secretaria de saúde do estado do ceará hospital geral de fortaleza

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SECRETARIA DE SAÚDE DO ESTADO DO CEARÁ
HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA
PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM GINECOLOGIA E
OBSTETRÍCIA
GENETTY KELLYNE ABREU REIS SANTIAGO
COLETÂNEA EM GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA
VOLUME IX
FORTALEZA-CE
2016
GENETTY KELLYNE ABREU REIS SANTIAGO
COLETÂNEA EM GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA
Monografia submetida à Coordenação do Programa
de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia,
do Hospital Geral de Fortaleza, como requisito
parcial para obtenção do título de especialista em
Ginecologia e Obstetrícia, sob a orientação do Prof.
Dr. Joaquim Luiz de Castro Moreira.
FORTALEZA- CE
2016
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter colocado este sonho em meu coração e ter-me
dado a Graça de alcançá-lo.
Aos meus pais, por todo incentivo e investimento em minha
formação e por terem sido um exemplo de honestidade, generosidade e amor.
Ao meu amado esposo, por compreender e me apoiar na árdua
rotina da Medicina.
Ao Dr. Ananias, meu primeiro supervisor na residência, por ter
me recebido tão bem e me deixado tão à vontade neste hospital que seria minha casa
pelos próximos três anos; por ter sido não só um preceptor, mas um verdadeiro irmão
em Cristo, que tanto me apoiou espiritualmente.
Ao Dr. Joaquim, supervisor da residência e chefe do serviço de
Obstetrícia, por toda sua dedicação a nós e por todo conhecimento que nos foi passado.
Aos meus preceptores, que, tão pacientemente, dedicaram seu
tempo e energia para transmitir conhecimentos valiosos.
Às minhas queridas colegas de residência, já promovidas a
amigas, com todo o peso do significado dessa palavra, obrigada pela amizade,
companheirismo, altruísmo, conhecimento compartilhado e por fazerem desses três anos
um tempo que lembrarei com profunda saudade.
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO............................................................................................................5
2- HIPERÊMESE GRAVÍDICA......................................................................................6
3- APENDICITE AGUDA..............................................................................................12
4- PANCREATITE AGUDA..........................................................................................15
5- NEFROLITÍASE.........................................................................................................18
6- VULVOVAGINITES..................................................................................................26
7- DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA..................................................................34
8- PATOLOGIAS BENIGNAS DA VULVA E DA VAGINA....................................42
1 INTRODUÇÃO
Do sonho, do trabalho e da dedicação de residentes e
preceptores, nasceu esta coletânea de capítulos sobre assuntos da prática clínica em
Ginecologia e Obstetrícia.
Foram selecionados assuntos diversos e muito prevalentes não
só no dia-a-dia do especialista, mas para todos que prestam assistência a mulheres.
Dessa forma, o Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Geral de Fortaleza,
prezando pelo papel dessa instituição de ensino, contribui com um acervo atualizado e
de temas relevantes para acadêmicos, internos, residentes e preceptores, bem como para
profissionais da Atenção Básica à Saúde.
Três livros foram lançados a partir dessa coletânea de capítulos:
Temas em Obstetrícia – Manual de Condutas para Médicos e Estudantes de Medicina e
Manual de Intercorrências Clínicas na Gestação, pela EdUECE; e Protocolos de
Obstetrícia – compilado dos dois livros anteriores, editado e publicado pela Secretaria
de Saúde do Estado do Ceará. Estão em fase de revisão o livro Temas em Ginecologia e
a segunda edição do livro Temas em Obstetrícia.
2
2.1
HIPERÊMESE GRAVÍDICA
Definição
É uma síndrome caracterizada por:
- Náuseas e vômitos;
- Perda de peso (>5% do peso pré-gestacional);
- Desidratação;
- Distúrbio hidroeletrolítico;
- Icterícia (formas graves);
- Cetose e cetonúria.
Tais sintomas estão presentes na ausência de entidades mórbidas
específicas. Esta síndrome se inicia antes da 20ª semana de gestação, mais comumente
entre a 6ª e a 14ª semanas.
2.2
Epidemiologia
- Náuseas e vômitos acontecem em 70–80% das mulheres grávidas; hiperêmese
gravídica acontece em apenas 0,5–2%.
- 2 : 1.000 gestantes.
- Pode associar-se com malformações: triploidia, trissomia do 21 e hidropsia fetal.
2.3 Fatores de risco
- Aumento de massa placentária (Doença Trofoblástica Gestacional
ou gestação
múltipla);
- História pessoal e familiar de hiperêmese gravídica;
- Primigestação;
- Idade < 30 anos;
- Obesidade.
2.4 Etiopatogenia
Ainda desconhecida. Há indícios de que os seguintes fatores
estejam envolvidos:
- Fatores endócrinos: a exacerbação clínica da hiperêmese está comumente associada ao
pico de secreção de hCG. O estrogênio e a progesterona também parecem estar
implicados na gênese dos sintomas.
- Fatores imunológicos: o organismo materno reagiria a uma substância antigênica no
centro do vômito e no trato gastrointestinal.
- Fatores psicossomáticos: a hiperêmese pode estar relacionada com uma alteração
comportamental materna em relação ao meio que envolve a paciente, por exemplo,
rejeição da gravidez, não aceitação da maternidade, perda da liberdade, rejeição ao
cônjuge, autopunição e imaturidade emocional da gestante.
- Fatores infecciosos: a presença do Helicobacter pylori em gestantes com hiperêmese
gravídica pode configurar uma associação com a etiologia desta morbidade .
2.5 Diagnóstico
- História: náuseas e vômitos, geralmente iniciados antes de 9 semanas de gestação;
história clínica de exclusão de outras morbidades .
- Exame físico: ausência de febre, dor ou de sinais neurológicos; observar sinais de
desidratação.
- Testes laboratoriais: enzimas hepáticas, bilirrubinas, amilase e lípase pancreáticas
podem estar levemente aumentadas; distúrbios hidroeletrolíticos, como hipocalcemia,
hiponatremia, alcalose metabólíca hipoclorêmica; o sumário de urina pode evidenciar
cetonúria.
2.6 Diagnóstico diferencial
- Gastroenterite;
- Apendicite;
- Pielonefrite;
- Hepatite;
- Pancreatite;
- Esteatose hepática;
- Obstrução intestinal;
- Litíase biliar;
- Hérnia de hiato;
- Nefrolitíase;
- Doença vestibular;
- Enxaqueca;
- Distúrbios psicossomáticos;
- Intoxicações exógenas;
- Neuropatias;
- Tumores cerebrais;
- Hipertireoidismo;
- Cetoacidose diabética;
- Doença de Addison;
- Pré-eclâmpsia;
- Doença trofoblástica gestacional;
- Torção anexial.
2.7 Tratamento
2.7.1
Medidas gerais:
- Internação;
- Controle de peso e diurese;
- Jejum de 24 a 48h; após estabilização do quadro, mudar progressivamente a
dieta para inicialmente líquida, depois sólida, branda, pobre em lipídios e rica
em carboidratos;
- Hidratação parenteral (a depender do grau de desidratação);
- Evitar medicamentos a base de sais de ferro por favorecerem o aparecimento
ou recrudescimento de náuseas, vômitos e dor epigástrica;
- Reposição venosa de vitaminas B6, C, K e tiamina.
2.7.2
Medicamentos:
2.7.2.1
Reposição hidroeletrolítica
- Primeiras 24 horas (sequenciais):
1000 ml de SF 0,9% em 2h, com 20mmol de KCl;
1000 ml de SF 0,9% em 4h com 20 mmol de KCl;
1000 ml de SF 0,9% em 6 h;
1000 ml de SF 0,9% em 8 h;
1000 ml de SF 0,9% em 8h (manutenção);
Reposição de potássio de acordo com os níveis séricos;
Evitar soluções com alta concentração de glicose;
Evitar reposição vigorosa de sódio;
Não exceder 6000 ml de solutos por dia;
2.7.2.2
Piridoxina (Vitamina B6): é a droga mais segura, utilizada na dose de
10 a 25mg a cada 8 horas.
2.7.2.3
Antieméticos: 1ª escolha
Metoclopramida: 10 a 20mg, EV, de 6/6h;
Bromoprida: 10 a 20 mg, EV, de 6 / 6 h;
Dimenidrinato: 50mg, EV, de 6/6h;
Prometazina: 25mg, IM, de 8/8h;
Ondansetron (em casos graves): 4 a 8mg, EV, até de 6/ 6 h.
2.7.2.4
Sedativos: 2ª escolha
Levomepromazina (solução a 4%) - 3gts (6mg), VO, de 8/8h;
Diazepam 5mg, VO, ou 10mg, EV, até de 8/8h.
2.7.2.5
Corticosteróides: 3ª escolha
Metilprednisolona 16mg, EV, de 8/8h (evitar o uso antes de 10
semanas)
2.7.3
Tratamento hospitalar complementar:
2.7.3.1
Nutrição parenteral.
2.7.4 Outras modalidades de tratamento:
2.7.4.1
Psicoterapia;
2.8
2.7.4.2
Acunputura;
2.7.4.3
Vitamina B12 e gengibre.
Complicações
- Depressão;
- Encefalopatia de Wernicke;
- Síndrome de Mallory-Weiss;
- Rotura de esôfago com pneumomediastino;
- Insuficiência renal aguda;
- Mielinólise pontina.
2.9
Bibliografia consultada:
CHAVES NETTO, H.; SÁ, R.A.M.; OLIVEIRA, C.A. Gemelidade. In: CHAVES
NETTO, H.; SÁ, R.A.M.; OLIVEIRA, C.A. Manual de Condutas em Obstetrícia. 3.ed.
Rio de Janeiro: Atheneu, 2011, p. 75-78.
NIEBYL,J.R. Nausea and Vomiting in Pregnancy. N Engl J Med. V.363, 2010, p.15441550.
ZUGAIB, M.; NOMURA, R.M.Y. Hiperêmese gravídica. In: MONTENEGRO, C.A.B.;
REZENDE FILHO, J. Rezende obstetrícia. 12.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2013, p.326-338.
