SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR MARIA DO CARMO BRANT DE CARVALHO Professora do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social na PUC-SP N este artigo, pretende-se refletir sobre a forte expressão da sociedade civil pela via do terceiro setor, procurando compreender sua significativa expansão e importância, e, ao mesmo tempo, identificar suas ambivalências, contradições e possibilidades no cenário contemporâneo, marcado pela turbulência, complexidade, perplexidade e perda de referências utópicas no fluxo de um capitalismo planetário e, o que é mais importante, atravessado por compressões para realizar a maior aposta deste século: a conquista da eqüidade, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades entre os cidadãos do mundo. A ênfase aqui é colocada no discurso presente entre os atores, militantes e teóricos adeptos do recente terceiro setor. É a partir da compreensão do que revelam que pretendese analisar os nexos entre sociedade civil e as apostas contemporâneas nas organizações solidárias, suas tendências e contradições no bojo de uma reforma do Estado, em curso, e novos padrões de governabilidade em escala global e local. É necessário ressaltar que não há consenso sobre o termo terceiro setor. Este é também recentemente utilizado no Brasil. “Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, essa questão sobre a falta de precisão conceitual do nome que define o conjunto dessas organizações não é uma polêmica vazia e de interesse exclusivamente acadêmico. Observando o comportamento das próprias entidades verifica-se a não existência de identificação com o termo e de manifestação clara e unânime de pertencer ao Terceiro Setor. Algumas organizações, principalmente aquelas com fortes raízes ideológicas de cunho político ou religioso, preferem ressaltar sua identidade própria, como se temessem que a agregação com outras provocasse uma espécie de diluição dos valores e preceitos norteadores de sua atuação. Outras, como as entidades representativas, parecem hesitar entre dois tipos de identificação: aquele que justifica sua origem, isto é, o segmento ou o grupo social que representa; e aquele que lhe oferece a guarida de pertencer a um setor mais diversificado, porém mais amplo e visível” (Fischer e Falconer, 1998:13). Mesmo considerando essa ausência de consenso e de adesão plena, o fato é que o termo terceiro setor vem sendo utilizado para designar o conjunto de organizações sem fins lucrativos que operam no campo social. É uma designação que, ao mesmo tempo, contém uma consigna: ou seja, a reapropriação das organizações solidárias que são sociedade civil por ela própria, a sociedade civil. Mas antes é preciso se perguntar por que terceiro setor? Quando analisado do ponto de vista do âmbito de suas ações, o terceiro setor presta os mais variados serviços (saúde, educação, assistência social, etc.), produz estudos e pesquisas, atua na defesa dos direitos humanos e monitoramento do comportamento das políticas públicas. Deste ponto de vista, o terceiro setor oscila entre mercado e Estado; ora quase mercado, ora quase Estado. Se for analisado pela sua composição e dinâmica, este setor articula uma heterogeneidade de organizações voluntárias ou sem fins lucrativos, incluindo desde as associações comunitárias e microlocais de entre-ajuda, até organizações articuladas em redes globais atuantes no plano dos direitos humanos, na defesa do meio ambiente, na cooperação para o desenvolvimento, entre outras. Deste ponto de vista, significa um termômetro da vida pública, sinalizando demandas societárias e igualmente tendências e déficits nos processos de regulação social ancorados nos princípios do Estado, do mercado e da comunidade presentes na regulação na modernidade (Santos, 1998). Numa outra direção reflexiva, pode-se dizer que enfatiza a esfera pública não estatal. 83 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 12(4) 1998 Já ao analisá-lo do ponto de vista da sua finalidade maior – a solidariedade –, seu passaporte básico é a ação voluntária. Significa um velho/novo modo de expressar compaixão para com o próximo e/ou de engajamento cívico, pela ação solidária, em sociedades complexas e planetárias. Sob esta perspectiva, pode significar igualmente oferta de “plena atividade” para os cidadãos em tempos de retração do pleno emprego. De toda forma, o terceiro setor é um termo que encobre ou recobre o próprio significado da ação política da sociedade civil contemporânea. A ação política é transmutada em ação solidária. Ou melhor, a solidariedade é a nova expressão da ação política. Com estas colocações pretende-se debater o terceiro setor e, mais do que isso, refletir sobre a mutação dos sujeitos protagônicos na sociedade contemporânea. Pode-se afirmar que, até os anos 60, as classes sociais foram os sujeitos coletivos protagonistas por excelência, depositando-se, inclusive na classe operária, as expectativas utópicas de transformação societária. O “abaixo a ordem” dos anos 60 pré-anunciavam uma deslegitimação dos “roteiros de classe”. O movimento jovem daquela década marcou a introdução de novos sujeitos/atores com capacidade de vocalização e legitimação política. Os movimentos sociais seguintes – étnicos, de