Uso de citocinas na imunomodulação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL
Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS
RESPOSTA IMUNE DA GLÂNDULA MAMÁRIA DE
BOVINOS: específica e inespecífica
- Uso de citocinas na imunomodulação -
Rodrigo Balduino Soares Neves
Orientador: Prof. Dr. Albenones José de Mesquita
Goiânia
2011
RODRIGO BALDUINO SOARES NEVES
RESPOSTA IMUNE DA GLÂNDULA MAMÁRIA DE
BOVINOS: específica e inespecífica
- Uso de citocinas na imunomodulação Seminário apresentado junto à
Disciplina Seminários Aplicados
do Programa de Pós-Graduação
em Ciência Animal da Escola de
Veterinária e Zootecnia da
Universidade Federal de Goiás.
Nível: Doutorado
Área de concentração:
Sanidade Animal, Higiene e Tecnologia de Alimentos.
Linha de Pesquisa:
Controle de Qualidade, Higiene e tecnologia de Alimentos
Orientador:
Prof. Dr. Albenones José de Mesquita – UFG
Comitê de Orientação:
Prof. Dr. Marcos Veiga do Santos – USP
Prof. Dr. Laerte Guimarães Ferreira Luiz – UFG/IESA
Goiânia
2011
SUMÁRIO
1.
INTRODUÇÃO ............................................................................................ 1
2.
REVISÃO DE LITERATURA ....................................................................... 4
2.1. Conceito de Imunidade da Glândula Mamária ...................................... 4
2.2. Imunidade inespecífica ou inata ............................................................ 4
a.
Defesa estrutural do teto .................................................................... 5
b.
Defesa solúvel não específica ........................................................... 7
c.
Defesas Celulares ............................................................................ 10
2.3. Imunidade específica ou adquirida ...................................................... 15
a.
Defesa solúvel específica ................................................................ 16
b.
Defesas Celulares ............................................................................ 18
2.4. O uso da imunomodulação para aumentar a resistência imunológica da
glândula mamária ......................................................................................... 20
3.
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 26
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 27
LISTA DE FIGURA
Figura 1. O músculo do esfíncter e o tampão de queratina. ................................... 5
Figura 2 Hiperqueratose de teto causado por sobreordenha ................................. 6
Figura 3 A inserção parcial minimiza os riscos de força as bactérias .................... 7
Figura
4
Reação
de
oxidação
do
tiocianato
catalisada
pela
enzima
lactoperoxidase. ................................................................................................... 10
Figura 5 (A) quando as bactérias entram na glandula mamária necessecitam ser
reconhecidas pelos leucócitos. (B) a funcão dos anticorpos é permitir que os
leucócitos reconheçam as bactérias para que os mesmos possam matá-las. ..... 12
Figura 6 (1) O neutrófilo fagocita as bactérias, e as armazena no saco digestivo,
............................................................................................................................. 13
Figura 7 O anticorpo identifica a bactéria para que seja mais facilmente
reconhecida e destruída pelo sistema imune. ...................................................... 15
1. INTRODUÇÃO
A compreensão da defesa imune da glândula mamária é fundamental
para o desenvolvimento de medidas que visam o controle da mastite,
conduzindo avanços na prevenção de novas infecções (RAINARD & RIOLLET,
et al., 2006). A mastite ou mamite é a inflamação da glândula mamária causada
por microrganismos como algas, fungos, leveduras e bactérias, sendo estas
últimas as responsáveis por mais de 90% dos casos da doença em bovinos. A
mastite é considerada uma doença grave dos rebanhos, visto que provoca
inúmeros prejuízos para a pecuária leiteira que vão desde a redução na
produção e na qualidade do leite, assim como demanda altos gastos com
tratamento e descarte prematuro de animais (SANTOS & FONSECA, 2007).
A prevenção e tratamento da mastite representam um oneroso encargo
para os produtores sendo uma das principais preocupações das indústrias de
laticínios. Apesar dos esforços desenvolvidos para controlá-la, a incidência de
mastite continua a ser uma das mais altas de todas as doenças do gado
leiteiro, e, como resultado da longa duração das mastites subclínicas, que é a
forma mais comum da doença, sua prevalência em rebanhos leiteiros continua
na vanguarda na escala nacional e internacional (RAINARD & RIOLLET et al.,
2006). As estimativas do Conselho Nacional de Mastite (NMC) sugerem que
essa doença afeta um terço de todas as vacas leiteiras, custando às indústrias
de laticínios mais de dois bilhões de dólares anualmente nos Estados Unidos
da América (EUA) (NMC, 1996).
No Brasil estima-se que possa ocorrer perda de até 15% na produção,
o que significa uma redução de 4,6 bilhões de litros ao ano em relação aos
30,7 bilhões de litros produzidos no país em 2010 (SANTOS & FONSECA,
2007; IBGE, 2011). Segundo dados do Laboratório de Qualidade do Leite
(LQL) da Universidade Federal de Goiás, aproximadamente, 39% dos 16.000
produtores analisados no Estado de Goiás, no ano de 2010, apresentaram
médias geométricas de contagem celular somática dos tanques (CCST), acima
de 400.000 céls/mL (LQL, 2011). Sabe-se que os rebanhos que possuem
CCST em torno de 400.000 céls/mL, podem apresentar em até 16% de quartos
2
infectados, o que gera uma redução em torno de 6% da produção de leite
(NMC, 1996).
O Estado de Goiás produziu cerca de 2,41 bilhões de litros de leite no
ano de 2010 (IBGE, 2010). Desse modo, ao considerar que 39% dos
produtores analisados obtiveram leite com CCST acima de 400.000 cel/mL, os
quais representam em torno de 70% da produção de Goiás, e considerando
uma redução de 6% no volume de leite produzido por esses rebanhos, o
estado deixou de produzir 101 milhões de litros de leite no ano de 2010, devido
à incidência de mastite (LQL, 2011).
Portanto, o impacto global da mastite sobre a qualidade e a quantidade
do leite produzida para o consumo humano fornece o ímpeto para melhor
compreender a fisiopatologia da glândula mamária e desenvolver formas de
aumentar a resistência à doença por meio do conhecimento dos mecanismos
de defesa (SORDILLO & STREICHER, 2002).