3 APENDICITE AGUDA
3.1
Introdução
Constitui a principal complicação não obstétrica cirúrgica na
gravidez, ocorrendo em uma a cada 1000 gestações. O diagnóstico nessa situação pode
ser mais difícil, devido à alta prevalência de desconforto abdominal nas gestantes
normais, às alterações anatômicas relacionadas ao aumento do volume uterino e à
leucocitose fisiológica da gravidez. É responsável pelo aumento na frequência de
quadros de abortamento e de parto prematuro
.
3.2
Quadro Clínico
O início do processo se apresenta com dor abdominal localizada
próximo ao umbigo que, a seguir, instala-se na fossa ilíaca direita. Acompanha-se,
amiúde, de náuseas, vômitos, febre baixa, taquisfigmia e parada da eliminação de gases.
Pode haver distensão abdominal com sinais de irritação peritoneal (sinal de Blumberg)
em nível de fossa ilíaca direita, no ponto de McBurney.
Contudo, algumas pacientes podem não ter uma apresentação
clássica, com queixa de pirose, irregularidade intestinal, flatulência, mal-estar ou
diarreia. Um apêndice de localização pélvica, por exemplo, pode ocasionar dor abaixo
do ponto de McBurney e levar a alteração da frequência urinária, disúria e sintomas
retais, como tenesmo e diarreia.
Na gestação, o sinal de Blumberg pode não ser muito evidente,
pois o útero gravídico proporciona uma maior distância entre o apêndice inflamado e a
parede abdominal anterior. O aumento do volume uterino pode levar a uma migração
cefálica do apêndice cecal. No primeiro trimestre, o ponto mais doloroso do abdome
situa-se na fossa ilíaca direita em 90 % dos casos; no segundo trimestre em 75 % dos
casos, e apenas em 37 % dos casos no terceiro trimestre. Entretanto, acredita-se que, em
qualquer período da gravidez, dor persistente na fossa ilíaca direita sugere fortemente o
diagnóstico de apendicite aguda.
3.3
Exames complementares
3.3.1
Hemograma completo: leucocitose (> 16.000/ml), com desvio à esquerda, com
fuga de eosinófilos, é chamativo.
3.3.2
Sumário de urina: pode ajudar no diagnóstico diferencial de infecção do trato
urinário ou calculose urinária.
3.3.3
Amilase e lipase: marcadores sorológicos de pancreatite aguda podem ser úteis
nos quadros atípicos.
3.3.4
Ultrassom abdominal: além de servir para afastar outras patologias, localiza e
estuda a morfologia do apêndice.
3.3.5
Tomografia axial computadorizada e Ressonância nuclear magnética: podem ser
utilizadas em determinadas circunstâncias, mormente, em casos duvidosos.
3.4
Diagnóstico Diferencial
3.4.1
Patologias obstétricas: hiperêmese gravídica, gravidez tubária, rotura uterina,
abortamento infectado e descolamento prematuro de placenta.
3.4.2
Patologias ginecológicas: doença inflamatória pélvica aguda (DIPA), torção de
cisto de ovário, rotura de cisto de ovário, endometriose.
3.4.3
Patologias diversas: colelitíase, colecistite, pancreatite, trombose mesentérica,
ileíte, diverticulite, doença de Crohn, colite ulcerativa, litíase ureteral, rotura hepática,
rotura de baço, úlcera péptica perfurada, pneumonia, infarto do miocárdio, Síndrome de
Ogilvie.
3.5
Conduta
As complicações advindas do quadro de apendicite aguda na
gravidez são frutos da demora em tomar decisões corretas. Quando houver suspeita, não
se deve esperar mais que seis horas. Laparotomia branca ou laparoscopia diagnóstica
trazem menos malefício para o binômio materno-fetal do que as temíveis complicações,
tais como, apêndice perfurado, peritonite generalizada e sepse.
Em locais sem acesso a laparoscopia, deve ser realizada a
laparotomia exploradora com incisão da pele, em sentido transverso (Davis), oblíquo
(Mc Burney) ou longitudinal, seguida de apendicectomia clássica. Deve-se, a todo
custo, evitar a realização concomitante da cesárea. Ao longo dos tempos, a cesárea,
empregando-se uma metáfora, sempre foi considerada “a rainha” das cirurgias
obstétricas, dispensando a presença de “acompanhantes”.
A laparoscopia encontra sua maior aplicação nos dois primeiros
trimestres da gravidez, trazendo as vantagens de um pós-operatório mais ameno e um
menor tempo de internamento hospitalar. Na necessidade de prescrição combinada de
antimicrobianos, deve–se trocar a associação usual de Ciprofloxacino e Metronidazol
por Clindamicina e Gentamicina, com vistas ao bem–estar do concepto. Na presença de
abscesso pélvico, em paciente com risco de parto prematuro, convém tomar medidas
como usar tocolítico (Nifedipina) e administrar corticóide (Dexametasona ou
Betametasona) com vistas a acelerar a maturação pulmonar do concepto.
Paciente com apendicite aguda na vigência de trabalho de parto
deve parir, preferencialmente, por vias naturais, com fins de minimizar complicações.
3.6
Bibliografia consultada
BARTH, W. H.; GOLDBERG, J. E. Acute appendicitis in pregnancy. Uptodate, aug.
2013. Disponível em: < www.uptodate.com/pt/home >. Acesso em: 21 set. 2013.
VIEIRA, O.M. As indicações da cirurgia no ciclo gestativo. In: REZENDE FILHO, J.;
MONTENEGRO, C. A. B. Obstetrícia. 12ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara
Koogan. Cap 78, p. 807-814, 2013.
ZUGAIB, M. Obstetrícia. 2ª Edição. São Paulo: Editora Manole, 2012.
4 PANCREATITE AGUDA
4.1
Introdução
A pancreatite aguda constitui uma complicação rara na gravidez
e que evidencia nítida associação com o aumento da mortalidade materna e perinatal.
Considera-se a terceira causa de abdome agudo não obstétrico durante a gestação. As
outras duas são a apendicite aguda e a colecistite aguda.
Os mais prevalentes fatores associados aos quadros de
pancreatite aguda durante a gravidez são: cálculos biliares (66%), etilismo (12%),
natureza idiopática (17%), hiperlipidemia (4%) e, menos comumente, trauma,
hiperparatiroidismo e esteatose hepática aguda da gravidez.
Obesidade (IMC>30Kg/m²), resistência à insulina,
baixos
níveis de HDL e hipertrigliceridemia formam os principais fatores de risco para o
aparecimento de cálculos biliares em gestantes. O consumo de álcool mostra associação
com o desencadear de quadro de pancreatite aguda no ciclo gestatório, podendo
favorecer ao surgimento de abortamento, malformações fetais e restrição do
crescimento fetal.
4.2
Diagnóstico
Os sintomas da pancreatite aguda na gravidez manifestam–se de
formas variadas, sendo o mais predominante deles a dor abdominal superior,
principalmente em epigástrio, com irradiação para a região lombar (em cerca de 40%
dos casos), podendo ainda se destacar febre, náuseas e/ou vômitos. A duração dos
sintomas pode variar de poucos dias a semanas. Em casos graves aparecem taquicardia,
hipotensão arterial, taquidispneia e o sensório pode se mostrar rebaixado em nível de
semicoma. A icterícia, ocasionalmente, apresenta-se. Pode haver rigidez muscular
discreta a moderada no abdome superior. Os ruídos hidroaéreos podem estar
diminuídos. Sinais de Gray Turner e Cullen se caracterizam por equimoses nos flancos
e região umbilical, respectivamente, e indicam extravasamento de exsudato
hemorrágico. O diagnóstico de pancreatite aguda na gravidez é confirmado pelo
aumento da amilase sérica e/ou da atividade da lipase. O hemograma pode mostrar
leucocitose. Os níveis séricos de glicose, bilirrubinas e enzimas hepáticas podem estar
normais ou aumentados. Em casos de pancreatite aguda, os níveis séricos de
triglicerídeos e colesterol estão, com frequência, elevados. Na pancreatite aguda
alcoólica durante a gravidez, a atividade da G-glutamil-transpeptidase (Gama-GT)
encontra-se aumentada.
A ultrassonografia de abdome total, os níveis séricos de
triglicerídeos e o cálcio ionizado podem auxiliar na detecção da etiologia da pancreatite
aguda da gravidez (Tabela 01).
Tabela 01 – Exames diagnósticos associados às etiologias mais prováveis de pancreatite
aguda na gravidez (PAG).
Exames Diagnósticos
Achados para PAG
Etiologia Provável
Ultrassonografia abdominal Cálculos biliares
Colelitíase
total
Níveis
séricos
de > 5000 mg/dL
Hipertrigliceridemia
triglicerídeos
Níveis séricos de Cálcio >10,5mg/dL
Hiperparatireiodismo
total
A
Colangiopancreatografia
por
Ressonância
Magnética
(CPRM), sem meio de contraste (gadolíneo), pode ser considerada no caso de resultados
inconclusivos verificados pelo ultrassom abdominal. Tal propedêutica apresenta
sensibilidade superior a 90%, além do que, não acarreta riscos de exposição materna ou
fetal à radiação ionizante. A ultrassonografia endoscópica apresenta maior
especificidade em relação à visualização da coledocolitíase e microcálculos, contudo,
deve ser realizada sob anestesia geral. A indicação da Tomografia Computadorizada
deve ser considerada com reserva em gestantes, por conta da presente radiação
ionizante.
4.3
Conduta
A instituição de hidratação endovenosa faz-se necessária,
havendo ocasiões em que pode estar associada à suplementação com terapia nutricional.
Dá-se preferência, na nutrição enteral, à via naso-jejunal, por ser relacionada à de menor
incidência de morbidade infecciosa quando em comparação com a nutrição parenteral.
Cumpre observar que o baixo teor de gordura indicado na nutrição enteral é favorável,
independente do fator etiológico da patologia. Nos casos de hipertrigliceridemia onde
não se obtém controle apenas com a dieta, o uso de ácidos graxos ômega 3 devem ser
utilizados. Não há benefício na prescrição de antibioticoprofilaxia na presença de
pancreatite aguda da gravidez, de um modo geral.
