O USO DE ALGUMAS TÉCNICAS DA TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL NO TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO USE OF SOME OF THE TECHNIQUES IN BEHAVIORAL THERAPY- COGNATE OBSESSIVE- COMPULSIVE DISORDER Lívia Maria Martins Guimarães¹ Tatiana C. M. Vasconcelos² RESUMO Os transtornos de ansiedade estão entre as doenças mentais mais prevalentes na atualidade. Entre estes, está o transtorno obsessivo-compulsivo, que acomete cerca de 2,5% da população geral. É considerado um transtorno mental grave, pois seus sintomas iniciam geralmente ao final da adolescência, sendo raro seu início depois dos 40 anos. As pessoas com esse transtorno apresentam prejuízos significativos em diversos aspectos, em especial nas relações sociais e familiares e no desempenho ocupacional. O objetivo desta revisão é identificar e apresentar algumas das técnicas cognitivo-comportamentais mais utilizadas no tratamento do Transtorno Obsessivo-Compulsivo. Esta revisão bibliográfica foi realizada através de pesquisa em livros, revistas e periódicos científicos coletados em banco de dados eletrônicos como SCIELO, MEDLINE e LILACS. A Terapia Cognitivo-Comportamental é uma abordagem terapêutica benéfica para o tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo por utilizar técnicas que atuam na correção dos pensamentos e crenças disfuncionais, assim como técnicas comportamentais que proporcionam mudanças nas compulsões ou comportamentos repetitivos do paciente. PALAVRAS-CHAVE: Transtorno Comportamental, Tratamento, Revisão. Obsessivo-Compulsivo, Terapia Cognitivo- ¹ Psicóloga. Pós-graduanda em Terapia Cognitivo-Comportamental – Centro Universitário Christus UNICHRISTUS ² Psicóloga Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental – Universidade de São Paulo - USP 2 INTRODUÇÃO O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) é um quadro psíquico incluído nos Transtornos de Ansiedade (ANDRADE, 2007). Seus sintomas envolvem alterações do comportamento (rituais ou compulsões, repetições, evitações), do pensamento (obsessões sobre dúvidas, preocupações excessivas, pensamentos de conteúdo ruim ou impróprio, etc.) e da emoção (medo, aflição, culpa, depressão) (ANDRADE, 2007). As características essenciais do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) são obsessõese/oucompulsões recorrentes e suficientemente graves para consumirem tempo ou causar sofrimento acentuado à pessoa (BALLONE, 2007). Os estudos que avaliaram o impacto do TOC na qualidade de vida dos portadores apontam para prejuízos significativos em diversos aspectos, em especial, nas relações sociais e familiares e no desempenho ocupacional (NIEDERAUER, 2007). Cerca de 2,5% da população em geral, é acometida de TOC. Seu curso geralmente é crônico, com os sintomas variando em intensidade e, se não tratado, com muita frequência, pode manter-se por toda a vida. Por vários motivos, é considerado um transtorno mental grave, pois os sintomas iniciam geralmente ao final da adolescência (muitas vezes ainda na infância), sendo raro seu início depois dos 40 anos (CORDIOLI, 2008). De acordo com Knapp e Isolan (2005) a terapia cognitivo-comportamental é uma terapia breve e estruturada, orientada para a solução de problemas, que envolve a colaboração ativa entre o paciente e o terapeuta para atingir objetivos estabelecidos. Cordioli (2008), afirma em um dos seus estudos que o modelo cognitivocomportamental permitiu uma melhor compreensão dos fenômenos obsessivo-compulsivos, da importância de aprendizagens errôneas e de crenças disfuncionais na sua gênese e manutenção. Permitiu, ainda, a proposição de uma variedade de técnicas e estratégias que possibilitam a redução dos sintomas para a maioria dos pacientes e até sua completaeliminação. O interesse pelo tema ocorreu a partir da identificação do sofrimento que o Transtorno Obsessivo-Compulsivocausaaos indivíduos. Muitos chegam a esconder dos familiares e amigos o problemaque o acomete. Para tanto, foi escolhida a Terapia Cognitivo-Comportamentalcomo enfoque terapêuticono tratamento do transtorno obsessivo-compulsivopelo fato de ser umaabordagem com uma variedade de técnicas e estratégias que possibilitam a redução dos sintomas para a maioria dos pacientes e até sua eliminação completa. O intuito desse trabalho é identificar e 3 apresentar algumas das técnicas