DIFICULDADE DE ALFABETIZAÇÃO NAS SÉRIES INICIAIS LITERACY DIFFICULTY IN SERIES START NILZA IVETE CABREIRA FANAIA RESUMO: Este artigo tem por objetivo abordar questões relacionadas as dificuldades de aprendizagem no processo escolar, de forma a contribuir e melhorar a qualidade de ensino, principalmente no processo de alfabetização. A alfabetização tem sido a preocupação de muitos estudiosos que buscam encontrar alternativas eficazes que contribuam com a melhoria do ensino/aprendizagem de todas as crianças, especialmente nas séries iniciais. Na abordagem desse assunto têmse considerado o que leva uma criança a ler e a escrever, destacando o início e o processo da alfabetização para que se compreenda as melhores estratégias a serem utilizadas com as crianças. Nesse sentido, este artigo aborda a construção dos conhecimentos relacionados à alfabetização, tendo como objetivo proporcionar ao educador algumas reflexões sobre esse processo, destacando o papel do professor e sua prática pedagógica em relação à alfabetização. Palavras-chave: Alfabetização,Conhecimento, Séries Iniciais. Abstract: This article aims to address issues related to learning difficulties in school process, in order to contribute and improve the quality of education, especially in literacy. Literacy has been the concern of many scholars who seek to find effective alternatives that contribute to the improvement of the teaching / learning of all children, especially in the early grades. In addressing this issue have been considered leading a child to read and write, highlighting the beginning and the literacy process in order to understand the best strategies to use with children. In this sense, this article discusses the construction of knowledge related to literacy, aiming to provide the educator some thoughts on this process, highlighting the role of the teacher and their practice in relation to literacy. Key- Words:Literacy, Knowledge, Initial Series. 1 - INTRODUÇÃO Muito se fala das diversidades metodológicas da alfabetização nas series iniciais. Acredita-se tratar-se de um assunto importante na área da educação, no atual contexto sócio histórico, uma vez que os futuros e atuais professores são co-responsáveis pela alfabetização de nossas crianças. Atualmente, na área da alfabetização, muitas são as dúvidas de como seria a melhor forma de proceder para instigar na criança o interesse à leitura e a escrita. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, a conquista da escrita alfabética não garante ao aluno a possibilidade de compreender e produzir textos. Aprendizagem exige um trabalho pedagógico. Quando são lidas histórias ou notícias de jornal para crianças que ainda não sabem ler e escrever, ensina-se a elas como é organizado o sistema de escrita. Segundo Emília Ferreiro: A alfabetização também é uma forma de se apropriar das funções sociais da escrita. De acordo com suas conclusões, desempenhos díspares apresentados por crianças de classes sociais diferentes na alfabetização não revelam capacidades desiguais, mas o acesso maior ou menor a textos lidos e escritos desde os primeiros anos de vida (FERREIRO, Emília. Cultura Escrita e Educação) De acordo com suas experiências com crianças, Ferreiro (1999, p.44-7), esquematiza algumas propostas fundamentais sobre o processo de alfabetização inicial: Restituir a língua escrita seu caráter de objeto social, desde o início (inclusive na préescola) se aceita que todos na escola podem produzir e interpretar escritas, cada qual em seu nível permite-se e estimula-se que a criança tenha interação com a língua escrita, nos mais variados contextos, permite-se o acesso o quanto antes possível à escrita do nome próprio, não se supervaloriza a criança, supondo que de imediato compreendera a relação entre a escrita. Tendo em conta a complicação da realidade brasileira, pode-se ressaltar que já aconteceram muitas coisas para viabilizar melhorias em todos os setores do processo ensino-aprendizagem, principalmente nas escolas públicas, que necessitam de maior atenção na alfabetização das séries iniciais. Muitas mudanças em relação à escolarização vêm ocorrendo e mais crianças em idade escolar estão nas salas de aula. Esse é o primeiro passo. Em seguida vem o desafio da qualidade da aprendizagem. As transformações têm se revelado muito lentas, pois convivemos principalmente com sistemas educativos municipais e estaduais que tornam ainda mais difícil a ocorrência de evoluções e transformações no processo educacional. MOLL (1997) em seu livro “Alfabetização Possível”, diz que a alfabetização é um processo mecânico, na qual “alfabetizar-se” está vinculado a habilidades de codificação (ou representação escrita de fonemas em grafemas) e decodificação (ou representação oral de grafemas em fonemas). As alfabetizações nos dias atuais persistem na repetição excessiva de exercícios visando à memorização de letras, silabas para formação de palavras, frases e textos, e a assimilação da criança, de que há uma ligação correspondente entre fala e a escrita. Alfabetização é muito mais que decodificação e codificação de códigos, a alfabetização é a relação entre aluno e seu conhecimento de mundo. O processo de alfabetização se inicia muito antes da criança entrar na escola, pois antes disso ela já possui contato com seu meio social, que lhe permite adquirir conhecimentos como a própria linguagem verbal, entre outros. Ao longo dos anos a alfabetização escolar tem sido alvo de inúmeras controvérsias teóricas e metodológicas, exigindo que a escola e, sobretudo, aqueles profissionais que lidam com o desafio de alfabetizar se posicionem em relação às mesmas, o que certamente terá consequências para as práticas pedagógicas que irão adotar. No Brasil, durante décadas predominou a discussão acerca da eficácia dos métodos de alfabetização, gerando-se confrontos entre os chamados métodos sintéticos e analíticos chegando-se a uma combinação de ambos nos chamados métodos analíticosintéticos como é o caso da palavração. Para prevenir as inevitáveis diferenças individuais na aprendizagem inicial da leitura e da escrita e evitar os eventuais fracassos que os métodos em si não eram capazes de contornar, elegeu-se um conjunto de prérequisitos para uma alfabetização bem sucedida, privilegiando-se principalmente uma maturidade dos aspectos perceptuais e motores aliada a um domínio da linguagem oral. Toda esta tradição estava vinculada a uma concepção de alfabetização segundo a qual, a aprendizagem inicial da leitura e da escrita tinha como foco fazer o aluno chegar ao reconhecimento das palavras garantindo-lhe o domínio das correspondências fonográficas. No máximo, buscou-se assegurar, de acordo com algumas abordagens, que este saber se desenvolvesse num universo de palavras que fossem significativas para o aluno no seu meio cultural, como nas famosas cartilhas