Dessa maneira, um conhecimento maior dos mecanismos de defesa da
glândula mamária torna-se fundamental para tomada de decisões acerca do
controle da mastite com objetivos de prevenir novas infecções (PHILPOT &
NICKERSON, 2002). Por outro lado, a imunidade é um campo da ciência
extremamente amplo para a investigação e, apesar de décadas de pesquisa, o
conhecimento atual das defesas do úbere é insuficiente (RAINARD &
RIOLLET, et al., 2006).
O presente seminário tem por objetivo abordar uma revisão sobre a
resposta imune da glândula mamária. Além disso, apresentar o uso das
citocinas como imunomoduladores para auxiliar no aumento da resistência da
glândula mamária contra os microrganismos causadores de mastite.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1.
Conceito de Imunidade da Glândula Mamária
A imunidade de glândula mamária é definida como a proteção e a
resistência às doenças infecciosas por meio da variedade de fatores imunes
presente no animal. A resposta imune é caracterizada pela capacidade de
reconhecer e discriminar substâncias estranhas entre as moléculas do próprio
corpo (SORDILLO & STREICHER, 2002; OVIEDO-BOYSO, J. et al., 2007).
As defesas imunológicas da glândula mamária de bovinos são
compostas por um sistema de imunidade inespecífico ou inata, e outro de
imunidade específico ou adaptativo (VIVIER & MALISSEN, 2005). É necessário
que ambos sistemas sejam altamente interativas e coordenadas, a fim de
fornecer uma boa proteção contra mastite (SORDILLO & STREICHER, 2002).
2.2.
Imunidade inespecífica ou inata
A imunidade inata é a primeira linha de defesa contra infecções
ocasionadas por microrganismos causadores de mastite, antes que os
mecanismos do sistema de imunidade adquirida sejam ativados. No entanto,
algumas defesas inatas são induzidas pelo encontro infeccioso, muitas vezes
durante as primeiras horas de contaminação (FINLAY & HANCOCK, 2004). O
sistema da imunidade inata usa um mecanismo de defesa codificado, que
funciona especificamente para atacar os microrganismos invasores da glândula
mamária. É por meio desse mecanismo que ocorre a fagocitose de patógenos,
mediada pelo complemento, a produção de mediadores e citocinas para
recrutar novas células fagocitárias, a secreção de interferon com a finalidade
de induzir respostas da glândula e a ativação das células Natural Killer (NK)
compreendendo a maioria das ações da resposta imune inata (RAINARD &
RIOLLET, 2006).
Dessa forma, a imunidade inata da glândula mamária pode ser dividida
em três mecanismos de defesa: estrutural do teto, solúvel não específica e
celular (SORDILLO & STREICHER, 2002). Todos esses possuem como
5
característica a falta de especificidade para a resposta imune frente ao agente
agressor (RAINARD & RIOLLET, 2006).
a.
Defesa estrutural do teto
Os tecidos que circundam o canal do teto são a primeira linha de
defesa contra os microrganismos causadores da mastite, uma vez que este é o
caminho principal pelo qual os patógenos penetram no interior da glândula
mamária. As estruturas responsáveis por impedir a invasão da glândula
mamária por microrganismos patogênicos são: o tampão de queratina e o
músculo do esfíncter do teto (Figura 1) (CAVEN, 1985; CAVEN & WILLIAMS,
1985).
Figura 1. O músculo do esfíncter e o tampão de queratina.
Fonte: PHILPOT & NICKERSON (2002)
A queratina que se forma no orifício do canal do teto é uma substância
pegajosa produzida pela pele que reveste o teto e funciona como uma barreira
física, sendo capaz de ligar e imobilizar a maioria das cepas de bactérias não
encapsuladas. Além disso, alguns componentes da queratina possuem
atividade bactericida, embora a sua eficiência seja limitada contra as bactérias
causadoras de mastite. Os agentes antimicrobianos, como os ácidos graxos
esterificados e não esterificados (mirístico, palmitoléico e linoléico) da queratina
possuem efeito bacteriostático, e outros componentes como proteínas
catiônicas também corroboram com a proteção da glândula mamária devido ao
seu efeito bactericida. Essas últimas se ligam eletrostaticamente aos
patógenos da mastite,
alterando suas paredes celulares tornando-os
suscetíveis à pressão osmótica do meio (CAVEN & WILLIAMS, 1985).
6
Em segundo lugar o esfíncter do teto, que circunda o canal mantendo-o
firmemente fechado entre as ordenhas para evitar a penetração de agentes
patogênicos da mastite (CAVEN, 1985; PHILPOT & NICKERSON, 2002).
Todavia, a ordenha é uma operação crítica em relação à eficácia das defesas
estruturais do teto. O fluxo de leite e a abertura do canal do teto pelo vácuo no
momento da ordenha promovem a lavagem do tampão de queratina e o
relaxamento do esfíncter do teto, que permanece aberto até duas horas após a
ordenha, o que acarreta a eliminação, momentânea, dessa defesa (SCHULTZE
& BRIGHT, 1983; PHILPOT & NICKERSON, 2002).
Além disso, o uso de equipamento de ordenha, quando apresenta
funcionamento deficiente pode comprometer a integridade do ducto do teto por
induzir deficiências mecânicas e circulatórias nos tecidos. Da mesma forma, o
esfíncter do teto também pode sofrer sérios danos devido ao funcionamento
deficiente dos equipamentos de ordenha (Figura 2) (ZECCONI et al., 2000).
Figura 2 Hiperqueratose de teto causado por sobreordenha
Fonte: Arquivo pessoal de MESQUITA (2009).
Portanto, para se manter os tetos saudáveis deve-se observar alguns
cuidados no manejo das vacas na ordenha. 1 – funcionamento correto do
equipamento de ordenha como o nível de vácuo, taxa de pulsação, tempo de
ordenha e remoção adequada de teteiras; 2 – cuidado na administração de
drogas intra-mamária, observando que as bactérias alojadas na queratina
podem penetrar no canal do teto pela ação mecânica de introdução da cânula
do medicamento (Figura 3) (PHILPOT & NICKERSON, 2002).
