SÍNDROME DE DISPERSÃO DA REGENERAÇÃO NATURAL EM FRAGMENTO DE FLORESTA OMBRÓFILA MISTA RIPÁRIA, RS1 TOSO, Lucas Donato2; REDIN, Cristina Gouvêa3; BEULCH, Lien da Silveira3; PIOVESAN, Gabriel2; DICK, Grasiele3; SOMAVILLA, Tamires2; FELKER, Roselene Marostega3; LONGHI, Solon Jonas4. 1 Trabalho de Pesquisa _Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Graduação em Engenharia Florestal, (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil. 3 Pós-Graduação em Engenharia Florestal, (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil. 4 Professor adjunto do Departamento de Ciências Florestais – UFSM, Santa Maria, RS, Brasil. E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]; 2 RESUMO A síndrome de dispersão de uma espécie é como os seus frutos e sementes são propagados. O potencial colonizador de uma espécie está relacionado à forma que suas sementes são dispersas, bem como o quanto esta espécie poderá agregar na biodiversidade local. O trabalho teve como objetivo analisar a síndrome de dispersão da regeneração natural, avaliada em fragmento de Floresta Ombrófila Mista ripária no município de Bom Jesus, RS que situa-se no Nordeste do Estado e pertence à bacia hidrográfica do rio Taquari-Antas. Observou-se que a maioria das espécies da regeneração natural do fragmento possui dispersão zoocórica. A família Myrtaceae apresentou o maior número de espécies (7) e a família Sapindaceae teve o maior número de indivíduos (23). O caráter de dispersão zoocórico, confere ao fragmento capacidade de manutenção da diversidade, tanto de flora quanto de fauna, potencial para colonizar novas áreas e conectar fragmentos atuando como corredores ecológicos. Palavras-chave: regeneração natural; Myrtaceae; zoocoria. 1. INTRODUÇÃO A Floresta Ombrófila Mista é popularmente conhecida como floresta com araucária, pinhais ou pinheirais (LEMOS-MICHEL, 2001). A denominação “mista” refere-se à presença das gimnospermas Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze e Podocarpus lambertii Klotzsch ex Endl consorciadas com angiospermas de gêneros primitivos, como Drymis, Ocotea, Cryptocarya e Nectandra (IVANAUSKAS et al., 2009). Segundo Mantovani et al. (2004) essa formação encontra-se sob clima temperado chuvoso, úmido em todas as estações, mas com verão moderadamente quente, e por estar em regiões com baixas temperaturas no inverno com ocorrência de geadas, a sazonalidade dos eventos fenológicos é ditada pelo clima. Esta formação florestal é bem estruturada e estratificada, tendo o seu estrato emergente tomado pelas araucárias que atingem alturas médias de 30m. O dossel é 1 formado por espécies latifoliadas da família Myrtaceae e Lauraceae, alem do pinheiro-bravo (Podocarpus lambertii), que juntamente com a araucária é elemento principal neste tipo de floresta. Ainda ocorrem a presença de epífitas, musgos, liquens, bromélias e orquídeas em abundância. De acordo com Romariz, (1996) a diversidade de espécies latifoliadas no estrato superior varia com a região geográfica. No Rio Grande do Sul espécies com grande potencial econômico como o cedro (Cedrela fissilis), angicos e ipês, predominam na Floresta Ombrófila Mista do estado. Floresta típica do Planalto Meridional, a Floresta Ombrófila Mista ocorre no RS em altitudes entre 500 m ao oeste a 1.000 m a leste, onde se destacam três núcleos principais: na borda dos Aparados entre o rios Maquiné e das Antas, na borda da encosta sul do Planalto, entre os rios Taquari e dos Sinos e em pleno Planalto Central, no curso superior do rio Jacuí. As florestas ripárias são aquelas que margeiam os cursos d’água e são de suma importância na manutenção da qualidade da água, tendo em vista que o emaranhado de espécies barra os sedimentos e minimiza o impacto dos fertilizantes e agrotóxicos provenientes de áreas agrícolas. Esta vegetação regra o fluxo de nutrientes, o regime hídrico local e dá estabilidade ao solo das margens e adjacentes ao curso d’água. Alem de proteger as águas, essas formações desempenham um papel fundamental na ligação entre fragmentos florestais, funcionando como corredores ecológicos para o fluxo gênico da fauna e da flora. Conhecer as espécies que compõem essas florestas ripárias é primordial para poder estudar as formas de recuperá-las, já que estas passam por um processo avançado de antropização. O objetivo deste estudo é verificar as espécies ocorrentes em formações ripárias de Floresta Ombrófila Mista e as suas respectivas síndromes de dispersão. 