DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS DO SONO Tema em destaque AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO DA APNÉIA DO SONO NA CRIANÇA CAMPANHA RESPIRE SÃO PAULO 2 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 DIRETORIA - BIÊNIO 2008/2009 DIRETORIA Presidente: José Eduardo Delfini Cançado Vice-Presidente: Jaquelina Sonoe Ota Arakaki Secretária Geral: Regina Maria de Carvalho Pinto 1º Secretário: Ricardo Millinavicius 2ª Secretária: Valéria Cristina Vigar Martins Diretor de Finanças: Oliver Augusto Nascimento Diretor de Assuntos Científicos: Gustavo F. Prado Diretor de Divulgação: Paulo Manuel Pêgo Fernandes Diretor Informática: Eduardo Henrique Genofre COMISSÕES Assuntos do Interior: Alex Gonçalves Macedo Defesa Profissional: Eduardo Henrique Genofre Ensino: Mônica Corso Pereira Promoções: Nephtali Segal Grinbaum Assuntos da Grande São Paulo: Sidney Bombarda DEPARTAMENTOS Cirurgia Torácica: Roberto Saad Júnior; João Aléssio Juliano Perfeito; Rodrigo Caetano de Souza Endoscopia Respiratória: Viviane Rossi Figueiredo; Miguel Lia Tedde; Nilza Sayuri Abe Pediatria: Maria Helena Bussamra; Marina Buarque de Almeida Ana Clara Toschi Gianotti de Souza Fisioterapia Respiratória: Lara Maris Nápolis; Priscila Batista de Souza Marisa Afonso A. Brunherotti Conselho Fiscal - Efetivos: Ana Luisa Godoy Fernandes; Alberto Cukier; Carlos Alberto de Castro Pereira Suplentes: Rafael Stelmach; Roberto Stirbulov; Mário Terra Filho Conselho Deliberativo Fernando Augusto Fiuza de Melo; Francisco Vargas Suso Jorge Nakatani; José Antônio Baddini Martinez; Manuel Lopes dos Santos; Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano Miguel Bogossian; Nelson Morrone; Ricardo Beyruti; Sonia Maria Faresin; Virgílio Alexandre Nunes de Aguiar REGIONAIS Regional do ABC Presidente: Marcelo Gervilla Gregório Secretario: Márcio Abreu Neis Regional de Araraquara / Bauru / Botucatu Presidente: Eduardo Ferraz Hage Secretario: José Eduardo Bergami Antunes Regional de Campinas Presidente: Ricardo Kalaf Mussi Secretária: Ana Maria Camino Regional de Marilia Presidente: Virgínia Maria Cavallari Strozze Catharin Secretaria: Gisele César de Rossi Agostinho Regional de Ribeirão Preto Presidente: Ana Carla Souza de Araujo Secretaria: Hugo Alejandro Veja Ortega Regional de São José dos Campos Presidente: Douglas Carlyle Belculfiné Secretaria: Maria Helena Magalhães Rezende Regional de São José do Rio Preto Presidente: Benedito Aparecido Caiel Secretaria: Elaine Mara Cesaretti de Paula PNEUMOLOGIA PAULISTA Órgão Informativo da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia Editor Responsável: Jaquelina Sonoe Ota Arakaki Editoração Eletrônica: Miriam Miranda Impressão: Gráfica Riopedrense • Tiragem: 1500 exemplares Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 SUMÁRIO 4 EDITORIAL 6 TEMAS EM DESTAQUE • Avaliação e diagnóstico da Apnéia do Sono na criança • Nasolaringoscopia como método auxiliar no diagnóstico da SAOS • Complicações cardiovasculares da SAOS • Avaliação e riscos peri-operatórios da Apnéia Obstrutiva do Sono no obeso 25 RESUMINDO ERECORDANDO • Distúrbios respiratórios do sono - classificação e diagnóstico • DPOC e distúrbios respiratórios do sono • Polissonografia - considerações técnicas, registros, estudos completos e simplificados 44 RELATO DE CASO Hipoventilação com múltiplas causas 48 IMAGEM EM PNEUMOLOGIA Avaliação por métodos de imagem da SAOS 52 EPIDEMIOLOGIA CLÍNICA Bases da estatística – estatística descritiva 55 CONTROVÉRSIA Análise crítica do tratamento cirúrgico da apnéia do sono 59 FUTURO DA PNEUMOLOGIA Distúrbios respiratórios do sono - tratamento clínico 62 OPINIÕES E AÇÕES Departamento de Fisioterapia 64 NOTÍCIAS 68 HISTÓRIA DA PNEUMOLOGIA De Fat Boy Joe à Leptina: Uma aventura digna do Sr. Pickwick NOSSA CAPA A Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo completa 96 anos em 2008. As Disciplinas de Pneumologia e Cirurgia Torácica, bem mais novas, atingiram a maioridade científica e estão em franca ascensão. As atividades de assistência, ensino e pesquisa são desenvolvidas nas enfermarias, ambulatórios, centros cirúrgicos, unidades de tratamento intensivo e laboratórios experimentais na faculdade e no complexo hospitalar. Os 50 médicos assistentes, 20 residentes, 3 preceptores e 30 pós-graduandos são responsáveis por 2.000 atendimentos ambulatoriais e 100 cirurgias por mês. Resultado da integração entre a Pneumologia e a Cirurgia Torácica, os programas de transplante pulmonar e de tromboembolismo pulmonar crônico são líderes no Estado e no país. A produção científica, alavancada pela descentralização dos assistentes em subgrupos, tem registrado um crescimento exponencial nos últimos anos em diversas áreas das especialidades, tendo sido traduzida em 50 artigos publicados em revistas de indexação internacional no ano de 2007. Prof.Dr. Francisco Vargas Professor titular da Universidade de São Paulo 3 PALAVRA DO PRESIDENTE SPPT EM AÇÕES Prezados sócios da SPPT, Os Distúrbios Respiratórios do Sono têm alta prevalência e continuam sendo um desafio na prática diária dos pneumologistas. Nessa edição optamos por focar esse tema, fazendo uma revisão do seu diagnóstico, repercussões clínicas, interação com outras doenças e tratamento. Nos meses de junho e julho, em comemoração a “1ª Semana Estadual de Educação e Conscientização sobre as Doenças Respiratórias” e ao “Dia do Pneumologista”, O2 de junho, a SPPT realizou a maior Campanha de divulgação já feita de nossa especialidade, a Campanha “Respire São Paulo”. Uma equipe de médicos e fisioterapeutas da SPPT, em praças públicas, nas cidades de Ribeirão Preto, Santos, São José do Rio Preto, São Paulo, Sorocaba, Campinas e Piracicaba prestaram atendimento à população aplicando questionário de sintomas respiratórios (GOLD), realizando Espirometrias, distribuindo materiais educativos sobre as principais doenças respiratórias (DPOC, asma, pneumonia, tabagismo e tuberculose), além de expor vídeo educativo sobre qualidade de vida e orientar a população. Em todas as praças houve grande cobertura da mídia, e vários colegas pneumologistas sócios da SPPT deram entrevistas nas redes de TV, rádios e jornais, divulgando a Campanha e a importância de realizar avaliação respiratória regularmente. Veja a matéria completa e os resultados da Campanha “Respire São Paulo” nessa edição. Além da Campanha, nesse mesmo período, as Regionais do ABC, Araraquara/Bauru/Botucatu e São José dos Campos também realizaram atividades para atualização médica, divulgação e orientação à população sobre doenças respiratórias. 4 Dando continuidade a programação científica de 2008, a SPPT realizou nos meses de junho e agosto, Jornada de Educação Continuada, nas Regionais de Campinas, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e Araraquara/Bauru/Botucatu. Em todos os eventos houve participação de colegas pneumologistas, cirurgiões torácicos, alunos de medicina e fisioterapeutas, além de uma ampla divulgação da nossa especialidade, nas mídias locais. Também realizamos, em 16 de agosto, em São Paulo, a Jornada de Cuidados Perioperatórios, na qual de maneira interativa, foram discutidos cinco casos cirúrgicos que fazem parte do nosso dia a dia. Além da platéia presente participaram como debatedores convidados cirurgiões, pneumologistas, cardiologistas e fisioterapeutas e, o foco principal das discussões foi a avaliação multidisciplinar do paciente pneumológico. O evento foi de excelente qualidade científica e um grande sucesso, pois, os colegas presentes puderam se atualizar em conceitos teóricos e condutas práticas aplicáveis à maioria de seus pacientes candidatos a procedimentos cirúrgicos. Nossa próxima Jornada na capital já está marcada para o dia 8 de novembro e será a “Jornada Jorge Kavakama”, em parceria com a Sociedade Paulista de Radiologia. As vagas serão limitadas e divididas entre as duas Sociedades. Não deixe para a última hora, faça sua inscrição antecipadamente. Um grande abraço e boa leitura, José Eduardo Delfini Cançado Presidente da SPPT [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 EDITORIAL APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO: UM GRAVE PROBLEMA DE SAÚDE PUBLICA Alguns aspectos chamam a atenção quando abordamos o tema apnéia obstrutiva do sono (AOS). A AOS só foi reconhecida há apenas 33 anos1, e só na última década de fato ganhou um reconhecimento maior em nosso meio. Uma dificuldade é derivada do fato de que a AOS era totalmente desconhecida durante a formação médica de uma significativa parcela dos pneumologistas. Ainda hoje, a quantidade de horas que as escolas médicas dedicam a ensinar medicina do sono é nula ou quase nula. Felizmente o quadro tem se modificado rapidamente. Hoje sabemos que a AOS é um grave problema de saúde pública. A prevalência da AOS na população geral chama a atenção. No estudo mais citado na literatura, que investigou uma população de indivíduos de meia idade em Wisconsin (EUA), encontrouse uma prevalência de AOS de 4% nos homens e 2% nas mulheres 2. Esses números são baseados numa definição que considera uma polissonografia com índice de apnéiahipopnéia (IAH) > 5 eventos por hora de sono associado a presença de sonolência excessiva diurna. No entanto, sabemos hoje que uma grande parcela dos pacientes com AOS não se queixam de sonolência excessiva. A prevalência de AOS, se for baseada somente nos dados de polissonografia alterada (IAH > 5), salta para 24% nos homens e 9% nas mulheres2. Mesmo considerando um ponto de corte restritivo, considerando-se somente os com IAH > 15 eventos por hora de sono, a prevalência de AOS permanece de 9% nos homens e 4% nas mulheres2. Em algumas populações específicas, o problema pode ser ainda mais dramático. Em um estudo que aplicou questionário Moreno e colaboradores encontrou alto risco de AOS em cerca de 26% dos motoristas de caminhão, sendo que a maioria admitiu que já tinha dormido na direção3. Não é difícil imaginar as conseqüências desastrosas da AOS nessa população. Atualmente está bem estabelecido que a AOS não só causa sonolência excessiva, queda de produtividade, diminuição de concentração e memória, queda da qualidade de vida, risco aumentado de depressão, mas também gera graves conseqüências para o sistema cardiovascular. A AOS está associada com aumento do risco do desenvolvimento de hipertensão arterial sistêmica, acidente vascular cerebral, infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíaca4,5. Num estudo espanhol de acompanhamento de 10 anos de pacientes encaminhados para polissonografia, foi demonstrado um aumento da mortalidade por causa Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 cardiovascular dos pacientes com AOS grave6. Esse risco foi diminuído significativamente em pacientes adequadamente tratados com pressão positiva contínua (CPAP). Apesar do grave problema, a maior parte dos pacientes com AOS segue não diagnosticada. O reconhecimento dos pacientes nem sempre é simples, e necessita de uma busca pró ativa dos médicos. O ronco alto, um dos sinais cardinais da AOS, é frequentemente ignorado ou não relatado pelo paciente. Da mesma forma, a sonolência excessiva diurna nem sempre é reconhecida ou relatada pelos pacientes. A idéia de que a AOS só afeta os pacientes extremamente obesos, também é falsa. A única solução, é a busca pró ativa e manter a suspeita clínica de distúrbio do sono em todos os pacientes, independente do motivo inicial da consulta. Os pneumologistas devem assumir um papel pró ativo no diagnóstico e tratamento dos pacientes com AOS. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. Guilleminault C, Tilkian A, Dement WC. The sleep apnea syndromes.Annu Rev Med 1976;27:465–484. Young T, Palta M, Dempsey J, Skatrud J, Weber S, Badr S. The occurrence of sleep-disordered breathing among middleaged adults. N Engl J Med 1993;328:1230–1235. Moreno CR, Carvalho FA, Lorenzi C, Matuzaki LS, Prezotti S, Bighetti P, Louzada FM, Lorenzi-Filho G. High risk for obstructive sleep apnea in truck drivers estimated by the Berlin questionnaire: prevalence and associated factors. Chronobiol Int. 2004;21(6):871-9. Peppard PE, Young T, Palta M, Skatrud J. Prospective study of the association between sleep-disordered breathing and hypertension. N Engl J Med. 2000;342(19):1378-84. Gozal D, Kheirandish-Gozal L. Cardiovascular morbidity in obstructive sleep apnea: oxidative stress, inflammation, and much more. Am J Respir Crit Care Med. 2008 Feb 15;177(4):369-75. Marin JM, Carrizo SJ, Vicente E, Agusti AG. Long-term cardiovascular outcomes in men with obstructive sleep apnoea-hypopnoea with or without treatment with continuous positive airway pressure: an observational study. Lancet. 2005;365(9464):1046-53. Geraldo Lorenzi Filho Lab. do Sono, Instituto do Coração, Disciplina de Pneumologia, HC-FMUSP [email protected] 5 TEMAS EM DESTAQUE AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO DA APNÉIA DO SONO NA CRIANÇA Autor: Gustavo Antonio Moreira Serviço: Disciplina de Medicina e Biologia do Sono, Departamento de Psicobiologia, UNIFESP A síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) é uma entidade freqüente que pode comprometer crianças de qualquer idade e leva as conseqüências importantes, como problemas escolares, alterações comportamentais e complicações cardiovasculares. 1-3 A SAOS apresenta diagnóstico difícil, pois necessita alto grau de suspeita, interrogando-se sobre sinais e sintomas noturnos, o que raramente é perguntado pelo profissional de saúde. O diagnóstico da SAOS baseado somente em dados clínicos tem baixa sensibilidade e especificidade, sendo necessário a polissonografia para a sua confirmação.1,4 Diferentemente da SAOS em adultos, a SAOS em crianças e adolescentes tem epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico e tratamento distintos.2 A Academia Americana de Pediatria recomenda o diagnóstico e tratamento precoce da SAOS em crianças, pois o atraso na pode levar a seqüelas cognitivas permanentes.1 DEFINIÇÃO Os distúrbios respiratórios do sono incluem diversas alterações como apnéia central, apnéia da prematuridade, hipoventilação e distúrbios de hipoventilação obstrutiva. Os distúrbios obstrutivos durante o sono variam desde uma situação benigna, como o ronco primário, passando pela síndrome da resistência de vias aéreas superiores (UARS) associada à fragmentação do sono e sonolência excessiva diurna; até a manifestação mais intensa desde distúrbios que é a síndrome apnéia obstrutiva do sono.2 A síndrome da apnéia obstrutiva do sono é definida como obstrução parcial ou completa das vias aéreas superiores associado à fragmentação do sono, hipoxemia e/ou hipercapnia, levando a sintomas diurnos. EPIDEMIOLOGIA Estudos populacionais variam muito quando a definição e coleta de dados. Uma revisão de literatura recente relatou que a prevalência de ronco habitual, ou seja, ronco por 4 ou mais noites na semana varia de 5% a 12%.5 Relato de apnéias durante o sono varia de 0,2% a 4%. O diagnóstico da SAOS, combinando questionário e exames diagnósticos, apresenta prevalência de 1% a 4%.5 A SAOS é mais freqüente nos 6 meninos, nas crianças com sobrepeso e nas crianças de ascendência africana.6 Apesar de vários autores sugerirem maior prevalência da SAOS entre 3 e 6 anos, idade onde há o maior crescimento adenotonsilar, atualmente não há dados suficientes que apontem diferenças de prevalência quanto à idade.5 CONSEQÜÊNCIAS Se não for tratada, a SAOS pode evoluir para morbidade significante que afeta diversos órgãos e sistemas, e algumas seqüelas podem ser permanentes com tratamento tardio. As conseqüências da SAOS em crianças são distúrbios comportamentais7-9, déficit do aprendizado9-12, hipertensão pulmonar13 e prejuízo do crescimento somático2-3. No entanto, se for tratada rapidamente no início dos sintomas, a SAOS pode não levar a efeitos adversos nas funções neurocognitivos e cardiovasculares, oferecendo um argumento forte para diagnóstico e tratamento precoces.1 Apesar de adultos com SAOS terem maior risco de morbimortalidade cardiovascular, só recentemente sabe-se que crianças com SAOS apresentam elevação da pressão arterial noturna, hipertensão arterial sistêmica diurna, mudanças da geometria e função ventricular esquerda14, assim como, alterações endoteliais.10 Além disso, crianças com SAOS apresentam ativação mantida do sistema nervoso simpático, inflamação sistêmica e alteração no metabolismo da glicose e dos lipídeos, levando ao início e propagação de processos de aterogênese.10 Diversos relatos descrevem a associação de SAOS com hiperatividade, falta de atenção, agressividade e comportamento opositor.7-8 Uma revisão de literatura recente relatou que há fortes evidências que a SAOS em crianças está associada com prejuizos na atenção, no comportamento, na regulação de emoções, no desempenho acadêmico e no estado de alerta.8 Também há evidências que a SAOS tem algum efeito no humor, habilidades de expressão lingüísticas, percepção visual e memória. Os mecanismos que levam a essas alterações parecem estar relacionados à interação de hipóxia intermitente, hipercapnia, despertares freqüentes e variações nas pressões intratorácicas. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Estudos experimentais em ratos mostraram que a hipóxia intermitente leva a alteração na memória espacial, hiperatividade e apoptose neuronal na região CA1 do córtex pre-frontal.15 Ainda, o impacto da hipóxia intermitente em diferentes idades, mostrou lesões mais intensas em ratos com idade de 10 a 30 dias de vida, correspondente ao período préescolar de seres humanos.16 Em crianças com doenças que levam a hipóxia crônica, como SAOS, cardiopatia congênita ou doença pulmonar crônica, também foi demonstrado alterações comportamentais e déficits neurocognitivos.17 Esses dados sustentam o argumento para diagnóstico e tratamento precoces da SAOS em crianças. Classe I Classe II Classe III Classe IV Fig. 1 – Mallampatti modificado QUADRO CLÍNICO Os sintomas noturnos incluem uma combinação de ronco, desconforto respiratório, apnéia, agitação, posições bizarras, palidez, cianose, ronco ressuscitativo, sudorese profusa, despertares freqüentes, movimento paradoxal de caixa torácica e enurese.18-21 A sonolência excessiva diurna, a principal queixa de adultos com SAOS, é observada com menor freqüência em crianças. A sonolência excessiva diurna subjetiva (questionário) é relatada em 30% das crianças, enquanto que a objetiva (teste de múltiplas latências do sono) é de 15%. 2-3 Em crianças com SAOS encontra-se comportamento hiperativo, agressividade, falta de atenção e mau desempenho escolar.7-8 Estão também presentes sintomas relacionados aos fatores de risco, como respiração bucal, voz anasalada, obstrução e prurido nasal, otites ou amigdalites de repetição, mas esses não são específicos da SAOS (Quadro 1). Visitas freqüentes ao pediatra devido a sintomas respiratórios são descritas, e se resolvem após adenotonsilectomia. Quadro 1. Principais sinais e sintomas Noturnos Diurnos Ronco habitual (>4 noites/sem) Hiperatividade Paradas respiratórias testemunhadas Falta de Atenção Desconforto respiratório Agressividade Agitação Sonolência excessiva Sudorese profusa Problemas de aprendizado Cianose / palidez Respiração bucal No exame físico deve-se avaliar a presença de desnutrição ou obesidade, através de medidas antropométricas (peso e estatura) e cálculo do estado nutricional com escalas de peso, estatura, e índice de massa corpórea adequados para idade e sexo. No segmento cefálico procura-se observar a presença de obstrução nasal, hipertrofia de cornetos, fácies alongada ou fácies típica de síndrome genética, hipoplasia mandibular ou maxilar, palato ogival, palato mole alongado, abertura de orofaringe pelo escore de Mallampati (Figura 1) e tamanho de tonsilas palatinas (Figura 2). Vários estudos demonstraram que o tamanho de tonsilas palatinas não tem relação com a presença de SAOS. Acredita-se que a SAOS em crianças seja provocada por uma combinação de hipertrofia adenotonsilar e alteração do tônus muscular de via aérea. Portanto, o Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Fig. 2 – Brodsky aumento das tonsilas e da adenóide não necessariamente indica a presença de SAOS. Por contraponto, amígdalas diminutas (+ ou ++) não excluem a SAOS, principalmente se houver via aérea superior estreita e alteração do tônus muscular da faringe. A presença de 2ª bulha hiperfonética em focos da base ou sopro sistólico em foco tricúspide sugerem hipertensão pulmonar. A presença de deformidade torácica tipo pectus escavatum sugere aumento do esforço respiratório de longa duração. Os principais fatores de risco são hipertrofia adenotonsilar, malformações craniofaciais, síndromes genéticas22, obesidade, prematuridade e doenças neuromusculares. 1-3 Qualquer doença que obstrua a luz das vias aéreas superiores ou reduza o tônus da musculatura da faringe são potencialmente de risco para SAOS (Quadro 2). Nas últimas décadas, com o avanço da prevalência de obesidade, têm se descrito em crianças e adolescentes um padrão clínico distinto daquele usualmente observado em pediatria.11 Esse padrão segue mais as características da SAOS em adultos, onde a hipertrofia adenotonsilar é mínima, não há alterações craniofaciais, mas observa-se obesidade, aumento da circunferência de pescoço e abdominal, sonolência 7 Quadro 2 - Fatores de Risco da Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono ANATÔMICOS FUNCIONAIS Nariz Controle neural deficiente Estenose nasal anterior Injúria de sistema nervoso central (anóxia neonatal, paralisia cerebral) Estenose / atresia de coanas Disfunção de tronco cerebral (malformação de ArnoldChiari tipo II, meningomielocele, estenose do forame magno, trauma, infecção, tumor) Desvio de septo Hipotonia Muscular Pólipo nasal Distrofia muscular de Duchenne Rinite alérgica Distrofia muscular congênita Corpo estranho Síndrome de Down Hematoma Drogas Nasofaringe ou orofaringe Narcóticos Hipertrofia de tonsilas faríngeas e adenóides Anestésicos Macroglossia (síndromes de Down, Beckwith-Wiedermann) Sedativos (hidrato de cloral, benzodiazepínicos, fenotiazinas) Micrognatia Álcool Obesidade Anti-histamínicos Higroma cístico Outros Reconstrução de fenda palatina Disfunção autonômica Tumor de faringe Privação de sono Craniofacial Tabagismo passivo Hipoplasia mesofacial (síndromes de Crouzon, Binder e Apert) Secreção oral abundante Hipoplasia mandibular (síndromes de Pierre-Robin, Treacher-Collins, Sky-Drager e Cornelia de Lange) Disfagia Acondroplasia Trauma Craniofacial Prematuridade Infiltração de tecidos moles (mucopolissacaridose) Hipotireoidismo excessiva diurna, depressão, autoconfiança reduzida, timidez, isolamento social, hipertensão arterial sistêmica, resistência à insulina, anormalidades lipídicas, proteína Creativa elevada e alteração das enzimas hepáticas (Quadro 3). FISIOPATOLOGIA Os padrões associados ao estreitamento das vias aéreas superiores durante o sono são muito variáveis, incluindo obstrução cíclica, aumento do esforço respiratório, limitação de fluxo aéreo, taquipnéia e alteração das trocas gasosas.23 Como conseqüência, há uma perturbação da homeostase do sono. O aumento da resistência de vias aéreas é um componente essencial da SAOS, incluindo qualquer combinação de estreitamento ou retroposição da maxila ou mandíbula, e aumento do tecido adenotonsilar. No entanto, além dos fatores anatômicos, a instabilidade das vias aéreas superiores é dependente da ativação neuromuscular24, do controle ventilatório e do limiar de despertar.25-26 Durante o sono, a maioria das crianças com SAOS mantém um padrão respiratório estável, indicando sucesso da ativação neuromuscular. No início do sono há uma redução da ativação 8 Quadro 3 – Sintomas e Laboratório dos tipos clínicos 1 e 2 Sintoma / Laboratório Tipo 1 Tipo 2 Sonolência excessiva diurna + ++++ Ganho de peso - ++ Hiperatividade ++++ - ou + Falta de atenção ++++ +++ Obesidade visceral - ou + +++ Aumento da circunferência cervical - ou + +++ Hipertrofia adenotonsilar ++++ ++ Otite média de repetição / timpanoplastia +++ + Depressão, auto-confiança reduzida + +++ Timidez, isolamento social + +++ Hipertrofia de ventrículo esquerdo ++ ++++ Hipertensão arterial sistêmica + ++++ Resistência à Insulina - ++++ Alteração dos lipídeos séricos + ++++ Elevação da proteína C reativa ++ ++++ Elevação das enzimas hepáticas - ++ - ausente, + até ++++ freqüência Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 dos músculos, a variabilidade ventilatória aumenta, e a respiração normal do sono NREM aproxima-se do limiar de apnéia obstrutiva. O colapso de vias aéreas é compensado pela atividade dos músculos dilatadores da faringe em resposta a hipercapnia e a pressão negativa intraluminal.23 Crianças com SAOS apresentam maior atividade dos músculos dilatadores de faringe em vigília e, por ter uma via aérea instável, necessitam elevar ainda mais essa atividade durante o sono NREM. Esse excesso de trabalho ventilatório leva a reduções abruptas da ativação muscular, contribuindo para a obstrução durante o sono NREM. O despertar do sono exagera a instabilidade ventilatória, e consequentemente os ciclos obstrutivos. Durante o sono REM existem reduções paroxísticas na ativação muscular dos músculos dilatadores de vias aéreas superiores, típicas do controle central do sono REM, levando a grande predisposição a eventos obstrutivos.23-24 DIAGNÓSTICO O diagnóstico da SAOS é baseado na suspeita clínica, história, exame físico e confirmação através da polissonografia.1-4 Alguns exames preliminares podem auxiliar no manejo das crianças com SAOS.18 A nasolaringoscopia permite a avaliação dinâmica de vias aéreas e localização do(s) local (is) de obstrução, geralmente é realizada com sedação ou anestesia. Na prática clínica, a nasolaringoscopia está reservada para crianças com vias aéreas difíceis (doenças genéticas, malformações craniofaciais, cirurgia prévia) ou com alteração de colapsibilidade (paralisia cerebral). 27 A faringometria acústica, um método não invasivo que utiliza sons para avaliar a área de secção transversa da faringe, tem sido usada com sucesso em adultos, mas tem aplicação limitada em crianças. A avaliação de vias aéreas pode ser feita por diversos estudos radiológicos, como raio-x de cavum, cefalometria, flouroscopia, tomografia computadoriza e ressonância nuclear magnética (RNM). Esses estudos demonstraram que as vias aéreas superiores de crianças com SAOS são mais estreitas do que em crianças saudáveis. A RNM permite reconstrução de todas as estruturas óssea e tecidos moles de vias aéreas superior, além de observar a dinâmica respiratória. A utilidade desses exames varia, e devem ser usados de acordo com a condição da criança. Estudos avançados devem ser reservados para os casos mais complicados.18 Vários estudos tentaram utilizar história e/ou exame físico para o diagnóstico da SAOS. Na década de 80, alguns autores utilizaram um escore clínico para diferenciar crianças com SAOS ou ronco primário, porém, observou-se que esse escore era indeterminado em três quartos das crianças roncadoras com suspeita de SAOS.21 Posteriormente, demonstrou-se que esse escore tem baixa sensibilidade (35%) e especificidade (39%).21 Recentemente, uma meta-análise demonstrou que a história tem um valor preditivo positivo baixo (64%) quando comparado ao padrão ouro, a polissonografia. 