Em casos de pancreatite necrotizante, o uso de antibióticos
carbapenêmicos (Imipenem e meropenem) encontra guarida (nível de evidência C na
gravidez). Não há estudos que mostrem a necessidade de ajuste de dose de tais fármacos
na gravidez. Por isso, observar a relação risco-benefício na aplicação de tais drogas.
Normalmente, as doenças das vias biliares em gestantes
sintomáticas são manuseadas de forma conservadora. No entanto, 50% destas podem
apresentar formas recorrentes de pancreatite biliar. Nesses casos, a colecistectomia
laparoscópica encontra plena indicação, na presença de sintomas sugestivos de
gravidade, tais como icterícia obstrutiva e peritonite. Considera-se tal procedimento
seguro em todos os trimestres da gravidez.
4.4
Bibliografia consultada
SAMARAEE, A. A.; MCCALLUM, I. J.; et. al. Nutritional strategies in severe acute
pancreatitis: a systematic review of the evidence. The Surgeon. v. 8, p. 105–110, 2010.
BOAKYE, M.K.; MACFOY, D.; RICE, C. Alcoholic pancreatitis in pregnancy. J
Obstet Gynaecol. v. 26, p. 814, 2006.
PORRAS, L. T. C.; NAPOLI, E. D.; et. al. Minimally invasive management of acute
biliary tract disease during pregnancy. HPB Surg. v. 2009, p. 1-3, 2009.
CRISAN, L. S.; STEIDL, E. T.; RIVERA-ALSINA, M. E. Acute hyperlipidemic
pancreatitis in pregnancy. Am J Obstet Gynecol. v. 198, p. 57-59, 2008.
EDDY, J.J.; GIDEONSEN, M.D. et. al. Pancreatitis inpregnancy. Obstet Gynecol. v.
112, p. 1075–1081, 2008.
FLORENTIN, M.; LIBEROPOULOS, E.N. et. al. Multiple actions of high-density
lipoprotein. Curr Opin Cardiol. v. 23, p. 370–378, 2008.
KEEGAN, J.; PARVA, M. et. al. Addiction in pregnancy. J Addict Dis. v. 29, p. 175191, 2010.
PIERCY, C.N.; CROOK, M.A. Severe hypertriglyceridemia complicating pregnancy,
management by dietary intervention and omega-3 fatty acid supplementation.
Nutrition. v. 25, p. 1098-1099, 2009.
RAMIN, K.D.; RAMIN, S.M. Acute pancreatitis in pregnancy. Am J Obstet Gynecol.
v. 173, p. 187-191, 1995.
ROUMIEU, F.; PONCHON, T. Acute pancreatitis in pregnancy: place of the different
explorations
(magnetic
resonance
cholangiopancreatography,
endoscopic
ultrasonography) and their therapeutic consequences. Eur J Obstet Gynecol Reprod
Biol. v. 140, p. 141-142, 2008.
5 NEFROLITÍASE
5.1
Introdução
A nefrolitíase trata-se de uma doença comum que afeta cerca de
10% da população durante a vida. Na gestação, apresenta-se como uma patologia com
potencial razoável de complicação, tanto para o compartimento materno quanto para o
fetal. A dor abdominal crusciante relacionada a essa condição se apresenta como a causa
mais comum de internação não obstétrica durante a gravidez.
5.2 Epidemiologia
A urolitíase sintomática apresenta uma prevalência variável de 1
em 244 a 1 em 2000 gestações. A sua incidência é semelhante entre mulheres gestantes
e não gestantes, explicada pela duração fugaz do ciclo gravídico, assim como a presença
de fatores inibidores da litogênse como o citrato, magnésio e glicosaminoglicanos. Os
cálculos ureterais são encontrados duas vezes mais frequentemente que os cálculos
renais. Dentre os tipos de cálculos, destacam-se os formados por fosfato de cálcio como
os mais prevalentes, ao contrário dos cálculos de oxalato de cálcio formados pelas
pacientes não grávidas.
5.3 Fatores de risco
Cerca de 80 a 90% das gestantes acometidas por nefrolitíase
apresentam-se no segundo e terceiro trimestres, com um risco 3 vezes maior em
multíparas. Pacientes de raça caucasiana, com história de doença renal e hipertensão
arterial têm uma propensão maior à litogênese. Um fato curioso é que pacientes com
história de nefrolitíase não apresentam risco adicional durante a gravidez (incidência de
24 a 30%).
5.4 Fisiopatologia
O aumento do fluxo plasmático renal e da carga filtrada de
cálcio, oxalato e ácido úrico são todos responsáveis pela litogênese na gravidez. Os
altos níveis de progesterona contribuem para a dilatação do músculo liso e redução no
peristaltismo ureteral, facilitando a estase urinária litogênica. Existe ainda o fator
compressivo representado pela dextrorrotação uterina e pelo aumento do volume
uterino.
5.5 Complicações na gestação
A nefrolítiase favorece à instalação de infecção do trato urinário
na gravidez. Esta morbidade, por si, predispõe ao desencadeamento do trabalho de
parto prematuro, amniorrexe prematura, parto prematuro, distúrbios hipertensivos,
diabetes gestacional e aumento das taxas de parto abdominal.
5.6 Diagnóstico clínico
Dor abdominal em flanco consiste no sintoma mais comum,
ocorrendo em 85 a 100% das pacientes. Náuseas e vômitos são achados inespecíficos
com grau de apresentação variado. Hematúria franca é flagrada em 15 a 30% dos casos
e hematúria microscópica mostra-se presente em praticamente todas as pacientes (95100%). Sintomas urinários como disúria e piúria podem estar presentes, mesmo na
ausência de uma infecção concomitante.
Ainda representa um desafio devido a modificações presentes
em fatores como anatomia e fisiologia do período gestacional. A hidronefrose
fisiológica pode ser vista em até 90% dos casos no rim direito e 67% no rim esquerdo.
5.7
Exames complementares
A análise urinária faz-se obrigatória para avaliar a hematúria,
leucocitúria (que pode estar presente nas infecções associadas) e pH (quando baixo,
sugerindo cálculos de ácido úrico; quando alto, sugerindo cálculos de fosfato de cálcio,
oxalato de cálcio ou estruvita). No caso de infecção associada, a urinocultura pode
ajudar na identificação do patógeno causador. O hemograma completo pode revelar
sinais de anemia ou leucocitose importante nos quadros de infecção sistêmica. Níveis
séricos de uréia e creatinina alterados auxiliam na definição do comprometimento renal.
A dosagem de potássio pode sugerir uma outra patologia associada (baixo nas acidoses
tubulares renais tipos 1 e 2; e alto na insuficiência renal por obstrução).
A ultrassonografia (US) do trato urinário constitui uma valiosa
propedêutica para investigação da nefrolitíase, pelo seu baixo custo, elevada
acessibilidade e por não utilizar radiação ionizante. Possui uma sensibilidade bastante
variável (28,5 a 95%) devido ao fato de ser observador-dependente, gerando uma taxa
considerável de falsos positivos, pois mostra-se incapaz de diferenciar uma obtsrução
ureteral secundária à litíase de uma hidronefrose fisiológica.
O US com Doppler é capaz de evidenciar sinais de nefrolítiase
pelo elevado índice de resistência dos vasos na área acometida e a ausência de jatos
ureterais.
A radiografia, a pielografia intravenosa e a tomografia
computadorizada são pouco utilizadas devido à radiação ionizante, porém já existem
trabalhos mostrando a segurança para o feto nos níveis de radiação emitidos por essas
modalidades diagnóticas.
A ressonância nuclear magnética (RNM) utiliza ondas
eletromagnéticas em lugar da radiação ionizante, sem efeitos nocivos para a gestante ou
seu concepto. Quando a ultrassonografia não ajuda no diagnóstico correto de um
problema do aparelho urinário, o passo seguinte é a realização de uma RNM. Segundo o
Colégio Americano de Radiologia, as gestantes podem ser submetidas a este exame em
qualquer fase da gravidez, no entanto, não é garantida uma segurança absoluta no
primeiro trimestre, que corresponde à fase da organogênese fetal.
Na RNM, os cálculos aparecem como espaços vazios que se
sobrepõem ao intenso sinal gerado pela urina no interior de um ureter dilatado. Existem
ainda alguns sinais que sugerem hidronefrose patológica ao invés de fisiológica, como o
final abrupto do ureter (ao contrário do afilamento em forma de cone ao nível da
cavidade pélvica) e edema periureteral.
Outros benefícios da RNM incluem a capacidade de realizar
diagnóstico diferencial com outras condições como apendicite e torção de ovário, além
de revelar sinais de complicação da nefrolitíase como a pielonefrite (edema
perinefrético). As desvantagens deste método incluem a falta de precisão na evidência
do cálculo propriamente dito, alta sensibilidade aos movimentos do paciente,
disponibilidade limitada, alto custo e desencadeamento da sensação de claustrofobia em
algumas pacientes.
5.8
Diagnóstico diferencial
Patologias inflamatórias que acometem o peritônio podem
simular uma cólica nefrética, como a apendicite aguda ou a diverticulite.
5.9 Tratamento
5.9.1
Terapia expectante com suporte
Segundo a literatura, a maioria dos cálculos ureterais
sintomáticos durante a gravidez podem ser expelidos de forma espontânea, facilitado
pela dilatação do trato urinário durante este período. É descrita uma taxa de 64 a 84% de
resolução dos casos com terapia conservadora.
Em relação à farmacoterapia, o paracetamol e os opiáceos são as
drogas de primeira escolha. Os AINES serão utilizados com cautela, principalmente a
partir de 34 semanas de gravidez, pois podem induzir a quadros de oligoidrâmnio,
restrição do crescimento fetal, fechamento precoce do ducto arterial e hipertensão
pulmonar.
Portanto,
a
conduta
inicial
baseia-se
em:
administrar
analgésicos, hidratação adequada, repouso no leito e antibioticoterapia quando
necessário.
5.9.2
Antibioticoterapia
Aproximadamente 50% das gestantes que cursam com
nefrolitíase apresentam infecção urinária associada. Escherichia coli, Klebsiella e
Enterobacter constituem 90% da etiologia. Os antibióticos considerados seguros na
gestação incluem as cefalosporinas, penicilinas e nitrofurantoína, constituindo o alicerce
do tratamento. Cada paciente deve ser abordada individualmente, com base nos
resultados da urinocultura para antibioticoterapia dirigida.