2. METODOLOGIA 2.1 Descrição da área O estudo foi realizado no municipio de Bom Jesus (28º 40’ 34,89” S 50º 25’ 29,33” W) que é limitado ao norte pelo Rio Pelotas, em um percurso de cerca de 100 km. O clima da região é do tipo Cfb (mesotérmico úmido), segundo a classificação de Köppen. A pluviometria nesta porção nos Campos de Cima da Serra varia entre 1.700 mm a 2.200 mm anuais, sem existência de déficit hídrico. A temperatura média anual varia entre 14º e 16º C. No que toca a geologia, o município de Bom Jesus está situado no domínio das rochas efusivas do Juro Cretáceo, fazendo parte da formação Serra Geral, (HORBACH et al. 2 1986). Os solos associados a estas rochas são Cambissolo Húmico alumínico, Neossolos Litólicos (em áreas de maior declividade) e Nitossolos Háplicos, em terrenos coluviais (BOLDRINI et al. 2006). O município de Bom Jesus faz parte da bacia hidrográfica do sistema Taquari-Antas. O rio Taquari nasce no extremo leste do Planalto dos Campos Gerais, com a denominação de rio das Antas, até a confluência com o rio Guaporé (FEPAM/RS, 2012). O Rio TaquariAntas tem suas nascentes em Bom Jesus, onde há baixos níveis de densidade populacional onde predomina a criação de gado, mas a partir de Antônio Prado a ocupação passa a ser mais intessiva. Quanto à vegetação, a bacia do rio Taquari-Antas apresenta quatro regiões fitoecológicas associadas à Mata Atlântica e consideradas como zona de transição: Savana, Floresta Ombrófila Mista, Floresta Estacional Decidual e Áreas de Tensão Ecológica. Ainda podem ser observados diversos ambientes onde a vegetação natural encontra-se em satisfatório nível de preservação, localizados nas encostas íngremes dos vales, de difícil acesso e impróprios a práticas agrícolas. 2.2 Metodologia de inventário A amostragem da cobertura vegetal presente na área foi realizada pelo Método de Parcelas de Área Fixa, instaladas aleatoriamente. As unidades de amostragem retangulares possuem área igual à 600m² para inventário da vegetação arbórea e sub-unidades amostrais de 100m² instaladas no canto direito de cada unidade amostral para avaliação da regeneração natural. O processo de amostragem consistiu em alocar as parcelas aleatoriamente no mapa, de forma que toda a flora fique bem representada no processo. Os instrumentos utilizados para o levantamento foram: trena, fita métrica, mapa da propriedade, planilhas de campo, e GPS. de navegação Garmin modelo Etrex Legend, em UTM, Datum South América SAD 69 e as espécies foram enquadradas nas famílias seguindo o APG II (2003). Foram instaladas doze unidades amostrais de 100m² para avaliação da regeneração natural em uma área de mata ciliar correspondente à 38,65ha de vegetação em Estágio Avançado re Regeneração Natural. 3. RESULTADOS E DISCUSSÕES Ao todo foram encontradas 27 diferentes espécies, distribuídas em 12 famílias botânicas na regeneração natural. A família melhor representada em questão de espécies na área foi Myrtaceae, com 7 espécies representantes dessa família. Em número de indivíduos a família melhor representada foi Sapindaceae, com 23 individuos, seguida por Myrtaceae com 20. 3 Em relação a síndrome de dispersão das espécies encontradas, pode-se observar que a maioria tem suas sementes dispersas pela fauna (zoocóricas), e em proporções consideravelmente menores aparecem aquelas que são dispersas pela própria ação da gravidade sem um agente dispersor específico (autocóricas) e por fim a forma de dispersão menos frequente que é aquela que se dispersa pelo vento (anemocórica). Na tabela 1, seguem as espécies encontradas ná área do estudo e a respectiva síndrome de dispersão de cada uma. Tabela 1: Espécies e suas respectivas síndromes de dispersão Nome Científico Nome Vulgar Família Annona neosalicifolia Annona rugulosa Banara tomentosa Ariticum Cortiça Guaçatunga Guabirobamiúda Guabiroba Guaçatunga Carvalhinho Cedro Camboatávermelho Pitangueira Inga Camboatábranco Cancorosa Guamirinzão Araça-do-mato Cambuim Murtilho Canela-amarela Canela -preta Canela-guaicá Angicovermelho Sarandi Branquilholeiteiro Cincho Leiterinho catiguávermelho Mamica Annonaceae Annonaceae Salicaceae Síndrome de dispersão zoocórica zoocórica zoocórica Myrtaceae zoocórica Myrtaceae Salicaceae Salicaceae Meliaceae zoocórica zoocórica zoocórica anemocórica Sapindaceae zoocórica Myrtaceae Fabaceae zoocórica zoocórica Sapindaceae