frágeis. Inclusive a conexão entre paciência e constrangimento não indicou relação com as demais palavras. Com filtro de 2 a figura 5 apresentou a evocação de 15 palavras, como vemos a seguir: Figura 5 - Árvore máxima de 2 coocorrências Esta etapa do estudo mostrou o tratamento como parte do núcleo central em relação à hanseníase confirmando os demais como mancha, cura, doença e preconceito. Confirmou parte do pressuposto inicial do estudo mostrando que a família é valorizada pelas mulheres e pelos homens também. Entretanto, percebe-se que há uma nítida complementaridade entre as palavras evocadas e o discurso dos sujeitos o que demonstra o acerto dos pesquisadores ao elegerem estas etapas como forma realmente de apoderar-se do núcleo central sobre Hanseníase, Ser Mulher Com Hanseníase e Ser Homem Com Hanseníase. 77 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados desta investigação constatam uma população na sua maioria de adultos jovens em plena atividade laboral, apesar da baixa renda, com poucos anos de estudo e mais da metade casados. Também possuíam pouco tempo de diagnóstico, maioria era multibacilar, demonstrando o descontrole epidemiológico da doença e mais da metade não referiu reação hansênica. As representações sociais apreendidas neste estudo permitiram identificar aspectos diferenciados entre homens e mulheres. Enquanto as mulheres portadoras de hanseníase mostraram-se mais preocupadas com questões relacionadas ao âmbito doméstico, cuidado com a família e sua imagem física, em geral as manchas, os homens estão mais preocupados com as mudanças em suas rotinas, como o fato de não poder beber, expor-se ao sol e adaptarem-se com uma rotina de medicação e consultas de saúde. Assim, o pressuposto inicial da pesquisa foi parcialmente confirmado, pois se constatou que a hanseníase trás repercussões diferentes para cada gênero, sendo para as mulheres a dinâmica familiar que também foi referida pelos homens, além da manutenção financeira desta, porém a sexualidade não teve destaque neste grupo pra esta pesquisa. Diante de uma população com baixa escolaridade, tanto os enfermeiros quanto demais profissionais de saúde devem dedicar maior atenção quanto às explicações referentes aos assuntos mencionados, para que os portadores da enfermidade possam compreender e ser agentes ativos durante o processo de tratamento. A adesão ao tratamento não se restringe a prescrever um medicamento ou conduta e imaginar que, mecanicamente, as pessoas seguirão o que está escrito e o que foi falado. Este seguimento depende muito mais da prática clínica e do envolvimento profissional do que da maior carga de responsabilidade conferida ao paciente, muitas vezes, negligenciando suas perspectivas, individualidades e experiências culturais. É necessário que os profissionais e serviços de saúde sejam corresponsáveis nesse processo. Os discursos chamam atenção pela riqueza de emoções afloradas e carregados de sentimentos negativos, principalmente referentes ao estigma ainda muito presente. Constatase referencia a doença por meio de metáforas. Os homens representam a hanseníase como “doença rejeição” queixando-se da alteração na rotina que a enfermidade trouxe. As mulheres, por sua vez a representaram como “doença nojenta”, que suja o corpo, que faz cair os pedaços, afasta as pessoas e gera preconceito. Como estratégia se isolam e a conseqüência é a solidão e a tristeza. 