1 PREMISSAS PARA UMA ANÁLISE CRÍTICA DA REGULAÇÃO DO COMÉRCIO MUNDIAL: os desafios da mercantilização dos serviços de seguridade social Cleusa dos Santos* RESUMO Este texto aborda a mercantilização dos serviços de seguridade social, as regulamentações da OMC na privatização dos serviços públicos estatais com rebatimentos nas condições de trabalho e nas políticas sociais. A refuncionalização exige modelos de gestão que transformem valores de uso em valores de troca. Nessa conjuntura ressurge, no Serviço Social, a tendência à psicologização com fundamentos morais da questão social. Desde 1999, há uma preponderância de cursos de capacitação profissional, atualização, treinamento e outros, em detrimento da crítica às conseqüências da reforma e busca de novos espaços na luta por direitos universais em direção a uma nova ordem social. Palavras-chave: Reforma. Serviços. Mercantilização. Questão social. ABSTRACT This text deals with the commercialization of the social security services, the WTO rules towards the privatization of the state public services and the changes in labor relations and social policies. The reorganization of both the public institutions and their management has turned use values into exchange values. As a consequence, the Social Services segment experiences the reappearance of the trends that base their analysis on psychological aspects and the moralization of the social problems. Since 1999, there has been emphasis on the professional skills, updating, training and others in detriment of criticism of the consequences of the reforms and the search for new places in the struggle for universal rights and a new social order. Keywords: Reform. Services. Commercialization. Social problems. 1 INTRODUÇÃO Este artigo é parte de uma pesquisa iniciada em 2000 que tem como objetivo analisar as políticas de regulamentação da Organização Mundial do Comércio (OMC) e seus impactos na reforma do Estado brasileiro no âmbito da seguridade social1. Tais impactos, expressões da crise do capital, resultaram no desmonte do Estado, redução do número de * Professora adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutora em Serviço social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Este trabalho contou com a colaboração das alunas de graduação em Serviço Social da UFRJ Kelly Aline Barbosa Ribeiro, Monique Ferreira dos Santos e Tatiana do Amaral (bolsista FAPERJ) e com as contribuições diferenciadas de Olga Calmon, Miriam Kaiuca e Sarah Silvestre. Agradecemos a leitura cuidadosa dos originais, realizada por Mavi Pacheco. 1 O projeto de pesquisa “Os Impactos da privatização e mercantilização da Seguridade social: balanço e perspectivas do Comércio Mundial” integra o Núcleo de Pesquisa e Extensão sobre Poder Local, Políticas Urbanas e Serviço Social - LOCUSS/ESS. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 2 empregos e precarização das relações de trabalho, alterando os processos de produção e reprodução da vida social. Um eixo de nossa investigação é o rebatimento dessas mudanças no Serviço Social, pois, que, a mercantilização reforça o caráter liberal de certa perspectiva profissional, que reivindica uma ação terapêutica e clínica para o Serviço Social. Isto traz conseqüências negativas para a consecução dos objetivos de solidariedade e universalidade dos direitos sociais, condição necessária para a consolidação dos princípios do código de ética profissional e conseqüente construção da razão emancipatória. 2 CONSTRUÇÃO DE ALGUMAS PREMISSAS Nossos objetivos constituem-se em compreender a natureza da transformação dos bens públicos, em serviços sociais privados, desmistificar as propostas conservadoras que naturalizam as expressões da questão social e aprofundar o debate sobre a categoria serviços – através de suas implicações práticas no âmbito cultural e valorativo do Assistente Social para fortalecer e consolidar o projeto ético-político de defesa dos serviços públicos e gratuitos. Assim, analisamos a reforma do Estado brasileiro e a efetivação dos direitos. Subordinado às políticas econômicas neoliberais determinadas pelo FMI, Banco Mundial e OMC, o Estado atua apenas para minimizar as conseqüências negativas dos programas de ajuste estrutural e não reconhece os direitos sociais como atributos das políticas de seguridade social, o que afeta diretamente a função redistributiva do Estado no âmbito da proteção social. A desresponsabilização do Estado leva à mercantilização dos serviços e o acesso a eles passa a depender do poder de compra dos indivíduos sociais conduzindo ao surgimento do que Mota (2000) designou de “cidadãos consumidores". Diante dessa nova situação, o Estado passou a articular as funções políticas e econômicas, tendo nas políticas sociais a forma típica para enfrentar as expressões da questão social. Elas se constituíram na via central para - a depender da correlação de forças favoráveis ao movimento democrático e popular – construir um sistema de proteção social que permita a ampliação dos direitos sociais. Contudo, as transformações políticas e econômicas, ocorridas a partir de 1970, apontam para um redimencionamento destas funções de que resultou um