IMAGINÁRIO POLÍTICO EREALIDADE ECONÔMICA, O

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IMAGINÁRIO POLÍTICO E REALIDADE ECONÔMICA,
O "MARKETING" DA SECA NORDESTINA
Iná Elias de Castro •
1 INTRODUÇÃO
A Região Nordeste é um caso paradigmático de regionalismo no País, cuja
idéia-força da identidade regional apoia-se no binômio pobreza e necessidade de
recursos da União. Mas, se a base do seu imaginário regionalista é alimentada por
queixas e pedidos, justificados pela concreta condição de pobre7.3 de grande parte da
sua população, a realidade econômica e financeira pode revelar-se contraditória à
imaginação política. Embora seja real a carência de recursos para a maior parte da
sociedade regional, sua justificativa não se esgota nas dificuldades do sistema
econômico, pretensamente causadas pelos problemas climáticos. Esta é a tese central
da discussão aqui proposta.
A importiincia de articular indicadores econômicos com o imaginário
político está justamente em identificar a assincronia que pode existir entre duas esferas
de poder e de ação sobre a sociedade. No caso particular da Região Nordeste, os
fracassos econômicos alimentam a imaginação e o discurso para a obtenção de recursos,
enquanto os sucessos alimentam a imaginação empresarial e o discurso político para a
obtenção de votos.
Panindo das condições particulares dessa Região, o objetivo deste artigo é
duplo. Trata-se de indicar que não sendo o sistema econômico necessariamente integrador do sistema social, o sistema político pode expressar e alimentar-se dessa
desintegração, expondo e reforçando os ângulos que melhor dão sustentação ao scu
imaginário, e que a pobre7.3 é um bom produto no mercado político da RegiãO.
Supondo ser de conhecimento geral que a Região Nordeste é o locus
privilegiado da pobreza do País (Abranches, 1985; Pastare et ai., 1983), a apresentação
será desenvolvida em três partes: a primeira e a segunda analisarão os avanços na
economia regional e suas relações com as finanças da União; a terceira indicará o
imaginário da elite política a panir do seu discurso. 1 Trata-se de compreender o
entrelaçamento de questões econômicas e sociais através de sua rcclaboração e utilização como recurso político. Metalogicamente significa anicular estatísticas econômicas e financeiras com o imaginário da elite política regional, expresso através dos temas
mais recorrentes nos seus discursos.
• Ge6grafa; Doutora em Ciência Polílica (IUPERJ); Professora do InslilulO de Geociências da UFRJ.
I
O material aqui analisado foi extraído da amostra de 476 discursos de parlamentares nordestinos no
Congresso Nacional enlrc 1945 c 1987 que serviu de base à minha lese de doulorado (Caslro, 1989).
Nova Economia 1Belo I1ori7.0nle 1v. 21 n. 2 Inovo 1991.
53
2 NORDESTE - UMA ECONOMIA RESPONSIV A
Com exceção da última década, a economia brasileira vem, desde os Anos
40, apresentando expansão e transformação na sua base material disponível para a
sociedade. A Região Nordeste, por sua vez, também sofreu o impacto dessa modernização e expandiu substancialmente suas atividades produtivas. Começaremos por
indicar alguns desses avanços.
Comparando a evolução da PEA nas diferentes regiões brasileiras, a
Região Nordeste manteve, entre 1940 e 1980, a posição de maior proporção de
população economicamente ativa no setor primário (79,1% em 1940 e 49,8 % em 1980).
Com relação à PEA do setor secundário, no mesmo período a Região perdeu sua posição
para a Região Sul, passando do 4" lugar em 1940 (com 6,9%) para o 5" em 1980 (com
13,0%). Não há qualquer originalidade nestas informaçõcs, apenas queremos ressaltar
que, mesmo perdendo posição para outras regiõcs, o Nordeste aeompanhou as transformaçõcs do País, transformando seu parque industrial e incorporando-lhe população
ativa.
Porém, como a expansão do emprego nas indústrias não tem necessariamente a mesma dimensão da expansão dos estabelecimentos industriais, a diferença na
variação do creseimento de ambos indica as tendências observadas, entre 1920 e 1980,
de maior implantação industrial do que ampliação do mercado de trabalho regional no
setor.
GRÁFICO 1
Região Nordeste e Brasil
Expansão Industrial e Emprego.
Taxas Médias Geométricas de Incremento Anual.
% a.a.
7
6
5
.....•
.•••.
4
3
2
...•.•.
.. -
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NE. e.tahclecido
-
.• -
-
.•.• -
.• -
Brasil - estabelecido
.•. ~'E- pessoal ocur-do
• .. .• .• .. .•..
Bruil. pessoal ocupado
o
1920-40
1940-60
1960-80
Fonte: Censo Industrial do Brasil. Rio de Jareira: IDGE, 1920; 1940; 1960; 1980,
54
Nova Economia 1 nelo 1I0rizonte I v. 21 n. 21 novo 1991.
o Gráfico 1 indica esta tendência de maior expansão das indústrias do que
do emprego industrial desde 1920. A situação resultou de mudanças no parque industrial da Região, implantado durante o Século XIX e início do Século XX, quando houve
uma progressiva eliminação de muitas indústrias tradicionais, mais utilizadoras de
mão-de-obra do que de capital. No período de 1960 a 1980, apesar das taxas de
crescimento indicarem uma reversão, consolidou-se a tendência dos períodos anteriores, acentuando-se a diversificação e a expansão das indústrias de bens duráveis e
intermediários, capazes de ampliar, ainda mais, o mercado de trabalho no setor secundário (IBGE, 1977).
Em linhas gerais, a lógica da expansão é a mesma para o Nordeste e para
o País. No entanto, enquanto no período 1920-1940 os dados indicam uma diferença
de 0,7% no Nordeste, e de 1% no Brasil, a favor dos estabelecimentos, entre 1940 e
1960 estas diferenças foram, respectivamente, de 3,4 e 0,9%. Ou seja, a expansão
industrial na Região, nesse período, foi muito mais poupadora de mão-de-obra do que
a do País. Entre 1960 e 1980 houve maior crescimento do pessoal ocupado em ambos
os casos, porém, a diferença para o Brasil foi maior. Portanto, apesar da mesma lógica
de expansão industrial poupadora de mão-de-obra, na Região Nordeste esta tendência
é mais acentuada.
Um dado complementar ao das taxas de crescimento dos estabelecimentos
industriais e do pessoal ocupado em indústrias é o comportamento, no tempo, do
número médio de empregados por estabelecimento. O Gráfico 2 compara o Nordeste
com o Brasil, no período de 1920 a 1980.
GRÁFICO 2
Região Nordeste e Brasil
Número Médio de Empregados por Estabelecimento
Industrial.
30
25
20
15
10
5
o
1920
I'onte: Idem Gráfico 1.
1940
1960
Nova Economia 1neJo lIori1.Onle 1v. 21 n. 2 1novo 1991.
J]J
Nordeste
~
Brasil
1980
55
Nas Décadas de 20 e de 30 o parque industrial nordestino, composto
principalmente de indústrias tradicionais, era mais tipicamente "trabalho-intensivo" do
que o do País. A Década de 40 foi, sem dúvida, um marco de mudanças para ambos,
embora seja visível a radicalização maior do processo no Nordeste. O Brasil apresentou
uma queda menor da média de empregados por estabelecimentos e uma recuperação
maior do que o ocorrida na Região.