28 Até o momento, nenhum estudo conseguiu demonstrar que a avaliação clinica é capaz de discriminar com acurácia SAOS Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 de ronco primário. Os questionários clínicos têm melhor uso quando utilizados para triagem daqueles indivíduos que irão necessitar de diagnóstico definitivo com a polissonografia. Como a polissonografia (PSG) tem custo elevado, outros métodos simplificados de diagnóstico como gravação em vídeo e oximetria noturna foram avaliados. Esses apresentam, entretanto, baixa especificidade e não excluem a necessidade da PSG. Estudos de PSG diurna (sonecas) em crianças > 1 ano, mostraram valor preditivo positivo de 77% a 100% e valor preditivo negativo 17% a 49%, ou seja, as PSG diurnas subestimam a presença e a gravidade da SAOS. Atualmente recomenda-se PSG diurna (~ 3 horas) apenas para lactentes. Estudos polissonográficos domiciliares sem técnico, incluindo montagem cardio-respiratória e monitorização por vídeo, foram realizados com sucesso em projetos de pesquisa. Esses estudos mostraram baixa sensibilidade e especificidade, principalmente, pela falta de um profissional para corrigir artefatos. O uso da monitorização domiciliar na prática clínica em diversas idades ainda não foi estabelecido.1,18 O padrão ouro para diagnóstico de SAOS em crianças é a PSG noturna. A PSG pode ser realizada adequadamente em crianças de qualquer idade, desde que se utilizem equipamentos adequados e profissionais habilitados. A polissonografia é um exame que a monitora de diversas variáveis biológicas:-eletroencefalograma, eletrooculograma, eletromiograma submentoniano e tibial, medidas de fluxo aéreo oral e nasal, medida de esforço respiratório torácico e abdominal, medida da saturação percutânea de oxigênio (SpO2) e do gás carbônico exalado (PETCO2), posição no leito, microfone para registro de ronco, além de gravação em áudio e vídeo. Em situações selecionadas também se utiliza o balão esofágico para medir pressão esofágica/intratorácica, uma medida de esforço respiratório. Em 2007, a Academia Americana de Medicina do Sono publicou uma força de trabalho revisando os padrões publicados em 1996.29 Em pediatria, a PSG deve ser estagiada e interpretada utilizando-se critério específico para idade.4,29 Considera-se anormal um evento respiratório com duração de dois ou mais ciclos respiratórios. Os eventos respiratórios devem ter a duração mínima de 2 ciclos respiratórios e são classificados em apnéia obstrutiva, apnéia central, apnéia mista, hipopnéia, aumento do esforço respiratório associado a despertar e hipoventilação obstrutiva. (figura 3) O índice de apnéia obstrutiva é a soma das apnéias obstrutivas e mistas divididas pelo tempo total de sono, já o índice de apnéia-hipopnéia é a soma das apnéias obstrutivas, mistas, hipopnéias e aumento do esforço respiratório associado a despertar divididas pelo tempo total de sono. Apnéia obstrutiva: queda em mais de 90% da medida de fluxo aéreo associado a esforço respiratório, observado nas cintas tóraco-abdominais ou pressão esofágica, por pelo menos 2 ciclos respiratórios. Apnéia central: ausência de fluxo aéreo e esforço respiratório por 20 segundos, ou por pelo menos 2 ciclos respiratórios 9 Quadro 4 – Classificação da SAOS em crianças Diagnóstico Índice de apnéia obstrutiva (eventos/h) Nadir da SpO2 (%) % tempo de sono com CO2 exalado > 50 mm Hg Índice de microdespertares (ev/hora) Ronco primário <1 > 92 < 53 < 10 EEG < 11 Síndr. de Resistência VAS <1 > 92 < 53 < 10 RERA > 1 SAOS leve 1–5 86 – 91 > 53 10 – 24 EEG > 11 SAOS moderada 5 – 10 76 – 85 > 60 25 – 49 EEG > 11 SAOS acentuada > 10 < 75 > 65 > 50 EEG > 11 desde que esteja associado a dessaturação de oxigênio > 3% e/ou um despertar. Apnéia mista: ausência de esforço respiratório no início do evento, seguido de por esforço respiratório no final do evento. Hipopnéia: queda maior de 50% do sinal de fluxo aéreo associado a dessaturação de oxigênio > 3% e/ou despertar. Hipoventilação: mais de 25% do tempo de sono com a medida de gás carbônico exalado (PETCO2) > 50 mmHg. Aumento do esforço respiratório associado a despertar: precedendo ao despertar há ronco, elevação do gás carbônico exalado e achatamento da curva de aéreo no sensor da cânula nasal, ou aumento progressivo do esforço respiratório observado na medida de pressão esofágica.29-30 O diagnóstico polissonográfico da SAOS é feito quando o índice de apnéia obstrutiva (IAO) > 1 evento/hora e houver dessaturação da oxi-hemoglobina (< 92%) e/ou retenção de gás carbônico (Pico do PETCO2 > 53 mmHg). Recomenda-se que o critério de adulto (índice de apnéia-hipopnéia > 5 eventos/hora) seja utilizado em adolescentes com 13 ou mais anos. O diagnóstico e a classificação de gravidade da SAOS em crianças é baseado no conjunto de achados clínicos e polissonográficos (Quadro 4). REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. CONCLUSÃO A síndrome da apnéia obstrutiva do sono em crianças e adolescentes tem características distintas da SAOS em adultos, principalmente quanto ao quadro clínico e os critérios polissonográficos. O profissional de saúde deve estar atendo a possibilidade da SAOS em crianças e adolescentes com problemas escolares, alterações do comportamento, síndromes genéticas, malformações craniofaciais, respiração bucal, doença atópica e infecções freqüentes de vias aéreas superiores. É fundamental uma história detalhada de sinais noturnos, como ronco, apnéia e desconforto respiratório. Isso indica a realização da polissonografia, o padrão ouro no diagnóstico da SAOS. A hipóxia intermitente, a hipercapnia, as alterações da pressão intratorácica e a fragmentação do sono podem a levar a seqüelas permanentes se a SAOS não for diagnosticada e tratada rapidamente. O profissional de saúde deve estar atento para os aspectos clínicos, pois uma vez diagnosticado a SAOS, o tratamento com adenotonsilectomia é eficaz na grande maioria das crianças.19 10 Pico do CO2 exalado (mm Hg) 9. 10. 11. 12. 13. 14. American Academy of Pediatrics. Section on Pediatric Pulmonology. Subcommitee on Obstructive Sleep Apnea Syndrome. Clinical practice guideline: diagnosis and management of childhood obstructive sleep apnea syndrome. Pediatrics 2002, 109:704-712. Marcus CL, Katz ES. Diagnosis of obstructive sleep apnea syndrome in infants and children. In Sheldon SH, Ferber R, Kryger MH, editors. Principles and Practice of Pediatric Sleep Medicine. Elsevier Inc., 2005, pp 197 – 210. Marcus CL. Sleep-disordered breathing in children. Am J Respir Crit Care Med 2001, 164(1):16-30. American Thoracic Society. Standards and indications for cardiopulmonary sleep studies in children. Am Resp Criut Care Med 1996, 153:866-878, 1996. Lumeng JC, Chevin R. 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O diagnóstico da SAOS, segundo a American Academy of Sleep Medicine Task Force 3 depende de critérios clínicos (A ou B) e de polissonografia (C), da seguinte maneira: A - Sonolência diurna excessiva não explicada por outras causas; B - Dois ou mais dos seguintes fatores (não explicado por outras causas): asfixia ou “respiração ofegante” durante o sono, despertares freqüentes durante o sono, sono não reparador, fadiga durante o dia e prejuízos de concentração; C- Índice de apnéia e hipopnéia (IAH) ³ 5 eventos respiratórios obstrutivos por hora de sono na polissonografia (PSG) noturna. A classificação da gravidade da doença, de acordo com o consenso americano 3, é baseada nos critérios de sonolência diurna excessiva e IAH registrados na PSG de noite inteira. FISIOPATOLOGIA DA SAOS: A via aérea superior (VAS) é uma estrutura dinâmica e complexa constituída por cavidades nasais, faringe e laringe bastante estudada na SAOS. Especialmente a faringe, segmento da VAS desprovido de arcabouço ósseo e cartilaginoso para sustentação, é bastante suscetível ao colapso durante o sono e parece estar comprometida na maioria dos portadores de SAOS. O conjunto de alterações anatômicas e funcionais é responsável por graus variados de colapso durante o sono 4,5,6. As principais doenças que comprometem a via aérea superior na SAOS são: - Doença nasal (obstrução por desvios de septo nasal, hipertrofia de conchas nasais, polipose nasal, rinite); - Aumento de tecidos moles da faringe (hipertrofia de 12 tonsilas faríngea e palatinas, inflamação de mucosa, hipertrofia de paredes laterais da faringe como ocorre, por exemplo, em obesos); - Formações expansivas benignas ou malignas da faringe e laringe (cistos, pólipos, tumores, malácea); - Malformações craniofaciais: micrognatia, retrognatia, alterações relacionadas à síndromes genéticas (Síndromes de Down, Pierre Robin, Treacher Collins Crouzon). Durante o período de sono, fatores como redução do tônus da musculatura dilatadora da faringe, desabamento de estruturas da faringe devido ao decúbito, abertura da boca e deslocamento posterior da mandíbula podem intensificar e perpetuar a obstrução faríngea. Tais fenômenos culminam em vibração das paredes das estruturas com produção ronco ou eventos de apnéia-hipopnéia de natureza obstrutiva que podem ocorrer, em graus variados, em todo o trajeto da VAS 4. MÉTODOS DIAGNÓSTICOS NA SAOS A polissonografia de noite inteira é o método de escolha para diagnóstico da SAOS. Porém, vários exames complementares são utilizados para estudar a VAS em relação à função, dimensões e presença de anormalidades anatômicas que favorecem a obstrução. Estas técnicas fornecem informações relacionadas à patogênese da SAOS e permitem individualizar a terapia. Os exames incluem cefalometria, tomografia computadorizada (TC), ressonância magnética (RM), fluoroscopia, nasolaringoscopia e o reflexo acústico. Cada um apresenta vantagens e desvantagens e devem ser criteriosamente indicados de acordo com cada caso 6,7. A nasolaringoscopia, ou exame endoscópico da VAS, é um método seguro, simples e de custo baixo, bastante utilizado na prática médica. Tem por objetivo documentar doenças anatômicas (estática) e funcionais (dinâmica) em toda a VAS9,10,11,12. Conforme descrito anteriormente, estas alterações anatômicas, ou estruturais, podem contribuir para originar ou perpetuar o colapso faríngeo durante o sono por reduzir o calibre da via aérea, aumentar o esforço respiratório (para manter a permeabilidade do órgão) e aumentar as diferenças de pressão no seu interior, favorecendo a ocorrência da obstrução durante o sono. A nasolaringoscopia também pode ser utilizada para avaliação funcional da faringe, através da observação das Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 variações de calibre em dois pontos específicos: regiões retropalatal (RP) e retrolingual (RL)12,13,14,15. O estudo do colapso das regiões RP e RL pode ser realizado pela manobra de Muller e sono induzido. A manobra de Muller, realizada durante a vigília, documenta a obstrução faríngea durante a inspiração vigorosa com a boca e o nariz ocluídos (o paciente faz uma inspiração vigorosa enquanto o examinador observa a obstrução RP e RL). O objetivo da manobra era estabelecer o valor preditivo do sucesso de cirurgias (por exemplo: a uvulopalatofaringopalstia - UPFP) destinadas à correção de causas anatômicas da obstrução (retirar o excesso de tecidos moles no palato mole e paredes laterais da faringe). A indicação cirúrgica seria destinada somente aos pacientes com obstrução RP isolada (obstrução superior a 75%) e ausência de obstrução RL10,11 . O resultado insatisfatório do tratamento pela UPFP (taxa de insucesso superior a 50%) trouxe descrédito em relação à avaliação pela manobra de Muller. Outros fatores contribuíram para inúmeras críticas à manobra: avaliação com o paciente sentado e acordado, métodos subjetivos para descrever a obstrução e variabilidade do esforço exercido pelo paciente durante a inspiração10,11,12,13,14,15. Com a finalidade de esclarecer dúvidas referentes à indicação cirúrgica pela manobra de Muller estudos foram realizados a partir da década de 1990, com objetivo de avaliar a obstrução faríngea durante o sono induzido16,17,18,19,20. Isto porque durante o sono fatores como redução do tônus da musculatura dilatadora da faringe, desabamento de estruturas da faringe devido ao decúbito, abertura da boca e deslocamento posterior da mandíbula, favorecem a obstrução. Estas alterações são intrinsecamente relacionadas ao período de sono e certamente contribuem para críticas à manobra de Muller. Estudos recentes realizados no serviço de Endoscopia Respiratória e do Laboratório do sono do Hospital das Clínicas da FMUSP mostraram que a manobra de Muller tem sensibilidade igual ao sono induzido para avaliar a obstrução retropalatal, no entanto para diagnosticar a obstrução retrolingual (RL) a manobra não foi adequada no grupo de Fig. 1 - Exame realizado durante o sono induzido com midazolam. Observar a obstrução retrolingual (fotos superiores) e movimento de vai e vem da úvula durante o ronco (fotos inferiores). Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 pacientes avaliados 21. Este é um fator que pode explicar a falha terapêutica da UPFP quando os pacientes são submetidos somente à avaliação pela manobra de Muller. Em outras palavras, se utilizarmos somente a manobra de Muller para excluir a obstrução retrolingual e indicar cirurgia, provavelmente não estaremos utilizando o melhor método 21,22. A nasolaringoscopia, com estudo detalhado da via aérea superior, na SAOS deve incluir a seguinte avaliação: 1- Cavidades nasais por via anterior e retrógrada para diagnóstico de doenças nasais obstrutivas; 2 - Avaliação anatômica da rinofaringe, oro e hipofaringe para estudar estruturas moles, paredes laterais da faringe e calibre da via aérea; 3 - Avaliação anatômica e funcional da laringe (na pesquisa de paralisias, malácea ou tumores obstrutivos de laringe); 4 - Manobra de Muller: avaliação do colapso faríngeo retropalatal e retrolingual durante a vigília. Se o paciente tiver obstrução retolingual significativa na manobra de Muller será excluído do tratamento cirúrgico (UPFP); 5 - Sono induzido (Figuras 1, 2 e 3) naqueles pacientes que não apresentam obstrução retrolingual (ou seja, manobra de Muller negativa retrolingual – obstrução inferior a 50%). Nestes casos, o sono induzido pode mostrar obstrução retrolingual não observado à manobra de Muller e o paciente será excluído do tratamento cirúrgico. O exame deve ser feito com o paciente em decúbito dorsal, com a cabeça em posição neutra. Acesso venoso periférico é necessário para infusão do sedativo. A sala de exame deve estar equipada com material para intubação, oxigenioterapia, ventilação mecânica e reanimação (vale lembrar que os pacientes portadores de SAOS poderão apresentar alterações que dificultam a intubação em situações de emergências). Anestesia tópica (solução aquosa ou gel) e uso de vasoconstritores (efedrina ou solução de adrenalina) nas cavidades nasais são importantes e proporcionam maior conforto durante o exame. O aparelho é introduzido por uma das narinas, até faringe e laringe. Avaliação anatômica da VAS é então realizada. A seguir, o sono é induzido com dose mínima de midazolam venoso e a obstrução faríngea é observada e analisada durante a nasolaringoscopia. O exame pode ser documentado em vídeo e análise quantitativa da obstrução pode ser obtida. Em nosso estudo, o exame pela indução do sono se mostrou uma técnica segura, de fácil realização e superior à manobra de Muller para documentar a obstrução retrolingual. Fig. 2 - imagens da obstrução multissegmentar (retropalatal e retrolingual) obtidas durante o sono induzido com midazolam 13 Fig. 3 - obstrução retrolingual total durante o sono induzido com midazolam, em paciente com SAOS. CONCLUSÃO A nasolaringoscopia é um método diagnóstico seguro, simples e de baixo custo. Representa uma técnica complementar de avaliação para pacientes com SAOS, podendo ser utilizada em casos específicos onde a avaliação da via aérea superior é importante para otimizar o tratamento. REFERÊNCIAS 1. Young T, Shahar E, Nieto FJ, Redline S, Newman AB, Gottlieb DJ, Walsleben JA, Finn L, Enright P, Samet JM. Predictors of sleep-disordered breathing in community-dwelling adults: the Sleep Heart Health Study. 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Diniz3; Geraldo Lorenzi-Filho2 Serviço: 1 Unidade de Hipertensão - Instituto do Coração (InCor) - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 2 Laboratório do Sono - Disciplina de Pneumologia – Instituto do Coração (InCor) - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 3 Iniciação científica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo INTRODUÇÃO A apnéia obstrutiva do sono é parte de um espectro de distúrbios respiratórios relacionados ao sono que incluem o ronco, a resistência aumentada de vias aéreas superiores (aumento do esforço respiratório sem apnéia ou hipopnéia), hipopnéias (redução do fluxo inspiratório <50% associada por mais que 10 segundos) e a apnéia (cessação do fluxo inspiratório por mais de 10 segundos) propriamente dita. Este distúrbio caracteriza-se por episódios recorrentes de hipopnéias e apnéias decorrente do colapso inspiratório das vias aéreas durante o sono, seguida de queda da saturação arterial de oxigênio.1 Quando associada a sintomas diurnos, principalmente sonolência e ou doença cardiovascular denomina-se síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS). Estudos epidemiológicos mostram que a SAOS acomete 4% dos homens e 2% das mulheres em uma população geral.2 Além do sexo masculino, obesidade, raça oriental, anormalidades estruturais de vias aéreas superiores, uso abusivo do álcool e história familiar são fatores de risco para a SAOS. Considerando apenas dados da polissonografia (apnéia obstrutiva do sono), sua prevalência chega a 24% em homens e 9% em mulheres.2 Nas últimas 2 décadas, observações clínicas têm persistentemente demonstrado uma freqüência maior da presença de doenças cardiovasculares em pacientes com SAOS do que a observada na população geral. De fato, estimase que a SAOS está presente em 30% dos pacientes com insuficiência coronariana,3 50% dos pacientes portadores de fibrilação atrial4 e de 12 a 53% nos pacientes com insuficiência cardíaca.5-6 Particularmente na hipertensão arterial sistêmica, estudos mostram uma prevalência de SAOS em 35% dos hipertensos,7 chegando a 70% em casos de hipertensão arterial refratária.8 Isto estimulou a curiosidade do mundo científico para a importância dos distúrbios do sono no ritmo circadiano e a implicação sobre a gênese e evolução das doenças cardiovasculares. Os progressos obtidos até o momento possibilitaram uma melhor compreensão dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos nesta associação. Na presente revisão, analisaremos as principais evidências da literatura referentes ao impacto da SAOS no Sistema Cardiovascular. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 SAOS E DOENÇA CARDIOVASCULAR: FISIOPATOLOGIA As apnéias e hipopnéias obstrutivas desencadeiam uma série de respostas mecânicas, hemodinâmicas, químicas, neurais e inflamatórias com conseqüências cardiovasculares significantes.9 Esforços respiratórios ineficazes contra uma faringe ocluída causam abrupta redução na pressão intratorácica. Este fato promove o aumento da pressão transmural do ventrículo esquerdo (VE), que é dado pela diferença entre a pressão intracardíaca e a pressão intratorácica, com conseqüente aumento da pós-carga. O retorno venoso, por sua vez, também é aumentado, resultando na distensão do ventrículo direito (VD) e deslocamento do septo interventricular para a esquerda. Há comprometimento do enchimento ventricular habitual, gerando uma diminuição da pré-carga. A combinação da redução da pré-carga, com aumento da pós-carga atuam conjuntamente para a redução do volume de ejeção do VE.9 O aumento da atividade simpática, um achado característico da SAOS, resulta da interação de diversos mecanismos excitatórios normalmente quiescentes durante o sono. Em situações normais, receptores de estiramento pulmonares suprimem a descarga simpática durante a respiração. Durante a apnéia, este reflexo cessa, havendo desinibição do fluxo simpático central. As apnéias e/ou hipopnéias recorrentes causam hipóxia e hipercapnia que amplificam a atividade simpática por estímulo de quimiorreceptores centrais e periféricos. A vasoconstricção resultante aumenta a resistência vascular periférica; o aumento do estímulo simpático promove aumento da frequência cardíaca e diminuição de sua variabilidade. Embora o despertar durante a noite gere o término da apnéia obstrutiva e facilite a retomada do fluxo de ar, a resultante carga excitatória dos centros corticais causa aumento da descarga simpática e perda do tônus vagal. Posteriormente o sono retorna, e o ciclo se repete com novo colapso da faringe. Em pacientes com SAOS grave, estes ciclos ocorrem centenas de vezes durante a noite expondo o coração e a circulação a altas oscilações do fluxo nervoso simpático e, portanto, da pressão arterial e da freqüência cardíaca. É interessante notar que 15 Fig. 1- Mecanismos envolvidos na apnéia obstrutiva do sono que predispõem a um aumento do risco cardiovascular muitos fenômenos que ocorrem durante a noite não são autolimitados, uma vez que persistem durante o período de vigília.9 Além da estimulação persistente da ativação simpática, outros fenômenos que são prejudiciais ao sistema cardiovascular também estão presentes como a inflamação sistêmica, a produção de espécies reativas de oxigênio, a disfunção endotelial, o aumento da coagubilidade, entre outros (Figura 1).10 SAOS E HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA (HAS) A relação entre a SAOS e a HAS se deve, em grande parte, ao fato de a SAOS servir como um modelo de ativação simpática persistente, com diminuição na sensibilidade dos barorreceptores, hiperresponsividade vascular e alteração no metabolismo do sal e água que podem contribuir para a elevação da pressão arterial.9 O conjunto das evidências experimentais e clínicas apontam nitidamente o papel da SAOS como uma causa secundária de HAS.11 Na parte clínica, os dados iniciais vieram de estudos epidemiológicos, inicialmente com desenho do tipo caso-controle e posteriormente com a realização de coortes prospectivas com seguimento prolongado dos pacientes com SAOS. Em um destes estudos, 709 indivíduos que trabalhavam na Universidade de Wisconsin responderam a um questionário sobre hábitos de vida e história médica, além da aferição da pressão arterial, peso, altura e estudo polissonográfico. Realizou-se análise multivariada com ajuste para outros fatores de risco para doença cardiovascular, como tabagismo, 16 obesidade, alcoolismo e pressão arterial presentes no início do estudo. Após seguimento de quatro anos, mostrou-se uma associação independente entre presença de SAOS na avaliação inicial e surgimento de HAS no seguimento.12 Adicionalmente os autores observaram uma relação doseresposta entre o IAH e o risco de aparecimento da hipertensão arterial. Dados desta coorte detectaram um aumento de 3 vezes no risco de hipertensão durante o seguimento de 4 anos. Independente de outras doenças. Outras coortes que se seguiram mostraram resultados semelhantes.13,14 Caracteristicamente, pacientes com SAOS apresentam repetitivos aumentos da pressão arterial associados aos episódios de apnéia e freqüentemente são considerados como “non-dippers” em decorrência de não haver uma queda apropriada da pressão arterial durante a noite.15 Este padrão é considerado de risco aumentado para o surgimento de doença cardiovascular. Outro ponto importante é que a maioria dos pacientes hipertensos com SAOS não tratados tem níveis pressóricos elevados, a despeito do uso de muitas drogas anti-hipertensivas.8 Desta forma, em pacientes com hipertensão refratária ao tratamento, a SAOS pode se constituir em uma das principais causas de ausência de resposta ao tratamento anti-hipertensivo. O tratamento da SAOS como coadjuvante no controle da pressão arterial foi abordado em diversos estudos. Nos estudos que avaliaram pacientes com HAS, a redução da pressão arterial após o tratamento com o CPAP por um Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 período de até 3 meses foi de 5 a 10 mmHg.16,17 No entanto, Bazzano et al.18 em recente meta-análise demonstrou a redução da pressão arterial de 818 participantes em 2,46 mmHg na pressão sistólica e 1,83 mmHg na pressão diastólica através do uso do CPAP. Essa redução modesta da PA obtida nessa meta-análise é sujeita a críticas, uma vez que englobou uma população muito heterogênea, incluindo um número significante de pacientes com HAS limítrofe ou mesmo normotensos, o que pode ter contribuído para a observação de uma redução modesta da pressão arterial.19 No que diz respeito ao tratamento da SAOS em pacientes com HAS refratária, as evidências são muito escassas. Logan et al.20 trataram 11 pacientes com SAOS e HAS refratária com CPAP e demonstraram uma queda de 11 mm Hg na pressão arterial sistólica nas 24 horas. Posteriormente, MartinezGarcia et al.21 demonstraram que o tratamento com o CPAP promoveu uma redução da pressão sistólica de 5,2 mm Hg nas 24 horas em pacientes com HAS refratária. Apesar das limitações, estes estudos fornecem dados iniciais do impacto do tratamento da SAOS nesse subgrupo de pacientes de maior risco cardiovascular. SAOS E HIPERTENSÃO PULMONAR A prevalência da hipertensão pulmonar em pacientes com SAOS gira em trono de 17 a 53%, dependendo principalmente do critério adotado para o diagnóstico da hipertensão pulmonar.22,23 Em geral, a hipertensão pulmonar observada na SAOS é leve embora haja formas graves que resultam em cor pulmonale. A hipertensão pulmonar na SAOS está em geral associada com a gravidade deste distúrbio do sono e associada com um remodelamento vascular e menor biodisponibilidade de óxido nítrico.24 Além da gravidade da SAOS, outros fatores associados com a hipertensão pulmonar na SAOS incluem idade avançada, obesidade e a presença de doença pulmonar concomitante, tais como o doença pulmonar obstrutiva crônica.22 Recentes evidências sugerem que o tratamento com o CPAP promove uma redução significante na pressão sistólica de artéria pulmonar o que pode ter um benefício no remodelamento do VD que tem sido observado nestes pacientes.25Apesar destas evidências, não existem recomendações nos consensos americanos26 de investigação da presença de hipertensão pulmonar em pacientes com SAOS. SAOS E ARRITMIAS A maioria das arritmias ocorre em pacientes com SAOS moderada a grave. A arritmia mais freqüentemente observada em pacientes com SAOS consiste na variação cíclica da freqüência cardíaca.27 Esta arritmia é caracterizada por bradicardia progressiva durante o período de apnéia com subseqüente taquicardia durante o período de retorno da respiração. A bradicardia geralmente começa com o início da apnéia com uma intensidade proporcional ao grau de hipoxemia e reflete uma mudança no tônus autonômico. Evidências mostram que cerca de 80% das bradicardias Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 associadas à apnéia acontecem durante o sono REM, mostrando a vulnerabilidade do coração às influências autonômicas durante esta fase do sono.27 O mecanismo de taquicardia pós-apnéia é provavelmente causado pela combinação do microdespertar e pela inibição do vago pelo reflexo de insuflação pulmonar resultando aumento da freqüência cardíaca, diminuição da resistência vascular periférica e broncodilatação. A taquicardia não é sustentada provavelmente por retorno da influência parassimpática assim que a respiração retorna.27 As ectopias ventriculares têm sido relatadas de forma muito mais freqüente em pacientes com SAOS do que em pessoas sem esta condição clínica.28 Outras arritmias que têm sido relacionadas com a SAOS incluem a pausa sinusal e o bloqueio átrio-ventricular de 2o grau, Mobitz II.29 Evidências consistentes sugerem que pacientes com SAOS desenvolvem mais fibrilação atrial do que pessoas sem SAOS, independente de qualquer outro fator de risco, incluindo a obesidade.30 Dentre