50 anos dedicados à América Latina

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INSTITUTO FERNAND BRAUDEL DE ECONOMIA MUNDIAL
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Caderno: Vida / Perfil
Página: A27
domingo, 25 de julho de 2010
50 anos dedicados à América Latina
Colaborador do ‘Estado’ ganhou, na semana passada, o Maria Moors
Cabot, um dos principais prêmios do jornalismo
José Maria Mayrink - O Estado de S.Paulo
São 76 anos de idade e 50 de jornalismo profissional - ou 61, se for contar a estreia no jornalzinho
do colégio e as andanças por cidadezinhas do interior da Nova Inglaterra, escrevendo como freelancer sobre o que lhe cheirava a notícia. Foi cronista de esportes e crítico de música clássica, antes
de se tornar correspondente estrangeiro, em 1961, abraçando então uma carreira que lhe deu, na
semana passada, o Prêmio Maria Moors Cabot, da Universidade de Columbia, por 50 anos de serviço
à América Latina e ao Caribe.
Norman Gall, que se especializou em economia e política internacional com reportagens e ensaios
publicados nos mais importantes jornais do mundo - entre os quais o Estado, do qual é colaborador
-, comemora o prêmio como uma deferência dos amigos que indicaram seu nome e reconhecimento
de sua dedicação à pesquisa. “Tive muita sorte, pois sempre soube o que queria fazer”, disse Gall
na tarde de quarta-feira, mergulhado entre as centenas de livros, quadros, estatuetas e fotografias
que enchem seu apartamento.
Como sabia que queria ser jornalista, dedicou-se para valer à profissão, após vender discos numa
loja de Nova York, sua cidade natal, e de trabalhar na campanha presidencial de John Kennedy, em
1960. “Eu cuidava do registro de eleitores porto-riquenhos”, lembra. No ano seguinte foi contratado
como repórter por um jornal de Porto Rico. “Comecei uma noite antes do assassinato do ditador
Rafael Trujillo e, por isso, fui enviado para cobrir a crise política na República Dominicana. Cobri
em seguida a campanha presidencial de Juan Bosh, o que me levou à fronteira do Haiti. Aí comecei
minhas romarias na América Latina, como freelancer do Washington Post.”
Em 1964, Gall foi a Cuba para as comemorações do 26 de Julho, tomada do quartel de Moncada,
na cidade de Santiago. Conheceu Fidel Castro e todo o comando da Revolução de Sierra Maestra.
“Os líderes cubanos desafiaram os jornalistas americanos para uma partida de beisebol e perdemos
feio. Joguei contra Fidel, seu irmão Raúl e Ramiro Valdez, chefe do serviço de inteligência, que atualmente se encontra na Venezuela para sustentar Hugo Chávez no poder.”
Foi sua única viagem a Cuba. “Não me deram mais visto porque perguntei a Fidel se havia provas
contra os funcionários do governo fuzilados sob acusação de cooperação com a CIA (agência de
inteligência dos EUA).”
Antes de vir para o Brasil, em 1977, o jornalista percorreu vários países sul-americanos para cobrir
golpes militares e guerrilhas. “Descobri minha vocação de trabalhar nos sertões da América Latina”,
lembra Gall, citando Peru e Bolívia. Excelente fotógrafo, ele montou um precioso acervo de imagens de personagens e cenas dos países por onde andou. “Tive o privilégio de ser contratado por
um grupo de universidades para fazer pesquisas no continente. Não me pagavam muito, mas con-
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seguia viajar e trabalhar onde queria, com o compromisso apenas de produzir.” Em 1967, escreveu
um longo ensaio, O Legado de Che Guevara, quando o líder revolucionário foi morto. Nessa época,
morou seis anos na Venezuela.
EVELSON DE FREITAS/AE
Cidadão do mundo. Nova-iorquino, Gall adquiriu cidadania brasileira e vive no País há 33 anos.