regionais. Mas de uma maneira geral, tratava-se de uma visão comportamental da aprendizagem que era considerada de natureza cumulativa, baseada na cópia, na repetição e no reforço. A grande ênfase era nas associações e na memorização das correspondências fonográficas, pois se desconhecia a importância de a criança desenvolver a sua compreensão do funcionamento do sistema de escrita alfabética e de saber usá-lo desde o início em situações reais de comunicação. A partir de 1980 a alfabetização escolar no Brasil começou a passar por novos questionamentos, porém desta feita o foco das discussões era a emergência de novas concepções de alfabetização, baseadas em resultados de pesquisas na área da psicologia cognitiva e da psicolinguística que apontavam para a necessidade de se compreender o funcionamento dos sistemas alfabéticos de escrita e de se saber utilizá-lo em situações reais de comunicação escrita, prevenindo-se desde o início da alfabetização o chamado analfabetismo funcional. Com a divulgação das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita (Ferreiro e Teberosky 1986) o enfoque construtivista tornou-se, sem dúvida, um dos mais influentes na elaboração de novas propostas de alfabetização, pois além de revelar a evolução conceitual por que passam as crianças até compreenderem como funciona o nosso sistema de escrita, incorporou a ideia defendida por Goodmann (1967) e Smith (1971) de que ler e escrever são atividades comunicativas e que devem, portanto, ocorrer através de textos reais onde o leitor ou escritor lança mão de seus conhecimentos da língua por se tratar de uma estrutura integrada, na qual os aspectos sintáticos, semânticos e fonológicos interagem para que se possa atribuir significado ao que está graficamente representado nos textos escritos. A importância das práticas sociais de leitura e escrita também teve o suporte dos estudos que no âmbito da linguística, da sociolinguística e da psicolinguística enfatizaram as diferenças entre as modalidades língua oral e língua escrita e demonstraram como muitas crianças se apropriavam da linguagem escrita através do contato com diferentes gêneros textuais, explorando através de suas interações com adultos alfabetizados a leitura e a produção de textos, mesmo antes de estarem alfabetizadas de forma convencional enquanto que outras, apesar de alfabetizadas, apresentavam uma ausência de domínio da linguagem utilizada nas formas escritas de comunicação. (Rego 1986, 1988; Abaurre 1986; Kato 1987). Um estudo longitudinal conduzido em Bristol (Wells 1986) mostrou, de forma contundente, a importância das experiências com a leitura de histórias para crianças de pré-escolar para o posterior sucesso escolar das crianças com a leitura e a escrita. Aquelas crianças, cujos pais liam regularmente e exploravam conjuntamente com elas os textos narrativos, não só aprenderam a ler com mais facilidade como revelaram-se excelentes escritores no término do ensino fundamental. Os resultados obtidos neste estudo levaram o autor a salientar aquelas variáveis que do ponto de vista sócio cultural seriam mediadoras das diferenças de desempenho na escola, pondo em destaque a leitura em voz alta pelo adulto e as experiências precoces com livros. Neste período emergiu também um vasto corpo de pesquisas que investigavam a relação entre o desenvolvimento de uma capacidade para refletir sobre as unidades sonoras das palavras e as diferenças individuais na aprendizagem inicial da leitura e da escrita em sistemas alfabéticos de escrita (Carraher e Rego 1980, 1984, CardosoMartins 1990). No entanto, na literatura científica internacional as relações entre esta capacidade denominada de consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita tem sido objeto de muitas controvérsias. Para alguns pesquisadores a capacidade de refletir sobre fonemas é uma consequência da exposição à aprendizagem de sistemas alfabéticos de escrita, pois sendo o fonema uma unidade abstrata, as escritas alfabéticas só poderiam ser aprendidas através do ensino explícito sobre essas unidades e sua relação com as letras do alfabeto. Entre os defensores desta posição estão os pesquisadores do grupo de Bruxelas cujas investigações focaram principalmente em comparações entre adultos alfabetizados e analfabetos ( Morais, Cary, Alegria e Bertelson 1979; Morais, Cluytens, Alegria e Content 1989) e em estudos de treinamento (Content, Kolinsky, Morais e Bertelson (1986) para ensinar crianças de 4 a 5 anos a segmentar fonemas. Estes estudos tiveram resultados pouco consistentes em relação às crianças mais novas, uma vez que em tais treinamentos se partia do pressuposto de que seria possível ensinar sobre fonemas independentemente do nível evolutivo do aprendiz. O argumento do grupo de Bruxelas está centrado no fonema, mas há outras dimensões da consciência fonológica como, por exemplo, as segmentações intrasilábicas, envolvendo o fonema inicial e a rima e a segmentação silábica. A capacidade para segmentar e, sobretudo, para categorizar essas unidades, percebendo semelhanças e diferenças entre as mesmas, se desenvolve antes de a criança se tornar alfabetizada e seria crianças do sucesso na aprendizagem posterior da leitura e da escrita ( Bradley e Bryant 1987, Goswami e Bryant 1990). Os resultados emergentes destas pesquisas foram até certo ponto desconsiderados pelos defensores da abordagem psicogenética, pois estes pesquisadores embora reconheçam que as crianças desenvolvem capacidades metafonológicas, isto é, se tornam capazes de refletir sobre os segmentos sonoros das palavras (Ferreiro 2004), argumentam que a grande maioria dos estudos que investigaram a consciência fonológica e a sua conexão com a aquisição da língua escrita ignoraram o processo evolutivo descrito na psicogênese da língua escrita e que seria através da atividade de escrita e da busca por fazer corresponder a segmentação oral com a segmentação gráfica que ocorreria a tomada de consciência dos elementos sonoros da palavra e o desenvolvimento da consciência fonológica. Embora haja evidências para a existência de uma conexão entre o desenvolvimento da consciência fonológica e a psicogênese da escrita em crianças falantes do inglês (Rego 1991) do espanhol (Vernon Calderón e Alvorado 2001) e, recentemente, do português (Morais e Leite 2005) não podemos ignorar os resultados de dois estudos clássicos de intervenção que demonstraram os benefícios de uma estimulação precoce da consciência fonológica na aprendizagem da leitura e da escrita. O primeiro deles foi conduzido por Bradley e Bryant (1983) e envolveu um grupo de 65 crianças inglesas cujo desempenho em tarefas que exigiam reflexão sobre as diferenças e semelhanças entre os sons iniciais e finais das palavras aos cinco anos de idade, era muito precário. As crianças foram divididas em quatro grupos: dois experimentais e dois de