78 A cultura é construída a partir das interações sociais, assim é resultante de sua experiência em determinados contextos e espaços específicos, os quais podem ser transformados, permeados e compartilhados por diferentes segmentos sociais. Na análise da estrutura das representações sociais evidenciou-se também a carga negativa que a hanseníase apresenta para seus portadores. Resultado reforçado pela similitude usada no estudo que mostra como palavras representativas tratamento, mancha, cura, doença e preconceito representando a enfermidade. Comprovando o achado nos discursos dos sujeitos. Para as mulheres o núcleo central foi a palavra família e esta, na similitude, tem uma forte conexão com a exclusão. Para os homens, o núcleo central foi composto por família, trabalho e tratamento, palavras que possuem relação entre si, pois por meio do tratamento eles podem manter-se trabalhando para prover a família. Neste grupo, foi mencionada uma diversidade de palavras que construiu conexões de similitude fracas e também se constatou que as palavras mais importantes evocadas não eram as primeiras a serem mencionadas. Os portadores de hanseníase expressam que os cuidados no tratamento geram alterações no seu cotidiano, inclusive em alguns momentos intensificando o isolamento social, circunstância já experienciada pela história arraigada ao diagnóstico ao ser comparado com a lepra dos tempos antigos. Assim, ao planejar a atividade educativa o serviço fornece ao usuário ferramentas para enfrentar a doença evitando que o preconceito gerado pela palavra lepra, leve ao afastamento social, prejudique o tratamento e a vida familiar dessas pessoas. A pesquisa chama a atenção para as ações de política pública em relação à hanseníase, pois ainda precisam avançar principalmente em relação à integração entre os três níveis de ação, primária, secundária e terciária, assim a descentralização do programa de eliminação da hanseníase seria mais eficiente ao garantir o atendimento do paciente nestes três níveis. Com isso, o cuidado as pessoas acometidas pela hanseníase poderá ser introduzido em um sistema de saúde baseado na assistência integral e humanizada para o controle da doença, podendo contribuir para a adesão ao tratamento e a quebra na cadeia de transmissão. Deve-se observar que o sistema de saúde está inter-relacionado com outros aspectos da cultura, assim como um sistema social não está dissociado da organização social de um grupo. Dessa maneira, a disposição de como um determinado grupo social pensa para manter a saúde e enfrentar episódios de doença, não está dissociado da visão de mundo e da experiência em geral que esse tem a respeito dos demais aspectos e dimensões sócio-culturais. 