gênero, ecológicos, etc. – deslocaram para a sociedade civil um papel protagônico na revolução cultural que ocorreu nas últimas décadas. As organizações não-governamentais (ONGs) são um desdobramento deste processo. Segmentos da classe média sem espaço nas estruturas tradicionais de poder – partidos, governos, empresas, sindicatos – encontram nas ONGs um novo espaço de articulação e protagonismo político. E, nesta via, a identidade de classe vai sendo substituída por outras: a feminista, a étnica e outras, referenciadas em projetos microidentitários fora dos “roteiros de classe”. Desloca-se assim o conflito, tornando opaca a contradição básica capital/trabalho coincidentemente com um momento histórico em que o capitalismo torna-se o modo único planetário de produção. Centra-se o conflito num sujeito já debilitado politicamente: os estados-nações. A sociedade civil passa a ser o espaço/sujeito que movimenta uma multiplicidade e heterogeneidade de projetos parcelares. to à coabitação entre várias pequenas narrativas (locais, culturais, étnicas, religiosas, ideológicas). O desaparecimento ou drástica transformação do comunismo do leste europeu (que existe apenas em nome) deve-se em grande parte ao enfraquecimento dos roteiros de classe e suas conseqüências teóricas. A mudança das proporções de significado político dos partidos para os movimentos (processo que em geral equivale à assimilação pelos europeus dos hábitos políticos americanos, um novo padrão em cujo os termos os movimentos, mais que os partidos, forjam as opções políticas) também resultou do reduzido papel das classes e estratégias de classe ou pelo menos foi bastante facilitada por isso”(Heller e Fehér, 1998:16-19). A sociedade civil, por meio de suas organizações solidárias, vem se apresentando como a principal defensora dos interesses dos cidadãos, capaz de oferecer respostas em tempos de retração do Estado e da perda do status do trabalho como vetor de inclusão social. É interessante notar que a sociedade, da forma como é idealizada, sugere um distanciamento e secundarização dos clássicos atores de defesa de direitos neste século: os sindicatos de trabalhadores, os partidos, o Estado. Coloca-se esta sociedade civil como ator principal capaz de portar novas utopias e restabelecer a res pública ancorada em valores de ética na política, e solidariedade na defesa e atendimento às necessidades dos grupos societários. Aliás esta busca não é nova; em vários períodos da história participou nas lutas por conquista de direitos, cumprindo uma função processante da política pública. O novo, neste tempo histórico, é que, por meio de organizações solidárias, promete-se reinventar o engajamento cívico no interior de sociedades complexas e globais. Estas organizações da sociedade civil eram mobilizadas e articuladas por outros atores principais nesta busca: trabalhadores, empresários, partidos, etc. A diferença na contemporaneidade é que as organizações da sociedade civil postam-se como autônomas e mais bem capacitadas para assegurar antigas e novas conquistas. E, nesta direção, invertem relações de complementaridade: organizações não-governamentais substituem governos ou se comportam como governos; centrais sindicais e partidos incorporam as lutas das organizações não-governamentais (e, em geral, não o inverso). Com o ressurgimento do conceito de sociedade civil, suas organizações também ganham maior plasticidade, visibilidade e um novo reconhecimento. A expressão sociedade civil guarda inúmeras ambigüidades e ressurge na atualidade apoiada em referencial teórico absolutamente eclético. Reivindica diferenciação em relação ao Estado e ao mercado, considerando a socieda- AS APOSTAS NAS ORGANIZAÇÕES SOLIDÁRIAS DA SOCIEDADE CIVIL “A condição política pós-moderna se baseia na aceitação da pluralidade de culturas e discursos. O pluralismo (de vários tipos) está implícito na pós-modernidade como projeto. O colapso da grande narrativa é um convite dire- 84 SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR de política – representada pelos partidos, parlamentos – envolvida diretamente com o poder do Estado e as organizações dos empregadores e de trabalhadores ligadas diretamente ao poder econômico (Vieira, 1996). Portanto, a sociedade civil entende-se como autônoma a ambos. Centra sua ação na esfera pública tendo como interlocutor privilegiado o Estado, seja para confrontar, negociar ou complementar. Os aportes teóricos que buscam explicar ou justificar este modo de conceber as ONGs e o papel da sociedade civil são, como já dito, ecléticos. Uma das referências básicas “é a divisão gramsciana tripartite entre sociedade civil, Estado e mercado ao mesmo tempo que preserva aspectos-chaves da crítica marxista à sociedade burguesa”. Inclui “ainda a defesa liberal dos direitos civis, a pluralidade societária enfatizada por Hegel, Tocqueville e outros, a solidariedade social tão cara a Durkheim, e a defesa da esfera pública e da participação política acentuada por Habermas e Hanna Arendt. Desta perspectiva, o fim último das revoluções não é mais a reestruturação do Estado a partir de um novo princípio, mas a redefinição das relações entre Estado e sociedade, do ponto de vista desta última” (Vieira, 1996:109). “O conceito de sociedade