Em Busca da Paz Social Valdete Souto Severo Juíza do Trabalho A solução pacífica dos conflitos sociais é um ideal há tempo perseguido. Os Juízes do Trabalho têm especial vocação para promovê-la. A tanto, se empenham de modo incansável nas audiências que realizam. É preciso, porém, que o excesso de conflitos a serem solucionados não os impeça de evitar que a renúncia tome lugar da verdadeira conciliação. Tornou-se senso comum a realização de acordo com “quitação geral do contrato”. As pessoas que buscam o Poder Judiciário Trabalhista em regra nem sabem o que isso significa. Pois bem, significa a chancela de renúncia a direito futuro e incerto. Significa que, fazendo o acordo e recebendo o valor, o trabalhador se compromete a nada mais pleitear contra o empregador ou tomador do serviço. Mesmo que não saiba se há alguma outra lesão a ser reparada. Mesmo que existam outros direitos violados. Essa prática, além de não encontrar amparo na legislação vigente, tem provocado uma situação interessante. Uma Emenda Constitucional trouxe para a Justiça do trabalho a competência para processar e julgar as ações de indenização por acidente de trabalho. Vários processos que já tramitavam no cível foram encaminhados para a Justiça do Trabalho. Em muitos casos, trata-se de trabalhadores que tiveram ações trabalhistas contra a empresa, fizeram acordo e outorgaram “quitação do contrato”. E esse é apenas um exemplo. Outros poderiam ser mencionados. Surge, pois, a questão. Será razoável impedir que o Estado-Juiz examine o conflito de interesses relativo ao dano decorrente de acidente de trabalho, sob o argumento de que houve quitação de direito futuro e incerto em anterior ação trabalhista, quando em lugar algum do nosso ordenamento jurídico há respaldo legal para essa prática? Haverá verdadeira pacificação do conflito social, se retirarmos do trabalhador a possibilidade de deduzir suas pretensões em juízo, ao argumento de que um acordo anterior, em que a questão sequer foi discutida ou cogitada, fulminou seu acesso ao Poder Judiciário? Se quisermos realmente paz social, teremos de assumir uma postura consciente e comprometida sobre a conciliação e a amplitude da quitação. Essa tarefa é de todos nós, operadores jurídicos, trabalhadores e empreendedores, porque implica, em última análise, o resgate da função ética do Poder Judiciário em uma sociedade organizada. (Jornal O Sul, caderno Colunistas, 08/10/2006)