O ENSINO DE ARTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

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O ENSINO DE ARTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
orientações metodológicas
Adriana. Valéria Pessoa
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
Cláudia Regina dos Anjos
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
Este ensaio se constitui de reflexões que foram sendo elaboradas ao
longo da prática pedagógica das autoras no ensino da Arte e, particularmente
quando da construção das proposições curriculares para o ensino de Arte na
Educação de Jovens e Adultos – EJA, no ano de 2008. O que se configurou
num desafio, especialmente para nós, educadoras da rede municipal de Belo
Horizonte. E desafio este que remonta às várias lutas e movimentos pelo
ensino da Arte no país e pela Educação de Jovens e Adultos. Esta proposta
aqui se configura como uma indicação de material didático para o campo do
ensino da Arte na EJA.
Esta proposta foi realizada junto aos educadores da EJA a partir da
reflexão do trabalho já realizado em Arte, nas diversas turmas, que funcionam
em diferentes espaços da cidade. Tendo como referência a Abordagem
Triangular, vários momentos de reflexão e estudos foram desenvolvidos com
os educadores, envolvendo inclusive o fazer artístico. Essa metodologia de
trabalho teve como centralidade, o processo do educando, uma vez que os
sujeitos jovens e adultos trazem consigo conhecimentos próprios acumulados
ao longo de suas vidas como trabalhadores, pais, mães, avós, avôs, enfim,
como sujeitos sócio-culturais e políticos que são.
A partir dos primeiros depoimentos dos educadores para a construção das
proposições curriculares para o ensino da Arte na EJA percebemos que a
formação dos educandos ainda está pautada na lógica da educação seriada, o
conteúdo é ainda a centralidade do processo educativo do educando. Por um
lado, é compreensível pelo fato da demanda dos estudantes se apresentarem
ainda como “recuperação do tempo perdido”. Por outro lado, ainda há uma
dificuldade de trabalhar uma organização escolar sem a lógica das séries,
graus, grades, avaliações acumulativas e reprovações.
A partir da experiência dos educadores da EJA e dos princípios
colocados, foi feita a proposta do eixo: Expressões Artísticas e Identidades.
Entendemos que o trabalho deveria partir da busca da consciência de si
próprios e da valorização de suas “identidades”. Pois são os educandos seres
humanos, ou seja, dotados de suas culturas, seres sociais e políticos,
sobretudo, cidadãos; pessoas que trazem consigo uma série de características
e capacidades, como a etnia, idade, histórias de vida, talentos, a percepção
estética, a ética, suas limitações etc. Um estudo que considere todo esse
manancial atrelado, sobremaneira ao estudo da Arte, que iremos explicitar mais
adiante.
No decorrer do processo, algumas questões foram colocadas: Como a
Arte e as expressões artísticas estão sendo compreendidas e desenvolvidas no
contexto de ensino? Como as expressões dos jovens e adultos estão sendo
potencializadas? Que trabalhos estão sendo e podem ser realizados?
No desenrolar dos trabalhos, a Arte como conhecimento e expressão
possibilitou a busca da ampliação da percepção estética, com as implicações
das identidades, também já colocadas. De maneira dialógica, junto aos
educadores da EJA, tendo na Abordagem Triangular seus referenciais teóricos
e metodológicos.
Dentre as etapas, foram realizadas: o fazer arte (experiências em
oficinas), reflexões a partir de textos, e em diversos momentos, explicitando
conceitos básicos da arte e a contextualização no tempo e espaço (estudo de
determinados períodos da história da Arte tecendo paralelos com o
contemporâneo).
Os estudos da Arte na EJA, nesse viés, constituem conhecimentos e
saberes que perpassarão pelos “sujeitos”, com suas histórias de vidas, seus
cotidianos etc. criando uma teia, textura ou tessitura de possibilidades que
terão nas expressões artísticas um novo tônus ou nuances para o ensino de
forma significativa.
A proposta buscou, assim, aprofundar os modos de como os educadores
da EJA compreendem a arte como área de conhecimento, bem como a sua
inserção na organização do trabalho e nas práticas cotidianas, a partir das
identidades dos sujeitos estudantes.
Este artigo configura-se em um ensaio a partir da construção das
proposições curriculares das Expressões Artísticas e Identidades para a
educação de Jovens e Adultos da Rede Municipal de Belo Horizonte/MG.