Tomando os números isoladamente temos que, no Nordeste, a média de
empregados por estabelecimentos industriais reduziu-se a menos da metade entre 1920
e 1960. Apesar do aumento entre 1960 e 1980, a média em 1980 foi exatamente a metade
da existente na Região em 1920. Para o conjunto do País, ao contrário, a partir de 1960
foi recuperado o número médio de empregados de 1920, indicando que entre 1960 e
1980 houve reversão da tendência poupadora das Décadas de 20, 30, 40 e 50.
Com relação à expansão industrial na Região e à sua participação no
crescimento absoluto das indústrias e do emprego industrial no País, há diferenças ao
longo do tempo, como indica o Gráfico 3. Este foi organizado com base no pereentual,
que corresponde à Região Nordeste, sobre o crescimento absoluto do número de
indústrias e do pessoal ocupado para cada período de 20 anos no País.
GRÁFICO 3
Região Nordeste
Participação
no Crescimento Absoluto
das Indústrias e do Pessoal Ocupado.
Brasil = 100
25
20
15
..••..••
..••..••
10
5
..••..••
Estabelecimentos
'--
Industriais
Pessoal Ocupado
o
1920.40
Fonte: idem Gráfico I.
1940.60
1960.80
Ao longo de todo o período, a parcela de indústrias instaladas no Nordeste
foi maior do que a parcela de empregos industriais gerados. Entre 1960 e 1980, apesar
de uma pequena reversão, a desproporção entre os dois percentuais continua grande e
confmna que a industrialização recente na Região, apesar de ter ampliado consideravelmente a participação da PEA no setor secundário, é mais poupadora de mão-de-obra
do que o foi até o início do Século XX, aliás, como csperado.
56
Nova Economia I Belo llori7.0nte Iv. 21 n. 2 I novo 1991.
Comparativamente falando, houve no Nordeste, entre 1920 e 1980, um
acréscimo absoluto de 41.008 estabelecimentos industriais e de aproximadamente
500.000 pessoas ocupadas; o acréscimo de estabelecimentos na Região Sudeste foi
pouco mais do que o dobro, e no Sul foi quase igual. Já para o pessoal ocupado, o
acréscimo foi 6 vezes maior para o Sudeste e o dobro para o Sul. Verifica-se então que,
em termos absolutos, a expansão de estabelecimentos industriais no Nordeste foi
importante, mesmo quando tomada em relação ao resto do País; no entanto, o crescimento do emprego em indústrias foi proporcionalmente bem menor na Região do que
o foi nas outras.
No Gráfico 4, a comparação dos percentuais das indústrias, do pessoal
ocupado e do valor da produção industrial, no Nordeste em relação ao Bra~il, toma mais
clara a tendência que já se delineava a partir da Déeada de 20, acentuando-se mais após
1940.
Industriali7.ação,
GRÁFICO 4
Região Nordeslc
Emprego e Valor da Produção
Brasil
Industrial.
= 100
25
20
15
10
lilliliI
ESlabclcimentos
5
~
Pessoal ocupado
o
~
Valor da produção
1920
1940
1960
1980
Foote: Idem Gráfico 1.
Com exceção de 1960, a redução da participação da Região Nordeste na
geração de emprego industrial no País, se dá concomitantemente à maior participação
do número de estabelecimentos e do valor da produção. Ou seja, as mudanças nas
características do parque industrial nordestino não constituem um fato apenas das duas
últimas décadas. Esse período apenas acentuou uma tendência que se delineou nos Anos
40.
É interessante observar que enquanto o pessoal ocupado passou de 20,3%
do total do Brasil em 1920 para 11% em 1980, com uma redução de quase 10% , a
reduçllo para o valor da produção foi de apenas 2,3% .
Nova Economia 1Belo Horizonte 1v. 21 n. 21 novo 1991.
57
Se levarmos em conta o pone do crescimcnto do valor da produção
industrial do País como um todo no período, e a expansão das Regiões Sudeste e Sul,
tem-se a medida da importância do valor da produção industrial na Região Nordeste.
Seguindo-o mesmo raciocínio, o Gráfico 5 permite comparar a variação da
parcela de pessoal ocupado e de salários industriais na Região, ao longo das quatro
décadas estudadas.
GRÁFICOS
Região Nordeste
Evolução dos Empregos e dos Salários em Indústrias.
Incremento Absoluto - 1920.80.
Brasil
100
=
25
20
15
to
5
I:ill]
Pessoal Ocupado
o
~
Salário
1920
Fonte: Idem Gráfico 1.
Apesar de uma queda aparentemente proporcional, a diferença em percentual entre as duas distribuições foi decrescente, passando de 8,3% em 1920 paro 4,3%
em 1980, porque o percentual do pessoal ocupado teve maior redução. Confirma-se o
processo de elitização do emprego industrial na Região, ou seja, menos pessoal ocupado
paro a mesma pareela de salários pagos.
O conjunto dos dados elaborados até aqui permite inferir que: a) houve
expansão real da atividade industrial na Região Nordeste entre 1920 e 1980; b) a .
tendência a um tipo de industrialização poupadora de mão-de-obra delineou-se desde
o início do século, aprofundando-se a partir da Década de 40; c) o valor da produção
industrial e os salários elevaram-se mais do que o crescimento dos estabelecimentos
industriais e o crescimento do emprego; e, finalmente, com relação à lógica da expansão
industrial na Rcgião, fica claro que, de forma mais acentuada do que o ocorrido no País,
a modernização implicou uma menor absorção relativa de trabalhadores na indústria,
provocando maior seletividade de emprego no setor. Este fato adquire maior relevância
porque contextualizado numa área onde a disponibilidade de mão-de-obra é a maior do
País.
58
Nova Economia 1Belo Horizonte 1v. 21 n_ 21 novo 1991.
Outros indicadores das transformações estruturais referem-sc à atividade
agrícola. A utilização de máquinas e instrumentos agrícolas cresceu na Região, especialmente durante as Décadas de 60 e de 70. Enquanto as máquinas e implementos
utilizados na produção e na colheita cresceram entre 1920 e 1950 em 6.474 unidades,
ou seja, 215,8 unidades/ano; entre 1950 e 1970 houve um acréscimo de 123.797
unidades, o que significa um acréscimo médio anual de 6.189,8 unidades. Entre 1970
e 1980 o crescimento foi de 184.926 unidades, ou scja, 18.192,6 unidades/ano.
A Década de 50 foi, sem dúvida, um marco no processo de modemização
da agricultura regional, claramente influenciada pela modernização industrial do País.
Esta influência pode ser também percebida pelas taxas de crescimento do número de
máquinas e instrumentos agrícolas, que passaram de 1,8% ao ano nas Décadas de 20 e
30 para 11,6% ao ano na Década de 50 e 60, e 8,7% ao ano na Década de 70.
A comparação entre os tipos de adubos utilizados na Região indica o
crescimento da utilização de adubos químicos, em detrimento dos de origem orgânica,
vegetal ou animal. Esta mudança reflete o incremento do uso de produtos de origem
industrial, e portanto mais caros, na agricultura nordestina: a adubação orgânica caiu
de 84,8% em 1970 para 59,2% em 1980, enquanto a adubação química passou de 13,4%
em 1970 para 36,8% em 1980; ou seja, uma redução de 25,6% para o primeiro e um
aumento de 23,4% para o segundo.
