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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
AS RECENTES TRANSFORMAÇÕES SÓCIO ESPACIAIS DO
NOROESTE MATO-GROSSENSE
ANA LETICIA DE OLIVEIRA1
RESUMO
O Mato Grosso vivenciou diferentes momentos sociais e econômicos ao longo dos
últimos séculos, porém sua efetiva ocupação passou ocorrer após a intervenção
governamental realizada a partir de década de 1960. Apesar disso, esse território já
vivenciou muitas transformações, contradições e conflitos, e esses podem ser ainda
mais observados no Noroeste do estado, que já presenciou conflitos de terras e
culturais entre povos indígenas e colonizadores, a substituição das atividades
extrativistas de diamante, ouro e madeira, pela pecuária e mais recentemente a
inserção da soja. Assim, compreende-se necessária uma reconstrução histórica e
atual dos processos que ocorreram e ainda se desenvolvem sobre o objeto de
estudo, levando ao entendimento da validade de uma metodologia com base em
uma dialética histórica, sendo considerada uma das mais condizentes e completas a
ser aplicada nas ciências sociais.
Palavras-chave: Expansão agrícola; espaço rural; dinâmica espacial; Mato Grosso.
ABSTRACT
Mato Grosso experienced different social and economic moments over the last
centuries, but its effective occupation occurred indeed after government intervention
carried out from the 1960s Nevertheless, this territory has experienced many
changes, contradictions and conflicts, and these can be further observed in the
northwest of the state, which has seen land and cultural conflicts between indigenous
peoples and settlers, the replacement of extractive activities of diamond, gold and
timber, for cattle and more recently the inclusion of soy. Thus, it is needed a historical
and current reconstruction of the processes that have occurred and still happen to
the object of study, leading to the understanding of the validity of a methodology
based on a historical dialectic, being considered one of the most consistent and
complete to be applied in social sciences.
Keywords: Agricultural expansion; rural space; spatial dynamics; Mato Grosso.
1
Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista,
Campus Rio Claro e professora do Instituto Federal de Mato Grosso, Campus Cáceres. E-mail de
contato: [email protected]
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DE 9 A 12 DE OUTUBRO
1 - Introdução
Ao observar a história e evolução territorial brasileira se observa que essas
sempre estiveram ligadas ao desenvolvimento e expansão das atividades
econômicas, principalmente à agropecuária. Isto explica a opção do Brasil, em
muitos momentos de sua história, por políticas socialmente injustas como a
utilização de mão-de-obra escrava, a apropriação indevida de áreas produtivas e a
concentração da terra em prol do favorecimento ao crescimento de uma economia
com base na valorização das atividades ligadas ao agropastoril destinadas ao
mercado externo (SILVA, 1998).
As
espacialidades
socioeconômicas
no
Brasil
sofrem
modificações
decorrentes da estruturação sistêmica político-econômica, calcada no modo de
produção determinado pela comercialização e competitividade dos e nos mercados
(ABRAMOVAY, 1998), descrita como a fase da economia neoliberal do processo de
globalização do capitalismo mundial.
Em busca da incorporação de novas áreas econômicas a ocupação do
território brasileiro se deu em distintos modelos, conforme o momento histórico em
que estava inserido. Um dos mais significativos, principalmente quando se discute a
ocupação do Estado de Mato Grosso, se deu ao longo das décadas de 1960 a 1980,
quando o Governo Militar incentiva a incorporação de distantes áreas brasileiras ao
Território já consolidado e ativo. Para isso contou com os Governos Estaduais e
empresas estatais e privadas com o intuito de elaborar e efetivar suas ações de
ocupação.
No entanto, essa ocupação não se dá isolada, uma vez que é acompanhada
de perto pela expansão das atividades econômicas, em especial aquelas ligadas aos
setores agropecuários e extrativistas. Com isso, os novos núcleos populacionais
criados foram acompanhados por incentivos à abertura de áreas agricultáveis junto
às florestas nativas e sua efetiva exploração, principalmente com atividade de
extrativismo de madeira e minérios (diamante e ouro), pecuária extensiva e
atualmente a soja.