5.9.3
Abordagem intervencionista
Infelizmente, cerca de 15 a 30% das pacientes acabam
necessitando de algum tipo de abordagem mais invasiva. As indicações de intervenção
são baseadas nos seguintes critérios: dor intensa, obstrução de rim único, obstrução
bilateral, função renal alterada, cálculo > 1cm, sepse e complicações obstétricas (ex:
trabalho de parto prematuro ou pré-eclâmpsia).
5.9.3.1
Cateter duplo J (CDJ) e Nefrostomia percutânea (NTPC)
Classicamente, o CDJ está indicado antes das 22 semanas de
gestação e a NTPC após esse período. A NTPC está especialmente indicada nos casos
de sepse em que a drenagem da via urinária se torna imperativa e a excessiva
manipulação pode ser deletéria. O procedimento permite a coleta de urina para cultura,
produz mínimos sintomas do trato urinário inferior, evita a manipulação ureteral e
complicações associadas, além de estabelecer acesso para uma futura nefrolitotomia
percutânea.
Os efeitos indesejados do CDJ e da NTPC incluem a sua
migração, exacerbação da dor, obstrução e infecção. Portanto, como desvantagens,
ambos podem trazer morbidade adicional, efeitos adversos à gestação e prejuízos à
qualidade de vida da paciente. Adicione-se a necessidade de troca a cada 4 a 6 semanas
pela incrustação desproporcional dos dispositivos associada a hipercalciúria e
hiperuricosúria). Uma abordagem definitiva faz-se necessária no período pós-parto.
5.9.3.2 Ureteroscopia (URCP)
A URCP com holmium laser para realização de litotripsia é tida
como o procedimento de escolha na falha da terapia conservadora. Ela permite a
redução do tempo de internação em comparação à passagem do CDJ ou realização de
NTPC, além de permitir a visualização completa do ureter e pelve renal, pois a
ureterohidronefrose gestacional facilita a manipulação. Ainda permite um diagnóstico e
terapêutica precisos e definitivos, com taxa de resolução entre 70 e 100%. O holmium
laser tem uma penetração muito limitada (0,5 a 1mm), tornando-se bem tolerado pelos
tecidos adjacentes e reduzindo a possibilidade de danos fetais.
Os estudos revelam que, em mãos experientes, o risco da URCP
na gravidez não difere do risco em pacientes não grávidas, mostrando ser um
instrumento seguro na gestação.
As contra-indicações a este procedimento incluem cálculos
maiores que 1cm, múltiplos cálculos, sepse, rim transplantado ou rim único (contraindicação relativa).
Uma potencial desvantagem deste método revela-se na
utilização de anestesia geral para sua execução. Entretanto, existem estudos em que a
URCP foi realizada com sucesso utilizando anestesia local ou regional sem
complicações.
5.9.3.3 Nefrolitotomia percutânea (NLPC)
A NLPC não é mais recomendada durante a gestação por conta
de seus efeitos deletérios sobre o concepto, como maior tempo operatório e utilização
de doses elevadas de fluoroscopia.
5.9.3.4 Litotripsia extracorpórea (LECO)
A LECO não é indicada durante a gestação pelos efeitos
deletérios das ondas de choque sobre o feto, com consequente aumento das taxas de
malformações congênitas, abortamento, descolamento prematuro da placenta e morte
fetal intra-útero.
5.9.3.5 Cirurgia aberta
A cirurgia aberta não é aconselhável, à exceção de casos de
pacientes com urosepse, onde não há disponibilidade de procedimentos urológicos ou
de profissional capacitado para utilizar os procedimentos anteriormente descritos.
Gestante apresentando
nefrolítiase
Cólica nefrética incontrolável,
vômitos persistentes, sinais de
infecção,
> 1cm, função
Falhacálculo
no tratamento
renal alterada,
obstrução renal
Conservador
bilateral, rim único, complicações
obstétricas.
Não
Sim
Falha no tratamento conservador
Tratamento conservador
Intervenção necessária
Sim
Drenagem necessária com
nefrostomia ou cateter
duplo J
Febre / infecção, cálculo de
grandes proporções, múltiplos
cálculos, anatomia do trato
urinário alterada, doença bilateral,
complicações obstétricas,
inexperiência do urologista,
recursos inadequados
Não
Oferecer Ureteroscopia
(Fonte própria)
5.10
Bibliografia consultada
Ashley E. Ross, Shelly Handa, James E. Lingeman, Brian R. Matlaga. Kidney stones
during pregnancy: an investigation into stone composition. Urol Res. 2008
May; 36(2): 99 – 102.
Shalom J. Srirangam, B. Hickerton, B. Van Cleynenbreugel. Management of urinary
calculi in pregnancy: a review. J Endourol. 2008 May; 22(5): 867 – 875.
Matei Andreoiu, Ross MacMahon. Renal colic in pregnancy: lithiasis or
physiological hydronephrosis? Urology. 2009 October; 74(4): 757 – 761.
Semins MJ, Trock BJ, Matlaga BR. The safety of ureteroscopy during pregnancy: a
systematic review and meta-analysis. J Urol 2009 January; 181:139 – 143.
Management of stone disease in pregnancy. Michelle J. Semins, Brian R. Matlaga.
Curr Opin Urol. 2010 March; 20(2): 174 – 177.
Urologic Emergencies in Pregnancy. Anil A. Thomas, Arun Z. Thomas, Steven C.
Campbell, and Jeffrey S. Palmer. Urology. 2010 January; 76(2): 453 – 460.
Nephrolithiasis during pregnancy: characteristics, complications, and pregnancy
outcome. Eran Rosenberg, Ruslan Sergienko, Sara Abu-Ghanem, Arnon Wiznitzer,
Igor Romanowsky, Endre Z. Neulander, Eyal Sheiner. World J Urol. 2011 April; 29:
743 – 747.
Imaging of stone disease in pregnancy. Gabriele Masselli, Martina Derme, Francesca
Laghi, Elisabetta Polettini, Roberto Brunelli, Maria Luisa Framarino, Gianfranco
Gualdi. Abdom Imaging. 2013 June. Epub ahead of print.
Kidney Stones and Pregnancy. Michelle J. Semins and Brian R. Matlaga. Adv
Chronic Kidney Dis. 2013 May; 20(3): 260 – 264.
6- VULVOVAGINITES
6.1
Introdução
A vulvovaginite é qualquer manifestação inflamatória e/ou
infecciosa do trato genital feminino inferior, caracterizada por corrimento vaginal
associado, ou não, a prurido, odor fétido, dispareunia ou disúria. A história clínica
sozinha geralmente é insuficiente para se estabelecer o diagnóstico, sendo necessários
exames complementares como: medida do pH Vaginal, teste das aminas, bacterioscopia
e cultura. Os principais tipos de vulvovaginites são: Vaginose Bacteriana (não
infecciosa), Tricomoníase, Vaginite por Cândida, Vaginite Inflamatória e Cervicite.
A presença de corrimento vaginal, nem sempre, significa
presença de uma infecção. São responsáveis pela composição do conteúdo vaginal
fisiológico: secreções das glândulas sebáceas, sudoríparas, de Bartholin e de Skene;
transudato da parede vaginal; células vaginais e cervicais esfoliadas; muco cervical;
líquidos endometriais e do oviduto; microorganismos e seus metabólitos. Podem variar
de acordo com o ciclo menstrual e a idade da mulher.
A microbiota vaginal é, predominantemente, aeróbica, sendo as
espécies mais comuns os Lactobacilos produtores de peróxido de hidrogênio,
responsáveis por manter o pH local abaixo de 4,5, o que inibe o crescimento de
bactérias patogênicas.
6.2
Vaginose Bacteriana
A Vaginose Bacteriana (VB) não é causada por nenhum agente
específico, e sim, por um desequilíbrio na flora vaginal normal, onde se observa
aumento exagerado de bactérias anaeróbias (Gardnerella vaginalis, Bacteroides sp,
Mobiluncus sp), associado a uma redução significativa dos Lactobacilos acidófilos. Não
pode, portanto, ser considerada uma doença sexualmente transmissível (DST).
Condições como múltiplos parceiros sexuais, uso de duchas, e relações sexuais sem
preservativos implicam nessa alteração da microbiota vaginal e, consequentemente, no
surgimento da VB.
A VB está associada a um maior risco de doença inflamatória
pélvica (DIP), infecções pós-operatórias da cúpula vaginal, citologia cervical anormal,
rotura prematura de membranas placentárias, trabalho de parto prematuro,
corioamnionite e endometrite pós-cesariana.
6.2.1
Diagnóstico
- Critérios de Amsel: presença de, pelo menos, três destes critérios
1) Corrimento branco, fino e homogêneo nas paredes vaginais;
2) pH vaginal > 4,5;
3) Presença de clue cells à microscopia;
4) Odor de peixe podre antes ou depois da adição de KOH 10% à amostra.
- Bacterioscopia através do sistema de NUGENT.
6.2.2 Quadro clínico
Observamos queixa de corrimento perolado, com odor fétido
(principalmente após o coito e a menstruação). Exame especular mostrando mucosas
vaginais íntegras, sem alterações ao teste de Schiller (em sua maioria), com corrimento
bolhoso, às custas das aminas voláteis.
6.2.2
Tratamento recomendado
- Metronidazol 500mg, via oral, 12/12h, por 7 dias OU
- Metronidazol gel 0,75%, um aplicador (5g) intravaginal, 1x/dia, por 5 dias OU
- Clindamicina creme 2%, um aplicador (5g) intravaginal, 1x/dia, por 7 dias
6.2.3
Tratamento alternativo
- Tinidazol 2g, via oral, 1x/dia, por 2 dias OU
- Tinidazol 1g, via oral, 1x/dia, por 5 dias OU
- Clindamicina 300mg, via oral, 12/12h, por 7 dias OU
- Clindamicina óvulos 100mg, intravaginal, 1x/dia, por 3 dias
Grávidas devem ser tratadas, pelas complicações associadas,
após teste microbiológico. De acordo com recomendações do CDC: Metronidazol
250mg, via oral, 8/8h, por 7 dias OU Clindamicina 300mg, via oral, 12/12h, por 7 dias.