cognitivo-comportamentais mais utilizadas no tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo. Este trabalho irá contribuir para a comunidade científica na construçãodo conhecimento acerca da utilização das técnicas da TCC no tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo. METODOLOGIA Para efetivação desse estudo foi realizada uma revisão da literatura, utilizando para tanto, livros, revistas e periódicos científicos dos bancos de dados SCIELO, MEDLINE e LILACS,com o objetivo deverificar algumas pesquisasque têm sido realizadas e como os diversos pesquisadores têm se posicionado acerca do tema. Os termos pesquisados foram: Terapia Cognitivo-Comportamental, Transtorno Obsessivo-Compulsivo. A triagem dos artigos foi realizada através da leitura dos resumos e a seleção foi apartir dos quemais poderiam contribuir para a temática em estudo.Foram triados no total 35 artigos, no período entre 10 de outubro de 2012 e20de fevereiro de 2013, dos quais 25 foram citados no presente trabalho. A TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma intervenção semi-estruturada, objetiva e orientada para metas, que aborda fatores cognitivos, emocionais e comportamentais no tratamento dos transtornos psiquiátricos (DUCHESNE, 2002). Para Stallard (2007), a terapia cognitivo-comportamental não é uma intervenção homogênea realizada de maneira padronizada; ao contrário, ela adota várias estratégias combinadas e empregadas de diferentes maneiras com um grupo heterogêneo de clientes, de diferentes idades e diferente desenvolvimento cognitivo, linguístico e social. A Terapia Cognitiva, segundo Andrade (2007), é uma abordagem ativa, diretiva e estruturada. Fundamenta-se numa base lógica teórica subjacente, segundo a qual o afeto e o comportamento de um indivíduo são largamente determinados pelo modo como ele estrutura o mundo. Confirmando a afirmação anterior, Beck (1997), afirma que a visão teórica da TCC está baseada na idéia de que os sentimentos e os comportamentos do indivíduo são determinados pelo modo como ele estrutura o mundo, suas cognições. 4 Cognição é o conteúdo do pensamento e os processos envolvidos no ato de pensar; representa a síntese de estímulos internos e externos e evidencia o modo como a pessoa avalia uma situação (SAFFI et al, 2008). Outro conceito utilizado pela TCC é o de distorções cognitivas, que de acordo com Knapp (2004), são vieses sistemáticos na forma como indivíduos interpretam suas experiências. Se a situação é avaliada erroneamente, essas distorções podem amplificar o impacto das percepções falhas. Ainda de acordo com Knapp (2004), as distorções cognitivas podem levar o indivíduo a conclusões equivocadas mesmo quando sua percepção da situação está acurada. Segundo Knapp (2004), os pensamentos automáticos são as cognições mais fáceis de acessar e modificar, porém podem não ocorrer em forma de pensamento, mas em forma de imagens. De acordo com Becket al., (1993 apud SAFFI et al, 2008), pensamentos automáticos são pensamentos breves e involuntários que surgem de modo inesperado. São mensagens específicas, discretas, que parecem taquigrafadas, compostas por palavras curtas e essenciais. Bahls (2004) ressalta que um dos objetivos da TCCé corrigir as distorções cognitivas que estão gerando problemas ao indivíduo e fazer com que este desenvolva meios eficazes para enfrentá-los. Para tanto são utilizadas técnicas cognitivas que buscam identificar os pensamentos automáticos, testar estes pensamentos e substituir as distorções cognitivas. Knapp (2004) lista as distorções cognitivas mais comumente observadas, modificadas a partir de outros autores. 1. Catastrofização – Pensar que o pior de uma situação irá acontecer, sem levar em consideração a possibilidade de outros desfechos. 2. Raciocínio emocional – Presumir que sentimentos são fatos. Pensar que algo é verdadeiro porque tem uma emoção muito forte a respeito. Deixar os sentimentos guiarem a interpretação da realidade. 3. Polarização (pensamento tudo-ou-nada, dicotômico) – Ver a situação em duas categorias apenas, mutualmente exclusivas, em vez de um continuum. Perceber eventos ou pessoas em termos absolutos. 4. Abstração seletiva (visão em túnel, filtro mental, filtro negativo) – Um aspecto de uma situação complexa é o foco da atenção, enquanto outros aspectos relevantes da situação são ignorados. 