JORNADAS SAM/ CONAMET/ SIMPOSIO MATERIA 2003 14-11 NOVO MÉTODO DE DETECÇÃO DE HIDROGÊNIO EM METAIS ATRAVÉS DE MEDIDAS DE DIFERENÇA DE POTENCIAL DE FERMI J. S. Coutinho1 , E. S. Carreira 2 , A. Mesquita3 e P. E. V. de Miranda4 1 UTP, Curitiba, PR, Brasil, [email protected] COPPE\UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2 [email protected]; 3 [email protected]; 4 [email protected] É apresentado um método para a determinação da concentração de hidrogênio em materiais metálicos baseado na medida do deslocamento do nível de Fermi de uma amostra carregada com hidrogênio. A diferença do nível de Fermi entre uma amostra de metal hidrogenada e uma amostra não hidrogenada do mesmo material pode ser medida em uma célula eletrolítica como uma diferença de potencial. É mostrado que esta diferença de potencial é diretamente proporcional à concentração de hidrogênio elevada a 2/3. O fenômeno físico observado, da variação do potencial de Fermi com a concentração de hidrogênio, foi modelado através de um circuito elétrico equivalente. Foi possível determinar experimentalmente a concentração do hidrogênio em uma amostra de vidro metálico para uma ampla faixa de concentrações de hidrogênio em solução sólida. Palavras chave: Sensor de Hidrogênio, vidro metálico, nível de Fermi, diferença de potencial. 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 1. INTRODUÇÃO A maior dificuldade na monitoração da contaminação de metais por hidrogênio reside no fato deste ser o elemento químico de menor número e massa atômica, exigindo a utilização de métodos analíticos sofisticados para a sua detecção e quantificação de seus efeitos. Para que um metal ou liga metálica seja considerado um sensor prático de hidrogênio é necessário que ele preencha uma série de requisitos de sensibilidade e estabilidade de suas propriedades físico-químicas face à interação com o hidrogênio. Estas características podem ser alteradas de forma permanente por reações químicas não reversíveis durante o processo de detecção, caracterizando um processo de medida destrutivo. Quando o sensor tem a capacidade de absorver e dessorver o hidrogênio sem sofrer alterações em suas propriedades, tem-se um processo de detecção não d estrutivo. Convencionalmente utiliza-se o paládio e suas diversas ligas, notadamente as ligas de paládioneodímio, paládio-zircônio, entre outras, como elementos sensores para a detecção de hidrogênio [1], [2]. Há, entretanto, candidatos mais promissores a materiais para elementos sensores de hidrogênio, tais como ligas metálicas amorfas, geralmente chamadas de vidros metálicos, que possuem a capacidade de absorver grandes quantidades de hidrogênio, algumas das quais, tal como a liga Ni81 P19 , sem a formação de hidretos [3]. Na implementação do método proposto há a possibilidade de se utilizar como elemento sensor o mesmo tipo de material constituinte da estrutura, sujeita à contaminação por hidrogênio, que se deseja proteger. Sabe-se que a função potencial de um metal é dada por [4]: ψ M = ε F + wM (1) Onde: ψ M é a função potencial do metal em [eV] εF é o nível de Fermi do metal em [eV] wM é a função trabalho do metal em [eV] Sendo o nível de Fermi dado por [4]: εF = h2 3N 8m π V 2 3 (2) Onde: N é o número de portadores livres V é o volume considerado em [m3 ] m é a massa do portador em [kg] h é a constante de Planck Como a função trabalho é uma propriedade de cada material, duas situações se apresentam para materiais que não contêm hidrogênio: - Amostras do mesmo material não apresentam diferença de potencial entre elas. - Amostras de materiais diferentes apresentam uma diferença de potencial de contato proporcional à diferença entre suas respectivas funções de potencial. Neste último caso, a expressão do potencial de contato correspondente é obtida a partir da equação. (1) como sendo: ψM1 ,M2 = ψM1 −ψM2 [ eV ] (3) Ou, em Volts: VM1 ,M2 = 1099 ( εF M1 + wM 1 − ε FM2 + w M2 q ) [V ] (4) JORNADAS SAM/ CONAMET/ SIMPOSIO MATERIA 2003 14-11 Onde q é a carga do elétron. 