Nakano e a Inflação Inercial

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Nakano e a Inflação Inercial
Francisco Roberto Fuentes Tavares de Lira
Rosana Paczyk
INTRODUÇÃO
Este artigo objetiva estudar a contribuição das obras de um dos economistas mais importantes do
Brasil, Yoshiaki Nakano, principalmente no que diz respeito à análise realizada na década de 1980,
(juntamente com Luiz Carlos Bresser-Pereira) sobre a inflação inercial. Este economista nipo-brasileiro
teve participação na construção de um artigo que delineou interpretações significativas sobre o Plano
Collor, e que posteriormente colaborou com a criação da URV – Unidade Real de Valor – do Plano Real.
Sua presença se estende à publicação de artigos na Revista de Economia Política, onde hoje, é
coeditor de jornais e revistas especializadas em economia. Também, participou na confecção do livro O
Brasil frente a um mundo dividido em blocos.
1
NAKANO: TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Yoshiaki Nakano é um dos grandes economistas da atualidade, sendo atualmente diretor e
professor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo. Desempenha esta
função desde 2001, quando deixou o cargo de secretário da Fazenda do estado de São Paulo, sua
relação com a FGV já atinge mais de trinta anos.
Nakano, descendente de imigrantes japoneses, nasceu em 1944, na cidade de Maringá, no
interior do estado do Paraná. Na cidade natal, completou sua educação básica, porém a busca de
oportunidades levou-o a fazer o ensino superior na Escola de Administração de Empresas de São Paulo
(EAESP-FGV).
Apesar de ter iniciado os estudos na área administrativa, Nakano viu-se atraído pelas ciências
sociais, mais precisamente pela Economia, e, nos anos 1960 conheceu o professor Luiz Carlos BresserPereira, do qual seria maior colaborador e amigo na vida acadêmica.
Ele (Nakano) sempre foi um dos meus melhores amigos, e certamente meu mais
próximo companheiro de aventuras intelectuais. Foi meu aluno, ainda nos anos 60, e
nessa época escreveu para um dos meus cursos um trabalho semestral sobre
escolhas de técnicas e desenvolvimento, que foi o primeiro trabalho publicado por
um aluno da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo na Revista de Administração de
Empresas (BRESSER-PEREIRA, 2009, p. 6).
Logo quando terminou a EAESP, tratou de ser professor na instituição a fim de conseguir o
doutorado no exterior, na área de ciências econômicas. Isto aconteceu na Fundação Instituto de
Pesquisas Econômicas (FIPE-USP), que o preparou para lidar com a oportunidade de estudar na
universidade norte-americana de Cornell. Nakano evidenciou numa entrevista o porquê da escolha de
Cornell para o doutorado: “Conheci Cornell através de três pessoas. (...) Então, acabei sabendo que
1 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | Cornell era uma universidade extremamente flexível, cujo lema era que cada um tivesse a liberdade de
estudar o que quisesse” (MANTEGA, REGO, 1999, p. 251).
Ao concluir o doutorado, Nakano continuou a trabalhar na FGV, e conciliou as atividades
acadêmicas com a tarefa de dirigir o departamento econômico do Grupo Pão de Açúcar. A passagem
no Pão de Açúcar foi extremamente relevante para a formação (ou melhor, consolidação) do
conhecimento econômico de Nakano, pois permitiu a ele aplicar o conhecimento à realidade. Além
disso, o grande interesse do economista nipo-brasileiro pela inflação e formação dos preços foi marcado
pela experiência no grupo econômico, o que fez com que produzisse ao lado do economista Luiz Carlos
Bresser-Pereira, um dos mais significativos trabalhos sobre a economia brasileira, especialmente num
momento em que o país vivia um grande ciclo inflacionário na década de 1980.
O artigo Fatores Aceleradores, Mantenedores e Sancionadores da Inflação marcou a carreira de
Nakano, colocando-os (apesar de já ser conhecido pela obra Desenvolvimento e Crise no Brasil) em
evidência no cenário nacional, devido à exposição precisa dos mecanismos da chamada inflação
inercial. Tal contribuição fez de ambos relevantes formadores de opinião na conjuntura econômica. Este
fato colaborou para que Luiz Carlos Bresser-Pereira fosse ministro da Fazenda em 1987, com a
responsabilidade de elaborar uma política econômica capaz de interromper o ciclo inflacionário, Nakano
foi escalado para compor a equipe econômica do ministro. A “estadia” da dupla no Ministério da
Fazenda foi curta, já que o Plano Bresser resultou em fracasso, devido a problemas de ordem política.