controle. Entre os 6 e 7 anos as crianças dos grupos experimentais participaram de atividades de estímulo à consciência fonológica. No primeiro grupo experimental as crianças foram apenas ensinadas a categorizar os sons iniciais e finais das palavras quanto à sua semelhança enquanto que no segundo grupo além desse tipo de estímulo elas foram ensinadas acerca das relações entre esses sons e as letras. Nos grupos controle não houve estimulação à consciência fonológica: um deles seguiu a metodologia normal da escola enquanto que o segundo recebeu um treinamento que consistia em classificar palavras em famílias semânticas. Os resultados demonstraram que as crianças que participaram das atividades de estímulo à consciência fonológica tiveram desempenho superior em leitura e escrita, comparativamente aos demais grupos e que esta diferença foi significativa para o grupo que foi ensinado sobre as relações entre os sons e a escrita das palavras alvo. O segundo tipo de evidência vem de um estudo conduzido na Dinamarca por Lundberg, Frost e Petersen (1988). O estudo envolveu crianças de pré-escolar que foram submetidas a um amplo programa de estímulo à consciência fonológica através de jogos e brincadeiras que se iniciavam com unidades maiores como rimas e sílabas e desciam até o nível do fonema. Este grupo de intervenção, após uma ano de participação no programa, demonstrou desempenho significativamente superior não só em tarefas de consciência fonológica como em leitura e escrita comparativamente a outro grupo de pré-escolares que embora no início do estudo tivesse demonstrado capacidades metafonológicas mais desenvolvidas, não foram submetidos ao programa de intervenção pedagógica em apreço. Os pesquisadores avaliaram também os conhecimentos de matemática de ambos os grupos não tendo sido constatadas diferenças entre os mesmos quanto a esta área de conhecimento. Se concebermos que o desenvolvimento da consciência fonológica é mera consequência da aprendizagem da leitura e da escrita ou da evolução psicogenética da criança a nossa postura pedagógica será a de que não necessitaremos de atividades específicas que estimulem esse tipo de reflexão, porém se considerarmos que o desenvolvimento da consciência fonológica é um facilitador da evolução psicogenética e da aprendizagem da leitura e da escrita transformaremos este tipo de reflexão num alvo pedagógico durante o processo de alfabetização. Portanto, as pesquisas emergentes a partir de 1980 e as concepções teóricas adotadas deram margem à proposição de modelos pedagógicos diferenciados de alfabetização: alguns com ênfase muito forte no processo de letramento: uso de práticas de leitura e escrita na sala de aula e outros que consideraram a necessidade de atividades específicas de alfabetização e quer conhecer a importância de acatar os resultados oriundos da literatura que investigou o impacto do estímulo à consciência fonológica sobre a aprendizagem de escritas alfabéticas. A proposta construtivista influenciada pelas pesquisas de Ferreiro e Teberosky (1986) e pelos modelos de leitura propostos por Goodmann (1967) e Smith (1971) defende uma alfabetização contextualizada e significativa através da transposição didática das práticas sociais da leitura e da escrita para a sala de aula e considera a descoberta do princípio alfabético como uma consequência da exposição aos usos da leitura e da escrita que devem ocorrer de uma forma reflexiva a partir da apresentação de situações problema nas quais os alunos revelem espontaneamente as suas hipóteses e sejam levados a pensar sobre a escrita, cabendo ao professor o papel de intervir de forma a tornar mais efetiva esta reflexão. Nesta perspectiva, a alfabetização dar-se-ia através de uma profunda imersão das crianças nas práticas sociais de leitura e escrita, descartando-se qualquer tipo de atividade didática que não estivessem vinculadas a essas práticas. Para Teberosky (1994) a formação de um vocabulário estável de palavras a partir dessas práticas seria o principal referencial da criança para a descoberta do sistema alfabético, uma vez que esta dar-se-ia a partir dos conflitos vivenciados pela criança entre a sua concepção original de escrita e a escrita convencional dos nomes. Para os adeptos desta corrente, não haveria necessidade de estudo sistemático das correspondências som-grafia nem de atividades de estímulo à consciência fonológica uma vez que esta seria uma consequência da própria evolução conceitual da criança em face de uma aprendizagem reflexiva da leitura e da escrita. Recentemente, Morais e Kolinsky (2004) e um grupo de pesquisadores brasileiros contestaram a proposta construtivista, retirando do foco inicial da alfabetização a importância das práticas sociais de leitura e escrita e definindo como objetivo inicial da alfabetização o domínio do sistema alfabético mediante uma metodologia voltada para o ensino explícito das correspondências entre fonemas e grafemas inclusive de regras ortográficas contextuais. A proposta se baseia em modelos cognitivistas de processamento da informação na leitura de orientação ascendente, segundo os quais o reconhecimento automático de palavras é o fator que melhor explica a compreensão na leitura. Este modelo tem sido defendido por autores como Gough e Tunmer 1980, Perfetti (1985), Stanovich (1980) entre outros, para os quais o uso de pistas contextuais na leitura é uma estratégia compensatória característica dos leitores ineficientes. Subjacente a esta proposta há um retorno explícito ao método fônico e a um modelo de alfabetização restrito ao reconhecimento de palavras, onde prevalece o ensino direto, independentemente dos níveis conceituais da criança, ou seja , da sua compreensão acerca do sistema alfabético de escrita. Para esta proposta as diferenças entre língua oral e língua escrita e os usos que fazemos da comunicação escrita também são irrelevantes. No entanto, temos que ter cautela com a polêmica estabelecida entre alfabetização e letramento a partir das propostas que descrevemos sumariamente acima. Poderíamos de certa forma antecipar que uma prática pedagógica focada principalmente no estudo das correspondências fonográficas não seria suficiente para produzir uma alfabetização de qualidade, uma vez que a leitura e a escrita são ferramentas culturais praticamente inexistentes nas famílias de uma considerável maioria das crianças que frequentam muitas das nossas escolas públicas, dado o nível de escolaridade dos seus familiares. Portanto, as práticas sociais de leitura e escrita teriam que ser enfocadas do ponto de vista pedagógico, sob pena de tornar a aprendizagem da leitura e da escrita pouco significativa para a criança, privando-a do acesso a formas de comunicação que só aparecem nos textos escritos. 