3. TÉCNICAS EXPERIMENTAIS No caso de duas amostras do mesmo material metálico, cristalino ou amorfo, supondo que apenas uma delas está carregada com hidrogênio, surge uma diferença de potencial entre elas devido à alteração do nível de Fermi da amostra carregada com hidrogênio. Esta alteração é provocada pelas cargas livres representadas pelos elétrons em excesso introduzidos no material pelo hidrogênio em solução sólida. Isto provoca o aparecimento de um potencial de contato entre as amostras, proporcional à diferença de níveis de Fermi, dada por: εF1 − εF2 VF1, F2 = (5) [V ] q A diferença de potencial produzida pela alteração do nível de Fermi de uma amostra metálica carregada de hidrogênio pode ser medida em uma célula eletroquímica como a mostrada esquematicamente Figura 2. A cada íon de hidrogênio (próton) que deixa o eletrodo hidrogenado através do eletrólito corresponderá um elétron livre que participará da corrente no circuito elétrico externo constituído pela resistência de carga RL . A expressão da diferença de potencial é obtida neste caso a partir das equações (2) e (5) assumindo-se que a concentração de elétrons na amostra hidrogenada é N2 =Np +N1 onde, Np é o número de prótons em solução sólida na amostra hidrogenada e N1 é o número de elétrons livres na amostra não hidrogenada, tendo em vista que para cada átomo de hidrogênio introduzido na amostra hidrogenada corresponde um elétron livre. Nestas condições a diferença de potencial será dada por: H+ ( V F1 ,F2 = h2 8qme Amostra não Hidrogenada ) 3 πV 2 3 (N 2 3 2 2 − N1 3 ) (6) Amostra Hidrogenada e- NaOH RL SW V Figura 2. – Representação esquemática do movimento de cargas em uma célula eletrolítica contendo duas amostras do mesmo material metálico, sendo uma das quais hidrogenada. Ou, em termos da concentração de portadores livres: VF , F 1 2 h2 3 = 8qme π 2 3 (η 2 2 3 − η1 2 3 ) (7) N2 é a concentração de portadores livres V N na amostra hidrogenada e η1 = 1 é a concentração V de portadores livres na amostra não hidrogenada. A curva correspondente à equação (7) é mostrada na Figura 1. Onde η2 = O mecanismo de distribuição de cargas elétricas em uma célula eletroquímica na qual um dos eletrodos está carregado com hidrogênio, pode ser modelado de maneira semelhante ao modelo de Gouy–Chapman [5]. Neste caso, as modificações necessárias no modelo ocorrem devido à existência de cargas livres positivas no eletrodo carregado com hidrogênio que atraem os íons negativos do eletrólito, provocando uma maior concentração de íons positivos na interface do eletrólito com o eletrodo oposto, não hidrogenado. No arranjo proposto na Figura 2, a célula eletroquímica apresentará dois comportamentos distintos segundo ela esteja carregada ou não pelo resistor RL . Os modelos elétricos correspondentes são mostrados na Figura 3. ENF -VA + ENF RDH RE RA CGC +VRLRL SW V V=ENF-VA (a) Figura 1. – Tensão em função da concentração de hidrogênio em amostras de mesmo material metálico, de acordo com a equação (7). SW RL V V=VRL (b) Figura 3. – Circuito equivalente da célula de medida da tensão resultante da diferença de nível de Fermi: (a) Célula sem resistência de carga e (b) Célula com resistência de carga. 