Uma opção terapêutica diferente deve ser utilizada em caso de
recorrência. O tratamento do parceiro sexual não é recomendado, pois não há evidências
de uma melhor resposta terapêutica da mulher.
6.3
Tricomoníase
A tricomoníase é uma vaginite causada pelo protozoário
flagelado unicelular Trichomonas vaginalis, cuja principal via de transmissão é a
sexual. Possui uma alta taxa de transmissão (60 a 80%), e, em até 60% das mulheres,
está associada à Vaginose Bacteriana. Portadoras de tricomoníase têm um risco
aumentado de celulite de cúpula vaginal pós-histerectomia, rotura prematura de
membranas e parto pré-termo.
6.3.1
Diagnóstico
- Corrimento vaginal verde-amarelado, abundante, bolhoso, de odor fétido;
- Prurido e irritação vulvar;
- Colpite difusa e/ou focal (colo em framboesa);
- Secreção vaginal com pH > 5,0, normalmente elevando para 6,7 a 7,5;
- Exame a fresco que mostra o protozoário flagelado móvel;
6.3.2
Tratamento recomendado
- Metronidazol 2g, via oral, em dose única OU
- Metronidazol 250mg, via oral, 8/8h, por 7 dias OU
- Metronidazol 400mg, via oral, 12/12h, por 7 dias OU
- Tinidazol 2g, via oral, em dose única OU
- Secnidazol 2g, via oral, em dose única (sem comprovação em grandes ensaios clínicos
publicados, porém é utilizado há mais de 30 anos no Brasil, e alguns outros poucos
países, com eficácia demonstrada na prática clínica).
6.3.3
Observações acerca do tratamento
- O parceiro sexual também deve ser tratado.
- O metronidazol gel não deve ser usado no tratamento da tricomoníase (taxa de sucesso
< 50%).
- Pacientes que não responderem ao tratamento inicial devem ser tratadas com
Metronidazol 2g ou Tinidazol 2g, via oral, em dose única diária, durante cinco dias.
6.4 Candidíase vulvovaginal
A candidíase vulvovaginal (CVV) é uma infecção causada pela
Candida sp., um componente da flora vaginal em até 50% das mulheres assintomáticas.
Cerca de 80 a 90% dos casos são devidos à Candida albicans, podendo o restante ser
devido às espécies não albicans (glabrata, tropicalis, Krusei, parapsilosis e
Saccharomyces cerevisae). Estima-se que 75% das mulheres terão pelo menos um
episódio de CVV durante a vida, e 45% apresentarão dois ou mais episódios. A CVV
pode ser classificada como simples ou complexa. A recorrente é definida como quatro
ou mais episódios de CVV em um ano e pode estar associado à Candida não albicans.
As pacientes apresentam sintomas irritativos persistentes no vestíbulo e na vulva.
Alguns fatores predisponentes estão associados ao surgimento
do quadro: gravidez; Diabetes Mellitus descompensado; obesidade; contraceptivos orais
de alta dosagem; antibióticos, corticoides ou imunossupressores; higiene/vestuário
inadequados; substâncias alérgenas e/ou irritantes (talco, perfume, desodorante);
imunodeficiências.
6.4.1
Diagnóstico
- Corrimento branco, grumoso, com aspecto de “leite coalhado”;
- Placas branco-acinzentadas aderidas à mucosa vaginal e ao colo;
- Prurido vulvovaginal;
- Hiperemia, edema, fissuras na vulva;
- Disúria externa;
- Dispareunia ;
- pH vaginal < 4,5.
6.4.2
Tratamento
Fármacos de aplicação tópica do grupo dos azóis é o tratamento
mais frequente e proporciona alívio dos sintomas em 80 a 90% das pacientes. Os
sintomas, em geral, levam de dois a três dias para desaparecer.
6.4.2.1
CVV simples
- O fluconazol 150mg em dose única oral parece ter eficácia igual aos
azóis tópicos.
- Miconazol 2% creme intravaginal por 7 dias
- Clotrimazol 1% creme intravaginal por 3 dias
- Nistatina 100.000U intravaginal por 14 dias
- Clotrimazol 1% creme por 7 – 14 dias.
6.4.2.2
CVV complicada
- Sintomas recorrentes e/ou graves, causada por Candida não-albicans,
pacientes imunodeprimidas, devem receber uma dose adicional de
fluconazol 150mg após 72 horas da primeira dose, podendo ser
necessárias até três doses. Também podem ser tratadas com esquema
tópico prolongado (10 a 14 dias). Na CVV causada por Cândidas não
albicans, devem-se usar esquemas mais prolongados ou ácido bórico
(600mg em cápsula intravaginal por duas semanas). No alívio dos
sintomas irritativos, pode ser usada hidrocortisona creme 1%
externamente.
6.4.2.3
CVV recorrente
- Deve ser feita uma indução da remissão dos sintomas crônicos com o
seguinte esquema: fluconazol 150mg a cada três dias por três doses +
manutenção com fluconazol 150mg/semana durante 6 meses. Cerca de
50% das pacientes ficarão assintomáticas após a conclusão desse
esquema terapêutico.
6.5 Vaginite inflamatória
Trata-se de uma síndrome clínica caracterizada por vaginite
exsudativa difusa, esfoliação de células epiteliais e corrimento vaginal purulento
abundante. Difere da vaginose bacteriana pela inflamação presente.
6.5.1
Diagnóstico
- Ausência relativa de lactobacilos e sua substituição por cocos Gram-positivos, em
geral, estreptococos.
- Corrimento vaginal purulento, irritação vulvovaginal e dispareunia.
- Eritema e manchas equimóticas vulvovaginais, colpite macular.
- pH > 4,5
6.5.2
Tratamento
- Clindamicina creme 2%, um aplicador (5g) intravaginal, 1x/dia, por 7 dias
- Clindamicina creme 2%, um aplicador (5g) intravaginal, 1x/dia, por 14 dias, em caso
de recidivas
- Creme de corticoide pode ser associado.
- Recidivas em mulheres menopausadas: considerar terapia hormonal (TH), ou
estrógeno tópico.
6.6
Cervicite
O colo uterino é dividido em ectocérvice (revestida por epitélio
escamoso) e endocérvice (revestida por epitélio glandular). O epitélio ectocervical é
acometido pelos mesmos patógenos responsáveis pelas vaginites. Já o epitélio glandular
endocervical é mais comumente infectado pela N. gonorrhoeae e pela C. trachomatis.
A cervicite caracteriza-se pela presença de corrimento
endocervical purulento, denominado mucopus.
O tratamento do(s) parceiro(s) sexual(is) é mandatório, dando-se
preferência às opções terapêuticas em dose única.
6.6.1
Diagnóstico
- Coleta da secreção endocervical com swab, evidenciando-se material verde ou
amarelo, característico do mucopus.
- Zona de ectopia bastante friável à manipulação durante o exame.
- Número aumentado de neutrófilos na secreção do canal endocervical (>30 por campo).
- Presença de diplococos Gram-negativos intracelulares (diagnóstico presuntivo de
cervicite por gonococo).
- Teste de amplificação do ácido nucleico para se identificar gonorreia e clamídia.
6.6.2
Tratamento da Gonorreia
- 1ª opção: Ceftriaxona (250mg IM, dose única).
- 2ª opção: Cefixima (400mg VO, dose única) OU Doxiciclina (100mg VO, 12/12h, por
07 dias).
6.6.3
Tratamento da Clamídia
- 1ª opção: Azitromicina (1g VO, dose única) OU Doxiciclina (100mg VO, 12/12h, por
7 dias).
- 2ª opção: Estearato de eritromicina (500mg VO, 6/6h, por 7 dias) OU Tetraciclina
(500mg VO, 6/6h, por 7 dias) OU Ofloxacina (400mg VO, 12/12h, por 7 dias) OU
Levofloxacina (500mg VO, 1x/dia, por 07 dias).
- Gravidez: contraindicado doxiciclina, levofloxacina e ofloxacina.
6.7 Bibliografia consultada
Manual de controle das doenças sexualmente transmissíveis. Ministério da saúde, 2006.
Febrasgo, manual de orientação. DST/AIDS
BEREK, Jonathan S.; Berek e Novak: Tratado de Ginecologia. 14a ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2010.
FREITAS, Fernando et al. Rotinas em Ginecologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.
HURT, K. Joseph et al; tradução: Maria da Graça Figueiró da Silva Toledo; revisão
técnica: Ricardo F. Savaris. Manual de ginecologia e obstetricia do Johns Hopkins. 4.
ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. 720 p.
7 DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA
7.1
Introdução
Doença inflamatória pélvica (DIP) compreende um espectro de
desordens inflamatórias do trato genital superior, que inclui a endometrite, a salpingite,
o abscesso tubo-ovariano, a peri-hepatite (síndrome de Fitz-Hugh-Curtis), e a peritonite.
São infecções frequentemente polimicrobianas, com envolvimento de bactérias
anaeróbias e facultativas, sendo 90% originárias de agentes sexualmente transmissíveis.
Os principais agentes etiológicos são a Chlamydia trachomatis e a Neisseria gonorreae,
seguindo-se Micoplasma hominis, Ureaplasma urealyticum, Streptococus β Hemolítico
grupo A, anaeróbios (em especial o Bacterioides fragilis) e outros aeróbios.
7.2 Epidemiologia
A incidência de DIP é muito difícil de determinar. Isso porque
muitos casos ocorrem de forma insidiosa ou mesmo assintomática e só se detectam mais
tarde pelas sequelas que ocasionam, principalmente a esterilidade. Além disso, quando a
sintomatologia existe, mas não é exuberante, grande parte das pacientes são assistidas
no âmbito dos cuidados primários de saúde, onde há uma maior dificuldade de serem
realizados certos exames laboratoriais, causando uma falha na completa caracterização
do caso. A maior prevalência é em mulheres sexualmente ativas entre 15 e 24 anos de
idade. Aproximadamente 12% das adolescentes sexualmente ativas têm no mínimo um
episódio antes dos 20 anos de idade.
A DIP, nos Estados Unidos, é responsável anualmente por cerca
de 2,5 milhões de consultas ambulatoriais, 200 mil internações e 100 mil procedimentos
cirúrgicos. É a causa ginecológica mais frequente para visitas ao departamento de
emergência.
