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CRÂNIO, FACE E PESCOÇO
GERAL
Tratamento cirúrgico dos defeitos complexos causados por
acidentes por animais peçonhentos
Rafael Galli, Rachel Rossine Baptista, Guilherme Cardinali Barreiro, Juliana Oliveira Gomes dos Reis,
Fernando Sartor Guimarães Fortes, Marcus Castro Ferreira
Introdução
Os acidentes por peçonha são muito
frequentes no Brasil. Os mais frequentes
estão relacionados ao ofidismo, ao
araneismo, ao escorpionismo e ao
erucismo. Há também lesões não usuais
por seres aquáticos, tais como águas vivas
e caravelas, além de peixes, enguias e
arraias. Estes acidentes podem gerar
perdas teciduais que exigem atuação do
cirurgião plástico.
Objetivo
Descrever uma série de casos de
pacientes vítimas de acidentes com
animais peçonhentos atendidos no
complexo HCFMUSP, em que houve
atuação da equipe de cirurgia plástica.
Métodos
Avaliação retrospectiva de pacientes
com acidentes por animais peçonhentos
que tiveram a atuação do cirurgião plástico
já no atendimento inicial. Os pacientes
receberam tratamento cirúrgico reconstrutivo conforme o tipo de lesão, sendo
necessários procedimentos complexos,
que variaram desde retalhos locais até
microcirúrgicos.
Resultados
Foram analisados 7 pacientes, em
idade produtiva, sendo 3 vítimas de
acidentes ofídicos, 3 por aracnídeos e
1 por arraia. Foram todos tratados com
reconstrução com retalhos complexos, de
acordo com o tipo e extensão do defeito.
Caso 1: Paciente de 23 anos, vítima de
ferroada de arraia em maléolo medial
esquerdo. Evolui com necrose extensa e
exposição ósseo-tendínea. Foi realizado
desbridamento e curativo a vácuo como
ponte para o tratamento definitivo. Após
preparo adequado do leito, foi realizada
reconstrução microcirúrgica com retalho
Rev. Bras. Cir. Plást. 2011; 26(supl): 1-102
muscular de reto abdominal e enxertia
imediata. Caso 2: Paciente de 39 anos,
vítima de picada por Bothrops em dorso
de mão esquerda, com necrose extensa
envolvendo antebraço distal, punho e
a primeira comissura. Foi realizado o
preparo do leito com curativo a vácuo
e reconstrução microcirúrgica com
retalho fasciocutâneo ântero-lateral da
coxa. Caso 3: Paciente de 35 anos, vítima
de mordedura por Bothrops em perna
esquerda. Evolui com necrose extensa em
região ântero-lateral da perna, com exposição óssea e fratura de tíbia. Realizado
fixação externa e retalho microcirúrgico
de músculo quadríceps femoral e enxerto
de pele parcial.
Discussão
Os acidentes por animais peçonhentos
são frequentes no Brasil, sendo muitas
vezes subnotificados. As lesões tissulares
acontecem secundariamente a inoculações de substâncias citotóxicas, principalmente proteases, e à queimadura
gerada pelo contato com cnidoblastos,
no caso das águas-vivas. Há também o
efeito deletério das infecções secundárias, geralmente oriundas de mordeduras
de cobra, por bactérias. A atuação do
cirurgião plástico restringe-se às situações em que há necrose tissular, com
comprometimento muscular e necessidade de fasciotomia de membros, e
posterior de cobertura específica. Dentre
os acidentes ofídicos, o acidente botrópico, além de mais frequente, correspondendo a 85% dos casos, é também o que
apresenta maior afecção tissular, com
extensa necrose loco-regional e repercussão clínica devido à rabdomiólise,
mioglobinúria e insuficiência renal aguda.
A mionecrose pode gerar um edema que
necessita fasciotomia de urgência, para
evitar a progressão da lesão. As demais
cobras da região geram pouca reação tecidual no local da picada, com manifestações sistêmicas mais exuberantes. Já entre
os acidentes aracnídeos, a única aranha
que apresenta veneno capaz de gerar lesão
tecidual é o gênero Loxosceles ou aranha
marrom. A picada é geralmente imperceptível, e o diagnóstico é presuntivo pelo
aspecto da lesão após 24 a 48 horas, com
surgimento de uma placa marmórea, equimoses e necroses pontuais. A evolução é
lenta, pela atuação da esfingomielinase D.
O tratamento imediato destes acidentes é
feito por soroterapia antiveneno intravenoso, de acordo com a classificação de
gravidade do acidente, além de prevenção
do tétano. Nos casos de acidente por
jararaca, ou botrópico, o cuidado com a
hidratação para prevenção de insuficiência renal e a avaliação da necessidade
de fasciotomia do membro acometido,
são imperativos. Dentre os casos apresentados, os acidentes botrópicos apresentaram lesões mais extensas e profundas,
sendo necessárias reconstruções mais
complexas, inclusive com retalhos livres.
Um dos casos correspondeu a um acidente
por ferrão de arraia, cujo veneno acantotóxico gerou necrose tecidual, com necessidade de retalho livre para cobertura. O
tratamento inicial deve ser a colocação do
membro em água quente para inativação
das toxinas termolábeis.
Conclusão
A atuação do cirurgião plástico nos
acidentes ofídicos restringe-se àqueles
em que há lesão tecidual extensa. Na fase
aguda, sua colaboração corresponde à
realização de fasciotomias, mas a atuação
predominante ocorre nas complicações
locais, para resolução das feridas, utilizando todo seu arsenal terapêutico.
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