Outro avanço significativo refere-se à expansão das terras irrigadas. A taxa
média geométrica do crescimento anual da superfície irrigada entre 1960 e 1980 foi de
8,3% ao ano na Região e 6% ao ano no Brasil. Em relação ao País como um todo, a
posição da região melhorou, passando de 11,4% em 1960 para 17,6% em 1980. Ou seja,
a Região beneficiou-sc da expansão da irrigação no País.
Atenção especial, no entanto, deve ser dada à estrutura fundiária do,
Nordeste. Esta informação possui, na realidade, um conteúdo que transcende às
questões puramente econômicas, sendo indicativa da própria estrutura social da Região
e das relações de trabalho dominantes. A Tabela 1 fornece a informação que nos parece
mais reveladora: a variação do tamanho médio dos menores e dos maiores estabelecimentos agrícolas. Este dado contém, em si o próprio, sentido da evolução das relações
econômico-sociais nordestinas.
TABELA 1
ESTABELECIMENTOS AGRíCOLAS - TAMANHO MÉDIO (ha)
REGIÃO NORDESTE E BRASIL
Anos
1920
1940
1960
1980
rONm:
Até 100 ha
Brasil
Nordeste
31,3
16,5
12,7
10,8
CENSO AGROPECUÁRIO
33,9
22,1
17,9
15,9
Mais de 1.000 ha
Nordeste
Brasil
2.921,0
2.567,0
2.474,0
2.686,7
4.217,4
3.654,1
3.385,3
3.418,3
DO BRASIL. Rio de Janeiro:
Nova Economia I Belo Horizonte I v. 21 n. 21 novo 1991.
Mais de 2.000 ha
Nordeste
Brasil
4.468,8
5.013,3
4.982,5
6.162,0
IBGE, 1920; 1940; 1960; 1980.
59
Enquanto os estabelecimentos com menos de 100ha tiveram seu tamanho
médio reduzido cerca de três vezes entre 1920 e 1980, os grandes estabelecimentos
apresentaram perdas bem menores, sendo que os maiores conseguiram ampliar ainda
mais sua área.
Fica claro que a modernização da agricultura nordestina ocorreu em uma
estrutura fundiária profundamente marcada pelo contraste entre propriedades muito
grandes e muito pequenas. A manutenção, e mesmo a ampliação, dessa diferença faz
parte do processo de valorização da terra decorrente da expansão do capitalismo na
agricultura. Na verdade, como no sistema capitalista as terras s6 se encontram efetivamente disponíveis para o capital, aos agricultores descapitalizados cabem parcelas de
terra cada vez menores. Os grandes proprietários, ao contrário, possuem a alternativa
de preservar suas terras como reserva de valor, e mesmo de status ou de transformar-se
em capitalistas agrários, o que lhes permite ampliar ainda mais suas propriedades.
As informaçôcs coletadas indicam, portanto, que foram incorporados à
agricultura regional novos equipamentos e novos produtos destinados à melhoria
técnica do processo produtivo e que, paralelamente à modernização da atividade
agrícola, consolidou-se uma estrutura fundiária socialmente injusta e economicamente
pouco estimulante.
Porém, apesar dos avanços da atividade agrícola, há um dado, apenas
aparentemente contraditório, que reflete justamente as condiçôcs sociais e econômicas
em que o processo de modernização ocorreu: aumentou a parcela de trabalhadores
agrícolas brasileiros residentes no Nordeste, enquanto a parcela correspondente ao valor
da produção regional no País diminuiu, como pode ser observado no Gráfico 6.
Pessoal Ocupado
GRÁFICO 6
Região Nordeste
e Valor da Produção
Brasil = 100
na Agricultura.
50
40
30
20
10
o
1920
1940
tillJ
Pessoal Ocupado
~
Valor da Produção
1980
Fonte: Idem Gráfico I.
60
Nova Economia 1Belo lIori7.0nle I v. 21 n. 2 1novo 1991.
Ou seja, houve efetivamente modernização da agricultura, wmbém na
Região Nordeste. No enwnto, aumentou a desproporção entre o pereentual do pessoal
ocupado e o do valor da produção, significando que a incorporação de novos implementos ao processo produtivo foi insuficiente para alterar ~ relação desvanwjosa entre
o tra- balho e a produção agrícolas. POrUlnto,a moderniiação pôde ocorrer sem alteração
subswncial tanto da estrutura fundiária quanto das relaçôcs de produção. Este é outro
traço do caráter regional.
A elaboração de alguns indicadores do comporWmento dos setores básicos
da economia nordestina visou demonstrar que não houve decadência da economia
regional nas últimas décadas. A Região evoluiu e se modernizou em vários aspectos,
ou preservou a sua posição em relação ao País.
3 NORDESTE - PROTECIONISMO FINANCEIRO
Apesar das dificuldades na obtenção de informaçôcs comparáveis no tempo
e no espaço sobre finanças públicas, foram selecionados alguns indicadores que, direta
ou indiretamente, possibiliwm uma visão, mesmo que aproximativa, da posição da
Região no conjunto do País. Começamos com a sua participação na geração da renda
interna. Em 1939 ela foi de 16,7%, passando a 12,2% em 1980. A redução foi de 4,5%.
No mesmo período a Região Sudeste reduziu a sua participação em I %, o Sul aumentou
2, I % e o Norte e o Centro-Oeste 3,4%. A Tabela 2 mostra mais claramente a
contribuição de cada região para a renda interna do País no período.
PARTICIPAÇÃO
TABELA 2
REGIONAL NA RENDA INTERNA
BRASIL = 100
Regiôcs
1939
1950
Nordeste
Sudeste
Sul
Norte/C.O.
16,7
63,2
15,2
14,6
65,5
4,9
3,6
16,3
1960
14,8
62,7
17,8
6,0
1970
12,0
65,0
17,0
6,0
1980
12,2
62,2
17,3
8,3
FON1TI: FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Rio de Janeiro. IllGE. Sistemas de contas nacionais.
Apesar da irregularidade da série, não é evidente que a diminuição da
participação nordestina na geração da renda interna do País seja decorrência da
expansão apenas do Centro-Sul. Na realidade, a Região Centro-Oeste cada vez mais se
deswca como a fronteira dinâmica do País, aproximando-se, em muitos indicadores, da
posição do Nordeste na classificação das regiôcs brasileiras.
Outra informação subsidiária à questão das finanças regionais é a contribuição tributária, via Imposto de Renda Entre 1940 e 1985, a participação do
Nordeste na receita nacional deste imposto caiu 3,7%. No mesmo período, o Sudeste
reduziu sua participação em 4,6% e o Sul em 3,7%, como pode ser visto na Tabela 3.
Nova Economia 1 Belo 1/0ri7,(>nle1 v. 21 n. 21 novo 1991.
61
Comparando a Tabela 3 com a 2, observa-se que, nos anos comparáveis
das duas séries, a parcela da renda interna gerada no Nordeste foi superior ao Imposto
de Renda gerado na Região. No Sudeste, ao contrário, a pareela deste imposto foi, em
todos os anos, superior à sua participação na renda interna nacional.