7.3 Fisiopatogenia
O canal endocervical exerce uma função de barreira, protegendo
o trato genital superior, normalmente estéril, dos microorganismos do ecossistema
vaginal. Os microorganismos causadores de DIP, quando associados a determinados
fatores facilitadores, que provocam uma pertubação dessa barreira (como alterações
hormonais, o método anticoncepcional e atividade sexual), disseminam por via
canalicular ascendente para o trato genital superior e instalam-se no endométrio,
passando para as tubas, ovários e peritônio pélvico,
onde exercem o seu papel
patogênico.
7.4 Quadro clínico
DIP aguda é difícil de diagnosticar devido à grande variação nos
sintomas e sinais, tornando o diagnóstico clínico impreciso. Os dados indicam que o
diagnóstico clínico da DIP sintomática tem um valor preditivo positivo (VPP) para
salpingite de 65%, comparando com um VPP de 90% da laparoscopia. Muitas mulheres
com DIP têm sintomas sutis ou leves. O atraso no diagnóstico e tratamento
provavelmente contribui para sequelas inflamatórias, levando a complicações como
gravidez ectópica, infertilidade e dor pélvica crônica. O VPP do diagnóstico clínico da
DIP aguda depende das características epidemiológicas da população, com VPP maior
entre as mulheres jovens sexualmente ativas (principalmente adolescentes), pacientes
que frequentam clínicas especializadas em tratamento de doenças sexualmente
transmissíveis (DST), e aquelas que vivem em ambientes onde as taxas de gonorréia e
clamídia são elevadas. A dor abdominal baixa é o sintoma principal em mulheres com
DIP, embora o caráter da dor possa ser muito sutil. O aparecimento recente da dor, que
piora durante o coito ou com movimento brusco, pode ser o único sintoma da DIP. O
aparecimento de dor durante ou logo após a menstruação é particularmente sugestiva. A
dor abdominal é geralmente bilateral e, raramente, de duração superior a duas semanas.
7.5 Diagnóstico
Para o diagnóstico clínico, é necessária a presença de três
critérios maiores mais um critério menor ou um critério elaborado:
Critérios maiores:
- Dor no abdômen inferior
- Dor à palpação dos anexos
- Dor à mobilização do colo uterino
Critérios menores:
- Temperatura axilar maior que 37,5°C
- Conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal
- Massa pélvica
- Leucocitose
- Proteína C reativa ou velocidade de hemossedimentação elevada
- Comprovação laboratorial de infecção cervical pelo gonococo, clamídia ou
Micoplasma
Critérios elaborados:
- Evidência histopatológica de endometrite
- Presença de abscesso tubo-ovariano ou de fundo de saco de Douglas em estudo de
imagem (ultrassonografia pélvica)
- Laparoscopia com evidências de DIP
7.6 Fatores de Risco
São fatores correlacionados com DIP:
- Idade: Constitui o maior fator de risco para uma DIP. Nas mulheres jovens, entre 15 e
24 anos, o risco é tanto maior quanto mais precoce o início da vida sexual.
- Nível socioeconômico: As mulheres com baixo nível socioeconômico estão mais
frequentemente associadas a comportamentos de promiscuidade, menor acesso a
cuidados médicos, hábitos de higiene deficientes, e, consequentemente, com uma maior
incidência de DST.
- DST’s prévias ou atuais: Pacientes portadoras de infecções por clamídia, micoplasma
e/ou gonococos na cérvice uterina apresentam um risco aumentado de DIP.
- Múltiplos parceiros sexuais ou parceiro recente: Em mulheres com mais de um
parceiro ou cujo parceiro tenha mais de uma parceira, a probabilidade de ocorrer
salpingite aumenta de 4 a 6 vezes.
- Uso de dispositivo intrauterino (DIU): Pode representar um risco três a cinco vezes
maior se a paciente for portadora de cervicite.
- Relações sexuais desprotegidas: Os métodos de barreira são fatores protetores para
DIP. Os preservativos são os mais eficazes, permitindo uma diminuição de 50% das
infecções por clamídia e gonococos.
- História pregressa de DIP: Pacientes com salpingite prévia têm uma chance aumentada
em 23% de desenvolver um novo episódio infeccioso.
- Parceiro sexual portador de uretrite.
7.7 Classificação
Considerando-se o grau de evolução do processo infeccioso para
o trato genital superior, a DIP pode ser classificada em:
- Leve: salpingite sem peritonite
- Moderada: salpingite com peritonite
- Grave: abscesso tubo-ovariano
7.8 Exames Complementares
Os principais exames que auxiliam no diagnóstico da DIP são:
- Velocidade de hemossedimentação
- Exame bacterioscópico com cultura e antibiograma de material obtido do orifício
cérvico-uterino, da uretra, de laparoscopia ou de punção do fundo-de-saco posterior
- Ultrassonografia abdomino-pélvica
- Radiografia simples do abdômen
- Laparoscopia (a depender da disponibilidade de cada serviço e, principalmente, nos
casos em que houver dúvida em relação ao diagnóstico)
- Sumário de urina e urocultura (para afastar infecção do trato urinário)
- Teste de gravidez (para afastar gravidez ectópica)
- Sorologias para HIV, sífilis e hepatites, para afastar outras DST’s
7.9 Diagnóstico Diferencial
O diagnóstico diferencial da DIP deverá ser feito com todas as
condições que podem causar abdome agudo, entre eles gravidez ectópica, apendicite,
ruptura ou torção de cisto ovariano, litíase e infecções do trato urinário.
7.10 Tratamento
Os princípios gerais do tratamento são: repouso e analgesia
adequada; retirar o DIU, se for o caso (porque acelera a cura); administrar
antibioticoterapia de amplo espectro, tendo em vista a etiologia polimicrobiana, com
duração mínima de 14 dias; em caso de abscesso tubo-ovariano ou pélvico, drenar, se
necessário; acompanhamento clínico e bacteriológico quatro a seis semanas após o
tratamento. Nos casos de leve a moderada intensidade, não há diferença entre os
tratamentos ambulatorial ou hospitalar. Quando o tratamento é ambulatorial, a paciente
deve ser reavaliada em 72 horas.
São critérios de hospitalização: 1) dúvida diagnóstica; 2)
ausência de resposta clínica, baixa aderência ou intolerância ao tratamento oral; 3)
quadro severo (náuseas e vômitos ou febre elevada); 4) abscesso tubo-ovariano ou
pélvico; 5) gravidez. Havendo melhora clínica nos primeiros três dias do tratamento por
via parenteral (queda da temperatura, diminuição da dor abdominal e pélvica
provocada), passar para via oral. Caso contrário, repetir os exames.
O tratamento deve ser iniciado logo que o diagnóstico
presuntivo seja feito, porque a prevenção de sequelas a longo prazo, tais como gravidez
ectópica, infertilidade e dor pélvica crônica é dependente da administração precoce de
antibióticos apropriados. Ao selecionar um regime de tratamento, deve ser considerado
disponibilidade, custo, aceitação do paciente, e susceptibilidade antimicrobiana
(TABELAS 1 e 2).
Tabela 1. Tratamento antibacteriano por via oral na DIP aguda.
Ceftriaxona (250mg IM, dose única) + Doxiciclina (100mg 12/12h por 14 dias), com
ou sem Metronidazol (500mg VO, 12/12h, por 14 dias).
Cefoxitina (2g IM, dose única) e Probenecida (1g VO) concomitantemente +
Doxiciclina (100mg 12/12h, por 14 dias), com ou sem Metronidazol (500mg VO
12/12h), por 14 dias.
Outra Cefalosporina de 3ª geração parenteral (ex: Ceftizoxime ou Cefotaxime) +
Doxiciclina (100mg 12/12h, por 14 dias), com ou sem Metronidazol (500mg VO
12/12h por 14 dias).
Fonte: Adaptado de Centers for Disease control, 2010
Tabela 2. Tratamento antibacteriano por via parenteral na DIP aguda.
Esquemas por via parenteral A
Cefotetano (2g, IV, 12/12h) OU Cefoxitina (2g, IV,
6/6h) + Doxiciclina, (100 mg, VO ou IV, 12/12h).
Guideline europeu: Ceftriaxona (1g/dia, IM ou IV)
+ Doxiciclina (100 mg, VO ou IV, 12/12h), seguido
de Doxiciclina (100mg VO 12/12h) + Metronidazol
(400mg VO 12/12h) até completar 14 dias.
Esquema por via parenteral B
Clindamicina (900mg, IV, 8/8h) + Gentamicina
(dose inicial de 2mg/kg peso, IV, e de manutenção,
1,5 mg/kg, IV, 8/8h).
Quando em dose única diária: Gentamicina (5mg/kg
peso, IV) + Clindamicina, (2700 mg, IV)
Guideline europeu: o esquema acima seguido de
Clindamicina (450mg VO 4x/dia) OU Doxiciclina
(100mg 12/12h) + Metronidazol (400mg 12/12h) até
completar 14 dias.
Esquema por via parenteral Ampicilina-sulbactam (3g, IV, 6/6h) + Doxiciclina
alternativo
(100mg, VO ou IV, 12/12h)
No caso de alergia a cefalosporina, recorrer a
Azitromicina, em geral efetiva contra gonococos.
Fonte: Adaptado de Centers for Disease control, 2010.
O metronidazol está incluído nos regimes ambulatoriais
recomendados para melhorar a cobertura para bactérias anaeróbicas que podem ter um
papel na patogênese da DIP. As bactérias anaeróbias são, provavelmente, de
importância relativamente maior em pacientes com DIP grave e alguns estudos têm
mostrado bons resultados sem o uso de metronidazol. O metronidazol pode, portanto,
ser interrompido em alguns casos de DIP leve a moderada em que há intolerância à
droga.
Atuais parceiros masculinos de mulheres com DIP devem ser
contactados e oferecidos conselhos de saúde e triagem para gonorréia e clamídia. Para
outros parceiros sexuais recentes, dentro de um período de seis meses antes do início
dos sintomas, também pode ser oferecido triagem. Os parceiros devem ser aconselhados
a evitar relações sexuais desprotegidas até que eles e suas parceiras tenham concluído o
curso do tratamento. Se triagem adequada para gonorréia e clamídia no parceiro sexual
não for possível, deve ser dada a terapia empírica para gonorréia e clamídia.