7
Figura 3 A inserção parcial minimiza os riscos de força as bactérias
para dentro do teto
Fonte: PHILPOT & NICKERSON (2002)
Por conseguinte, ao contrário de outros epitélios como intestinal, bucal,
ou respiratório, o da glândula mamária é raramente estimulado por
componentes bacterianos, e qualquer bactéria que penetrar pode ser
reconhecida como invasora (RAINARD & RIOLLET, 2005). Dessa forma, como
resultado da defesa estrutural do teto o lúmen intra-mamário torna-se um meio
asséptico, quando não sofre invasão de patógenos causadores de mastite
(PHILPOT & NICKERSON, 2002).
b.
Defesa solúvel não específica
Sistema Complemento
O sistema complemento é um conjunto de proteínas presentes no leite
que podem ajudar tanto a resposta imune inespecífica como a específica. As
proteínas
que
compõem
o
sistema
complemento
são
sintetizadas
principalmente pelos hepatócitos, embora sejam produzidas também por
monócitos e macrófagos de diferentes tecidos. Muitas atividades biológicas do
complemento são mediadas por receptores localizados em diversas células
(KORHONEN, et al., 2000; RAINARD, 2003).
Desse modo, as funções do sistema complemento incluem lise de
bactérias, opsonização e atração de fagócitos para o local da invasão. Alguns
exemplos podem ser mencionados como, as bactérias gram-negativas
causadoras de mastite (ex. Escherichia coli) são especialmente sensíveis à lise
mediada pelo complemento, enquanto as bactérias gram-positivas (ex.
8
Staphylococcus aureus) são resistentes, no entanto, todas as bactérias são
susceptíveis à ação de opsoninas C3b e C3bi. O sistema complemento
também pode funcionar em conjunto com um anticorpo específico como uma
opsonina de neutrófilos e macrófagos que promoverá a fagocitose bacteriana e
morte intracelular na glândula mamária (KORHONEN, et al., 2000).
Entretanto,
baixas
concentrações
de
complemento
podem
ser
observadas no leite de glândula mamária saudável durante a lactação, o que
comprova
que
as
atividades
bactericidas
e
hemolíticas
do
sistema
complemento só estão aumentadas em tecidos inflamados e a intensidade está
relacionada a uma resposta inflamatória. Dessa maneira, observa-se que as
maiores concentrações de complemento no leite colostral, mastítico e em
secreções são obtidos durante a involução mamária, provavelmente devido a
mobilização de componentes do complemento por transudação a partir do
sangue (RIOLLET et al., 2000; KORHONEN, et al., 2000; RAINARD, 2003;
BARRIO et al., 2003).
Embora a função geral do sistema complemento na defesa da glândula
mamária ainda não seja totalmente definida, as informações disponíveis não
sugerem um papel preponderante como um mediador pró-inflamatório durante
mastites causadas por coliformes (RAINARD & POUTREL, 1995).
Lactoferrina
A lactoferrina é uma proteína produzida por células epiteliais,
macrófagos e neutrófilos, que possui a propriedade de se ligar aos íons férricos
que estão livres no leite, tornando-os inacessíveis as bactérias que necessitam
desse íon como fator de crescimento ou fonte de ferro (SORDILLO &
STREICHER, 2002; KAI et al., 2002; LEE et al., 2004; PHILPOT &
NICKERSON, 2002). Em ruminantes, lactoferrina e IgG1 agem sinergicamente
para inibir o desenvolvimento de Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae
(SORDILLO & STREICHER, 2002; KAI et al., 2002; LEE et al., 2004).
Por outro lado, a atividade bacteriostática da lactoferrina pode ser
afetada na presença de citrato produzido por células epiteliais da glândula
mamária. Esse pode funcionar como um tampão de quelato de ferro, tornandoo biodisponível para bactéria (SMITH & SCHANBACHER, 1977). Sendo assim,
9
bactérias como Streptococcus agalactiae podem usá-la como uma fonte de
ferro para a sua multiplicação (BISHOP et al., 1976).
Foi demonstrado que o principal papel da lactoferrina é proteger contra
a infecção por coliformes, especialmente durante o período seco, uma vez que
a sua concentração é mais alta durante esse fase da lactação (PHILPOT &
NICKERSON, 2002; KORHONEN, et al., 2000; RAINARD, 2003; BARRIO et
al., 2003).
Lisozima
A lisozima é uma proteína bactericida outra função é clivar os
peptidoglicanos da parede celular de bactérias Gram-positivas, bem como
destruir a membrana externa das bactérias Gram-negativas. Outra função
atribuída à lisozima é a capacidade de favorecer a ligação de lactoferrina à
parede celular bacteriana (PHILPOT & NICKERSON, 2002).
O leite bovino contém em média apenas 13 mg/100mL de lisozima
(REITER, 1985). Essa baixa concentração predispõe o úbere à infecção
tornando-o mais susceptíveis a mastite (PHILPOT & NICKERSON, 2002).
Dessa forma, a lisozima não é considerada uma defesa significativa da
glândula mamária (RAINARD & RIOLLET, 2006).
Lactoperoxidase
Lactoperoxidase é uma enzima natural que em associação com o
peróxido de hidrogênio (H2O2) é capaz de oxidar moléculas produzindo
compostos antimicrobianos. Esse efeito antimicrobiano exige a presença de
tiocianato (SCN-) ou um halogênio como segundo substrato, para formar o
sistema lactoperoxidase (DE WIT & VAN HOOYDONK, 1996).
A enzima lactoperoxidase na presença de tiocianato e do peróxido de
hidrogênio possui efeito bacteriostático para bactérias Gram-positivas, como S.
aureus e estreptococos, bem como bactericida para Gram-negativas, como por
exemplo, os coliformes (SMITH & SCHANBACHER, 1977).