Estado máximo para o capital e mínimo para classe trabalhadora. Assim, ao estudar a forma como o Estado participa do processo de valorização e acumulação do capital (no capitalismo monopolista e, particularmente, na financeirização) e as orientações dos organismos multilaterais para a liberalização e mercantilização dos serviços públicos estatais, percebemos que, na fase São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 3 atual, o crescimento do comércio internacional constitui a nova base de acumulação do capital, o que revela a importância dos serviços. Nesse ponto de partida tanto a financeirização quanto o comércio de serviços, se radicam na criação do valor que se opera na extração da mais-valia relativa2 no mundo do trabalho. Ela só é possível através dos recursos técnico-científicos que aperfeiçoam o instrumental de trabalho e reorganizam as relações de produção. É com esse aperfeiçoamento técnico-científico que o capitalista reduz o tempo gasto na reprodução do capital constante, ou seja, reduz o tempo socialmente necessário para a reprodução do capital investido. Portanto, na ampliação do setor terciário - um dos mecanismos de valorização do capital, além dos oligopólios financeiros -, está o setor de serviços que permite identificar “a expansão das modalidades de investimento do monopólio, que convertem em serviço praticamente tudo, combina-se à perfeição com os projetos de preservação de individualidades” (NETTO, 1992, p. 36). Dentre vários autores estudados no Serviço Social3, Karsch (1987, p. 165) define o setor terciário como “um mecanismo político e econômico” que, na produção, se corporifica no produto e maximiza os lucros. Mostra que os serviços prestados pelo Estado são financiados pelas arrecadações de tributos. São então repassados à sociedade como benefícios aos segurados da previdência social e como políticas públicas de educação, saúde, segurança entre outros. São serviços que possuem uma função social de controle das diretrizes do capital e do Estado: eles surgem e desaparecem, modificam-se e ampliamse em decorrência das transformações tecnológicas. Karsch (1987) concorda com a criação de um fundo público4, obtido com tributação sobre o capital, para se combater a crescente mercantilização dos serviços públicos indo ao encontro de Oliveira (1998) que, além disso, propõe uma articulação para recuperar e aprofundar os direitos sociais alcançados no Estado de Bem Estar. Entretanto, se quisermos debater o advento dos serviços como uma mediação necessária ao desenvolvimento do capitalismo a crítica, portanto, deve partir do questionamento aos limites do capitalismo. A lógica capitalista do processo produtivo, que 2 Quando contrata operários, o capitalista não objetiva apenas reproduzir o capital investido, mas acrescentá-lo de nova quantia. Este acréscimo corresponde ao trabalho excedente, a mais-valia, que significa trabalho não pago. Toda a vez que esse parcela do trabalho não pago for originada pela extensão das horas de trabalho temos a mais-valia absoluta. Porém, como a extensão do horário de trabalho é limitada pelas próprias condições de reprodução da força de trabalho, o capitalista encontra nova forma de extrair mais-valia dos trabalhadores, através do aumento da produtividade. Dá-se, assim, a mais-valia relativa. 3 A referência a Karsch está na centrada na sua análise dos serviços a partir do setor terciário, por isto, não exclumos aqui a produção do Serviço Social que trata da categoria serviços. Tampouco, desconhecemos a importância das reflexões desenvolvidas em Relação Social e Serviço Social no Brasil (1983) de Iamamoto, ao contrário, as incopora. 4 É importante destacar que a discussão da destinação do fundo público está contemplada na proposta básica para o projeto de formação profissional, na qual se identifica que o mesmo contempla os grandes oligopólios em detrimentos das condições de vida das classes que vivem do trabalho. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 4 fragmentou a capacidade social e coletiva em trabalhos privados (MANDEL, 1982), deve começar por recuperar o acréscimo da composição orgânica do capital que significa uma massa maior de capital constante e a redução do capital variável. Por isto mesmo, tem relevância o exame da categoria valor agregado (trabalho vivo agregado ao trabalho morto), contido nos serviços públicos da seguridade social. Nestes serviços está embutida a produção, ou seja, a criação de riquezas que não entra na circulação por efeitos mágicos. Ela é resultado de um longo processo de produção coletiva e apropriação privada do trabalho. A análise histórica do capitalismo, particularmente, dos monopólios demonstra não só a transformação de bens em mercadorias, mas também o crescimento dos serviços e sua conversão em mercadorias. Donde, por outra parte, se expressa o ciclo de produtos que cria novos produtos e serviços, sendo que, alguns deles “tornam-se indispensáveis à medida que as condições da vida moderna mudam” (COSTA, 1998, p. 239). 