2 - HISTÓRICO DA ALFABETIZAÇÃO Durante muito tempo, no Brasil, data-se aproximadamente de 1890 a 1970, a discussão a respeito da alfabetização limitava-se aos métodos e sua eficácia. Eles estavam divididos em dois grupos: os sintéticos e os analíticos. Os métodos sintéticos seguem a marcha que vai das partes para o todo. Dentre eles compreendem-se (i) o método alfabético, que toma a letra como unidade de estudo, (ii) o fônico, que toma o fonema como unidade e (iii) o silábico, que toma a sílaba como foco inicial. Nos referidos métodos, o que se ensina é o sistema alfabético/ortográfico de escrita com sua lógica de representação, de organização e combinatórias. O segundo grupo são os métodos analíticos, cujo processo de ensino vai do todo para as partes. Estes métodos privilegiam a compreensão, ou seja, o reconhecimento global como estratégia principal e não a decifração. Tomam como unidade de estudo as palavras, as frases ou os textos para, posteriormente, realizar a análise das unidades menores. A leitura silenciosa e a cópia são atividades incentivadas e frequentes em salas de aula que utilizam estes métodos. Com o propósito de compreender a história dos métodos de alfabetização, Mortatti (2000) faz um resgate da alfabetização no estado de São Paulo tendo como referência os anos de 1876 a 1994. Para tal, a autora caracteriza quatro momentos históricos que envolvem a discussão do ensino da leitura e da escrita buscando compreender as dificuldades das crianças em aprender a ler e escrever. O primeiro momento, compreendido até o final do Império brasileiro, denominado de metodização do ensino da leitura, constitui-se como um período em que o trabalho da leitura e da escrita contava com poucos materiais específicos e os ambientes escolares eram inapropriados. A leitura era realizada por meio das cartas do ABC que apresentavam as letras do alfabeto nas suas variadas formas (maiúsculas, minúsculas, manuscrita e imprensa). Subjacente às cartas do ABC estão os métodos de marcha sintética como o da soletração, da silabação e o fônico. De acordo com Frade (2007, p.22) sua aplicação dava-se na seguinte ordem: [...] decoração oral das letras do alfabeto, seu reconhecimento posterior em pequenas sequências e numa sequência de todo o alfabeto e, finalmente, de letras isoladas. Em seguida a decoração de todos os casos possíveis de combinações silábicas, que eram memorizadas sem que se estabelecesse a relação entre o que era reconhecido e o que as letras representavam, ou seja, a fala. Mortatti (2000) considera a publicação, em 1876, da Cartilha Maternal ou Arte da Leitura, escrita pelo português João de Deus, um marco crucial deste momento. Tendo como aporte o método da palavração, esta cartilha baseava-se nos princípios modernos da linguística da época. Seu diferencial consistia em trabalhar inicialmente a palavra e, posteriormente, os valores fonéticos menores, ou seja, as letras. Desta forma, foi considerada, por seu principal militante Silva Jardim, como fase científica e definitiva para o ensino da leitura. O segundo momento é considerado como uma fase de expansão do método analítico. A preocupação centra-se em como ensinar – visando às questões didáticas – e, a quem ensinar – definindo habilidades motoras e visuais da criança, ou seja, atrelando às questões de ordem psicológica. É também considerada uma fase de consolidação do mercado editorial, havendo uma grande elaboração de diversas cartilhas brasileiras. Como enfatiza a autora, iniciou-se, nesse período, uma disputa entre os partidários do novo método analítico e os adeptos dos tradicionais métodos sintéticos da época do Império, em especial o da palavração. A partir de 1920, destaca-se o terceiro momento histórico da alfabetização. Com a autonomia didática proposta pela Reforma Sampaio Dória 5 observa-se que, além dos métodos analíticos e sintéticos, os mistos ou ecléticos6 passaram a ser utilizados nas escolas. No entanto, a defesa acirrada de um ou outro método foi, de certo modo, relativizada em decorrência da institucionalização das novas bases psicológicas da alfabetização, descritas no livro Testes ABC7 (1934), por M. B. Lourenço Filho. Com o objetivo de buscar soluções para as dificuldades das crianças, aplicavam-se provas de verificação da maturidade da criança. Com isso, os métodos passaram a subordinar-se ao nível de maturidade dos alunos e ao período preparatório, que consistia em exercícios de discriminação e coordenação viso motora e áudio motora. Nestes três momentos históricos abordados por Mortatti (2000), a alfabetização apoiava-se nos métodos e na noção de sujeito, apontando para as seguintes questões: como se ensina e a quem se ensina? No entanto, como se aprende, não era, até então, foco de atenção por parte dos educadores e pesquisadores. O quarto momento iniciado a partir dos anos 1980 significou uma “revolução conceitual” (MORTATTI, op. cit.). Tendo como base teórica a epistemologia genética proposta por Jean Piaget, Emília Ferreiro e Ana Teberosky em seus estudos sobre a psicogênese da língua escrita, centram-se no processo de aprendizagem. Diferentemente das concepções dos momentos anteriores, nesta perspectiva a criança é vista como um sujeito cognoscente, aquele que busca adquirir conhecimento. De acordo com Ferreiro e Teberosky (1991, p.26), a criança é “um sujeito que aprende basicamente através de suas próprias ações sobre os objetos do mundo, e que constrói suas próprias categorias de pensamento ao mesmo tempo em que organiza seu mundo.” A inserção dos estudos construtivistas na escola representou um avanço para a alfabetização. Isto porque a psicogênese da língua escrita compreendia a escrita não apenas como mera decifração de um código, um ato mecânico, como pensavam os adeptos dos métodos tradicionais de alfabetização, mas como algo que transcende os muros da escola. Ferreiro (1996) propõe um novo olhar sobre a alfabetização, uma vez que a língua é vista em sua dinamicidade e nos usos que a sociedade faz dela. Para a autora, a escola tradicional operou uma transmutação da escrita, transformando-a em um objeto exclusivamente escolar, ocultando suas funções extra-escolares. Na realidade, “a escrita é importante na escola porque é importante fora da escola e não o inverso” (FERREIRO, op. cit., p.20). Para indicar o desenvolvimento socioeconômico, muitos países têm como foco as taxas de analfabetismo. Segundo Ferreiro (2002), no Brasil, desde as primeiras décadas do século XX, essas taxas eram observadas a partir de avaliações censitárias, as quais tomavam como indicadores de alfabetização, a assinatura do próprio nome. Somente no censo de 1950, por influência da UNESCO8 que o conceito de alfabetizado passou a representar a capacidade de “ler e escrever um simples bilhete em qualquer idioma, não sendo assim consideradas aquelas que apenas assinassem o próprio nome.” (FERRARO, 2002, p. 31). Paulo Freire também compreendia a alfabetização numa concepção