Após esta fase, Nakano continuou na FGV e manteve-se focado no problema da inflação, ao
escrever artigos sobre conjuntura, tal como Hiperinflação e estabilização no Brasil: o primeiro Plano
Collor, criticando a natureza do plano econômico.
No entanto, conseguiu rapidamente outra oportunidade para atuar na administração pública, ao ser
escolhido, em 1995, pelo governador de São Paulo, Mário Covas, como coordenador da Secretaria da
Fazenda do Estado de São Paulo. Ao assumir tal tarefa, Nakano viu-se diante do desafio de equilibrar o
déficit das contas públicas do estado, além de conduzir a difícil privatização do banco estadual Banespa.
Deixou a secretaria em 2001, e viu-se novamente diante de outro desafio: a FGV propôs a Nakano
montar e dirigir a Escola de Economia de São Paulo. Aceitou a missão e conseguiu consolidar aquele
segmento da instituição.
2
FATORES ACELERADORES, MANTENEDORES
CONSAGRAÇÃO DE YOSHIAKI NAKANO
E
SANCIONADORES
DA
INFLAÇÃO:
O ano de 1984 marcou a carreira de Nakano com a publicação de Fatores aceleradores,
mantenedores e sancionadores da inflação, pois colocou-o nos holofotes da cena econômica nacional,
no qual se observavam as inúmeras medidas tomada pelo Estado, a fim de debelar o ímpeto
inflacionário que interferia no cotidiano dos agentes econômicos brasileiros.
No entanto, é necessário ressaltar que Nakano já havia escrito outras obras, que possuíam menor
notoriedade, mas não necessariamente eram de reduzida qualidade, muito pelo contrário. No artigo
Destruição da renda da terra e da taxa de lucro na agricultura, o economista expunha o problema em
2 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | torno da produção agrícola vinda de organizações familiares em contraste com a produção oriunda de
estruturas baseadas no trabalho assalariado. Ele colocava em evidência na obra os aspectos de cada
meio de produção agrícola, ao colocar como parâmetros a realidade norte-americana.
Este artigo demonstra que Nakano não se dedicou tão somente ao estudo da inflação, revelando
que na realidade se interessou sobre outros aspectos da vida econômica, como a agricultura e a estrutura
produtiva. Esta afirmação sobre a natureza acadêmica do economista nipo-brasileiro deriva da eclética e
flexível formação que ele recebeu da Cornell University. A título de curiosidade, cabe mencionar que
Nakano estudou muito bem as obras de Karl Marx, conforme ele mesmo relatou numa entrevista:
Na minha maturidade, encontrei em Marx a conciliação do processo lógico dedutivo
com a História e uma estrutura mais geral para o enquadramento e entendimento
das questões econômicas. Mas sempre fui crítico em relação às suas formulações
teóricas e, portanto, muito distante dos marxistas fundamentalistas. Alguns escritos
de Marx, como os capítulos históricos de O Capital, particularmente aquele sobre a
indústria capitalista, são para mim exemplos supremos do gênio analítico da
humanidade (MANTEGA, REGO, 1999, p.254).
Mas, o primeiro escrito de Nakano que abordava a inflação brasileira da década de 1980 veio com
o artigo Recessão e Inflação (1982), o qual já delineava a base da argumentação para a sua obra mais
importante. Neste trabalho, ele indicava o mecanismo da formação dos preços para explicar a alta
inflação da época, mostrando que medidas de contração monetária, a fim de reduzir a demanda, não
possuíam eficácia no controle inflacionário, tendo somente efeito passageiro.
De acordo com ele, a estrutura oligopolista do mercado em uma economia fechada fazia com que
a oferta tivesse significância na determinação dos preços, o que explicava o porquê de haver nos
períodos de recessão, a elevação dos índices de inflação (NAKANO, 1982). Esta inflação causada pela
capacidade ociosa da indústria foi um dos elementos essenciais para explicar o fenômeno da “inflação
inercial”, o qual seria fundamental no principal trabalho dele.