79 Neste âmbito, um dos caminhos desta pesquisa visa o estímulo à educação em saúde realizada de forma contextualizada com a realidade do indivíduo, por meio de sua vivencia perante a doença, sendo considerados como mulheres e homens que necessitam de qualidade da atenção prestada. O modelo de cuidado de enfermagem deve buscar entender o cotidiano de ser portador de hanseníase, aprendendo a lidar com a diferença, utilizando ações educativas transformadoras, objetivando avançar em direção à humanização do cuidado. Como limitação do estudo pode-se citar o tempo para a conclusão da pesquisa impedindo o aprofundamento de alguns temas abordados. Nesse sentido, o presente estudo deixa a contribuição de que o cuidado de enfermagem aos portadores de hanseníase deve ser norteado para os questionamentos do indivíduo em relação ao gênero, considerando o contexto cultural em que estes se encontram inseridos de forma a construir um cuidado qualificado e ético a estas pessoas que há tantos anos vem sofrendo com o preconceito. A tentativa de revelar as representações sociais da hanseníase e sua estrutura, sob a ótica do gênero não se encerra com este estudo, pois espera-se que este possa ser o ponto de partida para novas pesquisas voltadas para compreender os sujeitos na dimensão subjetiva e promover, deste modo, melhora no relacionamento interpessoal, minimizando o sofrimento destas pessoas e buscando superar também nossos preconceitos como profissionais de saúde. 80 REFERÊNCIAS ABRIC, J. C. 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Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Letras, Rio de Janeiro, 2006. 89 APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido O (a) senhor (a) está sendo convidado(a) a participar do projeto de pesquisa: Hanseníase: representações sociais de seus portadores sob a ótica de gênero, que tem como objetivos apreender as representações sociais sobre hanseníase elaboradas por seus portadores e analisar como se estruturam as representações sociais sobre hanseníase para seus portadores e suas significações considerando as questões de gênero. Serão utilizados um teste de associação livre de palavras e uma entrevista gravada. Dessa forma, pedimos a sua colaboração nesta pesquisa, respondendo ao teste de associação livre de palavras e a entrevista sobre o tema acima proposto que poderá ser gravada se o(a) Sr(a) concordar. Garantimos que a pesquisa não trará nenhum tipo de prejuízo, dano ou transtorno para aqueles que participarem. Todas as informações obtidas neste estudo serão mantidas em sigilo e sua identidade não será revelada. Vale ressaltar que sua participação é voluntária e o(a) Sr(a) poderá a qualquer momento deixar de participar deste, sem qualquer prejuízo ou dano. Comprometemo-nos a utilizar os dados coletados somente para a pesquisa e os resultados poderão ser veiculados através de artigos científicos e revistas especializadas e/ou encontros científicos e congressos, sempre resguardando sua identificação. Todos os participantes poderão receber quaisquer esclarecimentos acerca da pesquisa e, ressaltando novamente, terão a liberdade para não participarem quando assim não acharem mais conveniente. Contatos com o mestrando Raquel Santos Monte no seguinte endereço: Rua Benjamim Brasil, nº 369. Bairro Maraponga; telefone: (85) 8891-5642. O Comitê de Ética encontra-se disponível para quaisquer esclarecimentos pelo fone: 31015452/31018813. Endereço: R. Pedro I, 1033. Centro – Fortaleza/CE. Este termo está sendo elaborado em duas vias sendo uma para o sujeito participante da pesquisa