2) A crise do paradigma dominante

Propaganda
1ª AULA
FICHAMENTO DO LIVRO: " UM DISCURSO DAS CIÊNCIAS"
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS
1) O paradigma dominante
 Nascimento: séculos XVI, sob domínio das ciências naturais.
 Característica principal: modelo de racionalidade da ciência
moderna.
 Expansão: Sec. XIX, esse modelo se estende ás ciências
sociais emergentes.
 Consequência: transforma-se em modelo global – defesa
contra o senso comum e as humanidades (c. humanas).
 Modelo:
- totalitário por negar racionalidade “a todas as formas de
conhecimento que não se pautem pelos seus princípios
epistemológicos e pelas suas regras metodológicas” (p. 21).
 Duas
distinções
básicas:
1. entre conhecimento científico e do senso comum (senso
comum é experiência imediata, um conhecimento vulgar,
ilusório;
2. entre natureza e pessoa humana (natureza: passiva,
eterna, reversível; elementos se relacionam sob forma de leis
- Bacon: pessoa humana é “o senhor e o possuidor da
natureza”.
 Características: 1. lugar central da matemática: “conhecer
significa quantificar” / “as qualidades intrínsecas do objeto
são (...) desqualificadas (...). O que não é quantificável é
cientificamente
irrelevante.”
(p.
27);
2. redução da complexidade do mundo: “o mundo é
complicado e a mente humana não o pode compreender
completamente. (...) as leis da natureza são o reino da
simplicidade e da regularidade onde é possível observar e
medir com rigor.” (p. 28). Aspira à formulação de leis (idéias
de regularidade, ordem e estabilidade do mundo – concepção
a-histórica). Mundo-máquina, idéia de progresso –
mecanicismo.
 Evolução
do
paradigma
dominante:
A) Desde o século XVII: tentava-se descobrir leis da
sociedade (modelo das ciências naturais) - Vico e
Montesquieu
–
precursores.
B) Iluminismo vai criar condições para o surgimento das
ciências
sociais.
C)
Final
do
s.
XIX
2
vertentes:
1. aplicar os princípios epistemológicos e metodológicos das
ciências naturais às ciências sociais (física social positivismo) - sociologia: concepção dos fatos sociais como
coisas (Durkheim) – sujeito ≠ objeto – métodos quantitativos história quantitativa. Ideia de atraso das ciências sociais em
relação
às
naturais.
2. reivindicar um estatuto epistemológico e metodológico
próprio para as ciências sociais com base na especificidade
do ser humano, mas nas bases dos pressupostos modernos:
separação sujeito / objeto; natureza / cultura; afastamento do
senso
comum.
obstáculos intransponíveis: fenômenos sociais únicos,
historicamente condicionados e culturalmente determinados;
as ciências sociais não podem produzir leis nem previsões,
pois os seres humanos modificam o seu comportamento;
subjetividade inerente aos fenômenos sociais: o cientista
social não pode libertar-se, no ato de observação, dos
valores que informam a sua prática em geral e, portanto,
também
a
sua
prática
de
cientista.
Entretanto: essa perspectiva ainda “partilha com a distinção
natureza / ser humano e tal como ele tem da natureza uma
visão mecanicista à qual contrapõe, com evidência esperada,
a especificidade do ser humano”1. Outras distinções
partilhadas: natureza / cultura; ser humano / animal.
 Conclusão: Esse afastamento do modelo clássico, mesmo
não rompendo totalmente, apresenta um sintoma de crise: “...
se por um lado, se recusam [nas duas vertentes] os
condicionantes biológicos do comportamento humano, pelo
outro, usam-se argumentos biológicos para fixar a
especificidade do ser humano. Pode-se, pois, concluir-se que
ambas as concepções de ciência social [...] pertencem ao
paradigma da ciência moderna...” (p.. 40).
2) A crise do paradigma dominante
 A crise do paradigma da ciência moderna se explica por
condições teóricas e por condições sociais.
 A primeira condição teórica para a crise do paradigma é o fato
de o grande conhecimento que ele proporcionou permitiu ver
a fragilidade em que se sustenta. O primeiro rombo foi
Einstein com a reatividade da simultaneidade.
 A segunda condição teórica para a crise do paradigma é a
mecânica quântica, com a ideia de que “não conhecemos do
real senão a nossa intervenção nele” (pág. 44). Isto foi devido
ao princípio da incerteza de Heisenberg.
 A terceira condição teórica para a crise do paradigma
questiona o rigor da matemática, em que segundo as
investigações de Gödel ela carece de fundamento.
 A quarta condição para a crise do paradigma é relativa ao
avanços da microfísica, da química e da biologia.
 Todas essas inovações teóricas proporcionaram uma reflexão
do conhecimento científico, graças à situação intelectual atual,
que apresenta duas facetas sociológicas. A primeira é a
reflexão dos cientistas-filósofos que visão problematizar a sua
prática científica. A segunda é a reflexão que antes era
deixada para o sociólogo e agora ocupa papel de relevo na
reflexão epistemológica.