É importante salientar que a experiência que Nakano teve ao trabalhar no Grupo Pão de Açúcar
foi crucial para que ele compreendesse a formação de preços naquele turbulento contexto econômico, o
que se mostrou um enorme diferencial de Nakano em relação a outros economistas que raciocinavam o
fenômeno da inflação com base em modelos teóricos. Ele próprio admitia que a passagem no Pão de
Açúcar influenciou a visão dele sobre a economia:
(...), no meu trabalho, eu tinha contato direto com o processo de formação de preços.
(...) Mas eu trabalhava no departamento econômico do Grupo Pão de Açúcar e era
responsável pela elaboração de índices de preços para deflacionar os diferentes
relatórios internos. O meu contato quase que diário com os compradores da empresa
e seus fornecedores, de um lado, e com as regras de formação de preços da
empresa de outro, davam-me uma posição privilegiada para entender a inflação sob
o ponto de vista das regras de reajuste de preços e salários e suas dessincronias
(MANTEGA, REGO, 1999, p.265).
3 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | Esta convivência de Nakano acerca da composição dos preços no mercado auxiliou-o na
construção do artigo de 1984. Mas, apesar deste trabalho marcar a carreira dele, também vale lembrar
que se destacou muito a participação de seu parceiro, o professor Luiz Carlos Bresser-Pereira, cuja
capacidade de aliar a análise econômica à perspectiva histórico-política foi decisiva, especialmente na
renovação das ideias do pensador Ignácio Rangel, que possivelmente foi um dos primeiros a perceber o
fenômeno da inflação inercial. “Minhas próprias ideias sobre a inflação brasileira tinham origem no
pensamento estruturalista latino-americano e, principalmente, em Ignácio Rangel, meu velho mestre e
amigo” (BRESSER, 2009, pág. 4).
Põe-se a seguinte ressalva quanto à teoria que explicou o fenômeno da inflação inercial, cuja
autoria não pode ser reduzida a um único indivíduo ou grupo, pois o estudo em torno dessa área foi
abordado por diversos economistas, como Mário Henrique Simosen, Pérsio Árida, e Oswaldo Sunkel
(chileno), que se torna impossível afirmar que algum estudioso foi o “pai” da inflação inercial.
O artigo de Nakano e Bresser vislumbrou uma investigação detalhada sobre o fenômeno da
inflação nas economias capitalistas contemporâneas, ao refutar os argumentos keynesianos e clássicos
para explicar a inflação que atingia principalmente o Brasil.
Inicialmente, aborda-se a visão dos neoclássicos sobre a inflação, o que consistia em
desequilíbrios na oferta e demanda (BRESSER, NAKANO, 1984), porém os autores defendem que
houve a superação deste modelo pela visão de Keynes. Essa visão levava em conta o fato de que a
inflação continuava a ser produzida por desequilíbrios no mercado, dentre os quais, pode ser citado o
excesso de moeda ou de demanda (BRESSER e NAKANO, 1984). Porém, é constatado no texto que é
preciso ir além desses modelos para compreender.
Nos últimos anos, entretanto, tornou-se evidente que, para refletir a realidade do
capitalismo oligopolista e estatal dos nossos dias, os modelos econômicos deverão
dar um passo além de Keynes e abandonar também o pressuposto da estabilidade
de preços. (...) Na realidade, só é possível compreender a inflação, que assumiu
caráter relativamente autônomo em relação ao mercado, se partimos do pressuposto
de que ela é um fenômeno estrutural das economias capitalistas contemporâneas
(BRESSER e NAKANO, 1984, p. 6).
Com isto, traçam-se os elementos para entender a inflação inercial, o que leva à exposição dos
pressupostos de que a economia é regida pelo constante conflito distributivo entre os agentes
econômicos (capitalistas, trabalhadores, Estado), os quais buscam manter em um determinado patamar
a participação no conjunto da renda nacional; além disso, eles sempre buscam uma taxa de
crescimento “razoável”, rejeitando assim, a recessão (BRESSER e NAKANO, 1984).