5. Adivinhação – Prever o futuro. Antecipar problemas que talvez não venham a existir. Expectativas negativas estabelecidas como fatos. 5 6. Leitura mental – Presumir, sem evidências, que sabe o que os outros estão pensando, desconsiderando outras hipóteses possíveis. 7. Rotulação – Colocar um rótulo global, rígido em si mesmo, numa pessoa, ou situação, em vez de rotular a situação ou o comportamento específico. 8. Desqualificação do positivo – Experiências positivas e qualidades que conflituam com a visão negativa são desvalorizadas porque ‘não contam’ ou são triviais. 9. Minimização e maximização – Características e experiências positivas em si mesmo, no outro ou nas situações são minimizadas enquanto o negativo é maximizado. 10. Personalização – Assumir a culpa ou responsabilidade por acontecimentos negativos, falhando em ver que outras pessoas e fatores também estão envolvidos nos acontecimentos. 11. Hipergeneralização – Perceber num evento específico um padrão universal. Uma característica específica numa situação específica é avaliada como acontecendo em todas as situações. 12. Imperativos (‘deveria’ e ‘tenho que’) – Interpretar eventos em termos de como as coisas deveriam ser, em vez de simplesmente considerar como as coisas são. 13. Vitimização – Considerar-se injustiçado ou não entendido. A fonte dos sentimentos negativos é algo ou alguém, havendo recusa ou dificuldade de se responsabilizar pelos próprios sentimentos ou comportamentos. 14. Questionalização (E se?) –Focar o evento naquilo que poderia ter sido e não foi. Culpar-se pelas escolhas do passado e questionar-se por escolhas futuras. Além dos pensamentos automáticos, o modelo cognitivo é formado por crenças, que de acordo com Beck et al., (1993 apud SAFFI et al, 2008), são pensamentos ‘tão fundamentais e profundos que as pessoas frequentemente não os articulam, sequer para si mesmas’. As crenças são formadas por meio da interação com o mundo e com outras pessoas, ou seja, pela educação que se recebe e pelos modelos que se aprendem (BECK et al., 1993 apud SAFFI et al, 2008). Em um nível intermediário de cognições encontramos as crenças subjacentes, que são constituídas de pressupostos e regras que governam a relação do indivíduo no mundo (LIMA et al,. 2004). A TCC utiliza-se de procedimentos que visam à identificação de pensamentos distorcidos para posterior confrontação com a realidade, ou seja, procurar alterar o sistema de crenças disfuncionais que se encontram subjacentes a essas cognições (YANO, 2003). 6 Segundo Cade (2001), atualmente, estudos mostram que essa abordagem abrange amplos aspectos dos problemas humanos e patologias psiquiátricas, como o tratamento da dor crônica, hipertensão arterial, cefaleias, fobias, transtorno do pânico, reabilitação neuropsicológica, etc. O TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) possui curso crônico e é caracterizado pela presença de obsessões e compulsões, que ocupam boa parte do tempo do paciente, acompanhadas de desconforto, comprometendo as rotinas diárias, o desempenho profissional e as relações interpessoais (DSM-IV-TR, 2002). De acordo com Cassol (2010), o Transtorno Obsessivo-compulsivo é um transtorno mental incluído pelo DSM-IV entre os chamados transtornos de ansiedade. O transtorno aparece em média, entre os 20 e 25 anos de idade, acomete mais as mulheres do que os homens. As suas causas ainda não são bem definidas, mas se sabe que o fator genético é muito forte, uma vez que é comum que várias pessoas de uma mesma família sejam acometidas (SILVA, 2012). Segundo Ballone (2007), ele tanto pode surgir de forma abrupta, após algum evento desencadeante ou, mais comumente, sem que esteja associada a algum evento estressor importante. Um levantamento feito pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1998 considerou o TOC o 4º transtorno psiquiátrico mais comum, sendo precedido somente pela depressão, pela fobia social e pelo abuso de substâncias (NIEDERAUER, 2007). Há trabalhos atestando que20 a 40% dos pacientes não obtém melhora apesar do tratamento médico, 40 a 50% têm melhora moderada e apenas 20 a 30% melhoram significativamente. O bom ajustamento social e profissional ajuda a melhorar o prognóstico. Há casos em que a hospitalização é necessária, principalmente quando o paciente submete-se totalmente às compulsões ao invés de resistir a elas (BALLONE, 2007). Silva (2012), afirma que as obsessões são pensamentos repetitivos, negativos, estressantes, de natureza sempre ruim ou desagradável, que surgem de forma persistente e intrusiva, como se fossem ‘disquinhos arranhados’ de que a pessoa não consegue se livrar. Já as compulsões, conhecidas popularmente como ‘manias’, são comportamentos repetitivos que a pessoa se obriga a ter para ‘anular’ as consequências de seus pensamentos obsessivos, que ela teme que se realizem (SILVA, 2012). 