Embolia de Membros Superiores

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Nelson Wolosker
Médico-Assistente da Disciplina de
Cirurgia Vascular do Departamento
de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São
Paulo
Embolia de Membros
Superiores
As emboJias arteriais dos membros superiores correspondem a 16 a 32% dos casos de
obstrução arterial embólica periférica. Os autores analisaram 34 casos de embolia arterial em
membros superiores, atendidos de janeiro de 1991 a dezembro de 1993.
A idade variou entre 38 e 84 anos (mediana = 62 anos). Quinze pacientes eram do sexo
masculino e 17 do feminino. A etiologia da em,bolia foi na grande maioria dos casos bem
definida, sendo que a principal causa foi a fibrilação atrial (81 %). A oclusão da artéria braquial
foi a mais frequente (62% ).Todos os pacientes desta série apresentavam isquemia de membro,
sendo leve em 16 casos (47%) e grave nos outros 18 (53%). Nenhum paciente estava com
gangrena à admissão. A maioria dos pacientes apresentava tempo de isquemia entre o início do
quadro e da liberação do fluxo arterial entre 6 e 12 horas (40%).
Uma paciente foi tratada clinicamente. Todos os outros foram submetidos a embolectomia
braquial com catéter de Fogarty.
Empregou-se a fasciotomia em um paciente devido a presença de síndrome comparti mental.
Dois pacientes faleceram, no pós-operatório imediato, um por embolia mesentérica e o outro
por infarto miocárdico. A recuperação dos batimentos arteriais foi obtida em todos os pacientes.
Em três casos houve oclusão pós-operatória, reoperados com sucesso.
Em nenhum caso observou-se_alterações metabólicas que comprometessem o estado geral
do paciente e que pudessem ser relacionadas à reperfusão do membro superior isquêmico.
A preservação do membro foi obtida em todos os doentes.
Concluímos que em casos de embolia de membro superior, apresentando-se o paciente em
boas condições clínicas e com o membro superior sem necrose ins.t alada, vale a pena a
realização da embolectomia com catéter de Fogarty, devido aos bons resultados quanto à
manutenção do membro e batimentos arteriais, além de baixos índices de complicações derivadas
do procedimento cirúrgico.
Unitermos: artérias, artéria braquial, cirurgia arterial, embolectomia
s embolias arteriais dos membros
superiores correspondem a 16 a
32% dos casos de obstrução
arterial embólica periférica 7,9,10,1 6 .
Normalmente a sua evolução é mais
benigna do que nos membros inferiores,
entretanto a gangrena do membro, óbito,
ou sequela funcional permanente podem
ser a evolução em alguns casos 15
Apresentamos uma série de 34 casos
de embolia arterial em membros su periores tratados entre janeiro de 1991 e
julho de 1993 no Pronto Socorro do
Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo.
A
CAsuíSTICA EMÉTODOS
Entre janeiro de 1991 e julho de 1993 ,
32 pacientes atendidos no Pronto
Socorro do HCFMUSP foram tratados por
34 episódios de embolia em membros
supenores,
O quadro clínico de embolia arterial
de membro superior foi caracterizada
pela presença de sinais e sintomas de
oclusão arterial aguda, quais sejam: dor
no membro acometido, ausência dos
pulsos distalmente ao nível da obstrução,
má perfusão tecidual (observada pela
palidez ou cianose distaI e/ou diminuição
da temperatura em relação ao outro
membro), paresia ou paralisia (tanto pela
lesão isquêmica das fibras nervosas
quanto pela isquemia dos grupos musculares envolvidos) e parestesia, hipoestesia ou anestesia dos dedós ou da
mão. O diagnóstico de embolia arterial
foi determinado pela ausência de sintomas prévios em membro com quadro
clínico de instalação aguda, associado à
presença de fonte embolígena (geral-
Sérgio Kuzniec
Álvaro Gaudêncio
Paulo Celso Motta Guimarães
Ruben Rosoky
Médicos Pós Graduandos da
Disciplina de Cirurgia Vascular do
Departamento de Cirurgia da
Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
Leandro J,C, Silva
Médico Estagiário da Disciplina de
Cirurgia Vascular do Departamento
de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São
Paulo
Ricardo Aun
Professor-Assistente-Doutor da
Disciplina de Cirurgia Vascular do
Departamento de Cirurgia da
Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
Berilo Langer
Professor Titular da Disciplina de
Cirurgia Vascular do Departamento
de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São
Paulo
Trabalho realizado no Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo,
Recebido em 78/ 9/ 95
Aprovado para publ, em 27/ 5/ 96
Pacientes n = 32
Etiologia da embolia .""" .. N" ..................... %
FlbrUacão alrlal .................. 26 ..................... 81
Doença Valvar ..................... 1 ........................ 5
Não esclarecida ................. 5 ...................... 16
Tabela 1: Distribuição pela origem da embolia
mente cardíaca) e confirmação intraoperatória, com a retirada do material
embólico.
