DAVID HUME E A CRÍTICA À CAUSALIDADE Primeiro Autor¹; Segundo Autor² 1. Francisco pereira da Silva Filho. Bolsista FAPESB, Graduando em Filosofia, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail: [email protected] 2. Wagner Teles de Oliveira. Orientador, Orientador, DCHF, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail: [email protected] PALAVRAS-CHAVE: Hume, Causalidade, Necessidade INTRODUÇÃO O empirismo foi mais ou menos assimilado pela história da filosofia como aquela escola filosófica cuja principal traço seria a negação da existência de ideias inatas. Embora empirista, David Hume foi consagrado pela história da filosofia como crítico radical da causalidade, a qual tem a sua primeira formulação no Tratado da Natureza Humana. O cerne da crítica à causalidade consiste em fazer ver que não há conexão necessária entre fenômenos empíricos, a cuja natureza se possa atribuir o caráter de interno, o que quer dizer que a crítica feita por Hume consiste em compreender a relação entre os fenômenos da experiência é exterior. Disso resulta que toda necessidade que se pode atribuir à relação entre fatos empíricos não pode ser compreendida como da mesma natureza que marca a relação entre os elementos do domínio das matemáticas. Assim, o presente trabalho consisti, no essencial, em esclarecer as razões conceituais da crítica à causalidade tal como David Hume a apresenta no Tratado da Natureza Humana. A partir de um tal exame deve ser possível reconstituir as exigências conceituais à luz das quais Hume faz ver que a noção de necessidade não pode ser aplicada indistintamente aos domínios das ciências empíricas e das matemáticas, modifica-a e volta a aplicá-la no domínio do empírico. Nessa medida, a pesquisa visou à inteireza da obra de Hume, de sorte que as diversas passagens da obra que tratam da crítica à causalidade devem ser lidas à luz de sua inspiração original. MATERIAL E MÉTODO O método de pesquisa em filosofia consiste na leitura e escrita de textos segundo técnicas de exegese e de escrita que caracterizam a atuação profissional na área. Assim, execução das atividades concernidas pelo plano de trabalho privilegiou o cotejo com as fontes primárias da pesquisa, sobretudo o Tratado da Natureza Humana, sem se furtar à apreciação de fontes secundárias, textos de destacados comentadores, que se inscrevem na tradição de leitura da obra de Hume. Nesse sentido, o trabalho de pesquisa distribuiu-se em duas etapas. Em uma primeira etapa, a da leitura, os textos indispensáveis à pesquisa foram cuidadosamente fichados. Em uma segunda etapa, a da escrita, uma vez vencida a etapa da leitura, o bolsista passou a fazer exercício de escrita, cujo resultado deve servir à elaboração de sua monografia final de curso. A participação das reuniões semanais de nosso Grupo constituiu, assim, um importante componente do método, pois possibilitou ao bolsista, além de familiarizar-se com expedientes que são característicos da pesquisa na área, apresentar sistematicamente os resultados de sua pesquisa, perfazendo assim as condições para alcançar os resultados específicos do trabalho em filosofia. RESULTADO E/OU DISCUSSÃO Por se tratar de pesquisa em filosofia, os resultados são eminentemente conceituais, de sorte que a produção envolvida por eles é exclusivamente teórica. O desenvolvimento da pesquisa, assim, possibilitou a elaboração de textos, que foram apresentados nas reuniões do nosso Grupo de Estudo e Pesquisa, bem como a participação em debates de ideias concernidas pela pesquisa. Com isso, o bolsista pôde desenvolver competências de leitura e de escrita, que são características da atuação profissional na área, desenvolvendo o sentido conceitual. Por fim, o principal resultado da pesquisa é o fato de ela ter contribuído decisivamente com a elaboração do projeto de monografia de conclusão de curso do bolsista, o qual, se aprimorado, pode ganhar a forma de um projeto de mestrado, sobretudo se o bolsista continuar pesquisando sobre o tema. Por outro lado, caso mude o seu foto de pesquisa, poderá, em igual medida, beneficiar-se do conjunto de competências que desenvolveu ao longo do trabalho de pesquisa. Voltada ao exame da crítica à causalidade tal como apresentada no Tratado da Natureza Humana, nossa pesquisa encontra na noção de necessidade elaborada por Hume um de seus componentes mais centrais. A maneira como empreende a crítica à causalidade leva a reflexão humeana à ideia de que as relações entre eventos empíricos são exteriores aos próprios fenômenos. Essa ideia, por sua vez, tem lugar no interior duma funda reflexão a respeito da unidade da experiência e da razão e, a nosso ver, tem como desdobramento a perspectiva segundo a qual a necessidade não pode ser aplicada indistintamente aos domínios das ciências empíricas e das matemáticas. Isto quer dizer que a necessidade envolvida no cálculo matemático não é da mesma ordem da necessidade com que afirmamos determinados juízos empíricos. No entanto, continuamos a conceber tais juízos como necessários. Mais do que isso, não há qualquer necessidade envolvida no âmbito da experiência, pois a marca característica da presença da necessidade é o caráter interno