7 Segundo Ferrão (2007), o transtorno obsessivo-compulsivo abrange sintomas que representam diversos domínios psicopatológicos. Estes sintomas incluem percepções, cognições(obsessões), emoções, dificuldades nos relacionamentos sociais e diversos comportamentos motores(compulsões). Rangé e Sousa (2008), afirmam que pacientes com TOC superestimam a probabilidade de correrem perigo e de cometerem erros e partem do princípio de que toda situação é perigosa até que prove o contrário, por isso a necessidade de rituais para garantir que o perigo seja removido. Nierderauer (2007) ressalta que as obsessões e compulsões ocupam a maior parte do dia desses indivíduos, causando um impacto negativo no seu dia-a-dia, nas atividades sociais e ocupacionais, bem como nas suas relações familiares. Cordioli (2008), diz que o TOC, na maioria das vezes, interfere de maneira acentuada na vida da família, que é obrigada a adaptar-se aos sintomas, alterar suas rotinas, reduzir o uso de espaços e objetos, o que causa constantes conflitos. Além de que, até pouco tempo atrás, era considerado um transtorno de difícil tratamento. Segundo Rapoport (1988 apud GONZALEZ, 1999) as obsessões mais comuns são: preocupação com sujeira ou secreções corporais, medo de que algo ruim possa acontecer a si mesmo ou a alguém próximo, preocupação com simetria e escrupulosidade. As principais compulsões são: lavagem de mãos, verificação de portas, ordenação e arrumação, contagem e colecionismo. Já Silva (2012) destaca que “não raro os pacientes também relatam obsessões de conteúdo sexual e/ou de caráter religioso, o que envolve sentimentos de muita culpa”. PRINCIPAIS TÉCNICAS COGNITIVO-COMPORTAMENTAIS NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO Silva (2012) ressalta que além do tratamento medicamentoso, a psicoterapia de abordagem cognitivo-comportamental também é de grande importância no tratamento do TOC, pois atua de forma objetiva e estruturada para que hajam mudanças nas ideias distorcidas em relação aos acontecimentos, ao ambiente e à vida em geral, bem como seus comportamentos repetitivos. O referencial teórico da terapia cognitivo-comportamental permite que se utilizem várias técnicas, tanto individuais como em grupo, com o intuito de se trabalhar habilidades de 8 relacionamento, estilo de vida, ajustamento social, redução do estresse, resolução de problemas, etc., permitindo mais controle sobre a situação (CADE, 2001). As técnicas comportamentais são empregadas para modificar condutas inadequadas relacionadas com o transtorno psiquiátrico em questão (BAHLS, 2004). Psicoeducação Segundo Abreu e Oliveira (2008), uma característica bastante distintiva da terapia cognitiva em relação a outras abordagens é o seu caráter psicoeducativo. A psicoeducação é uma intervenção que tem como característica informar ao paciente dados sobre o seu diagnóstico. Informações que abranjam a etiologia, o funcionamento, o tratamento mais indicado e o prognóstico (COLOM&VIETA, 2004). Ela fornece um potente instrumento não apenas para melhorar a evolução de pacientes, mas para ajudá-los a gerenciar desespero, medos, estigma e baixa auto-estima. Knapp (2004) ressalta que a psicoeducação acerca do transtorno melhora a motivação para a mudança e estimula a participação pró-ativa do paciente na recuperação. A psicoeducação deve ocorrer com qualquer aspecto importante na vida do paciente, cujas informações insuficientes ou distorcidas devem ser corrigidas. O terapeuta pode utilizar todos os recursos técnicos e didáticos que tiver disponível; sejam recursos audiovisuais, artísticos, manuais, ou outros que sua criatividade lhe permitir (ITO, 2001). Registro de pensamentos disfuncionais (RPD) De acordo com Knapp (2004), grande parte do trabalho de identificar, examinar e modificar cognições utiliza o RPD, originalmente formulado por Aaron Beck (1979) e modificado por Judith Beck (1995). Treinar o paciente e solicitar que ele registre seus pensamentos disfuncionais, no final do dia ou, de preferência, ainda na vigência do desconforto psicológico, é técnica muito utilizada na TCC (JUNIOR, 2004). O preenchimento do RPD como tarefa de casa, no intervalo das sessões, oportuniza ao paciente seguir identificando, avaliando e questionando seus pensamentos automáticos. E permite ao terapeuta ter uma ideia do que realmente ocorre com seu paciente entre as sessões (JUNIOR, 2004). 