mais ampla. Em seu livro “A importância do ato de ler” (1988), o autor discute as questões relativas à leitura e define-a como um processo que vai além da significação das letras. Nas palavras do autor “a leitura de mundo precede a leitura da palavra”. Em consonância com os estudos atuais do letramento, o referido autor defende uma educação que seja capaz de transformar o homem e de conscientizá-lo. Isso implica em uma educação como prática de libertação, um projeto político capaz de desenvolver a consciência crítica dos alunos, levando-os a analisar os problemas de forma a superá-los. No Brasil, o termo surge atrelado ao conceito de alfabetização, isso devido à “necessidade de reconhecer e nomear práticas sociais de leitura e de escrita mais avançadas e complexas, que as práticas do ler e escrever resultantes da aprendizagem do sistema de escrita” (SOARES, 2004, p.6). A palavra letramento vem do inglês literacy, que quer dizer estado ou condição daquele que é literate que possui a habilidade de ler e escrever. Letrado é, então, aquele que além de saber ler e escrever faz uso competente da leitura e da escrita. Letramento é utilizado para designar o resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e escrita. O termo foi incorporado ao discurso da pedagogia e da linguística no Brasil a partir da metade dos anos 80. Conforme constata Kleiman (1995), foi utilizado pela primeira vez por Kato (1986) em seu livro “No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística”. Após essa ocorrência observa-se seu emprego por diversos autores (cf. Tfouni 1988; Kleiman 1995; Rojo 1998; Soares 1998 e outros). Estas obras contribuíram para as reflexões e discussões acerca da alfabetização na perspectiva do letramento, buscando caracterizar e viabilizar a compreensão destes dois conceitos por parte dos educadores e pesquisadores de um modo geral. Mas foi somente em 2001, que a palavra foi inserida ao dicionário Houaiss, aproximando sua definição aos estudos atuais do letramento. Tendo como pressuposto de que não há como dissociar a perspectiva do letramento da compreensão de gêneros discursivos, pois eles são representativos das ações comunicativas dos indivíduos, a alfabetização passou a contar com a presença de parlendas, receitas, músicas, reportagens, notícias etc, para desenvolver as capacidades relacionadas à aquisição do sistema linguístico. Não há como viver num mundo grafocêntrico como o nosso e aprender com textos desprovidos de sentido e distantes da realidade. Por isso, as atividades que tratam do domínio do sistema alfabético precisam acontecer paralelamente àquelas que visam o letramento. O importante é que, nos primeiros anos do Ensino Fundamental, ao mesmo tempo em que o aluno vai se apropriando do sistema, vá também se tornando usuário do texto. Nos últimos anos, as reflexões realizadas sobre a alfabetização têm mostrado que a aquisição da escrita é um processo complexo e multifacetado. Nesse processo, considera‐se relevante estabelecer a articulação entre as dimensões técnica e sociocultural do aprendizado da escrita. A concepção de alfabetização que orienta o nosso estudo leva em consideração a especificidade do ensino da leitura e escrita – a aquisição do código alfabético –, bem como a valorização das práticas de letramento – as práticas sociais de leitura e escrita em seus diferentes contextos. As discussões revelam o caráter multifacetado dos termos alfabetização e letramento, bem como a reflexão necessária acerca do ensino e da aprendizagem do sistema alfabético e ortográfico, indicando que, no convívio de uma sociedade letrada, não basta somente o aprendizado da leitura e escrita, mas a utilização desse conhecimento nas práticas sociais, sobretudo porque o convívio com os diferentes suportes textuais já se faz presente em nosso cotidiano. Na visão de Soares (2004, p. 14), dissociar alfabetização e letramento é um equívoco, visto que a inserção do sujeito no mundo da escrita ocorre simultaneamente por dois processos: pela “aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização – e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita – o letramento”. A autora defende a alfabetização conciliando o letramento como decisivo para que os alunos aprendam a ler e escrever e, principalmente, para que lhes seja possível o uso social dessas habilidades. Aborda, ainda, que alfabetizar letrando é um constante desafio e requer um novo (re)pensar acerca do processo de ensino e aprendizagem das crianças, sendo capaz de transformar a prática pedagógica (SOARES, 2006). Alfabetizar e letrar são processos contínuos, uma vez que a aprendizagem é dinâmica, devido às transformações constantes que vêm ocorrendo na sociedade atual em seus contextos culturais e sociais. No pensamento de Soares (2006, p. 47), “o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado”. Tfouni (1995) compreende a alfabetização letrada como o processo de alfabetização que se coloca como pano de fundo do letramento. Isso significa inserir, num contexto específico, diversificadas práticas de leitura e escrita do cotidiano. O grande desafio está na busca de novas perspectivas com base nessas modificações, não apenas aproximando a prática desses contextos, mas potencializando uma nova cultura que (re)produza novos processos, visando à vinculação da teoria e da prática, possibilitando novas metodologias para o saber fazer na prática pedagógica. Nesse contexto, os professores devem vincular e aumentar as experiências que os alunos vivenciam em sala de aula, por meio de novos saberes e práticas pedagógicas alfabetizadoras, dando oportunidade a eles de ler e escrever com propriedade, fazendo uso desses conhecimentos com autonomia, tanto em suas atividades em sala de aula quanto nas relações sociais, para que futuramente alcancem a emancipação e transformação como cidadãos. Alfabetizar letrando implica, ainda, uma opção política, levando em consideração que o sentido dado à palavra imprime a possibilidade de uma transformação da realidade, notadamente pelo direito de todos os indivíduos à apropriação da escrita como um bem cultural. Segundo Descardeci (2002, p. 46), ser letrado numa sociedade letrada “é essencial para que se possa participar ativamente da política, da tecnologia, da mídia; para que se possa ter acesso ao poder”. O educador, portanto, tem uma função muito relevante a realizar para que esse pensar crítico se desenvolva em seus educandos. De acordo com Freire (1996, p. 14), “[...] percebe‐se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo”. Ainda, consoante Soares (2004, p. 13), a alfabetização se desenvolve no contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e de escrita, ou seja, por intermédio de atividades de letramento; “este, por sua vez, só pode desenvolver‐se no contexto da e por meio da aprendizagem das relações fonema‐grafema, isto