civil implica o reconhecimento de instituições intermediárias entre o indivíduo, por um lado, e o mercado e o Estado, por outro. Estas instituições mediadoras cumprem o papel de ‘institucionalização’ de princípios éticos que não podem ser produzidos nem pela ação estratégica do mercado, nem pelo exercício do poder do Estado. Nesse sentido, a reconstrução da solidariedade social na modernidade estaria associada à idéia de autonomia social” (Avritzer apud Vieira, 1996:109). É, portanto, a esta noção de solidariedade – civil e laica – que as organizações solidárias da sociedade se vinculam e encontram legitimidade para reivindicar autonomia: nem Estado, nem mercado. Esta nova sociedade civil parece encarnar um pragmatismo utópico não mais ancorado na “grande narrativa”, mas sim nos muitos microdiscursos. Nesta direção é possível observar propósitos na busca de reinstalar valores essenciais a um salto qualitativo na vida dos cidadãos, tais como a solidariedade, a ética, a democratização da política, a defesa de direitos das minorias e o estabelecimento de condições que desafiam a humanidade, como o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Este novo modo de pensar e agir da sociedade contemporânea é resultado e resposta possível no contexto atual marcado por processos de globalização da economia, da informação, da política, da cultura, assim como dos avanços tecnológicos e transformação produtiva que vêm produzindo uma sociedade complexa e multifacetada. Uma sociedade global que mantém seus cidadãos, de um lado, fortemente interconectados e, de outro, extremamente vulnerabilizados em seus vínculos relacionais de inclusão e pertencimento. Integram este cenário a crise do Estado de Bem-Estar Social e, com ele, a oferta de políticas públicas universalistas enquanto reconhecimento de direitos sociais dos cidadãos. Neste cenário é compreensível a emergência de uma sociedade civil tecida por um conjunto aparentemente caótico de organizações autodeterminadas a produzirem, elas próprias, respostas às demandas dos grupos que representam, ou a serem os canais de vocalização destas mesmas demandas na esfera pública. Esta sociedade fragmentada, multifacetada, buscando ela própria novos canais de vocalização de suas demandas na esfera pública, secundariza os canais tradicionais de representação e mediação dos interesses coletivos (partidos, parlamentos, sindicatos). E, nas novas condições, gesta novos modos de processar e fazer política. Correndo em artérias globais, as organizações da sociedade civil pressionam (não sem contradições) instituições políticas mundiais, objetivando assegurar conquistas civilizatórias em nível planetário. É neste veio que emergem os movimentos/atores de defesa ecológica, de defesa de minorias, de defesa dos consumidores, entre outros, que expressam características pluralistas, porém, fragmentadas e particularistas, próprias da sociedade contemporânea. É com estas características que as organizações da sociedade civil articulam-se em redes locais, regionais, nacionais e mundiais, assumindo papel fundamental na constituição de solidariedades intermédias e mantendo o fluxo global/local e local/global (Santos, 1996). Neste fluxo, à política é reivindicado assumir uma perspectiva cada vez mais global – a perspectiva da Humanidade –, exercendo-se, entretanto, num espaço cada vez mais local (Franco, 1995). “O espaço onde se exerce a política da Contemporaneidade é um espaço local, regido porém por uma perspectiva global – não internacional mas planetária, como é hoje a perspectiva da Humanidade. Este espaço de comunidade é um espaço ético-político; quer dizer, um espaço local onde as relações políticas são reguladas por idéias-valores que decorrem da perspectiva global de constituição de humanidade. Isso só se torna possível quando se atribui finalidade tópica à política. Ou, seja, quando se pode dizer: ‘fazer política para...’(que um determinado conjunto de seres humanos concretos, de pessoas, tenha mais vida, mais liberdade e menos sofrimento). Ora, quando a perspectiva de constituição da Humanidade (futura) se traduz na construção de mais humanidade (no presen- 85 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 12(4) 1998 te), totalidade e finalidade coincidem e a política tornase permeável à ética, torna-se eticizável. A Humanidade Global vai, assim, sendo construída pelo desenvolvimento das relações ético-políticas que só podem se exercer nos espaços de Ação Local. Planeta e Pessoa constituem elementos necessários nessa combinação que gera a relação ético-política. Sem a dimensão planetária que universaliza os particularismos ampliando o sujeito político do grupo social ou do Estado-Nação para o conjunto da humanidade e sem a dimensão pessoal que foca o objeto político (ou da ação política) na vida humana de indivíduos concretos, que só podem ser encontrados como tais num local determinado, não pode haver política” (Franco, 1995:119-120). Há nesta direção uma aposta com tons mitificados sobre o papel das organizações da sociedade civil. “A proliferação das organizações da sociedade civil pode chegar a ser, ultrapassando as suas velhas origens, a maior inovação do século XXI” (Thompson, 1997:41). “O resultado é uma verdadeira ‘revolução