PROBLEMAS FILOSÓFICOS DA CONTEMPORANEIDADE Theodor Adorno: Uma reflexão crítica sobre a obra de arte Luciana Vieira de Lima - UNICENTRO O artigo abordará a perspectiva adorniana sobre o caráter da obra de arte como fomentadora de conhecimento e, com efeito, o de crítica social. Para Adorno (2001a), não podemos considerar qualquer expressão artística como uma arte libertadora ou como uma arte autêntica. Para o pensador há um empecilho a respeito do material artístico, pois existe uma forma de conceber a arte, que serve para legitimar os interresses do capital que, deste modo, anula a cognição do sujeito. A arte que busca apenas o entretenimento não pode, de forma alguma, suscitar uma reflexão no sujeito e buscar sua emancipação, já que o objetivo da indústria que promove esta arte é apenas comercial e de nivelamento do homem. Por sua vez, a arte só poderá abranger uma dimensão social, quando ela se vincular com a filosofia, que deve conter em si a crítica do real, para poder não sucumbir ao processo de dominação que tem sua autonomia destituída pelo capital. A arte não deve ser desvinculada de seu compromisso social, porque é mediante uma investigação permeada pela crítica do fenômeno artístico que o pensador busca evidenciar o caráter de manipulação do capital sobre o sujeito, pois quando falamos em consciência humana não podemos separar crítica artística e social. Adorno (2001a, p.13) discorre que: “a priori, antes de suas obras, a arte é uma crítica da feroz seriedade que a realidade impõe, sobre os seres humanos”. Deste modo, a obra de arte, para o pensador, não é apenas uma teoria a mais a ser discutida e analisada. Ao dar importância especial à arte, o pensador nos mostra que existe algo a mais que simplesmente uma reflexão estética. Para Adorno, a obra de arte se torna essencial quando inserida em uma crítica da sociedade e da cultura capitalista, por isso não podemos abandonar os preceitos da Teoria Crítica ao pensarmos a teoria estética adorniana. Adorno defende a teoria de que a crítica deve desempenhar um papel fundamental no processo de cognição do sujeito. Para poder defender a arte como conhecimento, o pensador se afilia a pensadores como Kant, Hegel e Marx onde encontra suporte para uma teoria crítica da sociedade. IX SEMANA ACADÊMICA DE 16 A 19 DE NOVEMBRO DE 2010 ANAIS - IX SEMANA ACADÊMICA DE FILOSOFIA UNICENTRO 2010 - ISSN 2178-9991 2 A abordagem do presente texto se fundamenta no livro “Teoria Estética” de Adorno. Esta obra foi publicada em 1969, mesmo ano de seu falecimento, portanto, é um livro inacabado, mas sólido, fornecendo, assim, subsídios importantes e consistentes a respeito do tema aqui proposto. Esta obra apresenta uma tese fundamental para este estudo que é a manipulação da produção artística pelo capitalismo, levando-nos ao entendimento de que a obra de arte na contemporaneidade só poderá resistir enquanto for filosófica e crítica para garantir sua existência. Para o pensador, que é cético em relação ao direito de existência da arte, isso só seria possível em uma sociedade que fosse totalmente livre da dominação e do medo imposto pelo capital. Adorno defende que mudanças devem ocorrer para que a obra de arte tenha autonomia e expressão crítica. Para argumentar sobre a obra de arte na dimensão social subentende-se a própria existência da arte enquanto tal, tanto na sua imanência como na autonomia. Adorno abre a “Teoria Estética” com a significativa afirmação: “Tornouse manifesto que tudo o que diz respeito à obra de arte deixou de ser evidente, tanto em si mesma como na sua relação com o todo, e até mesmo ao seu direito de existência” (ADORNO, 2006, p.11). Outros pontos relevantes a serem destacados na obra adorniana supracitada são os vários vínculos entre filosofia e arte ressaltados pelo pensador, mesmo que para ele, filosofia e arte não sejam a mesma coisa, apesar de se aproximarem pelo seu conteúdo de verdade. Adorno nos alerta para um problema encontrado na arte moderna que diz respeito à forma e ao conteúdo na tentativa de validar a filosofia e a arte. Segundo Jimenez (1977, p.31), “a teoria estética deve ser, então, ao mesmo tempo, crítica e filosófica, como único meio de restituir a arte seu direito de existência”. O