7.11
Bibliografia consultada
Centers for disease control and prevention. Pelvic inflammatory disease-atlanta,
December 2010.
Manual de controle das doenças sexualmente transmissíveis.Ministério da saúde, 2006.
Febrasgo, manual de orientação. DST/AIDS
HALBE, H.W.; CUNHA, D.C.. Doença inflamatória pélvica. Diagn Tratamento, São
Paulo, v.15, n.3, p.106-109, 2010.
European guideline for the management of pelvic inflammatory disease, junho de 2012
Doença
inflamatória
pélvica.
Ondina
Campos.
Disponível
em:
http://www.fspog.com/fotos/editor2/cap_11.pdf
Clinical features and diagnosis of pelvic inflammatory disease. Autores: Charles H
Livengood; Mariam R Chacko. Abril, 2013. Disponível em: www.uptodate.com
BEREK, Jonathan S.; Berek e Novak: Tratado de Ginecologia. 14a ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2010.
FREITAS, Fernando et al. Rotinas em Ginecologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.
HURT, K. Joseph et al; tradução: Maria da Graça Figueiró da Silva Toledo; revisão
técnica: Ricardo F. Savaris. Manual de ginecologia e obstetricia do Johns Hopkins. 4.
ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. 720 p.
8
PATOLOGIAS BENIGNAS DA VULVA E DA VAGINA
8.1
Introdução
As patologias da vulva são causas relativamente frequentes de
visita ao ginecologista. Com o intuito de estudá-las melhor, surgiu uma sociedade
específica para o estudo da patologia vulvar: The international society for study of
vulvar diseases (ISSVD). A ISSVD trouxe grandes avanços no conhecimento de tais
afecções. Em 2006, foi publicada uma classificação histológica das dermatoses vulvares
por subgrupos patológicos e seus correlatos clínicos. Em 2011, foi publicada uma
classificação clínica que abandonou os termos genéricos do passado, como distrofia e
alterações não neoplásicas da vulva, não devendo, portanto, ser mais utilizados.
Tabela 1. Classificação histológica das dermatoses vulvares, por subgrupos patológicos
e seus correlatos clínicos, ISSVD 2006
Padrão espongiótico
Dermatite atópica
Dermatite de contato alérgica e irritativa
Dermatite de contato irritativa
Padrão acantótico (antiga hiperplasia escamosa)
Psoríase
Líquen simples crônico
Primário (idiopático)
Secundário (superposto ao líquen escleroso, líquen plano ou outra doença vulvar)
Padrão liquenóide
Líquen escleroso
Líquen plano
Padrão esclerose/homogenização dérmica
Líquen escleroso
Padrão vesiculobolhoso
Penfigóide tipo cicatricial
Doença IgA linear
Padrão acantolítico
Doença de hailey-hailey
Doença de darier
Acantólise gênito-crural papular
Padrão granulomatoso
Doença de Crohn
Síndrome de Melkersson-Rosenthal
Padrão vasculopático
Úlceras aftosas
Doença de Behçet
Vulvite plasmocitária
Tabela 2. Classificação clínica das desordens dermatológicas da vulva, ISSVD 2011
1. Lesões cor da pele
A. Pápulas e nódulos
B. Placas
1. Papilomatose do vestíbulo 1. Líquen simples crônico e
e face interna dos pequenos outras doenças liquenoides
lábios (achado normal, não
2.
patológico)
Neoplasia
vulvar
2. Molusco contagioso
3. Condiloma (infecção pelo
HPV)
4. Cicatriz
5.
Neoplasia
intraepitelial
vulvar
6. Prolongamentos de pele
(acrocórdão,
pólipo
fibroepitelial)
7. Nevo (tipo intradérmico)
8.
Cisto
mucinoso
do
vestíbulo e face interna dos
pequenos lábios (pode ter cor
amarelada)
9. Cisto epidérmico (cisto
epidermoide, cisto epitelial)
10.
Tumor
semelhante
ao
glandular
mamário
(hidradenoma papilífero)
11. Cisto e tumor da glândula
intraepitelial
de Bartholin
12. Siringoma
13. Carcinoma basocelular
2. Lesões vermelhas: A. Doenças eczematosas e B.
Manchas e placas
liquenoides
Manchas
vermelhas
e
(sem
placas
ruptura
epitelial)
1.
Dermatite
de
contato
alérgica
1. Candidíase
2. Dermatite de contato por 2. Psoríase
irritante primário
3.
3.
Dermatite
(raramente
Alterações
superpostas
vista
em
4. Líquen plano
eczematosas
às
outras
desordens vulvares
5. Doenças que clinicamente
imitam doenças eczematosas
(candidíases,
intraepitelial
atópica vulvar
apresentação vulvar)
4.
Neoplasia
Doença
5.
Vulvite
(Zoon)
6. Infecção bacteriana de
tecidos
moles
(celulite/
fasceíte necrotizante inicial)
de 7.
Doença
Hailey-Hailey e doença de extramamária
Paget extra-mamária)
plasmocelular
de
Paget
3. Lesões vermelhas: A. Pápulas vermelhas
B. Nódulos vermelhos
pápulas e nódulos
1. Foliculite
1. Furúnculos
2. Condiloma (infecção pelo 2. Condiloma (infecção pelo
HPV)
HPV)
3. Angioqueratoma
3. Prurigo estrófulo
4.
Molusco
contagioso 4.
(inflamado)
5.
Hidradenite
Neoplasia
intraepitelial
vulvar
supurativa 5.
Molusco
(lesões iniciais)
(inflamado)
6. Doença de Hailey-Hailey
6.
contagioso
Carúncula
e
prolapso
uretral
7. Hidradenite supurativa
8.
Adenoma
semelhante
glandular
ao
mamário
(hidradenoma papilífero)
9.
Cisto
epidérmico
inflamado
10. Abscesso do ducto de
Bartholin
11. Carcinoma escamoso
12.
Melanoma
(tipo
amelanocítico)
De maneira geral, as doenças da vulva podem ser classificadas
de acordo com a sua apresentação predominante e com sua localização. É necessário um
exame físico cauteloso e uma anamnese bem detalhada, incluindo idade, status
hormonal, atividade sexual, doenças sistêmicas e exposição a irritantes.
Além disso, pode-se recorrer a uma série de exames
complementares a serem discutidos, como culturas, vulvoscopia, reações sorológicas e
biópsia dirigida (esta principalmente se houver persistência da lesão por mais de 6
semanas).
8.2
Líquen plano
Doença inflamatória de causa desconhecida que acomete pele e,
eventualmente, mucosa. Mais frequentemente, as pacientes apresentam lesões cutâneas
papulares e lesões orais descamativas e ulcerativas. Localizam-se, preferencialmente,
em superfícies flexoras como punhos, coxas e terço inferior das pernas. Em pacientes
com acometimento de vulva e vagina, são usuais queixas de dor e prurido local,
secreção vaginal serossanguinolenta, dispareunia e sensação de que a profundidade
vaginal está diminuindo. As pacientes também podem queixar-se de queda capilar. Os
achados clínicos variam desde pápulas discretas até lesões ulcerativas extensas, que
acometem vestíbulo e introito vaginal. O vestíbulo pode mostrar um padrão reticular
conhecido como estrias de Wickham. A vagina pode estar acentuadamente eritematosa
exibindo uma secreção serossanguinolenta. Com a evolução da doença, pode ocorrer a
reabsorção de pequenos lábios e clitóris, bem como o encurtamento e aderência de
paredes vaginais, decorrente da vaginite descamativa. Um importante diagnóstico
diferencial se faz com o líquen escleroso, porém pacientes com o líquen escleroso não
manifestam padrão reticular no vestíbulo, nem vaginite descamativa. A biópsia é o
método definitivo para se confirmar o diagnóstico, devendo ser realizada em área de
pele comprometida fora da úlcera, caso contrário os achados serão inespecíficos.
8.2.1
Tratamento
As formas mais brandas de líquen plano (não erosivas,
papulares) são usualmente bem manejadas com a simples aplicação de um corticoide
tópico de leve a moderada potência, uma a duas vezes ao dia. Nas lesões severamente
erosivas, o tratamento pode ser difícil. Faz-se necessário um corticoide de alta potência
e, nos casos de infecção secundária, a associação de um antibiótico ao corticoide. O
líquen plano com acometimento vaginal, também chamado de líquen plano erosivo,
deverá ser tratado com acetato de hidrocortisona 100mg em supositórios vaginais,
aplicados diariamente por 2 a 4 semanas, seguido de aplicação três vezes por semana
por mais 2 a 4 semanas. Depois desse período, trocar para supositórios de 25mg,
diariamente.
8.3
Líquen escleroso
É
uma
dermatose
inflamatória
crônica,
que
ocorre
principalmente na área anogenital. É uma das condições mais comuns tratadas em
clínicas de doenças da vulva. A etiologia é desconhecida, embora vários mecanismos
tenham sido propostos, incluindo imunológico, genético, inatividade ou deficiência de
receptores estrogênicos, e deficiência de fator de crescimento epidérmico.
Inicialmente, ocorre o aparecimento de pequenas máculas
brancas e coalescentes, de distribuição simétrica, em grandes e pequenos lábios,
podendo estender-se para a região perianal. A doença cursa, frequentemente, com
prurido persistente. Há progressiva retração do tecido conjuntivo, sendo que a pele
torna-se fina, lisa e brilhante, com consequente atrofia clitoridiana e de pequenos lábios,
podendo ocorrer estenose do introito. As mulheres na pós-menopausa são as mais
acometidas, seguidas de meninas pré-púberes. O diagnóstico se faz pelo aspecto clínico
e é confirmado pela biópsia vulvar. Com a progressão da doença, haverá uma perda da
distinção entre grandes e pequenos lábios e perda do prepúcio clitoridiano, até que o
clitóris seja recoberto pela fusão dos lábios. A diminuição do introito e da área perineal
poderá resultar em dispareunia. A vagina não será acometida, o que o diferencia do
líquen plano. As alterações associadas ao trauma determinado por coçaduras podem
favorecer a superposição de processos infecciosos locais, rachaduras, sangramentos e
ulcerações.
