universidade federal de sergipe pró-reitoria de pós

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
IURA GONZALEZ NOGUEIRA ALVES
INFLUÊNCIA DO HIPOTIREOIDISMO GESTACIONAL
EXPERIMENTAL NA NOCICEPÇÃO E DESEMPENHO
MOTOR DA PROLE DE RATOS
ARACAJU
2012
IURA GONZALEZ NOGUEIRA ALVES
INFLUÊNCIA DO HIPOTIREOIDISMO GESTACIONAL
EXPERIMENTAL NA NOCICEPÇÃO E DESEMPENHO
MOTOR DA PROLE DE RATOS
Dissertação apresentada ao Núcleo de
Pós-Graduação
em
Medicina
da
Universidade Federal de Sergipe como
requisito parcial à obtenção do grau de
mestre em Ciências da Saúde.
Orientador: Prof. Dr. Valter Joviniano de Santana Filho
ARACAJU
2012
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DA SAÚDE
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
A474i
Alves, Iura Gonzalez Nogueira
Influência do hipotireoidismo gestacional na nocicepção e desempenho motor da prole de
ratos / Iura Gonzalez Nogueira Alves. – Aracaju, 2012.
119 f. : il.
Orientador (a): Prof. Dr. Valter Joviniano de Santana Filho .
Dissertação (Mestrado em Ciências da Saúde) – Universidade Federal de Sergipe, PróReitoria de Pós-Graduação e Pesquisa, Núcleo de Pós-Graduação em Medicina.
1. Hipotireoidismo congênito 2. Gestação 3. Distúrbios neurológicos 4. Pesquisa
experimental em ratos 5. Endocrinologia 6. Obstetrícia I. Título
CDU 616.441-008.64:618.2
IURA GONZALEZ NOGUEIRA ALVES
INFLUÊNCIA DO HIPOTIREOIDISMO GESTACIONAL
EXPERIMENTAL NA NOCICEPÇÃO E DESEMPENHO
MOTOR DA PROLE DE RATOS
Dissertação apresentada ao Núcleo de
Pós-Graduação
em
Medicina
da
Universidade Federal de Sergipe como
requisito parcial à obtenção do grau de
mestre em Ciências da Saúde.
Aprovada em: ____/_____/____
__________________________________________________
Orientador: Prof. Dr.Valter Joviniano de Santana Filho
__________________________________________________
1ª Examinadora: Profa. Dra. Josimari Melo de Santana
__________________________________________________
2º Examinador: Prof. Dr. Waldecy de Lucca Júnior
PARECER
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais, fonte
constante de inspiração e apoio, que sempre me
fizeram acreditar que eu chegaria longe. Amo
vocês! E, também, ao meu Daniel, que esteve
comigo, dia-a-dia, neste longo caminho até
chegar aqui.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a Deus por não ter me deixado perder as forças e esperanças,
mesmo com tantos obstáculos que encontrei até chegar aqui hoje.
Agradeço, também, aos meus pais, pelos bons princípios ensinados e pelo grande
exemplo de força e de luta que sempre foram para minha vida. Vocês me ensinaram que
caráter é fundamental, me mostraram que as coisas na vida não são tão complicadas
quanto parecem, basta ter coragem e força para conseguir alcançar. Estiveram ao meu
lado quando eu quase troquei os pés pelas mãos e mostraram o melhor caminho a
seguir. É a vocês que devo todos os bons valores aprendidos e é por vocês que eu quero
chegar longe. É nos olhos de vocês que eu quero ver brilhar a felicidade e o orgulho de
cada conquista que eu alcançar na minha vida. Dizer que vocês são insubistituíveis e
essenciais seria pouco. AMO VOCÊS DEMAIS e isso é pra sempre, esteja onde eu
estiver!
Ao meu marido, o meu eterno agradecimento pelo amor a mim dedicado e pelo apoio
emocional e científico constante. Saiba que, para mim, você é um grande exemplo.
Alguém em quem me espelho. Obrigada por sempre me olhar deste jeito único que me
impulsiona e me faz sentir diferente, especial. Suas palavras de incentivo me fazem
acreditar que eu posso chegar onde quero. Te amo, forever!
Agradeço também aos meus queridos avós, Pepe- in memoriam- e Lola, pelo exemplo
de serenidade e amor que sempre foram para toda a família. Obrigada por terem sempre
me amado.
A minha única e querida irmã, obrigada sempre ter torcido por mim e pelo auxílio
“computadorlístico”, isso fez toda diferença. Love you pequena.
Aos meus padrinhos, Bel e Luquinhas, e a minha tia Ginha, agradeço a torcida e as
palavras de incentivo constantes. Vocês também fazem parte desta conquista.
Ao meu querido orientador e também chefe, por sempre ter demonstrado confiança no
meu trabalho com gestos e palavras. Sua tranqüilidade me inspira e o seu respeito e
atenção para com os outros são grandes exemplos. Te respeito e te admiro muito.
Obrigada por estar sempre ao meu lado.
A Tia Josi, minha madrinha e amiga, o meu agradecimento pelo carinho e entusiasmo
constante. Ouvir elogios seus ao meu respeito me engradece e me faz acreditar que
estou no caminho certo. Obrigado, pelas palavras de incentivo quando mais precisei.
Aos alunos do LAPENE, que me receberam de braços abertos, em especial, a Kamilla e
Clarissa, pela grande participação na coleta dos dados e, mais do que isso, pelo
empenho para que este trabalho se tornasse realidade. Valeu, meninas!
A todos os alunos do LANBAC, que torceram sempre e que também me ensinaram
tanto. Em especial, a Sheyla, Danilo, Cibelle e Danielle, que me auxiliaram na
realização deste trabalho.
Agradeço, também, ao Prof. Ângelo, que me proporcionou a oportunidade única de
poder ingressar no mestrado.
Os meus sinceros agradecimentos ao Prof. Dr. Luís Carlos Reis e ao Prof. Dr. Waldecy
de Lucca Júnior pela contribuição científica neste trabalho.
A todos os meus alunos (orientandos ou não), com os quais aprendi e descobri o
verdadeiro gosto pela academia.
Não poderia esquecer de agradecer ao “Seu Osvaldo”, pela atenção e carinho no
atendimento a todas as solicitações. Quando as ratas estavam danadas, só ele conseguia
segurá-las e com tamanha presteza ele jamais hesitou em auxiliar.
Por fim, aos amigos novos e antigos e a todos aqueles que torceram por mim, o meu
muito obrigado.
Agora, enfim, o meu sonho se tornou realidade!
i
RESUMO
INFLUÊNCIA DO HIPOTIREOIDISMO GESTACIONAL EXPERIMENTAL NA
NOCICEPÇÃO E DESEMPENHO MOTOR DA PROLE DE RATOS, Iura Gonzalez
Nogueira Alves, Universidade Federal de Sergipe, 2012.
Os hormônios tireoideanos são essenciais para o desenvolvimento normal do cérebro.
Portanto, doenças da tireóide podem ser responsáveis pelo aparecimento de graves
distúrbios neurológicos. O bom funcionamento da glândula tireóide materna,
especialmente durante os primeiros meses da gravidez, desempenha um papel
importante para garantir que os filhotes apresentem adequado desenvolvimento corporal
e cerebral. No presente estudo, investigou-se o impacto do hipotireoidismo gestacional
experimental (HGE) na sensibiliade mecânica e térmica e desempenho locomotor na
prole em diferentes idades pós-natais (7, 15, 23, 30, 60 e 120 dias pós-natais; DPNs). O
HGE foi induzido adicionando metimazol (MTZ), a uma concentração de 0,02%, em
água potável a partir do dia 9 de gestação até o parto. A prole foi avaliada para
sensibilidade térmica e mecânica através dos testes tail-flick e vonFrey,
respectivamente. Os testes Rota-Rod e o Grip Strength Meter foram utilizados para
avaliar a função motora da prole. Assim, nossos dados demonstraram que o HGE não
alterou a sensibilidade mecânica, no entanto, reduziu a latência térmica até o 1º mês de
vida dos filhotes (7, 15, 23 e 30 DPN). Aos 60 DPNs, somente os filhotes machos de
mães tratadas com MTZ durante o período gestacional apresentaram redução na latência
térmica (p<0,05). Acrescido a isto, estes mesmos machos apresentaram desempenho
locomotor deficiente aos 60 DPNs e força de preensão reduzida aos 120 DPNs (p<0,01
e p<0,05, respectivamente), em comparação com filhotes de mães eutireóideas. As
mesmas alterações não foram observadas na prole do sexo feminino. Em conclusão, o
HGE não altera a sensibilidade mecânica da prole, porém promove hipersensibilidade a
estímulos térmicos nocivos, sendo que, na fase adulta (60 DPN), apenas os machos são
afetados. Ademais, o desempenho motor é reduzido somente em machos, sugerindo a
presença de algum fator de proteção no sexo feminino.
Palavras-chave: hipotireoidismo congênito, nocicepção, ratos, diferenças sexuais,
controle motor.
ii
ABSTRACT
INFLUENCE OF EXPERIMENTAL HYPOTHYROIDISM DURING PREGNANCY
IN NOCICEPTION AND MOTOR PERFORMANCE IN OFFSPRING OF RATS, Iura
Gonzalez Nogueira Alves, Federal University of Sergipe, 2012.
Thyroid hormones are essential for normal brain development. Therefore thyroid
disease may be responsible for the onset of severe neurological disorders. The proper
functioning of the maternal thyroid gland, especially during the early stages of
pregnancy, plays an important role in ensuring that the offspring have normal brain and
body development.We aimed to investigate the impact of experimental gestational
hypothyroidism (EGH) on nociceptive threshold and motor activity in the offspring at
different postnatal ages (7th, 15th, 23rd, 30th, 60th and 120th postnatal days; PND) in rats.
EGH was induced with methimazole (MMI) 0.02% in drinking water from day 9 of
gestation until birth. The offspring was assessed for thermal and mechanical nociception
using the tail-flick test and vonFrey filaments. Rota-Rod test and grip strength were
used to assess motor function. EGH reduced thermal, but not mechanical threshold at all
ages studied (p <0.05). Differently, 60 days old females offspring from MMI-treated
dams (f-OMTD) were not affected by EGH when tested in the tail-flick. Only males
OMTD presented a deficient locomotor performance using the Rota-Rod test (p < 0.01
at 60th PND), and the grip strength meter (p < 0.05 at 120th PND), in comparison to
offspring from water-treated dams (OWTD). In conclusion, EGH promotes
hypersensitivity to noxious thermal, but not mechanical stimulus, whereas motor
performance is reduced and thermal hypernociception remains present, both only in
mature males OMTD, suggesting the presence of a protective factor in females.
Keywords: congenital hypothyroidism, nociception, sexual dimorphism, rats, motor
control.
iii
LISTA DE TABELAS E FIGURAS
Figura1.Estrutura química dos hormônios da tireióide (triiodotironina-T3 e
tetraiodotironina-T4). ..................................................................................................... 18
Figura 2. Controle da síntese e secreção de hormônio tireoideano por feed back positivo
e negativo. ....................................................................................................................... 19
Figura 3. Potenciais de ação gerados pelos diferentes tipos de fibras ........................... 29
Figura 4. Diagrama sistemático de controle da dor via teoria das comportas. SG
(substância gelatinosa); T (neurônio de transmissão)..................................................... 36
Figura 5. Desenvolvimento do SNC em ratos e humanos. ............................................ 43
Figura 6. Aparato para avaliação do limiar mecânico para retirada da pata (vonFrey).
Filamentos de vonFrey (A); Figuras representativas dos procedimentos de habituação
(B) e teste em filhotes aos 30 (C) e 120 dias pós-natais (D). ......................................... 55
Figura 7. Aparato para avaliação do limiar de sensibilidade térmica (tail flick).
Avaliação do filhote nos dias 7 (A) e 60 pós-natais. ...................................................... 56
Figura 8. Aparato para a avaliação do desempenho motor (Rota-Rod). ....................... 57
Figura 9. Aparato necessário para realização do teste de força de preensão (Grip
Strength Meter eletrônico). ............................................................................................. 58
Figura 10. Procedimento experimental adotado nas mães (A) e na prole (B). MTZ:
metimazol; DPN: dia pós-natal ...................................................................................... 59
Figura 11. Desenho experimental do estudo. ................................................................ 59
Figura 12. Efeito do HGE no número de filhotes paridos. Foram incluídas 5 fêmeas
eutireóideas (FE) e 7 fêmeas hipotireóideas (FH). Teste t de Student. .......................... 61
Figura 13. Efeito do HGE no peso corporal das mães, antes (A) e onze dias após o
tratamento com MTZ (B). Foram incluídas 5 fêmeas eutireóideas (FE) e 7 fêmeas
hipotireóideas (FH). Teste t de Student.. ........................................................................ 62
Figura 14. Efeito do HGE no tempo de abertura ocular da prole. Grupo Controle (prole
de mães eutireóideas (PME), n=22) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães
hipotireóideas (PMH), n=24). (*) p<0,05. Teste t de Student. ....................................... 62
Figura 15. Efeito do HGE no peso corporal da prole. Grupo Controle (prole de mães
eutireóideas (PME), n=22) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas
iv
(PMH), n=24). (**) p<0,01; (***) p<0,001, Anova two-way, Bonferroni post hoc test.
DPN: dia pós-natal. ........................................................................................................ 63
Figura 16. Efeito do HGE no peso corporal da prole aos 60 e 120 DPN. m-PMH:
machos da prole de mães hipotireóideas, n=9; f-PMH: fêmeas da prole de mães
hipotireóideas, n=9; m-PME: machos da prole de mães eutireóideas, n=13; f-PME;
fêmeas da prole de mães eutireóideas, n=8. (**) p<0,01, Anova two-way, Bonferroni
post hoc test. DPN: dia pós-natal. ................................................................................. 63
Figura 17. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade térmica, avaliado pelo método
Tail-Flick, aos 7 ,15, 23 e 30 DPN comparados aos respectivos controles. Grupo
Controle (prole de mães eutireóideas (PME), n=20) e Grupo Hipotireoidismo (prole de
mães hipotireóideas (PMH), n=23). (*) p<0,05; (**) p<0,01; (***) p<0,001, Anova twoway, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal......................................................... 64
Figura 18. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade térmica da prole aos 60 DPN. (*)
p<0,05, Anova two-way, Bonferroni post hoc test. Grupo Controle (prole de mães
eutireóideas (PME), n=13 para machos e n=9 para fêmeas) e Grupo Hipotireoidismo
(prole de mães hipotireóideas (PMH), n=11 para machos e n=12 para fêmeas). ........... 64
Figura 19. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade mecânica da prole, medido pelo
método vonFrey, aos 7, 15, 23 e 30 DPN. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas
(PME), n=22) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=24).
Anova two-way, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal ...................................... 65
Figura 20. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade da prole, medido pelo método
vonFrey, aos 60 e 120 DPN. m-PMH: machos da prole de mães hipotireóideas, n=9; fPMH: fêmeas da prole de mães hipotireóideas, n=9; m-PME: machos da prole de mães
eutireóideas, n=13; f-PME; fêmeas da prole de mães eutireóideas, n=9. Anova two-way,
Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal. ............................................................... 65
Figura 21. Efeito do HGE no desaempenho motor, medido pelo método Rota-Rod, da
prole aos 60 dias de nascidos. Grupo Controle (filhos de mães eutireóideas (PME), n=12
para machos e n=9 para fêmeas) e Grupo Hipotireoidismo (filhos de mães
hipotireóideas (PMH), n=11 para machos e n=13 para fêmeas). (**) p<0,01, Anova twoway, Bonferroni post hoc test. ........................................................................................ 66
Figura 22. Efeito do HGE na força de preensão, medido pelo método Grip Strength
Meter. Grupo Controle (filhos de mães eutireóideas (PME), n=13 para machos e n=9
para fêmeas) e Grupo Hipotireoidismo (filhos de mães hipotireóideas (PMH), n=9 para
machos e n=9 para fêmeas). (*) p<0,05, Anova two-way, Bonferroni post hoc test. ..... 66
v
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACC- córtex cingulado anterior
ACh- acetilcolina
AchE- acetilcolinesterase
ANOVA- análise de variância
BDNF- fator neurotrófico derivado do cérebro
AMPA- ácido-α-amino-2,3,-dihidro-5-metil-3-oxo-4-isoxazolepropiônico
CA- cornu ammonis
CEPA- Comitê de ética em pesquisa com animais
CGS12066B - 7-tnfluoromethyl-4 (4-metil-1 -piırazinyl)-pyrroIo (1 ,2-la) quinoxaiine
DITs –diiodotirosinas
DLF- funículo dorsolateral
DN- dia de nascimento
DNA - ácido desoxirribonucléico
DNM- doença do neurônio motor
DNPM - desenvolvimento neuropsicomotor
DG- dia de gestação
DPN- dia pós nascimento
EGF- fator de crescimento epidermal
EPM- erro padrão da média
f-PME- fêmeas da prole de mães eutireóideas
f-PMH- fêmeas da prole de mães hipotireóideas
GABA- ácido gama-aminobutírico
GABAA -Receptor GABA tipo A
GABAB - Receptor GABA tipo B
GABAC- receptor GABA tipo C
GD- giro denteado
GH- hormônio do crescimento
hCG - gonadotrofina coriônica
HGE – hipotireoidismo gestacional experimental
H2O2- peróxido de hidrogênio
vi
HTs – hormônios tireoideanos
HU- hospital universitário
LAPENE- laboratório de pesquisa em neurociências
LC- locus ceruleus
mGlu- receptor de glutamato metabotrópico
MITs- monoiodotirosinas
m-PME- machos da prole de mães eutireóideas
m-PMH- machos da prole de mães hipotireóideas
MTZ- metimazol
NA – noradrenalina
NADH- dinucleotidio de nicotinamida-adenina
NDR- núcleo dorsal da rafe
NMDA- receptor N-Metil-D-Aspartato
NMR- nucleo magno da rafe
nNOS- enzima óxido nítrico sintase neuronal
NO- oxido nítrico
NON-NS- neurônio não nocicpetivo
NOS- óxido nítrico sintase
PAG- substância cinzenta periaquedutal
PBN- núcleo parabraquial
pCPA- p-clorofenilanina
PET- tomografia por emissão de pósitrons
PME- prole de mães eutireóideas
PMH- prole de mães hipotireóideas
PTU- propiltiouracil
QI- quociente de inteligência
RN- recém- nascido
RNAm - ácido ribonucléico mensageiro
rpm – rotações por minuto
RT-PCR -reverse transcription polymerase chain reaction
rT3- triiodotironina reverso
RVM- bulbo ventro-medial rostral
vii
SNC- sistema nervoso central
SS- somatostatina
TBG - globulina ligadora de tiroxina
TFMPP- m-trifluoromethylphenyl-piperazina
TG - tireoglobulina
TRα - receptores para hormônios tireoidianos α
TRβ- receptores para hormônios tireoidianos β
TRH - hormônio liberador de tireotrofina
TSH- hormônio tireoestimulante
T3- triiodotironina
T4-tiroxina
UFS- Universidade Federal de Sergipe
5-CT- 5- carboxamidotryptamine
5´D1- desiodase tipo 1
5´D2- desiodade tipo 2
5´D3- desiodase tipo 3
5-HT- serotonina
5-HT1- receptor de serotonina tipo 1
5-HT2- receptor de serotonina tipo 2
5-HT3- receptor de serotonina tipo 3
5-HT4- receptor de serotonina tipo 4
5-HT5- receptor de serotonina tipo 5
5-HT6- receptor de serotonina tipo 6
5-HT7- receptor de serotonina tipo 7
6-OHDA- 6- hydroxydopamine
8-OH-DPAT - 8-Hydroxy-2-(di-n-propylamino) tetralin
SUMÁRIO
RESUMO...........................................................................................................................i
ABSTRACT.....................................................................................................................ii
LISTA DE TABELAS E FIGURAS.............................................................................iii
LISTA DE ABREVIATURAS.......................................................................................iv
1.
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 16
2.
REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................ 18
2.1. Regulação neuroendócrina da função tiroideana ................................................. 18
2.2. Sistema hipotálamo-hipófise-tireóide .................................................................. 19
2.3. Geração periférica de T3 apartir de T4 ................................................................ 20
2.4. Desenvolvimento da tireóide ............................................................................... 21
2.4.1.Humanos ............................................................................................................ 21
2.4.2. Ratos ................................................................................................................. 23
2.5. Desenvolvimento do sistema nervoso sensorial .................................................. 24
2.6. O Metimazol ........................................................................................................ 26
2.7. Mecanorreceptores e termorreceptores ................................................................ 26
2.8. Áreas encefálicas responsáveis pela nocicepção ................................................. 29
2.8.1. Vias ascendentes ............................................................................................... 29
2.8.2.Modulação da dor .............................................................................................. 35
2.9. Hipotireoidismo e sua ação no sistema nervoso central e periférico ................... 41
2.10. Hipotireoidismo e gestação ................................................................................ 44
2.10.1. Hipotireoidismo materno e nocicepção da prole ............................................ 47
2.10.2. Hipotireoidismo e controle motor ................................................................... 48
2.11. Considerações finais .......................................................................................... 51
3. OBJETIVOS ............................................................................................................. 52
3.1. Objetivo geral ...................................................................................................... 52
3.2. Objetivos específicos ........................................................................................... 52
4.MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 53
4.1.Animais utilizados ................................................................................................ 53
4.2. Drogas utilizadas e protocolo de indução do hipotireoidismo gestacional
experimental................................................................................................................ 54
viii
4.3. Acompanhamento das mães ................................................................................. 54
4.4. Acompanhamento da prole .................................................................................. 54
4.5. Avaliação do limiar mecânico para retirada da pata ............................................ 55
4.6. Avaliação da latência para a retirada da cauda .................................................... 55
4.7. Avaliação do desempenho motor ......................................................................... 56
4.8. Avaliação da força de preensão ........................................................................... 57
4.9. Desenho Experimental ......................................................................................... 58
4.10. Análise estatística .............................................................................................. 60
5. RESULTADOS ......................................................................................................... 61
6. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 67
7. CONCLUSÃO........................................................................................................... 74
REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 75
APÊNDICE A ............................................................................................................... 92
ANEXO A .................................................................................................................... 118
16
1. INTRODUÇÃO
Inúmeras desordens orgânicas, comumente diagnosticadas atualmente, não têm
etiologia seguramente determinada. Neste contexto, recentes abordagens experimentais
têm imputado valor aos eventos ocorridos durante a vida intra uterina como decisivos
no surgimento destas doenças em diferentes momentos da vida pós-natal.1–4
O desenvolvimento intra uterino é um processo complexo e dinâmico que se
caracteriza pela interação de fatores maternos e fetais. O desenvolvimento fetal
adequado depende de condições ideais para a manutenção dos altos índices de
proliferação, crescimento e diferenciação celular, característicos desse processo. Assim,
distúrbios no suprimento de macro e micro nutrientes, oxigênio e hormônios durante a
gestação, ou a exposição indevida a agentes potencialmente tóxicos, podem
comprometer o desenvolvimento do feto e resultar em conseqüências na sua vida adulta.
4,4,5
A carência na produção ou na atuação dos hormônios tireoidianos (HTs) promove
o quadro de hipotireoidismo.6 A disfunção tireoidiana é um problema de saúde comum,
para o qual ainda existem inúmeras controvérsias acerca da triagem, avaliação e
controle da doença.7 A prevalência do hipotireoidismo é variável e depende de alguns
fatores, tais como localidade, sexo e faixa etária. Na população em geral, essa
prevalência gira em torno de 4% a 10%, sendo sua maior ocorrência no sexo feminino.
Durante a gestação, de maneira geral, as anormalidades da função tireoidiana podem
acometer 10% das gestantes.8
Durante a gestação, o feto ainda se encontra inapto a suprir, sozinho, as suas
necessidades de HTs, sendo os HTs maternos essencias para o adequado
desenvolvimento do feto. Assim, quando o hipotireoidismo ocorre durante o período
gestacional, o sistema nervoso central (SNC) fetal é acometido, visto que este depende
de iodo e tiroxina para o seu desenvolvimento durante toda a gestação.9
17
Inúmeros estudos têm buscado compreender a neurobiologia do desenvolvimento
das vias de percepção e modulação descendente da dor em animais e seres humanos.10–
13
As principais vias, regiões encefálicas e neurotransmissores deste circuito já estão
bem descritos. Ademais, alguns relatos já demonstram o efeito do hipotireoidismo no
desenvolvimento do SNC e em diversos outros orgãos e sistemas. Mais recentemente,
alguns estudos experimentais têm sido desenvolvidos a fim de avaliar a resposta a
estímulos nociceptivos térmicos, químicos e mecânicos em ratos filhos de mães
hipotireóideas.14,15 Porém, até o presente momento, a maioria dos estudos têm utilizado
modelos de indução de hipotireoidismo nos períodos pré e pós-natal (i.e.: desde a
gestação, continuando durante a lactação). Diferentemente, em nosso estudo, a indução
do hipotireoidismo materno foi realizada exclusivamente durante o período gestacional.
Apesar da busca recente pela compreensão dos mecanismos que expliquem as
repercussões da vida pré e/ou perinatal na ocorrência de distintas doenças, pouco se tem
feito para investigar o papel dos hormônios tireoideanos no desenvolvimento de
circuitos encefálicos importantes, como aqueles envolvidos na regulação da percepção
nociceptiva e do controle motor.
Assim este estudo se justifica devido a prevalência considerável de
hipotireoidismo
gestacional,
reconhecida
influência
dos
desenvolvimento fetal, sobretudo do sistema nervoso central,
HTs
maternos
no
a carência de dados
correlacionando hipotireoidismo gestacional e nocicepção, em diferentes fases da vida
pós-natal da prole, ausência de dados associando hipotireoidismo gestacional e
alterações mecanoceptivas na prole, carência de dados correlacionando hipotireoidismo
gestacional e de desempenho motor na prole, e devido a carência de informações sobre
a existência de dimorfismo sexual nas desordens geradas,pelo HGE, na prole.
18
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. Regulação neuroendócrina da função tiroideana
Os HTs desempenham um papel essencial no crescimento e desenvolvimento de
diversos órgãos e tecidos, tanto na vida embrionária quanto após o nascimento. A larga
distribuição de receptores de HTs em todos os tecidos do organismo representa a
importância destes hormônios no desenvolvimento e função dos mesmos. A tireóide
produz tiroxina (T4) e triiodotironina (T3) que são lançados na corrente sanguínea. No
entanto, a maior parte do T3 circulante deriva da desiodação do T4, dada principalmente
pela desiodase tipo 1 (5´D1) e em menor grau pela desiodade tipo 2 (5´D2). Apesar
disso, o T3 possui atividade cerca de 5 vezes maior que T4, sendo assim o principal
hormônio tireodiano circulante responsável pelo crescimento e diferenciação dos órgãos
e tecidos na vida adulta.16,17
.
Figura 1. Estrutura química dos hormônios da tireióide (triiodotironina-T3 e tetraiodotironina-T4).
Oliveira,AS. (2009)]18
Neste contexto, a manutenção de taxas adequadas de T3 torna-se essencial para a
qualidade de vida do indivíduo. A manutenção dos níveis adequados circulantes deste
hormônio depende de dois mecanismos: 1. mecanismos centrais de controle da
atividade tireoidiana, o que requer o bom funcionamento do eixo hipotálamo-hipófisetireóide e; 2. da geração periférica de T3 a partir de T4 promovida pelas enzimas 5´D1 e
5´D2, que estão expressas em diversos tecidos incluindo o SNC.16
19
2.2. Sistema hipotálamo-hipófise-tireóide
A circulação porta-hipotálamo-hipofisária, composta por duas redes de capilares
localizadas na eminência mediana (base do hipotálamo), conecta duas estruturas
essenciais para o controle da função tireoidiana, o hipotálamo e glândula hipófise.
Neurônios localizados nos núcleos paraventriculares e periventriculares do hipotálamo,
estabelecem sinapses com estes capilares. Sob o estímulo adequado, estes neurônios
liberam hormônio liberador de tireotrofina (TRH) e somatostatina (SS) para os
capilares, que levam estes hormônios hipotalâmicos para a adeno-hipófise (hipófise
anterior). Lá eles se ligam aos receptores de membrana presentes nos tireotrofos (células
da hipófise). Os tireotrofos são responsáveis, a partir do estímulo do TRH, por produzir
hormônio tireoestimulante (TSH) ou tireotrofina. Em contrapartida a síntese de TSH é
inibida pela SS. A tireotrofina estimula os tireócitos (células da tiróide) a produzir T3 e
T4, que em concentrações elavadas, através do mecanismo de feedback negativo,
inibem a liberação de TRH, pelo hipotálamo, e de TSH, pela hipófise, e desta forma a
homeostase é mantida.16
Figura 2. Controle da síntese e secreção de hormônio tireoideano por feed back positivo e negativo.
[Oliveira,AS. (2009)]18
Toda esta regulação neurohumoral encontra-se integrada a sinais centrais
(provenientes de áreas do sistema nervoso central) e periféricos (representados por
20
metabólitos e hormônios), que desencadeiam a resposta de ativação ou inibição das
atividades deste sistema.
2.3. Geração periférica de T3 apartir de T4
O TSH interfere em todas as etapas da biossíntese e secreção dos hormônios
tireoidianos (T3 e T4). A biossíntese dos HTs ocorre nas células foliculares tireoidianas
e se inicia com o transporte ativo de iodeto, dado pelo estímulo do TSH. Este processo
ocorre por meio de uma proteína localizada na membrana basolateral, o cotransportador Na+/I-, conhecido como NIS, que transporta 2 íons de Na+ e 1 de iodeto
para o interior da célula tireoidiana, a favor do gradiente de concentração do Na+. Neste,
o TSH induz a expressão gênica do NIS, aumentando o simporte Na+/I-. Na sequência, o
iodeto citoplasmástico adentra a luz folicular após oxidação do mesmo a iodo, pela
enzima peroxidase e pelo peróxido de hidrogênio (H2O2). Mais uma vez, o TSH
também ativa este mecanismo. Ademais, vale ressaltar que a pendrina é a proteína
responsável pelo transporte de iodo para a luz folicular e ao que parece, a expressão
desta não é regulada pelo TSH.19–21
O peróxido de hidrogênio, como visto anteriormente, é essencial para a oxidação
de idodeto em iodo. A geração deste composto é estimulada pelo TSH. Este estimula a
captação de glicose pela célula folicular, sendo ela metabolizada gerando assim
NADPH a partir de NADP. O NADP e a dinucleotidio de nicotinamida-adenina
(NADH) oxidase são os responsáveis pela geração de H2O2.16
Preenchendo a luz dos folículos tireoidianos existe o colóide cuja principal
proteína componente é a tireoglobulina (TG). Esta substância serve de “molde” para a
biossíntese dos hormônios tireoidianos. A iodinação especificamente dos aminoácidos
tirosina da TG, resulta na formação das monoiodotirosinas (MITs) e diiodotirosinas
(DITs). As MITs e DITs se acoplam no interior do colóide folicular para a formação das
iodotironinas (T3 e T4). Vale ressaltar que é essencial para esta fase que o iodeto,
captado pelas células foliculares, seja oxidado pela enzima peroxidase e pelo H2O2, a
iodo. Este processo ocorre na célula folicular tireoidiana e se dá graças a ação
estimulatória do TSH.19–21
21
Após a contribuição do TSH na formação de T3 e T4, este agora participa na
secreção destes hormônios. Sob ação do TSH, ocorre aumento do número e da
motilidade das microvilosidades da membrana apical da célula folicular tireoidiana, que
endocitam o colóide intrafolicular. Assim, o interior da célula folicular passa a possuir
vesículas contendo colóide. O TSH estimula a migração de lisossomos em direção a
estas vesículas e estes se fundem as mesmas formando os fagolisossomos. Proteases
presentes nestes lisossomos hidrolisam a TG presente no colóide destas vesículas,
promovendo assim a liberação de T3, T4, MITs e DITs para o citoplasma, bem como de
T3 e T4 para a circulação. Parte do T4 presente no citoplasma sofre desiodação em T3 e
este processo é também estimulado pelo TSH.22,23
A ação do HT é mediada principalmente por receptores nucleares na célula-alvo.
Alguns estudos indicam a existência de ação não-genômica dos HTs, na membrana
celular, envolvendo proteínas dependentes de cálcio e AMPc.24 A família de receptores
para HTs compreende duas isoformas: receptores para hormônios tireoidianos α (TRα) e
β (TRβ).25 Os receptores TRα, divide-se ainda em TRα1, TRα2 e TRα3. As três
isoformas diferem entre si na sua porção carboxiterminal, somente a TRα1 se liga ao
T3.26 Outras duas variantes dos TRα, TRα1 e TRα2 que foram identificadas aparentam
não ligarem-se nem a T3 nem ao ácido desoxirribonucléico (DNA), demonstrando
serem inibidores dos TR.27 O segundo grupo de receptores, os TRβ, compreendem as
variantes TRβ1, TRβ2 e TRβ3.25 Essas três proteínas demonstraram exercer papéis
diferentes entre si. Na verdade, podemos considerar receptores para hormônios
tireoidianos, no sentido literal da palavra, somente as isoformas TRα1, TRβ1 e TRβ2,
por se ligarem ao T3 e ativarem ou inibirem a transcrição gênica.28
2.4. Desenvolvimento da tireóide
2.4.1.Humanos
A tireóide, primeira glândula a se desenvolver no embrião humano, surge por
volta do 22° dia após a concepção a partir do espessamento do assoalho da faringe,
entre a bifurcação da aorta. Por volta do 29º dia de gestação células que serão
futuramente chamadas de foliculares adquirem a capacidade de formar TG. Por volta do
22
48° dia de gestação a tireóide finalmente atinge a sua posição em frente à traquéia e
abaixo da cartilagem cricóide e então começa a formar folículos. Assim, por volta da
10ª-11ª semana após a concepção, a tireóide torna-se hábil a incorporar iodo aos
hormônios tireoidianos e sintetizar T4. Mais adiante, com a evolução da gestação, o
volume da tireóide aumenta progressivamente.29,30
Aparentemente, todo o desenvolvimento da tireóide visto até então, parece ser
independente do TSH, já que a presença deste só pode ser detectada por volta da 10ª-12ª
(11ª-24ª)31 semana de vida do embrião.32,33 A partir de então,com o desenvolvimento do
eixo hipotalamo-hipofise-tireóide, é possivel constatar níveis crescentes de TSH
circulantes até o final do segundo trimestre.33,34 Após este periodo segundo ThorpeBeeston et al. (1991)6 há manutenção dos níveis de TSH enquanto que Ballabio et
al.(1989)7 relatam aumento ainda maior neste com a evolução do desenvolvimento fetal.
Apesar da divergência encontrada quanto aos níveis de TSH após o final do segundo
trimestre, o que se sabe de fato é que as concentrações plasmáticas de TSH fetal são
maiores do que o da mãe após este período.
Os resultados do estudo desenvolvido por Ballabio et al. (1989)35 sugerem uma
resposta incompleta da glândula tireóide fetal ao TSH. Tudo indica que o sistema de
controle do feedback entre hipófise e tireóide está operando em um ponto de ajuste
diferente do que na vida pós-natal. Ademais, até o 1º-2º mês de vida do recém-nascido
não será observado normalização deste feedback.36
Dados publicados por Thorpe-Beeston et al., (1991)31 demonstram que os níveis
fetais de T4 na 12ª semana são de 26 nmol/L e estes se elevam para 240nmol/L até o
nascimento. A elevação das concentrações séricas de hormônios tireoideanos ocorre
devido ao aumento da estimulação e maturação da glândula tireóide bem como ao
aumento das concentrações séricas da globulina ligadora de tiroxina (TBG) e alcança os
níveis adultos no terceiro trimestre.31,37 Este aumento provavelmente reflete a maturação
funcional do fígado para produzir proteína. A globulina ligadora de tiroxina (ou TBG,
do inglês thyroxine-binding globulin) é uma das três proteínas (juntamente com a
transtirretina e a albumina) responsáveis pelo transporte dos hormônios tireoidianos, T4
23
e T3 na corrente sanguínea. Ao longo da gestação, também há aumento nas taxas de
albumina fetal.31
Em contrapartida os níveis fetais de T3 não são detectáveis ou são muito baixos
até a 20ª semana de gestação. A partir daí, os valores de T3 elevam-se devido a
deiodação placentária e hepática de T4 para T3 reverso, mas ainda assim estes são
baixos até o parto.31,34,38 A função do eixo hipófise-tireóide fetal é em grande parte
independente do da mãe. Considerando que a entrega de TSH maternos para o feto, via
passagem transplacentária, é desprezível, baixos níveis de T3 e T4 fetal são diretamente
influenciados pelas fontes disponíveis de hormônio na circulação materna. Uma
deficiência T4 na mãe vai levar a uma deficiência de T3 do feto no primeiro trimestre,
mesmo se o T3 materno estiver normal. Assim, a disponibilidade reduzida de T4 de
origem fetal (hipotireoidismo fetal) é largamente compensada pelo hormônio
tireoideano materno que atravessa a barreira placentária. Este efeito é possível apesar do
fato de que apenas 1% do T4 materno pode passar a barreira placentária.39
Para garantir a respectiva síntese dos hormônios tireoidianos materno e fetal, um
adequado nível de iodo é obrigatório. Isto é especialmente importante para o
desenvolvimento do cérebro fetal pois os hormônios tireoidianos são essenciais para tal
fato. Deficiência de iodo pode induzir hipotiroxinemia e levar a danos cerebrais com
seqüelas neurológicas severas.40Estudos apontam que a deficiência de iodo leve ou
limítrofe tem sido associada com anomalias do desenvolvimento e deficiências
intelectuais.41–43
2.4.2. Ratos
Em ratos, a glândula tireoide já se encontra bem formada, porém não
completamente, no 17° dia embrionário e neste periodo ela já é capaz de concentrar
tireoglobulina e iodeto, apesar do conteúdo ainda muito pequeno.44,45 Estudo
demonstrou que a tireóide do rato encontra-se pronta para a produção hormonal por
volta do vigésimo dia embrionário, quando esta adquire a maior parte das características
de uma glândula adulta.45
24
Basicamente, a fonte hormonal do embrião é materna. Assim, experimentos
demonstraram que até mesmo pequenas deficiências de iodo materno são capazes de
diminuir os níveis de T4 do feto, demonstrando que os níveis sorológicos normais
maternos de T4 são fundamentais para a manutenção dos níveis adequados deste
hormônio no embrião e uma adequada conversão local em T3.46 A detecção do
hormônio no embrião do rato acontece já no nono dia embrionário, com níveis
diferentes de T3 e T4, sendo o T3 mais abundante.
Relatos experimentais demonstraram que os embriotrofoblastos do rato
apresentavam uma concentração de 21% do valor de T4 e 54% do valor de T3
materno.47 Os níveis totais de T3 e T4 aumentam significativamente do 18º dia
gestacional até o nascimento devido a maturação da glândula tireóide. Após o
nascimento, os níveis plasmáticos de T4 sobem de forma acentuada até atingir um pico
no décimo sétimo dia pós-natal48, seguidos por uma elevação, em paralelo, dos níveis de
T3, que irão atingir seu pico por volta do vigésimo oitavo dia pós natal . Os níveis totais
de T3, que serão padrão em ratos adultos são alcançados no quadragésimo dia pós-natal.
Os hormônios tireoideanos são fundamentais para o desenvolvimento do
cérebro49. O início do desenvolvimento do tubo neural em ratos, por volta do oitavo dia
embrionário, coincide com o início do desenvolvimento da tireóide e, de certa forma,
com o surgimento dos receptores para hormônios tireoideanos. O ácido ribonucléico
mensageiro (RNAm) responsável pela produção dos receptores para HTs, foi detectado
no SNC de ratos, durante o desenvolvimento embrionário, por volta do décimo primeiro
e décimo quinto dia de gestação, e a proteína foi detectada em diferentes regiões do
cérebro de ratos no décimo quarto dia embrionário.50 Durante o mesmo período, décimo
dia embrionário, inicia-se a neurogênese central.
