HIPOTIREOIDISMO EM CÃO: RELATO DE CASO

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HIPOTIREOIDISMO EM CÃO: RELATO DE CASO
HYPOTHYROIDISM IN DOG: CASE REPORT
Taciana Kummer Pinto1, Tiago Zim da Silva1, Alexandre Corrêa2, Erika Mesquita3, Luzia
Cristina Lencioni Sampaio4*
Resumo
O hipotireoidismo em cães é o resultado da produção reduzida de tiroxina (T4) e
triiodotironina (T3) resultante da perda progressiva de tecido tireoidiano funcional pela
disfunção primária, secundária ou terciária da tireóide. Acomete principalmente cães de meiaidade de tamanho médio a grande, sem predileção por sexo. Uma deficiência de hormônio
tireoideo afeta a função de todos os sistemas orgânicos, resultando em sinais clínicos difusos,
variáveis e raramente patognomônicos. O diagnóstico pode basear-se em anormalidades
clínicas e bioquímicas associadas a concentrações séricas de TSH aumentadas e T4 total e
livre subnormais . A suplementação com hormônio tireóideo (L-tiroxina) é o tratamento de
escolha, sendo o prognóstico favorável nos casos de hipotireoidismo primário em adultos. O
objetivo desse trabalho foi relatar um caso de hipotireoidismo.
Palavras chave: tireóide, tetraiodotironina, L-tiroxina
Abstract
Hypothyroidism in dogs is the result of decreased production of thyroxine (T4) and
triiodothyronine (T3), as a consequence of progressive loss of functional thyroid tissue caused
by primary, second or tertiary thyroid dysfunction. It mainly affects dogs of middle-aged of
medium to large size, regardless of gender. A deficiency of thyroid hormone affects the
function of all organ systems, resulting in diffuse, inespecific and rarely pathognomonic
clinical signs. The diagnosis can be based on clinical and biochemical abnormalities
associated with increased serum TSH and subnormal T4 total and free. Supplementation with
thyroid hormone (L-thyroxine) is the treatment of choice, with a favorable prognosis in cases
of primary hypothyroidism. The aim of this study was to report a case of hypothyroidism.
Key words: thyroid, tetraiodothyronine, L-thyroxine
Hipotireoidismo é uma doença metabólica multissistêmica (FENNER, 2003)
caracterizada por uma desordem endócrina estrutural e/ou funcional, que resulta em
deficiência na produção dos hormônios tireoidianos tiroxina (T4) e triiodotironina (T3)
(LACERDA, 2005). Essa disfunção hormonal acomete principalmente cães de médio ou
grande porte, entre quatro e oito anos de idade, com prevalência maior nas raças Golden
Retriver, Labrador, Dobberman, Cocker Spaniel, Poodle, Chow Chow, Dachshund e
Schnauzer miniatura. Não existe predileção sexual, embora a doença seja mais comum nas
cadelas castradas (NELSON, 2006). Ettinger e Feeldman (2004) classifica a doença em 4
tipos distintos: o congênito (cretinismo), o primário (resultante de tireoidite ou atrofia
tireoidiana), o secundário (neoplasias de hipófise) e o terciário (disfunção hipotalâmica e/ou
deficiência de iodo).
A deficiência de hormônios tireoidianos, afeta múltiplos processos metabólicos de
todo sistema corporal, resultando em sinais clínicos variáveis e inespecíficos (FENNER,
1
Acadêmico Faculdade de Veterinária - UFPel
Médico Veterinário formado pela UFPel
3
Médico Veterinário formado pela UFPR
4
Médico Veterinário – Mestre – UFPel
* Faculdade de Veterinária, Campus Capão Leão, CEP 96010-900, [email protected]
2
2003). Segundo Lacerda (2005) o diagnóstico deve ser feito a partir do exame clínico
detalhado, anamnese completa, resultados de hemograma e valores bioquímicos incluindo
colesterol; além de exames laboratoriais específicos (dosagem hormonal da função
tireoideana) com o T4 total, T4 livre e TSH (hormônio tireoestimulante). O diagnóstico
definitivo só é possível com realização de biópsia da glândula (ETTINGER e FEELDMAN,
2004).
