Tatiane Baggio Psicóloga Conselheira do CRPRS, membro dos GTs Nacional e Regional de Laicidade. Em sua opinião, o que é laicidade? Importante pensarmos o que de fato significa a Laicidade, pois constantemente ouvimos argumentos fundamentalistas alegando que defensores da laicidade do Estado, associados à defesa dos direitos humanos, estariam propondo que o Estado estaria vetado a reconhecer quaisquer religiões, se consolidando como um Estado ateu. A Laicidade não possui uma postura ateísta, porém não se opõe a esta postura, ou seja, efetivamente é a favor da liberdade de crença e de consciência que prevê nossa legislação, respeitando a pluralidade que existe em nosso país e no mundo. Ela se opõe aos discursos fundamentalistas ligados às violações de direito, defendendo que as leis devam se orientar pelos Direitos Humanos Universais e a Constituição Federal e não em dogmas e ideologias religiosas. Além disso, defende que as igrejas não tenham poder politico e administrativo nas questões do Estado. Porém, a separação do Estado e igreja não significa que o Estado negue a igreja o direito de contribuir para o bem da sociedade. Um Estado que não respeita um espaço para as Igrejas na sociedade, ou que negue o direito de expressão, acabaria com a democracia, caindo no sectarismo, no totalitarismo ideológico. A psicologia defende a Laicidade em sua prática e como norteadora das decisões políticas, bem como a liberdade religiosa na sociedade civil. Que situações ou demandas atuais a Psicologia tem discutido e que estão ligadas diretamente ao tema? Podemos citar os atuais discursos fundamentalistas contra o casamento Gay e a diversidade sexual e de gênero, a questão da legalização do aborto e Lei do Nascituro, Intolerância Religiosa e Racismo, além da discussão sobre a predominância dos discursos religiosos e imposição de práticas religiosas nas propostas de projeto terapêutico da maioria das comunidades terapêuticas. Entre outras demandas, podemos citar muitas ligadas a um discurso preconceituoso, que busca se esconder através de argumentos em defesa de valores, da vida e da família e que no fundo busca impor suas próprias ideologias contrárias às liberdades de expressão e dos direitos humanos violando as diferentes formas do indivíduo de ser no mundo. É importante citarmos as discussões sobre a Ética e prática profissional do psicólogo nas mais diferentes áreas de atuação, na Clinica Pública ou privada, a postura de neutralidade e respeito à diversidade religiosa que o psicólogo deve assumir diante da população que atende e seu compromisso em defesa destes direitos. Embora o Brasil seja um país que se declare laico, algumas religiões tentam interferir no Estado e alterar leis e políticas públicas. Como exemplo, podemos citar o Projeto da “cura gay”. Vemos, ainda, exemplos de violações de direitos vinculadas ao fundamentalismo religioso. De que forma a Psicologia pode contribuir para o fortalecimento do Estado Laico e, ao mesmo tempo, combater essas situações de violações de direito? A consideração das diferenças morais, culturais, religiosas e das práticas sociais é fundamental para a construção da democracia, sendo o Estado laico a condição para que as diferenças não sejam assoladas por projetos políticos de segregação, marginalização e desqualificação. O incentivo às lutas de diferentes sujeitos e grupos sociais é fundamental para a construção de marcos legal e políticas públicas a eles diretamente relacionados, sendo mulheres, população negra, usuários de drogas, grupos religiosos, LGBT e outros atores sociais escutados em suas próprias crenças e reivindicações por direitos humanos e sociais. Para isso, é preciso buscar o diálogo entre a psicologia e outras categorias profissionais, somar-se às parcerias com grupos sociais, falar sobre esses temas junto à sociedade, discutir essas demandas às quais temos que constantemente nos posicionar enquanto profissionais defensores dos Direitos Humanos, reafirmando a laicidade da ciência Psicológica. Incentivar pesquisas, parcerias com a sociedade civil e instituições para se construir propostas de intervenções e posicionamentos coletivos referentes à Laicidade, Ética e Direitos Humanos. A presença da psicologia nos espaços de construção coletiva, como as representações no Controle Social, Conferências de Saúde, Assistência Social, Educação, Segurança, entre outras, marcando nossos posicionamentos em defesa da Laicidade que deve estar presente nas construções dos projetos de lei, também são formas de fortalecermos a defesa do Estado Laico. Além disso, o VIII CNP teve como uma das propostas o diálogo na interface da Psicologia com a religião, a espiritualidade e os saberes tradicionais, posicionando-se criticamente em relação ao fundamentalismo religioso ou moral, garantindo o exercício da psicologia baseado em seus princípios éticos, técnicos e científicos. Portanto, o psicólogo precisa repensar constantemente a sua prática a fim de não reproduzir os discursos ideológicos emergentes vinculados ao fundamentalismo e preconceito.