No artigo, os autores explicam os fatores mantenedores, aceleradores e sancionadores da
inflação, a começar pelos aceleradores. Os fatores aceleradores da inflação, de acordo com Nakano e
Bresser, podem ser situados em dois ambientes: o de economia aberta ou fechada. Numa economia
fechada estes são os fatores: “1) o aumento dos salários médios reais acima do aumento de
produtividade e/ou 2) um aumento das margens de lucro sobre a venda das empresas” (BRESSER e
4 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | NAKANO, 1984, p. 7). Enquanto numa aberta observam-se: “3) as desvalorizações reais da moeda e 4)
o aumento do custo dos bens importados. Se considerarmos no modelo o Estado, temos mais um fator
acelerador da inflação: 5) o aumento dos impostos” (BRESSER e NAKANO, 1984, p. 8).
O que fica claro que, na situação, a inflação deriva de um conflito distributivo entre os agentes
econômicos, e acrescenta uma peça importante para o artigo, o qual era a estrutura produtiva concentrada:
O aumento estritamente autônomo (independente do excesso de demanda sobre a
oferta) da margem de lucro só será possível na medida em que a empresa disponha
de poder de monopólio. (...) Para manter a taxa de lucro (lucro sobre o capital), as
empresas do setor oligopolista tenderão a aumentar suas margens de lucro nos
períodos de recessão. Dessa forma, a queda nas vendas é compensada pelo
aumento da margem, buscando-se manter o volume de lucro e a taxa de lucro
(BRESSER e NAKANO, 1984, p. 9).
Em seguida, explica-se no que se constituíam os fatores mantenedores da inflação, o que se
resumia ao já comentado conflito distributivo entre os agentes da economia, os quais disputavam a
manutenção de seus respectivos níveis de renda.
Fator mantenedor do patamar da inflação por excelência é o conflito distributivo, ou
seja, o fato de que as diversas empresas e sindicatos dispõem de instrumentos
econômicos e políticos para manter sua participação relativa na renda (BRESSER e
NAKANO, 1984, p. 9).
Os autores frisam que este determinado fator adquiria mais eficiência, conforme o nível de
concentração da produção econômica, isto é, maior será a efetividade da manutenção da inflação se o
setor for oligopolizado (BRESSER e NAKANO, 1984). E ainda esclarecem que tal fator não deveria ser
confundido pela ótica do primeiro. “É preciso ficar claro que esse processo de indexação formal e
informal não acelera, mas mantém o patamar da inflação, a medida que, simplesmente, mantém as
margens de lucro e os salários reais” (BRESSER e NAKANO, 1984, p. 10).
Outra questão descrita por Nakano e Bresser é o sancionador da inflação, que se referia ao
aumento da quantidade de moeda. A linha de raciocínio do fator sancionador residia na função da
moeda ser relegada a uma variável explicada, e não uma variável explicativa do processo inflacionário,
conforme é narrado pelos dois economistas neste trecho:
(...) dada a elevação constante dos preços, a quantidade real de moeda tende a
diminuir dado que m (margem de lucro) = M (quantidade de moeda)/ P (nível de
preços). Ora, a diminuição da quantidade real de moeda provocará uma crise de
liquidez e seguida a recessão. Aceito o pressuposto de que os agentes econômicos
têm como objetivo manter a taxa de crescimento da economia, não restará outra
alternativa senão aumentar a quantidade nominal de moeda e de restabelecer a
quantidade real (BRESSER e NAKANO, 1984, p. 13).
5 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | E em relação ao déficit público, argumenta-se que ele também assume o papel de fator
sancionador da inflação, de forma que respalda o aumento de moeda vigente na economia (BRESSER
e NAKANO, 1984).
Após comentar sobre os fatores que influenciam a inflação, o artigo de Nakano e Bresser
praticamente cumpre o seu propósito, que é explicar o fenômeno da inflação inercial. Mas o restante do
texto destina-se à discussão sobre os modelos monetaristas e keynesianos de inflação, tendo como
foco a curva de Phillips.
3. PLANO COLLOR: CONSIDERAÇÕES DE NAKANO SOBRE A POLÍTICA ANTIINFLACIONÁRIA
Yoshiaki Nakano, em seu trabalho intitulado As fragilidade do Plano Collor de estabilização
defende sua ideia teórica inicial, na década de 80, de que a oligopolização da indústria e o conflito
distributivo dificultam as políticas anti-inflacionárias. E delineia uma reflexão sobre as medidas de
combate à inflação inercial implantadas no governo Collor, com base nas experiências passadas
observadas pelo economista. Para tanto, ressalta que os meios de pagamento M1 (que consideram
moeda em poder do público e depósitos à vista) na década de 70 correspondiam a 20% do PIB,
passando para 2% antes do Plano Collor, porque a população, temerosa em perder seu poder de
compra, gastava imediatamente o salário recebido.