O tratamento para o hipotireoidismo diagnosticado consiste em reposição hormonal. A
L-tiroxina (L-T4) é o produto de escolha de reposição de hormônio tireóideo, sendo a dose
inicial de 0,02 mg/kg a cada 12h por via oral (FERGUSON, 1996). O prognóstico do
hipotireoidismo depende da causa subjacente, sendo o hipotireoidismo primário em adultos
favorável (NELSON, 2006).
Foi atendido na Clínica Veterinária Animalis em São José dos Pinhais-PR, no dia 20 de
maio de 2011, uma cadela, SRD, castrada, com 9 anos de idade, pesando 29,5 kg. Ao exame
físico, constatou-se alopecia e hiperpigmentação em região lombossacra e na cauda,
prostração e letargia, temperatura corporal de 37,2C, freqüência cardíaca de 120 batimentos
por minuto, campos pulmonares limpos a auscultação, mucosas normocoradas, glicemia 114
mg/dl, mixedema e aumento do plano nasal (facies trágica), não sendo observadas outras
alterações sistêmicas. Suspeitando-se de hipotireoidismo, foram solicitados exames
complementares que constaram de hemograma, perfil bioquímico, urinálise e dosagem de
hormônios tireoidianos.
No exame clínico do animal, observou-se alopecia e hiperpigmentação, sendo
confirmado por Nelson (2006). Não foi observado bradicardia, como relatado por Fenner
(2003). A obesidade ou aumento de peso está descrito em 44% a 47% dos cães com
hipotireoidismo conforme Dixon et al. (1999) o que também confere com o caso relatado,
onde, segundo a proprietária, o animal apesar de ter apetite seletivo passou a ganhar peso;
além da intolerância ao frio (termofilia) devido a T3 e T4 auxiliarem na regulação da
temperatura corporal, citada também por Fenner (2003). A letargia é um dos achados mais
consistentes de hipotireoidismo, segundo Graves (1998) a patogênese desse sinal está
relacionada à redução na atividade muscular e nervosa, devido aos baixos níveis de
hormônios tireoidianos, formando mixedema, principalmente na face (fácies trágica) o que
confere com o caso relatado.
Na primeira avaliação hematológica observou-se leucocitose (22.300/µl) com
neutrofilia (18509/µl), sem alterações na série vermelha sanguínea. Repetiu-se a avaliação
hematológica três dias depois, onde se percebeu hematócrito (32%), eritrócitos (4,78
milhões/µl) e hemoglobina (10,70 g/dl) abaixo dos valores de referência para a espécie (12 18 g/dl) segundo Dixon et al. (1999). A alteração clássica no hemograma é uma anemia
normocítica, normocrômica, não regenerativa, que segundo os estudos mais recentes afeta
32% a 40% dos cães hipotiroideos (DIXON et al., 1999). A contagem leucocitária é variável,
já a presença de leucocitose está normalmente associada a uma infecção concomitante, como
o caso de uma piodermite (NELSON, 2006). Entretanto, nesse caso foi realizada urinálise e
observou-se bacteriúria (1 + / cocos), a qual pode ser a justificativa para a leucocitose
detectada no leucograma. Foi iniciado o tratamento com enrofloxacina e observada a redução
do número de leucócitos para 16.700 /µl três dias após o início do tratamento.