os possíveis mecanismos responsáveis pela maior ocorrência de fibrilação atrial, destaca-se a evidência de remodelamento atrial promovido pela SAOS. Pacientes com SAOS, mesmo na ausência de hipertensão arterial, apresentam um aumento no tamanho atrial, conhecido fator que aumenta a predisposição para a ocorrência de arritmias.31 De forma interessante, um estudo mostrou que o tratamento da SAOS com o CPAP promove uma redução da recorrência de fibrilação atrial após 1 ano.32 Este dado sugere a importância do tratamento de pacientes com SAOS e este tipo de arritmia, uma vez que a recorrência pode aumentar o risco de complicações tais como eventos cardio-embólicos. SAOS E A RELAÇÃO COM AATEROSCLEROSE, DOENÇA CORONARIANA E ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL Há um interesse crescente na literatura da possível relação entre a SAOS, aterosclerose, doença coronariana e acidente vascular cerebral. Recentemente tem sido descrito na literatura que pacientes com SAOS apresentam uma aceleração no processo de aterosclerose. Em uma destas evidências, dados do nosso grupo 33 evidenciaram a ocorrência de sinais precoces de aterosclerose (aumento da rigidez arterial, aumento da espessura íntima-média da carótida e do diâmetro da carótida) em pacientes aparentemente saudáveis com SAOS grave. Além disto, houve uma correlação entre a gravidade dos marcadores de aterosclerose com a gravidade da SAOS. No que diz respeito à doença coronariana, até o momento as evidências são relativamente escassas e baseadas em uma relação de associação e não de uma relação causal. Estima-se que a prevalência de doença coronariana nos pacientes com SAOS esteja em torno de 25%, sendo esta porcentagem mais alta nos pacientes com SAOS moderada e grave.34 Já a prevalência da SAOS em pacientes com doença coronariana é estimada em 30%.35,36 A importância 17 do reconhecimento da SAOS é respaldada por evidências sugerindo que a SAOS pode contribuir tanto para a progressão da doença coronariana, quanto para a instabilização de uma doença coronariana estabelecida. Neste sentido, estudos com registros simultâneos da polissonografia e do eletrocardiograma demonstraram a ocorrência de episódios de isquemia noturna em pacientes com SAOS, sendo mais comum durante o sono REM, fase onde os eventos respiratórios são mais comuns.37 De forma interessante, o tratamento com o CPAP promoveu redução dos eventos isquêmicos noturnos. Outro dado interessante é o que se refere à carga aterosclerótica coronariana. Em um estudo, o escore de Gensini, indicador da gravidade da aterosclerose coronariana, foi maior em apnéicos com eventos de dessaturação >5 eventos/hora de sono (evento de dessaturação definido como queda na saturação O2 >3% com duração de no mínimo 10 seg.) do que nos não dessaturadores.38 Recentemente, Sorajja et al. encontraram que pacientes com SAOS apresentavam níveis de escore de cálcio coronariano maiores do que pacientes sem SAOS, independente de outros fatores de confusão.39 Com relação ao acidente vascular cerebral (AVC), estudos têm sugerido que a SAOS está associada à ocorrência de AVC e morte, sendo que a prevalência desta síndrome no AVC pode chegar a 60%40,41 em comparação com 2 a 4% na população de meia idade. Poucos estudos, no entanto, avaliaram o papel da SAOS como fator de risco independente para estes desfechos após ajustar para outros fatores de risco. Em um destes estudos, Yaggi e colaboradores40 em estudo observacional de coorte incluiu 1022 pacientes dos quais 68% apresentavam SAOS sendo o IAH>5 e 32% eram os controles com IAH < 5 eventos/hora. A apnéia do sono foi independentemente associada à AVC e morte (OR: 2,24) após ajustar para os fatores confundidores (idade, sexo, raça, IMC, diabetes mellitus, hiperlipidemia, fibrilação atrial e HAS). SAOS E INSUFICIÊNCIACARDÍACACONGESTIVA(ICC) Os dados até o momento não permitem considerar a SAOS como uma causa de ICC. No entanto, a SAOS pode contribuir para a piora da classe funcional e da função ventricular em pacientes com ICC estabelecida. No “Sleep Heart Study”, que envolveu mais de 6000 homens e mulheres, evidenciouse que a presença da SAOS aumentou em 2,38 vezes a probabilidade de um indivíduo ter ICC, independente de outros fatores de risco.41 Um estudo recente mostrou que a presença da SAOS em pacientes com insuficiência cardíaca estabelecida está associada com um aumento da mortalidade no seguimento médio de três anos. 42 Como vimos anteriormente, o substrato fisiopatológico para o estabelecimento desta relação baseia-se no impacto da ativação simpática persistente em detrimento da inibição vagal do sistema cardiovascular em geral, bem como os efeitos deletérios do aumento da sobrecarga e da hipóxia sobre o miocárdio. Neste sentido, as conseqüências da 18 ativação crônica do sistema simpático incluem a necrose do miócito, apoptose, downregulation e dessensibilização do receptor β-adrenérgico, arritmogênese e aumento das taxas de mortalidade.43 Estímulo nos nervos simpáticos do território renal promove a ativação do sistema renina-angiotensinaaldosterona, bem como a retenção de sódio e água. O comprometimento do barorreflexo e do controle da freqüência cardíaca são achados adicionais que cooperam para o aumento do risco de morte súbita nestes pacientes.9 Em contraste com o que acontece em pacientes com ICC isolada, a presença conjunta da SAOS coopera para amplificar os distúrbios do controle cardiovascular também durante o sono. Portanto, torna-se uma combinação altamente desfavorável para gerar uma piora da função ventricular, surgimento de arritmias e por conseqüência a uma piora da sobrevida. SAOS E MORTE SÚBITA O risco de eventos cardiovasculares na população geral é significativamente maior nas primeiras horas da manhã após o despertar (habitualmente entre às 6 horas da manhã e o meio-dia). Existem muitas explicações para justificar este padrão. O aumento dos eventos durante a manhã pode ser explicado em parte por mudanças no comportamento da atividade simpática, alterações circadianas do barorreflexo, aumento da coagulabilidade e de anormalidades eletrofisiológicas. Recentes evidências mostraram que o padrão circadiano de eventos cardiovasculares na SAOS é diferente da população em geral. Nesse sentido, Gami e colaboradores44 avaliaram 112 pacientes com SAOS que tiveram quadro de morte súbita de origem cardíaca. Diferentemente da população em geral, estes autores observaram que pacientes com SAOS morrem mais no período da meia-noite às 6 horas da manhã do que no período da manhã. Além disso, esses autores observaram que quanto mais grave a SAOS maior a chance do indivíduo ter morte súbita de madrugada do que em relação aos outros períodos. Esses dados sugerem que os eventos respiratórios durante a noite podem desencadear a ocorrência de doenças cardiovasculares tais como o infarto agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral em pacientes susceptíveis. CONCLUSÕES A SAOS constitui um importante problema de saúde pública não só pela sua prevalência, mas também pelas repercussões na qualidade de vida, e conseqüências cardiovasculares. No entanto, esta condição clínica é subestimada e, como conseqüência, subdiagnosticada. Há evidências claras de que a SAOS exerce repercussões importantes sobre Sistema Cardiovascular: a SAOS é uma causa secundária de HAS; participa ativamente no surgimento e/ou no agravamento da aterosclerose, infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, arritmias e acidente vascular cerebral. Por outro lado, inúmeras evidências demonstram que o tratamento da SAOS com o CPAP é efetivo em reduzir a morbidade e mortalidade Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 cardiovascular. Portanto, são necessárias medidas crescentes de divulgação e orientação para a triagem e tratamento destes pacientes. 15. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Sleep-related breathing disorders in adults: recommendations for syndrome definition and measurement techniques in clinical research. The Report of an American Academy of Sleep Medicine Task Force. Sleep 1999; 22:667-689. Young T, Palta M, Dempsey J, Skatrud J, Weber S, Badr S. The occurrence of sleep-disordered breathing among middleaged adults. N Engl J Med. 1993;328(17):1230-5. Bhama JK, Spagnolo S, Alexander EP, Greenberg M, Trachiotis GD. Coronary revascularization in patients with obstructive sleep apnea syndrome. Heart Surg Forum. 2006;9(6):E813-7. 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N Engl J Med. 2005;352 SUB-COMISSÕES SPPT 2008/2009 ASMA Lilian Serrasqueiro Ballini Caetano [email protected] CÂNCER Ilka Lopes Santoro [email protected] CIRCULAÇÃO Adriana Ignacio de Padua [email protected] DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS DO SONO Sônia Maria G. P. Togeiro [email protected] DOENÇAS INTERSTICIAIS Mariana Silva Lima [email protected] DPOC Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano [email protected] EPIDEMIOLOGIA Valdelis Novis Okamoto [email protected] INFECCÕES RESPIRATÓRIAS E MICOSES Mauro Gomes [email protected] PLEURA Alex Gonçalves Macedo [email protected] DOENÇAS AMBIENTAIS E OCUPACIONAIS Ubiratan de Paula Santos [email protected] TABAGISMO Sérgio Ricardo R. de Almeida Santos [email protected] TERAPIA INTENSIVA Pedro Caruso [email protected] TUBERCULOSE Márcia Telma Guimarães Savioli [email protected] FUNÇÃO PULMONAR Roberto Rodrigues Júnior [email protected] IMAGEM Gustavo de Souza Portes Meirelles [email protected] DOENÇA PULMONAR AVANÇADA Ilma Aparecida Paschoal [email protected] [email protected] 20 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 AVALIAÇÃO PERI-OPERATÓRIA DA APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO NO OBESO Autora: Sônia Maria Guimarães Pereira Togeiro Serviço: Disciplina de Medicina e Biologia do Sono, Departamento de Psicobiologia - Universidade Federal de São Paulo INTRODUÇÃO Independente dos riscos cardiovasculares, cognitivos e na qualidade de vida relacionados a Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS), estes indivíduos apresentam considerável risco de complicações peri-operatórias relacionadas principalmente a anestesia e analgesia, entretanto não ainda bem definido. A literatura é relativamente pobre no manejo peri-operatório e não existe consenso publicado sobre a conduta mais adequada neste período para estes pacientes. Este artigo pretende sintetizar a avaliação diagnóstica e sugerir a terapêutica perioperatória para minimizar tais complicações. DIAGNÓSTICO DA APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO Vários estudos confirmam ser a obesidade o principal fator de risco para a SAOS, sendo que até 70% dos apneicos são obesos,1,2,3 havendo uma relação entre o peso corporal e o índice de apnéia-hipopneia (IAH). Foi demonstrado que o aumento de 10% do peso associa-se ao aumento de 32% do IAH e em 6 vezes a chance de desenvolver SAOS de grau moderado a grave2. Inversamente, 10% da perda ponderal prediz um decréscimo de 26% no IAH. A obesidade pode causar estreitamento das vias aéreas superiores (VAS) como resultado do depósito de gordura na região cervical sendo que a circunferência cervical corrigida para a altura tem se mostrado um útil preditor para a SAOS4. Mais recentemente foi descrito que a obesidade central pode estar fortementemente relacionada a SAOS e alguns autores propuseram que a AOS deveria fazer parte dos componentes da síndrome metabólica5. Os outros fatores de risco incluem o sexo masculino, a idade, o aumento das adenóides e tonsilas palatinas e as alterações crânio-faciais (retro e micrognatia). Quanto à idade, a SAOS está presente em, aproximadamente, 6% dos homens com a idade de 50-70 anos6. O “Sleep Heart Health Study” demonstrou que 25% dos homens e 11% das mulheres com idade de 40 a 98 anos apresentam IAH maior que 15 eventos por hora de sono7. Entretanto, sintomas diurnos são menos comuns com o avançar da idade8. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Fatores genéticos também têm sido implicados, sendo que uma significante proporção do gene ApoE epsilon4 está associada á apnéia obstrutiva9,10. Num estudo realizado no laboratório do sono da UNIFESP (no prelo) avaliando 206 pacientes com IMC de 30+5,2Kg/m2 a AOS foi de grau leve, moderado e grave em 35,4%, 29,6% e 35%, respectivamente. Estudos revelam que a proporção de AOS em obesos mórbidos alcança ate 80% dos homens e 50% das mulhere 1,2,11 . Num estudo nacional, recentemente publicado, a AOS acometeu 98% dos obesos mórbidos,12 entretanto há de se considerar o espectro de gravidade da doença, sendo que 35.2% apresentavam AOS de grau leve, 30.6% de grau moderado e 27.8% de grau intenso. A dessaturação da oxi-hemoglobina correlacionou-se com o IAH sendo mais grave no sexo masculino. Entre os obesos mórbidos, uma pequena minoria apresenta Síndrome de Obesidade – Hipoventilação caracterizada pela presença de hipoventilação durante a vigília e o sono13. Em geral, estes indivíduos apresentam SAOS acentuada e as complicações da hipoxemia grave com cor-pulmonale, hipertensão pulmonar, poliglobulia e alta mortalidade14 Neste contexto pacientes obesos, particularmente os mórbidos, deveriam ser submetidos ao rastreamento para os distúrbios respiratórios do sono. Na prática clínica, alguns questionários têm sido utilizados com este objetivo sendo o mais utilizado o questionário de Berlim 15 . A presença de 3 domínios positivos em 5, indica alta probabilidade de SAOS. Ou seja, a presença de sintomas como sonolência ou ronco habitual e intenso tem o mesmo peso que a HAS ou o IMC para predizer a doença (quadro 1). Achados de exame físico como hipertrofia adenoamigdaliana, aumento da base de língua dificultando a visualização da oro-faringe (Sinal de Mallampati III ou IV), palato e úvula alongados e alterações esqueléticas faciais como retro e micrognatia freqüentemente estão presentes nestes indivíduos16. Tal diagnóstico deverá ser idealmente confirmado pela PSG para que o tratamento adequado seja proposto, sendo que, para os casos de grau moderado e grave o tratamento 21 Quadro 1 de escolha é a pressão positiva continua em vias aéreas (CPAP). QUESTIONÁRIO CLÍNICO DE BERLIN Categoria 1 1. Você ronca? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei 2. Seu ronco é: Pouco mais alto que sua respiração? Tão mais alto que sua respiração? Mais alto do que falando? Muito alto que pode ser ouvido nos quartos próximos? 3. Com que freqüência você ronca? ( ) Praticamente todos os dias ( ) 3-4 vezes por semana ( ) 1-2 vezes por semana ( ) 1-2 vezes por semana ( ) Nunca ou praticamente nunca 4. O seu ronco incomoda alguém? ( ) Sim ( ) Não 5. ( ( ( ( ( Alguém notou que você para de respirar enquanto dorme? ) Praticamente todos os dias ) 3-4 vezes por semana ) 1-2 vezes por semana ) 1-2 vezes por semana ) Nunca ou praticamente nunca Categoria 2 6. Quantas vezes você se sente cansado ou com fadiga depois de acordar? ( ) Praticamente todos os dias ( ) 3-4 vezes por semana ( ) 1-2 vezes por semana ( ) 1-2 vezes por semana ( ) Nunca ou praticamente nunca 7. ( ( ( ( ( Quando você está acordado você se sente cansado, fadigado ou não sente bem? ) Praticamente todos os dias )3-4 vezes por semana )1-2 vezes por semana )1-2 vezes por semana )Nunca ou praticamente nunca 8. Alguma vez você cochilou ou caiu no sono enquanto dirigia? ( ) Sim ( ) Não Categoria 3 9. Você tem pressão alta? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei IMC= Pontuação das perguntas: Qualquer resposta circulada é considerada positiva Pontuação das categorias: Categoria 1 é positiva com 2 ou mais respostas positivas para as questões 1-5 Categoria 2 é positiva com 2 ou mais respostas positivas para as questões 6-8 Categoria 3 é positiva se a resposta para a questão 9 é positiva ou o IMC > 30 Resultado final: 2 ou mais categorias positivas indica alto risco para AOS 22 COMPLICAÇÕES PERI-OPERATÓRIAS A importância do diagnóstico deste distúrbio respiratório na avaliação pré-operatória decorre das complicações perioperatórias incluindo aquelas devido ao uso de anestésicos e analgésicos ou ao ato da intubação orotraqueal.17, 18 A incidência das complicações peri-operatórias bem como com a gravidade da SAOS não foram ainda bem estabelecidas, entretanto o estudo de Hwang et al 19 demonstrou que complicações respiratórias, cardiovasculares e sangramento no período peri-operatório associavam-se à gravidade da hipoxemia durante o sono. Considerando que os sedativos, os anestésicos e os analgésicos, particularmente os opióides, promovem depressão ventilatória, estes pacientes estariam mais suscetíveis ao agravamento do distúrbio respiratório do sono. Ocorre dificuldade de desintubação e até mesmo morte nos casos em que o diagnóstico de SAOS não havia sido reconhecido. Potenciais efeitos sinérgicos de medicamentos também devem ser considerados, especialmente, como já referido, os com efeito depressor no sistema nervoso central. Assim, os hipnóticos sedativos, ansiolíticos e outros sedativos sempre que utilizados, impõe-se cuidado e monitoramento do paciente. Quanto à analgesia, a dose deve ser estabelecida de forma a garantir o alívio da dor sem comprometer o tônus muscular das vias aéreas superiores. O uso da analgesia controlada pelo paciente pode ser inadequada nos pacientes com SAOS se não for cuidadosamente estabelecida a dose limite que mantém a patência das VAS. As primeiras 24 horas do pós-operatório é o período mais crítico, no entanto as mortes pela SAOS podem ocorrer após estas 24 horas, sendo provável que também concorra para tal, a privação do sono com rebote de sono REM 20,21, período em que as apnéias são mais prolongadas. Tendose em mente o aumento de tempo do pós-operatório para as complicações, alerta deve ser considerado para os procedimentos ambulatoriais Frente ao exposto torna-se indiscutível a necessidade do monitoramento contínuo da oximetria de pulso e da freqüência cardíaca com alarmes acionados no período pósoperatório. Outro aspecto relevante seria que as alterações anatômicas em via aérea superior nestes pacientes, compreendendo o aumento da base da língua, palato e úvula alongados, cavidade oral de tamanho reduzido, presença de retro ou micrognatia e por vezes hipertrofia adeno-amigdaliana concorreriam para a dificuldade de intubação traqueal 22 . Frente a estes achados e caso o diagnóstico prévio de SAOS não tenha sido contemplado, Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 a suspeita deste diagnóstico ocorrerá durante o ato da intubação traqueal. Um estudo recente demonstrou que o IAH predisse a dificuldade de intubação, sendo tanto mais difícil quanto maior era o IAH 23. CONDUTA NO PÉRI-OPERATÓRIO É fundamental o seguimento de um protocolo pelo anestesiologista e pelo pneumologista que identifique os fatores de risco para a SAOS e contemple este diagnostico objetivando a escolha do procedimento anestésico mais adequado e de cuidados peri-operatórios individualizados17. O uso do CPAP nestes indivíduos é preconizado durante os períodos pré e pós-operatório, sendo altamente efetivo em controlar as sérias complicações, incluindo não somente as respiratórias, mas as decorrentes da hipoxemia, como as arritmias cardíacas e as isquemias coronarianas e cerebrais 24,25. O CPAP promove suporte vital das VAS mesmo naqueles que não estavam em uso domiciliar. A titulação pressórica do CPAP deve ser monitorada com o objetivo de se normalizar as trocas gasosas e a obstrução das VAS. Se há alguma evidencia de ronco ou apnéias enquanto o CPAP está sendo utilizado, preconizase aumentar sua pressão para eliminar a obstrução das VAS. As equipes devem estar treinadas em ventilação não invasiva e atentas ao fato de que aumentos pressóricos adicionais aos valores prévios à condição cirúrgica podem ser necessários, decorrente dos efeitos da anestesia e analgesia. Adicionalmente, pacientes podem ser incapazes de usar CPAP sem assistência no período do pós-operatório ou estar relutantes devido à dor, náusea ou outro desconforto. Sonda naso- gástrica ou cirurgia abdominal não contra-indicam o CPAP. Em situações em que há comprometimento da respiração nasal, máscaras faciais podem ser necessárias. Nos casos daqueles que não toleram ou há falha do CPAP, opta-se pelo o uso de oxigênio e outras modalidades de ventilação. Idealmente, considerando-se os casos com diagnóstico de SAOS, mas não tratados, alguns centros preconizam o uso do CPAP, iniciando-se pelo menos 3 semanas antes da cirurgia para garantir o melhor controle das comorbidades associadas a SAOS, como da HAS, das arritmias cardíacas e das alterações cognitivas com melhora da condição clínica para a cirurgia. CONCLUSÃO Frente ao exposto neste artigo a SAOS apresenta-se como um desafio para os cuidados peri-operatórios. Este distúrbio respiratório do sono aumenta o risco de complicações por anestésicos, analgésicos e sedativos, incluindo complicações cardiorrespiratórias e risco de morte. Avaliação sistemática para identificar estes pacientes, bem como a constante vigilância para o risco de obstrução da VAS, uso criterioso de medicamentos, Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 monitoramento dos eventos respiratórios anormais e uso de CPAP são fundamentais para otimizar os cuidados perioperatórios nestes pacientes. Tais recomendações são baseadas em experiência clínica e opinião de especialistas publicadas na escassa literatura disponível sobre este tema. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Young T, Peppard PE, Gottlieb DJ. Epidemiology of obstructive sleep apnea: a population health perspective. Am J Respir Crit Care Med 2002;165(9):1217–39. Peppard PE, Young T, Palta M, Dempsey J, Skatrud J.Longitudinal study of moderate weight change and sleepdisordered breathing. JAMA 2000;284(23):3015–21. Tishler PV, Larkin EK, Schluchter MD, Redline S. 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Preoperative diagnosis and postoperative management of adult patients with obstructive sleep apnea syndrome: a review of the literature. J Perianesth Nurs 1999;14(4):193-200. [email protected] 24 REUNIÕES CLÍNICAS NA CAPITAL UNIFESP/EPM 3ªs feiras, das 8 às 10h Pr. Octávio de Carvalho Anf. Nylceu Marques de Castro Rua Botucatu, 740 HC-USP 4ªs feiras, das 8 às 10h Instituto Central – Anfiteatro da Patologia 10º andar - Av. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 HSPE 3ªs feiras às 8h Biblioteca – 14º andar / Rua Pedro de Toledo, 1800 SANTA CASA 6ªs feiras, das 8 às 9h Unidade de Pulmão e Coração (UPCOR) Anfiteatro Rua Dr. Cesário Motta Jr, 112 ABC 6ªs feiras, das 8h30 às 10h30 Centro de Estudos do Hospital Mário Covas Rua Henrique Calderazzo, 321 - Paraíso - Santo André CLEMENTE FERREIRA 4ªs feiras, das 8:30 às 11:30h Auditório Rua da Consolação, 717 DEPARTAMENTO DE FISIOTERAPIA DA SPPT “Tópicos Avançados em Fisioterapia Respiratória” Data: Toda última terça-feira do mês Horário: 20h Local: R. Machado Bittencourt, 205 - Térreo INSTITUTO CLEMENTE FERREIRA Programação de setembro MÓDULO DE ASMA 03.09.2008 ASMA: O QUE OS LINFÓCITOS T Reg TÊM A VER COM ELA? Dra. Denise Rodrigues (ICF) 10.09.2008 EPIDEMIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Dra Rosimary Farias Alves Ghefter (UNIFESP) 17.09.2008 “ESTUDO COMPARATIVO, REALIZADO NO INSTITUTO CLEMENTE FERREIRA, ENTRE ASSOCIAÇÕES DE MEDICAMENTOS PARA ASMA PERSISTENTE LEVE E MODERADA” Dr. Claudio do Amaral Antonio 24.09.2008 ESTRATÉGIAS DE TRATAMENTO E ACOMPANHAMENTO AMBULATORIAL Dra. Ana Luisa Godoi Fernandes (UNIFESP) Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 RESUMINDO E RECORDANDO DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS RELACIONADOS AO SONO: CLASSIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO Autores: Lia Rita Azeredo Bittencourt, Silvério Aparecido Garbuio Serviço: Disciplina de Medicina e Biologia do Sono - Departamento de Psicobiologia – Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP INTRODUÇÃO As alterações fisiológicas do sistema respiratório durante o sono predispõem para que alguns distúrbios que ainda não se manifestaram na vigília já ocorram durante o sono1,2. Os distúrbios respiratórios relacionados ao sono são prevalentes e nem sempre diagnosticados adequadamente3,4. As conseqüências desses, envolvem sonolência excessiva e risco de acidentes de trabalho e de trânsito, além de déficits cognitivos e doenças cardiovasculares 5,6,7. Atualmente esses distúrbios são classificados segundo suas características fisiopatológicas e clínicas 8. CLASSIFICAÇÃO DOS DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS RELACIONADOS AO SONO Segundo a Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono (CIDS) 8, os distúrbios respiratórios relacionados ao sono são: Síndromes da Apnéia Central do Sono (SACS), Síndromes da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS), Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionada ao Sono, Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono causadas por Condições Médicas e outros distúrbios respiratórios relacionados ao sono. Nessas categorias encontram-se os distúrbios do adulto, da criança e do adolescente (tabela 1). Tabela 1 - Classificação dos Distúrbios Respiratórios relacionados ao Sono Síndromes da Apnéia Central do Sono Apnéia Central do Sono Primária Apnéia Central do Sono causada pelo Padrão de Respiração de Cheyne-Stokes Apnéia Central do Sono causada pela Respiração Periódica da Alta Altitude Apnéia Central do Sono causada por Condições Médicas que não Cheyne-Stokes Apnéia Central do Sono causada por Drogas ou Substâncias Apnéia do Sono Primária da Infância (do recém-nascido) Síndromes da Apnéia Obstrutiva do Sono Apnéia Obstrutiva do Sono, adulto Apnéia Obstrutiva do Sono, pediátrica Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono Hipoventilação Alveolar não-obstrutiva relacionada ao sono, idiopática Síndrome da Hipoventilação Alveolar Central Congênita Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono causadas por Condições Médicas Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono causadas doenças do parênquima e vasculatura pulmonar Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono causadas por obstrução das vias aéreas inferiores Síndromes da Hipoventilação/Hipoxemia relacionadas ao Sono causadas por doenças neuromusculares e da caixa torácica Outros Distúrbios Respiratórios relacionados ao Sono Apnéia do Sono/ Distúrbios Respiratórios relacionados ao Sono, inespecíficos Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 25 Nas SACS incluem-se aquelas nas quais o esforço respiratório é diminuído ou ausente, que ocorre intermitente ou de forma cíclica devido às disfunções do sistema nervoso central ou cardíaca. Essas síndromes são divididas em idiopáticas ou aquelas devidas às condições patológicas prévias ou ambientais 8. Os principais critérios diagnósticos das SACS encontram-se nos quadros 1 à 6 8. Quadro 4 - Apnéia do Sono Central Condições Médicas não Cheyne Stokes As apnéias centrais não se apresentam como padrão de Cheyne Stokes e são geralmente são associadas à: • Lesões de tronco cerebral (vascular, neoplásica, degenerativa, dismielinizante, traumática) • Doenças cardíacas Quadro 1 - Apnéia do Sono Central Primária • Doenças renais A) uma ou mais dessas queixas: • Sonolência Diurna Excessiva (SDE) • Despertares noturnos freqüentes ou queixa de insônia • Despertares com falta de ar Quadro 5 - Apnéia do Sono Central por Drogas ou Substâncias B) Polissonografia (PSG) revelando 5 ou mais apnéias centrais/hora de sono C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Quadro 2 - Apnéia do Sono Central: Padrão da Respiração de Cheyne-Stokes A) PSG revelando 10 ou mais apnéias ou hipopnéias centrais/hora de sono, sendo acompanhadas