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A importância do entendimento das dinâmicas que ocorrem nesse espaço
torna-se ainda mais evidente quando destaca-se que o Mato Grosso é um dos
estados que mais crescem no Brasil hoje e que mais contribuem para sua economia
principalmente através da produção agropecuária. Com isso, as espacialidades
socioeconômicas no Brasil sofrem modificações decorrentes da estruturação
sistêmica político-econômica, calcada no modo de produção determinado pela
comercialização e competitividade dos e nos mercados (ABRAMOVAY, 1998),
descrita como a fase da economia neoliberal do processo de globalização do
capitalismo mundial.
Leituras prévias e reconhecimento da realidade do estado do Mato Grosso e,
em especial, da região Noroeste desse, fizeram surgir algumas indagações que
motivam ainda mais a pesquisa sobre o tema. Em busca de respostas aos
questionamentos e problemáticas previamente levantados, traçam-se aqui os
objetivos que nortearão o estudo. Com isso o objetivo central dessa investigação
busca compreender como se desenvolveu a construção e (re)construção territorial e
dinâmica espacial do Mato Grosso nas últimas décadas sob o entendimento da
expansão agrícola.
Assim, compreende-se necessária uma reconstrução histórica e atual dos
processos que ocorreram e ainda se desenvolvem sobre o objeto de estudo, levando
ao entendimento da validade de uma metodologia com base em uma dialética
histórica, sendo considerada uma das mais condizentes e completas a ser aplicada
nas ciências sociais.
Partindo-se ainda do princípio defendido por Marconi; Lakatos (2011, p.83)
que a dialética compreende o mundo “como um conjunto de processos” inacabados
e em vias de constante transformação sendo o fim de um processo sempre o início
de outro, percebe-se sua aplicabilidade nesse estudo.
Isso porque, busca-se
identificar as transformações territoriais e espaciais ocorridas nas últimas décadas
sobre o Noroeste do Mato Grosso.
Para tal, utiliza-se a realização de um estudo, através de um levantamento
bibliográfico abrangendo a expansão da ocupação sob o território brasileiro a partir
da sua interligação com a expansão agrícola. Ainda, deve-se se destacar que esse é
apenas o início de um amplo estudo a ser realizado sobre a expansão agrícola no
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Mato Grosso, por isso apresenta-se aqui também, uma pequena síntese de sua
ocupação e evolução histórica nos últimos anos.
2 - Atividades econômicas e a influência sobre a organização
espacial
Buscando sanar suas principais necessidades, o homem busca meios que
facilitem, ou intensifiquem, sua apropriação da natureza, tornando-se cada vez mais
técnico e por consequência mais produtivo.
Todo esse processo pode ser
visualizado na obra de Ortega y Gasset (1991) que discorre sobre a evolução
técnica e produtiva do homem, desde suas formas mais primárias com a obtenção
da “técnica ao acaso” até a “técnica do técnico”, mais recente e cientificada.
Assim, o homem se torna técnico quando adquire a consciência clara de que
é capaz de invenções que superaram sua existência natural, meramente animal. E
essa capacidade é o iniciar de um complexo de atividades ilimitadas, que por vezes,
foram tidas como impossíveis. Isso acabou gerando também a perda do senso de
ilimitação e, consequentemente, contribuiu para que o homem perdesse a real
noção de quem é e de suas limitações, ampliando seu poder de dominação dos
recursos, criação e destruição de estruturas.
Isso pode ser observado desde a chegada dos europeus, quando a função
destinada as terras que hoje compõem o território nacional era a produção para o
atendimento das demandas do mercado metropolitano e demais países europeus e,
consequentemente, gerar lucros para os exploradores e para a Coroa Portuguesa.