 Em relação a esta segunda reflexão, ela possui alguns temas
principais, são eles: o questionamento do conceito de lei e de
causalidade, o fato de o conhecimento científico moderno ser
desencantado e transformar a natureza num autómato.
 Em relação às condições sociais para a crise do paradigma o
autor não trabalha tanto. Diz que “quaisquer que sejam os
limites estruturais de rigor científico, não restam dúvidas que o
que a ciência ganhou em rigor nos últimos quarenta ou
cinquenta anos perdeu em capacidade de auto-regulação”
(pág. 56). Ou seja, com a industrialização quem passou a
regular as prioridades científicas foram os centros de poder
econômico, social e político.
 Essa industrialização da ciência se manifestou nas aplicações
desta e na sua organização de investigação. Quanto às
aplicações pode-se dizer que cada vez mais os interesses
militares e econômicos estão convergindo, ocorrendo
acidentes sistemáticos. Quanto à organização do trabalho
científico a industrialização da ciência produziu dois efeitos
principais.
 O primeiro é relativo à estratificação da comunidade científica,
em que há mais autoridade entre relações de poder e
desigualdade, além de haver um processo de proletarização
dos cientistas.
 O segundo é relativo ao capital, em que cada vez mais há o
uso de instrumentos caros e raros, levando a um abismo
maior entre os países centrais e periféricos, uma vez que
estes não possuem recursos para dispor de tais
equipamentos.
 A crise do paradigma da ciência moderna esboçado traz
conjuntamente a ascensão do paradigma emergente.
3) O paradigma emergente
 A configuração do paradigma que está por vir só pode se dar
por especulações fundadas nos sinais que a crise do
paradigma atual emite.
 Por conta disso várias sínteses, com pontos convergentes e
divergentes, estão sendo apresentadas. Para o auto o
paradigma é de um conhecimento prudente para uma vida
decente. Ou seja, o paradigma a emergir da revolução
científica em nossa sociedade deve ser tanto científico
(conhecimento prudente) como social (vida decente).
1. Todo o conhecimento científico-natural é científico-social
 Não há mais a distinção dicotômica entre ciências naturais e
ciências sociais, em que havia uma concepção mecanicista da
matéria e da natureza em oposição ao ser humano, cultura e
sociedade.
 A queda dessa distinção levou a se reconhecer propriedades
e comportamentos, antes considerados específicos dos seres
humanos e de suas relações, também encontrados em outros
seres e meios que antes ficavam excluídos pela barreia
dicotômica. “É como se o homem e a mulher se tivessem
lançado na aventura de conhecer os objetos mais distantes e
diferentes de si próprios, para, uma vez aí chegados, se
descobrirem refletidos como num espelho” (pág. 62).
 O conhecimento do paradigma emergente é não dualista,
acabando assim, com o principal deles relativo às ciências
sociais / naturais. Em meio a essa distinção haviam ciências
que se enquadravam mal: a antropologia, a geografia e a
psicologia. Assim, observar o se passa com elas durante esta
transição é muito importante.
 É preciso conhecer o sentido e o conteúdo dessa superação.
Como vivemos em um estado de conflitos constantes
aspectos
do
paradigma
emergente
são
sentidos
desigualmente, tornando o futuro incerto. Cada vez mais o
conteúdo das ciências naturais e sociais se mistura,
permitindo inclusive que uma se aplique à outra.
 Considerar a superação da dicotomia sobre a proteção das
ciências sociais não é certo nem errado, apenas ilusório, uma
vez que o paradigma anterior as ciências sociais constituíramse sobre as naturais isso não quer dizer que este paradigma
emergente veio para inverter a situação. O que se pode
afirmar, no entanto, é que o novo paradigma erguerá uma
nova ordem científica.
 Esse avanço do conhecimento das ciências naturais no
paradigma ainda dominante mostra que os osbstáculos do
conhecimento na sociedade se dão em ordem científico-social
e científico-natural, “ou seja, o que antes era a causa do maior
atraso das ciências sociais é hoje o resultado do maior avanço
das ciências naturais” (pág. 70).
2. Todo conhecimento é local e total
 No paradigma dominante sofremos com a especialização, ou
seja, sabe-se muito mais sobre determinado assunto quanto
mais restrito ele é. Entretanto, essa excessiva especialização
transforma o cientista em um ignorante, causando efeitos
negativos na sociedade. Esses problemas são reconhecidos,
mas as soluções em geral costumam reproduzindo os
problemas de outra forma, pois se criam novas disciplinas
para a solução das antigas.
 Já no paradigma emergente o conhecimento é total e local.
Local porque se constitui ao redor de temas que às vezes são
adotados por grupos, ou seja, não é uma fragmentação de
disciplina e sim de temas, em que os conhecimentos
convergem em determinados momentos. Total porque
reconstitui os pensamentos locais transformando-os em
pensamento total.
 Desta forma a ciência do paradigma emergente incentiva os
pensamentos desenvolvidos localmente a emigrarem para
outros lugares, sendo utilizados também fora do seu contexto
de origem.
3. Todo o conhecimento é autoconhecimento
4. Todo o conhecimento científica visa constituir-se em
senso comum
Download