TABELA 3
ARRECADAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA
BRASIL = 100
Regiões
1940
1950
1960
1970
1980
1982
1985
Nordeste
Sudeste
Sul
Norte e C. O.
8,8
78,6
10,2
6,3
7,0
76,5
10,0
6,5
6,0
80,1
10,5
3,4
6,0
80,1
10,5
3,4
6,1
77,2
10,3
6,4
9,3
71,2
8,3
11,2
5,1
74,0
6,5
14,4
I'ONTES: ANUÁRIO ECONÔMICO
ANUÁRIO ESTATíSTICO
I'ISCAL. Brasnia : Ministério da I'azcnda. 19... Vários anos.
DO BRASIL. Rio de Janeiro : IBGE. 1986.
Complementando as informações anteriores com outras sobre as transações
financeiras do setor público, elaboramos, inicialmente, uma relação entre as Transferências Financeiras da União para os Estados e as suas populações em alguns anos. As
informações obtidas indicam que a parcela dessas tranferências para a Região Nordeste
tem sido crescente, tendo sido em 1983 maior do que as transferidas às outras regiõcs.
Como pode ser observado no Gráfico 7, já a partir de 1978 o pereentual dos recursos
transferidos para a Região foi superior ao da sua população. Além disso, mesmo nos
anos anteriores, quando se compara a parcela transferida para a Região e a pareela da
população residente, pereebe-se que a Região Nordeste foi mais beneficiada do que o
foram as Regiões Sudeste e Sul. Esta comparação é necessária, pois é suposto que estes
recursos se destinam à sociedade como um todo.
A participação do setor público nas finanças regionais pode também ser
avaliada pela relação entre as Transferências Correntes que compõem a Receita e a
Despesa dos Estados.
Das Transferências Correntes da União, a maior beneficiária tem sido a
Região Nordeste, que em 1970 recebeu 28,9%, em 1975,29,4% e em 1979,31,2%.
No entanto, se tomados os recursos da União por sua origem regional, o Nordeste
participou com 7,4% em 1970,8,6% em 1975 e 14,1% em 1979. Tal desequilíbrio entre
os destinos e as origens das receitas da União, por demais evidente, se dá em sentido
contrário nos casos do Sul e do Sudeste.
Os recursos do Fundo de Participação dos Estados e Municípios têm
também se concentrado no Nordeste. O Gráfico 8 mostra que entre 1970 e 1980, apesar
da queda em 1973 e 1975, a parcela destinada à Região foi crescente.
62
Nova Economia I Belo Iloriwnte
I v. 21 n. 2 I novo 1991.
GRÁFICO 7
Regiõcs Nordesw, Sudeslc e Sul
índice de Proporcionalidade
entre as Tranferências
Correnlcs da União e a População Regional.
2
1,5
lillillI
Nordeste
~
Sudeste
~
Sul
20
lillillI
Nordeste
10
~
Sudeste
o
~
Sul
0,5
o
1935
1972
Fonte: ANUÁRIO ESTATíSTICO
1978
1983
DO BRASIL. Rio de Janeiro: IBGE. Diversos anos.
GRÁFICOS
Regiõcs Nordesw, Sudeslc e Sul
Fundo de Participação dos Estados e Municípios.
Distribuição Regional.
Brasil = 100
50
40
30
1970
1973
1975
1977
1980
Fonte: Idem Gráfico 7.
Nova Economia I Belo Hori7.0nte 1v. 21 n. 21 novo 1991.
63
Utilizando, ainda, informações sobre a regionalização das transaçôcs do
setor público, é evidente que a Região Nordeste, no período para o qual os dados são
disponíveis, tem menor participação na Receita do Setor Governo e maior participação
nas Despesas. A Tabela 4 fornece a dimensão das diferenças.
TABELA 4
DA RECEITA E DESPESA DA UNIÃO'
BRASIL
100
REGIONALIZAÇÃO
Regiôcs
Receita
Nordeste
Sudeste
Sul
=
1970
Despesa
7,2
62,7
11,5
11,1
55,8
10,7
Receita
1975
Despesa
5,6
55,6
10,2
9,0
50,7
10,0
Receita
1980
Despesa
8,3
64,6
12,3
10,3
45,1
10,2
FON1TI: REGIONALIZAÇÃO
DAS TRANSAc6ES
DO SETOR PÚllLlCO.
Rio de Janeiro: Fundação
Getúlio Vargas/Centro de Estudos Fiscais, 1970, 1975 e 19811. A administração central e descentraJizadã. União, Estado, Municípios.
NOTA: • Administração Central e Descentralizada. União, Estados, Municípios.
Em percentual, o Nordeste apresenta saldo favorável às despesas na
Região, variando de 3,9% em 1970, 3,4% em 1975 a 2% em 1980. No Sudeste, ao
contrário, a diferença é negativa e passou de 6,9% em 1970, para -19,5% em 1980.
GRÁFICO 9
Região Nordeste
Renda e Tranferêncla
Per Caplta
l\I~dla Nacional = 1.0
1,4
1,2
0,8
0,6
0,4
rníJ
Renda
~
Transferências
0,2
O
1935
1939
FON1TI: Idem Gráfico 7.
64
1950
1960
1966
1970
1980
Nova Economia I BeJo /Iori7.0nte I v. 21 n. 2 I novo 1991.
Finalmente, deve-se estabelecer a relação entre as informações sobre as
transações do setor público com o comportamento, no tempo, da renda per capita
regional. O Gráfico 9 compara os valores per capita, em relação à média' nacional, para
as Transferências Correntes na Receita dos Estados e para a Renda. Apesar das
diferenças entre os anos das séries, a direção das linhas reforça algumas evidências.
A partir de meados da Década de 60, as Transferências Correntes per capita
para a Região foram crescentes, e em 1980 ultrapassaram a média nacional, enquanto
a renda per capita regional permanece teimosamente abaixo dessa média. Ou seja, o
aumento das transferências não tem produzido efeitos visíveis, pelo menos estatisticamente, no comportamento da renda per capita regional. Como esta é obtida através da
renda gerada internamente e da população, deduz-se que o avanço das atividades
geradoms de renda e as transferências do setor público não foram ainda capazes de
elevar a renda interna a níveis mais compatíveis com a sua massa populacional. Os
dados até aqui utilizados sugerem, portanto, que tem havido mais competência, por
parte dos gestores das finanças da região, em obter recursos do setor público, do que
em aumentar suas próprias receitas.
O conjunto de indicadores econômicos permite afirmar que o Nordeste
acompanhou o processo de modernização do País, e mesmo que se beneficiou dele,
ressalvando-se, porém, que as transformações foram setorial mente seletivas. Nesse
ponto reside o que poderíamos chamar de "enigma nordestino", pois à expansão e
modernização dos recursos materiais corresponde à pr=rvação
das relações sociais
forjadas na estrutura econômica anterior. Ou seja, assiste-se na Região à convivência
entre dinâmicas de transformação do econômico e do social muito diferentes, o que
resulta na superposição de condições materiais que se modernizam e condições sociais
que se deterioram. Embora esta seja uma situação que, de algum modo, ocorre em todo
o País (Abranches, 1985; Santos, 1985), a especificidade do Nordeste está nas proporções bem maiores em que o fenômeno aí se dá.