associacional global’, a multiplicação da atividade organizada, privada e voluntária que, segundo acredito, poderá revelar-se um aspecto tão importante do final do século XX quanto o advento do Estado-Nação o foi do final do século XIX” (Salamon, 1997:91). “...as fundações nos parecem uma das maiores reservas de liberdade, de pluralidade e de diversidade porque são uma das mais fecundas possibilidades de equilíbrio entre as iniciativas sociais e as necessárias limitações do Estado. É da minha opinião, o tema mais apaixonante de nossos dias: a nova concepção das relações entre o Estado e a Sociedade” (Miera, 1997:62). “O terceiro setor não se caracteriza, evidentemente, por investimentos intensivos de capital. Distingue-se ao contrário pelo uso intensivo do trabalho, apelando para a sua criatividade e para a sua dimensão voluntária” (Fernandes, 1997:32). “É função do terceiro setor contribuir criando condições para tornar possível a democracia cultural. Isso significa criar condições para que todos os diferentes sentidos e símbolos da diversidade social possam competir e circular em igualdade de condições” (Toro, 1997:36). “É a expansão da esfera pública pela atividade cidadã” (Fernandes apud Wanderley, 1997:100). “...a emergência das organizações não governamentais, dotadas de uma diversidade notável, que vem ganhando importância não só por articularem iniciativas múltiplas em vários planos da sociedade civil, como também por combinarem formas relevantes de associação com o Estado nas gestões de governos municipais, estaduais e federal, inclusive participando de redes continentais e mundiais, e que constituem grupos de pressão de grande alcance. Não isentas também de muitas ambigüidades estão trazendo subsídios preciosos para a esperada publicização ao prestarem serviços públicos relevantes e por gestarem formas inovadoras de parceria com os poderes públicos” (Wanderley, 1997:101). Esta última afirmação de Wanderley sinaliza para aqueles atributos mais valorizados no comportamento destas organizações: - capacidade de articularem iniciativas múltiplas revitalizando o envolvimento militante de setores da sociedade civil; - capacidade de estabelecerem parceria com o Estado na gestão de programas e políticas públicas; - capacidade de estabelecerem redes locais, nacionais ou mundiais e, por meio delas, não apenas constituírem grupos de pressão, mas também manterem dessa forma vivos os movimentos sociais e a reatualização de suas pautas de lutas. A DIVERSIDADE E PLURALIDADE DE PROPÓSITOS DAS ORGANIZAÇÕES SOLIDÁRIAS Independente das motivações atuais, é importante assinalar que a sociedade civil historicamente produziu formas associativas para atuar na esfera pública, seja em nome da reciprocidade, filantropia, caridade ou compaixão para com os pobres. Assim, recobre latu sensu uma infinidade de associações díspares que assumem propostas conservadoras ou progressistas. São multifacetadas, pinçando problemas e necessidades específicas ou elegendo clientelas locais, nacionais, supranacionais. Algumas se mantêm como braços doutrinários de Igrejas; outras, do empresariado; outras, braços solidários da própria comunidade e, as mais recentes, se reconhecem como braços das minorias ou da humanidade. Congregam deste modo uma variedade de entidades sem fins lucrativos, valendo aqui destacar algumas de suas principais diferenças. Entidades Comunitárias Possuem uma relação tal de pertencimento com os habitantes de seu microterritório, que as ações por elas desenvolvidas tomam quase sempre a característica de uma proteção/desenvolvimento mutualista. Regem-se pelo princípio da reciprocidade. Estas entidades têm pouca visibilidade, já que seu âmbito de ação é restrito ao microlocal. São múltiplas e específicas suas motivações, porém sua característica básica é a de prestarem serviços de proximidade, condu- 86 SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR zidos, em geral, por grupos voluntários, sustentados com poucos recursos financeiros. São estas, por excelência, que movimentam os espaços comunicativos primários e as redes espontâneas de sociabilidade. “Os espaços de comunicação interpessoal ancorados nos locais de moradia apresentam níveis variados de complexidade. (...) A estrutura organizacional mais elaborada, contudo, corresponde àquela apresentada pelos grupos especializados funcionalmente e dotados de alguma institucionalidade (encontros regulares com pauta predefinida, etc.), que vão desde os clubes de mães e os grupos de jovens, abrigados no âmbito das atividades paroquiais, até as associações de moradores e outros grupos, de emergência mais recente, dedicados ao tratamento de questões temáticas específicas (grupos de mulheres, comissões de saúde e de educação formadas nos bairros, etc.)” (Costa, 1997:129). Este agrupamento de organizações é hoje revalorizado pelo potencial que apresenta na proteção social dos indivíduos e na inclusão dos mesmos em redes de sociabilidade primária. Cumprem papel importante no fortalecimento de vínculos relacionais e de pertencimento – problemáticas essas que estão na ordem do dia, resultantes seja do crescente individualismo produtor de isolamento social, seja da transformação produtiva redutora das possibilidades de inserção