zoocórica Celastraceae Myrtaceae Myrtaceae Myrtaceae Myrtaceae Lauraceae Lauraceae Lauraceae zoocórica zoocórica zoocórica zoocórica zoocórica zoocórica zoocórica zoocórica Fabaceae autocórica Sapotaceae autocórica Euphorbiaceae autocórica Moroaceae Euphorbiaceae zoocórica autocórica Meliaceae zoocórica Rutaceae zoocórica Campomanesia rhombea Campomanesia xanthocarpa C.aseariadecandra Casearia sylvestris Cedrela fissilis Ccupania vernalis Eugenia uniflora Inga virescens Matayba elaeagnoides Maytenus aquifolia Myrcia hatschbachii Myrcianthes gigantea Myrciaria delicatula Myrrhinium atropurpureum Nectandra lanceolata Nectandra megapotamica Ocotea puberula Parapiptadenia rigida Pouteria salicifolia Sebastiania brasiliensis Sorocea bonplandii Stillingia oppositifolia Trichillia claussenii Zanthoxylum petiolare Ocorrem na regeneração natural espécies tipicamente umbrófilas tais como: Trichillia claussenii, Stillingia oppositifolia, Myrcia hatschbachii e Zanthoxylum petiolare, caracterizando o sub-bosque associadas à arbustos pertencentes principalmente às famílias Rubiaceae, Solanaceae e Piperaceae. Dentre estas espécies, exceto a Stillingia 4 oppositifolia não é zoocórica, indicando uma alta população de espécies com este carater de dispersão de sementes. Segundo Kanieski et al. (2010) que quantificou a diversidade em Floresta Ombrófila Mista na Floresta Nacional de São Francisco de Paula, RS, a família mais representativa foi a Myrtaceae, apresentando maior número de espécies e de gêneros. O presente estudo obteve as mesmas conclusões que Kanieski et al. (2010) quanto a família predominante nos estudos realizados em Floresta Ombrófila Mista, seguindo a tendência de vários estudos realizados nessa região. As espécies pertencentes a família Myrtaceae são muito atrativas a fauna, por possuirem geralmente frutos com polpa carnosa, odores e cores atrativas, sabor adocicado. Dentre as 22 espécies que são zoocóricas, 7 são Mirtaceas, totalizando 31,8% do total das espécies dispersas pela fauna. Em um total de 27 espécies encontradas, 22 apresentam sindrome de dispersão zoocórica, 4 apresentam síndrome de dispersão autocórica e 1 apresenta sindrome de dispersão anemocórica (Figura 1). Figura 1- Porcentagens das síndromes de dispersão das espécies encontradas em fragmento de Floresta Ombrófila Mista ripária em Bom Jesus, RS. 5 4. CONCLUSÃO O estudo mostrou que no fragmento ripário de Floresta Ombrófila Mista no município de Bom Jesus, o estágio da regeneração natural é composto principalmente por espécies que possuem dispersão zoocórica. Pode-se inferir que o fragmento analisado possui potencial para promover a colonização de novas áreas, a manutenção da biodiversidade local e a conexão entre fragmentos, atuando como corredores ecológicos, em virtude do caráter atrativo dos propágulos da maioria das espécies, o que proporciona as interações ecológicas entre a flora e a fauna. REFERÊNCIAS APG II. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orden and families of flowering plants: APG II. Linnaean Society. Botanical Journal, London, n. 141, p. 399-436, 2003. BOLDRINI,I.I Biodiversidade dos campos do Planalto das Araucárias: Relatório final. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2006. FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL HENRIQUE LUIZ ROESSLER – FEPAM, RS. Qualidade Ambiental. 2012. Disponível em: <http://www.fepam.rs.gov.br/qualidade/taquariantas.asp>. Acesso em: 29/ago/2012. HORBACH, R. et al. Geologia. In: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Levantamento de Recursos Naturais. Vol.33, Folha SH 22, Porto Alegre e parte das folhas SH 21 e SI 22 Lagoa Mirim. Capítulo 1, Rio de Janeiro, 1986, 796p. IVANAUSKAS, N. M. et al. Formações Florestais Brasileiras. In: MARTINS, VENÂNCIO MARTINS. Ecologia de Floretas Tropicais. Viçosa, MG, Editora UFV, 2009. KANIESKI, M. R. et al. Quantificação da diversidade em Floresta Ombrófila Mista por meio de diferentes Índices Alfa. Scientia Forestalis, Piracicaba, v. 38, n. 88, p. 567-577, 2010 LEMOS-MICHAEL, E. Hepáticas epifíticas sobre o pinheiro-brasileiro no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2001. MANTOVANI, A. et al. Fenologia reprodutiva e produção de sementes em Araucaria angustifolia (Bert.) O. Kuntze. Revista Brasileira de Botânica 27:787-796. 2004. ROMARIZ, D. A. Aspectos da vegetação do Brasil. 2 ed. São Paulo: Ed. Bio-Ciência, 1996. 6