3 DE GRÃO EM GRÃO... CHEGAMOS A “HETEROGENIA” DA COMUNICAÇÃO O caminho adotado foi composto de estudos bibliográficos, pesquisas em jornais de grande circulação, no Jornal Práxis/CRESS 7ª Região, nos documentos do CFESS Manifesta5; coleta de dados na Internet e análises críticas dessas referências. A questão era saber de que forma a categoria tem se apresentado às mudanças das políticas sociais e seus desdobramentos para a profissão. Inicialmente, verificamos o jornal Práxis do CRESS 7ª Região desde 1995, até os dias atuais. Dentre os 48 números do jornal desse período, 41 tratavam da temática.Maior destaque foi dado para a questão da saúde, embora a assistência também tenha sido abordada nos anos de 1999 e 20006. Na área da saúde apenas 22% das referências examinadas mencionavam o debate das Conferências de Saúde7, reforçando a necessidade de ampliação dessas discussões e da participação popular para o enfrentamento das proposições neoliberais. Reafirmam a idéia de que as Conferências se constituem em um espaço político de confronto e correlação de forças de pressão e articulação e que as propostas nem sempre atendem às necessidades da população usuária. Na questão dos serviços constatamos que, 5 Por questão de espaço não faremos referências aos posicionamentos do conjunto CFESS/CRESS que não deixam dúvidas quanto ao propósito de criticar não só as políticas neoliberais como também as ações do Governo Lula. Além disso, o nosso campo de análise é o Jornal Práxis da 7ª Região. 6 Nos 41 jornais encontramos 27 referências (artigos, comunicados, palestras etc.) sobre a saúde, 12 sobre a previdência e 22 sobre a assistência. 7 Até hoje houve doze Conferências Nacionais de Saúde. (1941), (1950), (1963), (1967), (1975), (1977), (1980), (1986), (1992), (1996), (2000) e (2003). (www. datasus.gov.br/cns/cns.htm). São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 5 para os assistentes sociais da área, se faz necessária a organização dos usuários para a reivindicação de funcionamento adequado dos serviços públicos. Se considerarmos que os serviços universais assumem, na gestão neoliberal, a função de fonte de lucro para investidores privados, vemos que o setor privado concentra grande quantidade de produção de serviços, tanto os de alta complexidade como os básicos, recebendo incentivos fiscais para tal. Assim, os serviços essenciais, ou não são oferecidos, ou o são de maneira precária pelas instituições públicas (VASCONCELLOS, 2002). Por outro lado, verificamos a redução da provisão de serviços públicos de responsabilidade estatal. Nesse cenário assume importância fundamental a agência reguladora do setor - Agência Nacional de Saúde (ANS)8 "órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantem a assistência suplementar à saúde” (art.1° da lei 9961/00, e 28.01.20000) que "terá por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores" (art° 3° da mesma lei). Com isso levantamos a hipótese de que há uma tendência de que as agências reguladoras passem a substituir o gerenciamento do serviço público e gratuito9. A estratégia utilizada é transformar as instituições públicas em organizações sociais administradas por fundações públicas de direito privado, desregulamentar direitos e regulamentar restrições, consoante as orientações do Banco Mundial, do FMI e da OMC. Ao nosso ver, esta nova configuração do Estado vem alterando as políticas da Seguridade Social, conforme concebidas na Organização Internacional do Trabalho (OIT) nos anos de 1940, bem como, os princípios consagrados na Constituição de 1988. Já na área da previdência, notamos um crescimento em termos absolutos na defesa da qualidade dos serviços em 58% das referências. Estas sinalizam para o entendimento de que a desestruturação é conseqüência do modelo neoliberal, que delega para o mercado soluções de ordem pública. Desta forma, é instituída a poupança individual financiada através de regime de capitalização, a previdência privada complementar e os fundos privados de pensão. 25% criticam a redução dos direitos previdenciários e ressaltam a importância de uma luta constante pela ampliação dos direitos que foram, ao longo dos anos, desmontados pela lógica restritiva/privatista. E, por fim, verificamos que apenas 17% 8 Sobre este ponto, é importante destacar que não há referências nos Jornais Práxis. Um estudo preliminar sobre as agências foi apresentado na primeira fase da Jornada de Iniciação Científica UFRJ-CFCH em novembro de 2004. Também foi apresentada, em outubro de 2004, a comunicação “O sentido da liberalização e desregulamentação dos serviços de Seguridade social: agências reguladoras em debate no XI Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais e III Encontro Nacional de Serviço Social e Seguridade”. 