À medida que isto ocorria, em paralelo, a liquidez dos títulos públicos aumentava, por ser a
principal forma de financiamento da dívida pública, passando a ser vendido diariamente, este efeito
dificultava o dimensionamento dos meios de pagamento utilizados, pois o título transformou-se numa
moeda indexada e remunerada (NAKANO, 1991).
O autor critica a falta de mudanças institucionais para o controle da política monetária pelo
BACEN. Além disso, a política fiscal ineficiente minava a possibilidade de o Banco Central ter em mãos
um título público confiável e com prazos maiores para o controle da liquidez. O plano utilizou-se de
instrumento secundário e auxiliar, sendo esse, o congelamento de preços e salários, conforme
observado por Nakano, após o congelamento, houve uma forte expansão da demanda.
Esta forte contenção da liquidez, no entanto, realizada pelo plano Collor, retirou boa parte do
capital de giro necessário das empresas, provocando uma recessão atípica, ou seja, contração do lado
da oferta. Assim quando as empresas se reestruturam para a nova demanda de mercado, os preços
foram pressionados para cima, na tentativa de recompor o lucro dos empresários, provocando novos
surtos inflacionários. No entendimento do economista, “o plano executado (...) não passa de um
monetarismo às avessas” (NAKANO, 1991, p. 152). E, portanto, deveria abordar “aspectos
fundamentais como a liberalização da economia, pacto com os trabalhadores e ajuste fiscal na
magnitude necessária (...). (NAKANO, 1991, p. 152).
Cabe aqui, justificar a proposta de Yoshiaki Nakano em liberalizar o mercado brasileiro, o
processo era considerado fundamental na redução do poder de monopólio das indústrias brasileiras,
que teriam maior dificuldade em repassar os seus custos nos preços dos produtos.
6 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | Desta forma:
a liberalização comercial deveria ser ponto de partida, para, em seguida,
caminharmos para a liberdade cambial e, na medida em que o Plano Collor inverteu
o processo, adotou uma estratégia de fragilidade na sustentação da estabilidade de
preços e aumentou o risco de um colapso cambial” (NAKANO, 1991, p. 151).
4. REFLEXÕES DE YOSHIAKI NAKANO SOBRE A GLOBALIZAÇÃO
Anos mais tarde, o economista escreve o artigo Globalização, competitividade e novas regras de
comércio mundial de 1994, no qual apresenta a nova ordem mundial, baseada na revolução
tecnológica/organizacional e na globalização.
Nakano observa o processo de abertura comercial, em que o Brasil se inseriu a partir da década
de 90, como um fator desafiante para o país, por estar frente a grandes transformações.
Nesse sentido, “as fronteiras nacionais e o Estado-Nação perdem sua importância econômica e os
conceitos de soberania nacional são redefinidos.” (NAKANO, 1994, p. 8), o que na opinião do
economista, não significa abrir mão do interesse nacional e sim formular estratégias de
desenvolvimento, função destinada ao governo.
A combinação da microeletrônica desenvolvida nos EUA e o modo de produção flexível do Japão
remodelaram os modos de produção, tornando a comunicação mais ágil, facilitando as alianças entre
empresas, que buscam se especializar nas atividades em que são eficientes, já que a aumento do
mercado em escala global acirrou a competição. Ou seja,
(...) essa nova configuração em escala mundial gera ganhos significativos para as
empresas, dando origem a uma nova vantagem competitiva de globalização. Nessa
estratégia global, as empresas transnacionais aproveitam tanto as vantagens
comparativas específicas de cada país como as vantagens competitivas específicas
das empresas utilizando as novas tecnologias de informação e coordenação.
(NAKANO, 1994, p. 14)
Este novo paradigma torna defasado o conceito tradicional de que os fatores de produção são os
determinantes nas trocas internacionais, o que conduz a uma nova teoria de comércio chamada de
teoria estratégica de comércio, pois este é resultado da rivalidade de empresas e governos. (NAKANO,
1994). Deste modo, o governo subsidia sua indústria nacional ou impõe barreiras a produtos
importados, protegendo-a.