e outro para o arquivo do pesquisador. Tendo sido informado (a) sobre a pesquisa Hanseníase: representações sociais de seus portadores sob a ótica de gênero, concordo em participar da mesma. Fortaleza ___/___/_____ __________________________ Assinatura do participante ______________________ Raquel Santos Monte Impressão Digital 90 APÊNDICE B – Características sociais, demográficas, clínicas e Teste de Associação Livre de Palavras Universidade Estadual do Ceará Centro de Ciências da Saúde – CCS Mestrado Acadêmico em Cuidados Clínicos em Saúde e Enfermagem–CMACCLIS Nº: Identificação Sexo: Feminino Masculino Idade: Anos de estudo: Estado civil: Nº de pessoas na residência: Profissão/ocupação: Renda mensal familiar: Tempo de diagnóstico: Classificação da hanseníase: Paucibacilar Reações ocasionadas pela hanseníase: Multibacilar Ausente Presente Teste de associação livre de palavras Quais são as 5 (cinco) palavras que lhe vem na cabeça quando você escuta a palavra: HANSENÍASE. 1.____________________ 2. ____________________ 4.____________________ 5._____________________ 3. __________________ Qual dessas palavras é a mais importante para você?__________________________ Quais são as 5 (cinco) palavras que lhe vem na cabeça quando você escuta : SER MULHER COM HANSENÍASE. 1.____________________ 2. ____________________ 4.____________________ 5._____________________ 3. __________________ Qual dessas palavras é a mais importante para você?____________________________ Quais são as 5 (cinco) palavras que lhe vem na cabeça quando você escuta : SER HOMEM COM HANSENÍASE. 1.____________________ 2. ____________________ 4.____________________ 5._____________________ 3. __________________ Qual dessas palavras é a mais importante para você?____________________________ 91 APÊNDICE C - Roteiro de Entrevista Nº: 1. Fale sobre sua vida atualmente: 2. Descreva o que é hanseníase para o Sr.(a): 3. Descreva o que é para o (a) o Sr.(a)ser homem/mulher portador(a) de hanseníase. 4. Descreva o que é hanseníase para as outras pessoas: 92 APÊNDICE D - Banco de Dados para Termo Indutor Hanseníase 001; 2; 1; 1; 4; 1 *Vida 2 Corpo 3 Febre 4 Manchas 5 Dormência 002; 2; 3; 2; 3; 1 Desconhecimento 2 Vítima 3 Descoberta 4 *Tratamento 5 Reação 003; 2; 3; 1; 4; 1 Amor 2 Constrangido 3 Médico 4 Melhorar 5 *Choque 004; 2; 2; 2; 4; 1 *Lepra 2 Doença 3 Nervos 4 Tratamento 5 Sintomas 005; 1; 3; 1; 1; 1 Grave 2 Sol 3 Trabalho 4 *Mancha 5 Dormência 006; 2; 1; 1; 3; 1 *Reação 2 Família 3 Preocupação 4 Assustador 5 Morte 007; 1; 3; 3; 2; 1 Ruim 2 Leve 3 *Tratamento 4 Mancha 5 Contagiosa 008; 1; 1; 1; 3; 1 Grávida 2 *Tratamento 3 Sintomas 4 Mancha 5 Impinge 009; 1; 2; 1; 3; 1 *Exame 2 Médico 3 Posto 4 Cura 5 Choro 010; 1; 2; 2; 3; 1 Diabo 2 Preconceito 3 Chato 4 Ruim 5 *Desgraçado 011; 2; 3; 1; 4; 1 Abalado 2 Traumatizado 3 *Médico 4 Cura 5 Preconceito 012; 2; 3; 2; 2; 1 Doente 2 Sintomas 3 Tratamento 4 *Caroço 5 Exames 013; 2; 1; 1; 4; 1 *Medo 2 Tratamento 3 Inchaço 4 Caseiro 5 Caroço 014; 2; 2; 1; 3; 1 *Tratamento 2 Seqüelas 3 Desconhecimento 4 Abalo 5 Família 015; 2; 4; 2; 4; 1 Contaminação 2 Cuidados 3 Alimentação 4 Água 5 *Beijo 016; 2; 3; 1; 2; 1 Esquisito 2 Distanciamento 3 Discriminação 4 *Relação-Sexual 5 Medo 017; 1; 3; 