é, em dependência da alfabetização”. Entendemos que alfabetizar letrando é uma prática essencial na sociedade grafocêntrica, para que se possa atingir a educação de qualidade e produzir um ensino em que os alunos não sejam apenas receptores de conhecimentos prontos e acabados, mas se tornem seres comunicantes, pensantes e transformadores da sociedade em que vivem. Um ponto primordial ao se tratar de prática pedagógica é reconhecer que os educandos já possuem conhecimentos prévios; assim, é relevante que os educadores façam um diagnóstico inicial do conhecimento de seus alunos, para saber de onde devem partir e planejar suas aulas. Entendemos ainda que, a partir da prática social, o conteúdo terá sentido para os educandos, que irão (re)construir conhecimentos gradativamente e desenvolver uma atitude transformadora da sociedade, pois perceberão que o conhecimento científico faz parte da sua vida e pode contribuir para melhorá‐la. Assim, as práticas devem promover a alfabetização e o letramento de cada indivíduo, de forma que o ensino do código alfabético seja conciliado com o seu uso social em várias ocasiões, podendo o sujeito ser autor de sua própria vida e transformações. A escola, nesse contexto, deve ser um ambiente que suscite reflexões e inquietações, favorável para um constante movimento de ideias, com trocas e conhecimentos, promovendo o crescimento intelectual, cultural e pessoal dos sujeitos. Para isso, faz‐se necessário que as proposições e práticas sejam contextualizadas com a prática social, colaborando para o aumento do desempenho escolar dos alunos. De fato, o ambiente escolar é o lugar onde se ensina e também se aprende quais são as melhores escolhas a ser feitas para viver em sociedade; dessa forma, será melhor se formar mais cedo – e de modo mais eficiente – indivíduos alfabetizados e letrados. É necessário, portanto, deslocar o olhar das práticas pedagógicas da mera codificação e decodificação individual e entendê‐las como uma prática social mais abrangente, existente no contexto histórico da sociedade atual. É relevante desenvolver práticas que considerem as especificidades e singularidades dos povos do campo, oferecendo aos alunos conteúdos produzidos socialmente partindo das experiências que vivenciam nos contextos culturais, com possibilidade de condições de vida no próprio lugar onde moram, tendo em vista que, para pensarmos a vida no campo, necessitamos pensar a relação entre o campo e a cidade na perspectiva do modelo capitalista de desenvolvimento em curso no país (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004). Quando defendemos que a alfabetização deve acontecer em contextos de letramento, isso não significa criar um novo método de alfabetizar os alunos. Espera‐se do educador uma maior reflexão da própria prática, pois, tendo consciência da metodologia utilizada (educação e letramento como prática social), pode‐se esperar um ensino de qualidade, capaz de preparar o sujeito para interpretar e agir na sociedade. Um caminho que o professor poderá seguir é a utilização dos gêneros textuais, sendo uma metodologia apropriada para atingir os dois aspectos da aprendizagem da língua escrita, pois fazer com que o educando seja alfabetizado e letrado resulta da contextualização que o indivíduo faz dos usos da escrita em suas diversas situações do dia a dia. Por isso, a prática pedagógica na perspectiva do letramento deve demonstrar a relevância do trabalho com diferentes gêneros textuais, baseando‐se em diversificados suportes de leitura, com o objetivo de fazer com que o educando perceba as inúmeras maneiras de utilizar a escrita para vários objetivos, partindo de situações de letramento que estão no seu próprio cotidiano. 3 – A ALFABETIZAÇÃO NO AMBIENTE ESCOLAR Para muitos alunos, o convívio e o acesso a textos escritos são coisas comuns, de modo que, ao ingressarem na escola, a leitura, a escrita e as tarefas típicas do âmbito escolar lhes são familiares e pertinentes. No entanto, para outros, ler e escrever são atividades pouco presentes em seu dia a dia. Para eles, a possibilidade de ampliar o grau de letramento, por meio da convivência com o material escrito, é algo a ser realizado pela instituição escolar. Nesse sentido, afirmamos que a escola necessita garantir a todos os educandos a vivência de práticas reais de leitura e produção diversificada diariamente. Citando FERREIRO (apud Ferreiro explica que: a alfabetização é um processo interno, que acontece de formas diferentes em cada indivíduo dependendo da forma com que é estimulado por seu meio ambiente. É caracterizada por grandes dificuldades e conflitos a nível cognitivo, levando a criança a aventura excitante, repleta de incertezas, com muitos, momentos críticos, nos quais é difícil manter a ansiedade sob controle” (pág. 63) Segundo a afirmação de Ferreiro (1999, p.47) “a alfabetização não é um estado ao qual se chega, mas um processo cujo início é na maioria dos casos anterior a escola é que não termina ao finalizar a escola primária”. A autora também defende que, de todos os grupos populacionais as crianças são as mais facilmente alfabetizáveis e estão em processo continuo de aprendizagem, enquanto que os adultos já fixaram formas de ação e de conhecimento mais difíceis de modificar ressalta ainda que: Há crianças que chegam à escola sabendo que a escrita serve para escrever coisas inteligentes, divertidas ou importantes. Essas são as que terminam de alfabetizar-se na escola, mas começaram a alfabetizar muito antes, através da possibilidade de entrar em contato, de interagir com a língua escrita. Há outras crianças que necessitam da escola para apropriar se da escrita. (Ferreiro, 1999, p.23) Dando continuidade, Ferreiro fala que a alfabetização é um processo no qual o indivíduo assimila o aprendizado e utilização como código de comunicação. Esse processo não se deve resumir apenas na aquisição dessas habilidades mecânicas (codificação e decodificação) do ato de ler, mas na capacidade de interpretar, compreender, criticar e produzir conhecimento. A alfabetização envolve também o desenvolvimento de novas formas de compreensão e uso da linguagem de uma maneira geral. Segundo o dicionário Aurélio alfabetização é a ação de alfabetizar; ou difusão do ensino primário, restrita ao aprendizado da leitura e a escrita rudimentar. Antigamente pensava na alfabetização como um método, mas Emília Ferreiro mudou essa concepção, nos revelando que alfabetização é estar em constante coordenação de informações e reconstrução de seu conhecimento adquirido, provocando assim mudanças internas e grandes avanços para se chegar pleno desenvolvimento da escrita e da leitura.Antes do surgimento da palavra letramento; havia vários termos como: analfabetismo, analfabetismo funcional, e o iletrismo. O primeiro se caracteriza pelo falta de compreensão ou produção de uma