Apesar da Região ter contribuído e ter-se beneficiado do processo de
crescimento econômico do País nas últimas décadas, foi nela também que a pobreza
mais se concentrou. Assim, enquanto em 1970 emm nordestinas 41% das familias
pobres brasileiras, em 1980 esse índice chegou a 50%. Levando-se em conta que neste
último ano viviam no Nordeste cerea de 27% das famílias do País, é evidente que nesta
Região permanece o mais importante espaço da pobreza nacional (Pastore, 1983).
Imaginar que esta contradição entre creseimento econômico e pobreza foi
semelhante para todo o País é um engano grosseiro. A Região Sudeste, cujos indicadores econômicos demonstram ter sido o espaço mais favorecido pela expansão da
economia do Brasil neste século, foi também onde o creseimento absoluto de famílias
com rendimento superior a I salário mínimo foi superior ao crescimento das famílias
que ganham menos do que esse valor.
A questão mais importante é tentar compreender como e por que as
transformações econômicas têm mais dificuldade em favorecer transformações sociais
na Região do que no resto do País.
O ponto de partida é de que o Nordeste - segunda massa populacional do
País e até fins do século passado sua região economicamente mais importante - tem se
Nova Economia 1Belo Horizonte I v. 21 n. 21 novo 1991.
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mostrado especialmente resistente às mudanças sociais favorecidas pela modernização
econôm ica, com destaque para as referidas às relações de trabalho e à estrutura
fundiária.
Trata-se, então, de investigar as formas que podem assumir as barreiras à
maior distribuição do produto social na Região e que agentes têm sido mais atuantes
na sustentação dessas barreiras. Levanta-se aqui uma dúvida quanto ao papel exclusivo,
a esse respeito, das relações econômicas inter-regionais e internacionais. Assim, uma
nova questão se coloca: a expansão dos investimentos destinados a aumentar os recursos
à disposição da sociedade foi a possível, tendo em vista limitações físicas e de
infra-estrutura regional, ou foi simplesmente a permitida pela ordem político-social
dominante na Região nesse período?
4 SECA E O IMAGINÁRIO POLÍTICO NORDESTINO
o fenômeno da seca, que na perspectiva da natureza é um fenômeno
climático, na perspectiva da sociedade pode ganhar um conteúdo eminentemente
político. Este conteúdo é possível porque, em sendo causada por fatores naturais, ela
fica fora do controle social, dando maior visibilidade às suas conseqüências do que às
suas causas. Afinal, a domesticação da natureza não chegou ainda ao ponto de fa7.cr
chover em épocas e quantidades desejadas. Além disso, a pouca disponibilidade de água
cria, concretamente, uma natureza mais difícil de ser trabalhada.
A seca, portanto, estabelece as condições necessárias ao imaginário da
tragédia: perda de rebanhos, vegetação crestada, sede, fome. Embora o semi-árido
brasileiro esteja, do ponto de vista climatológico, longe de ser um Sahel, do ponto de
vista político suseita base de mobilizações.
Afmnamos aqui que as condicões geográficas do território sob o clima
tropical semi-árido no Brasil são passíveis de aproveitamento, desde que técnicas
adequadas sejam utilizadas. Estas técnicas são largamente conhecidas e aplicadas em
diferentes regiões do mundo onde as condições pluviométricas podem ser até bem
piores do que as do nosso Nordeste. Portanto, nosso ponto de partida é que a seca tem
sido, historicamente, mais um pano de fundo para o jogo de cena político da Região do
que um problema climático intransponível.
As duas primeiras partes deste artigo mostraram que a economia da Região
é menos débil na prática do que no discurso da sua elite. O problema regional concreto
é seu quadro social, bastante conhecido, que concentra a pobreza do País. Paralelamente, o discurso parlamentar insiste em projetar uma imagem da Região filtrada pela
tragédia climática sem considerar que os problemas sociais são exatamente os mesmos
nos seus espaços úmidos. O filtro da seca é, portanto, importante para confundir
responsabilidades. É mais fácil culpar a natureza que os fatos e, quando estes são
responsabilizados, as causas são sempre externas. É este imaginário que será exposto
e discutido a partir do discurso político.
Os temas tratados nos discursos parlamentares veiculam mensagens que
compõem um painel ilustrativo dos elementos predominantes da imagem da Região
que se projeta no plano nacional através da atividade parlamentar.
66
Nova Economia 1Belo Horizonte I v. 21 n. 21 novo 1991.
A seca é tema freqUente e articula-se prioritariamente com pedidos de
recursos. Porém. recorrendo aos textos dos discursos. é possível maior compreensão
do significado da questão. Em primeiro lugar. a seca é tratada basicamente como
"calamidade". e o fenômeno é revestido de um carátér de inevitabilidade e de infortúnio.
o que sugere que ele deve ser enfrentado de forma imediata. ou seja. no momento em
que se manifesta. Mas. a semi-aridez. como aspecto do clima da maior parte da região.
implica também necessidades de investimentos permanentes para a sustentação e
ampliação das possibilidades de desenvolvimento da atividade agropecuária. Assim.
sob um ou outro ângulo. as discussões sobre a seca. seja como fenômeno de estiagem.
seja como escassez pluviométrica. conduzem necessariamente aos recursos. Estes. por
sua vez, devem vir de fora da Região, já que. por causa mesmo da seca, ela não dispõe
deles. A histórica centralização financeira do País defmiu onde os recursos deveriam
ser buscados.
As necessidades impostas pelas secas passaram a fazer parte. portanto. das
decisõcs do Governo. o que permitiu que o sistema representativo fornecesse o
ingrediente político e definisse o caráter da relação scca/recursos, cujo primeiro termo
traduz a necessidade de favores e privilégios e o segundo requer a mediação do sistema
político. o que implica interesses. acordos e adesõcs. O fenômeno da estiagem respaldou
então. historicamente. as relaçõcs políticas regionais, que definiram internamente a
direção dos favores e privilégios. e externamente a inclinação dos acordos e adesõcs.
Assim. a relação recursos/política na Região Nordeste. definida originalmente pela
relação seca/recursos, não mais se circunscreve à política regional. já que ampliada
como componente essencial do jogo político nacional. 2
Os pronunciamentos dos representantes políticos da Região permitem.
então. maior visibilidade da relação triangular composta pelas dimensões da carência.
dos recursos e do sistema político. A repetição de temas e argumentos, aqui palidamente
retratada. é a tônica desses discursos.
O pronunciamento do Deputado Furtado Leite. do Ceará. é ilustrativo. Ele
denunciou:
"estado de calamidade pública no interior do Ceará. onde multidões (...)
estão invadindo cidades; trens são assaltados por flagelados (...). como
conseqUência da estiagem. (...) os agricultores lamentam a destruição
parcial de suas lavouras e há ainda o perigo iminente do extermínio total
do gado daquela Região se não ocorrerem chuvas o quanto antes".
O Deputado criticou "as providências do Governo que sc resumem a planos
para solução a longo prazo, (...) quando precisamos urgentemente de medidas revolucionárias e concretas". Concluindo, o Parlamentar declarou que confia no "Governo do
Marechal Castelo Branco que. em boa hora. foi instalado no Brasil" (Diário ...• 1965. p.
719).