A coordenação da EJA da Secretaria Municipal de Educação organizou
equipes, que seriam compostas de assessores internos e externos, e contariam
com pessoas que já tinham um trabalho relevante em sua área de formação e
atuação. É importante ressaltar que a Arte contou apenas com pessoas da
própria rede. Depois de vários encontros foram definidos os tópicos para cada
área do conhecimento, e posteriormente, designados eixos. Estes foram
apresentados aos educadores, que, por sua vez, deveriam escolher uma área
de maior interesse e dessa forma, participar da oficina e da construção das
Proposições Curriculares para a EJA da RMBH. Um grupo de 60 pessoas
optou pela área de Arte, no eixo Expressões Artísticas e Identidades.
Essa construção, realizada de agosto a dezembro de 2008, permitiu a
compreensão da realidade de como está se dando o ensino de Arte na
EJA/RMBH, no seu tempo e espaço e no seu contexto, na qual foram usados
procedimentos e técnicas tais como a apresentação e justificativa da escolha
do tema; debates; fazer artístico; coleta de depoimentos orais; pesquisa
documental junto à produção sobre Arte/Educação e ensino da Arte; reflexão
do fazer e das produções artísticas dos educadores; contextualização e
debates a partir de algumas obras de grandes artistas, gerando paralelos e
questionamentos diversos, quando dialogadas com os próprios trabalhos;
relatos de experiência e construção da proposta.
Neste ensaio privilegiamos a metodologia porque consideramos
importante a reflexão como uma indicação de material didático para o campo
de ensino da Arte na EJA. Em que pese o texto completo da Proposta
Curricular abranger uma fundamentação teórica tanto da Arte como da
Proposição Curricular para EJA, que será publicado até o final de 2010.
1- Metodologia
Na contemporaneidade, a Arte/Educação tem buscado novos paradigmas,
implicando a arte como cognição: reflexão, crítica e compreensão histórica,
social e cultural da Arte nas sociedades. Essa proposta vem afirmando a
abrangência cultural se refere a um posicionamento teórico-metodológico
sistematizados por Ana Mae Barbosa, conhecido entre nós por Abordagem
Triangular, que implica na Arte/Educação pós-moderna que favorece
abordagens contextualistas, instrumentalistas, de fronteira de culturas e
interdisciplinar para o estudo da arte, no seu bojo traz questões internas e
externas para a discussão e a forma não é o seu único propósito (MASON,
2001).
Em outras palavras, a Proposta Triangular, como Ana Mae tem, também,
mencionado , quer dizer reflexão crítica e compreensão histórica, social e
cultural da Arte nas sociedades e a elaboração artística. Nesse sentido, três
elementos são indispensáveis no ensino da arte, sintetizando essa proposta: o
fazer artístico, a reflexão desse fazer e a contextualização da obra de arte no
tempo e espaço. Esses elementos desenvolvidos conjuntamente e a partir/com
as culturas dos sujeitos, em conexão com suas respectivas vidas fazem da
Arte/Educação sua principal razão de existir e se efetiva no processo de
formação humana.
Foi proposto, dessa forma, o desenvolvimento desses elementos
conjuntamente e a partir das culturas, conseqüentemente, dos sujeitos em
conexão com seus cotidianos fazendo com que a Arte/Educação em sua
principal razão de existir, se efetive no processo de formação humana de
maneira holística.
2- Desenvolvimento
O ponto de partida foi a investigação do sujeito em relação a si próprio.
Para isso houve a sensibilização, que ocorreu a partir da exposição de objetos
significativos, fotografias e da música. Dessa forma, criou-se um ambiente de
aconchego e respeito em que fragmentos de memórias se traduziram em
pequenas histórias pessoais de vida e sendo foram narradas. Um processo
que, como tal, ocorreu gradativamente, a partir do conhecimento do grupo e do
grau de confiança estabelecido. Dos relatos passou-se à produção de textos e
de desenhos, pois imbuídos da emoção trazida pelas memórias, esta forma de
expressão foi muito significativa. Os desenhos posteriormente foram expostos
na roda para apreciação e discussão. Houve acompanhamento de cada
educador/aluno nessa etapa, ação considerada de fundamental importância, no
desenvolvimento e realização dos trabalhos, pois as reações eram as mais
diversas possíveis: para alguns significou tranqüilidade e alegria, para outros,
motivo de tensões e dificuldades, por isso, a observação e o respeito estiveram
sempre presentes.