2.5. Desenvolvimento do sistema nervoso sensorial
No rato, a maturação estrutural e funcional da elaboração de processos
nociceptivos inicia no periodo pré-natal e continua no período pós-natal. Desordens que
afetem o desenvolvimento do sistema somatossensorial durante o período pré- e pósnatal podem determinar modificações do limiar de sensibilidade a dor e aos demais
25
sinais sensoriais.51 O momento em que esta desordem se apresenta também pode
resultar em manifestações distintas destes limiares.51 Em roedores a indução do
hipotireoidismo durante o período pré-natal até o desmame resulta em uma série de
efeitos sobre o desenvolvimento e função do sistema nervoso central e periférico.52,53
Portanto, o hipotireoidismo congênito
pode alterar a maturação das
vias
somatossensoriais, mudando respostas nociceptivas e o processamento da dor induzida.
Em estudos experimentais, prole de ratas com hipotireoidismo gestacional
experimental [i.e., tratadas com agentes antitireóideos; e.g.: propiltiouracil (PTU) ou
MTZ, do 10° dia de gestação até a 11ª semana pós-natal, mostraram retardo no
desenvolvimento cerebral. Redução na área do corpo caloso e no número de
oligodendrócitos no córtex cerebral foram vistas tanto no hipotireoidismo induzido por
PTU quanto por MTZ. 54
O hipotireoidismo induzido por metimazol afeta os níveis séricos de TSH e a
arquitetura histológica da glândula tireóide da prole. O hipotireoidismo materno
induzido, do 1° dia de prenhez até a 3ª semana de lactação, diminui na prole a atividade
da acetilcolinesterase (AchE) e aumenta de maneira concomitante o conteúdo de ácido
gama-aminobutírico (GABA), com supressão de Na+-ATPase, K+-ATPase, Ca2+ATPase, Mg2+-ATPase, no cérebro, cerebelo e bulbo. Assim o hipotireoidismo materno,
induzido, promove efeitos inibitórios na excitabilidade e neurotransmissão sináptica
nestas regiões encefálicas. Ademais foi observado, de maneira mais pronunciada na
prole de mães hipotireóideas, que com a progressão da idade dos filhotes os níveis de
5´DI foram reduzidos no cérebro, cerebelo e bulbo. 55
Sinha et al. (2008)56 demonstaram o papel indispensável do T4 materno no
desenvolvimento do cérebro do feto. Foi demonstrado que a deficiência de HTs materno
durante o período gestacional precoce provoca elevação prematura maciça na expressão
da enzima óxido nítrico sintase neuronal (nNOS), e morte neuronal no neocórtex
embrionário de ratos. Neste estudo, o hipotireoidismo materno foi induzido pela
administração de metimazol na água de beber ratas fêmes prenhas desde o 6º dia de
gestação até a lactação.
26
Apesar de se conhecer estes aspectos, pouco se sabe ainda sobre os mecanismos
celulares, moleculares e vias pelas quais os hormônios da tireóide atuam na regulação
do sistema nervoso. Portanto, ainda existem várias questões relativas aos fenômenos
envolvidos nestes processos. A determinação precisa dos mecanismos fisiopatológicos
dos distúrbios até agora encontrados permanecem desconhecidos e parecem ser
provenientes do déficit de HT materno57.
2.6. O Metimazol
Drogas antireoidianas (e.g.: MTZ e PTU) têm valioso uso clínico para o
tratamento de desordens relacionadas ao hipertireoidismo. Experimentalmente, no
entanto, constituem importantes ferramentas para simulação de condições de
hipotireoidismo. O MTZ reduz as concentrações plasmáticas de HTs por inibir a
incorporação de iodo em resíduos tirosil de tireoglobulina, o acoplamento de resíduos
tirosil iodados, e assim impedindo a formação de iodotironinas.58 Vale ressaltar que
seus efeitos só se tornam aparentes quando o hormônio pré-formado é metabolizado. 58
Ambos, o PTU e o MTZ, atravessam igualmente a barreira placentária e também
podem ser encontradas no leite materno. Estudo realizado por Diav-Citrin & Ornoy
(2002)59 não encontrou diferença entre o estado da tireóide fetal de filhos de mulheres
tratadas com PTU ou tratadas com MTZ. No entanto, ambas causam hipotireoidismo
fetal em humanos. Este é geralmente transitório com um retorno ao estado eutireóideo
dentro de alguns dias ou semanas após o nascimento.60,61
Como pode ser visto no estudo de Calvo et al. (1990)62 o tratamento com MTZ,
concentração de 0,02%, é efetivo para induzir hipotireoidismo materno visto que em
sete dias de tratamento, tal droga, diminuiu os níveis de T4 e T3 no plasma materno e
em todos os tecidos estudados.
2.7. Mecanorreceptores e termorreceptores
A sensibilidade somática consiste em um conjunto de submodalidades
pressórica/táctil, térmica dolorosa e proprioceptiva. Os receptores somáticos podem ser
27
sensíveis a estimulações mecânicas, térmicas ou químicas. Embora a sensibilidade de
um determinado receptor seja alta para apenas um tipo de estimulação, especificamente
no caso da dor, existem receptores que são considerados polimodais, visto que podem
responder a estímulos de naturezas distintas. As diferenças constitucionais na membrana
do neurônio e as estruturas acessórias que os envolvem determinam a sua sensibilidade
quanto à natureza e intensidade do estímulo que recebem. Assim, além das terminações
nervosas livres na pele e nos folículos pilosos, existem terminações nervosas envolvidas
por diversas estruturas. As informações aferentes são conduzidas até o SNC através de
fibras periféricas primárias cujos corpos celulares formam gânglios próximos da raiz
dorsal da medula espinhal.17,63
A sensibilidade táctil e de pressão pode ser definida pela capacidade de detecção
de deformações na superfície corporal, induzidas por objetos e superfícies que
pressionam o tecido cutâneo ou subcutâneo. Os receptores para pressão e tato possuem
sensibilidade
às
deformações
mecânicas
e,
por
isso,
são
chamados
de
mecanorreceptores. Os mecanorreceptores variam em sua forma anatômica e
morfológica e, assim, existem receptores para tato e pressão do tipo: 1. terminações
nervosas dos folículos pilosos; 2.terminações nervosas livres; 3. córpusculos de Pacini;
4. córpusculos de Meissner; 5.disco de Merkel; 6. córpusuclos de Ruffini; e 7.bulbos de
Krause. Sendo que para este último mecanorreceptor ainda não existe uma função
claramente definida.17
Dentre os tipos de mecanorreceptores, ressaltam-se as terminações nervosas livres
que são estruturas ramificadas e morfologicamente indiferenciadas, sensíveis também
aos estímulos térmicos ou químicos e responsáveis por gerar as sensações de calor, frio
ou dor. Estas estruturas são encontradas na pele e em todos os tecidos do organismo.
Estas terminações nervosas livres estão associadas às fibras de pequeno calibre Aδ e C,
respectivamente fibras milenizadas e não mielinizadas que conduzem o potencial de
ação
em
baixas
velocidades.
Ademais,
os
corpúsculos
de
Meissner
são
mecanorreceptores de adaptação rápida e com campos receptivos pequenos. As fibras
do tipo Aβ acabam em terminações nervosas receptoras e noveladas no invólucro de
tecido conjuntivo. Estes receptroes são encontrados na transição da derme com a
epiderme na pele desprovida de pelo. Os discos de Merkel também constituem
28
terminações nervosas com pequenos campos receptivos de fibras mielínicas que formam
discos que se associam as células de Merkel. As células de Merkel são células epiteliais,
e discute-se a possibilidade delas serem as células receptoras do estímulo de
tato/pressão. Assim, por contato, semelhante à sinapse, possivelmente as células de
Merkel retransmitiram as informações para a fibra mielinizada do tipo Aβ. Os discos de
Merkel são encontrados na epiderme da pele glabra com ou sem pelo. Estes receptores
repondem de forma tônica à compressão da pele e estão envolvidos com o
processamento do tato e da pressão contínuos. 17,63
Os termorreceptores são responsáveis pela detecção da temperatura e de suas
variações.
São
constituídos
histologicamentemas
que
por
se
terminações
diferenciam
nervosas
livres
funcionalmente.
indiferenciadas
Assim,
alguns
termorreceptores possuem maior sensibilidade térmica por temperaturas estáveis
próximas a 25ºC sendo que estes são sensiveis as perdas de temperatura e, por isso, são
chamados de receptores para o frio. Outros termorreceptores são sensíveis as elevações
de temperatura com uma sensibilidade máxima por temperaturas estáveis entre 40ºC e
45ºC. São chamados receptores de calor que, como os receptores de frio, estão
distribuídos por toda a superfície corporal. Estes receptores, diferentemente dos de frio
que estão associados às fibras Aδ, estão associados às fibras do tipo C. Outros
receptores são sensíveis ao calor e ao frio e não geram sensações conscientes de calor
ou de frio, mas sim saão responsáveis por gerar sensações de dor. Estes receptores são
ativados ao ultrapassar os 45ºC ou ao reduzir a temperatura abaixo de 10ºC.
Assim, as extremidades neurais receptoras, mecanoceptores e termoceptores, ao
serem deformadas mecanicamente ou estimuladas por temperaturas extremas,
aumentam a condutância da membrana neural aos cátions, o que gera potenciais de
ação. Desta forma, as informações mecanoceptivas são carreadas via fibras do tipo Aβ
(conhecidas por serem condutoras de informações mecânicas de baixo limiar) e as
informações termoceptivas são carreadas pelas fibras do tipo Aδ e C. Estas fibras fazem
sinapse com os neurônios secundários do corno dorsal da medula (lâminas de Rexed) e,
assim, ascendem via sistema ântero-lateral contralateral (informações referentes aos
termorreceptores) e via sistema lemniscal medial ipsilateral da coluna dorsal
(informações referentes aos mecanoceptores) e são transmitidas para o SNC, mais
29
precisamente para o tálamo. No tálamo, ocorre a sinapse com os neurônios de terceira
ordem e estes emitirão os seus axônios ao córtex somatossensorial, onde ocorre a
somatização deste estímulo, bem como para o giro cingulado anterior.17,63
2.8. Áreas encefálicas responsáveis pela nocicepção
2.8.1. Vias ascendentes
Para que qualquer impulso nervoso seja transmitido desde a periferia dos tecidos
até o SNC, é necessária a comunicação intra e interneuronal.63 A sensação dolorosa se
inicia com a percepção de um estímulo nocivo ou potencialmente nocivo, de origem
térmica, mecânica ou química, pelos nociceptores. Estes são terminações nervosas livres
associadas a fibras aferentes primárias finas (0,4-1,2 μm de diâmetro) não mielinizadas
(fibras C) com baixa capacidade de condução (0,5-2 m/s) ou associadas as fibras
mielinizadas de médio calibre Aδ (2-6 μm), que conduzem o impulso nervoso com
maior velocidade (12-30 m/s) ou as fibras mielinizadas de grande diâmetro tipo Aβ (>10
μm) que são capazes de conduzir rapidamente o estímulo doloroso (30-100 m/s).10,12,63
Figura 3. Potenciais de ação gerados pelos diferentes tipos de fibras [Kandel et al. (1991)] 80.
Mais especificamente os nociceptores térmicos são ativados por temperaturas
extremas (> 45 ° C ou <10 ° C) e inervados por fibras mielinizadas finas do tipo Aδ. Os
nociceptores mecânicos são ativados por pressão intensa aplicado sobre a pele e também
são inervados por fibras mielinizadas do tipo Aδ. Nociceptores polimodais são ativados
por alta intensidade de estímulo mecânico, químico ou térmico (quente e frio). Esses
30
nociceptores têm pequeno diâmetro e são inervados por fibras não mielinizadas e de
condução nervosa lenta do tipo C.63 Estas três classes de nociceptores estão distribuidos
na pele e em tecidos profundos e muitas vezes trabalham em conjunto. 63
As maiorias destas fibras, citadas anteriormente, se originam de neurônios cujos
corpos celulares estão localizados nos gânglios das raízes medulares dorsais, fazem
sinapse com neurônios secundários do corno medular dorsal da medula, onde os
neurotransmissores são sintetizados e liberados. Os neurônios secundários do corno
dorsal da medula dão origem as vias ascendentes de dor (ipsilateral) que são
responsáveis pela transmissão do impulso para as regiões supraespinhais.
De modo geral, após a exposição da pele a um estímulo nocivo, fibras
mielinizadas do tipo Aδ provocam uma fase rápida, de dor primária, aguda de natureza
“cortante”, enquanto que as fibras amielinzadas do tipo C evocam uma segunda fase de
dor denominada “maçante”, sendo esta crônica.11
A substância cinzenta da medula espinal pode ser divida em 10 lâminas, com base
na sua citoarquitetura ou com base nas caracteristicas citológicas dos neurônios
residentes. Destas 6 compõem o corno dorsal da medula espinhal, são elas: a lâmina I
(camada marginal), lâmina II (substância gelatinosa), Lâmina III e IV (núcleo propius) e
V e VI (camadas profundas).11,63. A lâmina VII corresponde à massa cinzenta
intermediária, as lâminas VIII e IX compõem o corno ventro-medial e o corno ventrolateral, respectivamente, enquanto a lâmina X é a região em torno do canal.11 As duas
lâminas mais superficiais I e II0 (a parte mais externa da lâmina II), juntamente com as
lâminas V, VI e X constituem as regiões predominantemente implicadas na recepção,
processamento e transmissão das informações nociceptivas. Assim, classes de neurônios
aferentes primários, que conduzem informações distintas terminam em lâminas
diferentes do corno dorsal da medula espinhal. Há uma estreita correspondência entre a
organização anatômica e funcional dos neurônios no corno dorsal da medula espinhal.63
As fibras aferentes do tipo Aδ e C são responsáveis por enviar a informação do
estímulo nocivo a partir do tecido injuriado até principalmente as lâminas superficiais
(I, camada marginal e II, substância gelatinosa) do corno dorsal da medula espinhal.
31
Sendo que as fibras tipo C projetam-se predominantemente para a lâmina II (II0) e as
fibras Aδ para a lâmina I. As fibras Aβ são responsáveis por levar informações
referentes aos estímulos mecânicos não nocivos para as lâmias III, IV (nucleos propius)
e V (camada profunda) do corno dorsal da medula espinhal. Sendo que as lâminas III e
V também recebem informações da fibra do tipo Aδ.
Os neurônios que inervam os nociceptores (corpo celular localizado no gânglio
dorsal da medula espinhal) fazem sinapse com neurônios de segunda ordem localizados
no corno dorsal da medula espinhal. Os neurônios de segunda ordem ascendem via
medula espinhal projetando suas fibras, principalmente para o tálamo. No tálamo,
neurônios de terceira ordem emitem axônios para o córtex somatosensorial, onde a
somatização do estímulo nocivo acontece, ou emitem projeções ao giro cingulado
anterior, responsável pelo componente emocional da dor. Esta constitui a via clássica da
dor, porém existem outras vias e estruturas nervosas envolvidas neste processo.64,65
A informação referente à lesão tecidual ascende a partir da medula espinhal até o
cérebro via sistema ântero-lateral através de cinco grandes vias ascendentes: 1.
Espinotalâmico; 2.espinorreticular; 3. tratos espinomesencefálicos; 4.cervicotalámico; e
5. Espinohipotalâmico. As principais vias ascendentes nociceptivas são as vias
espinotalamicas ventrais e dorsais. As ventrais constituem os tratos neoespinotalâmico e
cervicoespinotalâmico, que terminam nos núcleos talâmicos, principalmente os núcleos
ventrocaudais de onde partem axônios para o córtex somestésico. Estas vias são
responsáveis pelo aspecto sensitivo-descriminativo da dor. Já as vias do grupo
espinotalâmico dorsal incluem os tratos paleoespinotalâmico e paleotrigemiotalâmico
que emitem suas projeções até os núcleo mediais e intralaminares do tálamo, bem como
incluem os tratos espinorreticular e espinomesencefálico.63 As vias espinotalâmicas
dorsais fazem sinapse com tálamo. O trato espinorreticular faz sinapse com os
neurônios da formação reticular do tronco cerebral e o trato espinomesencefálico faz
sinapse com os neurônios da substância cinzenta periaquedutal (PAG) e núcleo
parabraquial (PBN). Sendo que acredita-se que o trato espinoanular, componente do
trato mesencefálico, é o que de fato se projeta para o PAG.11 Da PAG ventral partem
também as vias reticulotalâmicas que constituem projeções para regiões diversas do
sistema límbico.10,11 Esses axônios projetam-se para o lado contralateral da medula
32
espinhal e ascendem na matéria branca ântero-lateral, terminando no tálamo. Ademais o
PBN também recebe os tratos espinobraquioamigdalóide e o espinobraquihipotalâmico
(ambos originam-se das lâminas I e II do corno dorsal da medula espinhal).63
O trato espinorreticular compreende os axônios dos neurônios nas lâminas VII e
VIII. Esta via ascende no quadrante ântero-lateral da medula espinhal e terminam na
formação reticular e no tálamo. Em contraste com o trato espinotalâmico, muitos dos
axônios do trato espinorreticular não cruzam a linha média. O trato espinomesencefálico
compreende os axônios dos neurônios nas lâminas I e V. Esta via projeta-se para o
quadrante ântero-lateral da medula espinhal, para a formação reticular mesencefálica e
substância cinzenta periaquedutal, e através do trato espinoparabraquial, se projeta para
os núcleos parabraquiais. Por sua vez, os neurônios dos núcleos parabraquiais enviam
projeções para a amígdala, um componente importante do sistema límbico, envolvido
com o comportamento emocional da dor. Assim, é sugerido que o trato
espinomesencefálico contribui com componente afetivo da dor. 63
O trato cervicotalâmico ascende a partir dos neurônios do núcleo cervical lateral,
localizada na substância branca lateral, acima de dois segmentos cervicais da medula
espinhal. O núcleo cervical lateral recebe entrada de neurônios nociceptivos nas lâminas
III e IV do cordão espinhal. A maioria dos axônios cervicotalâmicos cruzam a linha
média e ascendem para os núcleos no mesencéfalo e os núcleos ventro-posteriores
laterais e póstero-mediais do tálamo. Alguns axônios das lâminas III e IV projetam-se
através das colunas dorsais da medula espinhal (em conjunto com os axônios de grande
diâmetro mielinizadas, fibras aferentes primárias) e terminam nos núcleos grácil e
cuneiforme da medula. O trato espinohipotalâmico compreende os axônios dos
neurônios nas lâminas I, V e VIII. Esta via se projeta diretamente para os centros de
controle autonômico supra-espinhais e é sugerido que esta seja a via responsável por
ativar complexas respostas neuroendócrinas e cardiovasculares.63
Vários núcleos
talâmicos
são
responsáveis
por processar informações
nociceptivas. No interior da lâmina medular interna, separando a massa talâmica lateral
da medial, existem pequenas massas de substância cinzenta que constituem os núcleos
intralaminares do tálamo. Medialmente à lâmina medular interna ficam os grupos
33
medial e mediano (ou núcleos da linha média) e lateralmente os núcleos laterais.
Lateralmente e posteriormente a medula interna situam-se os núcleos posteriores.66 O
grupo nuclear lateral do talamo compreende o nucleo ventro-posterior medial e o nucleo
posterior. Sendo importante salientar que o complexo de núcleos talâmicos posterior
incorpora o oralis pulvinar, o núcleo posterior e o núcleo posteriolateral. Esta região é
um local importante para a integração do input nociceptivo e termosensorial, e sua
desregulação funcional tem sido implicado na dor talâmica.11
O tálamo tem sido considerado como a estrutura chave para o recebimento supraespinhal, integração e transferência de informação nociceptiva. No entanto o tálamo não
é apenas alvo do trato espinotalâmico ventral, mas também, direta e indiretamente, é
alvo de outras vias que carregam informações nociceptivas. Na verdade, o tálamo
codifica a informação sobre o tipo, padrão temporal, a intensidade de entrada cutânea e
a localização topográfica da dor. Além disso, articula com as estruturas corticais e
límbico responsável pela dimensão tanto o sensório-discriminativo e emocionais da dor.