O sistema lactoperoxidase se ativa por meio de uma reação entre
peróxido de hidrogênio e o tiocianato que exerce suas propriedades
10
antibacterianas por meio da produção de hipotiocianate, um metabólito reativo
formado a partir da oxidação de tiocianato, conforme esquema da Figura 4. A
Lactoperoxidase é produzida em pequenas concentrações pela glândula
mamária, em torno de 30 mg/L, sendo necessário para sua ativação 1 a 2
mg/L. Já os níveis de tiocianato na glândula mamária dependem da
composição específica da dieta dos bovinos (SMITH & SCHANBACHER,
1977;SORDILLO et al., 1997).
Figura 4 Reação de oxidação do tiocianato catalisada pela enzima lactoperoxidase.
Fonte: DE WIT J. N. & VAN HOOYDONK,1996.
No entanto, vários fatores podem interferir na eficácia deste sistema
nas células epiteliais da glândula mamária, como por exemplo, a baixa tensão
de oxigênio da glândula mamária pode inibir a produção de peróxido de
hidrogênio, o que limita a eficácia desse sistema antimicrobiano contra os
patógenos causadores de mastite (RAINARD & RIOLLET, 2006).
Citocinas
O fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) é a principal citocina produzida
pelos macrófagos, neutrófilos e células epiteliais, durante a fase inicial da
infecção. Participa da atividade quimiotática dos neutrófilos, porque induz a
expressão de moléculas de adesão para células epiteliais. O choque
endotóxico é outra atividade atribuída a essa citocina em caso de mastite
aguda causada por E. coli. (HAVELL, 1989; PERSSON et al., 2003).
c.
Defesas Celulares
O leite de uma glândula mamária saudável é composto por poucas
células de defesa, embora a concentração varia muito em função do ciclo da
11
lactação. Com a progressão da lactação ocorre um aumento na concentração
celular total, no caso dos neutrófilos podem chegar a proporção de 40% a
menos no final da lactação em relação ao início. Já nos primeiro sete dias do
período seco os números de células podem ficar em torno de 2 a 5 x 106 / mL,
depois reduzem e estabilizam para 1 a 3 x 106 / mL. No parto a contagem de
células somáticas (CCS) são geralmente superiores a um milhão/mL e
diminuem a 100.000 mL após sete a 10 dias de lactação (JENSEN &
EBERHART, 1981; McDONALD & ANDERSON, 1981).
Por muitos anos considerou-se que os principais tipos de células
encontradas no leite de glândula mamária saudável eram de origem epitelial.
Mas, sabe-se que o número de células epiteliais é pequeno em proporção aos
macrófagos que são a maioria dentre todas as células presente na glândula de
vaca seca e lactante, e os neutrófilos por sua vez no leite colostral. Já os
linfócitos representam cerca de 10 a 20% do total de células durante a lactação
(JENSEN & EBERHART, 1975; LEE et al., 1980).
As células que compõem o sistema de defesa celular inespecífico da
glândula mamária são constituídas de macrófagos, neutrófilos e células natural
killer (NK) (EBERHART, 1981).
Macrófagos
A segunda linha de defesa inicia-se com a presença dos macrófagos
que representam o tipo de célula dominante no leite e nos tecidos saudáveis da
glândula mamária na lactação. Durante a patogênese bacteriana, macrófagos
regulam tanto as respostas imunes inespecíficas e específicas (BROWN et al.,
1994; SHAFER-WEAVER et al., 1999). A principal função dessa célula é
identificar as bactérias, de modo que as mesmas possam ser mais facilmente
reconhecidas pelos leucócitos. Esse processo de identificação é conhecido
como opsonização (Figura 5) (PHILPOT & NICKERSON, 2002). A liberação de
citocinas pró-inflamatórias, como TNF-α e interleucina-1b, ocorre após o
reconhecimento de bactérias invasoras, logo, a presença dessas citocinas
estimulam a atividade bactericida dos neutrófilos e, também, a produção de
prostaglandinas e leucotrienos, os quais elevam a reação inflamatória local
(BROWN et al., 1994; SHAFER-WEAVER et al., 1999).
12
Figura 5 (A) quando as bactérias entram na glandula mamária necessecitam ser reconhecidas
pelos leucócitos. (B) a funcão dos anticorpos é permitir que os leucócitos reconheçam as
bactérias para que os mesmos possam matá-las.
Fonte: PHILPOT & NICKERSON (2002).
Semelhante aos neutrófilos, as funções inespecíficas dos macrófagos
são de fagocitar e destruir bactérias com proteases e espécies reativas à
oxigênio.
A
taxa
fagocitária
dessas
células
pode
ser
aumentada
substancialmente na presença de anticorpos, particularmente, contra os
patógenos opsônicos (MILLER et al., 1988; MAGNUSSON, 1999). No entanto,
os números de macrófagos mamários tendem a ser menores durante a
inflamação e possuem menos receptores Fc, possivelmente diminuindo a sua
taxa de fagocitose quando comparado com neutrófilos (NIEMIALTOWSKI et al.,
1988). Outra alteração que ocorre nas capacidades funcionais dos macrófagos,
está relacionada ao período peri-parto, devido a menor atividade opsônica nas
secreções mamárias, e esta diminuição pode estar relacionada com a redução
de imunoglobulina M (IgM), a qual é responsável por facilitar a fagositose dos
macrófagos neste período (KEHRLI et al., 1999). Portanto, embora os
macrófagos sejam fagócitos profissionais,
acredita-se
que sua maior
importância na defesa inespecífica da glândula mamária reside em sua
capacidade de secretar substâncias que facilitam a migração dos neutrófilos
que desempenharão suas atividades bactericidas (PERSSON et al., 1993;
VANKAMPENAND & MALLARD, 1997;KEHRLI et al., 1999)
13
Neutrófilos
A contribuição dos neutrófilos presentes no leite normal para o sistema
de defesa da glândula mamária contra a mastite não está bem elucidada. Por
outro lado, a presença desses em glândulas saudáveis parece correlacionar-se
inversamente com o risco de infecções intra-mamárias (VANGROENWEGHE
et al., 2001; VANGROENWEGHE et al., 2002; BURTON & ERSKINE, 2003).
Os neutrófilos são os leucócitos inespecíficos, ativamente recrutados
para o local da infecção por meio de uma variedade de mediadores
inflamatórios, como citocinas, complemento e prostaglandinas. Sendo esses o
principal tipo de células encontradas nos tecidos mamários e secreções
durante a fase inicial do processo inflamatório associado com infecção
bacteriana (PAAPE et al., 2000).