mensagem escrita, PR mais simples que fosse. No entanto o segundo dominava as técnicas, depois de vários anos na escola, mas perdeu o domínio por falta de uso. Enquanto o terceiro ele é afastado completamente do mundo da comunicação escrita, não sendo familiares de livros, jornais. Citando Foucambert (Oliveira apud Foucambert 1994), nos mostra que somos iletrados em muitos campos, já citando Tfouni (Oliveira apud Tfouni 2006) para o autor não existe iletrismo, pois o termo está em desuso, mesmo encontrado em muitos discursos. Para Soares (2003), a alfabetização é considerada uma ação, a maioria acha que aprender o código, aprende a ler, se realmente fosse verdade, o Brasil não teria um índice de analfabetismo tão grande. No Brasil, o termo letramento foi usado pela primeira vez por Mary Kato (1986) numa obra intitulada “No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística”. Depois disso, muitos autores se interessaram pelo tema, tendo como consequência diversas pesquisas científicas. No entanto, Paulo Freire utilizou o termo alfabetização com um sentido aproximado de letramento, para designar uma prática sociocultural de uso da língua escrita que vai transformando-se ao longo do tempo, segundo a época e as pessoas que a usam, podendo vir a ser libertadora. Aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto, não numa manipulação mecânica de palavras, mas numa relação dinâmica que vincula linguagem e realidade. (Paulo Freire, 1987, p.08) A outra dimensão abordada por Soares (2004) é a dimensão social do letramento, a qual considera o mesmo uma prática social, ou seja, o uso que as pessoas fazem com as habilidades de leitura e escrita em um determinado contexto, relacionando-as com suas necessidades, valores e intenções. A autora também cita o Dicionário do Discurso (2004 p.300), explicando três pontos principais. Primeiro, saberes elementares: ler, escrever e contar, em seguida uso social da escrita, acrescentando o questionamento e por último inclui o analisar o uso da escrita. Citando Kleiman (2005) Oliveira nos fala que “o letramento é um fenômeno em que precisamos destacar a diferença entre o oral e o escrito, separando-os dos fenômenos sociais e culturais”. No texto “ O que é letramento, de Magda Soares (2003), acrescenta que a pessoa precisa de apropriar do sistema de escrita, dando exemplo do filme Central do Brasil, onde algumas personagens conhecem a carta mas não podiam escrevê-las, por serem pessoas analfabetas, outro exemplo dado foi do universo infantil, que a criança em posse de um livro passa o dedinho como se estivesse lendo, o inverso, sendo crianças letradas e não alfabetizadas. Outro ponto importante é relacionado ao contexto social, quando a autora aponta que há uma preocupação em alfabetizar, mas não se preocupa no contexto social da criança. Como alfabetizar, se os alunos não têm condições de comprar livros e revistas. A autora abre um importante parêntese quando fala que mesmo havendo distinção entre alfabetizar e letrar, ao mesmo tempo é fundamental que entendamos que são inseparáveis com suas especificidades. Mas explica que um dos grandes fracassos é pensar em que não se pode letrar antes de alfabetizar ou contrario. A autora Soares enfatiza que é necessária a política social da leitura, sendo contextualizada e não pelo exemplo da cartilha, com exemplos nunca vistos pelas crianças. Soares nos mostra que um dos desafios que se coloca hoje aos professores, nos mostra a autora Soares (2004) que ao trabalhar na perspectiva da alfabetização, somente será possível se for assegurado uma ação pedagógica coerente e adequada à contemporaneidade. Isso possibilitará ao aluno a apropriação do sistema linguístico e a plena condição de uso da língua nas práticas sociais de leitura e escrita e das diferentes linguagens produzidas culturalmente. A alfabetização é um campo aberto, no qual o conflito entre teorias é fundamental para o progresso do conhecimento. Mas é importante levar em conta a compreensão sobre as visões de mundo, de homem e de sociedade que as sustentam para o professor possa decidir de um modo mais crítico e consciente, sobre os quais, os ajudarão a concretizar os fins de uma educação formada da cidadania de nossos aprendizes. Atualmente parece que de novo estamos vivenciando uma nova situação, no que se refere à alfabetização, o que prenuncia o questionário a que vem sendo submetidos os quadros conceituais e suas práticas ao longo da desse seu processo na história. Estamos diante de um quadro que aponta problemas resultantes de alfabetização de crianças no contexto escolar, insatisfações e inseguranças entre alfabetizadores os que evidenciam uma perplexidade na persistência do fracasso escolar em alfabetizar. Neste contexto, vem surgindo nos discursos teóricos como uma proposta para superar tais fracassos, usando termos como alfabetizar ou letrar alfabetizando, apontados como o caminho para a superação dos problemas enfrentados nesta etapa de escolarização. No início da escolarização, uma pesquisa revela que, até os anos 80, o objetivo maior era a alfabetização isto é, enfatizava-se fundamentalmente a aprendizagem do sistema convencional da escrita. Em torno desse objetivo principal, métodos de alfabetização alteram-se em um movimento pendular: ora a opção pelo princípio da síntese, segundo o qual alfabetização deve partir das unidades maiores _ a palavra, a frase, o texto (método fônico, método silábico); ora a opção pelo princípio da análise segundo o qual a palavra, a frase, o texto em direção as unidades menores (método da palavração, da sentenciação, global). Em ambas as opções, porém a meta sempre foi à aprendizagem do sistema alfabético e ortográfico da escrita; embora se possa identificar na segunda opção uma preocupação também com o sentido veiculado pelo código. Seja no nível do texto (global, seja no nível da palavra, ou da sentença da palavração, sentenciacão) os textos foram postos a serviço da aprendizagem do sistema de escrita. Visto que, palavras são intencionalmente selecionados para servir a sua decomposição em sílabas e fonemas. Assim, pode se dizer que até os anos 80, a alfabetização escolar no Brasil caracterizou por uma alternância entre método sintético e métodos analíticos, mas sempre com o mesmo pressuposto – o de a criança para aprender o sistema de escrita, dependeria de estímulos externos cuidadosamente selecionados ou artificialmente construídos – e sempre com mesmo objetivo o domínio desse sistema, considerado condição, pré-requisito para que a criança desenvolvesse habilidades de uso da leitura e da escrita, isto é, primeiro aprender a ler e a escrever, para só depois, ler textos, livros, escrever histórias, cartas, etc. Nos anos 80, a perspectiva psicogenética da aprendizagem da língua escrita divulgada entre nós, sobretudo pela atuação formativa de Emília Ferreiro, sob