O tálamo também desempenha um papel ativo e adaptável no processamento de
informação nociceptiva.11
Até recentemente a maioria das pesquisas sobre o processamento central da dor se
concentravam no tálamo. No entanto, hoje se sabe que neurônios em várias regiões do
córtex cerebral respondem seletivamente a entrada nociceptiva. Alguns desses
neurônios estão localizados no córtex somatossensorial e tem pequenos campos
receptivos.11
Regiões tais como o córtex cingulado anterior (ACC) e o PBN são regiões
importantes para a entrada de informação nociceptiva. O ACC tem sido apontado como
uma estrutura fundamental no componente afetivo da dor. Através de tomografia por
emissão de pósitrons (PET) em seres humanos foi possível observar que duas outras
regiões do córtex, o giro cingulado e o córtex insular, estão envolvidos na resposta à
nocicepção. O giro do cíngulado anterior compõe o sistema límbico e foi sugerido que
este possa estar envolvido no processamento do componente emocional da dor. O córtex
insular recebe projeções diretas dos núcleos mediais do talamo e dos nucleos ventroposteriores do tálamo.67–69 Clinicamente, a ablação cirúrgica do tecido cortical do ACC
34
e arredores, diminui a sensação desagradável de dor, sem afetar a habilidade do paciente
para discriminar a intensidade ou a localização do estímulo nocivo.70 Acredita-se que o
córtex insular pode, portanto, integrar os componentes a afetivos, sensoriais e
cognitivos, componentes responsáveis para a resposta dolorosa normal. O PBN constitui
também um alvo central importante para as informações ascendentes nociceptivas da
medula espinhal.71–73 Resultados publicados por Coizet et al. (2010)74 demonstraram
que a inatividade do PBN atenua e em alguns casos elimina respostas nociceptivas.
Ademais, outras regiões do SNC podem ser acessadas diretamente por neurônios
espinhais nociceptivos tais como: a amígdala, o globo pálido / putamen (estriado de
ratos e núcleo lenticular no homem), núcleo accumbens e septo, bem como o frontal,
orbital (cíngulo) e o córtex infralimbico. Determinados alvos límbico das informações
ascendente nociceptivas estão intimamente interligados através do trato com o
hipotálamo, outra região imprtante para o processamento das informações dolorosas.11
A transmissão química da dor através das vias aferentes depende da liberação de
neurotransmissores tais como: acetilcolina (ACh), aminoácidos excitatórios (glutamato
e aspartato), histamina, óxido nítrico (NO), prostraglandinas e peptídeos sensoriais, tais
como a substância P. Transmissão sináptica entre os nociceptores e neurônios do corno
dorsal é mediada por neurotransmissores químicos liberados do centro de terminações
nervosas sensoriais.
O aminoácido excitatório glutamato, não é apenas a classe principal de
neurotransmissor excitatório no sistema nervoso central, mas também é liberado por
fibras aferentes primárias. O principal neurotransmissor excitatório liberado pelas fibras
Aδ e C é o aminoácido glutamato. A liberação de glutamato a partir de terminais
sensoriais evoca potenciais sinápticos rápidos nos neurônios do corno dorsal, ativando
os
receptores
de
glutamato
tipo
ácido-α-amino-2,3,-dihidro-5-metil-3-oxo-4-
isoxazolepropiônico (AMPA) e receptor N-Metil-D-Aspartato (NMDA).12 Ademais,
estudos eletrofisiológicos sugerem que o glutamato (além de outros aminoácidos
excitatórios) através da ação em ambos os receptores, ionotrópicos e metabotrópicos,
estão envolvidos na transferência de informação nociceptiva do trato espinotalâmico
para o tálamo e do trato espinomesencefálico para a PAG.12
35
2.8.2.Modulação da dor
Vias descendentes originárias do tronco cerebral e em outras estruturas cerebrais
têm papel importante na modulação e integração de mensagens nociceptiva no corno
dorsal da medula espinal.11 Estudos científicos mostraram que o cérebro tem circuitos
modulatórios cuja principal função é regular a percepção da dor. Sistemas modulatórios
diversos dentro do SNC afetam as respostas a estímulos nocivos. O sítio inicial da
modulação encontra-se na medula espinhal, onde as interconexões entre vias aferentes
nociceptivas e não-nociceptivas podem controlar a transmissão de informação
nociceptiva para centros superiores no cérebro. Sistemas modulatórios diversos, dentro
do sistema nervoso central, também alteram/atenuam as respostas a estímulos nocivos.
Este controle pode ser originado no córtex, tálamo ou no tronco encefálico, sendo que
os núcleos encefálicos, mais importantes, envolvidos com este controle são a PAG,
núcleos da rafe e o locus ceruleus (LC).
A dor não é apenas um produto direto da atividade de fibras aferentes
nociceptivos. Esta é regulada pela atividade de outras fibras aferentes mielinizados que
não estão diretamente envolvidas com a transmissão da informação nociceptiva. A
teoria dos portões ou teoria das comportas foi formulada por Melzack e Wall (1965) e
esta descreve a dor como resultado da atividade de fibras aferentes nociceptivos e nãonociceptivas. Esta teoria incorpora diversas observações importantes tais como: 1.os
neurônios da lâmina V, e, possivelmente, lâmina I, recebem entradas excitatórias
convergentes das fibras Aβ (não-nociceptivas) e das fibras Aδ e C (nociceptivas); 2. as
fibras de grande diâmetro Aβ inibem o disparo de neurônios da lamina V, do corno
dorsal da medula espinhal, ativando interneurônios inibitórios na lâmina II; e 3.as fibras
Aδ e C excitam os neurônios da lâmina V, mas também inibem o disparo dos
interneurônios inibitórios na lâmina II, que são ativadas pelas fibras Aβ.13
36
Figura 4. Diagrama sistemático de controle da dor via teoria das comportas. SG (substância gelatinosa);
T (neurônio de transmissão). [Melzack e Wall (1965)] 13
Assim, como pôde ser observado, já na década de sessenta estudos estabeleceram
que vias descendentes encontravam-se tonicamente ativas, vias estas descritas como
inibitórias visto que após transsecção da medula espinhal os reflexos nociceptivos foram
exageradas.75 O estímulo à investigação desta circuitaria descendente de modulação da
dor veio através do trabalho de Reynolds (1969)76, que demonstrou que a estimulação
elétrica focal no mesencéfalo, em ratos, mais precisamente a estimulação da PAG
permitiu a cirurgia abdominal na ausência de anestesia geral. Este bloqueio ocorre
porque a estimulação desta região é responsável por recrutar vias neurais descendentes
que inibe a atividade dos neurônios nociceptivos da medula espinhal. A substância
cinzenta periaquedutal também inibe o disparo de neurônios nociceptivos nas lâminas I
e V, reduzindo o processo álgico. Este fato também foi demonstrado a partir da
estimulação eletrica desta região em humanos, promovendo de forma eficaz o alivio a
dor sob várias condições.63
A partir deste primeiro relato, o conceito de sistemas endógenos envolvidos na
modulação da dor evoluiu. E como consequencia dos estudos de Reynolds (1969), o
PAG ventrolateral foi rapidamente estabelecida como uma importante área para inibição
descendente e para o processamento nociceptivo espinal.
76
Além disto, esta região foi
descrita também por Yaksh e Rudi (1978) como um sítio importante de ação dos
opióides, após microinjeção direta, visto que o efeito da estimulação elétrica era
replicado.77 Com o avançar das pesquisas também ficou claro que a estimulação elétrica
37
em diferentes locais no cérebro, incluindo o córtex sensorial, tálamo, hipotálamo,
mesencéfalo, ponte e bulbo, de forma semelhante, foi responsável por produzir efeitos
inibitórios sobre o processamento nociceptivo espinal.
Como conseqüência destes estudos envolvendo estímulos eletrofisiológicos,
estudos anatômicos e farmacológicos sobre as vias descendente de modulação da dor
foram realizados, sendo assim determinado a influência destas
processamento nociceptivo espinal. Especificamente,
vias sobre o
a influência do
bulbo
rostroventral (RVM), incluindo o núcleo magno da rafe medial.75
As vias recrutadas pela estimulação da PAG produzem alívio da dor pois poucos
neurônios na substância cinzenta periaquedutal se projetam diretamente para o corno
dorsal da medula espinhal. Em vez disso, fazem conexões com os neurônios excitatórios
do bulbo rostroventral, em particular com neurônios serotoninérgicos na linha média do
núcleo magno da rafe. Neurônios deste núcleo, projetam-se para a medula espinhal
através
da parte dorsal do funículo lateral e fazem conexões com os
neurônios
inibitórios das lâminas I, II e V do corno dorsal da medula espinhal que bloqueiam a
passagem do estimulo doloroso proveniente da periferia através da liberação de
encefalina, pepitideos com atividade opióide.78 A estimulação do bulbo rostroventral,
inibe neurônios do corno dorsal, incluindo os neuronios do trato espinotalâmico que
respondem aos estímulos nocivos.
Os núcleos da rafe se subdividem de vários grupamentos ao longo do
mesencefálo, ponte e bulbo, dentre os quais o núcleo dorsal da rafe (NDR) e núcleo
magno da rafe (NMR), estão envolvidos com o controle descendente da dor.
79
O NMR
recebe input diretamente do PAG e essa conxão evoca analgesia. Já foi demonstrado,
em estudo prévio, que a estimulação elétrica do NMR reduz a resposta das células do
corno dorsal para calor nocivo.80 O NDR se situa próximo a substância cinzenta
periaquedutal, mas é funcionalmente uma região distinta desta. É sabido que a
estimulação elétrica do NDR promove analgesia. Tem sido sugerido que o NDR pode
ser o mais efetivo núcleo para iniciar a estimulação analgésica.65,79 Este consiste no
mais importante núcleo serotoninérgico do encéfalo. O papel da serotonina (5-HT) nas
vias descendentes de controle da dor é largamente estudado. Assim, já foi observado em
38
estudos prévios que paraclorofenilalanina promove inibição na síntese de serotonina no
NDR e assim abole a analgesia induzida por estimulação central.79
A analgesia do núcleo magno da rafe ou dos sítios laterais do bulbo ventro-medial
rostral, produziu bloqueio parcial da inibição da dor gerada pelo PAG. Tais estudos
demonstraram que tanto o núcleo medial quanto os núcleos laterais do RVM precisam
ser inativados simultaneamente para bloquear completamente o efeito inibitório
descendente efeitos a partir do PAG.81,82 Considera-se agora que o RVM é o resultado
final comum para as influências das vias descendente dos sítios ventrais no cérebro.
Assim, até a década de 1990, o foco da investigação estavam voltado para as vias
descendentes responsáveis pela inibição do processamento nociceptivo espinal no
RVM. Porém, contrariamente, estudos demonstraram a presença de vias descendentes
facilitatórias provenientes do RVM que eram responsáveis pelo estado de hiperalgesia
após lesão do tecido periférico.75
Neste sentido, estudo realizado por Gebhart (2004)75 com eletroestimulação em
36 regiões distintas no núcleo magno da rafe, demonstrou que após a estimulaçao de
50% das regiões neste núcleo foi observado aumento e redução na latência no tail-flick
quando a intensidade das correntes eletricas eram, respectivamente, altas (≥50-200 μA)
e baixas (5-25μA). Tal efeito foi replicado quando ao invés de estimulação elétrica foi
realizada microinjeção intra-RVM de glutamato. Altas (50nmol) e baixas (5nmol)
concentrações deste neurotransmissor, foram responsáveis por aumentar e reduzir,
respectivamente, a latência ao tail-flick.
Sabe-se que a microinjeção de antagonista serotoninérgico ou inibidores da
síntese neuronal deste neurotransmissor, na PAG, inibe a analgesia obtida por
estimulação eletrica desta região. À nível de medula espinhal, parece que a modulação
da sinapse entre neuronios de primeira e segunda ordem também pode envolver além
das encefalinas, outros neurotransmissores tais como dopamina e GABA.83 A
modulação
da
dor
através
de
fibras
eferentes
depende
da
liberação
de
neurotransmissores que contribuem alterando o limiar doloroso tais como: a
noradrenalina, dopamina e serotonina que atuam em vias e receptores especificos e
ainda opioides endógenos como algumas encefalina e endorfinas.11,84
39
Ademais, alguns neurotransmissores estão envolvidos no controle descendente da
dor, sendo os principais a noradrenalina, os opioides endógenos, a 5-HT e o GABA,
embora outros também desempenham papel importante.79 A inibição descendente da
dor tem na PAG um importante núcleo de integração. Esta foi a primeira região onde, a
partir de estimulação elétrica, foi demostrado que era possível evocar hipoalgesia
adequada para intervenção cirúrgica.
O neurotransmissor serotonina, desempenha um papel importante na modulação
da transmissão nociceptiva. A maioria das evidências indicam que a medula espinal é o
principal sítio de ação da 5-HT e esta é liberada a partir de fibras descendentes
provenientes do RVM. O papel da 5-HT na modulação da dor já se encontra muito bem
descrito. Estudo evidenciou que o paraclorofenilanina (pCPA), bloqueador da síntese de
5-HT, é responsável por abolir a analgesia induzida por estimulação elétrica no SNC.
85
Ademais, ja foi demonstrado que a estimulção elétrica do núcleo magno da rafe
promove aumento na produção e liberação de 5-HT no corno dorsal da medula espinhal
de ratos, o que abole o efeito do pré-tratamento com pCPA.
Porém, apesar disso, a neurotransmissão serotoninérgica é bastante complexa, já
que é composta por sete classes de receptores (5-HT1, 5-HT2, 5-HT3, 5-HT4 ,5-HT5, 5HT6 e 5-HT7 , sendo estes ainda subdivididos em 5-HT1A, 5-HT1B , 5-HT1D ,5-HT1F, 5HT2A, 5-HT2B, 5-HT2C, 5-HT5A,5-HT5B).86 Dentre esses subtipos, estudo desenvolvido
por Alhaider et al. (1993)87 investigou o efeito modulatório espinhal do receptor de
serotonina tipo 5-HT1 na nocicepção em ratos. Para tanto foi utilizados conhecidos
agonistas do receptor 5-HT1A
[8-Hydroxy-2-di-n-propylamine, a tetrailin (8-OH-
DPAT) e a buspirona], agonistas do receptor tipo 5-HT1B [m-trifluoromethylphenylpiperazina (TFMPP) e 7-tnfluoromethyl-4 (4-metil-1 -piırazinyl)-pyrroIo (1 ,2-la)
quinoxaiine (CGS 1 2066B)] bem como um agonista misto de receptor tipo 5-HT1A e
5HT1B [5-carboxamidotryptamine (5-CT)]. Assim, foi constatado que a administração
intratecal de 8-OH-DPAT, buspirona e 5-CT facilitou significativamente o reflexo de
retirada da cauda, durante o teste de tail-flick, enquanto as drogas TFMPP e CGS 1
2066B foram responsáveis por prolongar o tempo de latência ao tail-flick. Estes
resultados confirmam outros achados sobre o papel facilitatório do receptor 5-HT1A
40
sobre as respostas nociceptivas e apoia o envolvimento do receptor 5-HT1B na ação
antinociceptiva da serotonina.
Neste sentido, estudo desenvolvido por Tood e Millar (1983)88 observou em seu
estudo que a 5-HT também estimula interneurônios GABAérgicos o que por sua vez
auxiliaria na redução da dor. Isto ocorre, visto que o GABA, por sua vez, também
constitui um aminoácido inibitório. Trata-se do neurotransmissor mais amplamente
distribuído no sistema nervoso. Aproximadamente 40% das terminações nervosas no
PAG são GABAérgicas. Atua primariamente na redução da excitabilidade neuronal
através da ligação a receptores GABA (GABAA, GABAB e GABAC), os quais
promovem a abertura de canais de Cl- ou de K+ na membrana do nervo destes
receptores. O influxo de Cl- ou o efluxo de K+ na célula pós-sináptica hiperpolariza a
membrana celular, reduzindo a propagação do potencial de ação, e assim, inibindo a
transmissão nociceptiva.
Acrescido a isto, existem fortes evidências relacionando a noradrenalina (NA),
um dos neurotransmissores mais abundantes no cérebro89,90, não apenas com a analgesia
induzida por estimulação central, mas sugerindo também que os efeitos da NA são
mediados por vias descendentes. Sagen e Proudfit (1984) demonstraram que a lesão
espinhal induzida pela neurotoxina 6- hydroxydopamine (6-OHDA) promove redução
drástica do conteúdo de NA promovendo hiperlagesia.91 Além disso já foi demonstrado
por Reddy e Yaksh (1980) que a administração intratecal de NA promove analgesia em
ratos e isto parece ser mediado por receptor α-adrenérgico visto que o efeito
antinociceptivo da NA foi antagonizado pela administração sistêmica prévia ou
intratecal de fentolamina (α-bloqueador), mas não foi afetado pelo pré-tratamento com
propranolol (β-bloqueador).92
A nível supra-espinhal, a NA também regula antinocicepção através de sua ação
sobre α-adrenoceptores localizados em núcleos cerebrais e da medula espinhal. È sabido
que um número de regiões do cérebro recebem inervação noradrenérgica e expressam
RNAm para alfa- adrenoceptor. Estas estruturas cerebrais incluem o RVM, núcleo
reticular lateral bulbar, amígdala, LC, hipotálamo entre outras.93
41
Outra via descendente inibitórias que bloqueia a atividade dos neurônios
nociceptivos no corno dorsal tem origem no LC noradrenérgico e em outros núcleos do
bulbo e da ponte. Essas projeções descendentes bloqueiam, direta e indiretamente, a
saída de neurônios nas lâminas I e V por ações inibitórias. O LC, composto por 6
subnúcleos , está localizado na ponte dorsolateral e estudos demonstrarma que esta
região envia projeções noradrenérgicas para a medula espinhal por meio das vias
descendentes.
66,94,95
Ativação do LC eletricamente ou quimicamente pode produzir
antinocicepção profunda96,97 e pode inibir a atividade nociceptiva em neurônios do
corno dorsal.94,98–100
Já foi demonstrado também que a via descendente do LC para a a medula espinhal
é ativada durante a inflamação periférica e que a ativação deste sistema ceruleo-espinhal
diminui o desenvolvimento da hiperalgesia.101 Diversos estudos tem evidenciado que o
LC envia uma projeção bilateral para o corno dorsal da medula espinhal.94,102,103Assim,
axônios dos neurônios contralaterais provenientes das projeçoes do LC, cruzam a linha
média dentro do cérebro e descendem através do funículo dorsolateral (DLF) para
terminar no corno dorsal da medula espinhal.102,103 Este achado sugere que a via
descendente proveninete do LC deve ser ativada bilateralmente durante a inflamação.
2.9. Hipotireoidismo e sua ação no sistema nervoso central e periférico
Vários fenômenos do desenvolvimento (e da vida adulta) são influenciados pelos
HTs, como: crescimento axonal e neurítico, sinaptogênese, migração e sobrevivência
neuronal, mielinização e eficácia sináptica52. Na ontogênese cerebelar, por exemplo,
experimentos demonstraram que os hormônios tireoidianos atuam pela mediação do
fator de crescimento epidermal (EGF), propiciando um aumento no número de
astrócitos104.
A regulação da liberação de neurotransmissores no hipocampo também se
mostrou influenciada pela presença de HTs.105. Investigações sobre a proliferação
celular na zona sub-ventricular do hipocampo também demonstraram que o T3 e seu
receptor TRα desempenham um importante papel na neurogênese desta região106.
Efeitos sobre a síntese de matriz extracelular também foram observados no cerebelo. A
42
ausência dos hormônios tireoidianos, no cerebelo, foi responsável por atraso na
expressão de laminina (proteína da lâmina basal) e redução nos seus níveis, quando
comparado ao grupo controle.107.
A deficiência dos HTs durante a vida intra-uterina e no período pós-natal mantém
a imaturidade do SNC, leva a hipoplasia dos neurônios corticais, atrasa a mielinização e
reduz a vascularização encefálica.108,109 Se a reposição hormonal não se fizer de
imediato após o nascimento, essas lesões podem tornar-se irreversíveis, com prejuízo no
desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM).