no mundo do trabalho, via privilegiada de integração social. faz desconfiar da intenção do uso das vantagens do título “sem fins lucrativos” para obtenção de isenções fiscais não negligenciáveis. Salamon (1997:94) afirma que, em termos de serviços, o setor sem fins lucrativos é uma presença significativa e constante, responsável por: - três em cada quatro matrículas universitárias no Japão; - mais da metade dos serviços de residência em clínicas particulares na França; - metade dos leitos hospitalares nos Estados Unidos; - um terço dos serviços de assistência diária na Alemanha. As organizações filantrópicas e as de cunho religioso são as que possuem maior tradição na realização de convênios ou contratos com agências governamentais para prestação de serviços sociais públicos. Entidades Voltadas ao Fortalecimento da Cidadania e à Defesa das Minorias São a estas últimas que stritu sensu se atribuem, em geral, o nome de organizações não-governamentais (ONGs), marcando diferenças com as demais entidades sem fins lucrativos. Regem-se pelo princípio da solidariedade. Este último agrupamento caracteriza-se por ações de multiple advocacy, e de empowerment voltadas, em geral, para as minorias (étnicas, de gênero, ou faixa etária). Incluem-se aqui igualmente ações dirigidas à defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável. É este, em geral, um campo de ação fortemente articulado em redes locais, regionais, nacionais e supranacionais. Este terceiro agrupamento opera com características quase governamentais ou mesmo substituindo os governos. Determinam significativamente a agenda pública das nações em estreita articulação com organizações das Nações Unidas/ONU. Esta última afirmação é suficientemente exemplificada pelo desempenho/comportamento político dos fóruns de ONGs que acompanharam e acompanham as conferências das Nações Unidas na presente década. O termo “ONG” foi cunhado pela Organização das Nações Unidas (ONU) já na década de 40 para designar entidades da sociedade executoras de projetos humanitários ou de interesse público transnacional. As ONGs expandem-se nas décadas de 60 e 70 nos países desenvolvidos para agirem no chamado Terceiro Mundo. Expressam, na sua origem, o compromisso humanitário dos países ricos para com os países pobres. No seu desdobramento, geraram ONGs locais nos países onde atuavam, introduzindo o início das modernas redes de cunho global. Entidades Filantrópicas Em geral, atuam na prestação de serviços assistenciais destinados aos segmentos mais vulneráveis da população (idosos, pessoas portadoras de deficiência, famílias em extrema pobreza, etc.) ou ainda na prestação de serviços de educação, saúde, cultura. Integram este conjunto as fundações empresariais como financiadoras ou promotoras diretas destes serviços. Este agrupamento de organizações rege-se pelo princípio da filantropia. Entidades Ligadas a Diversas Igrejas Com variadas ações progressistas ou conservadoras, estas entidades são orientadas pelo princípio da caridade e da compaixão. Também concentram-se na prestação de serviços assistenciais, de educação e saúde. É importante assinalar que estes dois últimos agrupamentos de organizações guardam, no seu conjunto, heterogeneidades quanto ao seu fazer social. Uma parte significativa delas se constituem como verdadeiras empresas muito próximas da produção de serviços via mercado. Algumas destas (uma minoria) prestam serviços com vistas ao lucro, mantendo uma parte não lucrativa, o que 87 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 12(4) 1998 Como analisa Santos (1995), o acirramento dos processos de globalização produz, em contrapartida, o acirramento dos processos de localização. As ONGs expressam nas suas novas dinâmicas este fluxo de dupla mão: local/global e global/local. Embora enraizadas no local, elas mantêm vínculos globais de tal sorte que uma problemática local, como por exemplo, a chacina da Candelária/meninos de rua ou a morte de um “sem terra”, tem imediata ressonância a nível mundial, articulando um fluxo de pressões e solidariedades internacionais. Neste fluxo de dupla mão local/global, as organizações da sociedade civil se permitem desconsiderar leis e padrões culturais dos países onde atuam em nome da humanidade. É este comportamento que gera maior resistência, seja por tensionar o instituído, seja por desrespeitar o multiculturalismo por elas valorizado. necessária parceria com a sociedade civil, para ofertar serviços de direito dos cidadãos. Assim, um dos fatores recentes na consolidação da presença política das organizações solidárias da sociedade civil é, sem dúvida, a mutação dos padrões de governança e governabilidade existentes antes da crise. Os processos de globalização e a intensificação da competitividade introduzem novas compressões para as nações (queda nas taxas de crescimento, desemprego, déficit público, pressões internacionais por ajustes fiscais, liberalização dos mercados, desregulamentação estatal, etc.), que desmontam/balançam os padrões na oferta de bens e serviços assegurados nas chamadas décadas gloriosas do pós-guerra. Há uma nova interdependência que fragiliza o conhecido modelo institucional que é o do Estado-Nação, tornando quase compulsórios e consensuais um movimento