Na continuidade, o foco se deu “no outro”. Aqui também foi desenvolvida
a investigação por meio de pesquisas em que foram criados diversos
instrumentos: elaboração de fichas para cadastro de artistas ou de grupos,
elaboração e realização de entrevistas com artistas locais etc. Foi realizado
também, o registro por meio de imagens. E a partir daí, várias indicações foram
feitas, como a de produção de audiovisuais, que de acordo com a sua
relevância e qualidade, deveria ser apresentado à turma e/ou comunidade.
Como uma forma de valorização e agradecimento às contribuições dadas.
Neste caso, os trabalhos digitalizados foram apresentados para o grupo de
educadores que o produziu.
De acordo com as discussões e relatos dos educadores, a produção
artística do educando da EJA nesse processo ocorre de maneira integrada, nos
diversos momentos do trabalho. Então a partir dos estudos sobre a teoria
contemporânea para o ensino de arte e de acordo com os interesses pessoais,
foram elencados temas e/ou conteúdos: estudos de objetos trazidos pelos
educandos, observação e realização de desenhos e pinturas de paisagens
naturais e/ou construídas, produções diversas a partir: da história da formação
do povo brasileiro, das etnias que constituem o nosso povo, da integração com
os esportes, dos sentimentos, da mídia, dos sons, dos movimentos, das cores,
do cinema, das comédias, dos romances, da vida e de estudos das obras de
artistas já consagrados e de artistas populares, bem como estudos sobre
alguns períodos da história da Arte, de acordo com o trabalho a ser
desenvolvido etc.
Vale ressaltar que, nessa proposta é preciso priorizar, fazer escolhas e
para tanto, o processo precisa ser dialógico, tendo em vista, a consciência do
papel do professor, a sua orientação, o incentivo e o olhar sensível, para saber
qual o momento para cada ação.
Na seqüência, passou-se à escolha de técnicas e tecnologias, ou seja,
os modos de realizar os trabalhos expressivos. Nessa tarefa, cabe ao
educador, a partir de sua formação, definir e oferecer um maior número de
possibilidades, para que o educando possa se identificar mais com esta ou
aquela forma, e assim descobrir o prazer de ser produtor de arte. No entanto,
esse processo deve ser dosado, de forma gradativa de complexidade, para que
cada um sinta-se capaz.
De acordo com nossa interpretação, essa proposta faz analogia a um
círculo em movimento, que acaba na espiral; é um ir e vir constante: o
educador, o educando, o trabalho, a história, a cidade, as tecnologias, as
produções dos educandos etc. criando condições para que cada um atue como
atores na construção de seu conhecimento e desenvolvimento da autonomia.
No contemporâneo, a Arte/Educação busca reflexões sobre o “fazer artístico”,
não é mais a “arte pela arte”. Por isso as produções devem ser apreciadas,
trazidas para fruição, comentadas. E para se criar um diálogo maior, de mão
dupla, em que se amplie a percepção estética é necessário recorrer aos livros,
especialmente à história da Arte, aos conceitos, às imagens, vídeos, às
visitações: a arte das galerias, dos museus, dos muros, das ruas etc. Pode-se,
inclusive trazer artistas para sala de aula, com algumas obras e/ou
apresentações. Dessa forma é possível tecer paralelos, fazer comparações e
desenvolver efetivamente o gosto pela arte, a elevação da auto-estima e a
ampliação do conhecimento de um modo geral.
De acordo com Barbosa:
[...] Não é possível o desenvolvimento de uma cultura sem o
desenvolvimento das suas formas artísticas. Não é possível uma
educação intelectual, formal ou informal, de elite ou popular, sem
arte, porque é impossível o desenvolvimento integral da inteligência
sem o desenvolvimento do pensamente divergente, do pensamento
visual e do conhecimento presentacional que caracterizam a arte
(Trechos extraídos de entrevista com Ana Mae Barbosa concedidas a
Agência Repórter Social, jornalista Flávio Amaral, e Museu de Arte
Contemporânea da USP).
A escola, dessa forma, deve procurar não só compreender, mas,
especialmente, reconhecer esses sujeitos a partir da sua origem social, idade,
sexo e experiências vivenciadas. Portanto, constituir-se como uma instituição
heterogênia, não mais uma simples transmissora de conhecimentos, centrada
na competição dos resultados da aprendizagem, na lógica da educação
bancária criticada veemente por Paulo Freire (FREIRE, 2003).
Dessa forma, é necessário que a escola assuma seu papel e implique e
considere que os educandos da EJA são sujeitos de direito, com experiências,
formas de sociabilidade, de atuação e de percepções próprias. Portadores de
novas identidades coletivas manifestam o desejo de construir novas
identidades individuais; são sujeitos que possuem o gosto pela vida (Parecer
da EJA, 2003).