43
Mesmo quedas sutis de T4 associado a
elevados níveis de TSH na gestante, podem resultar em prejuízo cognitivo na prole
110,111
Clinicamente, vários estudos indicam que filhos de mães com hipotireoidismo
descompensado durante a gestação podem apresentar significante decréscimo do
quociente de inteligência (QI).43,112,113 Ademais, neonatos expostos a níveis
consideravelmente reduzidos de HTs durante a vida uterina apresentam posteriormente
retardo no crescimento, defeitos neurológicos e desempenho reduzido em diversas
habilidades cognitivas.54 A ação dos hormônios da tireóide sobre o sistema nervoso
central ocorre, principalmente, do período intra-uterino até os dois primeiros anos de
vida na espécie humana. As conseqüências específicas à deficiência dependem do
período e severidade da exposição.114 Adicionalmente, a deficiência de HTs durante a
gestação reduz o número de células neuronais e afeta severamente as suas interações
sinápticas.115
Há mais de 30 anos, estudos pioneiros sobre os efeitos da deficiência dos HTs no
desenvolvimento
do
cérebro
utilizaram
ratos
como
modelo
experimental.
Diferentemente do que ocorre em humanos, em ratos, um grau significativo de
desenvolvimento do cérebro ocorre após o nascimento.116 A figura 2 ilustra uma
comparação simplificada entre o desenvolvimento do SNC do rato e do humano. No
rato, o efeito da privação dos hormônios da tireóide tem sido estudada no período
neonatal precoce, pois este corresponde à fase final de desenvolvimento intra-uterino
nos seres humanos. Os hormônios tireoidianos são primeiramente fornecidos pela mãe
para o feto (área mais escura sombreada) até que a função da tireóide fetal inicia (17º
43
dia embrionário, no rato), e, posteriormente, ambos contribuem para manter o nível de
hormônio tireoidiano no cérebro fetal.117 O número de receptores para hormônios da
tireóide aumenta durante as primeiras duas semanas pós-natal no rato, coincidindo com
o aumento dos HTs plasmáticos e a grande onda de mielinização do SNC. 117
Nível de hormônio tireoideano
tireoideano
Mielinização
Córtex cerebral
Striatum
Corpo caloso
Cerebelo
Nascimento
Humano
Idade gestacional em meses
Período embrionário
Nascimento
Ratos
Dias pós-natais
Figura 5. Desenvolvimento do SNC em ratos e humanos. [Rodriguez-Peña et al. (1999)]52
Trabalho desenvolvido por Madeira et al. (1991)118,119 evidenciou que a
deficiência dos hormônios tireoideanos no período pós natal imediato e tardio reduz a
proliferação neuronal e também leva ao aumento da morte celular. Estes eventos são
subjacentes à mudanças irreversíveis morfológicas observadas no cérebro de ratos com
hipotireoidismo, durante o desenvolvimento ou na maturidade. As alterações estruturais
observadas estão provavelmente relacionadas com os déficits funcionais observados
nesta condição. Ademais dados publicados por Hasegawa et al. (2010)120 indicam que o
hipotireoidismo perinatal reduz o volume cerebral como um todo.
Como dito anteriormente, a deficiência hormonal durante o desenvolvimento do
SNC provoca anormalidades neurológicas no cérebro como a perda neural. O
hipocampo é uma das regiões do cérebro vulneráveis à deficiência hormonal e o volume
do giro denteado (GD) e do cornu ammonis (CA) são reduzidos no hipotireoidismo
transitório, durante o desenvolviemento do SNC.121 Essas anormalidades neurológicas
das estruturas do hipocampo e a perda neuronal são irreversíveis, mesmo quando os
44
níveis de hormônios tireoideanos eram revertidos à níveis normais após o
desenvolvimento do SNC, como mostrado por Madeira et al. (1992). 118
Além disso, estudo desenvolvido por Pathak et al. (2011)122 com ratas prenhas
tratadas com metimazol (MTZ) do 6º de gestação até o final da lactação ou eutanásia
observou que níveis adequados de HTs maternos asseguram adequada citoarquitetura
fetal neocortical ressaltando a importância da reposição de tiroxina precocemente.
2.10. Hipotireoidismo e gestação
Durante a gestação, de maneira geral, as anormalidades da função tireoidiana
podem afetar 10% das mulheres gestantes.8,112 A prevalência de hipotireoidismo durante
a gestação varia em cada país, porém estima-se que esta varie de 0,3% a 25%.123 Para o
hipotireoidismo subclínico, estima-se que a prevalência seja de 4% segundo estudo
desenvolvido com gestantes no estado da Bahia.124 A deficiência de HTs, como no
hipotireoidismo congênito, é uma das causas mais comuns e tratáveis de deficiência
mental no recém-nascido (RN). 36,125,126
Durante o período gestacional, é importante o diagnóstico precoce do
hipotireoidismo, uma vez que este pode trazer consequências para o concepto e para a
própria gestante.8 Na gravidez, o organismo materno sofre uma série de modificações
hormonais e metabólicas e a ocorrência de alguma falha na adaptação dessas mudanças
fisiológicas resulta em disfunções tireoidianas.127 Tem sido demonstrado que adequadas
concentrações de HTs fetais são necessárias desde o início da gestação para se atingir
um desenvolvimento neurológico adequado.128 No início da vida fetal, o organismo é
dependente dos HTs da mãe por volta da 11ª semana, a tireóide fetal começa a captar
iodeto e, no meio da gestação, por volta da 18ª-20ª semana, passa a secretar seus
próprios hormônios.38
Precocemente, já no início da gestação, os níveis elevados de estrógeno
determinam aumento das concentrações séricas da proteína transportadora de T4, TBG,
particularmente por estímulo à sua síntese.
129
Em conseqüência há aumento das
concentrações séricas de T4 e T3 totais que atingem um plateau por volta de 12 a 14
45
semanas da gestação. Este aumento rápido e marcante da TBG (2 a 3 vezes do normal) é
acompanhado por tendência à diminuição do T4 e do T3 livres e resulta em estímulo do
eixo hipotálamo-hipófise-tireóide.130,131 Estas alterações nas concentrações de T4 livre
seguidas de aumento de TSH para novo equilíbrio não são usualmente detectadas nos
testes de rotina, porém, nas mulheres gestantes que vivem em áreas carentes em iodo,
ficam bem evidentes.132
No primeiro trimestre da gestação, ocorre estimulação direta da tireóide materna
pelas concentrações elevadas de gonadotrofina coriônica (hCG). Este aumento, que
atinge valores de pico entre a 8ª e a 14ª semana de gestação, é acompanhado por
inibição do eixo hipotálamo-hipófise e, em face da reatividade cruzada com o receptor
de TSH, promove aumento temporário do T4 livre.133,134
Além disso, durante toda a gestação, ocorre modificação do metabolismo dos
hormônios maternos por meio de sua desiodação pela placenta. Três enzimas catalisam
a desiodação dos hormônios tireoidianos (HT) nos tecidos humanos.135,136 A atividade
da desiodase tipo 1 parece não ser modificada na gestação, enquanto a do tipo 2 é
expressa na placenta, porquanto sua atividade representa mecanismo homeostático para
manter a produção maior de T3 local, quando as concentrações de T4 maternas são
reduzidas. A placenta contém grandes quantidades de desiodases tipo 3 que convertem
T4 em T3 reverso (rT3) e T3 em T2. Esta alta atividade durante a vida fetal pode
explicar as concentrações baixas de T3 e altas de rT3, que são características do
metabolismo dos HTs fetais.
Durante muito tempo se acreditou que a placenta era impermeável aos HTs,
embora estudos iniciais com marcação radioativa destes hormônios sugerissem que
alguma porcentagem de T3 e T4 atravessasse lentamente a barreira placentária.6,137 A
baixa permeabilidade desta barreira para o HT foi inicialmente atribuída às propriedades
físico-químicas de T3 e T4. No entanto, a descoberta de que a placenta contém
abundantes desiodases tipo 3 (5D´3), responsáveis por converter T4 em T3 reverso
(biologicamente inativo), sugeriu que a desiodação intraplacentária pode desempenhar
um papel importante para a disponibilidade de HTs.138 Corroborando com estes dados,
Vulsma et al., 198939 demonstraram que fetos com agenesia da glândula ou defeitos
46
completos de organificação, portanto incapazes de produzir hormônios tireoidianos,
apresentavam concentrações de T4 correspondentes a 30% dos níveis normais
circulantes. Estes dados então demonstraram que a transferência transplacentária
continua até o nascimento.
Ademais, a identificação da presença de receptores de T3 no cérebro fetal por
volta da décima semana139 e a observação da primeira fase de rápido desenvolvimento
cerebral no segundo trimestre, período no qual o suprimento de hormônios tireoidianos
se faz principalmente às custas da passagem materna, sugerem que baixas concentrações
maternas de T4 podem resultar em déficit neurológico irreversível na criança. 140–142
Em humanos, tem sido confirmada a presença de ambos os hormônios, T3 e T4,
nos tecidos fetais no início do primeiro trimestre, bem antes do início da produção dos
HTs pelo feto. Estes começam a ser formados no início do segundo trimestre.32,143,144
Assim, existem evidências clínicas que até mesmo reduções leves nos níveis de HTs
materno no início da gestação, podem levar ao desenvolvimento neuropsicológico
inadequado, destacando, assim, a importância de quantidades adequadas de T4 materno
para o desenvolvimento fetal normal.140,145–147
Na última década, o conhecimento acerca da capacidade dos HTs maternos
atravessarem a barreira placentária tem aumentado significativamente. Vários
transportadores de membrana placentário para hormônios tireoidianos têm sido
descritos.148 Loubière et.al. (2010)148 descreveram a ontogenia dos transportadores dos
hormônios tireoidianos MCT8, MCT10, LAT1, LAT2, OATP1A2 e OATP4A1 em uma
grande série (n = 110) de placentas humanas normais em toda a gestação. Assim o
método quantitativo RT-PCR (reverse transcription polymerase chain reaction)
revelou, neste estudo, que todos os RNAms que codificam estes transportadores de HTs
estavam expressos na placenta humana a partir da 6ª semana de gestação e durante toda
a gravidez. Em conclusão, este estudo demonstrou que transportadores para HTs estão
presentes na placenta humana a partir do inicio do primeiro trimestre com diferentes
padrões de expressão durante a gestação. Seus efeitos coordenados podem regular tanto
a passagem transplacentária quanto o fornecimento de HTs para o trofoblasto, ambos
essenciais para o desenvolvimento normal do feto e da placenta. 148
47
Estudo desenvolvido por Burns et al. (2011)149 postulou que a biodisponibilidade
de iodo placentário contribui significativamente para a proteção contra hipotireoidismo
neonatal. Estes achados sugerem que a placenta tem um papel não só na captação, mas
também no armazenamento de iodo como um meio possível de proteger o feto de
inadequações na ingestão de iodo na dieta materna. 149
É interessante ressaltar que a placenta parece ser incapaz de compensar o
hipotireoidismo materno. No início da gravidez quando os níveis adequados de HTs
fetal são cruciais para o desenvolvimento neurológico normal, os níveis de T4 que serão
encontrados no cérebro fetal refletem os níveis de T4 maternos.150,151 Isto sugere a
ausência de um mecanismo de feedback dos níveis de HT materno na transferência
materno-fetal de HT.150,151 Assim, redução de hormônios tireoidianos maternos pode
promover danos encefálicos importantes no feto. Desta forma, é possível notar que a
placenta é responsável por regular a passagem dos HTs maternos para o feto através da
interação complexa dos transportadores de membrana, enzimas e desiodades.150,151
2.10.1. Hipotireoidismo materno e nocicepção da prole
Especula-se que o hipotireoidismo congênito pode alterar a maturação das vias
somatossensoriais, alterando as respostas nociceptivas e o processamento da dor
induzida. Alguns estudos em animais têm tentado estabelecer o papel do hormônio
tireoidiano na nocicepção. Bruno et al. (2005)152 relataram que hipotireoidismo
induzido no periodo pré-natal e pós-natal reduziu o limiar nociceptivo térmico, induzida
pelo tail-flick, em ratos recém nascidos e idosos, mas aumentou a resposta nociceptiva
em ratos adultos jovens.152 Neste contexto, Edmondson et al. (1990) também
constataram que ratos hipertiroideos apresentam maior sensibilidade à estimulação
térmica.153
Animais filhos de mães com hipotireoidismo, 7 e 15 dias após o nascimento,
foram submetidos ao teste de formalina (injeção) na pata direita. Neste estudo, foi
possível observar que os filhotes de mães hipotireóideas demonstraram maior
sensibilidade a doses menores de formalina, quando comparados com o controle.154
48
Os achados supracitados sugerem que o hormônio da tireóide desempenha um
papel fundamental na resposta a dor aguda a estímulos breves de caráter tanto mecânico
quanto térmico. Vale ressaltar que, em todos os estudos supracitados, os autores
induziram o hipotireodismo através da adição de propiltiuracil na água de beber de ratas
gestantes e mantiveram este tratamento ainda durante os primeiros dias de lactação.
Estudo realizado por Akbari et. al. (2009)155, demonstrou redução particular da
expressão óxido nítrico sintase (NOS) no corno dorsal da medula espinhal em filhos de
mães hipotireóideas (induzido por meio de PTU do 16º dia de gestação até o 23º dia
pós-natal). Esta diferença parece explicar a modificação da sensibilidade nociceptiva
observada pelos autores.
Em suma, a ocorrência de hipotireoidismo materno durante a gestação apresenta
grande potencial em gerar desordens transitórias ou definitivas ao longo da vida da
prole. Neste contexto, há indícios de que o desenvolvimento da circuitaria neuronal
somatossensorial fetal é claramente dependente de HTs de origem materna. Por isso, a
deficiência destes hormônios durante a vida intra-uterina pode ser a origem de doenças
hiper ou hipoalgésicas crônicas, sem causa aparente, e que acomentem indivíduos mais
tardiamente em suas vidas.
2.10.2. Hipotireoidismo e controle motor
A presença de RNAm para receptores de hormônios tireoideanos no cerebelo foi
determinada pela técnica de biologia molecular RT-PCR no estudo de Habas et al.
(2011)156. Ao cerebelo, são tradicionalmente atribuídas funções tais como coordenação,
equilíbrio da marcha e controle motor fino.
A falta de TH no início da vida tem um efeito marcante sobre o desenvolvimento
do cerebelo de ratos.157 Hasebe et al. (2008) estudaram o efeito da indução do
hipotireoidismo durante o período gestacional e lactação na atividade locomotora na
prole de ratos machos por meio do teste Rota-Rod. Os cérebros dos animais foram
removidos nos 6, 9, 12, 15, 25 e 30 dias pós-natais e foram analisados, utilizando-se
cortes sagitais do cerebelo. Os autores verificaram que o desempenho motor dos filhos
49
de mães hipotireóideas foi significativamente pior quando comparado ao grupo controle
e que estes animais apresentaram alteração morfológica no cerebelo.157
Corroborado com estes achados, estudo desenvolvido por El-Bakry et al. (2010)158
com ratos visou estudar o efeito na prole do hipo e hipertireoidismo experimental
gestacional a nível do SNC. Os dados deste estudo evidencaram que tanto o
hipotireoidismo quanto o hipertireoidismo materno são responsáveis por malformações
e defeitos no desenvolvimento do córtex cerebelar e cerebral. Foi demonstrado a
presença de degeneração, deformação e retardo no crescimento grave em neurônios
dessas regiões em ambos os grupos tratados durante todo o período experimental. Neste
contexto, estudo em humanos, tal como o que foi realizado por Tajima T. (2007)159,
também identificaram casos de atrofia cerebelar associado ao hipotireoidismo
congênito.
Fuggle et al. (1991)160 avaliaram 57 crianças com hipotireoidismo congênito e
identificaram
déficit
importante
nas
habilidades
motoras
destas
crianças,
particularmente em relação ao equilíbrio. Assim, os autores sugeriram que tal déficit foi
encontrado em virtude de um comprometimento inicial do sistema vestibular, que pode
ocorrer apesar do tratamento precoce com T4. É sabido que o controle de equilíbrio
exato requer a integração, no tronco encefálico, de informações neurossensoriais de boa
qualidade fornecidas pelos sensores visual, vestibulares e somestésicos, bem como
requer processamento central eficiente para gerar respostas motoras adequadas,
incluindo movimentos oculares compensatórios pelo reflexo vestíbulo-ocular e ajuste no
corpo pelo reflexo vestíbulo-espinhal.161 Assim, a alteração em qualquer um destes
componentes pode ser responsável por gerar importante prejuízo motor e do equilibrio.
Alguns achados mais recentes têm demonstrado que o fator neurotrófico derivado
do cérebro (BDNF) promove a sobrevivência dos neurônios motores in vitro e resgata
os neurônios motores da morte celular induzida por axotomia in vivo. Neste estudo,
desenvolvido por Ikeda et al. (1995), objetivou-se examinar os efeitos da administração
de BDNF exógeno sobre a progressão da doença do neurônio motor (DNM) em ratos.
Assim identificou-se que o tratamento com BDNF foi responsável por aumentar a
50
mielinização em neurônios motores na raiz cervical quando comparado ao grupo
controle.162
Sabendo da importância do BDNF no cerebelo para a sobrevivência e
diferenciação circuitaria neuronal motora, bem como para o desenvolvimento do SNC
como um todo, diferenciação neuronal, sinapse, plasticidade neural e para o
aprendizado.163 Sinha et. al. (2009)164 avaliaram o efeito do hipotireoidismo gestacional
nos níveis de BDNF na prole. Assim, os autores constataram redução nos níveis de
BNDF no cerebelo da prole em diferentes fases do desenvolvimento pós-natal.
Além do BDNF, tem sido sugerido que a acetilcolinesterase (AchE),
independentemente da sua função catalítica, está envolvido na regulação da proliferação
celular e crescimento neurítico durante o desenvolvimento do sistema nervoso central
de ratos165 e do embrião de galinhas156. Também foi relatado que em roedores, há uma
relação entre HT e AchE e que ratos com hipotireoidismo apresentam um declínio da
atividade da AchE no cerebelo165.
Estudo desenvolvido por Haba et al. (2011)156 avaliou as conseqüências
prejudiciais do hipotireoidismo durante a embriogênese do embrião da galinha, que é
descrito como um modelo animal apropriado para investigar o estado do
hipotireoidismo durante a embriogênese. Para tanto, foi realizada inibição da biossíntese
de hormônio tireoidiano em embriões de galinha através do uso do MTZ. Assim,
identificou-se que a atividade da acetilcolinesterase cerebelar foi reduzida após
tratamento com MTZ e esta alteração foi relacionada pelos autores com o déficit motor
e cognitivo encontrado em individuos com hipotireoisimo congênito.
Diante do exposto, é possível compreender que distúrbios motores podem ser
observados quando o cérebro se desenvolve às custas de aporte insuficiente de HT.
Assim, sabendo da importância do hormônio tireoidiano para o desenvolvimento do
sistema nervoso central e da coordenação motora, torna-se essencial investigar os
efeitos do hipotireoidismo materno no que tange a atividade locomotora da prole.
51
2.11. Considerações finais
Em suma, a ocorrência de hipotireoidismo materno durante a gestação, sobretudo
na forma subclínica, apresenta grande potencial em gerar desordens transitórias ou
definitivas ao longo da vida da prole. Neste contexto, há indícios de que o
desenvolvimento da circuitaria neuronal, somatossensorial e motora, fetal é claramente
dependente de HTs de origem materna. Por isso, a deficiência destes hormônios durante
a vida intra-uterina pode ser a origem de doenças hiper ou hipoalgésicas crônicas ou
gerar problemas motores ou de equilíbrio , sem causa aparente, e que acomentem
indivíduos mais tardiamente em suas vidas. No entanto, até o presente momento, muitas
lacunas acerca dos mecanismos fisiopatológicos desta deficiência permanecem
obscuras.
52
3. OBJETIVOS
3.1. Objetivo geral
Investigar as repercussões da carência dos hormônios tireoideanos maternos
durante o período gestacional na nocicepção e no desempenho motor em diferentes
etapas da vida da prole.