Na bioquímica sérica, foi solicitada análise de colesterol total 495 mg/dL (116 - 300
mg/dL) , creatinina 2,1 mg/dL (0,5 - 1,6 mg/dL), fosfatase alcalina (FA) 152 UI/L (10 - 96
UI/L) e alanina aminotransferase (ALT/TGP) 30 UI/L (7,0 - 92 UI/L). Esses dados condizem
com Lorenz (1997), pois este cita que apesar do leve a moderado aumento de ALT, AST, FA e
creatinaquinase, esses achados são inconsistentes e podem não ser diretamente relacionados
ao hipotireoidismo. Segundo Graves (1998) a hipercolesterolemia é o achado bioquímico
mais consistente no hipotireoidismo, sendo tal alteração laboratorial também observada na
2
avaliação da bioquímica sanguínea do caso relatado. Na mensuração dos hormônios tireóideos
o T4 total- tetraiodotironina encontrado foi de 0,420 mcg/ dL (1,2 – 4,0 mcg/ dL) e o TSH
foi 0,55 ng/dl (0,04 - 0,40 ng/dL) sendo o hipotireoidismo diagnosticado pela mensuração
dos hormônios tireóideos que resultam em níveis baixos do T4 e T4 livre concomitantemente
com nível alto ou normal do TSH (NELSON, 2006).
Assim, preconizou-se tratamento com L-tiroxina na dosagem de 22 mcg/Kg SID com
objetivo de reposição do hormônio tireóideo e a anulação da deficiência de hormônio tecidual,
imitando padrão natural de secreção e metabolismo do hormônio tireóideo (FEGURSON,
1996). Após o tratamento preconizado, em nova avaliação no dia 22 de junho, foi possível
observar a redução dos valores de colesterol total 163 mg/dL, creatinina 0,9 mg/dL, e alanina
aminotransferase 57 UI/L, ficando apenas fosfatase alcalina acima dos valores de referência
para a espécie (138 UI/L). Além disso, em nova avaliação hematológica, todos os valores
estavam dentro da normalidade, não havendo nenhuma alteração significativa. Também foram
observados, redução de peso para 27,2 kg e do mixedema; além de diminuição das áreas antes
alopécicas. O animal já havia recuperado o apetite e segue tratamento com L-tiroxina.
Embora o diagnóstico definitivo do hipotireoidismo só seja confirmado com a biópsia
da tireóide, os sinais e achados encontrados nos exames clínico e laboratoriais foram
sugestivos. Fato que veio a se confirmar com a melhora clínica do animal.
Referências Bibliográficas:
DIXON, R.; Reid, S.; Mooney, C. Epidemiological, clinical, haematological and
biochemical characteristics of canine hypothyroidism. The Veterinary Record, v. 145, p.481487, 1999.
ETTINGER, S.J.; FEELDMAN, E.C.; Tratado de Medicina Interna Veterinária, 5. ed. Vol. 1,
Rio de Janeiro: Guanabara, 2004.
FENNER, R. W. Consulta rápida em clínica veterinária. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro,
RJ, 2003. cap. 27, p. 340-341.
FERGUSON, D.C. Terapêutica clínica em pequenos animais. In: Hipotireoidismo. Interlivros:
Rio de Janeiro, 1996. p.89-93.
GRAVES, T.K. et al. glândula tireóide. In: BICHARD, S. J.Manual Saunders: Clínica de
Pequenos Animais. São Paulo,1998. Seção 4, p.247-249.
LACERDA, M.A. Hipotireoidismo canino, Jornal Peregrino, Ribeirão Preto-SP, fev 2005;
disponível : http://www.jperegrino.com.br/veterinária/hipotireoidismocanino.htm, acesso em
09 agosto de 2011
LORENZ, M.D. Anormalidades da pigmentação da pele dos pelos e mucosas. In: Diagnóstico
clínico em pequenos animais. 2º ed. Rio de Janeiro: Interlivros, 1997. p.107.
NELSON, R.W. Distúrbios da glândula tireóide. In: NELSON, R.W.; COUTO, C.G.
Medicina interna de pequenos animais. 3ªed. Editora Guanabara Koogan. Rio de Janeiro/RJ,
2006. p.665 – 682.
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