1; 3; 1 Triste 2 Trabalho 3 Medo 4 *Filhos 5 Mancha 018; 1; 2; 1; 4; 1 Problema 2 Espanto 3 Impressionada 4 Chocada 5 *Tratamento 019; 1; 2; 1; 2; 1 Preconceito 2 Medo 3 Mancha 4 *Trabalho 5 Receio 020; 1; 2; 2; 1; 1 Perturbação 2 Medicação 3 *Cura 4 Ruim 5 Tratamento 021; 1; 3; 2; 4; 1 *Tratamento 2 Medicação 3 Doença 4 Ruim 5 Vergonha 022; 2; 2; 2; 3; 1 Comentários 2 *Cura 3 Simples 4 Sintomas 5 Mal-Estar 023; 2; 3; 1; 2; 1 Estranho 2 Preconceito 3 *Bom 4 Normal 5 Namorar 024; 1; 3; 2; 4; 1 Problema 2 Difícil 3 *Mancha 4 Exame 5 Triste 025; 1; 1; 2; 3; 1 *Dor 2 Caroço 3 Stress 4 Moleza 5 Apoio 026; 1; 2; 1; 4; 1 *Preconceito 2 Dor 3 Fadiga 4 Stress 5 Remédio 027; 2; 1; 1; 4; 1 Doença 2 *Medo 3 Ferida 4 Mancha 5 Medicamento 028; 2; 2; 1; 4; 1 Triste 2 Seqüela 3 *Preconceito 4 Bebida 5 Sol 029; 2; 3; 2; 4; 1 Discriminação 2 Estigma 3 Tratamento 4 *Efeitos-Colaterais 5 Preocupação 030; 2; 1; 1; 3; 1 Tratamento 2 Alergia 3 Vergonha 4 Medo 5 *Discriminação 031; 2; 2; 2; 3; 1 Cuidar 2 Tratamento 3 *Repouso 4 Contagioso 5 Discriminação 032; 1; 3; 2; 4; 1 Manchas 2 Dormência 3 *Tratamento 4 Dor 5 Remédio 033; 1; 3; 3; 2; 1 Triste 2 *Cura 3 Preocupada 4 Medo 5 Discriminar 034; 1; 2; 2; 3; 1 Demorada 2 Cura 3 *Cuidar 4 Morrer 5 Preocupada 035; 1; 2; 2; 3; 1 Doença 2 Ruim 3 Cura 4 Controle 5 *Desesperança 036; 2; 3; 2; 2; 1 *Mancha 2 Médico 3 Sofrer 4 Higiene 5 Roupas 037; 2; 3; 2; 3; 1 Médico 2 Mancha 3 Tratamento 4 Melhorar 5 *Saúde 038; 2; 1; 2; 3; 1 Aflito 2 Mancha 3 *Preocupado 4 Médica 5 Sol 039; 1; 2; 2; 4; 1 *Preconceito 2 Dor 3 Medo 4 Exclusão 5 Desconforto 040; 1; 3; 3; 2; 1 Incurável 2 Cuidado 3 Vergonha 4 Difícil 5 *Doente 041; 1; 3; 2; 1; 1 Ruim 2 Vergonha 3 *Preconceito 4 Lepra 5 Chato 042; 1; 3; 2; 3; 1 Sofrimento 2 Dúvida 3 Tristeza 4 Depressão 5 *Morte 043; 1; 2; 1; 4; 1 *Medo 2 Dúvida 3 Constrangedora 4 Vergonha 5 Esconder 044; 2; 3; 2; 2; 1 Cura 2 Tratamento 3 *Medicamento 4 Pele 5 Consulta 045; 2; 1; 1; 3; 1 Medo 2 Dor 3 Preconceito 4 Incerteza 5 *Cura 046; 2; 3; 1; 1; 1 *Medo 2 Reação 3 Dores 4 Sintomas 5 Comida 047; 1; 1; 2; 3; 1 Normal 2 Cura 3 Tratada 4 Trauma 5 *Preocupação 048; 2; 3; 2; 2; 1 Doença 2 Nervos 3 *Dor 4 Dormência 5 Dúvida 049; 2; 2; 2; 3; 1 Seqüelas 2 Dores 3 Fraqueza 4 *Nervosismo 5 Remédio 93 050; 2; 2; 1; 4; 1 Mancha 2 Vergonha 3 Dor 4 Paciência 5 Preconceito 051; 1; 3; 2; 3; 1 Dúvida 2 Ferimento 3 Mancha 4 Lesão 5 *Dormência 052; 2; 3; 2; 2; 1 Preconceito 2 Medo 3 Dúvida 4 Preocupação 5 *Constrangimento 053; 1; 2; 2; 4; 1 *Preconceito 2 Incômodo 3 Complexidade 4 Tristeza 5 Cura 054; 1; 3; 2; 4; 1 Doença 2 *Dor 3 Mancha 4 Remédio 5 Consulta 055; 1; 3; 2; 3; 1 Tratamento 2 *Saúde 3 Cuidado 4 Higiene 5 Paciência 056; 2; 3; 1; 2; 1 Doença 2 Cura 3 *Cuidado 4 Remédio 5 Remorso 057; 2; 3; 2; 1; 1 Preconceito 2 Medicação 3 Isolamento 4 *Trabalho 5 Tratamento 058; 2; 2; 2; 3; 1 *Doença 2 Incurável 3 Tratamento 4 Remédio 5 Melhora 059; 1; 3; 1; 2; 1 Doença 2 Feia 3 Tristeza 4 *Rejeição 5 Aceitação 060; 1; 3; 1; 2; 1 Discriminação 2 Afastamento 3 Saúde 4 Doença 5 *Medicamento 061; 1; 3; 2; 4; 1 Medo 2 Tristeza 3 Vergonha 4 *Conseqüências 5 Mancha 062; 1; 3; 1; 1; 1 Desprazer 2 Angústia 3 *Calor 4 Tratamento 5 Sintomas 063; 1; 2; 2; 3; 1 Mancha 2 Dormência 