tem um padrão de volume corrente crescendo e decrescendo acompanhado por despertares freqüentes e alteração da arquitetura do sono Obs: Podem ocorrer: SDE, despertares e vigília durante o período de sono, queixa de insônia e despertares com falta de ar B) Associação com Insuficiência Cardíaca Congestiva, Acidente Vascular Encefálico ou Insuficiência Renal Crônica A) Uso de opióides de longa ação (mínimo 2 meses) B) Apnéias centrais > 5/hora de sono ou respiração periódica C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas Quadro 6 - Apnéia do Sono Central Primária da Infância Apnéia da Prematuridade (menos do que 37 semanas de idade gestacional) A) Apnéias centrais ³ 20" ou obstrutivas e mistas mais curtas com bradicardia, hipoxemia, necessitando intervenção Apnéia da Infância (maior que 37 semanas de idade gestacional) B) Apnéias centrais ³ 20" ou obstrutivas e mistas mais curtas com bradicardia, cianose, palidez e hipotonia. C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias C) Ausência de outro distúrbio do sono, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Quadro 3 - Apnéia do Sono Central: Respiração Periódica da Alta Altitude A) Recente subida a altitudes de 4000m B) PSG revelando apnéias centrais recorrentes > 5/hora de sono, na fase NREM (ciclo de apnéias e hiperpnéias de 12 a 34") Obs: Podem ocorrer despertares e fadiga 26 Nas SAOS são incluídas aquelas em que há obstrução da via aérea resultando em esforço respiratório, porém na ausência de ventilação adequada. Adultos e crianças são identificados separadamente devidos aos diferentes métodos diagnósticos e tratamento. Os principais critérios diagnósticos das SAOS se encontram nos quadros 7 e 8 8. Nas Síndromes da Hipoventilação relacionadas ao Sono são englobadas aquelas doenças em que estão associadas à hipoventilação alveolar por limitação na habilidade de eliminação do gás carbônico (CO2). Como durante o sono ocorre um aumento fisiológico da pressão parcial de CO2 arterial (PaCO2 ), esse aumento excede o esperado e pode Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Quadro 7 - Apnéia do Sono Obstrutiva do adulto Critérios (A + B + D) ou (C + D) A) No mínimo 01 queixa: • Episódios de sono não intencionais durante a vigília, SDE, sono não reparador, fadiga ou insônia • Acordar com pausas respiratórias, engasgos ou asfixia • Companheiro relatar ronco alto e/ou pausas respiratórias no sono B) PSG: • 5 ou mais eventos respiratórios detectáveis (apnéias e/ ou hipopnéias e/ou despertares relacionados à esforço respiratório) / hora de sono • Evidência de esforço respiratório durante todo ou parte de cada eventos C) PSG: 15 ou mais eventos respiratorios detectáveis (apnéias e/ ou hipopnéias e/ou despertares relacionados à esforço respiratório) / hora de sono evidência de esforço respiratório durante todo ou parte de cada eventos ainda não estar ocorrendo durante a vigília nessas síndromes8. Os principais critérios diagnósticos das Síndromes Hipoventilação relacionadas ao Sono se encontram nos quadros 9 a 13 8. Quadro 9 - Hipoventilação Alveolar Não-Obstrutiva relacionada ao Sono Idiopática PSG: A) Episódios de diminuição da ventilação >10" com queda da saturação da oxi-hemoglobina, despertares relacionados ou bradi-taquicardia Obs:Podem ocorrer: sonolência diurna excessiva, despertares e vigília durante o sono ou insônia B) Ausência de doenças pulmonares, esquelética ou neuromuscular que afete a ventilação C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Quadro 10 - Hipoventilação Alveolar Central Congênita D) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias A) Período neonatal durante o sono: diminuição da ventilação ou cianose e apnéia Obs: Hipertensão pulmonar e cor pulmonale podem estar presente Quadro 8 - Apnéia do Sono Obstrutiva Pediátrica A) Relato de ronco e/ou respiração laboriosa durante o sono B) No míninmo um desses achados: • Movimento paradoxal da caixa torácica na inspiração • Despertares com movimentos • Sudorese • Sonolência Diurna Excessiva, hiperatividade ou comportamento agressivo • Taxa de crescimento lenta • Cefaléia matinal • Enurese C) PSG: • Um ou mais eventos respiratórios detectáveis (apnéias e/ou hipopnéias com duração de no mínimo 02 ciclos respiratórios) / hora de sono D) PSG com a ou b: a. No mínimo 1: • Despertares freqüentes relacionados ao esforço respiratório aumentado • Queda da saturação da oxi-hemoglobina relacionada ao eventos obstrutivos • Hipercapnia no sono • Episódios marcados de pressão esofágica negativa b. Períodos de hipoxemia, hipercapnia ou ambas no sono, associados a ronco, movimento paradoxal da caixa torácica na inspiração e no mínimo: • Despertares freqüentes • Episódios marcados de pressão esofágica negativa E) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 B) Hipoventilação que piora no sono comparado à vigília C) Teste da resposta ventilatória à hipercapnia e à hipoxemia diminuída ou abolida D) PSG: hipoxemia e hipercapnia acentuada sem apnéias E) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Quadro 11 - Hipoventilação/Hipoxemia relacionada ao sono causada por Doenças do Parênquima ou Vasculatura Pulmonar A) Doença do parênquima ou vasculatura pulmonar causando hipoxemia B)Polisonografia ou medidas de gases arterias no sono mostrando no mínimo um desses achados: • Saturação mínima da oxi-hemoglobina (SpO2) menor que 90% por mais de 5 min e SpO2 min de 85% • 30% do Tempo Total de Sono (TTS) com SpO2 menor que 90% • PaCO2 acentuadamente elevado ou desproporcionalmente maior que na vigília C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias 27 Quadro 12 - Hipoventilação/Hipoxemia relacionada ao Sono causada por Obstrução das Vias Aéreas Inferiores 2. A) Doença obstrutiva das vias aéreas inferiores (VEF1/ CVF: < 70%) causando hipoxemia 3. B) PSG ou medidas de gases arteriais no sono mostrando S, editor. Medicina e Biologia do Sono. 1st ed. São Paulo: Manole, 2007. p. 48-58. 4. no mínimo um desses achados: · Saturação mínima da oxi-hemoglobina (SpO2) menor que 90% por mais de 5 min e SpO2 min de 85% · 30% do Tempo Total de Sono (TTS) com SpO2 menor 5. Quadro 13 - Hipoventilação/Hipoxemia relacionada ao Sono causada por Doenças Neuromusculares e da Caixa Torácica A) Doença Neuromuscular ou da caixa torácica causando hipoxemia B) PSG ou medidas de gases arteriais no sono mostrando no mínimo um desses achados: • Saturação mínima da oxi-hemoglobina (SpO2) menor que 90% por mais de 5 min e SpO2 min de 85% • 30% do Tempo Total de Sono (TTS) com SpO2 menor que 90% • PaCO2 acentuadamente elevado ou desproporcionalmente maior que na vigília adults. N Engl J Med. 1993;328:1230-5. Conway SG, Tufik S, Frussa Filho R, Bittencourt LRA. Beebe DW, Gozal D. Obstructive sleep apnea and the prefrontal cortex: towards a comprehensive model linking noc turnal upper airway obstruction to daytime cognitive and behavioral deficits. J Sleep Res. 2002;11:1-16. 6. C) O distúrbio não pode ser melhor explicado por outro distúrbio do sono, doenças médicas ou neurológicas, uso de medicações ou distúrbio por uso de substâncias Young T, Palta M, Dempsey J, Skatrud J, Weber S, Badr S. The occurrence of sleep-disordered breathing among middle-aged Repercussions of a sleep medicine outreach program. Brazilian Journal of Medical and Biological Research. 2006;39:1057-63. que 90% · PaCO2 acentuadamente elevado ou desproporcionalmente maior que na vigília Andersen ML, Bittencourt LRA. Fisiologia do Sono. In: Tufik Barbé F, Pericás J, Muñoz A, Findley L, Antó JM, Agustí AG. Automobile accidents in patients with sleep apnea syndrome: an epidemiological and mechanistic study. Am J Respir Crit Care Med. 1998;158:18-22. 7. 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O reconhecimento precoce dos distúrbios respiratórios relacionados ao sono permite uma abordagem terapêutica mais efetiva com melhor prognóstico e sobrevidas dos pacientes acometidos pelos mesmos. REFERÊNCIAS 1. Douglas NJ. Respiratory physiology: control of ventilation. In: Kryger MH, Roth T, Dement WC, editors. Principles and Practice of Sleep Medicine. 4th ed. 2005. p. 224-31. 28 20h as 20h30 Abordagem do Derrame Pleural Dr. Luiz Francisco Ribeiro Médici 20h30 as 21h Diagnóstico de Tuberculose Pulmonar Dra. Luciene Franza Degering Coquetel Inscrições: APM - Associação Paulista Medicina (Srta. Márcia - 11 4330-6166 / 4125-4439 Apoio: Boehringer Ingelheim Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia Associação Paulista de Medicina Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA E DISTÚRBIO RESPIRATÓRIO DO SONO Autora: Marília Montenegro Cabral Serviço: Hospital Otávio de Freitas - Recife - PE 1. INTRODUÇÃO A fisiologia respiratória durante o sono é consideravelmente diferente quando comparada à vigília. O controle respiratório, a função neuromuscular e a resistência da via aérea superior são alterados durante o sono em indivíduos saudáveis1. A passagem da vigília ao sono está associada à queda de 5 a 10% da ventilação minuto com queda adicional de até 40% durante o sono de movimentos rápidos dos olhos (REM)2. Também foi demonstrado em indivíduos saudáveis a redução da resposta ventilatória à hipóxia e hipercapnia durante a transição vigília e sono não REM além de redução maior durante o sono REM. Essas alterações fisiológicas que ocorrem normalmente durante o sono não promovem efeitos deletérios em indivíduos saudáveis, entretanto em portadores da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) acentuadas hipoxemia e hipercapnia podem ocorrer3,4. Portanto, a hipoxemia durante o sono é frequente na DPOC e é mais acentuada em relação à vigília e à encontrada durante um exercício máximo5. Além das alterações fisiológicas encontradas durante o sono algumas patologias próprias do sono, em especial a Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS), quando presente em portadores da DPOC, causa grandes repercussões e contribui para hipoxemia, hipercapnia e hipertensão pulmonar. Esse artigo pretende revisar os mecanismos fisiopatológicos da hipoxemia noturna no portador da DPOC, suas conseqüências e tratamento enfatizando a associação DPOC e SAOS. 2. Patogênese da hipoxemia noturna Os principais mecanismos fisiopatológicos responsáveis pela hipoxemia noturna na DPOC são: hipoventilação, alteração da ventilação/perfusão e SAOS. 2.1. Hipoventilação: Diversos estudos6,7 consideram que a hipoventilação é a principal causa de hipoxemia noturna e existe documentação de redução da ventilação minuto quando comparada à vigília de 12% no estágio 2 do sono não REM, 19% no estágios 3 e 4 do sono não REM e 35% no sono REM 8 . Os mecanismos que levam a hipoventilação são: redução da taxa metabólica basal, aumento da resistência da via aérea superior e perda do estímulo da vigília para respirar. A Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 hipoventilação pode ser ainda maior na fase do sono REM quando ocorre uma acentuada hipotonia da musculatura acessória e intercostal da respiração, resultando em diminuição da contribuição da caixa torácica para a ventilação e tornando o diafragma o principal músculo responsável pela ventilação. A hiperinsuflação pulmonar da DPOC promovendo a retificação de cúpulas diafragmáticas e, portanto uma contração diafragmática ineficaz faz com que a musculatura acessória da respiração exerça um papel fundamental na ventilação. A hipotonia fisiológica da musculatura acessória que ocorre durante o sono REM, acarreta hipoventilação com acentuada hipoxemia. A figura 1 exemplifica um paciente portador da DPOC com quedas acentuadas da saturação periférica de oxigênio (SpO2) durante a fase REM. Fig. 1 - Hipnograma e traçado de oximetria de um paciente DPOC: nota-se profunda hipoxemia relacionada ao sono REM 17. 2.2. Alteração da ventilação/perfusão: Especula-se que alteração da ventilação/perfusão durante o sono contribua para a hipoxemia. Essa alteração é sugerida pela diminuição proporcionalmente maior da saturação arterial de oxigênio (SaO2) em relação a PaCO2 durante o sono no portador da DPOC. A piora da alteração ventilação/perfusão durante o sono pode ser explicada por alterações da ventilação enquanto o débito cardíaco mantém-se relativamente estável. As alterações da ventilação durante o sono podem ser explicadas por pelo menos dois mecanismos: 1. Redução da tosse com tendência ao acúmulo de secreções. 2. Redução da capacidade residual funcional contribuindo para o 29 fechamento de pequenas vias aéreas em zonas pulmonares dependentes. 2.3. Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono: A SAOS é caracterizada por obstruções recorrentes das vias aéreas superiores durante o sono, com conseqüente, hipoxia e hipercapnia, associadas à fragmentação do sono e sonolência excessiva diurna. A SAOS é encontrada em 2 a 4% da população adulta saudável9 e pode ser ainda mais prevalente em populações específicas, tais como em portadores de obesidade, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca congestiva e hipertensão pulmonar. Tanto a SAOS como a DPOC são condições clínicas comuns e, portanto é de se esperar que a associação entre as duas patologias não seja rara. Foi cunhado o termo “overlap syndrome”10 quando as duas condições clínicas estão presentes num mesmo paciente. A “overlap syndrome” (figura 2) resulta em hipoxemia relacionada ao sono acentuada com maior tendência a hipercapnia, hipertensão pulmonar e cor pulmonale, conferindo a esses pacientes um pior prognóstico11. Fig. 2 - Traçado da monitorização respiratória de uma polissonografia de um portador da DPOC: nota-se apnéia obstrutiva levando à dessaturação acentuada17 Uma revisão cuidadosa da literatura mostra que há escassos estudos com metodologia adequada e que os resultados de prevalência da SAOS em pacientes com diagnóstico da DPOC são variáveis na dependência de como a população alvo foi selecionada. O próprio valor de eventos respiratórios mínimo, determinado pelo índice de apnéia e hipopnéia (IAH), utilizado como critério polissonográfico para o diagnóstico da SAOS, é variável de estudo para estudo. Também é variável a definição da DPOC adotada pelos diversos estudos. Estudos iniciais documentaram prevalência da SAOS em portadores da DPOC e prevalência da DPOC em portadores da SAOS elevada11,12,13. Já estudos mais recentes citam prevalência da SAOS semelhante à população geral14. A primeira descrição de ocorrência da SAOS em população com diagnóstico da DPOC foi de Guilleminault e col. 12 que estudaram 26 pacientes encaminhados ao laboratório de sono por sonolência excessiva diurna e evidenciaram a SAOS em 80% dos pacientes. Bradley e col.13 e Chaouat e col.11 ao estudarem pacientes (n = 50 e 265, respectivamente) consecutivos portadores da SAOS 30 evidenciaram prevalência da DPOC de 14% e 11%, respectivamente. Viegas e col.15 estudaram 21 portadores da DPOC e encontraram a SAOS em 9,5% dos pacientes. O número pequeno de pacientes desses estudos e a seleção dos mesmos através de laboratórios de sono ou de clínicas de doenças respiratórias não permitem conclusões definitivas em relação à prevalência da associação SAOS e DPOC. Atualmente a prevalência da DPOC, definida pela relação VEF1/CVF < 70%, é descrita em torno de 10% em populações de adultos com idade maior ou igual a 40 anos e pode alcançar 20%16. A questão da prevalência da SAOS em portadores da DPOC com leve limitação do fluxo aéreo foi recentemente esclarecida através de uma grande estudo prospectivo populacional multicêntrico14. Os participantes pertenciam ao “Sleep Heart Health Study” e um total de 5954 participantes foram submetidos à espirometria e polissonografia noturna. Os principais achados foram: 1) Prevalência da DPOC de 19%, destes, apenas 3,8% apresentavam relação VEF1/CVF < 60%; 2) Prevalência da SAOS, IAH > 10/h e IAH > 15/h, de 22% e 14% respectivamente entre portadores da DPOC e 3) Prevalência da SAOS, IAH > 10/h e IAH > 15/h, de 29% e 19% respectivamente entre não portadores da DPOC. Neste grande estudo populacional a maioria da população portadora da DPOC apresentava leve limitação do fluxo aéreo (relação VEF1/CVF > 60%) e, portanto esses resultados não podem ser extrapolados para populações com moderada a acentuada limitação do fluxo aéreo. Em estudo também recente, embora com portadores da DPOC apenas com moderada a acentuada limitação do fluxo aéreo (n = 50 pacientes) e aleatoriamente estudados através de polissonografia completa no laboratório de sono, Cabral MM, encontrou uma prevalência de 28% da SAOS nesta população17. Portanto, de acordo com as evidências recentes da literatura, a prevalência da SAOS em portadores da DPOC é elevada embora não seja superior à população geral de mesma idade. 3. Definições e preditores de hipoxemia noturna e SAOS no portador da DPOC. Indicações para realização de polissonografia. Um evento de dessaturação é usualmente definido na literatura como a queda de 4% da SaO2 em relação ao nível basal obtido durante uma respiração tranqüila imediatamente antes do episódio de hipoxemia18. É provável que o número de eventos de dessaturação não seja o melhor índice de oxigenação no portador da DPOC. Alguns autores (19,20) identificaram um percentual de duração de registro com a SpO2 abaixo de 90% ou 80% para definição da presença de dessaturação noturna e abaixo do valor preconizado observaram aumento da pressão em artéria pulmonar com maior tendência ao desenvolvimento de hipertensão pulmonar. Por exemplo, Levi-Valensi e col19 definiram dessaturação noturna em portadores da DPOC com PaO2 > 60 mmHg como a documentação de SpO2 abaixo de 90% por > 30% de duração do registro. Outra definição proposta por Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Fletcher e col.20 é a documentação de queda da SpO2 abaixo de 90% > 5 minutos e com o nadir da dessaturação de no mínimo 85%. Outro parâmetro utilizado é a média da SpO2 durante o sono. Em geral existe uma boa correlação entre os níveis de hipoxemia diurna e a gravidade da hipoxemia noturna. Este fato é facilmente explicado pelo formato da curva de dissociação da oxi-hemoglobina. Embora seja mais freqüente e grave a dessaturação noturna em pacientes com hipoxemia diurna significativa, Fletcher e col20 documentaram a presença de dessaturação noturna em 30% dos pacientes com PaO2 > 60 mmHg. O nível de hipercapnia diurno também é um importante preditor de dessaturação noturna21, embora poucos estudos da literatura monitorizaram a PaCO2 durante o sono. A obesidade presente em um subgrupo de pacientes também é responsável pela maior dessaturação noturna. A definição da SAOS significativa é baseada na documentação polissonográfica de IAH alterado (e” 10 ou e” 15 eventos/hora de sono) associado a sintomas clínicos, tais como, fragmentação do sono e sonolência diurna excessiva18. Pelo fato da “overlap syndrome” ser freqüente devemos sempre pensar nesta possibilidade e procurar afastá-la. As variáveis clínicas de correlação positiva para SAOS no portador da DPOC são: a presença de ronco alto e freqüente, grande circunferência do pescoço, e padrão clínico-funcional definido como “polo bronquite” (inclui pacientes com índice de massa corpórea maior) 17. Vários estudos demonstraram que os achados da prova de função pulmonar não se correlacionam com a SAOS 14,15. As recomendações da literatura4,22 para indicação de polissonografia nos portadores da DPOC estão discriminadas na tabela 1. 4. Conseqûencias principais da hipoxemia noturna, especialmente da “Overlap Syndrome”. 4.1. Qualidade do sono: Muitos portadores da DPOC apresentam reduzida qualidade do sono23 caracterizada por eficiência do sono reduzida, latência para o início do sono aumentada e fragmentação da arquitetura do sono, Tabela 1 - Indicações de polissonografia em portadores da DPOC. 1. Sintomas sugestivos da SAOS (ronco alto, apnéia presenciada por familiar e sonolência excessiva diurna). 2. Policitemia na presença de PaO2 em vigília > 60 mmHg. 3. Hipertensão pulmonar na presença de PaO2 em vigília > 60 mmHg 4. Pacientes com queixa de cefaléia matinal em programa de oxigenoterapia. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 independente da gravidade da limitação do fluxo aéreo e dependente da presença da SAOS 14 . A causa é provavelmente multifatorial e inclui tosse noturna; dispnéia; uso de medicações, como a teofilina, e hipoxemia recorrente. Os portadores da “overlap syndrome” em comparação com os portadores da DPOC isolada apresentam pior qualidade de sono. 4.2. Circulação pulmonar: Os estudos que avaliaram a hemodinâmica pulmonar durante o sono em portadores da DPOC grave com PaO2 < 55/60 mmHg e em sua maioria com hipertensão pulmonar permanente, demonstraram que os episódios de hipoxemia não relacionados a SAOS, especialmente durante o sono REM, foram acompanhados de elevações da pressão de artéria pulmonar. Já em pacientes com PaO2 > 60 mmHg e ausência da SAOS, não há uma clara evidência se a hipoxemia noturna isolada poderá levar ao aumento de risco de hipertensão pulmonar 21,24. No entanto, os portadores da “overlap syndrome” apresentam risco aumentado de desenvolver hipertensão pulmonar (11) , especialmente se hipoxêmicos e com grave limitação ao fluxo aéreo. 4.3. Aumento de risco cardiovascular: Shepard e col25 documentaram que os episódios de hipoxemia noturna aumentavam a demanda de oxigênio para o miocárdio em nível superior ao encontrado no exercício. Também foi descrito 26 aumento do número de arritmias cardíacas representadas por extra-sístoles ventriculares e supraventriculares à noite em portadores da DPOC, especialmente em pacientes com hipoxemia noturna acentuada. A SAOS deflagra uma cascata de fatores chaves envolvidos na gênese da aterosclerose, incluindo a produção de espécimes reativas de oxigênio, fatores de coagulação e, especialmente, inflamação sistêmica, os quais podem ser responsáveis pelo aumento do risco de infarto miocárdico27,28 e acidente vascular cerebral29. Lorenzi-Filho G. e col.30 recentemente estudaram um grupo de portadores da SAOS e um grupo controle sem doença concomitante e livre de medicação e documentaram que, em contraste com o grupo controle, os portadores da SAOS apresentavam sinais precoce de aterosclerose. Portanto, a presença da SAOS no portador da DPOC pode aumentar o risco de mortalidade por doença cardiovascular. 4.4. Policitemia: Hipoxemia permanente é causa bem conhecida de policitemia embora ainda não está definitivamente demonstrada que a hipoxemia noturna isolada também induz policitemia. 5. Tratamento da hipoxemia noturna no portador da DPOC Um dos maiores objetivos do tratamento da DPOC com insuficiência respiratória avançada é corrigir a hipoxemia, já que desde 1980 se documentou redução de mortalidade nos portadores da DPOC hipoxêmicos que faziam uso de oxigenoterapia31. 5.1 Oxigênio: Não há dúvidas na literatura sobre a indicação de oxigenoterapia contínua nos portadores da 31 DPOC estável que apresentam acentuada e persistente hipoxemia, caracterizada por PaO2 < 55 mmHg ou PaO2 < 60 mmHg associada a sinais de cor pulmonale31,32. A duração diária da oxigenoterapia deve ser no mínimo 16 horas/dia, sendo mandatória durante o sono, para que os benefícios responsáveis pela redução da mortalidade sejam alcançados. Por outro lado, para os portadores da DPOC que não preenchem os critérios para oxigenoterapia contínua, mas que apresentam dessaturação noturna, não existem dados suficientes na literatura que justifiquem o uso de oxigenoterapia noturna isolada 33,34. 5.2. Gerador de fluxo de pressão positiva contínua e ventilação não invasiva: Para os portadores da “overlap syndrome” está bem definida na literatura o uso do gerador de fluxo que mantém pressão positiva contínua na via aérea (CPAP) o qual pode ser associado ao oxigênio nos pacientes hipoxêmicos35. O CPAP promove a abertura da via aérea superior prevenindo o colapso e apnéias obstrutivas e todas as suas consequências deletérias: hipóxia, hipercapnia, aumento da pós-carga do ventrículo esquerdo e estimulação simpática excessiva. O controle da hipoxemia reduz a progressão da hipertensão pulmonar presente nesses pacientes. Vários ensaios clínicos recentes randomizados36,37, em portadores da SAOS tratados com CPAP demonstraram melhora do desempenho cognitivo, da sonolência diurna e redução do risco de complicações cardiovasculares. Pelo fato da hipoventilação alveolar representar um importante mecanismo responsável pela hipoxemia noturna no portador da DPOC, vários estudos38,39 foram realizados com o uso da ventilação não invasiva noturna (VNI) domiciliar associada ao oxigênio em portadores da DPOC estável com hipoxemia e hipercapnia e não portadores da SAOS. Os resultados dos estudos foram conflitantes em relação à redução da hipercapnia diurna, ao aumento do tempo total de sono, à melhora da qualidade de vida e à redução de internação hospitalar. Entretanto, em estudo recente multicêntrico40, o benefício da VNI associada ao oxigênio foi definitivamente demonstrado em relação a redução da hipercapnia, melhora da dispnéia e qualidade de vida. As recomendações da literatura38 para uso da VNI estão discriminadas na tabela 2. 6. CONCLUSÃO Como descrevemos, hipoxemias acentuadas, recorrentes ou persistentes são freqüentes no portador da DPOC e podem contribuir para o desenvolvimento precoce de hipertensão pulmonar e contribuir para sua piora clínica. Devemos procurar identificar o subgrupo de pacientes de risco para SAOS já que merece uma abordagem terapêutica específica. Sintomas clássicos para SAOS, tais como ronco alto e freqüente associado a apnéia testemunhada e portador da DPOC onde o grau de hipertensão pulmonar e policitemia não são justificados pela SaO2 de vigília devem ter o diagnóstico da SAOS descartado através de polissonografia. REFRÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. Tabela 2 - Indicações de ventilação não invasiva domiciliar para os portadores da DPOC estável hipercápnica. 1. DPOC estável sintomático apesar de tratamento medicamentoso otimizado e se um dos itens abaixo estiver presente: a. PaCO2 > 55 mmHg. b. PaCO2 de 50 a 54 mmHg e dessaturação noturna (SaO2 de 88% por 5 minutos consecutivos apesar de O2 suplementar de 2l/min) c. PaCO2 de 50 a 54 mmHg e uma ou mais hospitalização por descompensação da DPOC em 12 meses. 32 11. 12. 13. 14. Hudgel DW, Martin RJ, Johnson B et al. Mechanics of the respiratory system and breathing during sleep in normal humans. J Appl Physiol 1984;56:133-37. Gould GA, Molloy J. Breathing pattern and eye movement density during REM sleep in man. Am Rev Respir Dis. 1988;138:874-77. Weitzenblum E, Chaouat A. Sleep and chronic obstructive pulmonary disease. Sleep Med Rev.2004;8:281-94. McNicholas WT. Impact of sleep in COPD. Chest 2000;117:48-53. Mulloy E, McNicholas WT. Ventilation and gas exchange during sleep and exercise in severe COPD. Chest 1996;109:387-94. Catterall JR, Calverley PMA, MacNee W, et al. Mechanism of transient nocturnal hypoxemia in hypoxic chronic bronchitis and emphysema. J Appl Physiol 1985;59:1698-703. 