Embora os números de neutrófilos sejam relativamente baixos nas
glândulas mamárias saudáveis (<105 células/mL), em processo de infecção
intra-mamária esses podem representar mais de 90% da população de
leucócitos (> 106 células/mL). Dessa forma, este aumento ocorre, em função
dos mediadores inflamatórios, que recrutam os neutrófilos do sangue para o
lumém alvelar da glândula mamária, favorecendo a fagocitose de bactérias
patogênicas, conforme Figura 6 (PERSSON et al., 1993). O efeito bactericida
dessas células é mediado por uma explosão respiratória que produz oxigênio e
radicais de hidroxila (HEYNEMAN et al., 1990). Além disso, as defensinas,
produzidas pelos neutrófilos, que são pequenos peptídeos, também possuem
efeito bactericida sobre os patógenos causadores de mastite (SELSTED et al.,
1993).
Figura 6 (1) O neutrófilo fagocita as bactérias, e as armazena no saco digestivo,
(2) onde elas são destruídas por enzimas, (3) que migram para o saco digestivo.
Fonte: PHILPOT & NICKERSON (2002)
14
No entanto as principais funções dos neutrófilos como fagocitose,
atividade de explosão respiratória, a produção superóxido de ânion, a migração
celular aleatória, e quimiotaxia são prejudicadas no período peri-parto, devido a
redução de neutrófilos maduros no sangue e nas secreções lácteas em
detrimento da presença elevada de células imaturas no sangue bovino
(HEYNEMAN et al., 1990).
Os neutrófilos constituem as células mais importantes encontradas em
mastites crônicas, logo, se as bactérias resistirem aos mecanismos de defesa
da resposta inespecífica da infiltração de neutrófilos esses são substituídos por
monócitos e linfócitos T e B, que representam a resposta imune específica da
glândula mamária (KORHONEN, et al., 2000; RAINARD, 2003; BARRIO et al.,
2003).
Células natural killer (NK)
As Células NK são grandes linfócitos granulares que possuem
atividade
citotóxica
independente
do
complexo
principal
de
histocompatibilidade (MHC), e também possuem a capacidade de matar
bactérias gram-positivas e gram-negativas e, portanto, podem ser importantes
na prevenção da infecção mamária. O mecanismo de ação dessas células,
passa pela sua união à células tumorias ou infectadas, logo em seguida ocorre
a secreção de perforina, substância responsável pela destruição da célula alvo
por meio da ruptura da membrana (PARK et al., 2004).
Todavia, mudanças na população de células durante o período periparto não foram estudadas extensivamente, porém a potente atividade
bactericida
dessas
células
torna-as
(SORDILLO & STREICHER, 2002).
merecedoras
de
estudos
futuros
2.3.
Imunidade específica ou adquirida
O local onde ocorre a resposta imune inespecífica é desenhado por
uma inflamação, quando o patógeno é capaz de escapar, ou, não é
completamente eliminado pelo sistema de defesa inespecífico, o sistema imune
específico é acionado. Sendo essa uma reposta imune mediada por um
complexo antígeno-específico composta por células de memória do sistema
imune, conforme Figura 7 (SORDILLO & STREICHER, 2002; RAINARD &
RIOLLET, 2006).
Figura 7 O anticorpo identifica a bactéria para que seja mais facilmente
reconhecida e destruída pelo sistema imune.
Fonte: PHILPOT & NICKERSON (2002)
As respostas imunes adquiridas reconhecem determinados antígenos
específicos de um patógeno. Dessa forma, um estado de reatividade
imunológica ocorrerá devido a uma memória imune, em função de repetida
exposição da glândula mamária a um mesmo patógeno. Após o primeiro
contato, uma nova exposição ao mesmo patógeno desencadeia uma resposta
imune de uma forma mais rápida, consideravelmente mais forte, duradoura e
eficaz na eliminação desse agente invasor (PARK et al., 2004).
O reconhecimento e a eliminação dos fatores patogênicos pela
resposta imune específica são mediados por defesas solúveis específicas e
celulares (SORDILLO et al, 1997).
16
a. Defesa solúvel específica
As citocinas dentre os componentes de defesa solúvel específica,
possuem uma função primordial no mecanismo da resposta imune devido a
sua importante atividade de imunomodulação dos leucócitos na fisiopatologia
da mastite bovina (SORDILLO et al, 1991; DALEY et al., 1993). Pode-se
observar na Quadro 1, os principais grupos de citocinas que incluem as
interleucinas (IL), fatores estimuladores de colônias (CSF) e interferons (IFN),
assim como a descrição de suas origens quanto a sua célula produtora, as
quais estão ligadas ao tipo de resposta imune e seus efeitos observados na
glândula mamária saudável ou infectada.
QUADRO 1 Efeitos das citocinas sobre a resposta imune da glândula mamária
Tipo
Citocina
IFN-У
Células que produz
linfócitos CD4+/CD8+
e NK
Tipo de
Efeitos
resposta imune
observados
Específica
monócitos,
IL-1
macrófagos e cél
Específica
epiteliais
IL-2
linfócitos CD4+
Específica
Aumenta a capacidade fagocitária dos
neutrófilos
Regula a expressão de adesinas;
quimiotaxia de neutrófilos
Estimula o crescimento e diferenciação de
linfócitos B; ativa os linfócitos T e NK.
Choque séptico agudo por S. aureus ou
IL-6
macrófagos
Específica
coliformes; favorece a substituição de
neutrófilos por monócitos
É ativa em mastite causadas por E. coli e
monócitos, linfócitos T,
IL-8
macrófagos e células
Específica
IL-12
Células Dendríticas e
Inespecífica e
linfócitos T
Específica
G-CSF
Fibroblastos,
GM-CSF
células endoteliais,
M-CSF
macrófagos
está em baixa concentração em mastite
causadas por S. aureus.
epiteliais e endoteliais.