Assim, Oliveira (2011) destaca que o Brasil passou por distintas fases econômicas,
cada uma incorporando uma distinta atividade produtiva, como o pau-brasil, a canade-açúcar, a mineração, a pecuária, o café e mais recentemente a agricultura
modernizada. No entanto, todas têm em comum que auxiliaram na expansão e
ocupação do território nacional de acordo com suas particularidades.
Conforme pode-se entender, em relação aos principais ciclos da economia
brasileira, sua estrutura produtiva evoluiu, adaptando-se às exigências de mercado
de cada época, isto, obviamente, dentro dos limites técnicos de cada período. No
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entanto, permaneceu sempre trabalhando para suprir as demandas do mercado,
geralmente do externo, ou seja, permaneceu como integrante das exigências do
sistema econômico vigente.
Silva (1998, p.3) discorre evite o coloca utilize outro verbo que a evolução
agrícola brasileira ocorreu por meio de dois processos, sendo o primeiro “de
destruição da economia natural, pela retirada progressiva dos vários componentes
que asseguravam a „harmonia‟ da produção assentada na relação Homem-Natureza
(e suas contradições)”. Já o segundo diz respeito a uma reorganização “baseada no
conhecimento e no controle, cada vez maior, da Natureza e na possibilidade de
reprodução artificial das condições naturais da produção agrícola. A esta passagem,
denomina-se industrialização da agricultura.”
Ainda sobre as transformações da produção capitalista no campo, o mesmo
autor compreende que a produção agrícola se torna mais intensa sob a influência ou
o controle do capital, ou seja, uma maior produtividade do trabalho. Desta forma,
entende que, “com o desenvolvimento da produção capitalista na agricultura (ou
seja, as transformações que o capital provoca nas atividades agropecuárias)”, há a
tendência de ocorrer “um maior uso de adubos, de inseticidas, de máquinas, de
maior utilização de trabalho assalariado, o cultivo mais intensivo da terra, e outros”.
A partir de meados do Século XX, as políticas públicas desenvolvidas pelo
Governo Brasileiro, passaram a estimular o setor industrial de duas maneiras: a
primeira, referente a instalação de indústrias voltadas à base do setor agroindustrial,
ou seja, de maquinários e insumos básicos, os quais e por sua vez, necessitam de
indústrias de base como siderurgia e petroquímica, respectivamente. Os
investimentos nestes setores se deram tanto por iniciativa oficial junto às empresas
nacionais ou na forma de incentivos às empresas particulares nacionais e
internacionais.
Para Silva (1998, p.51) com a modernização da agricultura, também ocorreu
a expansão da indústria voltada a transformação da matéria-prima do setor agrícola,
passando este a ser considerado diretamente ligado ao setor industrial. Isto porque,
enquanto atua como fornecedor de matéria-prima a ser processada pela indústria,
também recebe desta os produtos necessários a sua produção como maquinários,
equipamentos, insumos e sementes selecionadas. Argumentando ainda Silva (1998,
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p.68) coloca que “aí então a produção agropecuária deixará de ser uma esperança
ao sabor das forças da Natureza para ser uma certeza sob o comando do Capital”. E
o autor continua “se faltar chuva, irriga-se; se não houver solos suficientemente
férteis, aduba-se; se ocorrerem pragas e doenças, responde-se com defensivos e
técnicas biológicas; e, se houver ameaças de inundação, estarão previstas formas
de drenagem”.
Apesar da constante evolução e adaptação da agricultura brasileira, a
principal transformação verificada na sua dinâmica, desde o século passado até
hoje, é a passagem do complexo rural para os complexos agroindustriais (CAIs)
(KAGEYAMA e SILVA, 1987, apud, SILVA, 1999, p. 89). Isto porque a intensificação
da atuação do capital e da tecnologia na agricultura não alterou apenas as relações
de produção entre a agricultura e a indústria, mas também as relações entre o
campo e a cidade e todas as implicações que estas trazem consigo.