1100 JORNADAS SAM/ CONAMET/ SIMPOSIO MATERIA 2003 Assumindo inicialmente a chave SW aberta, o circuito equivalente simplificado é o mostrado na Figura 3(a). Neste circuito o capacitor, CGC, é conhecido como capacitância da camada de Gouy–Chapman [5], que modela os efeitos da distribuição de cargas na interface eletrólito-eletrodo. Com a célula em aberto não haverá circulação de corrente no circuito externo, de tal forma que as resistências associadas ao modelo completo da camada de Gouy–Chapman [5] podem ser omitidas. O modelo correspondente à célula carregada é mostrado na Figura 3(b), onde, ENF, é a tensão produzida pela diferença de nível de Fermi, RDH é a resistência protônica da amostra hidrogenada correspondente à mobilidade dos prótons na amostra, RE é a resistência protônica do eletrólito, RA é a resistência eletrônica do eletrodo não hidrogenado e RL é a resistência de carga. Deve ser notado que a capacitância da camada de Gouy–Chapman [5] não aparece neste modelo devido à recombinação de íons 14-11 carregado com hidrogênio pela equação (8). Notandose que a resistência RA e RE são despresíveis face a RDH e RL.pode-se calcular o valor da resistência protônica como: E RDH = RL NF − 1 VL O valor da concentração de portadores no Ni81 P19 não hidrogenado foi obtido por medida de efeito Hall [3] como sendo 0,155x1028 m-3 . Utilizando este valor na equação (7) obtém-se a concentração de hidrogênio em solução sólida no vidro metálico, como é mostrado na última coluna da Tabela 1. Tensão Fermi [mV] Tensão na carga [mV] Concentração [molH m-3] 322,8 276,0 245,0 165,5 157,5 138,7 135,7 130,7 118,5 112,9 109,1 101,0 100,6 5,1330 3,1640 2,4730 1,0770 0,9555 0,8062 0,7234 0,6451 0,5956 0,4884 0,4244 0,4243 0,3910 5509,24 5039,44 4736,02 3987,23 3914,29 3744,64 3717,81 3673,22 3565,18 3515,95 3482,68 3412,10 3408,63 - H+ com os íons OH da solução eletrolítica o que provoca o desaparecimento da camada de Gouy– Chapman [5]. O efeito é equivalente à descarga do capacitor CGC pela resistência RL . Na operação normal a célula é mantida carregada (SW fechada) para manter a capacitância de Gouy– Chapman [5] descarregada. A tensão VL, medida externamente, é devido à circulação da corrente de elétrons, liberados pela difusão dos prótons no eletrólito, no resistor RL , sendo seu valor dado por: RL VL = E NF R A + RE + RDH + R L (8) Para determinar a tensão ENF é necessário abrir a chave SW, durante um tempo suficientemente curto para não permitir o restabelecimento da capacitância de Gouy–Chapman [5]. O valor de ENF fornece diretamente a concentração de hidrogênio na amostra através da equação (7), onde o valor de η1 é uma constante do material obtida por medida de efeito Hall [6] (9) Tabela 1 – Valores medidos do potencial de Fermi e valores de concentração de hidrogênio correspondentes para a liga Ni81 P19 . Com os valores de tensão em carga pode-se, então, obter os valores de resistência protônica e compará-las com os valores obtidos a partir da mobilidade de prótons medidos no mesmo material com a técnica de efeito Hall. x10 -13 EXPERIMENTAIS E 10 [m2 V-1 s-1 ] 4. RESULTADOS DISCUSSÃO 8 Mobili da de d e Pró tons Medidas da tensão de Fermi foram efetuadas em uma célula eletrolítica formada com dois eletrodos da liga 6 amorfa Ni81 P19 de dimensões 25mm x 25mm x 55µm com eletrólito de NaOH 1 mol.l-1 . A célula foi 4 carregada com uma resistência de 10 k Ù, com precisão de 0,01% e coeficiente de temperatura de 2 5ppm. Um dos eletrodos foi hidrogenado por via o gasosa sob pressão de 2 atm., temperatura de 80 C durante 4 horas. As medidas foram efetuadas 3 5 10 15 20 25 30 35 x10 utilizando-se potenciostato microprogramado Galvpot. Concentração de Hidrogênio [MolH m -3] O resultado das medições da tensão de Fermi efetuadas pelo procedimento descrito na seção Figura 4. – Concentração de hidrogênio e mobilidade anterior, estão resumidos na Tabela 1. Também são dos prótons medida por efeito Hall no Ni81 P19 [4]. fornecidos os valores da tensão na carga, utilizados para o cálculo da resistência protônica do eletrodo 1101 JORNADAS SAM/ CONAMET/ SIMPOSIO MATERIA 2003 As expressões de resistência a partir da condutividade são as seguintes: RDH = 1 L × σp