a denominação de construtivismo, trouxe uma significativa mudança de pressupostos e objetivos na área de alfabetização, porque alterou fundamentalmente a concepção efetivas de leitura e de escrita. Essa mudança permitiu identificar e explicar o processo através do qual a criança torna-se alfabética; por outro lado, e como consequência disso, sugeriu as condições em que mais adequadamente se desenvolve esse processo, revelando o papel fundamental de uma interação intensa e diversificada da criança com práticas e matérias reais de leitura e escrita a fim de que ocorra o processo de conceitualização da língua. No entanto, o foco no processo de conceitualização da língua escrita pela criança e a importância de sua interação com práticas de leituras e de escrita como meio para provocar e motivar esse processo tem subestimado, na pratica escolar da aprendizagem inicial da língua escrita, o ensino sistemático das relações entre a fala e a escrita de que ocupa a alfabetização. Como consequência de o construtivismo ter evidenciado processos espontâneos de compreensão da escrita pela criança, ter condenado os métodos que enfatizam o ensino direto e explicito do sistema de escrita e, sendo fundamentalmente uma teoria psicológica, não ter proposto uma metodologia de ensino, os professores foram levados a supor que, apesar de sua natureza convencional e com frequência arbitrária, as relações entre a fala e a escrita seriam construídas pela criança de forma incidental e assistemática, como decorrência natural de sua interação com inúmeras variedades práticas de leitura e de escrita, ou seja, através de atividades de letramento, prevalecendo, pois, estas sobre as atividades de alfabetização. É, sobretudo essa ausência de ensino direto, explicito e sistemático da transferência da cadeia sonora da fala para a forma gráfica da escrita que tem motivado as críticas que atualmente vem sendo feitas ao construtivismo. Além disso, é ela que explica porque vêm surgindo, surpreendentemente, propostas de retorno a um método fônico como solução para os problemas que se enfrentam na aprendizagem inicial da língua escrita pelas crianças. Cabe salientar, porém, que não é retornando a um passado já superado e negando avanços teóricos incontentáveis que esses problemas serão esclarecidos e resolvidos. Por outro lado, ignorar ou recusar a crítica aos atuais pressupostos teóricos e a insuficiência das práticas que deles tem decorrido resultará certamente em mantê-los inalterados e persistentes. Nesta perspectiva, surge letramento, que, segundo Kleiman não está ainda dicionarizada define letramento como um contraponto ao conceito de alfabetização, segundo ela os dois conceitos se alternam e se completam. Percebe-se que quando se discute qual é a melhor maneira de ensinar, a ler e escreve busca um método mais práticos que venha suprir tal necessidade de alfabetizar. Existem vários métodos para ensinar escrever. O que ocorre é que quando o professor lança mão de um método para alfabetizar não leva em conta se esse método realmente vai suprir a necessidade do aluno a ser alfabetizado, centra-se apenas no ato de codificar e decodificar os sinais e os sons, como diz Paulo Freire: deve levar o aluno a refletir sua vida no mundo, não deixando se levar pela a educação bancária que aplica o conhecimento, a educação deve se esforçar para desmascarar a realidade para que o aluno possa interferir de forma crítica na sua realidade, a “educação é uma forma de intervenção no mundo ‘(Freire, 2000)’”. Atualmente a educação está caminhando para alfabetizar. No processo de alfabetizar e letrar é imprescindível que os educadores tenham claros tais conceitos, pois alfabetização é um processo especifico e indispensável de apropriação do sistema da escrita, a conquista dos princípios alfabético e ortográfico que possibilita ao educando ler e escrever com autonomia e letramento é o processo de inserção e participação na cultura escrita, processo este que tem inicia quando a criança começa a conviver com as diferentes manifestações da escrita na sociedade e se prolonga por toda a vida, com a crescente possibilidade de participação nas práticas sociais que envolvem a língua escrita. 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS É preciso mudar o aprender, e isto demanda tempo, talvez muito tempo, que não acontece de uma hora para outra, porque requer forças de muitos segmentos, segmentos estes que na maioria extrapolam o ambiente escolar. Como o social, econômico, tecnológico, político e muitos caminham alheios aos objetivos da educação. O desafio da escola atual está em sua contribuição à redefinição dos saberes e dos valores aptos a participar dos processos de construção de novos cenários, num mundo ao mesmo tempo global e intercultural. Nota-se que a situação é real, porque há escolas que não oferecem formação contínua para os seus professores, mas que também há profissionais que não planejam adequadamente o processo de alfabetização. Seus métodos utilizados na prática pedagógica e a forma como são conduzidas na sala de aula, não adaptam com o contexto social onde os alunos estão inseridos. Diante dos problemas que enfrentamos no processo educacional, especialmente na alfabetização das séries iniciais, necessitamos de soluções que ajudem na construção do conhecimento com educação de qualidade que prepare o ser humano para a vida, pois as atividades de fala, escrita e leitura são muito importantes nesse processo. Também não se deve pensar que todas as informações, pesquisas e experiências necessárias à prática docente já estejam analisadas. É fundamental que o tema da alfabetização esteja sempre presente nas reflexões sobre a prática pedagógica, nos questionamentos, nas pesquisas, nos seminários, livros e artigos, para que a educação não seja só privilégio de poucos, mas tenha valor na vida de todas as pessoas de nossa sociedade. 5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CORTEZ. Reflexões sobre Alfabetização. Tradução Horácio Gonzáles (et.al.). 24. ed. São Paulo, 2001. FERREIRO, Emília e TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. FERREIRO, Emilia. Reflexões Sobre Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1985. FEIL, Iselda T. Sausen. Alfabetização: Um Diálogo de Experiências. 2.ed. rev. e ampl. – Ijui: Unijui, 2004.136 p. ____,Iselda T. Sausen. Didática da Alfabetização. Apostila. Ijuí: UNIJUI, 2011. GARCIA, Regina Leite (org.). Novos Olhares Sobre a Alfabetização. São Paulo: Cortez, 3ªed., 2008. ______,Sonia(org). Alfabetização: Dilemas da Prática. RJ: Dois Pontos, Ed Ltda, 1986. Professora Especialista Nilza Ivete Cabreira Fanaia. Professora graduada em Pedagogia pela Faculdade de Educação de Tangará da Serra, Especialista e Interdisciplinaridade na Educação Básica. Lotada na Escola Municipal de Educação Básica “13 de Maio”. Em Nova Olímpia - MT