Específica
Regula a diferenciação dos linfócitos T
Aumenta a migração e fagocitose de
neutrófilos
e linfócitos T
Legenda: INF-У - interferon gama; IL- interleucina; G-CSF – granulócitos do fator estimulante de
colônia; GM-CSF – granulócitos-monócito do fator estimulante de colônia; M-CSF – macrófago
do fator estimulante de colônia.
Fonte: Adaptada de SORDILLO & STREICHER (2002); OVIEDO-BOYSO et al. (2007).
17
O tipo de proteína que participa da defesa solúvel específica é a
imunoglobulina (Ig), a qual atinge o seu pico de concentração nas secreções
mamárias durante colostrogenesis e a inflamação. Pode-se observar na
Quadro 2 que existem quatro classes de Ig conhecidas por atuar nos
mecanismos de defesa da glândula mamária: IgG1, IgG2, IgA e IgM e suas
funções biológicas (GUIDRY & MILLER, 1986).
QUADRO 2 Imunoglobulinas da defesa solúvel específica da glândula
mamária.
Imunoglobulinas
IgG1
IgG2
IgA
IgM
Função Biológica
−
Transporte seletivo de secreções mamárias
−
Opsonização de bactérias
−
Fagocitose
−
Transporte de secreções durante a diapedese de neutrófilos
−
Opsonização de bactérias
−
Fagocitose
−
Associação com Gordura
−
Aglutinação de bactérias
−
Toxina neutralizante
−
Fixação do complemento
−
Aglutinação de bactérias
−
Opsonização de bactérias somente para neutrófilos
Fonte: adaptado de SORDILLO & STREICHER, 2002.
Os diversos isotipos de imunoglobulinas (IgG1, IgG2 e IgM) podem
funcionar como opsoninas para aumentar a fagocitose por neutrófilos e
macrófagos. A IgG1 é o isotipo primário encontrado em secreções mamárias
de animais saudáveis, enquanto a IgG2 aumenta substancialmente durante a
inflamação da glândula mamária. Além disso, a IgA não auxilia na opsonização
de bactérias, mas possui a função de promover a aglutinação de bactérias
evitando assim, a propagação da doença (MALLARD et al., 1998).
Estudos demonstram que a concentração de IgG no soro bovino é
inferior no parto e sugerem que a falta do isotipo específico de IgG2, está
correlacionado com aumento da incidência de mastite (MALLARD et al., 1998).
No entanto, outra pesquisa demonstrou que nem todas as vacas leiteiras
apresentam uma redução na capacidade de resposta de anticorpos no parto,
18
esse fato implica que alguns animais podem não desenvolver a doença devido
a uma capacidade superior e natural de produzir altos níveis de anticorpos,
independentemente do estágio de lactação (MALLARD et al., 1997).
b. Defesas Celulares
Macrófagos
Macrófagos
também
desempenham
um
papel
essencial
no
desenvolvimento de respostas imunes específicas por meio do processamento
e apresentação de antígenos em associação com antígenos MHC classe II
(complexo principal de histocompatibilidade classe II) (FITZPATRICK et al.,
1992; POLITIS et al., 1992). Grandes alterações nas capacidades funcionais
dos macrófagos ocorrem durante o período peri-parto e foram diretamente
relacionadas com a incidência da mastite. Embora os números de macrófagos
sejam os mais altos na última semana de gestação, a capacidade fagocitária
dessas células é reduzida, possivelmente devido a menor atividade opsônica
nas secreções mamárias (WALTER, 2000).
Além disso, a expressão MHC II pelos macrófagos de bovinos durante
o período peri-parto é reduzida, o que pode contribuir para uma apresentação
menor de antígenos, o qual resulta em uma menor resposta imune específica
dos linfócitos da glândula mamária (FITZPATRICK et al., 1992; MALLARD et
al., 1998)
Linfócitos
Os linfócitos podem reconhecer uma variedade de estruturas
antígenicas
características
por meio de receptores de membrana que definem as
de
especificidade,
diversidade
e
memória
do
sistema
imunológico. Esses são divididos em dois grupos principais: linfócito T e B. Os
linfócitos T podem ser classificados em: T helper (CD4+) e T supressor (CD8+)
(PARK et al., 2004; OHTSUKA et al., 2004).
Na glândula mamária saudável os linfócitos T CD8+ são os tipos
predominantes, porém durante a mastite, os linfócitos T CD4+ passam a
19
prevalecer e são ativados em resposta ao reconhecimento do complexo
antígeno-MHC classe II das células apresentadora de antígenos, tais como
linfócitos B ou macrofágos. (PARK et al., 2004; OHTSUKA et al., 2004).
Os linfócitos CD8+ podem eliminar a célula do hospedeiro devido a
resposta imune durante infecção bacteriana. Devido a isso, estes linfócitos têm
sido considerados como "catadores", pois eles eliminam células velhas ou
danificadas da glândula mamária ( DOSOGNE et al., 2002; BURCHILL et al.,
2003).
A principal função dos linfócitos B é a produção de anticorpos contra
patógenos invasores. Em contraste com os macrófagos e neutrófilos, os
linfócitos B usam seus receptores de membrana para reconhecer patógenos
específicos e da mesma forma como células dendríticas e macrófagos, elas
funcionam
como
células
apresentadoras de
antígenos,
internalizando,
processamento e apresentação das antígenos aos linfócitos CD4+.( BURCHILL
et al., 2003).
2.4.
O
uso
da
imunomodulação
para
aumentar
a
resistência
imunológica da glândula mamária
A imunomodulação é um termo geral usado para descrever o processo
de imunidade do hospedeiro alterado a um nível desejado. O uso de
imunomodulador pode provocar mudança na magnitude e na cinética da
resposta imune inespecífica ou específica a qualquer estímulo antigênico,
alterando assim a defesa do hospedeiro frente ao microrganismo causador de
mastite (SORDILLO & STREICHER, 2002).