Joacil Pereira. Deputado pela Paraíba, da mesma forma. reclamou que 90%
do Estado foi atingido pela seca e descreve o "flagelo" das áreas atingidas. afirmando
que:
2 Uma análise mais completa do conleúJo temático dos discursos foi feita em Castro (1989. capo 5)
Nova Economia 1Belo l!ori7,onte 1v. 21 n. 21 novo 1991.
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"por mais que se saiba disso, tudo que tem sido feito, sempre menos que
o prometido, continua insuficiente. Regimes e governos Jamais respondemm com eficiência ao desafio da seca no Nordeste. No meu Estado
não há mais reservas de alimentos (...) e os trabalhadores mais uma vez
passarão a depender das frentes de emergência".
Continuando, o parlamentar reclamou que "o atendimento aos flagelados
é um desses casos em que os recursos não podem ficar sujeitos à morosidade. frieza e
indiferença burocráticas". Citando os "pecuaristas empobrecidos, perdendo seus rebanhos", propoz a abertura "de uma linha de crédito, nos bancos oficiais, a juros módicos,
paro promover a retirada dos rebanhos paro outros estados e salvar o que resta" e também
"mobilizar todas as forças vivas da nacionalidade numa campanha de socorro ao
Nordeste" (Diário, 1980. p. 9.182). Tmta-se objetivamente de reforçar a necessidade
das frentes de emergência e a perspectiva de que a pobreza atinge tanto os trabalhadores
rumis como os pecuaristas. Assim. todos merecem socorro igualmente.
O Deputado Paulo Lustosa. do Ceará. se referiu ao "agravamento da seca
que assola o Nordeste" aumentando o "sofrimento e a luta do povo". Paro o Parlamentar.
"as variações climáticas adversas contribuem para que se avolumem os infortúnios", e
aproveitou paro acrescentar que como os "recursos são escassos". os pequenos e médios
produtores rumis pedem prazos maiores paro saldar suas dívidas (Diário ... 1983. p.
1.037).
O Deputado Vingt Rosado, do Rio Gmnde do Norte, foi dramático quando
abordou:
"o problema da seca que mais uma vez se abate sobre o Nordeste. (...)
sinto-me na obrigação de juntar minha voz aos demais congressistas da
Região que, como habitantes e conhecedores dos problemas têm descrito
com cores reais e palavras verazes o quadro desolador que nos bate
novamente à porta. (...) Ressaltar os dias dilTceis que enfrentamos na
terra onde nascemos. pela estiage,m, é retratar paro toda a Nação o
doloroso espectro da seca (...) E a falta d'água (...), é o homem
maltrapilho, esquálido e esquelético, que migra em busca da sobrevivência. (...) Precisamos que o Governo Federal. urgentemente. através do
Ministério do 1nterior{MINTER, da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste/SUDENE, Departamento Nacional de Obras
Contra a Seca/DNOCS. Banco Nacional de Habitação/BNH. Banco do
Nordeste do BrasiVBNB e de tantos órgãos que atuam na Região, nos
socorra com serviços públicos e trabalho paro muitos milhares de norterio-gmndenses.
Negar o que tem sido realizado pelo Presidente Figueiredo em prol de
nosso povo seria injustiça clamorosa (...). O nosso apelo é (...) que sejam
agilizados os serviços de emergência; que não se suspendam os financiamentos para investimentos dos pequenos e médios agricultores (...)"
(Diário ..., 1983, p. 1.021).
Inocêncio de Oliveira, Deputado por Pernambuco. demonstrou que:
"o reescalonamento das dívidas dos produtores rurais e agropecuaristas
do Nordeste. com juros subsidiados e sem correção monetária, por um
prazo mzoá vel e com um período de carência, é medida que se faz necessária na atual conjuntum paro permitir que se recuperem dos efeitos catastróficos dos quatro anos consecutivos de seca .•(Diário ...•1983, p.2l9).
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Nova Economia 1Belo Horizonte 1v. 21 n. 21 novo 1991.
Parece evidente, nos pronunciamentos citados, que a relação seca/recursos,
inserida no sistema político - haja vista sua freqüência - ,desdobra-se naturalmente na
atribuição de responsabilidade à União para com o Nordeste e, conseqüentemente, no
pressuposto de que as soluçôcs dos problemas regionais escapam à vontade da sua elite.
Nesse sentido, há uma perspectiva essencialmente paternalista, com relação às possibilidades reais de alcancá-Ias. Ou seja, a seca deve ser enfrentada como inexorável e
não como um fenômeno climático, passível de ser controlado com técnicas adequadas.
A seca representa pois um "destino manifesto" às avessas nas estratégias geopolíticas
particulares da elite nordestina.
Também a dependência da Regiilo em relação ao Poder Central, seja este
definido como "União", como "Governo Federal" ou mesmo personalizado na figura
do "Presidente da República", foi explicitada com muita freqüência nos discursos. O
Deputado Carneiro Amaud defendeu a abertura de frentes de trabalho no período de
estiagem, afirmando que:
"são necessárias providências urgentes do Governo Federal, por intermédio dos órgãos competentes do Ministério do Interior, melhorando o
salário do trabalhador braçal e ampliando as frentes de trabalho na
Região sertaneja, mas também atendendo aos proprietários rurais, na
grande maioria pequenos lavradores e pecuaristas, que também precisam do apoio e da assistência governamentais" (Diário ... 1983, p. 83).
O Deputado Martins Rodrigues falando sobre a seca no seu Estado e na
Região, declarou que:
"só o Governo da União poderá acudir de maneira eficiente com a
realização de obras e assistência à população carente", pedindo a
"atenção dos diversos ministérios a fim de que se tomem as providências
necessárias para socorrer as populaçôcs flageladas" (Diário ... 1958, p.
653).
Moisés Pimentel, embora afirme não acreditar nas soluçõcs adotadas pelo
Governo Federal, formulou:
"um apelo veemente ao Governo, especialmente aos Ministérios do
Interior, da Aeronáutica, da Agricultura, ao CNPq, à SUDENE, ao
DNOCS, enfim a todos os órgãos que têm responsabilidade na solução
do problema das secas no Nordeste, no sentido de se empenharem na
pronta realização do projeto" . (Refere-se ao do CT A para mudar o clima
do Nordeste "que há 8 anos dorme nas gavetas do CNPq") (Diário ...
1985, p. 839).
O Deputado Paes de Andrade referiu-se à seca que deixa "milhões de
pessoas flageladas e famintas" e acreditava na "necessidade de dinamizar em todo o
Nordeste as frentes de trabalho visando sobretudo ao setor agro-pecuário", o que
"dependerá sempre de créditos extraordinários a serem abertos pelo Executivo (...)"
(Diário ... 1970, p. 751).
Paulo Sanv.ate (Diário ... 1952, p. 1.726) foi ainda mais explícito quando
pediu urgência para aprovação do crédito solicitado em projeto de sua autoria sobre o
êxodo do Nordeste, ressaltando a necessidade de providências imediatas, "que devem
ser tomadas pelo Poder Público e por todos aqueles que têm responsabilidade pelo
Nordeste".
Nova Economia 1Relo ilOn7.0nle Iv. 21 n. 21 novo 1991.
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o Deputado Raimundo Asfora, em discurso em que criticou duramente o
modelo econômico do Governo, proposto pelo então Ministro Delfim Netto, declarou
que o "Nordeste é uma questão nacional" e como tal deve scr pensada e equacionada
(Diário ... 1983, p. 225).