A (9) Onde: σp = qvp µp (10) E ainda: q vp µp é a densidade de prótons no material é a mobilidade dos prótons [6] Na Figura 5 são apresentados e comparados os valores de resistência obtidos para a amostra de Ni81 P19 utilizando os dois processos. Fermi 6 Resistência Protônica [Ohms] 2.5x10 Hall 6 2.0x10 14-11 medida do deslocamento do nível de Fermi de uma amostra carregada com hidrogênio. A diferença do nível de Fermi entre uma amostra de metal hidrogenada, no caso Ni81 P19 e uma amostra não hidrogenada do mesmo material pode ser medida em uma célula eletrolítica como uma diferença de potencial. O fenômeno físico observado, da variação do potencial de Fermi com a concentração de hidrogênio, e a célula eletrolítica foram modelados através de um circuito elétrico equivalente. O modelo empregado tornou possível determinar experimentalmente a concentração do hidrogênio em uma amostra de vidro metálico para uma ampla faixa de concentrações de hidrogênio em solução sólida. Os valores obtidos de concentrações de hidrogênio em solução sólida empregando o potencial de Fermi foram comparados, através da resistência elétrica de cargas positivas, com o método de Hall apresentando boa concordância. 6 1.5x10 5. REFERÊNCIAS 6 1.0x10 5.0x105 3.0x103 3.5x103 4.0x103 4.5x103 5.0x103 5.5x103 -3 Concentração de Hidrogênio [MolHm ] Figura 5 – Valores de resistência protônica calculadas através de medidas do potencial de Fermi e do Efeito Hall. Na Figura 5 observa-se que os valores de resistência protônica têm mesma ordem de grandeza. A razão entre os valores, indica que a mobilidade dos prótons obtida com o potencial de Fermi é no máximo 2,5 vezes maior do que o valor obtido com a medida de Efeito Hall. Esse resultado é comparável às variações observadas entre medidas eletroquímicas de difusibilidade de hidrogênio obtidas por ensaios eletroquímicos de permeação pelo método duplo potenciostático e as obtidas pelo método do degrau potenciostático [7]. O método de medida do potencial de Fermi apresentado é de simples implementação. O modelo proposto para o conjunto célula eletroquímica – amostra hidrogenada, apesar dos resultados apresentados serem satisfatórios, está sendo aperfeiçoado para levar em conta a espessura da provável camada de depleção formada no eletrodo carregado com hidrogênio e seu efeito na variação da difusibilidade do hidrogênio em solução sólida na amostra. [1] Imai, Y., Mercado, J., Okamoto, T., Tanaka, M., “Study on optically readable hydrogen sensor consisting of Pd/Mg thin films by spectroscopic ellipsometry”, 20th Electronics Division Meeting of the Ceramic Society of Japan, Engineering Materials, V.216, 2001, pp. 101-104. Kawasaki, Japan. [2] Wang, C., Mandelis, A., Au, I.K.P., “Physical mechanism of reflectance inversion in hydrogen gas sensor with Pd/PVDF structures”, Sensors and Actuators, V.73 n 2-3 , 2001, pp. 100-105. [3] P. E. V. de Miranda, J. S. F. Coutinho and A. C. F. Mesquita, “Characterization of hydrogen in metallic glasses by the use of Hall effect measurements”, Journal of Alloys and Compounds, Vol. 356-357, 2003, pp. 575-578. [4] Eisberg, R., Resnick, R., Ed. Campus, 1ª Ed., Física Quântica, Rio de Janeiro, Brasil, 1979, pp. 515518. [5] Rieger, P. H., Electrochemistry, 2nd Ed., Chapman & Hall, New York, USA, 1994, pp. 59-63. [6] Coutinho, J. S. F, “Caracterização por Efeito Hall de Ligas Metálicas Amorfas para Detecção de Hidrogênio”, Tese de D.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, 2002. [7] D. S. Santos, P. E. V. Miranda, “Hydrogen Solubility in Amorphous and Crystalline Materials”, Int. J. Hydrogen Energy, Vol. 23, No. 11, 1998, pp. 1011-1017. 5. CONCLUSÕES É apresentado um método simples, de fácil implementação para a determinação da concentração de hidrogênio em materiais metálicos baseado na 1102