3.2. Objetivos específicos
Investigar o efeito da carência dos HTs durante a gestação:
1. no limiar mecânico ao longo da vida da prole de ratas, na latência térmica ao
longo da vida da prole de ratas;
2. no desempenho locomotor ao longo da vida da prole de ratas com
hipotireoidismo gestacional experimental;
3. no ganho de peso da prole;
4. no tempo de abertura ocular da prole.
5. na duração da gestação, no número de filhotes por ninhada e no peso corporal
das mães.
53
4.MATERIAL E MÉTODOS
4.1.Animais utilizados
Foram utilizadas três categorias de ratos Wistar obtidos do Biotério Central da
Universidade Federal de Sergipe. São elas: Categoria I. onze fêmeas adultas (200 a 250
g) que foram acompanhadas para acasalamento programado. Destas, sete emprenharam
e tiveram suas gestações concluídas para a produção do número necessário de filhotes.
Confirmadas as sete gestações, quatro fêmeas foram submetidas ao protocolo de
indução de hipotireoidismo durante a gestação (grupo FH) e três receberam água de
torneira (grupo FE); Categoria II. seis machos adultos (250 a 300 g), para
acasalamento com as fêmas adultas da categoria I; Categoria III. 46 ratos neonatos,
sendo 22 (13 machos e 9 fêmeas) filhos de mães eutireóideas e 24 (11 machos e 13
fêmeas) neonatos filhos de mães com hipotireoidismo gestacional experimental.
Enquanto não estavam gestantes, as fêmeas da categoria I foram mantidas em
caixas de policarbonato coletivas com 2 animais por caixa. Diariamente, tiveram seu
ciclo estral acompanhado por análise colpocitológica para que, na fase do proestro,
fossem expostas a rato Wistar adulto para acasalamento. A confirmação da cópula foi
feita pela detecção microscópica de espermatozóide no lavado vaginal. Confirmado a
cópula, cada fêmea foi acondicionada individualmente em caixa de policarbonato, onde
permaneceram por toda a gestação, parto e lactação. No dia 3 após o nascimento, os
filhotes foram sexados e mantidos em amamentação em ninhadas com, no máximo, oito
animais. No dia 21 após o nascimento, a ninhada foi desmamada e os filhotes
transferidos para caixas coletivas, com até seis animais do mesmo sexo por caixa.
Durante todo o período, os animais tiveram livre acesso à água e comida. As salas de
manutenção dos animais e experimentação, localizadas no Laboratório de Pesquisa em
Neurociências (LAPENE, HU), tinham luminosidade controlada com ciclo claro-escuro
de 12/12h (luz das 6 às 18 horas), e temperatura de 23 + 2 oC, tendo livre acesso à
alimentação e água. Os animais receberam água de torneira e foram alimentados com
ração especifica para roedores.
54
Todos os procedimentos aos quais os animais utilizados neste estudo foram
submetidos estão de acordo com as normas e princípios éticos preconizados pela
International Guiding Principles for Biomedical Research Involving Animals e foram
aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Animais (CEPA) da Universidade
Federal de Sergipe, sob o nº88/11.
4.2. Drogas utilizadas e protocolo de indução do hipotireoidismo gestacional
experimental
Para a indução de hipotireoidismo gestacional experimental, foi utilizado o
inibidor da iodoperoxidase, metimazol (MTZ), administrado ad libitum na concentração
de 0,02% na água de beber (água de torneira), a partir do nono dia de gestação (DG) até
o dia do parto.166 Esta concentração ofertada por 10 dias é hábil para gerar
hipotireoidismo em ratas prenhas, visto que se evidencia redução nos níveis circulantes
de T3 total e T4 total.55 Esta solução foi protegida da luminosidade e trocada a cada três
dias. As fêmeas controles (eutireóideas) receberam água de torneira ad libitum.
4.3. Acompanhamento das mães
Desde o momento da aquisição no Biotério Central da Universidade Federal de
Sergipe (UFS), as fêmeas foram pesadas em dias alternados até o parto. Foi utilizado,
para fins estatísticos, o peso das fêmeas no dia do acasalamento e onze dias após o
ínicio do tratamento com MTZ (20º dia de gestação). Acrescido a isto, foi avaliado o
tempo de gestação das ratas prenhas de ambos os grupos, bem como o número de
filhotes por ninhada.
4.4. Acompanhamento da prole
Foi realizada a pesagem diária dos filhotes do 3º ao 30º dia pós-natal. A partir de
então, a avaliação do peso corporal dos filhotes de ambos os grupos passou a ser mensal
até 120 dias pós-natais. Além disso, os filhotes de ambos os grupos foram avaliados
diariamente, desde o nascimento, a fim de se verificar o momento em que realizariam a
abertura ocular.
55
4.5. Avaliação do limiar mecânico para retirada da pata
Para a avaliação do limiar mecânico de retirada da pata, foram utilizados os
filamentos de vonFrey aplicados diretamente nas patas traseiras. Inicialmente, os
animais foram ambientados em suas caixas por 30 minutos na sala de comportamento.
Na sequência, os animais foram transferidos para caixas transparentes com piso de tela
de metal vasada, onde foram mantidos por 30 minutos para nova ambientação. Este
procedimento foi repetido por dois dias consecutivos. Séries de filamentos com forças
crescentes (em mN), calibrados em balança semi-automática de precisão, foram
aplicados, em duplicata, na superfície plantar da pata traseira até que o animal
manifestasse o comportamento de retirada da pata mediante o estímulo.167 A menor
força na qual o animal retirasse a pata de uma das duas aplicações foi registrada como
limiar mecânico de retirada da pata, e interpretada como sensibilidade mecânica
secundária (cutânea). Esse método tem demonstrado extrema confiabilidade
estatística.168
Os filhotes de mães eutireóideas, bem como os das mães com hipotireoidismo
gestacional, foram submetidos a este procedimento aos 7, 15, 23, 30, 60 e 120 dias de
nascidos. Tal procedimento já se encontra consolidado na literatura, inclusive para
faixas etárias iniciais (7, 15, 23 e 30 dias).169–172. Porém, até o presente momento
nenhum estudo utilizou o teste de sensibilidade mecânica de vonFrey em filhotes de
mães hipotireóideas nas idades mencionadas (figura 6).
A
B
C
D
Figura 6.4.6.
Aparato
para avaliação
do limiar
mecânico
para retirada
da pata (vonFrey). Filamentos de
Avaliação
da latência
para
a retirada
da cauda
vonFrey (A); Figuras representativas dos procedimentos de habituação (B) e teste em filhotes aos 30 (C) e
120 dias pós-natais (D).
56
Para avaliação do limiar térmico, foi utilizado o tail-flick. Neste modelo, foi
realizado um estímulo térmico acima de 49oC aplicado à cauda dos ratos,
desencadeando o reflexo da retirada da mesma por flexão predominantemente em
direção rostral. A avaliação destas respostas foi realizada por meio da medida da
latência (em segundos) entre o início da aplicação do estímulo térmico e o momento de
afastamento da cauda da fonte de calor. Foi adotado o ponto de corte de 20 segundos.
Foi registrado o limiar térmico por meio do tempo de latência do reflexo de retirada da
cauda. Esse modelo permite obter informações sobre o mecanismo de regulação da
sensibilidade térmica, uma vez que o parâmetro avaliado (i.e.: reflexo de retirada da
cauda) é de integração medular e supra-medular.173
Os filhotes de mães eutireóideas bem como os das mães com hipotireoidismo
foram submetidos a este procedimento aos 7, 15, 23, 30 e 60 dias de nascidos. Tal
procedimento já se encontra consolidado na literatura em todas as faixas etárias
utilizadas neste estudo15,152,174–176(figura 7).
A
B
Figura 7. Aparato para avaliação do limiar de sensibilidade térmica (tail flick). Avaliação do filhote nos
dias 7 (A) e 60 pós-natais.
4.7. Avaliação do desempenho motor
Os possíveis efeitos no desempenho motor promovidos pelo hipotireoidismo
materno na prole foram testados através do aparato Rota-Rod. Especificamente, os
animais foram colocados no Rota-Rod rodando a uma velocidade de 10 rotações por
minuto (rpm) por 120 segundos e mantida por outros 30 segundos em 18 rpm.177 Para
habituação, os ratos foram treinados durante os dois dias anteriores ao dia do teste. Aos
60 dias de vida, foram submetidos a três sessões com três tentativas cada, em intervalos
57
de 15 minutos entre as sessões e intervalos de 5 minutos entre as tentaivas. O tempo de
performance foi registrado em segundos (figura 8).
Figura 8. Aparato para a avaliação do desempenho motor (Rota-Rod).
A prole de mães eutireóideas e hipotireóideas foi submetida a tal procedimento 60
dias após o nascimento. A utilização do Rota-Rod em ratos jovens, também já se
encontra padronizado na literatura e é bastante utilizado em animais com idades
inferiores a 30 dias.178–181
4.8. Avaliação da força de preensão
Os possíveis efeitos na força de preensão (em gramas) promovidos pelo
hipotireoidismo gestacional foram avaliados na prole através do Grip Strength Meter. O
teste de força de preensão constitui um método não invasivo amplamente utilizado
projetado para avaliar a força dos membros dos ratos. Tal método tem sido
frequentemente utilizado para investigar os efeitos de doenças neuromusculares e
drogas.182,183
Este se baseia na tendência natural do animal para agarrar uma barra ou grade
quando suspenso pela cauda. O animal agarra uma barra de metal horizontal enquanto é
puxado levemente pela cauda. A barra ou grade é acoplada a um transdutor de força que
mede o pico da força de tração (em gramas), que pode ser visualizado em uma tela
digital. O objetivo deste teste é avaliar o tônus dos animais e/ou a força dos membros
anteriores e posteriores ao mesmo tempo ou separadamente. Este método pode ser útil
58
para medir a progressão de uma disfunção neuromuscular em ratos. Alterações na força
de preensão avaliada pelo Grip Strength Meter eletrônico (figura 9) tem sido
interpretadas como evidência de redução ou aumento da força muscular.184
O teste foi realizado com um animal por vez, sendo obtidas, para cada animal, três
medidas com intervalos de 5 minutos entre as mensurações. Para cada animal, foi
escolhido o melhor valor alcançado entre as três medidas. Tal teste foi realizado aos os
120 dias pós-natais.
Figura 9. Aparato necessário para realização do teste de força de preensão (Grip Strength Meter eletrônico).
Uma vez que todos os testes comportamentamentais in vivo, por sua natureza,
apresentam variabilidade, a fim de reduzir tal fenômeno o mesmo examinador realizou
todos os testes descritos anteriormente. Para impedir a influência do experimentador nos
testes comportamentais realizados, estes não tinham conhecimento dos grupos aos quais
pertenciam os animais (estudo cego).
4.9. Desenho Experimental
Os experimentos seguiram o seguinte cronograma experimental: 1. As fêmeas
foram acompanhadas para detecção do estro e acasalamento. 2. No nono dia de gestação
foi iniciado o protocolo de indução do hipotireoidismo gestacional experimental (HGE);
3. Ao final da gestação (parto), foi interrompida a administração de MTZ; 4. No 21º
DPN os filhotes foram desmamados e separados por sexo; 5. Aos 7, 15, 23, 30, 60 e 120
dias de vida, os animais foram submetidos aos testes de sensibilidade mecânica e
59
térmica. Aos 60 dias de vida, foi testada a atividade locomotora dos filhotes por meio do
Rota-Rod. Aos 120 dias, os filhotes foram submetidos ao teste para avaliação da força
de preensão das patas (figura 10).
A
B
Figura 10. Procedimento experimental adotado nas mães (A) e na prole (B). MTZ: metimazol; DPN: dia pós-natal
Os filhos de mães HGE ou controle foram distribuídos nos seguintes grupos:
Grupo 1. 11 machos MTZ (i.e.: filhos de mães hipotireóideas) para o teste de
sensibilidade mecânica, térmica, Rota-Rod e grip strength meter; Grupo 2. 13 machos
controle (i.e.: filhos de mães eutireóideas) para o teste de sensibilidade mecânica,
térmica, desempenho motor e força de preensão; Grupo 3. 9 fêmeas controle (i.e.: filhas
de mães eutireóideas) para o teste de sensibilidade mecânica, térmica, desempenho
motor e força de preensão; Grupo 4. 13 fêmeas MTZ para o teste de sensibilidade
mecânica, térmica, desempenho motor e força de preensão.
Todos os dados referentes aos dias 60 e 120 dias após o nascimento foram
analisados dissociando os machos das fêmeas. Tal procedimento se justifica pois, a
partir de 60 dias de vida, ratos machos e fêmeas já se encontram sob grande
interferência de hormônios gonadais, que sabidamente afetam a nocicepção.185,186
60
Assim, pretendemos investigar a existência de um possível presença de dimorfismo
sexual, tornando ainda mais intrigante este estudo.
4.10. Análise estatística
Os dados referentes aos testes de sensibilidade (vonFrey e tail-flick), desempenho
motor ( Rota-Rod) e força de preensão (Grip Strength Meter) foram analisados por meio
do teste estatistico ANOVA two-way de amostras repetidas, seguido do post hoc test de
Bonferroni. O teste T foi utilizado para analisar os dados referentes a abertura ocular
dos filhotes, duração da gestação, número de filhotes por mães e peso corporal das
mães. O nível crítico fixado foi de 5% para se admitir uma diferença de médias como
estatisticamente significante. Os resultados foram expressos em média ± erro padrão da
média (EPM).
61
5. RESULTADOS
Neste estudo, não foram identificadas diferenças no tempo de gestação (22±0
versus 21,75± 0,25 dias, FH e FE respectivamente) bem como no número de filhotes
por ninhada das fêmeas hipotireóideas (FH) quando comparadas as fêmeas eutireóideas
Tempo de gestação (dias)
(FE) (9,14±0,96 versus 7,6±0,92, respectivamente) (figuras 11 e 12).
TEMPO DE GESTAÇÃO
25
20
FE
FH
15
10
5
0
Figura 11. Efeito do HGE na duração da gestação. Foram incluídas 5 fêmeas eutireóideas (FE) e 7
fêmeas hipotireóideas (FH).Teste t de Student.
Nº de filhotes
15
FE
FH
10
5
0
Figura 12. Efeito do HGE no número de filhotes paridos. Foram incluídas 5 fêmeas eutireóideas (FE) e
7 fêmeas hipotireóideas (FH). Teste t de Student.
Ademais, não houve diferença significativa no peso corporal das ratas alocadas
em ambos os grupos, FH e FE (196,4±13,84 versus 197,49±12,2 gramas,
respectivamente), bem como no peso destas após onze dias de tratamento com MTZ
(239± 17,7 versus 227±12,7 gramas, respectivamente) (figura 13).
62
Observou-se que a prole de mães hipotireóideas (PMH), quando comparada a
prole de mães eutireóideas (PME), apresentou um retardo significativo no tempo
necessário para abertura ocular após o nascimento (15,42±0,19 versus 14,41±0,22 dias,
respectivamente, p<0,05) (figura 14). Os mesmos animais também apresentaram peso
corporal inferior no 15º e 30º DPN quando comparados a PME (22,03±0,65 versus
25,87±0,42 gramas, 45±1,42 versus 73,58±1,3 gramas, respectivamente) (p<0,01 e
p<0,001, respectivamente) (figura 15). Não houve diferença significativa no peso
corporal da PMH quando comparada a PME, no 3º DPN (6, 51±0,18 versus 8,53±0,19
gramas, respectivamente).
A
B
300
Controle
Hipotireoidismo
Peso corporal (g)
Peso corporal (g)
300
200
100
FE
FH
200
100
0
0
Figura 13. Efeito do HGE no peso corporal das mães, antes (A) e onze dias após o tratamento com MTZ (B).
Foram incluídas 5 fêmeas eutireóideas (FE) e 7 fêmeas hipotireóideas (FH). Teste t de Student.
Abertura ocular (dias)
20
15
*
PME
PMH
10
5
0
Figura 14. Efeito do HGE no tempo de abertura ocular da prole. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas
(PME), n=22) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=24). (*) p<0,05. Teste t de
Student.
63
***
Peso corporal (g)
80
PME
PMH
60
40
**
20
0
3 DPN
15 DPN
30 DPN
Figura 15. Efeito do HGE no peso corporal da prole. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas
(PME), n=22) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=24). (**) p<0,01; (***)
p<0,001, Anova two-way, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal.
No que tange a influência do HGE sobre o peso corporal dos animais aos 60 e 120
DPNs foi observado que apenas os machos da prole de mães hipotireóideas (m-PMH),
possuem peso significativamente inferior quando comparados aos machos da prole de
mães eutireóideas (m-PME) (202,3±5,8 versus 223,8±5,1 gramas, respectivamente)
(p<0,01 para ambas as idades estudadas) (figura 16).
**
Peso corporal (g)
300
m-PME
m-PMH
f-PME
f-PMH
**
200
100
0
60 DPN
120 DPN
Figura 16. Efeito do HGE no peso corporal da prole aos 60 e 120 DPN. m-PMH: machos da prole de
mães hipotireóideas, n=9; f-PMH: fêmeas da prole de mães hipotireóideas, n=9; m-PME: machos da
prole de mães eutireóideas, n=13; f-PME; fêmeas da prole de mães eutireóideas, n=8. (**) p<0,01,
Anova two-way, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal.
64
Os animais da PMH apresentaram latência reduzida quando comparados a PME,
para o 7º (10,93±1,4 versus 17,76±0,84 segundos), 15º (11,77±1,13 versus 16,08±1,0
segundos), 23º (13,45±1,36 versus 18,31± 0,82 segundos) e 30º DPN (15,37± 0,96
versus 19,42± 0,3 segundos) (p<0,001, p<0,05, p<0,01, p<0,05, respectivamente)
(figura 17).
25
***
Latência (s)
20
**
*
23 DPN
30 DPN
*
PME
PMH
15
10
5
0
7 DPN
15 DPN
Figura 17. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade térmica, avaliado pelo método Tail-Flick, aos 7 ,15,
23 e 30 DPN comparados aos respectivos controles. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas (PME),
n=20) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=23). (*) p<0,05; (**) p<0,01;
(***) p<0,001, Anova two-way, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal.
Para os dados de sensibilidade térmica, aos 60 dias pós-natais, foi possível
observar que apenas os m-PMH permaneceram hipersensíveis (15,05±1,41 versus
18,65±1,07 segundos) (p <0,05) (figura 18).
25
PME
PMH
*
Latência (s)
20
15
10
5
0
Machos
Fêmeas
Figura 18. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade térmica da prole aos 60 DPN. (*) p<0,05, Anova
two-way, Bonferroni post hoc test. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas (PME), n=13 para
machos e n=9 para fêmeas) e Grupo Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=11 para
machos e n=12 para fêmeas).
65
Os animais da PMH apresentaram maior limiar mecânico de retirada da pata em
todos os dias estudados porém esta diferença não foi significativa ( 7,96±1,07 versus
5,18±0,9mN no 7º DPN; 15,43±1,11 versus 12,40±1,49 mN no 15º DPN; 15,34±1,17
versus 14,06±1,15 mN no 23º DPN; 22,29±2,89 versus 18,93±2,74 mN no 30º DPN).
(figura 19 e 20).
Limiar mecânico (mN)
30
PME
PMH
20
10
0
7 DPN
15 DPN
23 DPN
30 DPN
Figura 19. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade mecânica da prole, medido pelo método vonFrey,
aos 7, 15, 23 e 30 DPN. Grupo Controle (prole de mães eutireóideas (PME), n=22) e Grupo
Hipotireoidismo (prole de mães hipotireóideas (PMH), n=24). Anova two-way, Bonferroni post hoc test.
DPN: dia pós-natal
Limiar mecânico (mN)
250
m-PME
m-PMH
f-PME
f-PMH
200
150
100
50
0
60 DPN
120 DPN
Figura 20. Efeito do HGE no limiar de sensibilidade da prole, medido pelo método vonFrey, aos 60 e 120
DPN. m-PMH: machos da prole de mães hipotireóideas, n=9; f-PMH: fêmeas da prole de mães
hipotireóideas, n=9; m-PME: machos da prole de mães eutireóideas, n=13; f-PME; fêmeas da prole de mães
eutireóideas, n=9. Anova two-way, Bonferroni post hoc test. DPN: dia pós-natal.