No Brasil. A convite da Fundação Carnegie, o jornalista escreveu sobre a emergência do Brasil na
economia do hemisfério. Fez reportagens sobre o Acordo Nuclear Brasil-Alemanha e sobre a ocupação de Rondônia, na Amazônia. A vinda para São Paulo, onde foi editor correspondente da revista
Forbes, não lhe impediu de continuar escrevendo sobre o desenvolvimento da economia na Europa,
Japão, EUA, México, Chile, Peru, Venezuela e Argentina.
Seus artigos foram reproduzidos por jornais como The New York Times, Wall Street Journal e Washington Post nos EUA, Times Literary Supplement em Londres, Le Monde em Paris e Die Zeit em
Hamburgo, na Alemanha.
Norman Gall continua fazendo aquilo que gosta, publicando agora seus artigos e ensaios no Braudel
Papers, jornal bimestral de pesquisa do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, do qual é
o diretor executivo e foi um dos fundadores.
“O Instituto Fernand Braudel sobrevive graças a pequenos milagres”, comenta o pesquisador, grato
à generosidade de parceiros que lutam a seu lado para levar a obra adiante. “As pesquisas que faço
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não são financiadas ou são marginalmente financiadas”, observa ele, sem esconder uma ponta de
mágoa. “No Brasil, é fácil fazer seminários, mas é muito difícil financiar pesquisas.” Artigos e ensaios de Gall têm sido reunidos em livros, como Lula e Mefistófeles (A Girafa Editora) e O Terremoto
Financeiro (Elsevier Editora).
Dificuldades à parte, o trabalho no Fernand Braudel dá satisfação e alegria. “Temos no instituto
o projeto Círculos de Leitura, que é o encanto de minha vida atualmente”, entusiasma-se, ao descrever o encontro com jovens da periferia de São Paulo que se reúnem para ler e comentar clássicos da literatura.
Apaixonado pelo País, onde vive há 33 anos, Gall se naturalizou brasileiro, sem renunciar à cidadania norte-americana, já que os EUA passaram a admitir a dupla cidadania. “O Brasil tem sido generoso para comigo.” Ele avalia que o País está muito melhor do que quando veio para São Paulo.
“Apesar de haver muita negligência, o Brasil está se realizando; o desafio é vencer a negligência.”
Instituto faz defesa da educação
O Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial tem esse nome em homenagem ao historiador
francês que, em sua passagem pelo Brasil na década de 30, participou da criação da Universidade
de São Paulo (USP), sob a coordenação do jornalista Julio de Mesquita Filho. Em sua obra, Braudel
destacou o mercado como força de desenvolvimento humano - ideia que coincide com a proposta
do instituto.
Fundado em 1987 e hoje presidido pelo jornalista Antônio Carlos Pereira, editor de Opinião do
Estado, o instituto tem se preocupado com a qualidade do ensino público. Em 2007 e 2009, seus
pesquisadores viajaram a Nova York, Chicago, Washington e Baltimore para estudar as reformas de
ensino em escolas em situação crítica. A primeira viagem resultou em uma série de artigos, publicada pelo Estado, com o objetivo de estimular a discussão de como enfrentar as dificuldades na área.
Em 2008, o instituto, em parceria com o Itaú Social e a Secretaria Estadual da Educação de São
Paulo, começou a desenvolver um projeto em dez escolas públicas da capital com os piores desempenhos no Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (Idesp). Com medidas
simples e de baixo custo - ofereceu tutoria a professores de matemática e português e criou o cargo
de “coordenador de pais”-, o projeto está conseguindo melhorar o ensino. Ele deve ser sistematizado, com o objetivo de ser replicado em outras escolas.
Com a Faculdade de Economia da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), cujo diretor é o embaixador Rubens Ricupero, o Instituto Fernand Braudel promove pesquisas e debates públicos sobre
crises financeiras, comércio, energia e a expansão da democracia na América Latina. Em 20 anos,
foram mais de 160 seminários.
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