externo, em direção à formação e à integração em blocos econômicos, e um movimento interno, de descentralização, flexibilização e fortalecimento da sociedade civil para compor um novo pacto e condições de governabilidade. Neste novo cenário global, organizações supranacionais, como as Nações Unidas, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional, ampliam seu poder na definição da agenda de prioridades políticas dos diversos países. Assim, estas organizações ganham maior visibilidade e, em certa medida, maior legitimidade a partir de vínculos mais estreitos tecidos com as organizações da sociedade civil. Por outro lado, para estas últimas, o apoio das organizações das Nações Unidas, por exemplo, também representa sua legitimação política, tanto no âmbito global quanto no local. “Hay áreas en las cuales, con conocimiento de los gobiernos, el BID actúa más directamente vinculado con los actores sociales. Hemos venido logrando un mandato de los gobiernos para estrechar esta relación com los actores sociales. De a poco, en América Latina tiende a reproducirse el fenómeno europeo de una gran participación de las organizaciones no gubernamentales en la administración y ejecuación del gasto social. No es fácil, claro, operar en la intersección de la sociedad civil y los Estados” (Iglesias, 1996:9). Vale lembrar as conferências 1 protagonizadas pela ONU na presente década, com a expressiva participação das chamadas organizações não-governamentais. É ilustrativo descrever alguns processos que movimentam este círculo virtuoso de parceria entre ONGs e organizações das Nações Unidas. Para ratificar e implementar, por exemplo, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e do Adolescente (1989), ONGs com liderança em diversos países foram AS BASES DE SUSTENTAÇÃO E LEGITIMAÇÃO DO TERCEIRO SETOR Um dos pilares de sustentação e legitimidade das organizações da sociedade civil encontra-se nas próprias motivações do indivíduo enquanto sujeito social. Isto é, de se auto-objetivar por meio de ações voltadas ao bem comum e de engajamento cívico na esfera pública. O compromisso ético político e a solidariedade são valores energizantes da vida do cidadão e também da vida pública. Outro pilar de sustentação e legitimidade dessas organizações vem do próprio Estado. A concessão na prestação de serviços sociais de utilidade pública, ou a publicização de atividades não exclusivas do Estado, é motor sem dúvida de expansão do terceiro setor. O Welfare State em muitos países já combinava serviços estatais com serviços prestados por entidades sem fins lucrativos ou confessionais, especialmente no campo da saúde, educação e assistência social. Mas há um outro motor/pilar presente nas últimas décadas: o incentivo das organizações multilaterais e de governos ou fundações dos países do norte na constituição das novas organizações da sociedade civil. De fato, desde o final da década de 70, tanto organizações multilaterais quanto governos dos países do norte já incentivavam a expansão e o fortalecimento de organizações solidárias da sociedade civil, desacreditando da competência/ eficácia dos governos do chamado Terceiro Mundo, no enfrentamento da questão social. Estavam aí colocados interesses de, no plano da global governance, criar condições de governabilidade que passavam, algumas delas, pelo fortalecimento das organizações da sociedade civil. A crise do Welfare State, o déficit público e os ajustes fiscais impulsionaram a chamada reforma do Estado e a 88 SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR mobilizadas e sensibilizadas a partir de diversos encontros internacionais apoiados ou promovidos pelo Unicef. Numa seqüência de processos e ações impulsionadoras e convergentes, realizou-se em 1990 o Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, realizado na sede das Nações Unidas, quando 71 presidentes e chefes de Estado, além de representantes de 80 países, assinaram a Declaração Mundial sobre Sobrevivência, Proteção e Desenvolvimento da Criança. Adotaram plano de ação para a década de 90, assumindo o compromisso de implementar de imediato a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. Coube às ONGs mobilizadas, de certo modo, sensibilizar governos e sociedades, à qual pertenciam, para introduzir no campo legal e político o novo paradigma de proteção a este grupo etário, como ocorreu no Brasil, no mesmo período. “Em verdade, quando se trata de transferir a res pública para a gestão da iniciativa privada, o controle tem que ser constante, eficaz e, porque não dizer, formal, pelo menos até que se estruture outra forma de controle em substituição, especialmente quando a res pública vai ser utilizada para o desempenho de atividades não lucrativas, como as da área social, já que aí o controle de resultado é muito mais difícil do que quando se trata de atividade de natureza econômica, passível de ser avaliada segundo critérios mais objetivos” (Di Pietro, 1998). As Organizações que Compõem o Terceiro Setor Ressurgem na Esteira da Crise do Welfare State Mais Como Preenchedoras de Vazios que Portadoras de Um Novo Projeto – “(...) é grande o risco de o terceiro setor ser chamado a ressurgir, não pelo mérito próprio dos valores que subjazem ao princípio da comunidade – cooperação, solidariedade, participação, eqüidade, transparência, democracia interna –, mas para atuar como amortecedor das tensões produzidas pelos conflitos políticos decorrentes do ataque neoliberal às conquistas políticas dos setores progressistas e populares obtidas no período anterior. Se este for o caso, o terceiro setor converte-se rapidamente na ‘solução’ de um problema irresolúvel e o mito do terceiro setor terá o mesmo destino que teve anteriormente o mito do Estado e, antes deste, o mito do mercado. Esta advertência, longe de minimizar as potencialidades do terceiro setor na construção de uma regulação social e política mais solidária e participativa, visa apenas significar que as oportunidades que se nos deparam neste domínio acontecem num contexto de grandes riscos” (Santos, 1998). ALGUMAS QUESTÕES FINAIS QUE PERMANECEM NA AGENDA Fica Claro que o Chamado Terceiro Setor Ganha Enorme Relevância no Novo Arranjo e Gestão da Política Social. Este Novo Arranjo Está Ancorado na Parceria Estado, Sociedade Civil e Iniciativa Privada – Neste sentido, está na ordem do dia o que se denomina Welfare Mix, que promove uma combinação de recursos e de meios mobilizáveis junto ao Estado, mercado, iniciativas das organizações da sociedade sem fins lucrativos e, ainda, aqueles derivados das micro-solidariedades originárias na família, nas Igrejas, no local (Martin, 1995 e Evers, 1993), de modo que as políticas sociais se apresentam hoje como responsabilidades partilhadas. É por isso que se indaga até que ponto o protagonismo da sociedade civil é real ou induzido. As Organizações da Sociedade Civil Incorporaram em Seu Fazer Social e Político a Noção de Redes e Parcerias, o Que as Tornam Fortemente Articuladas, Mantendo Vínculos Locais, Regionais, Nacionais e Mundiais – A constituição de redes garante uma enorme visibilidade ao chamado protagonismo da sociedade civil. Para além da possibilidade de exercer pressão, elas criam um círculo virtuoso: os movimentos sociais nascem, se fortalecem, cumprem sua função instituinte, desdobram-se em ONGs que, articuladas em redes, re-criam os movimentos sociais em novas bases, isto é, com maior institucionalidade e transnacionais. Estas observações deixam claro a impossibilidade de refletir sobre o terceiro setor desconectado da reflexão de um certo modo de conceber o comportamento e prática política da sociedade civil contemporânea. E é esta conexão que precisa ser apreendida no discurso que referencia o protagonismo da sociedade civil pela via do terceiro setor. A Reflexão sobre o Terceiro Setor Não Está Descolada da Reflexão sobre os Projetos de Reforma do Estado – Tais projetos mantêm na pauta política a tensão entre eficiência e eqüidade. É que os processos de privatização e de publicização de atividades não exclusivas do Estado prometem maior eficiência no gasto público, porém não asseguram eqüidade. As empresas estatais privatizadas lograram, na maioria dos casos (e na maioria dos países), maior eficiência operacional, porém mantém-se o desafio de garantir que essas vantagens cheguem com menor custo e maior qualidade ao cidadão consumidor. Na publicização de atividades não exclusivas do Estado – campo privilegiado de envolvimento do terceiro setor – também há riscos. O principal risco é exatamente a privatização das atividades sociais do Estado. 89 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 12(4) 1998 As Organizações sem Fins Lucrativos Ganham Maior Flexibilidade e São Pró-Ativas na Construção de Parcerias com Governos, Iniciativa Privada Mercantil, Movimentos Sociais, Além de Organizações Multilaterais ou Supranacionais – Nesta direção, o terceiro setor caminha para uma maior institucionalidade, reforçando suas duas grandes tendências: a primeira é a de ampliar e consolidar o espaço de prestação de serviços sociais “terceirizados ou publicizados” pelo Estado, operando, porém, num patamar muito próximo às regras ditadas pelo mercado; a outra tendência é a de ganhar e consolidar espaço na defesa de direitos e ações de multiple advocacy, operando em escala local/global, articulado em redes ancoradas em processos de mobilização social tendo como pontos de referência/confrontação/parceria as agências multilaterais e o Estado. As fundações empresariais mais recentes apresentam estas duas tendências atuando, inclusive, menos como financiadoras de outras organizações e mais, elas próprias, na promoção direta de serviços ou na defesa de direitos. Buscam no terceiro setor marcar seu compromisso social, ao mesmo tempo em que o usam enquanto marketing de seus negócios. Também aqui há uma conexão a ser refletida: o mercado, as empresas e o social. O social enquanto negócio tem para o mercado dupla importância, pois é mercadoria lucrativa e o melhor instrumento de marketing para seduzir o atual consumidor. Os consumidores estão mais exigentes com a qualidade dos produtos e, ao mesmo tempo, mais sensíveis e propensos a consumir produtos e marcas de empresas que defendam o meio ambiente, a ecologia e os direitos humanos. Por outro lado, as transformações produtivas indutoras de desemprego e uma pobreza persistente podem desestabilizar o mercado, o que compele seus agentes a um compromisso com o social pela mediação do terceiro