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[email protected] 33 34 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 POLISSONOGRAFIA: CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS, REGISTROS, ESTUDOS COMPLETOS E SIMPLIFICADOS Autor: Rogério Santos da Silva Serviço: Disciplina de Medicina e Biologia do Sono, Departamento de Psicobiologia - Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP INTRODUÇÃO A polissonografia (PSG) é um termo genérico que se refere ao registro simultâneo de algumas variáveis fisiológicas durante o sono, tais como: eletroencefalograma (EEG), eletrooculograma (EOG), eletromiograma (EMG), eletrocardiograma (ECG), fluxo aéreo (nasal e oral), esforço respiratório (torácico e abdominal), outros movimentos corporais (através do EMG), gases sangüíneos (saturação da oxi-hemoglobina – SpO2, concentração de dióxido de carbono), posição corporal, entre outras. É considerada, pela Academia Americana de Medicina do Sono (AASM), o método diagnóstico “padrão-ouro” para os distúrbios do sono 1 . O registro polissonográfico é realizado no laboratório, durante uma noite inteira de sono, com acompanhamento por um técnico especializado em PSG 2,3. Além da PSG de noite inteira (Tipo 1), outros três tipos de registros, para diagnóstico da Sindrome da Apnéia obstrutiva do Sono (SAOS), são descritos na literatura 4, sendo: Tipo 2 – possui, no mínimo, sete canais de registro, incluindo EEG, EOG, EMG da região mentoniana, ECG, fluxo aéreo, esforço respiratório e SpO2. O registro é realizado na casa do paciente, sem acompanhamento técnico. A literatura ainda não apresenta evidências validando este método de registro. Tipo 3 – possui, pelo menos, quatro canais de registro, incluindo fluxo aéreo, esforço respiratório, freqüência cardíaca e SpO2. É considerada uma alternativa para diagnóstico em pacientes selecionados, com alta probabilidade clínica de SAOS. Recentemente, a força tarefa da AASM 5 recomenda o uso apenas em adultos, referindo a inexistência de dados que validem o seu uso na população acima de 65 anos, crianças e indivíduos com comorbidades (portadores de doenças pulmonares, neurológicas ou com doença cardiovascular). Tipo 4 - mede saturação e/ou fluxo aéreo. Não há evidências que suportem a recomendação para diagnostico de SAOS 5. CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS DA PSG REGISTRO DO SONO Em 1968, um comitê formado por experientes Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 pesquisadores em fisiologia e distúrbios do sono publicou, junto ao “Brain Information Service”, um manual de estagiamento de sono e técnica polissonográfica 6 . Entretanto, esse manual não incluía a análise e marcação de eventos associados. Em 2007, a AASM publicou um novo manual para estagiamento do sono e eventos associados, na tentativa de padronizar as regras, terminologia e especificações técnicas relacionadas à PSG7. Com base em evidências acumuladas na literatura, esse novo manual recomenda o registro mínimo de três derivações do EEG, duas derivações do EOG, EMG da região mentoniana, duas derivações de EMG do músculo tibial anterior (pernas esquerda e direita), parâmetros de fluxo aéreo, esforço respiratório, SpO2, posição corporal e ECG. Deve-se utilizar equipamentos de registro (polígrafos) com boa qualidade, sendo recomendada resolução digital mínima de 12 bits/amostra e freqüência de amostragem mínima de 200 Hz para EEG, EOG, EMG, ECG, e ronco, 25 Hz para fluxo aéreo, pressão esofágica e esforço respiratório, 10 Hz para oximetria e 1 Hz para posição corporal8. O conjunto de filtros recomendado para a PSG está descrito na Tabela 1. De acordo com o novo manual, o estagiamento do sono deve ser feito visualmente, por profissional treinado, já que não existem evidências de que os equipamentos digitais de registro do sono possam fazer a análise automática de maneira confiável 9. Tabela 1 - Conjunto de filtros rotineiramente utilizados na polissonografia Variável Filtro de baixa freqüência (Hz) Filtro de alta freqüência (Hz) EEG 0,3 35 EOG 0,3 35 EMG 10 100 ECG 0,3 70 Respiração 0,1 15 Ronco 10 100 35 O estagiamento do sono é baseado na observação de grafoelementos específicos do EEG durante o sono, que permite a identificação dos padrões do sono não REM (NREM) e do sono REM. É recomendada a colocação das derivações F4-M1(mastóide esquerdo), C4-M1 e O2-M1, para observação das ondas lentas do sono profundo e dos complexos K, ondas agudas do vértex e fusos do sono, e do ritmo alfa, respectivamente. Os eletrodos F3, C3, O1 e M2 (mastóide direito) também devem ser colocados como reserva, em caso de artefatos com os eletrodos recomendados. São colocados no couro cabeludo de acordo com o Sistema 10-20 de colocação de eletrodos10, após a adequada preparação da pele. Devem ser bem fixados, para que resistam ao longo período de registro do sono, geralmente com a utilização de colódio elástico. Eletrodos para observação dos movimentos rápidos dos olhos que ajudam na identificação do sono REM, além dos movimentos rotatórios lentos dos olhos, característicos da transição da vigília-sono. Esses eletrodos registram a diferença de potencial do globo ocular, sendo a córnea positiva em relação à retina. Um eletrodo é colocado um centímetro acima do canto externo do olho direito e outro eletrodo é posicionado um centímetro abaixo do canto externo do olho esquerdo. Ambos são referidos com M2 e fixados com fita adesiva. A outra variável fisiológica recomendada para estagiamento do sono é o EMG da região mento/ submentoniana. Três eletrodos são colocados, sendo que dois eletrodos são utilizados para o registro e o 3º eletrodo e utilizado como reserva. O 1º eletrodo é posicionado na linha media do queixo e um cm acima do osso da mandíbula, o 2º é colocado um cm abaixo do osso da mandíbula e dois cm a direita da linha média, e o 3º eletrodo é fixado dois cm abaixo do osso da mandíbula e dois cm a esquerda da linha média. Essa derivação permite a observação da diminuição do tônus muscular característico do sono REM, em comparação com o sono NREM. ESTAGIAMENTO DO SONO O novo manual da AASM recomenda a seguinte terminologia para denominação dos estágios do sono: a vigília é denominada como Estagio V (ou estágio W, do termo inglês “Wakefulness”); o sono NREM é dividido em três estágios - N1, N2 e N3, no sentido do mais superficial para o mais profundo; e o sono REM é denominado estágio REM 9. Para o estagiamento do sono, o registro polissonográfico é dividido em intervalos de tempo com 30 segundos de duração, denominados épocas. Esse “sistema de épocas” para estagiamento do sono assegura que toda a PSG seja dividida em segmentos consecutivos de tamanhos iguais e que cada segmento represente um único estágio. Quando, numa mesma época, mais de um estágio estiver presente, deve-se considerar o estágio que compreender a maior porção da época. 36 As seguintes regras são recomendadas pela AASM para estagiamento do sono7,9: Estágio V A. Considerar estágio V para épocas que apresentem mais de 50% de ritmo alfa (8 a 13 Hz) na região occipital. B. Considerar como estágio V as épocas sem alfa característico, mas que apresentem: 1) Piscamentos com freqüência de 0,5 a 2 Hz; 2) Movimentos oculares de leitura (fase lenta seguida por fase rápida na direção oposta); 3) Movimentos irregulares dos olhos em associação ao tônus muscular preservado. Estágio N1 A. Em indivíduos com presença de ritmo alfa proeminente, considerar estágio N1 para épocas que apresentem atenuação do ritmo alfa pela intrusão de atividade EEG com freqüências mistas de baixa voltagem (predominantemente 4-7 Hz) em mais de 50% da época. B. Em indivíduos sem presença de ritmo alfa proeminente, considerar o aparecimento do 1º dos seguintes eventos: 1) Atividade EEG com freqüências mistas de baixa voltagem, com lentificação maior que 1 Hz da linha de base do estágio V. 2) Ondas agudas do vértex (ondas agudas com duração menor que 0,5 segundo, que destacam-se da linha de base, com maior amplitude na região central). 3) Movimentos oculares rotatórios lentos. Estágio N2 A. As seguintes regras definem o início de um período de estágio N2: 1) Começar o estagiamento de N2 se pelo menos um dos seguintes eventos ocorrerem na 1ª metade da época ou na 2ª metade da época anterior: a. Um ou mais complexos K (onda com componente negativo rápido seguido por componente positivo mais lento, com duração maior ou igual a 0,5 segundo, com máxima amplitude na região frontal) não associados a despertares; b. Um ou mais fusos do sono (trem de ondas com freqüências de 11 a 16 Hz – geralmente de 12-14 Hz), com maior amplitude em regiões centrais). Estágio N3 A. Considerar estágio N3 quando 20% ou mais da duração da época apresentar atividade EEG com ondas lentas (freqüências de 0,5 a 2 Hz e amplitude maior que 75 µV, de pico-a-pico). Estágio R A. Marcar com estágio R as épocas que apresentarem todos os seguintes eventos: a. Freqüências mistas com baixa amplitude no EEG, com ou sem presença de ondas em dentes-de-serra (triangulares, Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 2 a 6 Hz, com maior amplitude em regiões centrais); b. Baixo tônus no EMG do queixo; c. Movimentos rápidos dos olhos. Essa terminologia para estagiamento do sono pode ser aplicada para crianças acima dois meses pós-termo. O estagiamento do sono em crianças com menos de dois meses de idade foi discutido pela Força Tarefa de Pediatria da AASM 11. EVENTOS ASSOCIADOS AO SONO Despertares do EEG Os despertares do EEG são eventos observados durante a PSG e estão associados à fragmentação do sono. De acordo com a recomendação do novo manual da AASM7, os despertares do EEG são definidos como uma alteração abrupta na freqüência do EEG (teta, alfa ou beta – excluindose fusos) com, pelo menos, três segundos de duração, precedido por, no mínimo 10 segundo de sono estável. A marcação dos despertares do EEG deve incorporar informações da atividade das regiões central e occipital. Pode ser marcado nos estágios N1, N2, N3 e REM. Entretanto, durante o estágio REM, a marcação do despertar do EEG requer aumento concomitante do EMG do queixo com, no mínimo, um segundo de duração12. Os despertares do EEG devem ser marcados independentemente do estagiamento do sono, isto é, despertares do EEG podem ser marcados em épocas de vigília, desde que nela ocorram 10 segundos consecutivos de sono antes da alteração abrupta da freqüência do EEG13. MOVIMENTOS ANORMAIS O novo manual da AASM 7 recomenda que sejam marcados rotineiramente na PSG, pois têm características PSG específicas, os seguintes movimentos anormais14: MOVIMENTOS PERIÓDICOS DE PERNAS DURANTE O SONO (MPPS) Para registro dos movimentos de perna durante o sono são colocados dois eletrodos sobre o músculo tibial anterior de cada perna. É considerado movimento de perna um aumento da amplitude do EMG maior ou igual a 8 µV acima da linha do repouso, com duração mínima de 0,5 e máxima de 10 segundos. O critério de fim do movimento é baseado na diminuição da amplitude do EMG para menos de 2 µV acima da linha do repouso, por mais de 0,5 segundo. Para que o movimento seja considerado periódico, deve estar incluído numa sequência de, pelo menos, 4 movimentos, com intervalo de 5 a 90 segundos entre dois movimentos consecutivos. MPPS devem ser associados com despertares do EEG quando o tempo entre eles for menor que 0,5 segundo (não importando quem ocorreu primeiro). Movimentos de pernas podem estar associados com o final do evento respiratório ou promover um aumento no Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 registro do fluxo aéreo, quando o tempo entre eles for menor que 0,5 segundo. Entretanto, estes movimentos não devem ser incluídos nos parâmetros de MPPS. Pacientes com SAOS podem apresentar associação com MPPS, mas o clínico deve tratar a SAOS para desmascarar o MPPS. BRUXISMO De acordo com a AASM 7,14, a identificação de bruxismo pode ser feita pela observação do registro da derivação do EMG do queixo. Entretanto, a critério do investigador, eletrodos nos músculos masseteres podem ser incluídos na montagem da PSG. As seguintes regras são recomendadas para definição de Bruxismo: 1) Elevação mantida (evento tônico) ou em abalos (evento fásico) da atividade do EMG do queixo, com aumento da amplitude superior à duas vezes a linha de base. 2) Breves elevações da atividade do EMG do queixo são marcadas como bruxismo se durarem 0,25 a 2 seg e se ocorrerem numa seqüência de pelo 3 eventos. 3) Elevações mantidas do EMG do queixo são marcadas se durarem mais que 2 segundos. 4) Entre dois eventos de bruxismo deve ocorrer um período maior que três segundos sem aumento da atividade do EMG. 5) Bruxismo pode ser estagiado confiavelmente na PSG associado a dois ou mais episódios audíveis, na ausência de epilepsia. DISTÚRBIO COMPORTAMENTAL DO SONO REM (DCSREM) A PSG apresenta uma ou ambas características em indivíduos com DCSREM 14: 1) Atividade do EMG do queixo mantida (em mais de 50% da época) durante estágio R. 2) Atividade muscular transitória excessiva durante o estágio R, no EMG do queixo ou pernas. DISTÚRBIO RÍTMICO DE MOVIMENTO A AASM 7,14 recomenda, para identificação de Distúrbio rítmico de movimento, que sejam colocados eletrodos de superfície para registro de EMG dos grandes grupos musculares envolvidos, observando-se as seguintes regras de identificação: 1) Freqüência mínima para marcação de movimentos rítmicos = 0,5 Hz. 2) Freqüência máxima para marcação de movimentos rítmicos = 2,0 Hz. 3) Número mínimo de movimentos para fazer um “cluster” de movimentos rítmicos = 4. 4) A amplitude mínima de um abalo deve ser igual a duas vezes a amplitude do EMG basal. A PSG com vídeo sincronizado, em adição ao critério PSG, é necessária para diagnóstico de Distúrbio Rítmico do Movimento7. 37 EVENTOS RESPIRATÓRIOS De acordo com a AASM 7,15, a identificação da apnéia do sono deve ser feita com base no registro do fluxo aéreo realizado pelo sensor denominado termístor (ou termopar). O termistor é capaz de detectar as variações na temperatura do fluxo aéreo por variação da sua resistência elétrica. Alguns termístores combinam sensores capazes de determinar o fluxo aéreo de ambas as fossas nasais e da boca, simultaneamente. São colocados imediatamente abaixo do nariz e fixados por fita adesiva ou esparadrapo. As hipopnéias devem ser identificadas a partir do sinal de fluxo aéreo registrado por uma cânula nasal conectada a um transdutor de pressão. Para classificação da apnéia, o esforço respiratório do tórax e do abdome deve ser registrado. A pressão esofágica ou a pletismografia de indutância são os métodos recomendados para registro do esforço respiratório. A AASM 7,15 recomenda, para marcação de apnéias, que o evento respiratório deve encontrar todos os seguintes critérios: 1) Queda da amplitude do registro do termístor maior ou igual a 90% da linha de base; 2) A duração mínima do evento é de 10 segundos; 3) Pelo menos 90% da duração do evento encontra o critério de redução da amplitude. A presença de dessaturação da oxi-hemoglobina não é critério para marcação de apnéias. Baseada no esforço inspiratório, a apnéia do sono pode ser classificada em: apnéia obstrutiva: ausência do fluxo aéreo e manutenção do esforço respiratório; apnéia central: ausência do fluxo aéreo e ausência do esforço respiratório; e apnéia mista: o início do evento respiratório apresenta ausência do fluxo aéreo e ausência do esforço respiratório e, no final do evento, a ausência do fluxo aéreo persiste mesmo após a retomada do esforço respiratório. A definição recomendada para hipopnéia inclui uma queda maior que 30% da amplitude do fluxo aéreo pela cânula nasal, com duração mínima de 10 segundos, associada a dessaturação da oxi-hemoglobina maior de 4%. A AASM oferece, ainda, uma definição alternativa para hipopnéia, que sugere marcar o evento respiratório que encontrar queda da amplitude do registro da cânula nasal maior ou igual a 50% da linha de base, com duração mínima de 10 segundos, associada a dessaturação da oxihemoglobina maior de 3% ou a um despertar do EEG. Apenas uma das definições deve ser utilizada para marcação da hipopnéia durante a análise de uma PSG. A análise da PSG pode incluir, opcionalmente, a marcação do Despertares Relacionados ao Evento Respiratório (“Respiratory Effort Related Arousals” – RERA), quando ocorrer um evento maior ou igual a 10 segundos, caracterizado por aumento do esforço respiratório, mensurado pela pressão esofágica, ou achatamento da onda da pressão nasal, que leve a um despertar do EEG (quando o evento não encontrar critérios para marcação de 38 apnéia ou hipopnéia)7,15. Hipoventilação pode, opcionalmente, ser marcada na PSG se houver aumento maior ou igual a 10 mmHg na PaCO2, durante o sono, em comparação aos valores em vigília, em posição supina. A AASM 7,15 ressalta que a dessaturação persistente da oxi-hemoglobina não é suficiente para marcação de hipoventilação e que não há evidências de que sensores de medida indireta (CO 2 transcutâneo ou exalado) substituam a medida da PaCO2, em adultos. É recomendada a marcação da Respiração de CheyneStokes quando houver presença de, no mínimo, três ciclos consecutivos do padrão respiratório cíclico (padrão crescendo – decrescendo), em associação a, pelo menos, um dos seguintes critérios: cinco ou mais apnéias ou hipopnéias centrais por hora de sono e/ou duração do padrão respiratório cíclico maior ou igual a 10 minutos consecutivos7,15. RELATÓRIO DA PSG Após o estagiamento do sono e marcação dos eventos associados, deve ser criado um relatório resumindo os principais achados da PSG. A AASM recomenda a inclusão dos seguintes parâmetros no relatório da PSG7: Dados do estagiamento do sono 1) Horário de “luzes apagadas” (h:min) 2) Horário de “luzes acesas” (h:min) 3) Tempo total de sono (TTS; em min) 4) Tempo total de registro (TTR; de “luzes apagadas” até “luzes acesas”, em min) 5) Latência do sono (LS; de “luzes apagadas” até a primeira época de qualquer estágio de sono, em min) 6) Latência de estágio R (do início do sono até a primeira época do estágio R, em min) 7) Vigília após o início do sono (estágio V durante TTR, menos LS, em min) 8) Porcentual de eficiência do sono (TTS/TTR) x 100 9) Tempo em cada estágio do sono (min) 10) Porcentual do TTS em cada estágio do sono (Tempo em cada estágio (min)/TTS) x 100 Despertares 1) Número de despertares 2) Índice de despertares (número de despertares/TTS) Eventos respiratórios 1) Número de apnéias obstrutivas 2) Número de apnéias mistas 3) Número de apnéias centrais 4) Número de hipopnéias 5) Número de apnéias + hipopnéias 6) Índice de apnéia (IA = (número de apnéias obstrutivas + Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 número de apnéias mistas + número de apnéias centrais) x 60/TTS 7) Índice de hipopnéia (IH = número de hipopnéias x 60/ TTS) 8) Índice de apnéia + hipopnéia (IAH = número de apnéias + hipopnéias x 60/TTS) 9) Despertares relacionados ao esforço respiratório, número total (opcional) 10) Índice de despertares relacionados ao esforço respiratório (número total de despertares relacionados ao esforço respiratório x 60/TTS) (opcional) 11) Dessaturações da oxi-hemoglobina e” 3% ou e” 4%, número total (opcional) 12) Índice de dessaturação da oxi-hemoglobina e” 3% ou e” 4% (número total de dessaturações da oxi-hemoglobina e” 3% ou e” 4% x 60/TTS) (opcional) 13) Saturação da oxi-hemoglobina contínua, valor médio 14) Saturação da oxi-hemoglobina mínima durante o sono 15) Ocorrência de hipoventilação (sim / não) (opcional) 16) Ocorrência de respiração de Cheyne-Stokes (sim / não) REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. Eventos cardíacos 1) Freqüência cardíaca média durante o sono 2) Maior freqüência cardíaca durante o sono 3) Maior freqüência cardíaca durante o registro Deve-se relatar a ocorrência (sim / não) de arritmias cardíacas. Se presente, deve-se listar a freqüência cardíaca ou a duração da pausa. 7. 8. Movimentos 1) Número de movimentos periódicos de membros durante o sono (MPMS) 2) Número de movimentos periódicos de membros durante o sono (MPMS) associados a despertares 3) Índice de MPMS (MPMS x 60/TTS) 4) Índice de MPMS associados a despertares (MPMS associados a despertares x 60/TTS) Resumo 1) Achados relacionados a diagnósticos do sono 2) Anormalidades do EEG 3) Anormalidades do ECG 4) Observações comportamentais 5) Hipnograma (opcional) CONCLUSÃO O novo manual para estagiamento do sono da AASM representa uma tentativa de combinar as evidências disponíveis com a opinião de experientes investigadores em ciência e medicina do sono. Entretanto, como o campo do sono não é estático, o manual da AASM não pretende permanecer imutável. Assim, as regras sugeridas deverão ser periodicamente revisadas e modificadas com base em novos achados científicos. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Kushida CA, Littner MR, Morgenthaler T, Alessi CA, Bailey D, et al. Practice parameters for the indications for polysomnography and related procedures: an update for 2005. Sleep 2005;28(4):499-523. Bittencourt LRA, Silva RS, Conway SG. Laboratório do sono – Estrutura física e pessoal, técnica polissonográfica, questionário de sono e banco de dados. Sao Paulo: AFIPAssociacao Fundo de Incentivo a Psicofarmacologia, 2005. AASM – American Academy of Sleep Medicine. ICDS-2 - International Classification of Sleep Disorders, 2nd ed., Diagnostic and Coding Manual. Westchester,Il. 2005. ASDA - American Sleep Disorders Association. 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Redline S, Budhiraja R, Kapur V, Marcus CL, Mateika JH, et al. The Scoring of Respiratory Events in Sleep: Reliability and Validity. J Clin Sleep Med 2007; 3(2):169200. [email protected] 39 RELATO DE CASO HIPOVENTILAÇÃO COM MÚLTIPLAS CAUSAS Autores: Sérgio Roberto Nacif; Mauri Monteiro Rodrigues Serviço: Serviço de Doenças do Aparelho Respiratório do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo INTRODUÇÃO A hipoventilação do sono na polissonografia noturna ocorre quando se observa aumento acima de 10mmHg na PaCO 2 , em relação ao basal, geralmente associado à dessaturação da oxi-hemoglobina, na ausência de eventos respiratórios obstrutivos. A Síndrome Obesidade/Hipoventilação (SOH) ocorre quando estão presentes obesidade (IMC>30Kgm²) e hipercapnia crônica (PaCO2>45mmHg), acompanhadas de SAOS em aproximadamente 90% dos casos (SAOS hipercápnica). Nos demais pacientes que não apresentam eventos obstrutivos do sono, a síndrome é chamada de hipoventilação do sono2. A associação entre DPOC e SAOS, conhecida como “Overlap Syndrome”, produz alterações nas trocas gasosas mais acentuadas, hipertensão pulmonar. Estes pacientes são mais graves, internam-se mais freqüentemente. RELATO DE CASO ID - Mulher, 61 anos, branca, aposentada, natural e procedente de São Paulo. MEDICAMENTOS • Enalapril, amlodipino e hidroclorotiazida • Ziprasidona 80mg/ dia, biperideno 2 mg/dia e clonazepan 2 mg/dia. EXAME FÍSICO Torporosa, confusa, IMC= 25kg/m2; Respiratório – cianótica, f=24irpm, roncos e sibilos difusos; Cardiovascular – ritmo regular e P2 hiperfonética, fc=100bpm e PA=150x95mmHg; MMII – edema +++/4+ EXAMES • HMG: Hb-19,6g/dl e Ht-65%, Leucócitos-normais e PLT36000 • Gasometria arterial (FiO2=0,21) pH=7,43 PaO2=39,4mmHg PaCO2= 71mmHg BE=+20 • Uréia e creatinina – normais • ECG – ritmo sinusal, regular, eixo QRS negativo e P pulmonale • Radiograma de tórax (figura 1) HPMA Paciente internada, procurou o hospital com queixa de dispnéia progressiva há alguns meses, associada à fraqueza dos membros inferiores, maior na perna direita, e edema. Referiu piora dos sintomas na última semana, agora com ortopnéia e dificuldade para caminhar devido à fraqueza dos membros. Negava perda ponderal e sintomas compatíveis com infecção. COMORBIDADES HAS, DPOC, esquizofrenia. Investigação na hematologia de eritrocitose e plaquetopenia de causa desconhecida. HÁBITOS Tabagista 45maços/ano Fig 1 - Radiograma Tórax PA – presença de cardiomegalia 40 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 HIPÓTESES DIAGNÓSTICAS: • HAS • DPOC • Poliglobulia secundária à hipoxemia • Cor pulmonale • Insuficiência cardíaca esquerda? • Narcose pelo CO2 e ou AVC? • Esquizofrenia EVOLUÇÃO Realizada TC de crânio que afastou AVC e processo expansivo. Iniciadas medidas para broncoespasmo, diurético, sangria de 500ml e oxigênio suplementar 4L/min, via cateter nasal. Após as medidas terapêuticas, a paciente teve melhora importante da parte cognitiva. Foram solicitados gasometria arterial e hemograma de controle, além de ecocardiograma. Por indicação da psiquiatria, foram suspensos ziprasidona e biperideno, por se tratar de antipsicóticos de ação central com possível efeito sedativo e que poderiam interferir na ventilação da paciente. Introduzida olanzapina e mantido clonazepan. Hemograma (após sangria) Hb-17,6g/dl e Ht- 56% Gasometria arterial com O2 3l/min: pH-7,43 PaO2=61mmHg PaCO2=53mmHg e BE=+5 Ecocardiograma com doppler • Disfunção importante do VD • Insuficiência tricúspide acentuada • PSAP – 75mmHg • AE- 42 mm (aumento leve) • FEVE – 55% • Disfunção diastólica leve do VE O ecocardiograma diagnosticou hipertensão pulmonar (HP) com disfunção cardíaca direita. AE de tamanho normal, associado com FE>50%, torna pouco provável o componente venoso como a causa da HP, mesmo havendo grau leve de disfunção diastólica no ecocardiograma. Sendo assim, foram solicitadas prova de função pulmonar e tomografia de tórax com protocolo para embolia, para afastar hipertensão pulmonar tromboembólica. A ausência de falhas de enchimento na tomografia não afasta tromboembolismo pulmonar crônico como a causa Fig 2 - Tomografia de Tórax com protocolo para embolia CT Torax c/ protocolo para TEP: ausência de falhas de enchimento da HP, porém o parênquima pulmonar normal, sem padrão em mosaico, ou opacidades subpleurais, torna esta possibilidade pouco provável. Embora não exista relação da gravidade do enfisema na tomografia com o grau de obstrução na prova de função pulmonar, geralmente a HP secundária à DPOC é de leve à moderada e os pacientes são hipoxêmicos e com obstrução acentuada na prova de função pulmonar. Ainda que não tenha sido realizada tomografia de alta resolução para excluir doença do parênquima pulmonar como causa da hipoxemia, a paciente apresentava hipercapnia acentuada na gasometria arterial e após manobra de hiperventilação voluntária forçada em ar ambiente, houve correção da hipoxemia (SaO2 84 para 94%) o que corrobora redução do “drive” central como causa principal da hipoxemia4. Durante a internação, a paciente apresentou roncos intensos com apnéias presenciadas, sendo solicitada a polissonografia, que foi realizada com titulação de pressão positiva em vias aéreas na segunda metade da noite. Polissonografia com titulação (“split night”) e O2 3 L/min • IAH aumentado (10 eventos obstrutivos/hora). Ausência de apnéia central. • SaO2 basal sentada – 84%. Após O2 a 3 l/min – 92% • SaO2 média durante o sono - 92% e a mínima de 82% • Titulação - CPAP 9 cm H2O, com bom resultado. Prova de função pulmonar PREVISTO PRÉ BD % PREV PÓS BD %PREV CVF (L) VEF1 (L) 3.11 2.47 2.35 1.17 76% 47% 2.44 1.31 79% 53% VEF1/CVF 79% 50% 54% Laudo: Distúrbio ventilatório obstrutivo moderado com CVF reduzida por provável hiperinsuflação. Ausência de variação significativa de VEF1 e CVF após BD. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 41 Estágios do sono Posição corporal LM/PLM SaO2 Pulso Ronco Após 3 meses de acompanhamento ambulatorial e cessação do tabagismo, a paciente encontra-se sem queixas respiratórias e psiquiátricas, com melhora na qualidade do sono, em uso de β 2 de longa duração associado com corticóide inalatório, oxigênio domiciliar >19h/dia e CPAP noturno com pressão de 9 cm H2O, além das medicações habituais já citadas. Clinicamente a força muscular está preservada. Realizada gasometria arterial de controle, em ar ambiente, que revelou melhora principalmente na PaCO2:pH= 7.44; PaO2= 58.7 mmHg; PaCO2= 39mmHg; BE=+5 e SaO2= 92%. Nova polissonografia será realizada para reavaliação das trocas gasosas noturnas, controle da titulação do CPAP e da qualidade do sono. Obstrutivo Central Misto Hipopnéia Fig. 3 - Hipnograma com O² 3L/min. Titulação CPAP últimas 3 hs de sono DISCUSSÃO O índice de apneia/hipopneia leve não explica a causa isolada da HP. A hipoxemia acentuada provavelmente é a principal causa da hipertensão pulmonar, secundária à síndrome de hipoventilação alveolar e apnéia do sono em paciente com DPOC. As alterações nas trocas gasosas são acentuadas, em paciente psiquiátrica não obesa, com IAH leve, DPOC moderada e redução no controle ventilatório central. Outra causa de hipoventilação central que pode estar presente na idade adulta é a Síndrome de Hipoventilação Central congênita, própria do período neonatal, determinada por mutação do gene PHOX2B5,6. Barratt e cols7 relatam caso de hipoventilação central associada à mutação no gene PHOX2B, desenvolvendo insuficiência respiratória crônica tardia, com resposta reduzida à hipercapnia (medida por reduzida pressão de oclusão em 100 milissegundos), podendo estender o espectro da hipoventilação central congênita para a idade adulta. A melhora do padrão ventilatório e do quadro psicótico com a interrupção de algumas drogas, nos leva a pensar que as alterações acentuadas nas trocas gasosas poderiam estar agravando a esquizofrenia. Relato de caso recente descreve paciente de 63 anos com esquizofrenia, alucinações resistentes ao tratamento e fadiga diurna acentuada, que apresentou remissão do quadro psiquiátrico após diagnostico de SAOS hipercápnica ou Síndrome da Obesidade-Hipoventilação, e tratamento com CPAP noturno8. 42 CONCLUSÃO Apresentamos discussão do caso de uma paciente psiquiátrica de 61 anos de idade, 20 anos em tratamento intensivo para esquizofrenia, com agravamento nos últimos anos. Grande fumante. Diagnóstico de DPOC moderada há 2 anos, sem tratamento. Atendida no PS cianótica, com hipoxemia e hipercapnia acentuadas e hipertensão pulmonar. História de sono de má qualidade com roncos intensos. Cessação do tabagismo, tratamento com broncodilatadores, substituição de ziprasidona por olanzapina, uso de oxigênio domiciliar e CPAP noturno, trouxeram grande melhora clinica para a paciente e, praticamente, normalização do quadro gasométrico. Houve melhora importante dos sintomas psiquiátricos. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. American Academy of Sleep Medicine. International Classification of Sleep Disorders. 2a. Edition: Diagnostic and coding manual I(ICSD-2). Westchester: IL; 2005 Mokhlesi B, Tulaimat A. Recent advances in Obesity Hypoventilation Syndrome. Chest 2007;132;1322-1336 Weitzenblum E, Chaouat A, Kessler R and Canuet M. Overlap Syndrome. Proc Am Thorac Soc 2008;5: 237–241. Leech J, Onal E, Aronson R and Lopata M. Voluntary hyperventilation in obesity hipoventilation. Chest 1991;100:1334-1338. Weese-Mayer DE, Berry-Kravis EM and Marizita ML. In pursuit (and discovery) of a genetic basis for congenital central hypoventilation syndrome. Respiratory Physiology & Neurobiology 2005; 149:73-82. Berry-Kravis EM, Zhou L, Rand CM and Weese-Mayer DE. Congenital Central Hypoventilation Syndrome. Am J Respir Crit Care Med 2006; 174:1139-1144. Barratt S, Kendrick AH, Buchanan F, and Whittle AT. Central hypoventilation with PHOX2B expansion mutation presenting in adulthood. Thorax 2007; 62:010-20. Karanti A, Landén M. Treatment refractory psychosis remitted upon treatment with CPAP:a case report. Psychopharmacol Bull, 2007; 40(1):113-7. [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 43 IMAGEM EM PNEUMOLOGIA AVALIAÇÃO POR MÉTODOS DE IMAGEM DA SÍNDROME DA APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO Autores: Carlos Toyama; Carlos Jorge da Silva Serviço: Fleury Medicina Diagnóstica INTRODUÇÃO Define-se síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) como obstruções intermitentes, completas ou parciais, das vias aéreas superiores que ocorrem durante o sono 1 . Estudos epidemiológicos demonstraram que a SAOS sintomática ocorre em até 9% dos homens de meia idade e em aproximadamente metade deste número na população feminina. Sua incidência é maior em pacientes com faixa etária mais avançada, embora possa ocorrer em qualquer idade. Acomete principalmente homens obesos entre 40 e 60 anos, sendo incomum em mulheres não obesas antes da menopausa2. Ocorre também em crianças, principalmente relacionada à hipertrofia das tonsilas faríngeas (adenóides). Há também outras causas como malformação craniofacial, doenças neuromusculares e obesidade. Admite-se que a SAOS resulte de vias aéreas superiores estruturalmente pequenas, associadas à perda fisiológica do tônus muscular durante o sono, o que se torna crítico durante a respiração, quando a pressão negativa da via aérea tende a colabar a orofaringe 3. A B Apesar de representar um considerável problema de saúde pública, não se conhece inteiramente sua patogênese. ACHADOS DE IMAGEM Cefalometria, tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) são exames de imagem que demonstram a anatomia das vias aéreas superiores. A cefalometria (radiografia em perfil da cabeça) avalia a relação maxilomandibular, as medidas do espaço aéreo, o comprimento e a espessura do palato mole e a posição do osso hióide em relação à mandíbula. Suas principais vantagens são o baixo custo e a facilidade de realização. As suas desvantagens são o uso de radiação ionizante e a produção de imagem bidimensional, impossibilitando a análise do plano axial. A TC helicoidal com multidetectores (multislice) obtém imagens axiais de alta resolução (Figuras 1 e 2), possibilitando a reconstrução multiplanar e avaliação de partes moles e ósseas da face e pescoço (Figura 4). A RM possibilita uma melhor resolução anatômica dos C Fig 1 - TC axial no nível do palato mole. A) Paciente normal: observe a forma elíptica habitual da faringe. B) Na SAOS moderada, note a redução do calibre faríngeo, notadamente no eixo laterolateral. C) Na SAOS grave, o paciente apresenta acentuada redução da coluna aérea faríngea no eixo laterolateral, com conseqüente predomínio do eixo anteroposterior. 44 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Fig 2 - TC axial dinâmica (durante o ciclo respiratório) no nível do palato mole, em um paciente com SAOS, demonstrando acentuada redução da coluna aérea durante a respiração, indicando maior complacência. Fig 3 - Paciente com SAOS. A RM com seqüências T1 no plano sagital (A) e axial (B) demonstra aumento do palato mole no eixo craniocaudal e a forma arredondada da faringe, respectivamente. tecidos moles em relação à TC, com aquisições multiplanares e dinâmicas (durante o ciclo respiratório), sem o uso de radiação ionizante (Figura 3). Várias estruturas anatômicas possivelmente relacionadas à fisiopatologia da SAOS e os locais de obstrução das vias aéreas superiores foram estudados por estes métodos de imagem, a saber: • Língua: aumento dos seus diâmetros transverso, anteroposterior e craniocaudal. • Complexo uvulopalatal: aumento da área e de suas medidas lineares, como o diâmetro craniocaudal e a espessura (Figura 3A). Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 • Osso hióide: rebaixamento desta estrutura óssea. • Mandíbula: presença de retrognatia. • Coluna aérea da faringe: estreitamento da coluna aérea da faringe nos níveis do complexo uvulopalatal e língua, redução do diâmetro laterolateral da luz faríngea em detrimento do diâmetro anteroposterior, promovendo a mudança da forma da coluna aérea que passa de oval com predomínio do diâmetro laterolateral em indivíduos normais (Figura 1A), para arredondada ou oval com predomínio do diâmetro anteroposterior em pacientes com SAOS grave (Figura 1C). 45 A B C D Fig 4 - Pacientes com SAOS. As seqüências T1 sagitais adquiridas durante a manobra de Müller demonstram obstrução da faringe no nível do palato mole em um indivíduo (A) e nos níveis do palato mole e da língua em outro (B). Achados semelhantes podem ser caracterizados pela reconstrução sagital da TC em outros pacientes com obstrução no nível do palato mole (C) e nos níveis do palato mole e da língua. Fig 5 - A TC com reconstrução 3D das vias aéreas superiores demonstra redução da luz da faringe no nível do palato mole em um paciente com SAOS. DISCUSSÃO: A polissonografia é o método de escolha para o diagnóstico da SAOS, porém não avalia o local de obstrução ou o prognóstico cirúrgico dos pacientes. As fossas nasais obstruídas por rinite, infecção sinusal, deformidades do nariz, desvio de septo e hipertrofia das conchas podem causar um esforço extra para a respiração, determinando uma pressão negativa na faringe, retraindo os tecidos moles e ocasionando o ronco. A TC é o principal exame de imagem para a análise dos seios da face e fossas nasais com esse intuito. Os exames de imagem como a TC e RM também são úteis para afastar outras patologias relacionadas, analisar a anatomia da faringe, bem como o local e o grau de obstrução das vias aéreas superiores. A TC e RM demonstram bem a anatomia das vias aéreas, 46 assim como as estruturas adjacentes. A TC apresenta como vantagem o menor custo. As suas desvantagens são a radiação ionizante e a impossibilidade de aquisição sagital dinâmica durante a respiração. A RM tem maior resolução anatômica para os tecidos moles, realiza cortes em todos planos e com aquisições dinâmicas, sem radiação ionizante, porém as maiores desvantagens são o seu alto custo e a dificuldade de execução em pacientes claustrofóbicos. Estudos de RM em pacientes com SAOS, realizados durante o sono espontâneo, evidenciaram obstruções e estreitamentos de vários sítios das vias aéreas superiores em decorrência da perda dos mecanismos compensatórios essenciais que mantêm o tônus muscular1, 4. A RM também foi realizada nestes pacientes em vigília, demonstrando um transitório estreitamento nos mesmos sítios das vias aéreas superiores. Estes estudos sugerem que a RM realizada no paciente acordado pode identificar o local da obstrução da vias aéreas e auxiliar na escolha da conduta terapêutica. Pesquisas têm comprovado que não há significativa redução ou obstrução das vias áreas da faringe em pacientes sem SAOS, mesmo naqueles obesos e roncadores1, 3-6. A complacência das vias aéreas superiores (mudança da área da coluna aérea durante a respiração) também é maior nos pacientes com SAOS avaliados por TC (Figura 2) 7 ou por RM dinâmica. A manobra de Müller (esforço inspiratório contra narinas e boca fechadas) tem sido descrita como uma das mais fáceis para a análise do colapso dinâmico da faringe, identificando os focos de obstrução na região do palato mole e/ou língua, podendo ser realizada durante a endoscopia ou durante os exames de imagem (Figura 4). A RM com a manobra de Müller (Figuras 4A e 4B) avaliou a extensão craniocaudal da obstrução das vias aéreas superiores melhor que a endoscopia em alguns pacientes8. O CPAP (continuous positive airway pressure) é o tratamento padrão para a SAOS, porém alguns pacientes não se adaptam ao seu uso, sendo o tratamento cirúrgico uma alternativa terapêutica. O sucesso de tratamento Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 cirúrgico, como a uvulopalatofaringosplatia, é variável e a identificação do local da redução da coluna aérea pode fornecer informações relevantes para o planejamento cirúrgico (Figura 4) 9. A TC com reconstrução tridimensional (3D) também pode auxiliar na conduta cirúrgica e na avaliação pós-operatória, pois demonstra com clareza a diferença no volume das vias aéreas em pacientes que responderam bem a uvulopalatofaringoplastia, os quais apresentavam menor volume das vias aéreas superiores, menor índice de volume das vias aéreas em relação à língua e menor índice de volume da orofaringe em relação ao palato mole (Figura 5)10. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. Ikeda K, Ogura M, Oshima T, Suzuki H, Higano S, Takahashi S, et al. Quantitative assessment of the pharyngeal airway by dynamic magnetic resonance imaging in obstructive sleep apnea syndrome. Ann Otol Rhinol Laryngol 2001;110(2):183-9. Ferreira DP. Ronco e Apnéia-Hipopnéia Obstrutiva do Sono: Indicações da Somnoplastia e da Uvulopalatofaringoplastia com Laser de CO2. Arq. Fund. Otorrinolangol 2001;5(4). Galvin JR, Rooholamini SA, Stanford W. Obstructive sleep apnea: diagnosis with ultrafast CT. Radiology 1989;171(3):775-8. Ciscar MA, Juan G, Martinez V, Ramon M, Lloret T, Minguez J, et al. Magnetic resonance imaging of the pharynx in OSA patients and healthy subjects. Eur Respir J 2001;17(1):79-86. Avrahami E, Solomonovich A, Englender M. Axial CT measurements of the cross-sectional area of the oropharynx in adults with obstructive sleep apnea syndrome. AJNR Am J Neuroradiol 1996;17(6):1107-11. Shellock FG, Schatz CJ, Julien P, Steinberg F, Foo TK, Hopp ML, et al. 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[email protected] Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 PROGRAMAÇÃO ANUAL DA SPPT SETEMBRO 04 07 Pizza Cirúrgica Proclamação da Independência OUTUBRO 02 Pizza Cirúrgica 04/08 ERS 12 Nossa Senhora Aparecida 16 Pizza Clínica 18 Dia do Médico 25/30 CHEST NOVEMBRO 02 Finados 06 Pizza Cirúrgica 08 Jornada de Radiologia Jorge Kavakama 15 Proclamação da República 17 Dia Nacional de Combate à Tuberculose 17 Dia Mundial da DPOC 21/25 XXXIV Congresso Brasileiro de Pneumologia e Tisiologia 22 30 anos da SPPT 27 Dia Combate ao Câncer DEZEMBRO 25 31 Natal Reveillon DATAS COMEMORATIVAS 18 DE OUTUBRO Dia do Médico 17 DE NOVEMBRO Dia Nacional de Combate à Tuberculose Dia Mundial da DPOC 27 DE NOVEMBRO Dia Nacional de Combate ao Câncer 47 EPIDEMIOLOGIA CLÍNICA BASES DA ESTATÍSTICA: ESTATÍSTICA DESCRITIVA Autora: Valdelis Novis Okamoto Serviço: Hospital AC Camargo – Unidade de Terapia Intensiva A estatística é um ramo da matemática que se preocupa com a organização, descrição, análise e interpretação dos dados experimentais. Portanto, ela é uma ferramenta fundamental na Ciência e também está presente em nosso cotidiano. Quando discutimos os resultados de uma pesquisa eleitoral, ou conferimos os números do IBOPE sobre os programas de TV, ou simplesmente discutimos os dados sobre o desempenho dos alunos nas provas do nosso curso, estamos usando a estatística. Ainda assim, a estatística tem uma certa má fama. Isso acontece porque ela é, muitas vezes, mal aplicada, excessivamente enfatizada ou, em última análise, mal compreendida. A estatística pode ser usada para descrever os dados de uma pesquisa, mostrando suas médias, porcentagens, variabilidade, subtipos, etc. Isso é chamado de estatística descritiva. Por outro lado, ela também pode ser usada para analisar as semelhanças e diferenças entre dois grupos de estudo. É a chamada estatística analítica, que está intimamente relacionada à teoria das probabilidades. Embora o ensino da estatística não seja enfatizado durante a formação acadêmica da maioria dos profissionais de saúde, conhecimentos básicos sobre a matéria são necessários para uma leitura crítica e qualificada da literatura das ciências da saúde (e até mesmo para compreender melhor os números do IBOPE sobre as próximas eleições). A estatística tem fama de “complicada” – e ela pode mesmo ser bem complicada, com aquelas fórmulas enormes. Mas, por sorte, o conhecimento que nos é necessário para o nosso objetivo – avaliarmos estudos científicos – é simples e intuitivo. ESTATÍSTICA DESCRITIVA Em um estudo, a estatística descritiva (como o próprio nome diz) serve para descrever as característica mais importantes da amostra ou da população estudada. Os estudos populacionais abrangem populações inteiras e geralmente são caros e difíceis de fazer. A maior parte dos estudos da literatura médica envolve amostras. Amostras são subconjuntos de uma determinada população. Elas devem ser preferencialmente grandes e representativas. O 48 tamanho da amostra geralmente é representado pela letra n. Os dados a respeito da amostra – as variáveis - podem ser agrupadas em dois tipos básicos: categóricas ou contínuas. Categóricas: distribuídas em categorias. Exemplos: sexo: feminino ou masculino, cor dos olhos: azuis, verdes, castanhos, pretos, etc., classificação das aulas: ruim, regular, bom ou ótimo. Essas categorias podem ou não ter ordenação. Contínuas: valores numéricos intrinsecamente significantes. Exemplos: peso, altura. Se os dados forem imprecisos, provenientes de amostras viciadas, populações mal definidas e com critérios subjetivos de avaliação, os resultados do estudo também serão imprecisos, não havendo estatística que os salvem (como diz a famosa frase: “garbage in, garbage out”, que pode ser traduzida como “se entrar lixo, sairá lixo”). A função mais importante da Estatística Descritiva é resumir os dados da amostra ou população em poucos números. Por exemplo: ao final de um estudo sobre valores de pressão arterial em uma amostra de 200 pessoas, os pesquisadores têm em mãos 200 medidas de pressão arterial. Como expressar esses valores resumidamente, sem perder informação? Através das medidas de tendência central e de dispersão. As medidas de tendência central dão uma idéia de onde se localiza o centro de determinado conjunto de dados. São medidas de tendência central: média, mediana e moda. Média (Mean ou Average, em inglês): é a soma dos valores, dividida pelo número de observações. É a medida de tendência central mais utilizada e famosa. Mediana (Median, em inglês): é o valor que divide a amostra em duas metades de valores crescentes. É também conhecida como percentil 50. Moda (Mode, em inglês): é o valor mais freqüentemente observado na amostra. Não é uma medida muito utilizada na prática. Ao expressar a medida de tendência central, damos uma idéia aproximada de que valor encontramos nas nossas Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 observações. No exemplo do estudo da pressão arterial, podemos expressar que a média das medidas de pressão arterial sistólica foi 125mmHg. Isso não significa que todos os 200 participantes tiveram pressão de 125mmHg – significa que, em média, a pressão arterial sistólica na amostra estudada foi de 125mmHg - mas dá uma idéia aproximada da pressão arterial sistólica na amostra. Para refinar um pouco mais o resumo dos dados, além das medidas de tendência central, utilizamos as medidas de dispersão. As medidas de dispersão são aquelas que descrevem como os dados se posicionam ao redor do ponto central. A medida de dispersão mais conhecida é o desvio padrão (standard deviation, em inglês). No exemplo da pressão arterial, posso dizer que a média foi 125mmHg. Para detalhar melhor, posso dizer que o desvio padrão foi 45mmHg. O desvio padrão nos diz muito sobre como os dados variam ao redor da média, para mais e para menos. Vamos entender melhor isso a seguir. Observe o gráfico abaixo. TENDÊNCIA CENTRAL 2. Na distribuição normal, 95% dos valores estão a 2 desvios padrão para mais e para menos da média. Um exemplo: se em uma amostra de 200 adultos, a média de altura foi de 175cm e o desvio padrão foi de 15 cm, sabemos que 95% das medidas de altura estão entre 145cm e 205cm. A conta para chegar a essa conclusão foi: Média = 175cm Desvio padrão = 15cm 2X desvio padrão = 30 cm Dispersão da amostra: 95% dos valores entre 145 – 205 cm (175 ± 30cm) Chamamos de uma amostra homogênea aquela que tem uma dispersão pequena ao redor do seu ponto central, ou seja, todos os componentes da amostra são parecidos. Quando a distribuição dos valores é normal – simétrica em torno da média – usamos a média e o desvio padrão como um bom resumo desses valores. Se a distribuição é assimétrica, ou não normal, o uso da média e do desvio padrão não está indicado, pois eles se influenciam muito por valores muito altos ou baixos. Vejam os dois conjuntos de dados a seguir: 8 AMOSTRA 1 Pessoa 1 FREQÜÊNCIA 6 4 2 0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 8,0 9,0 2 3 1300 1100 4 5 1500 1400 6 7 1150 1200 8 9 1350 1200 10 1000 DISPERSÃO Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Média= R$1240 Mediana= R$1200 Desvio Padrão= R$149 Percentis: 25%= R$1138 50%= R$1200 75%= R$1363 AMOSTRA 2 Pessoa Esse gráfico denomina-se histograma, e expressa a freqüência de valores em uma amostra ou população. No exemplo abaixo, notamos que a distribuição da freqüência dos valores no gráfico se apresenta de modo simétrico, lembrando a forma de um “sino”. Essa distribuição simétrica da freqüência de valores é denominada distribuição normal. Muitos dados biológicos têm distribuição normal, por exemplo, a altura da população adulta. Matematicamente, a distribuição normal apresenta algumas propriedades muito interessantes: 1. Quando valores têm distribuição normal em uma população, a média,a mediana e a moda são iguais ou muito semelhantes; Renda mensal (R$) 1200 Renda mensal (R$) 1 2 1200 1300 3 4 1100 1500 5 6 1400 1150 7 8 1200 1350 9 10 Média= R$26.140 Mediana= R$1350 Desvio Padrão = R$78.656 Percentis: 25%= R$1187 50%= R$1250 75%= R$1425 1200 250.000 As duas amostras são praticamente iguais, com a exceção de que a pessoa #10 tem renda mensal de R$ 1000,00 na 49 Amostra 1 e R$ 250.000,00 na Amostra 2. Isso trouxe uma enorme diferença entre as médias e desvios padrão das amostras. Se alguém analisar apenas a média de renda mesal da Amostra 2, terá a falsa impressão de que as pessoas nessa amostra estão muito bem de vida! Agora comparem as medianas das duas amostras - R$1200 e R$ 1350. A mediana é menos afetada por valores extremos e reflete melhor a verdade, em amostras de distribuição não normal. Como leitores de revistas científicas, nós não temos acesso aos dados originais, apenas à medidas de tendência central e dispersão. Mas é possível detectar se as medidas de tendência central e dispersão estão sendo utilizadas de maneira correta. O principal indício de que média e desvio padrão estão sendo incorretamente utilizados para descrever uma amostra de distribuição não normal é que o desvio padrão é muito elevado, aproximando-se do valor da média. E se quando usamos o valor do desvio padrão para obter os valores que abarcam 95% dos valores da amostra (média ± 2 desvios padrão), obtemos valores negativos ou impossíveis, isso significa que a distribuição dos valores na amostra não é normal. Assim, média e desvio padrão não são bons descritores (melhores seriam mediana e intervalo interquartil) para essa amostra. Além disso, os testes estatísticos utilizados na análise devem ser os adequados para amostras de distribuição não normal (os chamados testes não paramétricos). INTERVALOS DE CONFIANÇA Como já mencionado, é muito difícil estudar cientificamente populações inteiras. Por isso, a maioria dos estudos científicos valem-se de amostras das populações de interesse. É muito importante que a amostra seja representativa da população e não apenas de um subgrupo dela, como freqüentemente ocorre na literatura médica – os estudos científicos avaliam preferencialmente homens brancos. Além disso, é importante que o número de pessoas incluídas na amostra seja suficiente para responder a pergunta do estudo. Uma das principais funções dos estaticistas que trabalham em pesquisa clínica é fazer esses cálculos. Intuitivamente, supomos que quanto maior o número de pessoas estudadas na amostra, mais válido é o estudo. Os intervalos de confiança são a tradução numérica dessa intuição. Intervalos de confiança podem ser estimados ao redor de praticamente qualquer estimativa. Para fins didáticos, vamos discutir o cálculo do intervalo de confiança de uma variável contínua. Como exemplo, vamos supor que estamos interessados em conhecer o nível de glicose plasmática dos habitantes da cidade de São Paulo. Como seria inviável fazer dosagens de glicemia de jejum de todos os habitantes, resolvemos estudar uma amostra. Encontramos uma média de 110 mg/dL. Sendo a distribuição normal, a média da glicemia nesta amostra é a melhor estimativa que temos da média de glicemia na população de São Paulo. O desvio padrão encontrado foi 20 mg/dL. A precisão da nossa 50 estimativa depende diretamente do tamanho da amostra, expressa pelo intervalo de confiança, o intervalo que mais provavelmente contém o real valor da média da glicemia na população. O cálculo do intervalo de confiança de 95% é feito através da seguinte fórmula para variáveis contínuas: IC 95% = média da amostra ± 2. (DP/ “N) IC 95%= intervalo de confiança de 95% DP = desvio padrão N= tamanho da amostra Assim, no caso do estudo da glicemia em habitantes de São Paulo, se observe o efeito do aumento do tamanho da amostra sobre o intervalo de confiança: Amostra 1: N= 25 IC 95% = média da amostra ± 2. (DP/ “N) IC 95% = 110 ± 2 (20/”25) = 110 ± 2(4) IC 95% entre 102 e 118 => o real valor da média de glicemia da população está entre 102 e 118, com 95% de probabilidade. Amostra 2: N= 625 IC 95% = média da amostra ± 2. (DP/ “N) IC 95% = 110 ± 2 (20/”625) = 110 ± 2(0,8) IC 95% entre 108,4 e 111,6 => o real valor da média de glicemia da população está entre 108,4 e 111,6 com 95% de probabilidade. Ambas as amostras tiveram média de 110 mg/dL, mas a amostra maior resultou em um intervalo de confiança mais estreito, portanto uma estimativa mais precisa. O termo (DP/ “N) é conhecido como erro padrão da média e serve para construir intervalos de confiança ao redor de variáveis contínuas. O erro padrão da média (standard error of the mean, SEM, em inglês) muitas vezes é utilizado para expressar a variabilidade da amostra, o que é errado – para expressar a variabilidade da amostra, utilizamos o desvio padrão. Na próxima edição do Pneumologia Paulista, discutiremos as bases da estatística analítica. Até lá! REFERÊNCIAS 1. Introdução à bioestatística para simples mortais. Ulysses Doria Filho.Primeira edição, 1999. Editora Negócio. 2. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. Robert H. Fletcher, Suzanne W. Fletcher, Edward H. Wagner. Terceira edição, 1996. Artes Médicas. 