No estudo da atividade locomotora, por meio do Rota Rod, observa-se que os mPMH, apresentaram
menor tempo de permanência na plataforma giratória quando
66
comparados aos m-PME (27,45±6,57 versus 93,91±14,53 segundos, respectivamente)
(p<0,01). Entretanto, nenhuma diferença foi demonstrada entre as fêmeas (96,46±13,61
versus 93,22±13,11 segundos, f-PMH e f-PME respectivamente) (figura 21).
150
PME
PMH
Duração (s)
**
100
50
0
Machos
Fêmeas
Figura 21. Efeito do HGE no desaempenho motor, medido pelo método Rota-Rod, da prole aos 60 dias de
nascidos. Grupo Controle (filhos de mães eutireóideas (PME), n=12 para machos e n=9 para fêmeas) e
Grupo Hipotireoidismo (filhos de mães hipotireóideas (PMH), n=11 para machos e n=13 para fêmeas).
(**) p<0,01, Anova two-way, Bonferroni post hoc test.
Os dados referentes à avaliação do efeito do HGE sobre a força de preensão,
através do grip strength meter, em filhotes machos e fêmeas, aos 120 dias pós-natal,
podem ser visualizados na figura 22.
Nestes podemos observar que os m-PMH
apresentaram força de preensão significativamente menor em comparação aos m-PME
(1103,88±44,56 versus 1329±68,66 gramas, respectivamente) (p<0,05). No entanto, não
houve diferença entre as fêmeas (993,55±38,01 versus 1149,55±93,19 gramas, f-PMH e
f-PME, respectivamente.).
Força (g)
1500
*
PME
PMH
1000
500
0
Machos
Fêmeas
Figura 22. Efeito do HGE na força de preensão, medido pelo método Grip Strength Meter. Grupo
Controle (filhos de mães eutireóideas (PME), n=13 para machos e n=9 para fêmeas) e Grupo
Hipotireoidismo (filhos de mães hipotireóideas (PMH), n=9 para machos e n=9 para fêmeas). (*) p<0,05,
Anova two-way, Bonferroni post hoc test.
67
6. DISCUSSÃO
O presente estudo demonstrou que a administração de MTZ, para induzir HGE em
ratas prenhas, não alterou o peso corporal, tempo de gestação e número de filhotes por
ninhada. Entretanto, alterações importantes foram observadas no desenvolvimento
corporal e nos sistemas sensorial e motor da prole.
Os
hormônios tireoidianos são responsáveis por mediar importantes efeitos
fisiológicos em diferentes sistemas biológicos ao longo da vida. Hipotireoidismo
durante um período crítico de desenvolvimento tem sido associado com retardo mental
irreversível e profundo distúrbio neurológico.187 Além disso, tanto anormalidades
puramente neurológicas quanto as neuro-comportamentais são comuns em disfunções
da tireóide no adulto.187
Lasley et al. (2011)188, utilizaram PTU a uma concentração de 0,001% e
evidenciaram redução discreta, porém significativa, do peso corporal de ratas tratadas a
partir do 17º dia de gestação. No entanto, refletindo os nossos achados, vanWijk et al.
(2008) demonstraram que a indução do hipotireoidismo materno não foi responsável
pela redução do peso corporal das mães tratadas durante o período gestacional189. Isto
aponta para a enorme possibilidade de que uma hipofunção tireoideana não gere,
necessariamente, sinais e sintomas clássicos nas gestantes.
No que diz respeito à duração da gestação, não encontramos diferenças entre as
ratas tratadas com MTZ e as controles. Estes achados corroboram os de Pancieira et al.
(2007)190 que identificaram que cadelas tratadas com iodeto radioativo durante a
gestação, para induzir hipotireoidismo, não apresentaram tempo prolongado de gestação
quando comparado as cadelas do grupo controle. Contrariamente, Hapon et al. (2003)191
induziram hipotireoidismo em ratas oito dias antes do acasalamento com PTU na água
de beber e identificaram aumento no tempo de gestação das ratas tratadas.
Adicionalmente, a chegada com êxito ao termo, ou seja, o parto de um produto
vivo, também pode coexistir com o hipotireoidismo gestacional, apesar da alta
correlação entre hipotireoidismo e aborto.192–195 Similarmente a Calvo et al. (1990)62 e
68
Hapon et al. (2003)191, nossos dados demonstraram que o tratamento com MTZ, a
0,02%, não afeta o número de fetos por ninhada, uma vez que o número de filhotes
nascidos vivos não diferiu entre os grupos.
Estudo prévio evidenciou que a deficiência de iodeto durante a gestação promove
morte precoce ou aborto, aumenta a ocorrência de natimortos ou promove o nascimento
de filhotes fracos.195,196 Contrariamente, não identificamos a ocorrência de abortos ou
natimortos com a concentração de MTZ de 0,02%. Tal achado pode estar
correlacionado com a dosagem utilizada, visto que Behzadi e Ganji (2005)197
demonstraram que as concentrações de 0,05% e 0,075% de PTU, adicionadas a água de
beber de ratas prenhas, aumentaram a mortalidade dos filhotes na segunda semana pós
natal diferente do que foi visto com a concentração de 0,005% de PTU, que também
gerou hipotireoidismo nas ratas prenhas, no entanto, reduziu a mortalidade fetal e pósnatal.
Curiosamente, a avaliação da prole de mães com HGE demonstrou que ocorrem
claras e importantes modificações na prole, sobretudo no que diz respeito ao peso
corporal, tempo de abertura ocular, sensibilidade mecânica e térmica e desempenho
motor durante as diferentes fases de desenvolvimento pós-natal. Portanto, apesar de não
termos realizado dosagens dos HTs e do TSH nas mães, as razões apontadas
anteriormente nos permitem, de forma segura inferir que o MTZ, administrado por via
oral, conforme o protocolo adotado neste estudo, induz hipotireoidismo em ratas
gestantes. Acrescido a isto, estudo desenvolvido por Ahmed et al. (2010)55 aponta que
esta concentração de MTZ adicionada a água de beber por 10 dias é capaz de gerar, nas
ratas prenhas, redução dos níveis circulatentes de T3 total e T4 total.
Segundo Rohani et al. (2009)154, a indução do hipotireoidismo materno (PTU a
0,005%) impede o adequado desenvolvimento corporal da prole, o que pode ser
evidenciado pelo baixo peso corporal dos filhos de mães hipotireóidieas a partir da
segunda semana de vida154,196–198, corroborando nossos achados. De forma mais
específica, assim como em nosso estudo, Lasley et al. (2011)188 evidenciaram redução
no peso corporal da prole a partir do 15º DPN, no entanto, a redução de peso corporal
observada por estes autores foi mantida apenas até o 35º DPN, diferentemente do
69
presente estudo, em que os animais mantiveram peso corporal menor em relação aos
controles até os 120 dias pós-natais. Neste contexto, os estudos clínicos com humanos
são divergentes. Em um estudo caso-controle, foi evidenciado que o peso médio ao
nascimento dos neonatos, em gestações cujas mães apresentam hipotireoidismo
subclínico, foi significativamente menor quando comparado aos neonatos filhos de
mães eutiróideas.199 Contrariamente, Casey et al. (2007) demonstraram que a
prevalência de recém nascidos com baixo peso (< 2,5kg) não foi significativamente
diferente para mães eutireóideas e hipotireóideas.200
A diminuição do peso corporal e do crescimento tem sido comumente encontrado
em experimentos nos quais o hipotireoidismo foi induzido em ratos durante o
desenvolvimento.201–205 Assim, tem sido demonstrado que déficits dos HTs afetam
negativamente o crescimento ósseo através de um efeito sobre a produção e ação do
hormônio de crescimento (GH).206 Além disso, Van Vliet et al (2009)
207
constataram
que o impacto causado pelo hipotireoidismo congênito na maturação esquelética do RN,
apresenta dimorfismo sexual, sendo os machos mais afetados. Tal achado pode justificar
o fato de ter sido observado, apenas nos machos filhos de mães hipotireóideas, redução
no peso corporal aos 60 e 120 dias pós-natais, quando comparado ao grupo controle.
Similarmente aos nossos achados, Rohani et al. (2009) e Sawin et al. (1998)
demonstraram que os filhotes de mães hipotireóideas apresentam retardo na abertura
ocular.154,198 Tal fato pode indicar atraso no desenvolvimento destes animais.
Em um estudo realizado por Bruno et. al. (2005)152, induziu-se hipertireoidismo
através de injeção intraperiotineal de L-tiroxina (T4) (25 μg/100g de peso) em ratos
machos e analisou-se o efeito do hipertireoidismo na sensibilidade térmica nos dias 5,
60 e 330 dias após o nascimento. Os autores relataram que, com cinco dias de vida, o
hipertireoidismo experimental foi responsável pelo aumento na latência da resposta ao
estímulo térmico, contrastando com o que foi observado aos 60 e 330 dias pós-natais.
Neste contexto, Bruno et al. (2005)15 desenvolveram, no mesmo ano, estudo a fim de
avaliar a nocicepção de filhotes neonatos de mães hipotireóideas e a nocicepção de
filhotes adultos com hipotireoidismo induzido pela tireoidectomia. Os resultados deste
estudo demonstaram que com 14 e 420 dias de vida, os filhotes apresentaram aumento
70
na latência ao estímulo térmico medido pelo tail-flick, quando comparado ao grupo
controle. Porém, de maneira contrária, aos 60 dias de vida estes animais apresentaram
redução da latência térmica, caracterizando hiperalgesia. Interessantemente, em nossos
achados, filhos de mães hipotireóideas apresentaram redução na latência térmica (i.e.:
hiperalgesia térmica) em todas as idades estudadas (7, 15, 23, 30) quando comparado ao
grupo controle. No entanto, aos 60 dias pós-natais, a redução na latência térmica foi
observada apenas nas fêmeas filhas de mães hipotireóideas. Tal achado pode estar
relacionado
ao
efeito
antinociceptivo
do
estrógeno
relatado
por
diversos
autores185,186,208,209. Neste sentido, Okuda et al. (2011)208 verificaram que o efeito
antinociceptivo produzido pelo estrógeno ocorre via interação deste hormônio com o
receptor de serotonina na medula espinhal. Assim, Lawson et al. (2010)209 evidenciaram
que tal efeito está relacionado ao aumento na expressão do gene do receptor opióide
Kappa na medula espinhal gerado pelo estrógeno. È importante ressaltar que não há na
literatura estudos para avaliar a presença de dimorfismo sexual no limiar de
sensibilidade térmica na prole de mães hipotireóideas. Assim, este constitui o primeiro
estudo com esta finalidade.
Até o presente momento, nenhum estudo utilizou o teste vonFrey com a finalidade
de aferir a sensibilidade mecânica em animais filhos de mães hipotireóideas. Portanto,
não há na literatura qualquer relato a respeito de alterações na sensibilidade mecânica da
prole induzida pelo HGE. Para tanto, o presente trabalho, de forma inédita, avaliou este
grupo de animais com o intuito de preencher esta lacuna do conhecimento acerca da
sensibilidade mecânica da prole de mães HGE. Interessantemente, nossos dados
apontam que o HGE sobre a não influencia a sensibilidade mecânica na maioria das
idades estudadas. A exceção foi verificada apenas para machos aos 60 dias de vida, o
que demonstra que a alteração encontrada foi transitória, e mais estudos são necessários
para elucidar o mecanismo para esta reposta pontual.
Hasebe et al. (2008)157 demonstraram que os filhos de mães hipotireóideas
apresentam tempo de permanência na plataforma do Rotarod reduzido. Assim os autores
sugerem a ocorrência de alterações cerebelares como causa de tal fenômeno, visto que a
presença de um defeito funcional no cerebelo, ocasionado pela redução da
71
biodisponibilidade de HTs durante o desenvolvimento cerebral, já foi demonstrado em
diversos outros estudos. 157
O desenvolvimento do cerebelo em animais
hipotireóideos tem sido
extensivamente estudado. Trabalhos prévios revelaram que (1) o número de células de
Purkinje não é diminuído, (2) a maturação do cerebelo é permanentemente afetada,
refletida pela organização anormal da árvore dendrítica, hipoplasia persistente do campo
dendrítico e diminuição do número de espinhas dendríticas, (3) a proliferação, a
migração e a diferenciação de células granulares externas é retardada, (4) fibras
paralelas são mais curtas e têm menos contato sináptico com células de Purkinje, e (5) a
densidade sináptica é degradada ao longo do córtex cerebelar.210–215
Considerando estas alterações neurobiológicas, em nossos achados machos filhos
de mães hipotireóideas apresentaram redução no desempenho locomotor avaliado por
meio do Rotarod. Portanto, baseando-se nestes estudos prévios, é possível que a
insuficiência de HTs durante a gestação determine algum déficit funcional cerebelar
nestes animais.
De modo intrigante, tais alterações não foram observadas em filhas de mães HGE.
Isto aponta para a presença de fatores protetores presentes em fêmeas, provavelmente
relacionados à ação estrogênica direta ou indireta. Foi demonstrado por diversos autores
que existe uma sensibilidade diferencial sexo-dependente para as alterações no BDNF
causadas pela deficiência de hormônio tireoideano. 216–219 Tal achado pode ser devido a
modulação estrogênica na expressão da proteína BDNF ou a interacções dos hormônios
estrogênicos com os hormônios tireoideanos no cérebro.216–219 Assim, tem sido
mostrado que o estrogênio é um potente regulador de BDNF no cérebro de ratos.220,221
Mais recentemente, Aguirre e Baudry (2009)222 evidenciaram que a administração
exógena de estrógeno aumenta a expressão de BDNF no hipocampo.
Já está bem descrito na literatura a importância do BNDF no cerebelo para a
sobrevivência e diferenciação da circuitaria neuronal motora, bem como para o
desenvolvimento do SNC como um todo, diferenciação neuronal, sinapse, plasticidade
neural e para o aprendizado.163 Sinha et al. (2009)164 avaliaram o efeito do
72
hipotireoidismo gestacional nos níveis de BNDF na prole de ratos, constatando redução
nos níveis de BNDF no cerebelo da prole em diferentes fases do desenvolvimento pósnatal. Desta forma, não se pode excluir a possibilidade de que o estrógeno, já presente
aos 60 dias de vida no organismo das ratas estudadas, possa ter aumentado a expressão
do BDNF cerebelar, melhorando a eficácia sináptica e promovendo melhor performance
locomotora nestas ratas.
Ainda de forma semelhante, apenas os machos filhos de mães hipotireóideas,
apresentaram menor força muscular quando mensurada pelo Grip Strength Meter, em
relação ao grupo controle. Tal como nos dados referentes ao desempenho motor, as
fêmeas não foram afetadas.
Assim, considerando que o rota-rod consiste no teste mais comum para avaliar, a
nível experimental, o desempenho motor de animais.223,224 e que o Grip Strength Meter
fornece uma medida de força muscular e equilíbrio,225,226 habilidade neuromotora
precoce se faz necessária para que os animais realizem adequadamente os testes.
Portanto, tomados em conjunto, estes achados indicam que qualquer um dos
componentes do circuito do controle motor, desde a aferição dos sinais proprioceptivos
até a atividade contrátil muscular, pode ser afetada pela deficiência de HTs durante a
vida intra-uterina. Mais que isso, estes resultados reforçam a hipótese que as fêmeas
estão mais protegidas que os machos submetidos às mesmas circustâncias
experimentais.
Corroborando estes achados, em um estudo desenvolvido por vanWijk et al.
(2008), em que o hipotireoidismo materno foi induzido por dieta pobre em iodo,
constatou-se que, antes do desmame da prole (14º dia de vida), os filhotes de ambos os
sexos apresentaram pior desempenho no grip strength meter quando comparado ao
grupo controle. No entanto, tal diferença desapareceu, para ambos os sexos, no 29º dia
de vida. 189 De modo semelhante, Darbra et al. (2003)225 também verificaram tempo de
latência diminuído no "wire hanging test” no dia 21 pós-natal em ratos machos em que
o hipotireoidismo foi induzido do 9º dia gestacional ao 21º dia pós-natal. Este teste
também afere a atividade locomotora e o equilíbrio dos animais. No entanto, estes
autores observaram que aos 40 e 60 dias pós-natal essa diferença no desempenho motor
73
desaparece. Assim, nenhuma diferença entre o grupo controle e hipotireoideo foi
observada no 80º dia pós-natal no teste " wire hanging test”, segundo o estudo de SalaRocca (2002).226
Portanto, nossos resultados demonstram, pela primeira vez, que a ausência de HTs
durante, exclusivamente, a vida intra-uterina, pode afetar permanentemente os
mecanismos de controle nociceptivo e motor, podendo, por isso, constituir um elemento
etiológico de desordens álgicas e motoras que atualmente são consideradas de origem
desconhecida.
74
7. CONCLUSÃO
Assim concluímos que o hipotireoidismo gestacional experimental afeta
negativamente o desenvolvimento corporal da prole, bem como os sistemas sensorial e
motor. Ademais, parece haver dimorfismo sexual, nas respostas encontradas, uma vez
que ratos machos apresentaram pior desempenho motor e menor força de preensão do
que fêmeas.
Assim, os achados obtidos a partir deste trabalho abrem perspectivas para que
novos estudos sejam desenvolvidos a fim de identificar o substrato neurobiológico das
alterações nos mecanismos de nocicepção e controle motor encontradas nos filhos de
mães hipotireóideas.
75
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APÊNDICE A
93
Experimental hypothyroidism during pregnancy affects nociception and locomotor
performance along the life of offspring in rats
Authors:
Iura Gonzalez Nogueira Alves (Alves, IGN)1
Kamilla Mayara Lucas da Cruz (Cruz, KML)2
Clarissa Maria Dias Mota (Mota, CMD)1
Luís Carlos Reis (Reis, LC)3
Kathleen A. Sluka (Sluka, KA)4
Josimari Melo de Santana (DeSantana, JM) 2
Valter Joviniano de Santana-Filho (Santana-Filho, VJ)2
Daniel Badauê-Passos Jr (Badauê-Passos, D Jr) 1
1
Departamento de Fisiologia, Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, SE, Brazil
2
Departamento de Fisioterapia, Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, SE, Brazil.
3
Departamento de Ciências Fisiológicas, Instituto de Biologia, Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro, Brazil
4
Department of Physical Therapy and Rehabilitation, University of Iowa, Iowa City, IA,
USA.
*Corresponding author: Daniel Badauê Passos Jr., Departamento de Fisiologia,
Universidade Federal de Sergipe. Av. Marechal Rondon, s/n. São Cristóvão, SE,
BRAZIL. Zip code: 49100-000. E-mail: [email protected].
Running Title: Gestational hypothyroidism and pain in offspring
Words for indexing: gestational hypothyroidism, nociception, sex dimorphism, rats
94
ABSTRACT
We aimed to investigate the impact of experimental gestational hypothyroidism (EGH)
on nociceptive threshold and motor activity in the offspring at different postnatal ages
(7th, 15th, 23rd, 30th, 60th and 120th postnatal days; PND) in rats. EGH was induced with
methimazole (MMI) 0.02% in drinking water from day 9 of gestation until birth. The
offspring was assessed for thermal and mechanical nociception using the tail-flick test
and vonFrey filaments. Rota-Rod test and grip strength were used to assess motor
function. EGH reduced thermal, but not mechanical threshold at all ages studied (p
<0.05). Differently, 60 days old females offspring from MMI-treated dams (f-OMTD)
were not affected by EGH when tested in the tail-flick. Only males OMTD presented a
deficient locomotor performance using the Rota-Rod test (p < 0.01 at 60th PND), and
the grip strength meter (p < 0.05 at 120th PND), in comparison to offspring from watertreated dams (OWTD). In conclusion, EGH promotes hypersensitivity to noxious
thermal, but not mechanical stimulus, whereas motor performance is reduced and
thermal hypernociception remains present, both only in mature males OMTD,
suggesting the presence of a protective factor in females.
Keywords: gestational hypothyroidism, nociception, sex dimorphism, rats.