das relações e no domínio empírico as relações, todas elas, são exteriores. Agora, podemos reformular a recusa da aplicação indistinta da noção ao domínio dos fatos e ao domínio dos conceitos. Não há qualquer paralelo no domínio da experiência para a necessidade característica dos juízos matemáticos e, no entanto, continuamos a conceber determinados juízos empíricos, como é o caso de “ O sol nascerá amanhã”, como necessários. Para Hume, não haver um tal paralelo significa que a negação de um tal juízo não envolveria contradição. A partir, então, da distinção entre questões de fato e relações de ideias, Hume elabora a pergunta a respeito de qual tipo de necessidade estaria envolvida pelos nossos juízos sobre a experiência. Mais do que questionar a natureza da necessidade concernida por juízos empíricos, Hume pergunta-se como é possível conhecer a relação de causa e efeito, já que não encontramos qualquer correlato para ela na experiência. Para Hume, o conhecimento dessa relação, em hipótese alguma, é alcançado por meio da razão. Então, se não é produto de raciocínio a priori, como se dá as relações do entendimento a partir da causalidade, senão através da experiência, já que, como bem Hume nos chama a atenção, nossa razão é incapaz de extrair, sem auxílio da experiência, qualquer conclusão referente à existência efetiva das coisas: “causas e efeitos são descobertos não pela razão, mas pela experiência (...)”. (HUME, 2003. p. 56) Porém, Hume adverte-nos de que uma variedade de acontecimentos familiares à nossa percepção envolve qualidades que simplesmente escapam à capacidade de captação de nossos sentidos, como é o caso, por exemplo, da capacidade nutritiva do pão. Os nossos sentidos são capazes de captar todas as propriedades sensíveis do pão, mas são incapazes de captar a sua capacidade nutritiva, que figura como uma qualidade oculta, para Hume, à qual todas as propriedades sensíveis estão de algum modo vinculadas. A crítica à causalidade visa a questionar exatamente um tal vínculo, pois, tão logo percebemos aquelas qualidades sensíveis típicas do pão, somos levados a concluir que se trata de algo com capacidade nutritiva. Com isso, fazemos a passagem entre qualidades sensíveis e qualidades ocultas. Em certo sentido, a crítica à causalidade consiste em questionar esse tipo de inferência, que, segundo Hume, é generalizada em nossa relação com a experiência. Em sendo assim, a pergunta que parece mover a crítica humeana é a respeito dos fundamentos das inferências sem as quais não seria possível a lida humana com a experiência. CONCLUSÃO Acreditamos que as razões por que Hume atribui à experiência o papel de fundamentar a necessidade sem a qual ela própria não pode funcionar só podem ser compreendidas na medida em que for esclarecida a noção de necessidade que está em jogo na crítica à causalidade. Por essa Perspectiva, tal noção de necessidade tem papel preponderante na crítica à razão que consiste na afirmação de sua incapacidade de fundamentar os juízos empíricos e, por conseguinte, na crítica à ciência. Caso nossa hipótese esteja correta, poderemos, a partir da análise da crítica à causalidade, da qual um dos principais componentes é o diagnóstico de insuficiência da razão, medir o alcance de uma tal crítica na fundamentação da ciência com a qual a obra de Hume parece se comprometer. Desse modo, não nos parece ser possível avaliar o alcance da crítica humeana sem compreender tanto a face negativa da crítica, que encerra as razões pelas quais se pode afirmar a impossibilidade de uma fundamentação a priori, quanto a sua face positiva, que consiste em compreender como uma tal fundamentação pode ser feita. No geral, a face negativa consiste em compreender que a necessidade atribuída à relação entre os fenômenos da experiência não se baseia na própria experiência, nem tampouco se trata de uma relação interna que como tal possa ser resultado de nossos raciocínios. A face positiva, por sua feita, consiste em fazer ver que a necessidade que atribuímos às relações entre os fenômenos depende do concurso entre nossas experiências e o princípio do hábito, que nos torna aptos a reconhecer regularidades nelas. REFERÊNCIAS HUME, David. Tratado da natureza humana. UNESP, São Paulo, 2001. _____. Uma investigação sobre o entendimento humano. UNESP, São Paulo, 2004. _____. Resumo de um Tratado da Natureza Humana. Porto Alegre: Paraula, 1995. DELEUZE, Gilles. Empirismo e subjetividade. Editora 34, São Paulo, 2001. LEBRUN, Gérard. A boutade de Charing Cross. In: A filosofia e sua história, Cosac & Naif, São Paulo, 2006. _____. Berkley ou le sceptique malgré lui. In: A filosofia e sua história, Cosac & Naif, São Paulo, 2006. MONTEIRO, João Paulo. Hume e a epistemologia. Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1984. MONTEIRO, João Paulo. Teoria, Retórica, Ideologia. Ed. Ática, SP, 1975. _____. Novos Estudos Humeanos. São Paulo, Discurso editorial, 2003. _____. Hume: Três Problemas Centrais. In: Dois Pontos, Curitiba, Vol 1, n. 2, p.111 – 128, jan/jun, 2005. MOURA, Carlos Alberto Ribeiro de. David Hume para além da epistemologia. In: Racionalidade e crise, Discurso Editorial e Editora da UFPR, São Paulo, 2001.