As atividades se adaptam às exigências dos novos padrões (ABRAMOVAY,
1998) e a produção se desenvolve através da intensidade do mercado e dos fluxos
gerados pelas escalas de produção e de comercialização em diferentes
circunstâncias. A existência de distintos processos de produção e de circulação
determina a horizontalidade e a verticalidade. O espaço transforma-se segundo as
atividades produtivas que revelam suas formas assumidas, de acordo com as ações
dos agentes sociais, econômicos e políticos existentes na organização espacial.
A espacialidade rural brasileira sofre as mesmas pressões e interferências a
exemplo das demais estruturas produtivas que ocorreram em outras partes do
mundo. A necessidade de se tornar mais produtivo como fornecedor de matériasprimas e se inserir como consumidor no mercado de insumos, equipamentos e
maquinários destinados à agropecuária fez com que o meio rural brasileiro em seu
processo evolutivo fosse acumulando e assumindo distintos processos de produção.
O entendimento das relações resultantes do trabalho humano na natureza
requer o uso de conceitos científicos, sua aplicação no auxílio da solução dos
problemas e no estabelecimento das relações e conexões entre teoria e prática.
Soja (1993) discutindo a dimensão espacial, além de reiterar o papel do espaço e da
espacialidade como fundamentais para a reconstituição e o devir da sociedade,
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considerou que o espaço deve ser visto como o receptáculo de múltiplas
contradições espaciais, como as condições socioeconômicas.
Nesse sentido, Santos (1997; 2008) entende não ser possível conceber uma
determinada formação socioeconômica sem se recorrer ao conceito de espaço,
embora reconhecendo que modo de produção, formação socioeconômica e espaço
sejam categorias interdependentes. Ao avançar nessa linha de pensamento, o autor
entende que os modos de produção de um dado território criam formas espaciais
que constituem uma linguagem dos modos de produção.
Por outro lado, chama a atenção para as formas constituintes da paisagem
revelando o modo de produção existente, permitindo que, através das formas se
alcance as funções criadoras, os processos geradores e as estruturas de
sustentação, como a dinâmica da produção e da reprodução de uma dada formação
socioeconômica.
Santos (1997, p.1) compreende ainda o espaço “como instância, ele contém e
é contido pelas demais instâncias, assim como cada uma delas o contém e é por ele
contida. A economia está no espaço, assim como o espaço está na economia”. O
autor ainda complementa colocando que “o espaço não pode ser apenas formado
pelas coisas, os objetos geográficos, naturais e artificiais”. Deste modo, orienta-se
ao entendimento de que o espaço contém uma combinação de elementos com a
sociedade.
A formação social e a organização espacial enquanto estruturas subordinadosubordinantes, são contidas entre si e envolvem, por exemplo, cultura do grupo
social, história da trajetória de vida dos grupos humanos, trabalho de produção e de
sobrevivência, relações e inter-relações econômicas, interferências e ações políticas
em espacialidades geográficas, poder no/do espaço geográfico e capital técnico e
social das espacialidades produtivas.
A velocidade do comportamento processual das novas relações de produção
que se operacionalizam atinge as relações de caráter social, político e cultural.
Igualmente, atinge as relações tecnológicas, ambientais e econômicas. Os novos
processos estabelecem ligações e conexões que consolidam e configuram
realidades sócio espaciais, especialmente no meio rural. Observam-se mudanças no
modo de produção e de reprodução dos sistemas agrários vigentes, nas dinâmicas
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até então inerentes a estes sistemas e baseadas em matrizes tradicionais
(OLIVEIRA, 2011).
Neste contexto, velhas e novas formas de produção se transformam em um
movimento processual que, embora contínuo, contém contradições e antagonismos.
Conforme avançam as relações capitalistas de produção nestas espacialidades
geográficas, agricultores (produtores) e atividades tendem a se reestruturar
mediante processos de inovação e de aprendizagem.