Essas mudanças também partem na organização do comércio mundial,
a gestão de interdependência e dos conflitos de comércio toma a forma
de acordos preferenciais, com a consequente formação de blocos
regionais de comércio e de comércio administrado. (...) através de
negociações e cooperação entre as nações. (NAKANO, 1994, p. 8)
7 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | 5. TRABALHOS ATUAIS
Atualmente, Yoshiaki Nakano escreve artigos para jornais renomados do país, sendo os
principais, a Folha de São Paulo e o Valor Econômico.
Num destes escritos, o economista abordou a grande repercussão que a inflação, em 2008, derivada
da alta dos preços de alimentos, estava provocando na economia brasileira. De acordo com Nakano:
o governo brasileiro é um dos grandes responsáveis pela atual crise mundial de
escassez de alimentos. Não por causa dos programas de álcool e biodiesel, mas por
sua inação e total descaso com o setor agropecuário (NAKANO, 2008).
Dois fatores agravaram ainda mais a situação da agropecuária, na visão do diretor da Escola de
Economia da FGV: a elevada taxa de juros e a apreciação da taxa de câmbio, o setor depende de
crédito que se torna mais caro e por ser exportador, a renda está diretamente ligada ao câmbio.
Ainda, fez suas considerações sobre a Crise Mundial financeira iniciada no segmento subprime.
Numa delas, mais precisamente em outubro do ano passado, em 2009, Nakano alerta para a
possibilidade de novas crises financeiras, que tem na taxa de juros de curto prazo baixa e no excesso
de liquidez, as principais causas, situação verificada por ele no início da recuperação da economia
mundial (NAKANO, 2009).
CONCLUSÃO
Yoshiaki Nakano, durante sua trajetória acadêmica, estudou, de forma abrangente e sistemática, o
processo da inflação brasileira. Conseguiu observar e descrever a formação de preços, identificando a
inflação administrada que se baseia na transferência do aumento dos custos para os preços de
mercado. Posteriormente ampliou essa visão junto com Bresser-Pereira, na sua obra mais importante
Fatores aceleradores, mantenedores e sancionadores da inflação.
O economista continua se dedicando ao assunto que o tornou reconhecido nacionalmente,
publicando suas opiniões e análises sobre a economia. Seus artigos científicos são de fundamental
importância para quem quer aprender e entender a inflação do país, pois representam verdadeiros
marcos da história econômica brasileira recente.
8 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | REFERÊNCIAS
BRESSER-Pereira, Luiz Carlos. A descoberta da inflação inercial. Escola de Economia de São Paulo,
Fundação Getúlio Vargas, 2009.
Disponível em: <http://www.bresserpereira.org.br/papers/2009/09.01.Descoberta_Inflacao_Inercial.pdf>,
acesso em 18 nov. 2009.
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; NAKANO, Yoshiaki. Fatores aceleradores, mantenedores e
sancionadores da inflação. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 4, n.1, jan./mar. 1984.
MANTEGA, Guido. REGO, José Márcio. Singer, Paul Israel. Conversas com economistas II. 1ª ed.
SP: Editora 34, 1999.
NAKANO, Yoshiaki. As causas da inflação de preços dos alimentos. Conjuntura econômica, maio de
2008. disponível em <http://www.eesp.fgv.br/_upload/publicacao/488f55a7cc65b.pdf> acesso em: 17
nov. 2009.
________, Yoshiaki. As fragilidades do plano Collor de estabilização. In Faro, Clóvis de. Plano Collor:
avaliações e perspectivas. Rio de Janeiro: LTC, 1990.
________, Yoshiaki. Globalização, competitividade e novas regras de comércio mundial. Revista de
Economia Política. São Paulo, v. 14, n. 4, out./dez. 1994.
________, Yoshiaki. Inflação e Recessão. Revista de economia política, São Paulo, v. 2/2, n.6,
abr./jun. 1982.
________, Yoshiaki. Novas crises financeiras à vista. Folha de São Paulo. São Paulo, 4 out. 2009, p.
B2, 2009.
9 Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 1, março 2010 | 
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