3. Primer of biostatistics. Stanton Glantz. Fourth edition, 1996. Mc Graw Hill. 4. Practical Statistics for Medical Research. Douglas G. Altman. First edition, 1991. Chapman & Hall / CRC. [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 CONTROVÉRSIA ANÁLISE CRÍTICA DA INDICAÇÃO DO TRATAMENTO CIRÚRGICO NA SAOS Autores: Fernanda Louise Martinho1,2; Lia Rita Azeredo Bittencourt2; Luiz Carlos Gregório3; Sérgio Tufik4 Serviços: 1 Disciplina de Medicina e Biologia do Sono - Departamento de Psicobiologia - Universidade Federal de São Paulo 2 Disciplina de Otorrinolaringologia - Universidade Federal de São Paulo INTRODUÇÃO A síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS) caracteriza-se pela presença de estreitamento parcial (hipopnéia) ou colapso total (apnéia) da via aérea superior (VAS) durante o sono, proporcionando diferentes graus de dessaturação da oxihemoglobina e fragmentação do sono decorrente dos freqüentes despertares1. Várias teorias têm sido propostas para explicar a fisiopatologia da doença que é multifatorial, provavelmente decorrente de alterações funcionais e anatômicas associadas a alterações neuromusculares da faringe, principal sitio da doença2. As principais alterações anatômicas relacionadas à doença são as que abrangem a VAS e o esqueleto facial, em especial a hipoplasia maxilar e/ou mandibular3. Por ser uma doença de fisiopatologia multifatorial, vários tratamentos têm sido propostos, porém os aparelhos de pressão aérea positiva são considerados tratamento de escolha para esses casos, em especial, para a SAOS moderada a grave. A principal limitação desse tipo de terapia é a adesão4. Devido ao fato do sitio de colapso da VAS ser a faringe e das dificuldades em relação à adesão à terapia com aparelhos de pressão aérea positiva, alguns procedimentos cirúrgicos que envolvem tanto a VAS quanto o esqueleto facial são propostos para o controle da doença. O objetivo desse artigo é mostrar quais são os possíveis procedimentos cirúrgicos para o tratamento da SAOS. TRATAMENTO CIRÚRGICO AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA A indicação da maior parte dos procedimentos cirúrgicos é baseada na presença de alterações anatômicas e na gravidade da SAOS. Desta forma, uma adequada avaliação desses pacientes, incluindo avaliação clínica, exame físico da VAS e crânio-facial e polissonografia, é fundamental para que obtenhamos a melhor resposta terapêutica5 . Também é necessária uma adequada avaliação préanestésica. Sabemos que a maior parte dos pacientes com SAOS apresenta, além da obesidade, alterações anatômicas em VAS e crânio-faciais, fatores que podem dificultar a intubação oro-traqueal. Além disso, o pós-operatório Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 imediato deve ser bem assistido, principalmente em pacientes obesos, devido ao risco de depressão do sistema respiratório. Outro fator a ser considerado e que pode agravar o quadro é o edema pós-operatório, que também pode trazer algum desconforto respiratório. O uso do CPAP no pré e pós-operatório pode ser válido na tentativa de compensar clinicamente o paciente e de minimizar essas complicações. Alem disso, é de fundamental importância que o paciente esteja ciente das outras modalidades de tratamento possíveis e que em concordância com o médico, opte pelo tratamento cirúrgico5. TIPOS DE PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS A seguir estão listados os procedimentos que podem ser realizados para o tratamento da SAOS. Existem alguns procedimentos novos que vêm sendo estudados, como a aplicação de substâncias esclerosantes no palato mole e os implantes palatais, mas que ainda encontram-se em fase de pesquisa e que, por este motivo não serão citados neste trabalho. • Cirurgias nasais: septoplastia, turbinectomia e cauterização linear ou radiofreqüência de conchas nasais inferiores • Cirurgias faríngeas: amigdalectomia, uvulopalatofaringoplastia e suas variações, uvulopalatoplastia a laser de CO2 (LAUP), radiofreqüência de palato mole, glossectomia mediana, radiofreqüência de base de língua • Cirurgias crânio-faciais: avanço do músculo genioglosso e avanço maxilo-mandibular • Traqueostomia CIRURGIAS NASAIS Os trabalhos mostram que as cirurgias nasais muitas vezes são limitadas no controle da SAOS quando consideramos a redução do índice de apnéia e hipopnéia (IAH) na polissonografia, porém observa-se redução dos despertares e da fragmentação do sono. Desta forma, as cirurgias nasais podem melhorar a qualidade de vida e a sonolência diurna desses pacientes 6-8. As cirurgias nasais também podem ser realizadas com 51 intuito co-adjuvante, ou seja, na tentativa de permeabilizar as fossas nasais visando otimizar o uso do CPAP. Vários trabalhos na literatura 9-11 vêm nos mostrando que a cirurgia nasal é capaz de reduzir os níveis pressóricos terapêuticos de uso do CPAP, em especial nos pacientes que necessitam pressões mais elevadas 11 , podendo contribuir para uma melhora na sua aceitação e adesão. Os melhores resultados das cirurgias nasais são em pacientes com SAOS leve/moderada, jovens, não obesos e sem alterações anatômicas em outros sítios. CIRURGIAS FARÍNGEAS: UVULOPALATOFARINGOPLASTIA (UPFP) E SUAS VARIAÇÕES TÉCNICAS A UPFP inclui a exerése de parte do palato mole e da úvula, com ou sem tonsilectomia. Foi popularizada em 1981 por Fujita12 e desde então vem sendo realizada de diversas formas por variadas técnicas cirúrgicas. Inicialmente era indicada para todos os pacientes com SAOS, porém os resultados mostraram-se limitados 13. Sher e cols 13 através de uma revisão por metanálise questionaram a sua eficácia e sugeriram que os pacientes fossem melhor selecionados. Neste trabalho os autores encontraram 40,7% de sucesso com o procedimento. A partir de então se passou a selecionar os pacientes de acordo com a gravidade da doença e observou-se que os melhores resultados eram encontrados em pacientes com quadros mais leves. Janson e cols14 mostraram que a média do IAH dos pacientes que obtiveram sucesso com o procedimento era de 25/hora de sono e dos insucessos era de 48/h de sono; e Dunlevy e cols15 encontraram 49% de sucesso nos pacientes como um todo, porém essa taxa subiu para 69% quando foram selecionados pacientes com SAOS leve e moderada. Além da gravidade da SAOS, o sucesso da UPFP foi relacionado à presença de alterações anatômicas na orofaringe como hipertrofia das tonsilas palatinas, pilares medianizados, palato redundante e úvula alongada. Friedman e cols 16 encontraram melhores resultados da UPFP em pacientes com tonsilas palatinas hipertróficas grau III e IV (obstrução superior a 50% do espaço orofaríngeo) associados ao índice de Mallampatti modificado classe I ou II (adequada relação entre base de língua e orofaringe) e com índice de massa corpórea inferior a 40 Kg/m2, que ele classificou como estágio 1, com 80,6% de sucesso; diminuindo progressivamente conforme a variação desses parâmetros (estágios 2, 3 e 4). Além disso, a tendência atual, é a de se realizar procedimentos mais conservadores, abordando principalmente a parede lateral da faringe, poupando a linha média, a fim de se evitar que o paciente tenha dificuldade para utilizar os aparelhos de pressão aérea positiva, se for necessário5, 17. Deste modo, os melhores resultados da UPFP são em pacientes com SAOS leve/moderada, não obesos, com hipertrofia das tonsilas palatinas grau III e IV, com índice de Mallampati modificado classe I e II e sem alterações anatômicas em outros sítios. 52 CIRURGIAS FARÍNGEAS: UVULOPALATOPLASTIA A LASER DE CO2 (LAUP) A LAUP consiste na realização da exerése de parte do palato mole e da úvula com laser de dióxido de carbono. Sua indicação está baseada nas mesmas características expostas para a UPFP, porém não inclui a realização de tonsilectomia devendo, portanto ser indicada apenas em pacientes com tonsilas palatinas normotróficas. Essa técnica foi introduzida por Kamami 18 em 1990 para o tratamento do ronco. O procedimento pode ser realizado ambulatorialmente sob anestesia local e pode ser necessária mais de uma aplicação. A eficácia do procedimento para o tratamento do ronco varia na literatura de 48% a 86% 19-21 e para o tratamento da SAOS varia de 24% a 48% 19-21. Baseada em uma revisão de literatura, a Academia Americana de Medicina do Sono desenvolveu um guia prático para a utilização da LAUP, o qual preconiza o uso dessa técnica apenas para o tratamento do ronco, não devendo ser empregada para o tratamento da SAOS22. Desta forma, os pacientes que podem se beneficiar com o procedimento são aqueles que apresentam quadro de ronco sem SAOS, com alteração anatômica orofaríngea sem hipertrofia das tonsilas palatinas, não obesos e que não apresentem alterações em outros sítios anatômicos. É importante lembrar que essa técnica, aborda principalmente a linha média da orofaringe, e que a tendência atual é a de se poupar a linha média e atuar principalmente na parede lateral5, 17. CIRURGIAS FARÍNGEAS: RADIOFREQUÊNCIA DE PALATO MOLE A radiofreqüência de palato mole é um procedimento cirúrgico ambulatorial realizado sob anestesia local e que promove hidrólise por desnaturação protéica celular decorrente do aumento de temperatura tecidual fornecido pelo procedimento. A maior parte dos aparelhos trabalha entre as freqüências de 300 e 500KHz e a empresa americana Somnus® foi quem o desenvolveu com esse intuito e de onde se originou o nome somnoplastia, como também é chamado, o procedimento23. A aplicação é realizada na submucosa, onde se espera que ocorra fibrose tecidual e conseqüente aumento do espaço retro palatal, devendo ser indicada apenas em pacientes com tonsilas palatinas normotróficas, pois não inclui tonsilectomia e não há exerése tecidual alguma. Pode ser necessária mais de uma aplicação e não há um consenso de quantas aplicações seriam necessárias. Nos trabalhos preconiza-se em média de três a quatro aplicações24-27. Trabalhos mostram taxas de sucesso variando de 30 a 86%24-27, sendo que a sua indicação é semelhante ao da LAUP, com a vantagem de poder ser indicada também em pacientes com SAOS leve e de ser um procedimento menos doloroso28. Deste modo, os pacientes que apresentam melhores resultados com essa técnica cirúrgica são os pacientes com SAOS leve, com alterações orofaríngeas sem hipertrofia das tonsilas palatinas, sem alterações anatômicas em outros sítios e não obesos. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 PROCEDIMENTOS SOBRE A BASE DA LÍNGUA As glossectomia realizadas para o tratamento da SAOS são parciais e medianas, visando diminuir seu volume em relação à orofaringe. Várias técnicas são descritas na literatura. Podem ser associadas a outros procedimentos como epiglotectomia e UPFP. Os resultados são insatisfatórios com taxas de sucesso variando de 25% a 83%, sendo que os piores resultados foram os associados à epiglotectomia29-30. A radiofrequência de base de língua apresenta as mesmas características da de palato já citada, e foi primeiramente realizada por Powell e cols 31 . Estudos mais recentes mostram uma taxa de sucesso variando de 20% a 83% 32-34 . Apesar de apresentar resultados variáveis e limitados na literatura, os pacientes que podem se beneficiar com esses procedimentos cirúrgicos são aqueles que apresentam a base da língua como principal sítio obstrutivo CIRURGIAS ESQUELÉTICAS FACIAIS: AVANÇO DO MÚSCULO GENIOGLOSSO O avanço do músculo genioglosso é realizado através da confecção de uma janela óssea no mento (mandíbula), que é fixada anteriormente, na qual o músculo em questão que está aí inserido é tracionado, proporcionando a anteriorização da língua e, portanto, aumento do espaço retro palatal. Pode ser associado a outros procedimentos faríngeos como a suspensão do hióide e a UPFP, como proposto pelo grupo de Stanford e denominado como fase I 35-37. Os resultados cirúrgicos variam de 25 a 78% 35-37, sendo que na maior parte dos artigos a técnica foi combinada à suspensão do hióide e/ou UPFP. Deste modo, o avanço do músculo genioglosso pode ser realizado isoladamente ou associado a outros procedimentos cirúrgicos como a suspensão do hióide e a UPFP e os melhores resultados encontram-se em pacientes com SAOS leve/ moderada, não obesos e que apresentam a base da língua como principal sítio obstrutivo. CIRURGIAS ESQUELÉTICAS FACIAIS: AVANÇO MAXILO-MANDIBULAR (AMM) O AMM é realizado através de osteotomia maxilar do tipo Leffort I, com fixação por microplacas, associada à osteotomia sagital da mandíbula com fixação bi cortical por parafusos. Juntamente com as estruturas ósseas, todo o tecido mole faríngeo aderido é anteriorizado, na tentativa de aumentar o espaço aéreo posterior e diminuir a colapsibilidade faríngea durante o sono. Inicialmente essa técnica vinha sendo utilizada para o tratamento de oclusões dentárias alteradas e de dismorfismos crânio faciais e posteriormente foi proposta para o tratamento da SAOS pelo grupo de Stanford, chamada de Fase II de Stanford67. As taxas de sucesso na literatura variam de 75% a 100%38,39. Estudos demonstram eficácia de 90% do AMM no longo prazo40. Na maior parte desses artigos a realização do AMM foi indicada em pacientes com SAOS grave que não toleraram o uso do CPAP ou como resgate de outras cirurgias Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 que não obtiveram os resultados esperados. O AMM pode ser indicado também como forma inicial de tratamento para SAOS em pacientes com alterações ortognáticas evidentes independente da gravidade da SAOS76. Deste modo o AMM pode ser indicado em pacientes com SAOS grave que não toleraram o uso do CPAP independentemente da presença de alterações crânio-faciais. Pode ser indicado também como forma inicial de tratamento em pacientes com alterações anatômicas crânio - faciais evidentes, independente da gravidade da SAOS. TRAQUEOSTOMIA A traqueostomia é o único procedimento cirúrgico com eficácia de 100% no tratamento da SAOS, porém, é realizada como última opção devido às repercussões sociais que ela propicia. Sua indicação é reservada a pacientes com SAOS grave que não se adaptem ao CPAP ou BiPAP/ViPAP e que possuam contra-indicação cirúrgica para a realização do AMM. Normalmente trata-se de pacientes com obesidade mórbida ou com alteração crânio- facial exuberante ou com doenças associadas descompensadas5. Esses pacientes normalmente utilizam a traqueostomia durante a noite, deixando-a tampada durante o dia. Alguns pacientes podem necessitar de traqueostomia preventiva pré operatória, principalmente quando se espera edema acentuado de VAS; ou forem submetidos à traqueostomia pós operatória na vigência de alguma complicação; mas nestes casos o seu uso é transitório. CONCLUSÕES A SAOS é uma doença de fisiopatologia multifatorial e evolutiva. O tratamento de escolha, em especial para os quadros moderados a grave, é o uso de aparelhos de pressão aérea positiva. O tratamento cirúrgico é uma outra opção de tratamento e sua indicação normalmente é baseada na presença de alterações anatômicas e na gravidade da SAOS. Além disso, o tratamento cirúrgico pode ser realizado tanto com intuito curativo como coadjuvante, na tentativa de amenizar a doença ou de facilitar a adesão aos aparelhos de pressão aérea positiva. A adequada avaliação e seleção dos pacientes é fundamental para que possamos otimizar os resultados terapêuticos, independentemente do tipo de tratamento a ser empregado. 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A apnéia obstrutiva do sono e a síndrome da hipoventilação da obesidade são as condições mais relevantes deste espectro pela prevalência e gravidade. Abordaremos o tratamento não-farmacológico destas duas entidades. APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO A apnéia obstrutiva do sono (AOS) é definida pela obstrução total (apnéia) ou parcial (hipopnéia), recorrente, da via aérea superior durante o sono. A AOS é comum entre adultos, sendo sua prevalência entre homens adultos de 4% e de 2% entre mulheres.1 As conseqüências da AOS são bem conhecidas e incluem sonolência excessiva diurna, comprometimento neurocognitivo, redução da qualidade de vida e risco de acidentes (automobilísticos e de trabalho) 2. Portadores de AOS não tratados tem maior mortalidade cardiovascular quando comparados com indivíduos sem AOS ou com tratamento adequado3. O tratamento do paciente com AOS objetiva, a curto prazo, tratar os sintomas associados e a longo prazo tratar ou evitar as complicações da doença, sobretudo as cardiovasculares. Existem diversas evidências que a AOS pode causar hipertensão arterial sistêmica e o tratamento da AOS reduz os níveis pressóricos. Do mesmo modo, diversas doenças cardiovasculares têm sido associadas à AOS e seu tratamento leva à melhora de prognóstico. Neste caso se incluem o acidente vascular cerebral, a insuficiência cardíaca congestiva, a insuficiência coronariana e a fibrilação atrial paroxística 4. A associação entre AOS e doenças cardiovasculares é assunto discutido em profundidade em outro artigo deste númerto da Pneumologia Paulista. Classificação: A apnéia obstrutiva do sono é classificada de acordo com o índice de apnéia e hipopnéia. Este índice é obtido na polissonografia e revela o número total de apnéias e hipopnéias dividido pelo número de horas de sono (IAH) e classificado desta maneira: leve, IAH 5-15; moderada, IAH 15-30 e grave, IAH >30 eventos/hora. Além da gravidade, para a decisão do tratamento da AOS deve-se considerar os sintomas, presença de comorbidades e ocupação profissional. A correlação entre sintomas e gravidade não é alta 5. Assim, Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 há pacientes com AOS moderada a grave, pouco sintomáticos e pacientes com AOS leve muito sintomáticos. A intensidade dos sintomas correlaciona-se com a adesão ao tratamento, como será descrito abaixo. Assim, pacientes assintomáticos terão maior dificuldade para aceitar e aderir ao tratamento. A ocupação do paciente pode determinar tratamento imediato e mais rigoroso. Motoristas profissionais, pilotos de avião, operadores de máquinas, por exemplo, devem receber atenção especial. A presença de comorbidades também deve ser valorizada para a decisão de tratamento, sobretudo os portadores de doença cardiovascular, frente ao pior prognóstico já descrito neste grupo de pacientes 4. Na decisão sobre quando e como tratar o paciente portador de AOS deve-se considerar as expectativas do paciente e seus familiares. O paciente consciente de seu problema, das conseqüências para sua saúde e bem estar, além do bem estar de seu (sua) companheiro(a) facilitam a aceitação do tratamento e melhoram a sua adesão. O tratamento da apnéia obstrutiva do sono envolve medidas comportamentais: Perda de peso: nos indivíduos com excesso de peso pode levar a melhora significativa dos sintomas e do índice de apnéia e hipopnéia. Considera-se significativa a perda de pelo menos 10% do peso, a partir da qual já há impacto na AOS. Infelizmente, uma pequena porcentagem dos pacientes conseguem perder peso e mantê-lo a longo prazo. Este fato deve ser lembrado sobretudo em pacientes com AOS grave, sintomáticos ou sob risco de acidentes. Nestes casos, devese considerar uma forma mais imediata de tratamento concomitante à perda de peso. A cirurgia bariátrica também pode auxiliar no tratamento da AOS, tendo resolvido 86% dos casos em uma meta-análise6. Deve-se ter atenção especial no tratamento da AOS no período peri-operatório destes pacientes pelo risco elevado de complicações 7. Álcool e medicamentos: há evidências que o álcool piora a AOS e deve ser evitado8. Da mesma forma, benzodiazepínicos podem acentuar a gravidade da AOS e de seus sintomas. Terapia posicional: a AOS relacionada à posição supina é definida de forma diferente segundo alguns autores. Alguns a definem quando há pelo menos o dobro de eventos na posição supina em relação ao decúbito lateral, outros quando 55 o índice de apnéia e hipopnéia na posição lateral é menor que 5/hora9, 10. Poucos estudos avaliaram a eficácia da posição lateral no tratamento da AOS relacionada à posição supina. Um estudo comparou a técnica de colocação de bola de tênis dentro de um bolso costurado ao dorso do pijama. Houve melhor controle do IAH e melhora da saturação de oxigênio após a utilização de CPAP do que após a colocação da bola. A redução dos sintomas foi similar 9. Outros dispositivos como um colete que impede o paciente de deitar em decúbito dorsal, travesseiros que elevam o tronco ou melhoram a posição cervical também foram testados com melhora dos sintomas10. A adesão ao tratamento com bola de tênis em um estudo foi de 38 % em 6 meses11. Estes dados mostram que a terapia posicional é uma opção em casos selecionados. A polissonografia utilizando-se o dispositivo posicional pode assegurar a eficácia do tratamento. Diagnósticos diferenciais: outros distúrbios do sono podem estar associados à AOS. O diagnóstico de narcolepsia, movimentação periódica de membros ou hipersonolência idiopática envolvem tratamento específico e a falha em seu diagnóstico pode explicar a persistência de sintomas como a sonolência excessiva mesmo após o tratamento adequado da AOS. A privação de sono é muito comum em nosso meio e pode acentuar os sintomas de sonolência diurna, fadiga e irritabilidade dos portadores de AOS. A orientação quanto à adequada higiene do sono deve fazer parte do tratamento do paciente portador de AOS. Sintomas de depressão também devem ser procurados não só pela semelhança com os sintomas da AOS, mas também porque a privação do sono associado à AOS pode levar a ideações suicidas12. O “screening” para hipotireoidismo é indicado em portadores de AOS, pois a deficiência de hormônio tireoideano pode provocar a apnéia obstrutiva e a reposição de tiroxina pode resolver a AOS13. DISPOSITIVOS DE AVANÇO MANDIBULAR Os dispositivos de avanço mandibular têm como objetivo protruir a mandíbula e melhorar a patência da via aérea superior a fim de se evitar o ronco e apnéias/hipopnéias durante o sono. Estes dispositivos devem ser adaptados individualmente para cada paciente. No entanto, é necessária dentição suficiente para suporte do aparelho. Deve-se ter cuidado naqueles com doença periodontal ou com disfunção temporo-mandibular. Outro tipo de dispositivo oral são aqueles de protusão da língua por sucção, os quais não dependem da dentição para suporte. Eficácia: estes dispositivos promovem a redução de 50% do IAH em aproximadamente 65% dos pacientes. Porém, apenas 35% dos pacientes normalizam o IAH14. Apesar de não haver controle total dos eventos respiratórios em todos os pacientes, há evidências ainda de redução da sonolência diurna, melhora da qualidade de vida e redução da pressão arterial. No entanto, nem todos os pacientes têm controle adequado da AOS com os dispositivos de avanço mandibular e não há como prever na prática clínica aqueles que se beneficiarão10. Alguns dados sugerem que os dispositivos de avanço mandibular são melhores aceitos pelos pacientes que o CPAP14. A adesão ao tratamento é em média de 77% se considerado o 56 relato do paciente14. Existem potenciais efeitos adversos relacionados ao uso dos dispositivos de avanço mandibular. Salivação, dor nos dentes, irritação gengival, cefaléia e desconforto da articulação temporo-mandibular podem ocorrer, em geral no período inicial de uso. Alteração da posição dos dentes pode ocorrer no longo prazo. A Academia Americana de Medicina do Sono recomenda o uso de dispositivos de avanço mandibular no tratamento de AOS leve a moderada nos pacientes que prefiram o uso de dispositivo de avanço mandibular ao CPAP ou que não tiveram sucesso com o CPAP. Recomenda-se uma nova polissonografia com o dispositivo a fim de se assegurar a sua eficácia. Entre os pacientes com AOS grave ou que necessitam de tratamento imediato devido à sintomas importantes ou comorbidades associadas, O CPAP deve ser a primeira opção pela sua maior eficácia15. TRATAMENTO COM PRESSÃO POSITIVA CPAP O tratamento com CPAP é a primeira opção para AOS grave 16. A pressão de CPAP para controle dos eventos respiratórios deve ser determinada por titulação manual ou automática no laboratório do sono, utilizando-se polissonografia. A Academia Americana de medicina do sono recomenda a titulação de CPAP durante uma noite inteira, mas aceita a titulação durante metade da noite como alternativa (“split night”)16. Neste caso, o exame de polissonografia é interrompido após 2 horas para ser titulada a pressão de CPAP, desde que o índice de apnéia e hipopnéia tenha sido maior que 40/hora e idealmente tenha incluído um período de sono REM 17. A pressão de CPAP, no entanto, pode ser subestimada se não houver um período de sono REM ou posição supina durante a titulação ou se os eventos se concentrarem na primeira metade da noite. Uma alternativa foi descrita em um estudo no qual, pacientes com alto risco de AOS foram randomizados para titulação com dispositivo de CPAP automático em casa, dispensando-se a polissonografia, ou diagnóstico convencional seguido de titulação no laboratório. Pacientes submetidos à titulação em casa tiveram controle da AOS similar àqueles com titulação no laboratório mas com melhor adesão ao CPAP após 3 meses18. Algumas fórmulas foram testadas para predizer a pressão de CPAP. Sua acurácia, no entanto não permite eliminar a titulação de pressão de CPAP19. A primeira noite de uso do CPAP pode predizer a adesão ao CPAP no longo prazo20. Esta evidência revela a importância de apresentar o CPAP de forma adequada e escolher a melhor interface para o paciente (máscara nasal, prong nasal, máscara facial) de acordo com sua anatomia facial e preferências. A máscara de uso mais comum é a nasal. Poucos estudos compararam a adesão no longo prazo quando utilizadas interfaces diferentes. Um estudo revelou que a adesão é pior quando utilizada máscara facial em comparação à nasal, sendo a nasal preferida e relacionada à maior redução na escala de sonolência de Epworth 21. Um estudo comparou almofada nasal (“nasal pillow”) com máscara nasal. A almofada nasal teve maior adesão, menos efeitos colaterais e maior satisfação22. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 No entanto, pressões elevadas podem impedir o uso desta interface. Umidificador aquecido: o uso de umidificador melhora a adesão ao CPAP e reduz efeitos colaterais. A Academia Americana de medicina do sono recomenda a utilização de umidificação aquecida com o dispositivo de CPAP16. Em nosso meio, o clima mais quente e úmido reduz a necessidade de umidificação aquecida, mas deve ser usado quando há queixa de ressecamento do nariz e boca. Deve-se tratar a obstrução nasal, pois ela está relacionada à pior adesão ao CPAP. O uso de corticóide nasal, antihistamínicos ou cirurgia de correção do desvio de septo e turbinectomia podem ser necessários. A adesão ao CPAP também está relacionada ao grau de sonolência do paciente, à gravidade da doença e se a iniciativa de procurar o diagnóstico de AOS foi do próprio paciente. Nos pacientes pouco sintomáticos, mas com indicação de CPAP pela gravidade ou presença de co-morbidades, um cuidado ainda maior deve ser tomado. A adesão ao CPAP na primeira semana também prediz seu uso no longo prazo. Assim, é na primeira semana de uso do CPAP que o suporte ao paciente e supervisão devem ser mais intensivos.26 A Academia Americana de Medicina do Sono recomenda a monitorização do uso de CPAP através do registro feito pelo aparelho, uma vez que o relato do paciente superestima o uso real 16. Existem duas formas de registro: por horímetro, o qual registra o número de horas que o aparelho ficou ligado e outro, mais preciso, que registra o uso por dia de uso efetivo. Os efeitos colaterais do uso de CPAP mais comuns são: a congestão nasal, rinorréia, boca seca e irritação ocular. O aparecimento de efeitos colaterais pode levar o paciente a desistir de usar o dispositivo. Desta forma, a orientação ao paciente quanto aos efeitos colaterais auxiliam na sua detecção precoce e tratamento imediato. Auto-CPAP: outros modos de ventilação não-invasiva com pressão positiva podem ser utilizados. O CPAP com pressão automática (auto-CPAP) varia a pressão de CPAP de acordo com a necessidade, baseado na detecção de restrição ao fluxo e vibração. Pacientes que necessitam de pressões mais elevadas de CPAP podem se adaptar melhor ao auto-CPAP, pois a pressão média de CPAP tende a ser menor, melhorando seu conforto. De fato, a maioria dos estudos revela preferência ao auto-CPAP pelos pacientes. No entanto, a eficácia é igual e a maior parte dos estudos não mostrou que a utilização de auto-CPAP aumentasse a adesão ao tratamento. Pacientes portadores de insuficiência cardíaca congestiva, doença pulmonar grave, dessaturação noturna relacionada à hipoventilação da obesidade, pacientes que não roncam e pacientes que tem número significativo de apnéias centrais não devem utilizar este modo de tratamento.23 C-Flex: mais recentemente, foi introduzida nova tecnologia de alívio de pressão (C-flex), a qual proporciona alívio da pressão positiva durante a expiração. Um estudo avaliou eficácia e adesão comparando o dispositivo com alívio de pressão com CPAP convencional. Ambos foram igualmente eficazes, sem diferença na adesão após 7 semanas.24 BIPAP: a utilização de pressão positiva em dois níveis de Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 pressão (BIPAP) está indicada em pacientes que apresentam hipoventilação associada. Pacientes que requerem níveis elevados de pressão de CPAP também podem preferir o BIPAP, pois é possível utilizar pressão expiratória menor. No entanto, quando avaliada a adesão ou eficácia utilizando-se BIPAP, não houve diferença em relação ao CPAP 25. SÍNDROME DA HIPOVENTILAÇÃO DA OBESIDADE A síndrome da hipoventilação da obesidade (SHO) ou síndrome de Pickwick é definida como obesidade (índice de massa corpórea >30Kg/m2) associado à hipoventilação alveolar (PaCO2>45mmHg) enquanto acordado, excluindo-se outras causas de hipoventilação 27. Sua real prevalência não é conhecida, mas 31% dos pacientes com IMC>35 kg/m2 apresentavam este diagnóstico em um estudo realizado em pacientes internados. A morbidade e mortalidade são elevadas. Em pacientes hospitalizados, a mortalidade foi de 23% em 18 meses, enquanto 9% dos indivíduos obesos sem hipoventilação evoluiram a óbito no mesmo período em um estudo27. O tratamento da SHO é importante, pois estes pacientes freqüentemente desenvolvem insuficiência respiratória aguda e óbito na evolução. Na sala de emergência, estes pacientes devem ser prontamente identificados, pois a oxigenioterapia pode levar à acentuação da hipercapnia e narcose. A perda de peso deve sempre ser orientada. A mudança nos hábitos alimentares e o exercício físico são essenciais. Pode-se optar pelo uso de inibidores de apetite. A SHO pode ser indicação isolada para a cirurgia bariátrica. Neste caso, a adaptação de dispositivo de pressão positiva e seu uso no peri-operatório são necessários para a redução dos riscos associados à cirurgia. A traqueostomia foi o tratamento inicialmente usado para o tratamento da SHO, porém é raramente utilizada atualmente devido ao desenvolvimento dos dispositivos de pressão positiva. A maioria dos pacientes normaliza os níveis de hipercapnia apenas com a traqueostomia, sugerindo que a obstrução recorrente da via aérea superior durante o sono tem papel fisiopatológico importante. O uso de estimulantes respiratórios como progesterona e teofilina foram pouco estudados e não são indicados no momento28. Duas modalidades de dispositivos de pressão positiva podem ser utilizadas para o tratamento da SHO. O CPAP é indicado no tratamento da SHO e comprovadamente melhora a hipercapnia. O CPAP não proporciona aumento imediato da ventilação alveolar, porém alivia a fadiga da musculatura respiratória por impedir a obstrução recorrente da via aérea superior. Pode haver também aumento do “drive” ventilatório central pela redução da fragmentação do sono29. O dispositivo de BIPAP proporciona aumento imediato da ventilação alveolar e, portanto da PCO2 arterial. Em pacientes com insuficiência respiratória aguda, é o tratamento de escolha para a redução mais rápida da PaCO2 (29). Um estudo recente comparou CPAP e BIPAP no tratamento de pacientes com hipoventilação da obesidade sem hipoxemia acentuada durante o sono e sem acidose respiratória. A redução dos níveis de PCO2 arterial na vigília foi similar em ambos os métodos. Apesar da síndrome da hipoventilaçâo da obesidade não 57 requerer o diagnóstico com polissonografia, deve-se proceder à titulação de CPAP ou BIPAP e oxigeniooterapia se necessário, a fim de se controlar os eventos obstrutivos e hipoventilação. CONCLUSÃO O tratamento da AOS deve ser decidido conforme a intensidade dos sintomas, gravidade, presença de comorbidades e ocupação profissional. Em pacientes portadores de AOS grave, recomenda-se tratamento independentemente de sintomas. Neste caso, o CPAP é o tratamento de eleição. Nos pacientes portadores de AOS leve a moderada, a opção terapêutica entre dispositivo de avanço mandibular, CPAP, cirurgia e/ou medidas comportamentais devem ser discutidas com o paciente. 