3 Preconceito 4 *Ferimento 5 Vergonha 064; 2; 2; 1; 2; 1 Remédio 2 Sol 3 Dificuldade 4 *Trabalho 5 Mal- Estar 065; 2; 4; 2; 2; 1 Dormência 2 Dor 3 *Tristeza 4 Apoio 5 Nervos 066; 2; 4; 1; 4; 1 Dor 2 Inchaço 3 Febre 4 Dor 5 *Frio 067; 1; 3; 2; 2; 1 Doença 2 Grave 3 Sentimento 4 Tristeza 5 *Lutar 068; 2; 2; 2; 3; 1 Remédio 2 Cansaço 3 Sono 4 Preguiça 5 *Paciência 069; 2; 4; 3; 3; 1 Debilitado 2 Inchaço 3 Tratamento 4 Ajuda 5 *Avó 070; 2; 3; 2; 4; 1 *Tratamento 2 Alta 3 Calma 4 Paciência 5 Tranqüilidade 071; 2; 2; 1; 3; 1 Doença 2 Cura 3 *Tratamento 4 Cuidados 5 Medicação 072; 2; 2; 1; 4; 1 *Doença 2 Preconceito 3 Cuidado 4 Médico 5 Complicação 073; 2; 2; 2; 3; 1 Perigosa 2 Tratamento 3 *Preconceito 4 Sensibilidade 5 Mancha 074; 2; 1; 1; 3; 1 Nervoso 2 Alarme 3 Medo 4 Assustado 5 *Preconceito 075; 2; 2; 2; 4; 1 Medo 2 Câncer 3 Mancha 4 Cura 5 *Tratamento 076; 2; 2; 2; 3; 1 Estresse 2 Medicamento 3 *Complicado 4 Preocupação 5 Nervoso 077; 2; 2; 2; 2; 1 *Problema 2 Cura 3 Tratamento 4 Estressado 5 Dor 078; 1; 3; 1; 2; 1 Dúvida 2 Tempo 3 Tratamento 4 *Exame 5 Mãe 079; 1; 3; 2; 3; 1 Isolado 2 Morte 3 Intranqüila 4 *Dúvida 5 Medo 080; 1; 3; 1; 4; 1 Dúvida 2 Tempo 3 Tratamento 4 *Exame 5 Mãe 081; 2; 2; 2; 2; 1 Medo 2 Lepra 3 Cura 4 * Vida 5 Paz 082; 2; 3; 2; 2; 1 Dor 2 *Câimbra 3 Tranqüilo 4 Cura 5 Tratamento 083; 2; 3; 1; 4; 1 Normal 2 Pesada 3 *Vista 4 Nervo 5 Ferida 084; 1; 1; 1; 3; 1 Remédio 2 *Curtir 3 Bebida 4 Nervosa 5 Inquieta 085; 2; 2; 1; 4; 1 *Grave 2 Incurável 3 Complicada 4 Cuidado 5 Chocado 086; 2; 3; 1; 1; 1 Normal 2 *Descoberta 3 Tratamento 4 Mancha 5 Medicamento 087; 2; 2; 1; 2; 1 Nojenta 2 *Cuidar 3 Hospital 4 Exame 5 Doença 088; 1; 3; 2; 4; 1 Grave 2 Ruim 3 Mancha 4 Coceira 5 *Bisnetos 089; 1; 3; 2; 3; 1 Comum 2 Disposta 3 Inchaço 4 *Trabalho 5 Normal 090; 1; 4; 2; 3; 1 *Lepra 2 Contato 3 Leprosário 4 Remédio 5 Moderno 091; 1; 2; 1; 3; 1 Tratada 2 *Triste 3 Medo 4 Preconceito 5 Reincidente 092; 1; 2; 1; 2; 1 *Cura 2 Reação 3 Mancha 4 Dor 5 Choque 093; 1; 2; 1; 2; 1 Indiferente 2 Desconhecimento 3 *Remédios 4 Acompanhamento 5 Tratamento 094; 1; 1; 1; 4; 1 *Desconhecida 2 Reação 3 Mancha 4 Dormência 5 Triste 095; 1; 3; 2; 2; 1 Ruim 2 Tratamento 3 *Dor 4 Dormência 5 Inchaço 096; 1; 2; 1; 3; 1 *Desconhecia 2 Reação 3 Mancha 4 Dormência 5 Triste 097; 1; 4; 3; 2; 1 Grave 2 Ruim 3 Mancha 4 Coceira 5 *Bisnetos 098; 1; 2; 2; 4; 1 Normal 2 Cura 3 Tratada 4 Trauma 5 *Preocupação 94 099; 1; 3; 2; 2; 1 Ruim 2 *Sonolência 3 Mole 4 Perde-Forças 5 Trabalho 100; 1; 2; 2; 3; 1 *Preconceito 2 Normal 3 Afastamento 4 Empresa 5 *Exame 95 APÊNDICE E - Banco de Dados para Termo Indutor ser Mulher com Hanseníase 005; 1; 3; 1; 1; 007; 1; 3; 3; 2; 008; 1; 1; 1; 3; 009; 1; 2; 1; 3; 010; 1; 2; 2; 3; 017; 1; 3; 1; 3; 018; 1; 2; 1; 4; 019; 1; 2; 1; 2; 020; 1; 2; 2; 1; 021; 1; 3; 2; 4; 024; 1; 3; 2; 4; 025; 1; 1; 2; 3; 026; 1; 2; 1; 4; 032; 1; 3; 2; 4; 033; 1; 3; 3; 2; 034; 1; 2; 2; 3; 035; 1; 2; 2; 3; 039; 1; 2; 2; 4; 040; 1; 3; 3; 2; 041; 1; 3; 2; 1; 042; 1; 3; 2; 3; 043; 1; 2; 1; 4; 047; 1; 1; 2; 3; 051; 1; 3; 2; 3; 053; 1; 2; 2; 4; 054; 1; 3; 2; 4; 055; 1; 3; 2; 3; 059; 1; 3; 1; 2; 060; 1; 3; 1; 2; 061; 1; 3; 2; 4; 062; 1; 3; 1; 1; 063; 1; 2; 2; 3; 067; 1; 3; 2; 2; 078; 1; 3; 1; 2; 079; 1; 3; 2; 3; 