As principais células envolvidas na imunomodulação são: os linfócitos
T e B, células NK, células da série monócitos/macrófagos e granulócitos. No
entanto, os componentes solúveis do sistema imune, como citocinas,
imunoglobulinas e complemento também são passíveis de serem usados como
imunomoduladores (PYORALA, 2002). Portanto, a compreensão profunda, a
nível celular e molecular, dos mecanismos ativados por citocinas pode ser uma
estratégia, não só, para elucidar a fisiopatologia da mastite, mas para auxiliar
no desenvolvimento de terapia e controle mais eficazes para essa doença
(RAINARD & RIOLLET, et al., 2006).
Sendo assim, o propósito de qualquer imunomodulador é promover
uma imunidade mais eficaz e sustentada à agentes infecciosos sem o risco de
toxicidade ou dano tecidual do hospedeiro. Além disso, o impacto de certos
patógenos bacterianos é determinado por fatores ambientais e/ou condições
fisiológicas. Dessa maneira, é preciso entender completamente a patogênese
específica dos microrganismos causadores de mastite para determinar se a
prevenção ou o tratamento com um imunomodulador é uma opção viável
(ALLUWAIMI, 2004).
O projeto de imunomoduladores eficazes para o controle da mastite é
especialmente difícil porque a doença é causada por uma grande variedade de
agentes infecciosos com mecanismos muito diferentes de patogênese
(RAINARD & RIOLLET, et al., 2006). Portanto, o sucesso no desenvolvimento
de imunomoduladores seguros e eficazes para controle da mastite dependerá
da
contínua
investigação
sobre
(SORDILLO & STREICHER, 2002).
as
interações
hospedeiro-patógeno
21
Dessa forma, é sabido que, os patógenos causadores de mastite
possuem um espectro de fatores de virulência que facilitam a colonização e
infecção da glândula mamária. Por exemplo, certos patógenos causadores de
mastite podem fugir das defesas imunes do hospedeiro por meio das seguintes
estratégias: adesão às células epiteliais, elaboração de cápsulas para evitar a
fagocitose e conseqüente destruição por neutrófilos, produção de enterotoxina
e endotoxina para destruir ou inativar os leucócitos, assim como a utilização de
invasão intracelular para escapar de vigilância imunológica. Se bem sucedido,
esses patógenos e seus subprodutos não apenas exacerbam a resposta
inflamatória, mas também danificam células secretoras do parênquima vascular
(KEHRLI & HARP, 2001; PYORALA, 2002).
A Imunomodulação das defesas imunes inata ou adaptativa da
glândula mamária desperta muito interesse de pesquisadores. Dessa forma,
muitos estudos relatam os efeitos do uso de citocinas recombinantes, com
objetivo de prevenir ou curar infecções mamárias, devido a sua capacidade de
estimular leucócitos (SORDILLO et al., 1997; KEHRLI & HARP, 2001;
ALLUWAIMI, 2004).
O fator estimulante de colônia (CSF) é um grupo de citocinas
necessárias para a proliferação e diferenciação de uma variedade de célulastronco hematopoéticas. Esses fatores de crescimento são glicoproteínas
distintas que se ligam a células por meio de um receptor comum. São
produzidos por uma variedade de células, incluindo fibroblastos, células
endoteliais, macrófagos e células T (CULLOR, 1990). Cada CSF-alvo tende a
uma linhagem celular específica para expandir ou ativar sua função. A
marcante influência dos granulócito-fator estimulante de colônia (G-CSF) em
populações de células fagocíticas sugere possíveis aplicações clínicas na
prevenção de doenças infecciosas bacterianas, como a mastite. (CULLOR,
1990). O G-CSF, possui como alvo os neutrófilos, aumentando seu número no
leite, e estimulando a atividade fagocitária e bactericida. Embora o tratamento
de vacas por diversas semanas com o G-CSF tenha as protegido contra o
desafio experimental com Klebsiella, esse tratamento não obteve os mesmos
efeitos sobre infecções pré-existentes por S. aureus ( KEHRLI & HARP, 2001).
Com base na disponibilidade e reatividade cruzada entre espécies
biológicas de humanos e bovinos, grande parte dos trabalhos com citocinas
22
recombinantes
em
bovinos
envolveu
a
forma
humana
recombinante
(SORDILLO et al., 1997). Uma das primeiras citocinas a ser testada em um
modelo experimental de mastite foi recombinante humana granulócito-fator
estimulante de colônia (rhG-CSF). A rhG-CSF foi administrada por via
subcutânea em vacas nas doses que variou de 1-5 mg/kg por dia, resultando
em um aumento dos neutrófilos no sangue periférico após 3-5 dias de injeções
(CULLOR, 1990). Essa administração de rhG-CSF em vacas, em lactação, por
injeção subcutânea reduziu nova infecção intra-mamária em 47% após a
inoculação experimental de S. aureus em comparação com controles tratados
com placebo (NICKERSON et al., 1989b). A redução de novas infecções intramamárias causadas por S. aureus estava relacionada com o recrutamento de
neutrófilos para a glândula mamária induzida por meio de administração de
rhG-CSF anterior a infecção. Não houve relatos sobre a prevenção ou
tratamento de mastite causadas por S. aureus utilizando uma infusão
intramamária de rhG-CSF (NICKERSON et al., 1989b).
Por outro lado, o tratamento da glândula mamária de bovinos com
recombinante humana bovina granulócito-fator estimulante de colônia (rhbGMCSF) aumentou significativamente as capacidades quimiotática e bactericida
de neutrófilos. A infusão intra-mamária de rhbGM-CSF em doses de até 5 mg
não afetou significativamente a contagem de células somáticas (CCS) do leite,
mas em contrapartida, ocorreu um acréscimo na capacidade dos neutrófilos
residentes em produzir superóxido, bem como a porcentagem de células
fagocititadas (CULLOR, 1990).
Já os granulócitos e macrófagos fator estimulante de colônia (GMCSF) foi primeiramente identificado por sua capacidade de induzir as células
progenitoras hematopoéticas de se transformarem em granulócitos e
macrófagos. (NICKERSON et al., 1989a). Vários estudos com vacas leiteiras
evidenciam que a GM-CSF não é apenas uma molécula importante para induzir
o crescimento destes tipos de células, mas também afeta uma variedade de
funções de granulócitos maduros. (NICKERSON et al., 1989a). No entanto, o
uso de GM-CSF na glândula mamária, estimulou a eficiência antibacteriana dos
fagócitos, e ofereceu alguma proteção contra a posterior contaminação
induzida de S. aureus (DALEY et al., 1993).