Quinze pacientes eram do sexo masculino e 17 do feminino , com a idade
variando entre 38 e 84 anos (mediana =
62 anos).
O membro superior direito foi acometido em 20 casos e o esquerdo em 14.
CIR VASC ANGIOL 12: 120-124,1996
Embolia de Membros Superiores
Uma paciente foi atendida em 3 episódios
diferentes de embolia para o mesmo
membro (direito).
A etiologia da embolia foi na grande
maioria dos casos bem definida, sendo
que a principal causa foi a fibrilação atrial,
como verificamos na tabela I.
O nível de obstrução arterial está
relacionado na tabela II. Note-se o
predomínio do acometimento da artéria
braquial 19
Todos os pacientes desta série
apresentavam isquemia de membro,
sendo leve em 16 casos (47%) e grave
nos outros 18 (53%). Nenhum paciente
estava com gangrena à admissão.
O tempo de isquemia entre o início do
quadro e o momento da liberação do fluxo
arterial está representado na tabela IH,
sendo o intervalo mínimo de 2 horas e o
máximo de 36 horas.
Com relação aos aspectos terapêuticos o acesso cirúrgico foi o
braquial em todos os pacientes,
todos sob anestesia local e embolectomia clássica com catéter de
Fogarty.
Trê s pacientes apresentaram-se em
condições clínicas graves , o primeiro
com insuficiência cardíaca descompensada, necessitando de cuidados
intensivo s, o segundo com início da
i squemia do membro menos de 24
horas após a instalação de acidente
vas cular cerebral e o último com
parada cárdio-respiratória devidQ a
infarto agudo do miocárdio.
Em 32 casos instituiu-se o tratamento
cirúrgico de urgência. Empregou-se
anestesia local por infiltração de lidocaína
ou bloqueio do membro. Em todos os casos
operados foi abordada a artéria braquial
na sua porção distaI, com extensão até a
sua bifurcação quando necessário o
acesso à origem das artérias radial e uInar.
Todas as embolectomias foram realizadas
com catéter de Fogarty. Em um caso foi
feita também a construção de fistula artériovenosa rádio-cefálica distaI com o o~ietivo
de aumentar o fluxo proximalpela dimi-
Nelson Wolosker e cols.
Paclenles n = 32
Nível de obslruçao ............ N2 .......•........ %
AxIlar .................................... 5 ....... c•••••••• 15
Braqt.ial ............................... 21 ............... 62
Radial e Ulnar ...................... 8 ................ 23
Paclenles n =32
Tempo de Isquemla ........... N2 ............... %
O a 6 horas ......................... 10 ............... 32
6 a 12 horas ........................ 13 ............... 40
mais de 12 horas ................. 9 ................ 28
Tabela 11: Dlslrlbulçao segundo o nível de
obslruçao
Tabela 111: Dlslrlbulçao segundo lempo de
Isquemla
nuição da resistência periférica, uma vez
que o leito arterial apresentava-se aparentemente comprometido.
Uma paciente foi tratada clinica~ente.
Uma paciente desenvolveu síndrome
compartimental, sendo então realizada
fasciotomia em membro superior por
incisão longitudinal extensa no compartimento flexor, tendo sido prolongada
através do ligamento carpeano até dentro
da mão 14
Em nenhum caso foi realizada arteriografia.
crômca e insuficiência cardíaca congestiva, com dor fraca e isquemia leve
do membro superior direito , que se
iniciou duas horas antes do atendimento.