080; 1; 3; 1; 4; 084; 1; 1; 1; 3; 088; 1; 3; 2; 4; 089; 1; 3; 2; 3; 090; 1; 4; 2; 3; 091; 1; 2; 1; 3; 092; 1; 2; 1; 2; 093; 1; 2; 1; 2; 094; 1; 1; 1; 4; 095; 1; 3; 2; 2; 096; 1; 2; 1; 3; 097; 1; 4; 3; 2; 098; 1; 2; 2; 4; 1 Comum 2 Tristeza 3 Sensível 4 Rejeição 5 *Tratamento 1 Medo 2 Família 3 Remédio 4 Indiferente 5 *Normal 1 Diferente 2 Sol 3 *Medicamento 4 Remédio 5 Ruim 1 Difícil 2 *Preconceito 3 Segredo 4 Ruim 5 Depressão 1 Terrível 2 Sol 3 Trabalho 4 Remédio 5 *Reação 1 Feridas 2 Vaidade 3 Psicológico 4 Doença 5 *Irritada 1 Abalo 2 Normal 3 Preconceito 4 *Segredo 5 Trabalho 1 Problema 2 *Cuidado 3 Hidratante 4 Ressecada 5 Discreta 1 Gasto 2 Viagem 3 Trabalho 4 Raiva 5 *Controle 1 Remédio 2 Deus 3 Trabalho 4 Raiva 5 *Transmitir 1 Família 2 Segredo 3 Receio 4 *Esposo 5 Filhos 1 *Horrível 2 Afastamento 3 Perguntas 4 Família 5 Amigos 1 Complicado 2 *Baixa-Estima 3 Mancha 4 Choro 5 Aceitação 1 Susto 2 *Inesperado 3 Família 4 Emagrecer 5 Cansaço 1 Sozinha 2 Filha 3 Amigos 4 Vaidade 5 *Deus 1 Família 2 Filhos 3 Sofrer 4 *Rejeitada 5 Nojo 1 Mancha 2 Dores 3 Coçar 4 Remédio 5 *Rejeição 1 Omissão 2 *Família 3 Tratamento 4 Assintomática 5 Dormência 1 Isolamento 2 Família 3 Auto-Estima 4 Netos 5 *Triste 1 *Triste 2 Fracassada 3 Desanimada 4 Fé 5 Deus 1 Impacto 2 *Tratamento 3 Lepra 4 Isolamento 5 Remédio 1 *Mudanças 2 Difícil 3 Vergonha 4 Ansiedade 5 Choro 1 Família 2 Sair 3 *Contrair 4 Trabalho 5 Doença 1 Transporte 2 Médico 3 Despreocupada 4 Tratamento 5 *Deus 1 *Fé 2 Seqüela 3 Ansiosa 4 Apoio 5 Família 1 *Vergonha 2 Tristeza 3 Família 4 Tratamento 5 Esconder 1 Depressão 2 Esposo 3 *Feia 4 Vergonha 5 Cura 1 Desânimo 2 Sofrimento 3 Diferente 4 *Cura 5 Remédio 1 Melhora 2 Doença 3 *Viver 4 Esperança 5 Cura 1 Preconceito 2 Susto 3 Impressionada 4 Dúvida 5 *Contaminação 1 Amor 2 *Tristeza 3 Solidão 4 Desprazer 5 Neta 1 Medo 2 Triste 3 Preocupado 4 *Esperança 5 Cura 1 Difícil 2 Mancha 3 *Tratamento 4 Médico 5 Posto 1 Dormência 2 Posto 3 Consulta 4 *Cuidado 5 Preocupação 1 Preocupação 2 *Tratamento 3 Triste 4 Trabalho 5 Depressão 1 Dormência 2 Posto 3 Consulta 4 *Cuidado 5 Preocupação 1 Envergonhada 2 Desânimo 3 *Mancha 4 Dores 5 Inchaço 1 Vida 2 Tratamento 3 Remédio 4 Cura 5 *Alta 1 Sol 2 Remédios 3 Andar 4 Desanimada 5 *Preconceito 1 Medo 2 Excluído 3 Sangue 4 Espirro 5 *Saliva 1 *Emprego 2 Ruim 3 Vaidosa 4 Mancha 5 Problema 1 Preconceito 2 Palestra 3 *Tratamento 4 Remédio 5 Perigo 1 *Mancha 2 Imobilidade 3 Infertilidade 4 Usar-Camisinha 5 Não-Prevenir 1 Difícil 2 Trabalho 3 Dor 4 Família 5 *Diferença 1 Ofensivo 2 Comprimido 3 Desgosto 4 *Dúvida 5 Sol 1 Difícil 2 Trabalho 3 Dor 4 Família 5 *Diferença 1 Vida 2 Tratamento 3 Remédio 4 Cura 5 *Alta 1 Criança 2 Transmitir 3 Contrair 4 Bebê 5 *Imunização 96 099; 1; 3; 2; 2; 1 Independente 2 Remédio 3 *Deus 4 Pouca-Melhora 5 Tratamento 100; 1; 2; 2; 3; 1 Palestra 2 Justiça 3 Trabalho 4 Tranqüila 5 *Cura 97 APÊNDICE F - Banco de Dados para Termo Indutor ser Homem com Hanseníase 001; 2; 1; 1; 4; 002; 2; 3; 2; 3; 003; 2; 3; 1; 4; 004; 2; 2; 2; 4; 006; 2; 1; 1; 3; 011; 2; 3; 1; 4; 012; 2; 3; 2; 2; 013; 2; 1; 1; 4; 014; 2; 2; 1; 3; 015; 2; 4; 2; 4; 016; 2; 3; 1; 2; 022; 2; 2; 2; 3; 023; 2; 3; 1; 2; 027; 2; 1; 1; 4; 028; 2; 2; 1; 4; 029; 2; 3; 2; 4; 