As atividades agrícolas nos tempos atuais são o resultado de constantes
mudanças, principalmente do avanço tecnológico, do crescimento populacional e da
necessidade de abastecimento alimentar dos grupos sociais localizados nas mais
distintas localidades em escala mundial. Incorporar a natureza como bem de uso e
de produção, de sobrevivência e de sustentação tem sido tarefa comum a qualquer
formação sócio espacial.
Hoje, as atividades rurais estão inseridas e acompanham o sistema capitalista
de mercados que não atua apenas como um agente econômico, mas também como
um agente organizacional e, em algum momento, político. Assim, a organização
econômica privilegia as grandes propriedades, pois elas são capazes de circular
significativa quantidade de capital na chamada agricultura empresarial. No entanto,
essa não anula necessariamente a agricultura familiar, que mesmo em situações
mais delicadas continuam a coexistir e competir espaço com a estrutura dominante
principalmente na produção de alimentos.
Por isso o interesse no estudo da espacialidade construída e reconstruída
com a expansão da agropecuária sobre o Mato Grosso, uma vez que as dinâmicas
espaciais são visíveis e cada vez mais intensas, principalmente no Noroeste do
estado. Isso pode ser verificado e explicitado com as atuais alterações da estrutura
produtiva e dos tipos de produção, tendo como exemplo a substituições das culturas
já tradicionais como extrativismo e pecuária pelo cultivo de soja, a reconfiguração
espacial e as transformações sociais que ali passam a ocorrer.
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3 - Resultados parciais: a dinâmica espacial do Noroeste de Mato
Grosso
A região Centro-Oeste, em especial a área que assenta hoje o território do
Estado de Mato Grosso, é um dos berços indígenas, com populações que se
destacaram em relação a outros estados e que chegaram a mais de 60 mil
indivíduos em 1872. Hoje representam menos de 30 mil pessoas, redução essa,
resultado de sucessivos massacres e extermínios (PIAIA, 2003).
Em partes isso é resultado de contínuas investidas territoriais e econômicas
que remontam séculos de história.
A colonização e ocupação do que hoje é o
estado de Mato Grosso, tidas como oficiais, foi um processo lento que teve início a
partir do século XVIII com entrada de bandeiras que descobriram seu grande
potencial aurífero na região de Cuiabá. Essas atividades passaram a incentivar o
povoamento e região (CAVALCANTE; COSTA, 1999).
Até os meados do século XX a população e as atividades econômicas
concentravam-se nas porções mais ao sul, hoje contempladas pelo Mato Grosso do
Sul. Enquanto às áreas ao norte, hoje pertencentes ao Mato Grosso, permaneciam
em parcial isolamento com uma população rarefeita. Esses dois estados só
separaram-se na década de 1970 com a Lei Complementar de 11/10/1977
(FERREIRA, 2001).
As tentativas de arranjo espacial e integração nacional das porções mais
afastadas do Brasil, somente passam a ter maior atenção do Governo Federal após
1930 quando Getúlio Vargas assume o poder. Pela proximidade da região Sudeste e
da infraestrutura já disponibilizada, a região que hoje pertence ao Mato Grosso Sul
passou a desenvolver uma economia e política mais dinâmicas, enquanto o norte,
semiabandonado
minguava
para
sua
manutenção,
consumindo
grandes
quantidades de recursos provenientes do seu coirmão ao sul.
Conforme Piaia (2003) somente a partir da década de 1950 programas de
efetiva colonização do Mato Grosso surgem através de órgãos como INTERMAT –
Instituto de Terras do Mato Grosso e DTC – Departamento de Terras e Colonização.
Ainda assim, as terras ao norte continuavam pouco povoadas e produtivas.