Dayrell (1996), localiza a urgência de se pensar em uma nova escola,
uma nova organização, uma nova concepção de educação em que os sujeitos
sejam a centralidade de processo escolar.
Para dialogarmos com esse conceito de educação e de escola, na
contemporaneidade, lançamos mão do conceito de cultura do antropólogo
Cliford Geertz (1989), a cultura como sistemas simbólicos. Mais
especificamente, “como sistemas entrelaçados de signos interpenetráveis”
(GEERTZ, 1989, p. 10). Pensando nessa dimensão, a cultura é um campo de
significados, valores e sentidos e não
[...] um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os
acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou os
processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem ser
descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade
(GEERTZ, 1989, p. 10).
Portanto, para compreender a cultura de um povo, segundo Geertz, fazse necessário que a conheçamos e que seja tornada pública sem, no entanto,
reduzir a sua complexidade. Nesse sentido, o autor nos alerta que, para a
compreensão da cultura, não é necessário trabalhar para a “descoberta do
continente dos significados e o mapeamento da sua paisagem incorpórea”
(GEERTZ,1989, p.14). Assim, para ele, a análise cultural seria “(ou deveria ser)
uma adivinhação dos significados, uma avaliação das conjeturas, um traçar de
conclusões explanatórias a partir das melhores conjeturas (GEERTZ, 1989, p.
14).
Nesse aspecto, as questões apresentadas pelos educadores apontam
para os significados, valores e sentidos do ensino da Arte na Educação de
Jovens e Adultos:
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Possibilidade de ampliar a possibilidade e o campo imagético
dos estudantes a partir dos objetos cotidianos.
Objetos utilitários e cotidianos como detonador do ensino da
arte.
Liberdade, caminho e trabalho possível em sala de aula.
Diversidade de materiais propicia olhares diferenciados e um
encontro com a histórica identitária.
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Vinculação da arte e da cultura.
Relação com o trabalho, à cultura e a identidade.
Partindo desses apontamentos, a educação, sobretudo, a educação de
jovens e adultos, não comporta mais a organização por meio de grades
curriculares estanques, conteúdos programados para cada ano série e,
principalmente, a expectativa de que todos os estudantes tenham que aprender
no mesmo tempo/espaço e da mesma forma.
Dessa forma, afirmamos que a arte é um elemento fundamental na
formação humana. E a educação escolar, com a função de sistematizar e
construir o conhecimento, de contribuir para a formação e socialização do
indivíduo, torna-se privilegiada para propiciar momentos e movimentos do
ensino da arte.
Pensamos que esse é um ponto instigante para discutir, pois, que ações
foram e estão sendo desenvolvidas para que a população, de modo geral,
tenha acesso a esse legado da humanidade? Segundo Ostrower (1998), a
origem da arte se confunde com a existência humana.
Nestor Garcia Canclini (1984) afirma que
[...] diferentes caminhos da arte contemporânea permitem apreciar
seus vasos comunicantes e sua riqueza polifônica. [...] A importância
adquirida, na formação do gosto, pelos novos meios de comunicação
– os cartazes, a televisão -, a irrupção de produtos da cultura popular,
junto com as classes que lhes dão origem, obrigam a ampliar o
campo da arte, não só os objetos e mensagens, mas todas as
atividades nas quais se realizam a produção, a circulação e o
consumo do gosto, da fruição sensível e de sua elaboração
imaginária. O estudo da arte abrange, hoje, a análise das obras tanto
quanto a das transformações de seu sentido, realizadas pelos canais
de distribuição e pela variável receptividade dos consumidores.
Abrange as artes tradicionalmente conhecidas como tais e, também,
as atividades não consagradas pelo sistema de belas-artes, ou como
as expressões visuais e musicais nas manifestações políticas, ou
aspectos da vida cotidiana. A arte, então, deixa de ser concebida
apenas como um campo diferenciado da atividade social e passa ser,
também, um modo de praticar a cultura. (CANCLINI, 1984, p. 207208, citado por ANJOS, 2008).
Nessa perspectiva, a abrangência da arte ganha novos contornos.
Elementos da vida cotidiana e dos meios de comunicação, entre outros,
colocam em xeque a imponência da arte européia em detrimento de outras,
como a arte africana. A arte européia, durante séculos, foi legitimada como a
única de valor estético e artístico.