Octacílio Queiroz, embora concordasse com as críticas a um plano de
emergência "acusado de fracasso e corrupção na Assembléia Legislativa", defendeu a
sua continuidade mesmo com a chegada das chuvas, acrescentando que "scm auxfiio
dessa emergência, haverá uma progressão da situação de calamidade no Nordeste".
Como as chuvas "não resolveram o problema do trabalhador, do posseiro e do morador",
o Parlamentar fez seu pronunciamento para "exigir do Governo imediata reformulação
do programa social, restabelecendo a emergência, enquanto não chegam as soluções
mais justas" (Diário ... 1982, p. 4.555).
Apesar da seca ser a justificativa mais freqüente para responsabilizar o
Estado pela parcela do seu território carente, os problemas das zonas úmidas são
tratados da mesma forma. Assim, lbales Ramalho denunciou o clima de tensão social
da zona da mata do sul de Pernambuco:
"em decorrência da grave crise dos plantadores, usineiros e trabalhadores da indústria da cana de açúcar. (...) Portanto é necessário o auxílio
do Governo Federal, pois ele é responsável pela política açucarcira do
País, através do Ministério da Indústria e Comércio e do Instituto do
Açúcar e do Álcool/IAA, dispondo de amplos recursos" (Diário ... 1978,
p.2.314).
O Deputado Arruda Câmara, em longo discurso sobre a necessidade de
transformações da economia do País e do Nordeste, ofereceu o apoio do P'Mlamento às
decisões do Governo para agilizar o processo, pois o "Nordeste passa fome e miséria
por inabilidade dos governos" (Diário ... 1958, p. 3.897).
Antônio F1orêncio falou nas lavouras perdidas, nas migrações desordenadas, no desemprego, na desorganização financeira dos estados e sugeriu como
solução "indispensável a pronta e eficiente participação do Poder Central" (Diário ...
1972, p. 431).
As dificuldades climáticas são, na grande maioria dos pronunciamentos,
responsabilizadas pela pobreza regional, o Deputado Adauto Bezerra foi bastante
explícito quando disse que "o Nordeste há mais de 100 anos luta contra as inclemências
do meio, e outros fatores, que o transformam em uma das regiões mais pobres e
sofredoras do mundo" (Diário ... 1981, p. 13.794).
Mas, o clima, sendo responsabilizado pela pobreza regional, plasmou
outras dificuldades, como a levantada pelo Deputado Antônio F1orêncio que solicitou:
"melhor atenção para a cultura algodoeira do Nordeste, porque nesta
Região, em especial na wna semi-árida, não há outra opção para um
aproveitamento em potencial, (...) sendo necessário um preço especial
para o produto dada a sua baixa produtividade na Região Nordeste"
(Diário ... 1974, p. 9.124).
O Deputado Oswaldo Coelho, falando da insuficiência dos muitos recursos
que foram carrcados para a área, defendeu a necessidade de irrigação e explicou que o
"baixo nível cultural do Nordeste responde pela elevada resistência às mudanças".
70
Nova Economia I Belo Horizonte Iv. 21 n. 21 novo 1991.
Para o referido Parlamentar:
"a pobreza nordestina, em particular a de Pernambuco, se explica melhor
pela ótica polítieo-social do que pela climática", pois "tem faltado uma
decisão política firme para implementação da agricultura irrigada. A
escassez de recursos, descontinuidade de investimentos, ausência de
política de créditos diferenciados para a agrieultura de irrigação, são
alguns obstáculos que, ao lado da concentração de renda, impedem a
expansão do consumo e representam as grandes barreiras ao projeto
agrícola em Pernambuco" (Diário ... 1984, p. 14.672).
Para o Deputado Arnaldo Maciel foi:
"exagerada a determinação governamental em exigir que a agricultura
nordestina opere em níveis de produtividade e, conseqüentemente, com
custos semelhantes a outras regiões de condições climáticas e ecológicas
reconhecidamente mais favoráveis" (Diário ... 1984, p. 1.220).
Portanto, mesmo a baixa produtividade da agricultura nordestina, em sendo
também decorrente das condições físicas da Região, deve ser considerada como uma
justificativa para a canalização de mais recursos, de maiores facilidades fiscais e de
preços mínimos regionalmente diferenciados, pois trata-se de compensar o Nordeste
por seus azares climáticos. Deve ser lembrado novamente que, mesmo na zona da mata
úmida, com solos de massapê reconhecidamente férteis, a produtividade da cana de
açúcar é também baixa.
A freqüência com que os recursos são solicitados e a segurança na
atribuição de responsabilidade ao Governo pelas soluções dos problemas s6cioeconômicos nordestinos não devem ser interpretados como mera retórica. Há um fato
conhecido, mas pouco explicitado nos discursos, que é o tradicional governismo da
bancada nordestina (Aeischer, 1985). Assim, a contrapartida política para os tão
necessários recursos, embora menos explícita, pode ser percebida também nas declarações de apoio ao Governo Federal ou ao Presidente da República.
Algumas "declarações" são significativas do suporte político que a bancada
nordestina tem oferecido ao Governo Federal em diferentes legislaturas, em troca de
atenções especiais à Região.
O Deputado Nilson Gibson, criticando a desarticulação do Programa de
Emergência no seu Estado e explicando a necessidade de criação de um fundo social,
objetivando uma melhor distribuição de renda no País, acrescentou:
"Desejo denunciar desta tribuna que o próprio partido do Governo vai
ter grandes dificuldades nas próximas eleições se realmente for ratificada a desativação do Plano de Emergência no sertão pernambucano"
(Diário ... 1982, p. 4. I73).
O Deputado Henrique Eduardo Alves, criticando as omissões do Governo
Federal na Região, declarou que:
"o eleitorado nordestino foi o mais ludibriado no úlLimo pleito ao
sufragar o partido situacionista, como se lhe devesse um bom desempenho, quando na realidade, aumentou no último decênio o gap entre o
desenvolvimento daquela esquecida Região e o do Sul do País (...)"
(Diário ... 1983, p. 1.983).
O Deputado Inocêncio de Oliveira afirmou que:
Nova Economia I Belo l!ori7.0nle I v. 21 n. 2 Inovo 1991.
71
"não resta dúvida que o Governo Federal, atendendo ao pleito da
bancada nordestina no Congresso Nacional, proporcionou recentemente
alguns benefícios creditícios e de diferenciaçào de juros à nossa região"
(Diário ... 1983, p. 5.465).
Também o Deputado Paulo Lustosa, ao discursar sobre os problemas da
Região, ressaltou o peso do apoio nordestino às propostas governamentais, lembrando
que o Nordeste é uma "reserva política tradicional com que o Governo conta" (ver
Brasil. Câmara dos Deputados, Sessão de 22/05/1979).
A relação perversa entre o apoio político da elite regional e a contrapartida
de recursos (ou vice-versa) foi mais claramente definida por algumas vozes minoritárias
como a de Fernando Lyra, que criticou o destino das verbas federais que só chegavam
"aos coronéis e aos apadrinhados do poder", acrescentando que "foi alimentando a
miséria do Nordeste, os 'barõcs' da indústria da seca, os latifundiários (...) que os
generais presidentes conseguiram até hoje maioria parlamentar no Nordeste" (Diário ...