Foi tratada com aquecimento do membro,
vasodilatador endovenoso e analgesia.
Houve desaparecimento dos sintomas e
obtenção de perfusão normal da extremidade em cerca de 8 horas.
Em nenhum caso observou-se alterações metabólicas que comprometessem o estado geral do paciente e que
pudessem ser relacionadas à reperfusão
do membro superior isquêmico.
Todos os pacientes receberam anticoagulantes após a cirurgia, visando a
prevenção da formação de novos trombos. A reembolização ocorreu em uma
de nossas pacientes por duas vezes,
mesmo na vigência de anticoagulação
oral adequada, tendo ela sido ~eoperada
com sucesso.
Dois pacientes faleceram, um por
complicações de necrose intestinal
maciça decorrente de embolia de artéria
mesentérica superior com rápida evolução para sepsis e óbito. O outro faleceu
devido a IAM agudo extenso antes de
ser operado.
Dentre os 32 membros operados, 29
foram bem sucedidos quanto à restituição dos batimentos arteriais e
perfusão sanguínea do membro após a
primeira cirurgia. Nos 3 casos restantes,
houve trombose pós-operatória, sendo
necessária reoperação logo nas primeiras
24 horas. Obteve-se sucesso nos 3
episódios com reoperação e trombectomia com catéter de Fogarty. Em um caso,
na reoperação, foi construída uma fístula
artério-venosa rádio-cefálica, no intuito
de se aumentar o fluxo arterial proximal
devido a doença arterial proximal e distaI,
que foi a provável 'causa da trombose
após a primeira cirurgia.
Um paciente apresentou infarto agudo
do miocárdio no pós-operatório imediato.
Necessitou internação prolongada, mas
teve boa evolução.
Uma paciente foi tratada sem cirurgia,
com boa evolução. Era uma paciente de
85 anos, portadora de fibrilação atrial
CIR VASC ANGIOL 12 : 120-124, 1996
A embolia arterial é uma manifestação
clínica muito frequente 1. n .17 , correspondendo à segunda maior causa de
obstrução arterial aguda de membro
superior 19 . Neste estudo, 86% dos casos
tinham certamente como fonte embolígena o coração.
A distribuição equitati va entre os
sexos, a variação de idade (entre 38 e 84
anos de idade) e o acometimento preferencial do membro superior direito, com
20 episódios (58,8 %), foi compatível com
a encontrada na literatura 12
O diagnóstico clínico de embolia
costuma não trazer dificuldades, principalmente quando algum fator causal está
evidente. Em todos os nossos casos,
especialmente quando a doença cardíaca
era presente, pudemos supor que a
origem embólica não estava relacionada
à árvore arterial do membro, autorizando
Nelson Wolosker e cols.
Embolia de Membros Superiores
a não realização de arteriografia, o que
provocaria uma maior demora para que
se encaminhasse o paciente para a
cirurgia, além das complicações decorrentes do exame. Em casos de dúvida
diagnóstica é necessária a arteriografia
para que a correção cirúrgica adequada
seja instituída.
Na maioria dos casos (86%) havia
alguma alteração cardíaca que pudesse
justificar a origem do êmbolo 18 Outras
causas menos frequentes de embolia
para membro superior, como aneurismas
ou placas embolizantes, não foram
encontrados na nossa casuística l 9 . Os
cinco casos (16%) de origem não reconhecida coincidem com a maioria das
estatísticas 13
A embolia em membro superior apresentou-se em 53 % da nossa casuística
sob a forma de isquemia grave, podendo
levar a lesões irreversíveis para o membro
quando não tratado em tempo.
A taxa de mortalidade em di versas
séries varia entre 9 e 21 %11, geralmente
causada por doença cardíacaS, com
mortalidade duas vezes maior no s
indivíduos com mais de 60 anos D Na
nossa casuística, o índice foi de 6,2 %,
sendo os pacientes de mais de 60 anos.
O tratamento clínico, com uma anticoagulação adequada em pacientes com
isquemia leve, pode ser. conduta justificável em situações clínicas graves, em
que o membro superior não esteja em
risco, no que pese o risco de claudicação
de membro superior. Uma paciente com
isquemia leve e condições clínicas pouco
favoráveis, foi tratada clinicamente, com
bom resultado.