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A partir de 1960, com o Governo Militar, um novo direcionamento é dado
para a ocupação do território mato-grossense, com incentivos fiscais e de crédito
que privilegiavam a instalação de latifúndios dando os pilares para a estrutura
fundiária vigente até os dias atuais. Para isso foram fundamentais órgãos como o
Banco da Amazônia, a Superintendência para o Desenvolvimento do Centro-Oeste
(SUDECO) e a Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM).
Isso vai ao encontro da concepção de Brandão (2010) quando discute que o
estado tem papel fundamental para a expansão do território produtivo e que desde
meados dos anos 1970, a ação estatal, sobretudo na periferia nacional, vinha
reforçando seu papel estruturante do território nacional.
Com isso, projetos de colonização, em distintas partes do estado começam
a surgir através da parceria do Estado e da iniciativa privada, atraindo imigrantes de
distintas partes do país. Esses eram agricultores vindos do sul e sudeste, expulsos
pela modernização da agricultura; nordestinos fugindo de uma situação de
estagnação econômica; além de populações atraídas pelos programas de
crescimento e ocupação do Centro-Oeste desde a construção de Brasília (PIAIA,
2003).
Com essas populações tem-se início uma nova expansão da fronteira
agrícola, com atividades voltadas para a pecuária e agricultura na porção sul do
estado, e ao extrativismo de minerais e madeira e pecuária ao norte e noroeste.
Essa expansão colonizatória, associada à grande presença de povos indígenas, fez
com que essas últimas se tornassem palco de intensos conflitos de terras e
genocídios em massa.
Essa violência presente nas apropriações de terras e recursos são
explicadas por Brandão (2010, p.44) uma vez que “o modo de produção capitalista
sempre combinou violência extraeconômica, direta, com a violência econômica,
indireta, pela mercadificação de tudo, isto é, sua inexorável tendência de transformar
tudo em mercadoria, levando a mercantilização às últimas consequências”.
Continua, “os métodos utilizados são os mais diversos, não deixando nada a desejar
em sua violência daqueles descritos por Marx durante o processo de acumulação
primitiva originária”, exemplo disso são a expropriação de terras; uso dos recursos
até a exaustão; privatização de recursos antes partilhados (Ibid., p.48).
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Isso marca uma das primeiras contradições presentes nesse espaço. A
retirada da população nativa do local, para apropriação da terra e ocupação por
migrantes provindos de outras regiões do país. Sobre isso, pode-se dar destaque a
Soja (1993) ao considerar que o espaço deve ser visto como o receptáculo de
múltiplas contradições espaciais, como as condições socioeconômicas. Isso
exemplifica a ocorrência de divergências dentro do mesmo espaço, uma vez que
sempre haverá a ascensão de um dominante e a repressão de um dominado
(ISNARD, 1978).
Após a década de 1990, a pecuária passa a ganhar ainda mais força,
expandindo também uma estrutura de terras baseada no latifúndio e grandes
propriedades, e com elas, a disseminação de uma política elitista e uma economia
concentrada nas mãos de poucos.
Foi essa atividade econômica que atraiu o
desenvolvimento para diferentes regiões do Mato Grosso, incluindo aquela chamada
aqui por Região Noroeste.
Compreende-se aqui essa região como sendo constituída pelos municípios
de Juruena, Brasnorte, Juína, Juara, Castanheira, Aripuanã, Colniza e Rondolândia
(Ver Figura 01). Tal recorte foi pensado a partir de características comuns presentes
em cada um deles como a povoamento recente, basicamente ocupados nos últimos
30 e 40 anos através de projetos colonizatórios, com economias baseadas na
pecuária extensiva e extrativismo vegetal e mineral e atualmente passando por
processos de incorporação de agricultura de grãos.