9 Questionamento Socrático O Questionamento Socrático constitui a ferramenta principal e mais concreta para corrigir pensamentos disfuncionais (crenças distorcidas), buscando uma ‘maneira’ mais adaptada, racional e realista de interpretar os estímulos e a realidade da pessoa (ANDRADE, 2007). Deve ser feito, a partir da identificação e registro dos pensamentos disfuncionais, encorajando o paciente a avaliá-los, por meio de perguntas que o levam a pensar e, dessa forma, ter clareza e tomar decisões racionais a partir de suas próprias conclusões (CORDIOLI, 2008). O questionamento socrático pode ser útil para pacientes que acreditam demasiadamente no poder do pensamento (fusão de pensamento e ação, pensamento mágico) ou na necessidade de controlá-lo. Tais pacientes expressam o medo de se tornar o contrário: sujos, agressivos, ateus ou com algum desvio de caráter (SALKOVSKIS et al,. 1999, apud KNAPP, 2004). O questionamento pode ser feito utilizando-se diferentes estratégias que foram adaptadas para o TOC (busca de evidências e explicações alternativas, torta da responsabilidade, questionamento do duplo padrão, duas teorias, questionamentos específicos para cada domínio de crenças, testes comportamentais, etc.). A técnica das duas teorias (A e B) Segundo Salkovskiset al,. (1998 apud KNAPP, 2004), uma das formas de mudar uma interpretação errônea (de um sintoma, situação ou pensamento) é assessorar a pessoa a construir e testar uma explicação alternativa coerente, menos ameaçadora e aflitiva, modificando a forma como o paciente interpreta a ocorrência e o conteúdo dos pensamentos e impulsos intrusivos e levando-o a encará-los de forma mais realística. Isso pode ser feito pelo terapeuta ao propor e sugerir a testagem de explicações alternativas. Ainda de acordo com Salkovskiset al,. (1998 apud KNAPP, 2004): Há duas teorias alternativas para explicar o que ocorre: 1) Teoria A: Você está de fato contaminado e precisa se lavar porque podecontaminar sua família e ser responsável por doenças e, quem sabe, pelamorte de familiares. 10 2) Teoria B: Você é uma pessoa muito sensível a medos de sercontaminado e reage a esses medos de uma forma que compromete suavida: fazendo um excesso de lavagens seguidas. Automonitoramento De acordo com Leahy (1996, apud KNAPP, 2004) a intervenção terapêutica mais simples e menos intrusiva é o automonitoramento. O automonitoramento pode trazer uma série de informações ao paciente e ao terapeuta: 1) como o tempo é usado, 2) variações do humor associadas com emoções e pensamentos; além disso, traz os efeitos benéficos de: 3) aumentar a consciência do paciente sobre o que está fazendo, pensando, sentindo, e 4) esse aumento da consciência pode ampliar o autocontrole do paciente (LEAHY 1996, apud KNAPP, 2004). Exposição e prevenção de respostas A Terapia de Exposição e Prevenção de Rituais tem-se mostrado muito eficaz na eliminação dos sintomas do TOC. Ela está fundamentada exatamente nas modalidades de aprendizagem do indivíduo, especialmente através da habituação. Utilizando-se a habituação pode-se levar o paciente de TOC a abster-se de evitar ou de executar os rituais neutralizadores dos pensamentos obsessivos (ANDRADE, 2007). De acordo com Cordioli (2008), a exposição consiste no contato direto ou na imaginação com objetos, lugares ou situações que, na realidade, não são perigosos, mas que a pessoa evita em razão do medo, aflição ou nojo que o contato provoca. O principal efeito da exposição é o aumento da ansiedade, que pode chegar a níveis elevados nos exercícios iniciais e a cada exercício os níveis de ansiedade vão diminuindo e a necessidade de realizar rituais se tornam menores, podendo até desaparecer por completo (CORDIOLI, 2008). Já a Prevenção de Respostas (ou dos rituais) é a abstenção, do paciente, de realizar rituais, compulsões mentais, ou outras manobras, destinadas a aliviar ou neutralizar medos ou desconfortos associados às obsessões (CORDIOLI, 2008). As tarefas devem ser claras e operacionais: não lavar as mãos ao chegar em casa da rua, verificar a porta apenas uma vez antes de deitar, demorar no máximo 10 minutos no banho, sentar diariamente durante 30 minutos na cama com a roupa da rua (CORDIOLI, 2008). 