23
O efeito da interleucina recombinante bovina 1β (IL-1β) e interleucina 2
(IL-2), também foram testados sobre as infecções da glândula mamária. Essas
citocinas induzem um fluxo de neutrófilos para o leite quando aplicado no
lúmen da glândula mamária. Essas demonstraram alguns efeitos preventivos e
curativos em infecções experimentais. (DALEY et al., 1993; SORDILLO et al.,
1997). A administração profilática de IL-2 demonstrou que está pode proteger a
glândula mamária de futuras infecções causadas por S. aureus. Apesar de que
NICKERSON et al.(1989a) evidenciaram que a administração intra-mamária
em bovinos de IL-2 pode aumentar respostas imunes celular e humoral em
quartos infectados com S. aureus. DALEY et al., 1991, indicaram que a
administração terapêutica dessas citocinas em quartos que já foram infectados
com S. aureus, foi menos eficaz para eliminar a infecção intra-mamária
preexistente. No entanto, os relatos sugerem que a combinação de citocinas
homólogos com as formulações de antibióticos pode melhorar a eficácia global
desses agentes terapêuticos (NICKERSON et al., 1989b).
O uso de interferon gama recombinante bovino (IFN-γ), que
potencializa as atividades de linfócitos T, macrófagos e neutrófilos, foi avaliado
nas funções de modulação de neutrófilos da glândula mamária durante o
período peri-parto (SORDILLO et al., 1991b). Sendo este período fisiológico
crítico, quando a vaca está mais suscetível a infecções devido à depressão das
funções imunológicas, o uso da imunomodulação pode representar uma
importante escolha para a prevenção de mastite. No entanto, a administração
intra-mamária de citocinas recombinante IFN-γ, como agentes terapêuticos,
não foram mais ativos do que os clássicos tratamentos com antibióticos
(DALEY et al., 1993; SORDILLO et al., 1997).
Em contra partida, o interferon alfa (IFN-α) também pode regular a
resposta do hospedeiro às toxinas bacterianas. Dependendo da dose e do
tempo de administração em relação ao desafio. IFN-α foi capaz de diminuir a
morbidade e mortalidade associada com endotoxemia (NICKERSON et al.,
1989b). Com base nas ações biológicas dessa citocina, foi sugerido que o
tratamento intra-mamário com IFN-α pode aumentar a depuração bacteriana
por fagócitos e regular respostas inflamatórias agudas às toxinas bacterianas
durante a mastite causada por coliformes. Para testar essa hipótese,
pesquisadores examinaram a influência do tratamento com IFN-α recombinante
24
de bovino no estabelecimento e na gravidade da mastite induzida
experimentalmente por E. coli em vacas leiteiras pós-parto. Vacas leiteiras que
foram tratadas por procedimentos intra-mamários, 24h antes do parto, com
IFN-α, tiveram menos quartos infectados por E. coli, infecções de menor
duração e menor escore clínico do que as vacas tratadas com um placebo.
Todas as vacas que foram tratadas com IFN-α sobreviveram ao desafio
experimental da E. coli, mas o grupo que recebeu o placebo teve uma taxa de
mortalidade de 42% dentro de três dias de desafio experimental, o que foi
atribuído à mastite causada por coliformes (SORDILLO et al., 1991a).
Dessa forma, estes experimentos indicam claramente a capacidade de
citocinas recombinantes modificarem o resultado da mastite quando o sistema
imunológico está comprometido. Essa capacidade ocorre por meio de um efeito
combinado de recrutamento de células efetoras maior depuração bacteriana
por populações de células fagocíticas, e regulação da reação inflamatória
aguda (SORDILLO et al., 1997).
Contudo, o conhecimento da cinética das citocinas na glândula
mamária bovina durante a infecção ainda é insuficiente para uma utilização
racional desses agentes biológicos tão potentes. As complexidades das
múltiplas interações envolvidas na mastite são agravadas pela variabilidade
dos processos patogênicos particulares de cada patógeno responsável pela
infecção. Além disso, o tratamento preventivo da mastite com citocinas
recombinantes depende da praticidade, da dose necessária ao esquema de
administração, do custo e do conhecimento dos efeitos colaterais em condições
de campo (KEHRLI & HARP, 2001; PYORALA, 2002).
Portanto, o desafio que confronta os pesquisadores é obter uma melhor
compreensão da complexa interação entre a patogênese da bactéria, as
respostas do hospedeiro necessárias para eliminar os patógenos da glândula
mamária, e os mecanismos pelos quais citocinas podem modular essas
respostas (SORDILLO et al., 1997).
O desafio, nos próximos anos, é obter uma visão completa dos fatores
que afetam a interação entre os diferentes agentes etiológicos e as células da
glândula mamária. Sendo assim, o surgimento de ferramentas de pesquisa
como a genômica, proteômica e transcriptômica, podem auxiliar no
25
desenvolvimento de estudos mais precisos sobre a imunidade da glândula
mamária e suas interações solúveis e celulares (RAINARD & RIOLLET, 2006).
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A mastite bovina ainda possui uma alta prevalência entre os rebanhos
brasileiros, desse modo os estudos sobre a imunidade deverão avançar nos
próximos anos, a fim de se obter resultados mais concretos no controle dessa
doença.
Portanto,
torna-se
necessário
o
desenvolvimento
de
novos
conhecimentos sobre os mecanismos de reposta imune da glândula mamária,
para contrabalançar a relação existente entre o hospedeiro-patógeno, sendo
que nas últimas “batalhas” os patógenos, por meio de suas mutações e
reestruturações de seus mecanismos de patogenicidade e virulência, estão
conseguindo se estabelecer dentro da glândula mamária com maior eficiência.
Embora a utilização de imunomoduladores não tenha apresentado
bons resultados para a cura da mastite pré-existente na glândula mamária,
acredita-se que esses imunomoduladores possam funcionar como um
elemento complementar, junto às vacinas e antibióticos, na profilaxia e no
tratamento de infecções intra-mamárias.
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