Para esse tipo de arte o acesso e apreensão ainda é limitado,
principalmente para as classes populares. Porém, com o avanço das
tecnologias isso tem se modificado. Até pouco tempo, para se conhecer uma
obra de arte era necessário se deslocar até os museus e galerias; atualmente,
é possível conhecê-las virtualmente. Ainda hoje o acesso ainda não é para
todos. A visão de que esses lugares são somente para conhecedores de arte e
para especialistas também foi se constituindo no imaginário das pessoas.
Outra questão apontada por Canclini é a possibilidade de ver, fruir e
produzir arte, na contemporaneidade, não se restringir aos artistas e as obras
consagradas e reconhecidas como tal. Está também, e principalmente, nas
expressões e manifestações das comunidades e na vida cotidiana.
A exclusividade das obras – poucas em relação ao total da produção
cultural –, que reivindicavam seu estatuto como obra de arte, contribuiu muito
para a arte vir a ser considerada como a cultura hegemônica. Mas, na visão
contemporânea, a arte está mais conectada com a vida das pessoas, bem
como seus conhecimentos, expressões e manifestações (ANJOS, 2008). E os
“códigos hegemônicos são cada vez mais questionados no seu universalismo”.
(BARBOSA, 1998, p. 11). Pensar o ensino da Arte, hoje, pressupõe o
reconhecimento de todas as formas de manifestações e expressões como
processos de criação de um povo, portanto, arte.
E se propomos de fato uma educação libertadora e centrada nos sujeitos
a arte é imprescindível no processo de desenvolvimento humano, como nos
afirma Ana Mae:
... uma educação não apenas intelectual, mas principalmente
humanizadora, a necessidade da arte é ainda mais crucial para
desenvolver a percepção e a imaginação, para captar a realidade
circundante e desenvolver a capacidade criadora necessária à
modificação desta realidade (Trechos extraídos de entrevista pessoal
com Ana Mae Barbosa e entrevistas concedidas a Agência Repórter
Social, jornalista Flávio Amaral, e Museu de Arte Contemporânea da
USP).
A partir daí, no que diz respeito ao planejamento e construção de
materiais para o ensino de arte na escola, fica explícita a necessidade de
organizar, planejar e sistematizar o currículo contemplando a área de
conhecimento em Arte.
Para isso, conforme nos diz Pimentel: é necessário que o educador tenha
uma base teórica que lhe possibilite a amplidão de pensamento, tanto para
conhecer os caminhos trilhados por seus/suas estudantes quanto para
propiciar momentos significativos que possibilitem encontrar novos processos
individuais e coletivos.
Entretanto, grande parte dos educadores da EJA formados em outras
áreas do conhecimento, deixa muito a desejar em diversos aspectos em
relação ao ensino da arte, em sua prática como docente diante das mudanças
e demandas contemporâneas da educação; a dicotomia se estabelece, dentre
outras, entre o trabalhar com o currículo pronto e rígido e o currículo aberto e
mais flexível (ANJOS, 2008).
Essa dicotomia se reflete nas práticas pedagógicas de forma contundente
quando afirmam que não é trabalhada a parte artística com os estudantes e a
dificuldade de desenvolver o trabalho de arte com os jovens e adultos, em
função das questões de gênero.
Outro ponto de vista nos aponta que é preciso conhecer as diversas
concepções de ensino, e mais especificamente, ligadas ao ensino da arte para
não cair na armadilha das atividades isoladas sem conexão com a cultura do
estudante e o conhecimento historicamente construído pela humanidade ao
longo da vida.
Em outras palavras, há de se ter o cuidado para não retomar a concepção
do ensino de arte como “mera atividade artística”, difundida pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 5692/71. Concepção
esta considerada por vários estudiosos como esvaziada de conteúdos
(FERRAZ e FUSARI, 1993 citado por ANJOS, 2008) e que levou o ensino da
arte nas escolas brasileiras, por várias décadas a ficar relegada em último
plano, em relação às demais áreas do saber institucionalmente reconhecidas.
Por outro lado, as educadoras buscaram nesse trabalho uma ampliação do
conhecimento para o ensino da arte, assim como a predisposição para a
aprendizagem e construção.
Outro aspecto é o que se pensa ser e o que é trabalhado como conteúdo
de Arte. Partindo do pressuposto de que a Arte é uma área com conteúdos
próprios a serem ensinados para a construção do conhecimento, é necessário
que se tenham objetivos, metodologias e intencionalidades bem definidas, para
que o estudante consiga compreender a seqüência e a lógica daquilo que se
está construindo. Nessa perspectiva, é preciso salientar que a arte é própria do
ser humano, e em cada cultura, algo a ser apreendido e desenvolvido
processualmente, e não um dom de alguns poucos privilegiados.