1981, p. 2.067). Também a Deputada Cristina Tavares, em aparte, questionou as raízes
da miséria nordestina, afirmando que muitos programas na Região são utilizados para
reforçar o poder das "oligarquias fundiária~", "que é, em última instância, a responsável
pelo problema". E acusou o Governo e seus representantes de se limitarem a pedir mais
dinheiro para "reforçar seus latifundios, suas oligarquias, scu poder, seu mando
político" (Diário ... 1983, p. 9.125).
É interessante verificar que, da mesma forma que a atuação federal é
reconhecida como condição primordial para o desenvolvimento regional, os mecanismos de vazamentos dos recursos e desvios de seus objetivos declarados são também
identificados. Para Praxedes Pitanga as deturpaçõcs são provocadas pela atividade
política. O Parlamentar denunciou as:
"deformações e explorações que políticos pouco escrupulosos imprimem à assistência do Governo Federal às populaçõcs flageladas pela
seca" e a "ação política na distribuição de recursos da emergência" que
estabelece a "exigência de fidelidade partidária aos Oagelados inscritos"
(Diário ... 1958, p. 1.033).
Também Ivan Bichara referiu-se à "exploração do trabalhador das frentes
de emergência pelo chefe político local" citando um caso em que o chefe político é dono
do "Barracão", no qual os trabalhadores são obrigados a fazer suas compras. E
acrescentou que "a seca só é trágica para os pobres, para os trabalhadores e suas famílias.
Há homens no sertão fazendo fortunas da noite para o dia com o desconto de 20% dos
salários dos sertanejos". No entanto, apesar da denúncia, o Parlamentar concluiu seu
pronunciamento fazendo apelo para que a Legião Brasileira de Assistência atuasse na
Região e para que a imprensa fizesse "uma campanha destinada a vestir os sertanejos"
(Diário ... 1955, p. 3.373).
O Deputado Miguel Arraes declarou que "foi do Nordeste dos grandes
proprietários que sempre cuidaram os governos" denunciando a "utilização da miséria
como forma de pressão para conseguir recursos que, ressalvadas as poucas exceçõcs
acabam nos bolsos dos poderosos" e concluiu que "a política governamental de combate
à seca fortalece ainda mais a estrutura da região, com obras que beneficiam as grandes
propriedades" (Diário ... 1983, p. 10.080).
72
Nova Economia
1Belo 1l0ri7.0nlc 1v. 21 n. 2 1novo 1991.
Foram apresentadas, na primeira parte deste artigo informações sobre a
estrutura sócio-econômica da Região Nordeste e sua perda de posição para outras
regiões brasileiras, o que pode ser considerado um indicador de resistência a mudanças.
Estamos tentando demonstrar que parcela significativa da elite regional é agente nesse
processo. Alguns pronunciamentos são ilustrativos da defesa do status quo regional.
Um exemplo refere-se à produção açucarcira e à atuação do IAA para preservá-Ia.
O Deputado Raimundo Diniz, em discurso de apoio ao órgão, justificou a
sua estrutura legal que preservou a baixa produtividade da agricultura da cana nordestina pois, para o Parlamentar:
"aquela infra-estrutura teve a sua razão de ser no momento exato (...).
Se tivéssemos aberto à livre iniciativa da produção de açucar há anos,
muito possivelmente dezenas e dezenas de indústrias não teriam agüentado o preço competitivo pelo aviltamento do mercado"(Diário ... 1973,
p. 1.866-1.868).
Sintetizando as idéias e opiniões até aqui analisadas, temos que os problemas sócio-econômicos da Região Nordeste na perspectiva da grande maioria dos seus
parlamentares, desde 1945 até a Legislatura 83-87, decorrem das condições climáticas
desfavoráveis e devem ser equacionadas com recursos da União. Assim, a explicação
para a pobreza afasta-se das relações sociais de produção, sendo o quadro por ela
composto um forte argumento para conduzir os apelos, solicitações e exigências de
recursos, que podem assumir as mais diferentes formas: investimentos em obras,
créditos subsidiados, preços mínimos compensadores, programa de emergência etc.
Desse modo, existe uma questão social, provocada por condições climáticas desfavoráveis, cuja solução depende dos recursos que devem ser canalizados para
a Região. É bastante evidente, na maior parte dos pronunciamentos, que a Região é
tratada como uma homogeneidade social, na qual todos os segmentos vivenciam igualmente as mazelas regionais, sendo necessário que todos se unam para buscar as soluções, materializadas nos recursos que atenderão às expectativas das diferentes classes
da RegiãO. Na realidade, as relações sociais desiguais e as condições estruturais regionais, que preservam esta desigualdade, são diseutidas por um número bem reduzido de
parlamentares. Para a maioria, tanto umas como outras não constituem questões relevantes,já que tanto os problemas como as soluções para a Região são vistos como acima
da vontade de seus habitantes, entre eles as suas elites, tanto econômicas como políticas.
A perspectiva da elite nordestina, que se projeta como representante de uma
região definida pelos seus problemas climáticos, pela sua pobreza e pela dependência
de recursos federais não é unívoca. Alguns desdobramentos podem ser percebidos
através das diferentes maneiras pelas quais a cIite política aborda a questão.
A tentativa de dar visibilidade a algumas manifestações contidas nos
discursos parlamentares apóia-se na suposição da relação entre o imaginário político,
expresso mediante interesses, opiniões e atitudes, e a organização social e econômica
do território representado. Assim, os atos p'olíticos orientados por aquele imaginário,
sejam eles de decisões ou de não-decisões,3 exercem algum grau de influência sobre
as relações sociais e sobre o espaço por elas organizado.
3 Sobre a importância das não-decisões
ver Bachrach. BOTalZ(1970); Santos (1972).
Nova Economia 1Belo Horizonte 1v. 21 n. 2 I novo 1991.
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5 CONCLUSÕES
o imaginário político a1imenta-sc de fatos concretos dos quais são extraídas
as bases, tanto para o discurso como para a ação. O caso da Região Nordeste é bastante
paradigmático e didático. A natureza cria objetivamente um probIcma que é a estiagem.
Esta é, porém, dramática porque ocorre num território ainda fortemente rural, com
elevada concentração da propriedade e da renda e onde vive uma grande massa
populacional no limiar da miséria.
A relação entre política e a economia na Região é expressa pelas estratégias
conservadoras das suas elites, cujo resultado imediato é evitar alterações profundas na
organização social e no sistema produtivo do espaço regional. Esta estratégia tem sido
vitoriosa por longo tempo. No entanto, há iniciativas empresariais de sucesso que
desmentem a inexorabilidade do fracasso ou da necessidade do socorro da Nação,4
embora ignoradas no discurso da elite parlamentar.
Politicamente, trata-sc, portanto, de reforçar o imaginário da pobreza,
sustentado numa realidade de penúria, para estabelecer a ficção da ajuda como única
solução. O cenário da miséria tem sido historicamente um markeling eficiente para as
alianças da elite política regional, que é também, na maioria dos casos, a elite
econômica. A imagem da necessidade e do abandono tem um endereço certo e um
retomo garantido de dividendos políticos e econômicos.
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• Interessante reportagem da Revista VEJA de 13/06/1990.
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