setor. Esta mediação torna leve este compromisso, introduzindo o mercado (entidade abstrata) pelas mãos das fundações empresariais, via terceiro setor, em parceiro da sociedade civil e, mais que isso, o confundindo com a própria sociedade civil. No fluxo de ações e relações local/global estas organizações “podem estar arrogantemente desautorizando as leis de seus próprios países” ou ainda, arrogantemente impondo valores e projetos a outros países. Enfim abusam da prerrogativa de ingerência internacional; “são jacobinas, pois julgam ter o direito de impor suas próprias concepções a sociedade que mal conhecem. São monotemáticas e por isto têm dificuldades em admitir outros pontos de vista ou outras dimensões de um problema...” (Albuquerque, 1995). Podem ser também grupos de interesse. Apropriam-se privadamente de fundos públicos. Além disso, mantêm uma permanente tensão: são uma nova força neoliberal ou um novo modo de engajamento cívico progressista. As Organizações Solidárias da Sociedade Civil, Chamadas de Terceiro Setor, Ganham Consenso Quanto ao Que Representam na Busca de Enfrentamento da Questão Social Contemporânea: - capacidade de mobilização social. “Entre 1975 e 1985, houve um aumento de 1.400% de assistência ao desenvolvimento canalizada para as ONGs (Fowler, 1991:55 in Adams 5). No Nepal as ONGs aumentaram de 220 em 1990 para 1.210 em 1993, enquanto na Tunísia cresceram de 1.886 em 1988 para 5.186 em 1991 (Hume e Edwards, 1997:4). No Quênia, as ONGs controlam entre 30% e 40% das despesas de desenvolvimento e 40% das despesas de saúde (Ndegwa, 1994:23). Em Moçambique, os programas de emergência, a ajuda humanitária e outras atividades de desenvolvimento estão em larguíssima medida a cargo de ONGs internacionais que atuam em articulação com ONGs nacionais, as quais em 1996 eram em número de 164 (Santos, 1998). - possibilidade de oferta de postos de trabalho é igualmente atividade solidária para os “fora” do trabalho. Uma pesquisa em realização pelo Instituto de Políticas da Universidade John Hopkings (Estados Unidos), que investiga o terceiro setor em vários países, concluiu que em sete deles (Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Hungria e Japão), o terceiro setor possuía em 1990 um total de cerca de 12 milhões de empregados com pagamento equivalente a tempo integral, mais 5 milhões de voluntários. Isso significa que um em cada 20 empregados e um em cada dez prestadores de serviços estão lotados no setor sem fins lucrativos naqueles países. (...) Em comparação com os 6,8% do emprego total nos Estados Unidos, o setor sem fins lucrativos representa nada menos que 4% na França, Alemanha e Reino Unido. Em termos absolutos, o Japão possuía o segundo maior setor sem fins lucrativos do mundo. Se for incluído o emprego voluntário e não apenas o remunerado, a Suécia, exemplo clássico de vocação social, supera todos os outros países euro- Embora Cercada de Visibilidade, Legitimidade e Reconhecimento, as Organizações Solidárias da Sociedade Civil não Deixam de Produzir Resistências – Reivindicam autonomia de expressão e ação, porém não assumem no geral o compromisso com a transparência e o dever ético de prestação de contas de suas ações públicas. Produzem ações inovadoras, porém com baixa capacidade de alteração da qualidade de vida daqueles para os quais destinam suas ações. 90 SOCIEDADE CIVIL, ESTADO E TERCEIRO SETOR REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS peus (Salamon, 1997:94). A reflexão sobre estes dados e a expansão do terceiro setor nos últimos anos sinalizam para a importância do mesmo na geração de empregos assim como na geração da “plena” atividade; - restabelecimento da res pública ancorada em valores de ética na política e solidariedade na defesa e atendimento às necessidades dos grupos societários. “Podese criticar seriamente as estratégias de vários movimentos, e na verdade criticamos determinados movimentos pelo que julgamos suas ilusões políticas. Contudo, fechar os olhos para o papel constitutivo deles nas mudanças sócio-políticas e culturais do panorama político no pós-Segunda Guerra Mundial é permanecer indiferente ao ineditismo da condição política pós-moderna” (Heller e Fehér, 1998:26). Não há dúvida sobre o importante papel que vêm cumprindo os movimentos sociais e organizações solidárias da sociedade civil na constituição de canais de escuta e vocalização de demandas societárias, assim como a condição que mantêm de inscrever na agenda pública estas mesmas demandas. Mesmo que movimentando-se de forma fragmentada, estas organizações apoiadas em microdiscursos e em microinteresses, repõem um olhar sobre a humanidade. É preciso observar, no entanto, que esta sociedade civil e, em particular, as ONGs parecem representar mais as minorias organizadas e menos as maiorias desorganizadas que se mantêm como desafio nas sociedades atuais. As questões aqui arroladas continuam em pauta no estudo e monitoramento das tendências quanto ao papel/ comportamento do terceiro setor e sua condição de mediação no protagonismo da sociedade civil. ABRAHANSON, P. Welfare pluralism: para um novo consenso na política social européia? Brasília, Neppos/Ceam/UnB, 1995. ALBUQUERQUE, G. 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