Talvez como consequência desse trauma, áreas do líquen
escleroso tornam-se hiperplásicas. Acredita-se que essas áreas possam ser de risco para
o desenvolvimento de carcinoma de células escamosas. O diagnóstico diferencial se faz
com líquen plano e vitiligo, sendo que neste último a pele não é caracterizada por
atrofia.
8.3.1
Tratamento
É recomendada a aplicação tópica de Propionato de Clobetasol
0,05% pomada 1 vez ao dia por 12 semanas, e depois 1 a 2 vezes por semana. As
pacientes devem ser seguidas, inicialmente, mensalmente para monitoramento de
possíveis efeitos colaterais e para a verificação de resposta clínica, para que, então, a
frequência de aplicação possa ser diminuída e o intervalo entre as consultas aumentado.
Após o terceiro mês, pode-se optar por fazer um tratamento de manutenção
semanalmente com Dipropionato de Betametasona ou um corticoide menos potente. É
importante ressaltar o acompanhamento por vários anos para avaliar possíveis alterações
e suspeita de malignidade.
8.4
Líquen simples crônico
O líquen simples crônico (LSC) da vulva é uma das causas
primárias mais comuns de prurido vulvar, mas também pode ser uma complicação
secundária de qualquer doença vulvar pruriginosa. O LSC primário é a condição mais
comum e pode ser uma consequência da exposição a um agente irritativo ou
inflamatório, podendo também ser relacionado com o estresse. Pode ser considerado
uma variante localizada e crônica da dermatite atópica. A irritação contínua ocasionada
pelo ato de coçar produz um ciclo vicioso em que o prurido leva a liquenificação, que
por sua vez, causa mais prurido. Ao exame, nota-se acentuação das marcas cutâneas,
epitélio esbranquiçado, do tipo placa e, algumas vezes, hiperpigmentação. A doença é
usualmente unilateral. O diagnóstico se faz pela história, exame clínico e biópsia.
8.4.1
Diagnóstico diferencial
Deve-se excluir candidíase, dermatite de contato, psoríase,
líquen escleroso e doença de Paget. A identificação da presença de condições
dermatológicas específicas associadas estabelece que o LSC é secundário e direciona o
tratamento à doença vulvar subjacente. Citologia a fresco com hidróxido de potássio e
cultura para fungos são úteis para diagnosticar infecção fúngica secundária.
8.4.2
Tratamento
O LSC somente pode ser curado se o ciclo prurido-coçadura for
cessado. Pacientes devem ser fortemente aconselhadas a evitar coçar a lesão. O
tratamento imediato com Propionato de Clobetasol a 0,05% ou Valerato de
Betametasona em forma de pomada, aplicada na área afetada duas vezes ao dia, por
quatro semanas, diminui a inflamação e quebra o ciclo prurido-coçadura. Devem ser
afastadas substâncias irritantes, como água excessivamente quente, sabões em geral,
lenços de limpeza, medicamentos tópicos, duchas, perfumes, desodorantes, calcinhas
sintéticas, roupas justas e superaquecimento.
8.5
Doença de Behçet
A doença de Behçet é uma doença inflamatória sistêmica,
resultante de uma vasculite primária, caracterizada por três manifestações clínicas
essenciais: úlceras aftosas orais, úlceras genitais e lesões oculares. A manifestação
ocular da doença consiste em uma uveíte decorrente de uma arterite necrotizante,
podendo determinar, com frequência, perda da visão. A doença tem como principais
complicações, além da amaurose, o surgimento de artrite, trombose arterial, colite e
orquite.
Geralmente, as pacientes apresentam úlceras vulvares múltiplas,
dolorosas, que impedem a relação sexual. O exame da mucosa oral revelará úlceras
orais semelhantes às vulvares.
8.5.1
Critérios diagnósticos
Os critérios diagnósticos para a doença de Behçet incluem a
presença de úlceras orais e mais 2 das seguintes manifestações clínicas:
- Úlceras genitais recorrentes
- Lesões oculares (uveíte, vasculite de retina)
- Lesões dermatológicas (eritema nodoso, lesões pápulo-pustulosas ou lesões
acneiformes)
- Teste de patergia positivo (injeção intradermal de água esterilizada, resultando em
formação de pápula ou pústula 48 horas após)
8.5.2
Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial se faz com herpes, sífilis, penfigoide,
pênfigos, doença de Crohn. Torna-se necessária a biópsia da pele vulvar e estudos de
imunofluorescência.
8.5.3
Tratamento
O manejo da doença de Behçet é feito inicialmente com
aplicação de corticoides tópicos, anestésicos tópicos e banhos de assento. No caso de
úlceras orais incapacitantes, utilizam-se corticoides sistêmicos e, quando, ainda assim,
não há resposta, pode-se fazer necessário o uso de terapias imunossupressoras.
8.6
Dermatite atópica e de contato
A dermatite atópica é uma doença dermatológica inflamatória,
frequentemente de etiologia indeterminada, com manifestações agudas, subagudas e
crônicas, mais comumente presente como uma erupção pruriginosa. A dermatite de
contato é uma reação da pele vulvar a agentes irritantes, como produtos usados para
higiene (sabonete, desodorantes íntimos, papel higiênico) ou vestuários. O tratamento se
faz com a identificação do fator irritante ou alérgico, hidratação e lubrificação da pele
com cremes e loções, corticoides tópicos e uso de anti-histamínicos para alívio do
prurido.
8.7
8.7.1
Tumores benignos e processos do tipo tumoral na vulva
Condiloma acuminado
Lesão
vulvar
causada
pelo
papilomavirus
humano,
principalmente dos tipos 6 e 11 (não oncogênicos). Ocorre com maior frequência em
áreas diretamente afetadas pelo coito. As verrugas causadas pelo HPV são altamente
contagiosas.
O tratamento visa à remoção das lesões, persistindo a infecção
viral, cuja erradicação não é possível. Pode ser feito com crioterapia, ácido
tricloroacético, creme de imiquimod, laser, dentre outras alternativas.
8.7.2
Cistos do Ducto de Bartholin
Ocorrem devido ao acúmulo de muco secundário à oclusão do
ducto. Normalmente, são assintomáticos, porém podem evoluir com infecção e
formação de massa bastante dolorosa e de crescimento rápido, o abscesso de Bartholin.
O tratamento pode ser feito por meio de incisão e drenagem, marsupialização ou
ressecção da glândula.
8.7.3 Cistos do Ducto de Skene
Dilatações das glândulas de Skene, localizadas na proximidade
do meato uretral. Geralmente, não atingem grandes volumes, mas podem aumentar e
provocar obstrução urinária.
8.7.4 Fibroma
Trata-se de tumoração geralmente única, elevada, de cor
marrom ou acastanhada, que envolve grandes lábios e períneo. Pode atingir grandes
dimensões e o tratamento deve ser cirúrgico.
8.8
Doenças benignas da vagina
8.8.1 Malformações
- Septos transversais: ocorrem em qualquer local na extensão da vagina e podem ser
perfurados ou imperfurados. A paciente pode apresentar queixa somente após início da
vida sexual (obstáculo à penetração) ou, ainda, com o início dos ciclos menstruais,
quando pode apresentar criptomenorreia (septo imperfurado). O diagnóstico é dado
através do exame ginecológico/vaginoscopia.
- Septos longitudinais: dividem a vagina em lados direito e esquerdo. Não costumam
causar sintomas até o início da atividade sexual, quando podem ser obstáculos ao coito.
- Atresia: a atresia total da vagina normalmente é acompanhada de agenesia do útero. A
paciente entra na puberdade, porém não apresenta o sangramento cíclico, o que a levará
a procurar atendimento. A atresia parcial pode ser tanto da porção proximal quanto da
distal. Quando o útero da paciente com atresia de vagina é funcionante, ela evoluirá com
criptomenorreia.
8.8.2
Adenose
Lesão vaginal constituída por tecido glandular da ectocérvice.
Pode ser de origem congênita ou secundária à exposição fetal ao dietilestilbestrol
(DES). Cerca de 0,1% das pacientes expostas intra-útero ao DES irão desenvolver
adenocarcinoma de células claras.
O diagnóstico de adenose é feito por meio de exame
colposcópico e só requer tratamento de houver confirmação de NIC ou NIVA.
8.8.3
Cistos de origem embrionária
São provenientes do epitélio mesonéfrico, paramesonéfrico e do
seio urogenital, porém mais frequentemente originados dos ductos de Wolff
(mesonéfricos).
Os cistos do ducto de Gartner originam-se de remanescentes dos
ductos de Wolff e se apresentam como múltiplos cistos ao longo da parede lateral da
vagina. Em geral, são assintomáticos, necessitando de tratamento (excisão) apenas
quando apresentam volume aumentado.
Os cistos embrionários podem surgir, ainda, na parede vaginal
anterior ou sob a bexiga. Aqueles com origem no epitélio do seio urogenital localizamse na área do vestíbulo vulvar.
8.8.4
Pólipos fibroepiteliais
São pregas polipoides de tecido conjuntivo, capilares e estroma,
recobertas por epitélio vaginal. Sua excisão é necessária apenas em casos sintomáticos e
deve-se ter cuidado devido à rica vascularização que possuem.
8.9
Bibliografia consultada
WILKINSON, E.J; STONE, I.K. Atlas de doenças da vulva.In: WILKINSON, E.J;
STONE. Máculas. 2. Ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2011. Cap.03, p.23-33.
Atlas de doenças da vulva. In: WILKINSON, E.J; STONE. Placas. 2. Ed. Rio de
Janeiro: Revinter, 2011. Cap.06, p.72-78.
Atlas de doenças da vulva. In: WILKINSON, E.J; STONE. Úlceras. 2. Ed. Rio de
Janeiro: Revinter, 2011. Cap.08, p. 125-128.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PTGI E COLPOSCOPIA. Disponível em:
HTTP://www.colposcopia.org.br/files/classificaçoes-da-vulva-para-homepage.pdf>.
Acesso em: 08 set. 2013.
Berek & Novak's gynecology, 14ª edition, 2007
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