A embolectomia por exploração
cirúrgica já era preconizada como tratamento' de escolha 1• 17 mesmo antes da
utilização rotineira do catéter preconizado por Fogarty 6 em 1963. A simplificação técnica introduzida pelo
método e a possibilidade de utilização
de anestesia local para o acesso à
bifurcação da artéria braquial permitiram
maior liberalidade na indicação da
CIrurgia.
Os paCIentes submetidos ao tratamento cirúrgico apresentaram bons
resultados, mesmo nos 3 casos em que
foi necessária reoperação. Não houve
nenhuma amputação de membro ou
gangrenas digitais. Os resultados foram
adequados em todos os grupos, independentemente de tempo ou grau de
IsquernIa.
Devido à presença de circulação
colateral abundante no membro superior,
o grau de isquemia é menor do que no
no membro inferior. Nesta série de
pacientes, a indicação cirúrgica foi a
presença de embolia em pacientes com o
membro superior sem alterações tróf1cas
irreversíveis, não se levando em consideração o tempo e o grau da isquemia.
Não se confirmou o conceito de que
os melhores resultados ocorreriam em
indivíduos com menor tempo de isquemia s.9• 18
Não houve alterações metabólicas
decorrentes da reperfusão, mesmo em
membros com isquemia grave. Estas
alterações são comuns, e muitas vezes
graves, após obstruções arteriais agudas
em membro s inferiores ), porém pro vavelmente a menor massa muscular do
membro superior em relação ao inferior
faz com que a liberação de metabólitos
indesejáveis ocorra em menor quantidade.
Independentemente da fonte embolígena ser identificada, a anticoagulação
por períodos prolongados é recomendada para prevenir-se embolias recorrentes 4,9 Em um caso, apesar desta
conduta ter sido corretamente adotada,
houve a recorrência do quadro em duas
oportunidades.
Em casos de embolia de membro
superior, apresentando-se o paciente em
boas condições clínicas e com o membro
superior sem necrose instalada, vale a
pena a realização da embolectomia com
catéter de Fogarty, devido aos bons
resultados quanto à manutenç ão do
membro e batimentos arteriais, além de
baixos índices de complicações derivadas
do procedimento cirúrgico.
CIR VASC ANGIOL 12 :120-124, 1996
~==~---------------------------------------------------------------
Nelson Wolosker e cols.
Embolia de Membros Superiores
~11~h~rJâ1
UPPER LlMB ARTERIAL
EMBOLlSM
Upper limb arterial embolism
represents 16 to 32% of ali peripheral
embolic arterial occlusions. The
authors have analysed 34 cases of
upper limb arterial embolism, treated
from Jan uary 1991 to December
1993.
The age of the patients ranged
from 38 to 84 years (median
62
years) . Fifteen patients were male and
17 were female. The etiology of the
embolus was almost always defined,
the most common cause being atrial
=
fibrillation (81 %). The brachial artery
was the most common site of occlusion .
Ali patients presented with limb
ischemia, that was mild in 16 cases
(47%), and severe in 18 cases (53%) .
No patient presented with gangrene. The
majority of patients had a ischemic
period (from onset of .symptoms to flow
restoration) ranging from 6 to 12 hours
(40%) .
One patient was treated medically.
Ali the others underwent arterial
embolectomy with the Fogàrty catheter.
Fasciotorny was performed in a patient
who
developed. compartmental
syndrome. Two patients died in the
immediate postoperative period: ane of
mesenteric embolism, the other of
,.lo'
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CIR VASC ANGIOL 12:120-124,1996
myocardial infarction . Distai pulses
were restored in ali patients. Three
patients developed postoperative
occlusion and were reoperated
successfully. No patiente lost a limb.
Serious metabolic alterations that
could be ascribed to reperfusion of the
ischemic limb were not seen.
We conclude that, in patients in
good clinicai condition with upper limb
embolism without tissue necrosis , it is
worthwhile to pertorm Fogarty catheter .
embolectomy, for its good results, with
pulse restoration , limb preservation,
and low complication rate.
(.
.:..- _.
"
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