filósofo defende a posição de repensar a arte a partir de suas possibilidades de se libertar em relação ao conceito, devendo superar a forma tradicionalista de compreensão da arte. Sendo, portanto, que a estética não pode ser compreendida a partir de um princípio filosófico anteriormente elaborado, assim a filosofia deve compreender a arte, mas antes deve se libertar de ser o ponto de partida. A filosofia e a arte partilham do mesmo empreendimento que é o de provocar o sujeito para sua vida de aparências, o de fazer com que este tome consciência de sua vida supérflua onde tudo e todos se reduzem a mercadorias, sendo que a filosofia deve desempenhar este papel de maneira específica, por intermédio da reflexão dialética, levando ao esclarecimento sobre a relação de determinação mútua entre o universal e o particular. IX SEMANA ACADÊMICA DE 16 A 19 DE NOVEMBRO DE 2010 ANAIS - PROBLEMAS FILOSÓFICOS DA CONTEMPORANEIDADE UNICENTRO 2010 - ISSN 2178-9991 3 O filósofo pensa a arte de maneira não tradicional, ou seja, póstradicional. A arte que Adorno concebe como autêntica, nasce do potencial do material manipulado pelo artista, é o material artístico que faz surgir no artista o seu objeto, para extrair deste o máximo de significado. Para o filósofo, o papel do artista será o de experimentar ao máximo a forma sensível do seu objeto, para extrair dele o maior número de significação, deste modo, o conceito é posterior ao da criação da obra. A obra de arte deve querer a autonomia, abandonando a obrigação de representar a realidade empírica e o de querer agradar quem as contempla. Para o pensador, a linguagem estética, seja ela qual for, deve voltar contra si mesma (reflexão dialética) em pretensão de uma expressão que seja autêntica, capaz de conferir voz ao carente de expressão, já que a obra de arte, ao alcançar o indivisível, coloca-se para além dela mesma, e por isso que a expressão da obra de arte não se encontra na sua fala ou palavra, mas no olhar de quem as contempla. Deste modo, na “Teoria Estética” adorniana, deparamo-nos com a arte caminhando lado a lado com a filosofia, estabelecendo, assim, uma condição de dependência uma com a outra. A contribuição da filosofia para com a arte deve ser no que lhe concerne a tarefa da crítica e para o momento de reflexão, pois a arte precisa do momento reflexivo da filosofia, entendendo que a filosofia é quem pode lhe proporcionar tal experiência reflexiva. IX SEMANA ACADÊMICA DE 16 A 19 DE NOVEMBRO DE 2010 ANAIS - PROBLEMAS FILOSÓFICOS DA CONTEMPORANEIDADE UNICENTRO 2010 - ISSN 2178-9991 4 Referência ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2003. ADORNO, T. W. Teoria estética. Tradução: Artur Morão. Lisboa, Portugal: Edições 70, 2006. ADORNO, T, W. Experiência e criação artística. Tradução: Artur Morão. Lisboa, Portugal: Edições 70, 2003. ADORNO, T. W. A arte é alegre? In: RAMOS-DE-OLIVEIRA; ZUIN, A. A. S.; PUCCI, B. (Orgs.). Teoria crítica, estética e educação. Campinas: Unimep, 2001a. p. 11-18. ADORNO, T. W. Prismas: crítica cultural e sociedade. Tradução: Augustin Wernet e Jorge Mattos Brito de Almeida. São Paulo: Ática, 2001b. IX SEMANA ACADÊMICA DE ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M. A indústria cultural: o esclarecimento como mistificação das massas. In: ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Tradução: Guido Antônio de Almeida. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985. 16 A 19 DE NOVEMBRO DE 2010 BECKETT, S. Companhia. Tradução: Elsa Martins. Rio de Janeiro: Francisco Alves,1982. HAUSER A. História social da arte e da Literatura. Tradução: Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 2003. JIMENEZ, M. Para ler Adorno. Tradução: Roberto Ventura. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves S.A.,1977. MERQUIOR, J. G. Arte e sociedade em Marcuse, Adorno e Benjamin. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969. SANTARRITA, M. Beckett e a sobrevivência. In: Companhia. Tradução: Elsa Martins. Rio de Janeiro: Francisco Alves,1982. ANAIS - PROBLEMAS FILOSÓFICOS DA CONTEMPORANEIDADE UNICENTRO 2010 - ISSN 2178-9991 5 SELIGMANN-SILVA, M. Adorno. São Paulo: Publifolha, 2003. TIBURI, M. 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