15. 16. 17. 18. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 58 Young T, Palta M, Dempsey J, et al. The occurrence of sleepdisordered breathing among middle-aged adults. N Engl J Med 1993; 328: 1230-1235. Patil SP, Schneider H, Schwartz AR, Smith PL. Adult obstructive sleep apnea: pathophysiology and diagnosis. Chest 2007; 132: 325-337. Marin JM, Carrizo SJ, Vicente E, Agusti AGN. 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A SAHOS devido à sua maior prevalência, gravidade e morbidade e conseqüências neurocognitivas e cardiovasculares tem se tornado um problema crescente de saúde pública.1,2, 3 A escolha do tratamento mais adequado a cada paciente depende da gravidade da apnéia e das suas conseqüências. Os objetivos do tratamento são: promover uma ventilação e oxigenação noturnas normais; reduzir ou abolir o ronco; e eliminar a fragmentação do sono.4 Diversos estudos têm sido realizados para verificar a eficácia das várias terapêuticas que podem ser aplicadas no combate à SAHOS, sendo, a Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas (CPAP), o tratamento clínico mais recomendado atualmente.1,4,5 O CPAP consiste num tipo de ventilação mecânica nãoinvasiva que através de um fluxo de ar contínuo, estabiliza as vias aéreas superiores, prevenindo seu colapso. Deste modo, a fragmentação do sono desaparece e a arquitetura normal do sono é restaurada.6 A prescrição do CPAP nasal é médica, no entanto, o profissional que geralmente ajusta e monitora esses equipamentos nos hospitais é principalmente o fisioterapeuta, isto porque este profissional está mais familiarizado com o aparelho e pode acompanhar o paciente por um período de tempo maior. E o que se observa atualmente é que essa parceria estabelecida entre a medicina e a fisioterapia, tem se estendido para clínicas e centros de distúrbios do sono, onde após o médico haver diagnosticado a SAHOS e indicar o CPAP nasal como tratamento, o fisioterapeuta instala, ajusta e orienta sobre o correto uso do equipamento, auxiliando o médico na assistência domiciliar, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida destes pacientes. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Por esta maior proximidade com o paciente e sua família o fisioterapeuta pode ainda orientar quanto à manutenção de uma boa higiene do sono, ou seja, dormir sempre no mesmo horário, em ambientes com luminosidade, som e temperatura adequadas, evitando a privação do sono e a posição supina, eliminar ou evitar fatores que possam aumentar a gravidade da resistência das VAS, tais como: a obesidade, a cafeína, o álcool, agentes sedativos, hipnóticos, narcóticos, benzodiazepínicos, tabaco e outros.5,7 Além disso, a Fisioterapia pode auxiliar em requisitos importantes para o sucesso da terapia como: a educação prévia através da explicação sobre a doença, o uso do CPAP e seus efeitos, fatores estes de extrema relevância para incentivar a adesão ao tratamento. Quanto maior o empenho em motivar o paciente, maior a probabilidade do uso de acordo com a prescrição, especialmente nos casos em que tal intervenção se faz precocemente. Pode ainda, orientar o uso de máscara adequada, que quando bem ajustada elimina os vazamentos e previne ferimentos na pele, o que deixa a terapia mais confortável e aumenta a adesão ao tratamento e o uso de umidificador aquecido, principalmente, em condições de baixa temperatura e umidade relativa do ar, bem como medidas para higiene nasal com solução fisiológica.7 Uma alternativa interessante para aumentar a adesão aos aparelhos de pressão aérea positiva seria a inclusão de um teste prévio com o aparelho na rotina de um laboratório de sono, visando à familiarização do paciente com a máquina e com as sensações nunca antes experimentadas.7 Essa já é uma rotina adotada pelo Laboratório do Sono do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde os pacientes do experimento de Figueiredo et al (2004),1 fizeram uma sessão de fisioterapia respiratória para a adaptação ao dispositivo. Nessa ocasião, os pacientes vivenciaram a máscara nasal por cerca de 60 minutos e foram orientados sobre os conceitos básicos da utilização do aparelho.1 59 No estudo de Ballester et al (1999), ocorreu o mesmo. Os sujeitos do estudo foram instruídos sobre o uso do CPAP e passaram um dia inteiro em uma unidade de sono, onde puderam ser acomodados à máscara e se familiarizar com o tratamento, auxiliados por um fisioterapeuta.6 E apesar de observar-se na literatura uma escassez de trabalhos publicados discutindo o papel fisioterapêutico no tratamento da SAHOS, entendemos como é importante a atuação do fisioterapeuta nas orientações que serão prestadas ao paciente acerca de sua patologia e na adaptação deste paciente à máscara, contribuindo para a melhora no índice de adesão à terapia. Deste modo, concluímos que o CPAP nasal é um método de tratamento efetivo, em que a fisioterapia pode atuar positivamente, prestando assistência domiciliar e orientando os portadores desta síndrome a respeito de sua patologia e da correta utilização e manutenção do aparelho, visando à melhoria da qualidade de vida destes pacientes. REFERÊNCIAS 1. Figueiredo A.C, et al. Efeitos da pressão positiva contínua em vias aéreas sobre os sintomas nasofaríngeos em pacientes com a síndrome da apnéia obstrutiva do sono. Jornal 2. Brasileiro de Pneumologia. 2004; 30(6): 535-539. Rodrigues CJO, Tavares A. Síndrome da apnéia do sono: causa de hipertensão arterial e de refratariedade ao tratamento anti-hipertensivo. Rev Bras Hipertens. 2004; 3. 11(4):251-5. Daltro CHC, Fontes FHO, ET AL. Síndrome da Apnéia e Hipopnéia Obstrutiva do Sono: Associação Com Obesidade, Gênero e Idade. Arq Bras Endocrinol Metab. 2006; 50( 4. 1):74-81 Balbani APS, Formigoni GGS. 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Lara Maris Nápolis Presidente do Departamento de Fisioterapia SPPT Especialista em Fisioterapia Respiratória pela UNIFESP-EPM Mestre e Doutora em Ciências pela UNIFESP-EPM 60 CALENDÁRIO DE ATIVIDADES DAS REGIONAIS REGIONAL- ARARAQUARA/BAURU/BOTUCATU 06 de setembro em São Carlos - Doenças Ocupacionais 04 de outubro em Araraquara - Pulmão e Colagenoses REGIONAL - MARÍLIA Último sábado da cada mês, às 09h30 - Reuniões Reuniões alternadas entre as Faculdades FAMEMA e UNIMAR REGIONAL - SÃO JOSÉ DOS CAMPOS 26 de setembro - Asma 24 de outubro - Avaliação Pré-operatória no DPOC 21 de novembro - Queima de Biomassa e Pol, Atmosférica REGIONAL - SÃO JOSÉ DO RIO PRETO Outubro em Catanduva - Tabagismo REGIONAL – CAMPINAS Serviço de Pneumologia e Cirurgia Torácica do Hospital de Clínicas da UNICAMP • 4as feiras: 8h30 às 10h Reunião das disciplinas de Pneumologia e Cirurgia torácica para discussão de casos clínicos e cirúrgicos, com a presença de radiologistas, pneumologistas, cirurgiões torácicos, radioterapeutas, residentes e alunos. Local: anfiteatro de Radiologia, terceiro andar, Hospital de Clínicas da Unicamp - Cidade Universitária Zeferino Vaz, s/n, Barão Geraldo, Campinas. • 5as feiras (exceto a última do mês): 8h30 às 9h30 Reunião anátomo-clínica-radiográfica para discussão de casos com comprovação histo-patológica, com a presença de patologistas, pneumologistas, cirurgiões torácicos, radiologista, residentes e alunos. Local: Anfiteatro de Anatomia Patológica, segundo andar, Hospital de Clínicas da Unicamp. Departamento de Pneumologia e Cirurgia Torácica da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas • Todas as quartas 4as feiras do mês, das 20:00 às 22:00h (discussão de casos clínicos ou palestras sobre temas diversos) Local: Anfiteatro da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas. Rua Delfino Cintra, número 63, Centro. Telefone: (19) 3231 2811. REGIONAL - RIBEIRÃO PRETO Reuniões - última quinta-feira do mês, às 20h Local: Chopp Time Street, Av. independência, 2579, 2° andar Discussão de Casos clínicos com a participação do HCFFMRP-USP, Hospital São Francisco e Santa Casa. Discussão de Casos Clínicos com a participação do HCFFMRP-USP, Hospital São Francisco e Santa Casa. 25 de setembro; 30 de outubro; 27 de novembro Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 NOTÍCIAS ATIVIDADES DO TRIMESTRE No sentido horário, membros da diretoria da SPPT, palestrantes e presidentes de regionais nas Jornadas Paulistas realizadas em Botucatu, Campinas, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto No último trimestre tivemos uma atividade científica intensa. As Jornadas Paulistas aconteceram nas cidades de Ribeirão Preto, Campinas, São José do Rio Preto e Botucatu. Temas como a hipertensão pulmonar, a DPOC, a asma e a insuficiência respiratória crônica foram abordados por palestrantes com grande experiência e conhecimento nas respectivas áreas. As Jornadas Paulistas não só atingiram o objetivo de educação continuada, mas também o da valorização da pneumologia, divulgando a nossa especialidade nas diferentes regiões. Contamos também com um número expressivo de acadêmicos. Os futuros pneumologistas. A totalidade dos presentes avaliou os eventos no interior como ótimo ou bom. REGIONAIS SPPT 2008/2009 SUB-SEDE ABC Av. Príncipe de Gales, 821 - Príncipe de Gales 09060-650 - Santo André - Telefone: (11) - 4993-5469 [email protected] Na capital, as Reuniões Clínicas com discussão de casos na “Pizza Clínica” e “Pizza Cirúrgica” continuam proporcionando a oportunidade de aprender e trocar experiências de uma forma lúdica e descontraída. As duas reuniões neste ano tornaram-se eventos oficiais da Associação Médica Brasileira, passando a valer pontos no programa de acreditação da AMB. A “Pizza Cirúrgica” que é marcada pela presença e participação ativa dos principais cirurgiões do Estado São Paulo, continua com discussões calorosas e de alto conteúdo científico. Em julho em comemoração à inauguração da sede da Sociedade Brasileira de Cirurgia Torácica (SBCT) na cidade de São Paulo ( Sala Vicente Forte), contamos com a presença de diversos cirurgiões torácicos de outros estados. SUB-SEDE MARÍLIA Rua 24 de dezembro, 435 - 17500-060 - Marilia Telefone: (14) - 3433-3412 - [email protected] SUB-SEDE RIBEIRÃO PRETO Av. Bandeirantes, 3900 - 14040-030 - Ribeirão Preto Telefone: (16) - 3602-2631 - [email protected] SUB-SEDE ARARAQUARA / BAURU / BOTUCATU Av. Prof. Dorival De Oliveira, 77 - Vila João Godoi 14802-378 - Araraquara - Telefone: (16) - 3336-8953 [email protected] SUB-SEDE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO Av. Vinte e Três, 1205 - 14780-000 - Barretos Telefone: (17) - 3322-8544 - [email protected] SUB-SEDE CAMPINAS Zeferino Vaz, S/N - Barão Geraldo - 13086-002 - Campinas Telefone: (19) - 3521-7907 - [email protected] SUB-SEDE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS Rua Cel. José Monteiro, 740 - 12243-730 - São José dos Campos Telefone: (12) - 3922-5935 - [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 61 NOTÍCIAS CAMPANHA “RESPIRE SÃO PAULO” SEMANA DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS DOENÇAS RESPIRATÓRIAS SPPT promove eventos públicos no Estado de São Paulo com realização de exames de rastreamento de doenças abertos à população A Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT), com o apoio da Boehringer Ingelheim/Pfizer, colocou nas ruas de várias cidades do Estado de São Paulo, no início de junho, a Campanha “Respire São Paulo”. O intuito principal foi alertar a população sobre as doenças respiratórias e sobre a importância da avaliação com um pneumologista regularmente. A iniciativa faz parte das comemorações da “1ª Semana Estadual de Educação e Conscientização sobre as Doenças Respiratórias” que, a partir de 2008, ocorrerá anualmente, conforme determina a recém-promulgada Lei nº 12.749. A data também coincide com “Dia do Pneumologista”, O2 de junho. A Campanha “Respire São Paulo” foi realizada em Ribeirão Preto, Santos, São José do Rio Preto, São Paulo, Sorocaba, Campinas e Piracicaba. Em todas as cidades, em praças públicas e com grande divulgação pela mídia local, uma equipe de médicos e técnicos da SPPT, aplicou questionário de sintomas respiratórios (GOLD), realizou Espirometrias, distribuiu materiais educativos sobre as principais doenças respiratórias (DPOC, asma, pneumonia, tabagismo e tuberculose), expôs vídeo educativo sobre qualidade de vida e orientou a população. O atendimento foi totalmente gratuito e considerado, em todas as praças, como uma grande prestação de serviço da SPPT para a comunidade. Números Gerais da Campanha “Respire São Paulo”: • Nas sete cidades realizadas foram avaliadas 2.312 pessoas e realizadas 1.956 Espirometrias (82,5% da população avaliada). Índices de DPOC 62 Índices de DPOC (Percentual) TOTAL DE PARTICIPANTES 583 422 411 270 RIBEIRÃO PRETO 264 207 SÃO PAULO 175 SANTOS S.J. RIO PRETO SOROCABA CAMPINAS PIRACICABA TOTAL DE EXAMES 403 397 302 233 260 186 143 RIBEIRÃO PRETO SÃO PAULO SANTOS S.J. RIO PRETO SOROCABA CAMPINAS PIRACICABA • A cidade de São José do Rio Preto teve a maior quantidade de público abordado na triagem, 583 pessoas. • As praças São Paulo e São José do Rio Preto realizaram os maiores números de Espirometrias, 403 e 397, respectivamente. • Em média, em 32% das Espirometrias realizadas foi observado Distúrbio Ventilatório Obstrutivo (GOLD). • 6,56% da população total que realizou Espirometria apresentaram Obstrução Grave ou Muito Grave (GOLD). • 75,5% da população que passou pela triagem nunca tinham ouvido falar sobre a DPOC. • Todos os casos diagnosticados receberam orientação e foram encaminhados para avaliação e tratamento com pneumologista já nos locais. Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) A Campanha “Respire São Paulo” conseguiu despertar a atenção da comunidade, divulgar as principais doenças respiratórias, ensinar medidas preventivas, fazer diagnóstico precoce e referir os pacientes para tratamento adequado divulgando o pneumologista. Temos certeza que a campanha foi um grande sucesso e deve ser repetida nos próximos anos. A diretoria da SPPT agradece a todos os médicos e técnicos da SPPT que atuaram na campanha, a Boheringer/Pfizer pela parceria, às Prefeituras Municipais, pela liberação dos espaços públicos, a imprensa que nos deu total apoio e cobertura e, a todas as pessoas que trabalharam no desenvolvimento e realização da Campanha “Respire São Paulo”. “RESPIRE SÃO PAULO” NA MÍDIA Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) SÃO PAULO: Bom Dia SP - Globo Telejornal Gazeta News Radio Gazeta Rádio Jovem Pan Rádio Bandeirantes BandNews FM Rádio Record Portal SEGS Rádio Mundial SOROCABA: Bom Dia Cidade – TV Globo Programa Noticidade / SBT Jornal Cruzeiro do Sul Radio Vanguarda/Alo Noticia Radio Cruzeiro Clube Virtual Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) RIBEIRÃO PRETO: EPTV – Globo TV Record Ribeirão Preto TV CLUB - Band Gazeta de Ribeirão On Line SANTOS: TV Record Radio Globo A Tribuna Digital S.José do Rio Preto: TV TEM - Globo Rádio Novo Tempo Índices de DPOC Índices de DPOC (Percentual) CAMPINAS: Rádio Globo TVB Noticias/SBT Rádio CBN Radio Bandeirantes Radio Educativa PIRACICABA: Jornal de Piracicaba Jornal Gazeta de Piracicaba Rádio Onda Livre Rádio Difusora Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 63 HISTÓRIA DA PNEUMOLOGIA DE FAT BOY JOE À LEPTINA: UMA AVENTURA DIGNA DO SR. PICKWICK Autor: Mauro Gomes Serviço: Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo “... e no caixote sentou-se um garoto gordo e de rosto vermelho em estado de sonolência (...). Joe! – que droga, aquele garoto foi dormir novamente! (...) Todas as pessoas estavam excitadas exceto o garoto gordo, e ele dormia profundamente como se o barulho do canhão fosse a sua canção de ninar... – Senhor, será que é possível beliscá-lo na sua perna? Nada mais o acorda!” O trecho acima foi extraído do romance “Os Escritos Póstumos do Clube Pickwick” (The Posthumous Papers of the Pickwick Club), publicado em 1836 por Charles Dickens. Neste, que foi seu primeiro livro, Dickens parece ter descrito o primeiro paciente portador de apnéia do sono. Há ainda diversas outras referências no livro a esse personagem – Fat Boy Joe -, sugerindo que ele tinha uma forma grave da doença. O romance gira em torno das peripécias de certo Sr. Pickwick, que junto a seus três inseparáveis amigos - Tupman, Snodgrass e Winkle, integrantes do Clube Pickwick -, saem em aventuras pela capital inglesa do século XIX. É um retrato comovente e humorístico da sociedade de seu tempo. Em 1918 Sir Willian Osler usou o termo “Pickwickian” pela primeira vez para referir-se a paciente obeso e sonolento, em referência ao título do livro. O epônimo, consagrado em 1956 por Burwell e col., remete ao romance de Charles Dickens, e não a algum suposto médico que primeiro descreveu a doença. A partir daí, muitos acreditam que o personagem Pickwick é que possuía a síndrome, o que não é verdade. O garoto Joe era o apneico do romance de Dickens. Durante a evolução em nosso planeta, as primeiras formas de vida provavelmente se desenvolveram nos climas equatoriais e não nos pólos. Isso deve ter induzido 64 Fig. 1 - Uma das primeiras edições de “The posthumous papers of the Pickwick Club”, quando Charles Dickens ainda utilizava o pseudônimo “Boz”. Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Fig. 2 - Ilustração de Joe – The Fat Boy, à época do lançamento do livro “The posthumous papers of the Pickwick Club” Fig. 3 - Charles Dickens nos primatas e nos primeiros seres humanos o surgimento dos ciclos de sono e vigília, conseqüência do movimento de rotação da Terra e do contato visual com o meio. O interesse pelo estudo do sono é relativamente recente. Talvez o maior obstáculo ao estudo do sono ao longo do tempo tenha sido o fato dos pesquisadores terem que ficar acordados à noite, o que só se tornou possível após o advento da luz elétrica. O primeiro médico a descrever uma apnéia foi Broadbent em 1877, referindo-se a uma pessoa de idade avançada, deitada de costas, em sono profundo e roncando ruidosamente e que, de tempos em tempos, apresentava falha da inspiração. “Então, ocorrerão dois, três ou quatro períodos respiratórios de movimentos torácicos ineficientes, para finalmente o ar entrar com um ronco barulhento ou rugido, após o qual ocorrerão várias inspirações profundas compensatórias”. Alguns momentos na história foram importantes para o desenvolvimento do estudo das doenças do sono e o primeiro deles foi a descoberta da atividade elétrica do sistema nervoso por Richard Caton, em 1875. O psiquiatra alemão Hans Berger foi o primeiro a descrever as ondas cerebrais no final dos anos 1920 e, na década de 1930, um grupo de Harvard descreveu os diferentes padrões de ondas cerebrais durante o sono. Avanços maiores nas pesquisas nesta área foram atrasados devido a Segunda Grande Guerra. Foi somente em 1953 que um fato marcou uma nova era neste campo: a descoberta dos movimentos oculares e sua correlação com as fases do sono, com os sonhos e os batimentos cardíacos por Aserinsky e Kleitman. Em 1956, Burwell e col. consagraram o termo “pickwickiano” para descrever pacientes obesos e sonolentos, portadores de hipoventilação, cianose, policitemia e cor pulmonale. No entanto, suas conclusões são hoje contestadas, pois eles atribuíram a sonolência à hipercapnia. A importância do seu trabalho está na criação com sucesso do termo “Síndrome de Pickwick”, o que despertou o interesse sobre o estudo do assunto e a lenta popularização dos distúrbios do sono na classe médica. Pouco depois, na Europa, grupos diferentes de pesquisas chegaram a conclusões semelhantes. Gastaut, Tassinari e Duron, na França, e Jung e Kuhlo, na Alemanha, observaram que doentes tidos como “pickwickianos” apresentavam repetidos episódios de apnéia durante o sono. Em 1965, o grupo francês descreveu a apnéia obstrutiva do sono, a importância do ronco, a hipersonolência e correlacionaram tais achados a doenças cardíacas, além de observar sua ocorrência mesmo nos não obesos. Kuhlo e col., em 1969, conseguiram melhorar esses doentes através da traqueostomia, consolidando o conceito que a apnéia do sono ocorre como conseqüência da obstrução ou do colapso das vias aéreas durante o sono. Finalmente, em 1973, Christian Guilleminault reuniu os conhecimentos e cunhou o termo Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS), diferenciando dos achados da síndrome da hipoventilação do obeso. Mas foi em 1978 que John Remmers descreveu a interação entre sono, Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 65 músculos da caixa torácica e da via aérea superior, o que elucidou o colapso da via aérea superior durante o sono. Guilleminaut, em 1982, relatou uma nova síndrome em crianças (Síndrome de Resistência de Vias Aéreas Superiores - SRVAS), também descrita em adultos em 1993. Nesse mesmo ano, importante estudo de Young e col. reconheceu a importância dos distúrbios do sono como problema de saúde pública, documentando sua prevalência na população. Mais recentemente, os avanços neste campo alcançaram a genética. Hoje se discute o papel da leptina (do grego leptos, magro) no controle da respiração, particularmente em obesos. Em modelos animais, a perda do gen responsável pela produção da leptina levou à disfunção no controle da respiração, particularmente durante o sono REM, à obesidade e insuficiência respiratória. Tais alterações foram revertidas após reposição de leptina e não ocorreram em animais sem anormalidades dessa proteína e com obesidade induzida artificialmente. Como é rara a deficiência de leptina em humanos, postula-se que nos homens obesos ocorra um estado de resistência periférica à leptina. Se os avanços no conhecimento da SAOS avançaram lentamente, o tratamento da mesma é muito mais recente. Embora divulgada em 1964 por Ikematsu para o tratamento do ronco, a uvulopalatofaringoplastia só foi utilizada para o tratamento da SAOS em 1981. Neste mesmo ano, na Austrália, Sullivan, Berthon-Jones, Issa e Eves publicaram os resultados de doentes que utilizaram a primeira máquina de pressão positiva contínua na via aérea (CPAP) para controle da apnéia obstrutiva do sono. Atualmente, o uso de CPAP é considerado a forma mais eficaz de tratamento da SAOS moderada e grave em adultos, e o seu uso também mostrou reduzir os níveis de leptina circulantes. Há apenas poucas décadas que desordens respiratórias foram correlacionadas com a obesidade. No entanto, há mais de um século Charles Dickens antecipou a ciência nesta sua obra, onde nos apresentava de modo caricatural um clássico portador do distúrbio do sono. Sem ser médico, Dickens era um sujeito pobre vindo de uma família cujo pai esteve preso por não pagar as suas dívidas. Possuía um profundo senso de observação das pessoas e de crítica social, e, com “Os Escritos Póstumos do Clube Pickwick”, publicado inicialmente em episódios inseridos em jornal quando ele tinha pouco mais de vinte anos, remediou a sua vida. Após vender 400 exemplares no seu ano de lançamento, no segundo ano a cifra atingiu o espantoso número de 40 mil, sendo um grande sucesso editorial. Seguiram-se Oliver Twist, Canção de Natal, David Copperfield e muitos outros, consolidando uma extensa e produtiva carreira. Reconhecido como um dos maiores escritores de todos os tempos, há um museu em sua homenagem em Londres e outro em Rochester, cidade onde anualmente se realiza o Festival Dickens. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. Dickens C. The posthumous papers of the Pickwick club. London: Chapman and Hall; 1836. Aserinsky E, Kleitman N. Regularly occurring periods of eye motility, and concomitant phenomena, during sleep. Science 1953;118:273–4. Gastaut H et al. Polygraphic study of diurnal and nocturnal (hyponic and respiratory) episodal manifestations of Pickwick Syndrome. Rev Neurol (Paris) 1965; 112:568-79. Guilleminault C et al. Insomnia with sleep apnea: a new syndrome. Science 1973; 181: 856-8. Kuhlo W et al. Successful management of pickwickian syndrome using long-term tracheostomy. Dtsch Med Wochenschr 1969; 94:1286-90. Dement WC. History of Sleep Medicine. Sleep Med Clin 2008;147–156. Young T, Palta M, Dempsey J, et al. The occurrence of sleep-disordered breathing among middle-aged adults. N Engl J Med 1993;328:1230-5. Lavie P. Sleep Med Rev 2008; 12(1): 5-17. Rabec C. Leptin, obesity and control of breathing : the new aventures of Mr. Pickwick. Electron J Biomed 2006;1:3-7. [email protected] PRÓXIMAS EDIÇÕES: Edição comermorativa dos 30 anos da SPPT Doenças Pulmonares Obstrutivas ENVIE SUAS SUGESTÕES 66 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008 67 68 Pneumologia Paulista Vol. 21, No.3/2008