Entretanto, somente com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira (LDBEN), nº 9394, promulgada em dezembro de 1996, a Arte passa
a ser considerada área de conhecimento: “o ensino da arte constituirá
componente curricular obrigatório, nos diversos níveis de educação básica, de
forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (art. 26, § 2º).
Enquanto área de conhecimento é necessário que se considerem aspectos
formativos como conhecer, apresentar, interpretar, simbolizar e metaforizar, em
um contexto de apreciação e valorização, possibilitando ao estudante a
construção de conhecimentos que interajam com sua emoção, através do
pensar, do apreciar e do fazer arte (Proposta Curricular/MG, 2005).
Essa passagem de “atividade artística” LDBEN 5692/71 para ”área do
conhecimento” LDBEN 9394/96 é sem dúvida, um avanço e um
reconhecimento da importância da arte como dimensão formadora do sujeito.
Entretanto, o que parece ocorrer é que os pressupostos da LDBEN 5692/71
ainda estão muito presentes e orientam as práticas docentes, apesar de não
mais vigorar (ANJOS, 2008).
O que se pretende com a arte no ensino, hoje, é compreendê-la em seus
diversos aspectos: contexto social, político e cultural, bem como trazê-la para o
debate, a reflexão através de confrontos e/ou analogia com a história
construída e acumulada pela humanidade. E tornar os sujeitos envolvidos no
processo, cônscios de seu tempo histórico, da importância de suas identidades,
do seu papel e envolvimentos neste processo.
Assim, é preciso afirmar que a arte é um elemento fundamental na
formação humana. E compete à educação escolar, neste caso, a modalidade
de educação de Jovens e Adultos, a função de sistematizar e construir o
conhecimento, de contribuir para a formação e socialização do indivíduo,
tornando-se privilegiada por propiciar momentos e movimentos do ensino da
arte.
3- Considerações finais
Iniciamos estas considerações reafirmando o prazer que tivemos em
participar da construção das Proposições Curriculares para EJA – Expressões
Artísticas e Identidades, pois por mais difícil que possa ter sido em alguns
momentos, avaliamos que foi um avanço. Acreditamos que construir indicações
para o ensino da arte, em conjunto com a formação de professores, não é um
empreendimento fácil e isento de tensões, paradoxos e contradições que
cercam nossas escolhas. Para isso, fez-se necessário, então, termos
sensibilidade para escutar e compreender o que esses educadores estão
trazendo.
Percebemos, também, para um trabalho significativo para os educandos
da EJA é necessário que proponha nova organização dos tempos e espaços
de aprendizagem, sobretudo, que se pense e assuma uma nova lógica de
pensar o seu papel educativo dessa modalidade de ensino, considerando o
processo e trajetórias de cada sujeito, inclusive de educandos. Porque ter o
sujeito na sua centralidade, implica em reconhecer os valores, as crenças, as
vivências, enfim, as culturas que os sujeitos têm e trazem consigo.
Em relação à concepção da arte como área do conhecimento, pudemos
observar que para algumas de nossos colegas, é uma concepção que está
ainda em construção e para outras, nem sequer tinham a dimensão dessa
premissa.
No que se refere às práticas pedagógicas, pudemos constatar, através do
relato e discussão com os educadores, que embora os conteúdos trabalhados
tenham o objetivo de atender o desejo dos educandos e relacioná-los com o
contexto e identidades dos sujeitos, o trabalho de arte com os educandos
jovens e adultos ainda é um desafio.
Outra questão percebida é que o acesso à arte, para a maioria dos
educadores, foi na escola, embora tenham freqüentado esporadicamente locais
como museus, centros culturais, meios de comunicação, especialmente, a
internet, entre outros, configurem-se atualmente como canais mais
democráticos de acesso à arte. Declararam que não utiliza a internet como
tempo de aprendizagem em arte.
No que se refere às práticas pedagógicas, podemos considerar que os
conteúdos são trabalhados ainda segundo as técnicas de desenho e pintura,
de forma convencional e linear. Não percebemos discussão sobre as obras de
arte que os educandos estavam trabalhando, nem mesmo a contextualização,
no tempo e espaço, das mesmas.
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adolescentes. Belo Horizonte: UFMG/FAE,2002. 288p. Dissertação de
Mestrado/ UFMG/FAE.
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