Entende-se que nessa porção do território mato-grossense seja possível
observar a expansão recente do cultivo de grãos, principalmente a soja. Uma vez
que
cada
um
desses
municípios,
encontra-se
em
diferentes
níveis
de
desenvolvimento da produção agrícola intensiva. Exemplo disso são: Brasnorte e
Juara já inseridos também na agricultura intensiva, ao mesmo tempo sendo grandes
produtores pecuaristas; Juína, Castanheira e Juruena vivenciando atualmente a
entrada da agricultura intensiva em substituição da pecuária bovina de corte; e
Aripuanã, Colniza e Rondolândia, ainda com sua economia fundamentada na
pecuária extensiva e silvicultura.
Figura 01 – Mapa de localização da Região Noroeste de Mato Grosso.
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Fonte: Org. FONSECA, R. G. (2015)
Entende-se que a inserção dessa nova estrutura produtiva, ocasionará (e já
veem ocasionando) intensas transformações espaciais na região. Uma vez que para
sua implantação necessita de toda uma infraestrutura de armazenamento e
transporte, redes viária, informacional e financeiras eficientes, fornecedores de
insumos e componentes agrícolas, além de uma efetiva rede de contato com
mercados consumidores. Resultantes desse processo, são as transformações
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imperadas sobre o espaço geográfico, que agem como ajustes espaço-temporais
necessários à reprodução do sistema capitalista vigente (HARVEY,2004).
Com isso, pode-se colocar em discussão que essa região, como já ocorrido
com tantas outras no Estado de Mato Grosso, está vulnerável à interferência de
forças externas que afetarão não apenas suas atividades econômicas. Junto dessas,
a dinâmica espacial e estrutura social como um todo serão afetadas pela entrada de
novas estruturas físicas, financeiras e informacionais que ali ingressarão.
4 - Considerações parciais
Na atualidade núcleos formados nas últimas décadas do Século XX
encontram-se em plena transformação, tendo seu espaço ainda mais dinamizado
sobre a influência do grande capital agrícola. Exemplo disso é a região Noroeste do
Mato Grosso, que atualmente vê a forte inserção da soja em substituição às
atividades tradicionalmente desenvolvidas.
Essa acaba sendo mais uma reconfiguração espacial e territorial em uma
região que já viu as bruscas transformações sob uma área naturalmente constituída
de uma transição entre o Cerrado e a Floresta Amazônica, em um domínio da
agricultura e pecuária. Igualmente vivenciou uma colonização forçada pelo Estado,
sobre áreas de domínio indígena, atualmente nas mãos do capital privado.
Fazendo uso das palavras de Isnard (1978, p.7) considera-se que “toda
sociedade participa da criação de seu espaço. Nele emprega todos os meios de
ação que seu estágio de civilização permite: a força de trabalho, a engenhosidade
de suas técnicas, o apoio de suas crenças, de suas esperanças, de ambições”.
Assim, toda evolução da sociedade e dos meios de produção, levarão a uma
evolução da organização do espaço.
Isso explica, porque cada vez mais há dinamismos nas construção e
(re)construções espaciais. Uma vez, que conforme se transformam as necessidades
do mercado consumidor, ampliam as ações produtivas e consequentemente
intensificam-se as transformações sobre o meio e sobre as relações sociais.
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As modificações produtivas que têm ocorrido na Região Noroeste de Mato
Grosso, são resultados das novas necessidades de investimentos e reinvenção da
economia. A incorporação de novas terras para a produção do agronegócio através
do cultivo intensivo de grãos, é uma forma de valorização e reprodução do capital
financeiro.
Com base nisso, considera-se de fundamental importância a compreensão
das transformações territoriais e espaciais que vêm ocorrendo no Estado de Mato
Grosso e em especial sua região Noroeste. Esta que vive na atualidade uma
reorganização decorrente da recente inserção da soja em sua área de abrangência,
e em substituição das tradicionais atividades de pecuária e extrativismo. Por isso,
reconhece-se que muito à de ser investigado e compreendido a cerca dessas
transformações, e que o presente é apenas um estudo introdutório.
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social crítica. Tradução (2 ed., inglesa) Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993.
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