030; 2; 1; 1; 3; 031; 2; 2; 2; 3; 036; 2; 3; 2; 2; 037; 2; 3; 2; 3; 038; 2; 1; 2; 3; 044; 2; 3; 2; 2; 045; 2; 1; 1; 3; 046; 2; 3; 1; 1; 048; 2; 3; 2; 2; 049; 2; 2; 2; 3; 050; 2; 2; 1; 4; 052; 2; 3; 2; 2; 056; 2; 3; 1; 2; 057; 2; 3; 2; 1; 058; 2; 2; 2; 3; 064; 2; 2; 1; 2; 065; 2; 4; 2; 2; 066; 2; 4; 1; 4; 068; 2; 2; 2; 3; 069; 2; 4; 3; 3; 070; 2; 3; 2; 4; 071; 2; 2; 1; 3; 072; 2; 2; 1; 4; 073; 2; 2; 2; 3; 074; 2; 1; 1; 3; 075; 2; 2; 2; 4; 076; 2; 2; 2; 3; 077; 2; 2; 2; 2; 081; 2; 2; 2; 2; 082; 2; 3; 2; 2; 083; 2; 3; 1; 4; 085; 2; 2; 1; 4; 1 Complicado 2 *Trabalho 3 Jogar-Bola 4 Sol 5 Comida 1 *Preparado 2 Preocupado 3 Dor 4 Trabalho 5 Ruim 1 Incomum 2 Triste 3 Calmo 4 *Tratamento 5 Enfermeiros 1 Trabalho 2 *Seqüela 3 Pele 4 Problema 5 Medo 1 *Cura 2 Alegre 3 Divertido 4 Mancha 5 Dormência 1 Constrangido 2 *Tratamento 3 Tranqüilo 4 Medicamento 5 Recuperação 1 *Trabalho 2 Médico 3 Normal 4 Chateado 5 Medicamento 1 Médico 2 Trabalho 3 *Família 4 Apoio 5 Acostumado 1 Médico 2 *Deus 3 Desempregado 4 Exames 5 Atestado 1 *Frustrante 2 Vida 3 Saúde 4 Esposa 5 Diferente 1 Conhecimento 2 Difícil 3 Mancha 4 Problema 5 *Cicatriz 1 Abalo 2 Despreocupado 3 Lepra 4 Preconceito 5 *Trabalho 1 Bebida 2 Divertir 3 Viajar 4 *Triste 5 Chateado 1 Indiferença 2 Amigos 3 Família 4 Sol 5 *Tempo 1 Isolamento 2 Irritado 3 Impaciente 4 Mancha 5 *Mudança 1 Transmitir 2 Família 3 Vaidade 4 Incômodo 5 *Seqüela 1 *Drogas 2 Limpo 3 Pai 4 Desafio 5 Sol 1 Mancha 2 Consulta 3 Médico 4 Exame 5 *Ansioso 1 Queixa 2 Filhos 3 Horrível 4 Deus 5 *Discriminação 1 *Esposa 2 Calmo 3 Calor 4 Agitado 5 Disfarçar 1 Preconceito 2 Amigos 3 *Medo 4 Rejeição 5 Trabalho 1 Esquisito 2 Conformado 3 Tratamento 4 *Descriminação 5 Constrangido 1 Aceitação 2 Exclusão 3 *Superação 4 Descoberta 5 Cuidado 1 Novidade 2 Problema 3 Frustrado 4 Receoso 5 *Dúvida 1 Tratamento 2 Medicamentos 3 Remédio 4 Ajuda 5 *Trabalho 1 Choque 2 Saudável 3 Trabalhador 4 *Desprezo 5 Lepra 1 *Péssimo 2 Ruim 3 Apoio 4 Aproximação 5 Família 1 Dificuldade 2 Trabalho 3 Contágio 4 Tratamento 5 *Bebida 1 Caroço 2 Exame 3 Médico 4 *Mancha 5 Dormência 1 *Mancha 2 Dor 3 Dúvida 4 Conversa 5 Informação 1 Ruim 2 Afastamento 3 Melhora 4 *Problema 5 Deus 1 Difícil 2 Esconder 3 Isolamento 4 *Mudança 5 Choque 1 Difícil 2 Médico 3 Segredo 4 Preocupação 5 *Fé 1 Morrer 2 *Esposa 3 Solidão 4 Filhos 5 Doente 1 Sol 2 *Sair 3 Preconceito 4 Esclarecimento 5 Cura 1 Saber 2 *Doença 3 Informação 4 Caroço 5 Dormência 1 Dedicação 2 *Amor 3 Carinho 4 Vida 5 Seriedade 1 *Entender 2 Aproximação 3 Contagiosa 4 Comentário 5 Dor 1 Constrangido 2 *Tratamento 3 Tranqüilo 4 Medicamento 5 Recuperação 1 Normal 2 Sem-Mudança 3 *Rotina 4 Cura 5 Depressão 1 *Preconceito 2 Ruim 3 Mancha 4 Exame 5 Bebida 1 Lepra 2 Abandono 3 *Bebida 4 Sol 5 Protetor 1 Problemas 2 Socialização 3 *Preconceito 4 Esclarecimento 5 Cura 1 Medicamento 2 *Trabalho 3 Sol 4 Ruim 5 Afastado 1 Esposa 2 Choro 3 Triste 4 Indiferente 5 *Vencedor 1 Dormência 2 Abalado 3 Avançado 4 Cuidar 5 *Mancha 1 Febre 2 Trabalho 3 Amigos 4 Comida 5 *Bebida 1 *Conhecimento 2 Praia 3 Alimentação 4 Trabalho 5 Segredo 98 086; 2; 3; 1; 1; 1 Cuidado 2 Sem-Diferença 3 Médico 4 Recomendação 5 *Vida 087; 2; 2; 1; 2; 1 Comprimido 2 Febre 3 *Saúde 4 Reação 5 Remédio