Perspective: The identification of changes in the sensitivity to noxious stimulus in
offspring from hypothyroid mothers may provide new insights for further studies, and
then support in advancing our understanding of the mechanisms involved in the
pathophysiology of some pain disorders.
95
INTRODUCTION
Thyroid hormones (THs), thyroxine (T4) and 3,5,3’-triiodothyronine (T3) are
essential to normal body development, especially to structural and functional formation
of the central nervous system (CNS)
adulthood
women
4,10,26
20,37,51
5,30,31
, not only during development but also in
. High prevalence of hypothyroidism has been reported in pregnant
. The role of THs in mammalian brain development has been extensively
studied 42. However, it is not clear how thyroid dysfunctions during intra-uterine life can
affect these organisms later in life. It is known that THs act on normal neurological
development in the following manner
proliferation
13
differentiation
41
: (i) they increase the rate of neuronal
, (ii) act as the “time clock” to end neuronal proliferation and stimulate
13,39
, (iii) once neurons are formed, they follow an orderly pattern of
migration to the appropriate regions in the brain, particularly, in the cerebral and
cerebellar cortex, (iv) they stimulate the formation and development of neuronal
processes, axons and dendrites
28
, and consequently (v) synaptogenesis. THs have also
been implicated in the control of the expression of brain-derived neurotrophic factor
(BDNF) and several neurotransmitters and receptors in the brain 49.
THs, synthesized in the maternal thyroid gland, can easily cross the placental barrier.
Before onset of function of its own thyroid gland, maternal THs are the only source of
these hormones to the fetus during a crucial period of neuronal development18,35. An
inadequate support of THs from pregnant mothers can temporarily or permanently
affect CNS differentiation in the offspring
17
. Cerebellum, lumbar dorsal horn and
cerebral cortex constitute same examples of structures in the CNS related to the
nociception and motor control that are targets for THs2,15,24,49. Thus, lower THs plasma
levels during intra-uterine life may affect nociception and motor performance in the
adult. In addition, it may potentially explain, at least in part, the origin of many
96
nociceptive and motor disorders, including those with unidentified etiology (e.g.:
fibromyalgia).
Prenatal and postnatal changes in the somatosensory system determine pain
sensitivity and sensory processing at each developmental stage 16. For example, several
studies show that early postnatal injury results in enhanced nociception in adult rats 3,45.
Prior studies also show that alterations in THs postnatally can affect nociceptive
threshold, with increases or decreases depending on the age7,8,14. Hyperthyroidism
postnatally acutely reduces nociceptive thresholds7, while perinatal hypothyroidism
decreases the pain sensitivity in newborn and old aged rats, but increases the
nociceptive response in young adult rats 8. Taken together, these findings suggest that
THs may play a key role in the neurochemical processing of acute (phasic) nociceptive
information7,8,14,44.
In the present study we aimed to investigate the consequences of the gestational
hypothyroidism in the programming of neural circuitry involved on the nociceptive
control over the offspring life in rats. Simultaneously, we characterized the presence of
any sexual dimorphism in offspring from hypothyroid dams.
2. MATERIALS AND METHODS
2.1. Animals and the induction of gestational hypothyroidism
All animals used were obtained from the Animal Care Facility of the Federal
University of Sergipe and maintained under controlled light/dark cycle (12/12h) and
room temperature (23±2 oC). They had free access to standard show and drinking
solution. Female Wistar rats (~200g) had their estrus cycle followed on daily basis
through vaginal smear. Once proestrus phase was detected, adult males (~300g) were
97
put in female cages for mating overnight (i.e. estrus phase). On the next morning, the
presence of spermatozoid on vaginal smear was considered as day 0 of gestation (GD).
To
induce
gestational
hypothyroidism,
dams
were
given
0.02%
methyl
mercaptoimidazole (methymazole, MMI, Sigma-Aldrich, Sant Louis, MO, USA) in the
drinking water from GD 9 up to delivery day (GD 21-22). This concentration given for
10 days to ensures that the dams have hypothyroidism, as shown by the decrease of
circulating levels of maternal total T3 and total T4 1. Offspring from MMI-treated dams
(OMTD) were compared to the corresponding control offspring (offspring from watertreated dams; OWTD). Newborns were sexed on post-natal day (PND) 3, and weaned
PND 21. Males and females were separated at weaning.
From 60th PND, all data obtained was analyzed separately considering the
gender of the offspring [male- and female-OMTD (m-OMTD and f-OMTD) or maleand female-OWTD (m-OWTD and f-OWTD)]. This procedure was adopted to avoid the
well known interference of gonadal hormones on nociception, especially after puberty
34,52
.
All procedures were reviewed and approved by the Ethics Committee for
Animal Research (CEPA) of the Federal University of Sergipe which operates under the
rules of the National Council for the Control of Animal Research (CONCEA) and
International Guiding Principles for Biomedical Research Involving Animals (Protocol
# 88/2011). All efforts were made to minimize animal suffering and reduce the number
of animals used.
2.2. Evaluation of thermal threshold
The threshold for noxious temperature was evaluated by using the Tail-Flick
apparatus (AVS, São Carlos, SP, Brazil). The intensity of the heat source was about
98
49ºC and was kept constant. Cut-off time was set to 20 s to prevent damage to the skin.
This procedure was performed at 7th, 15th, 23rd, 30th and 60th PND. However, on the 60th
PND, males and females were separately analyzed.
2.3. Evaluation of mechanical threshold
Mechanical threshold was measured by using vonFrey filaments (Ugo Basile,
Milan, Italy) as described by Gopalkrishnan and Sluka et al. 201021. This procedure was
performed at 7th, 15th, 23rd, 30th, 60th and 120th PND. On the 60th and 120th PNDs, males
and
B females were separately analyzed.
Initially, the animals were placed in transparent Lucite cubicles on a wire mesh
elevated plate and acclimated for another 30 minutes before testing. A series of
filaments with increasing bending forces (9.4 to 495.8 mN) were applied twice on the
plantar surface of the hind paw until the rat withdrew from the stimulus. The lowest
force at which the rat withdrew its paw from 1 of 2 applications was recorded as the
paw withdrawal threshold.
2.4. Evaluation of motor performance
The possible effects of gestational hypothyroidism on motor performance of the
offspring was tested using Rota-Rod test (AVS, São Carlos, SP, Brazil) (see Sluka et al.,
2001 for details)
50
and a grip strength test (Insight, Ribeirão Preto, SP, Brazil). Grip
strength was recorded as the highest value obtained from three consecutive trials. Each
trial was performed after five minutes of rest. Rota-rod test was performed only on the
60th PND whereas the grip strength was performed only in 120 days old animals. Males
and females were separately analyzed in both tests.
99
2.3. Data analysis
Nociceptive and motor tests were analyzed by repeated measures two-way ANOVA
with the testing across time as the repeated dependent variable, sex and treatment
(OMTD and OWTD) as independent factors. Bonferroni test was used for post hoc
analyses. The Student t test measured for the time of eyelid opening, the duration of
gestation, the number of pups per dam and body weight of the mothers. The threshold of
statistical significance was set at P < 0.05. The results were expressed as mean and
standard error of mean.
RESULTS
In this study, no differences were observed in the duration of the pregnancy and
number of offspring delivered by MMI treated mothers in comparison with control.
Moreover, eleven days of MMI administration did not alter mother’s body weight (i.e.:
20th GD), when compared to vehicle treated mothers (table 1).
Offspring from MMI treated dams showed a delay in the time of eyelid opening
(p = 0.02) (fig. 1). The same OMTD also had reduced body weight on the 15th and 30th
PND, when compared to OWTD (p < 0.01 and p < 0.001, respectively) (fig. 2). When
males and females were analyzed separately on the 60th and 120th PND, body weight
was significantly lower only in m-OMTD (fig. 3). Statistical analysis showed significant
effects for the treatments, time of testing, and interaction between treatment and time of
testing for body weight (2-way ANOVA, p < 0.01).
In figure 4, statistical analysis showed significant effects for the treatments and
time of testing, but not for interaction between treatment and time of testing for thermal
withdrawal latency (2-way ANOVA, p < 0.05). OMTD showed a lower threshold for
thermonociception, on the 7th, 15th, 23rd and 30th PND (p <0.001, p < 0.05, p < 0.01, p <
100
0.05, respectively). At 60th PND, only m-OMTD remained hypersensitive (p < 0.05)
(fig. 5). In fig. 5, the analysis of these data showed differences for the treatments, but
not for sex, and for interaction between treatment and sex (2-way ANOVA, p < 0.05).
On the other hand, mechanical threshold (vonFrey test) was not altered at 7th,
15th, 23rd and 30th PND (fig. 6). Similarly, when males and females were analyzed
separately on the 60th and 120th PND, no differences were observed (fig. 7).
For the Rota-Rod test, motor performance was tested only on the 60th PND, and
a reduction was observed only in m-OMTD (p < 0.01) (fig. 8). Similarly, using the grip
strength meter, the force exerted on day 120 m-OMTD was lower than m-OWTD (p <
0,05). However, no difference was observed in female rats at both tests (figs. 8 e 9).
Statistical analysis showed significant effects for the treatments and sex, and for
interaction between treatment and sex for the Rota-Rod test (2-way ANOVA, p < 0.05).
On the other hand, for grip test, the analyses showed significant effects for the
treatments and sex, but not for interaction between treatment and sex (2-way ANOVA,
p < 0.05).
DISCUSSION
The current evidence demonstrates, for the first time, that the deficiency of THs,
exclusively during intra-uterine life, can permanently and differentially affect thermal,
but not mechanical nociception. This suggests that hypothyroidism during gestation can
change neurocircuitry. This study found that OMTD presented a reduced thermal
nociceptive threshold (i.e., thermal hypersensitivity) at all studied ages, except in adult
females OMTD. In a previous study, Bruno et al. 2005 8, investigated newborns of
hypothyroid dams and adults with hypothyroidism induced by thyroidectomy.
101
Contrarily to our findings, they show that young and old animals (respectively, at 14th
and 420th PND) presented reduced thermal sensitivity at the Tail-Flick test. But
conversely, at 60th PND, these animals were more sensitive to thermal noxious stimulus.
The contradictory findings may be, at least in part, due to the differences between the
protocols used for the induction of hypothyroidism. In the present study, MMI
administration was restricted to gestation period, whereas others’ studies (including
Bruno’s and colleagues studies) maintained the animals in low THs plasma level even
after birth
1,8,15
. In addition, Bruno and colleagues, in 2005
7
, showed that
hyperthyroidism induced by intraperitoneal injection of high dose of L-thyroxine (T4)
in male rats was able to differently affect thermal sensitivity in an age-dependent
manner. Interestingly, these authors report a shift in the threshold for thermal sensitivity
during the life. Whereas experimental hyperthyroidism reduced thermal sensitivity at 5th
PND, it was increased at 60th and 330th PND.
Interestingly, in an unprecedented way, this study showed that mechanical
sensitivity, measured through vonFrey test, was not affected at all studied ages in
OMTD. No other studies have assessed mechanical sensitivity in offspring of
hypothyroid dams. Thus, further studies are needed to validated these finding and
elucidate the underlying mechanism.
We found that locomotor performance and muscle force were reduced in OMTD,
but only in adult males. Again, females were not affected. Because the motor system is
one important component of the response observed in the nociceptive tests used in this
study12,47, we tested how hypothyroidism can affect motor performance and the grip
force. Interestingly, despite the reduction in motor function observed in male OMTD,
they were able to remove their tails faster than control when exposed to noxious thermal
stimulus. This finding reinforces the hypothesis that thermal nociception is facilitated in
102
this animals. However, the lack of difference in mechanical sensitivity may be, at least
in part, compensated by the decrease in the motor performance. Thus, we cannot ensure
that the mechanical sensitivity is not anyhow affected by EGH.
The reduction in motor performance observed in this study is in agreement with
other studies using distinct protocols for the induction of hypothyroidism
6,46
. Previous
studies demonstrated that the lack of THs during pregnancy determines functional
deficit of the cerebellum of the offspring. Hasebe et al. 2008 24, showed that pups born
by hypothyroid dams spent less time at the platform of Rota-Rod apparatus. Other
studies showed that lower THs plasma levels can affect the cerebellum in different
manners
11,29,32,36,43,55
. For example, whereas the number of Purkinje cells are not
altered, cerebellar maturation is permanently affected. There is an abnormal
organization of the dendritic tree, persistent hypoplasia of the dendritic field and
decrease in the density of dendritic spines. Further Sinha et. al., 2009
49
showed that
hypothyroidism during gestation decreases BDNF expression in the cerebellum of the
offspring at different ages of development. BDNF increases the survival and
differentiation of neuronal circuitry in the cerebellum 33. Taken together, these findings
indicate that any of the components of the motor control circuit, including
proprioceptive sensitivity, peripheral and central neural pathways and ending on
muscles, may be affected by THs deficiency during the intrauterine life.
All the changes we found in mature male OMTD (i.e. higher thermal sensitivity,
lower motor performance and reduced muscle force) were not found in female OMTD.
It is possible that protective factors are present in females and could be related either
directly or indirectly to sexual hormones. It has been shown by several authors that
hypothyroidism can differentially alter BDNF expression in a sex-dependent manner in
the cerebellum, such that males show a larger decrease in BDNF
22,27,40,53
. Estrogen is a
103
recognized inducer of BDNF expression in the brain of rats
19,23,56
, and thus could
explain the sex differences between male and female rats. Contrary to our results,
vanWijk et al., 200854, showed that hypothyroidism reduces the grip performance in
male and female preweaning offspring (14 days old rats). It is likely that the lack of sex
differences at 14 days is because gonadal hormones are not being highly produced at
this stage. Interactions between ovarian hormones with THs in the brain are also
possible 22,27,40,53. Thus, together this study support the hypothesis that females are more
protected to the development of motor dysfunctions than males, when hypothyroidism
is present during gestation.
Despite the reduction in THs concentrations, our findings demonstrated that this
protocol did not to alter dam’s body weight. Similarly, van Wijk et al. 2008 showed no
changes in body weight by using a different protocol 54. These are considered valuable
findings once they suggested that in spite of thyroid hypofunction, the experimental
protocol used in the present study did not lead to apparent signs of hypothyroidism.
Thus, it seems to be a good model to mimic subclinical hypothyroidism that usually
occurs in pregnant women.
In addition, corroborating data from Pancieira et al. 2007
38
, the present data
showed no differences in the duration of gestation of hypothyroid and euthyroid
mothers. The current study agrees with prior studies showing that neither the number of
newborns and abortions were affected by hypothyroidism 9, despite a high correlation
between hypothyroidism, miscarriage and stillbirth 25.
However, beside the already mentioned differences in thermal nociception and
motor performance, we found other important changes in OMTD. OMTD presented
lower body weight from 15th PND overall experimental period. However, adult females
104
OMTD were again protected, and their body weights were similar to controls. The time
required to eyelid opening was longer in OMTD, as found by others 44,48.
In conclusion, we demonstrated for the first time that experimental
hypothyroidism exclusively during gestation increases thermal but not mechanical
nociception. Interestingly, the higher thermal sensitivity was maintained during the
adulthood, but only in adult males OMTD. Similarly, only mature m-OMTD had
reduced motor performance and grip force. Therefore, males OMTD were more
intensely sensitive than females to gestational hypothyroidism, suggesting a sexual
dimorphism of this disorder. Further studies are necessary in order to elucidate the
mechanisms by which hypothyroidism during gestation is able to interfere with the
programming of the processing of nociceptive stimulus, as well as the origin of the sex
differences observed in this study.
Acknowledgments
We thank Mr. Osvaldo Andrade Santos for the technical support, as well as
Sheyla Santos de Oliveira, Danilo Menezes Santos de Jesus, Vanessa Cibelle Barbosa
de Carvalho, Leonardo Silva Santos and Danielle Pereira Gaujac, all students at the
Laboratory of Basic and Behavioral Neuroendocrinology at the Federal University of
Sergipe, for the animal care. We also thank Dr. Alan Kim Johnson, from the University
of Iowa, for the kind donation of the drug used in this work to induce hypothyroidism
(methymazole).
Disclosures
This work was supported by grants from the National Council of Technological
and Scientific Development (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
105
Tecnológico/CNPq/Brazil) and the Research Supporting Foundation of State of Sergipe
(Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de
Sergipe/FAPITEC-SE).
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109
FIGURE LEGENDS
Table 1. Effects of MMI treatment on the duration of pregnancy, number of newborns
per dam, and maternal weight at days 0 and 20 of gestation. Data are shown as means ±
SEM. No differences were found.
Figure 1. Effect of EGH on the time of eyelid opening in offspring (OMTD = offspring
from MMI-treated dams, n=24; and OWTD = offspring from water-treated dams, n =
22). Data are shown as means ± SEM. (*) p < 0.05, compared to control.
Figure 2. Effect of EGH on the body weight of offspring (OMTD = offspring from
MMI-treated dams, n=24; and OWTD = offspring from water-treated dams, n = 22).
Data are shown as means ± SEM. (**) p<0.01 or (***) p <0.001, compared to the
control group. PND: postnatal day.
Figure 3. Effect of EGH on the body weight of 60 and 120 days old male and female
offspring (OMTD = offspring from MMI-treated dams, n=9 males and n=9 females; and
OWTD = offspring from water-treated dams, n=13 males and n=8 females). PND:
postnatal day. (**) p <0.01, compared to respective control. Data are shown as means ±
SEM.
Figure 4. Effect of EGH on the threshold for thermal sensitivity measured through TailFlick test at 7th, 15th, 23rd and 30th postnatal day (PND) in offspring (OMTD = offspring
from MMI-treated dams, n=23; and OWTD = offspring from water-treated dams, n =
20). Data are shown as means ± SEM. (*) p <0.05 or (**) p <0.01 or (***) p<0.001
compared to respective control.
Figure 5. Effect of EGH on the threshold of thermal sensitivity in 60 days old male and
female offspring (OMTD = offspring from MMI-treated dams, n=11 males and n=12
females; and OWTD = offspring from water-treated dams, n=13 males and n=9
females). PND: postnatal day. . (*) p <0.05 or (**) p<0.01 or (***) p< 0.001 compared
to respective control. Data are shown as means ± SEM.
Figure 6. Effect of EGH on the threshold for mechanical sensitivity measured through
vonFrey test at 7th, 15th, 23rd and 30th postnatal day (PND) in offspring (OMTD =
offspring from MMI-treated dams, n=24; and OWTD = offspring from water-treated
dams, n = 22). No differences were found. Data are shown as means ± SEM.
Figure 7. Effect of EGH on the threshold of mechanical sensitivity in 60 and 120 days
old male and female offspring (OMTD = offspring from MMI-treated dams, n=9 males
and n=9 females; and OWTD = offspring from water-treated dams, n=13 males and n=9
females). PND: postnatal day. No differences were found. Data are shown as means ±
SEM.
110
Figure 8. Effect of EGH on the locomotor performance in 60 days old male and female
offspring (OMTD = offspring from MMI-treated dams, n=11 males and n=13 females;
and OWTD = offspring from water-treated dams, n=12 males and n=9 females). PND:
postnatal day. (**) p <0.01, compared to respective control. Data are shown as means ±
SEM.
Figure 9. Effect of EGH on the grip strength (Grip Strength Meter) in 120 days old male
and female offspring (OMTD = offspring from MMI-treated dams, n=9 males and n=9
females; and OWTD = offspring from water-treated dams, n=13 males and n=9
females). PND: postnatal day. (*) p < 0.05, compared to respective control. Data are
shown as means ± SEM.
111
TABLE
Table 1
Groups
Days of
gestation
Number of
newborns per dam
Maternal BW (g) at
day 0 of gestation
Maternal BW (g) at
day 20 of gestation
Euthyroid dams
21±0.2
(n=5)
7,6±0.9
196.4±13.8
239±17.7
Hypothyroid
dams
22± 0.2
(n=7)
9.1±0.9
197.5±12.2
227±12.7
112
FIGURES
Figure 1
Figure 2
113
Figure 3
Figure 4
114
Figure 5
Figure 6
115
Figure 7
Figure 8
116
Figure 9
118
ANEXO A
119
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