11 Assim como ocorre com a exposição, a prevenção da resposta provoca um incremento inicial de ansiedade, que desaparece espontaneamente com o passar do tempo, reduzindo a intensidade do impulso a realizar rituais e, consequentemente, sua frequência (RACHMAN et al, 1976, apud KNAPP, 2004). Modelação É a realização por parte do terapeuta de um comportamento desejado em frente ao paciente, de forma a encorajá-lo a fazer o mesmo. Uma vez que a simples observação de outras pessoas fazendo tarefas consideradas de risco é uma forma de reduzir ou desaprender medos (CORDIOLI, 2008). Segundo Cordioli 2004, os exercícios servem para ilustrar de forma didática o fenômeno da habituação, pois, em geral, a ansiedade, intensa no início, desaparece rapidamente ainda no decorrer da sessão. Experimentos comportamentais Uma forma muito eficiente de corrigir crenças distorcidas é testando-as na prática. Solicita-se ao paciente que descreva um erro (por exemplo, fazer um depósito numa conta bancária errada) e questiona-se as consequências que imagina que possa ocorrer. Posteriormente, o paciente fará um experimento e a comparação entre o que aconteceu de fato e o que havia imaginado (SALKOVSKIS et al,. 1998 apud KNAPP, 2004), CONCLUSÃO Tendo em vista o que foi apresentado e discutido nesta revisão bibliográfica, verificamos que a TCC é, possivelmente, uma abordagem terapêutica benéfica para o tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo, por utilizar técnicas que atuam na correção dos pensamentos e crenças disfuncionais, já que pacientes com TOC acreditam demasiadamente no poder dos seus pensamentos. Assim como utiliza técnicas comportamentais que proporcionam mudanças nas compulsões ou comportamentos repetitivos do paciente. 12 Essas técnicas propõem-se a identificar, corrigir e testar conceitos distorcidos e contribuir para que o paciente através da correção dos pensamentos e crenças possa superar situações que lhe trazem sofrimento. No entanto, novos estudos deverão avaliar melhor a eficácia da TCC para o transtorno obsessivo-compulsivo, ampliando o leque de técnicas disponíveis para o tratamento. ABSTRACT Anxiety disorders are among the most prevalent mental illnesses today. Among these is the obsessive-compulsive disorder, which affects about 2.5% of the general population. It is considered a severe mental disorder because its symptoms usually begin in late adolescence, being rare start after age 40. People with this disorder have significant losses in many aspects, especially in social and family relationships and occupational performance. The aim of this review is to identify and present some of the cognitive-behavioral techniques most often used to treat Obsessive-Compulsive Disorder. This literature review was performed by searching in books, magazines and journals collected in electronic databases as SCIELO, MEDLINE and LILACS. A Cognitive-behavioral therapy is an benefic approach for the treatment of obsessive-compulsive disorder by using techniques that work in correcting the dysfunctional thoughts and beliefs, as well as behavioral techniques that provide changes in repetitive behaviors or compulsions patient. KEYWORDS: Obsessive-compulsive disorder, Cognitive-Behavioral Treatment Review. REFERÊNCIAS ABREU, N.; de OLIVEIRA, I. R. Terapia cognitiva no tratamento da depressão. In: Psicoterapias: abordagens atuais. 3. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. American PsychiatricAssociation. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-IV-TR. 4ª ed rev. Porto Alegre: Artmed; 2002. ANDRADE, M. A.TOC: Terapia Cognitiva-Comportamental, in. PsiqWeb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, 2007. BAHLS, S.C.; Navolar, A.B.B. Terapia cognitivo-comportamentais: conceitos e pressupostos teóricos. Revista eletrônica de psicologia V.4 Curitiba, 2004. BALLONE,G. J- Transtorno Obsessivo-Compulsivo - in. 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