9 São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 6 das referências abordam a reforma da Previdência, entrelaçada ao redimensionamento da relação entre Estado e sociedade em prol dos interesses do capital financeiro. Na área da assistência, os pontos que receberam destaque ressaltavam a construção de um modelo de gestão específico para a Assistência Social (23%); o mapeamento dos serviços prestados (14%); o padrão de qualidade dos serviços (31%); os critérios de prioridade e de partilha de recursos (18%) e por fim, a qualificação dos recursos humanos (14%)10. Ademais, observamos que o CRESS-RJ reafirma a necessidade de um compromisso tanto com a qualidade dos serviços quanto com a ampliação do acesso da população a estes, além de buscar alternativas políticas para o enfrentamento da pobreza, a garantia dos mínimos sociais e a universalização dos direitos sociais, temas debatidos nos dez anos da Lei Orgânica da Assistência Social. A ênfase no atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de rentabilidade econômica; na universalização dos direitos sociais; no respeito ao cidadão; na igualdade de direitos; no acesso ao atendimento e divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas, projetos, assistenciais e recursos. São aspectos que favorecem o ideal de luta na consolidação dos princípios da LOAS defendidos pelo conjunto CFESS/CRESS. Outro elemento nas matérias é a Reforma do Estado e a Capacitação Profissional. De 1995 a 1999, há um posicionamento crítico e resistente dos organismos representativos da categoria sobre os impactos da reforma. Entretanto, a partir de 1999 observa-se uma preponderância dos cursos de capacitação, atualização, treinamento profissional em detrimento da crítica às conseqüências da reforma e da busca de novos espaços na luta por direitos universais em direção a uma nova ordem social11. Exemplo disto é redimensionamento das prioridades do CRESS-RJ, no ano de 2001. As matérias preocupam-se com a inserção do assistente social no mercado de trabalho frente às novas demandas e, ao mesmo tempo, revelam timidez em relação à articulação com a luta dos outros trabalhadores. As mobilizações dos trabalhadores de setores em oposição às 10 Neste ponto, observamos que o jornal Práxis revela consonância com as deliberações dos Encontros Nacionais do conjunto CFESS/CRESS. Identificamos nestas deliberações um posicionamento de clara defesa das políticas públicas e de denúncia dos efeitos deletérios do neoliberalismo não só sobre as condições de trabalho do Assistente Social, mas também, sobre as condições de vida das classes que vivem do trabalho. 11 Essa alteração de prioridades se expressa na redução do número de referências publicadas de 95 a 99 (22 para Reforma do Estado e nenhuma para os Cursos de Capacitação) e as escritas no período de 2000 a agosto de 2004 (15 para Reforma e 14 para os Cursos). A direção desses cursos é consoante aos princípios éticopolíticos assumidos pela categoria desde a década de 1970, que reforça uma postura de defesa dos serviços e políticas públicas e que busca fortalecer nos profissionais uma defesa da universalidade de acesso aos serviços sociais. É importante assinalar que a apresentação destes dados é apenas quantitativa, pois a análise qualitativa se encontra em andamento. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 7 reformas (MST, Serviço Público Federal e sindicatos, etc.) foram pouco destacadas, apesar da grande militância da categoria nestas entidades.12 No entanto, se desejamos fortalecer os Conselhos de Direitos13 – um novo tipo de formas institucionais - de saúde, assistência, tutelares etc., assim como a dimensão pedagógica da profissão14, devemos sair de “uma atitude defensiva e pouco ousada” para ampliar e enriquecer o espaço profissional. Incorporar “novas questões ao seu âmbito de intervenção institucional” como um “intelectual que, habilitado para operar numa área particular, compreende o sentido social da operação e a significância da área no conjunto da problemática social”. Tornar-se, portanto, capaz de antecipar as possibilidades de intervenção “com a análise teórica de tendências sociais que extrapolam as requisições imediatamente dadas no mercado de trabalho” (NETTO, 1996, p.125). Neste sentido as ações do Serviço Social devem fortalecer as análises que tratam dos serviços contidos na esfera da circulação como formas de reprodução do capital, superando a visão fetichizada deste setor como algo autônomo, desvinculado da produção material. 4 CONCLUSÃO Este contexto de reformas estruturais neoliberais mostra que as organizações multilaterais, particularmente a OMC, assumem um protagonismo político relevante e que a liberalização, a desregulamentação e a privatização constituíram-se nas pilastras centrais da hegemonia do capital para transformar tudo em mercadoria. No Brasil, o desmonte dos mecanismos extramercado de regulação (sistema de previdência, legislação trabalhista etc.) deu origem a políticas sociais focais, fragmentadas e residuais (como o programa “Fome Zero15”). Essa substituição do Estado pelo mercado tem 12 Exemplo desta militância é o grande número de Assistentes sociais no Andes-SN, inclusive na direção da entidade. 13 No período de 1999 a 2004 foram encontradas 12 referências que tratam dos Conselhos de Direito especificamente na área abordada pelo trabalho. Ressaltamos que no Jornal Práxis há um conjunto de referencias que destacam a atuação do CRESS junto aos Conselhos municipal e estadual, particularmente, no de Assistência. 14 Como já demonstrou Iamamoto o perfil predominante dos assistentes sociais não é mais o de serem executores terminais de políticas sociais, pois, “o processo de descentralização das políticas públicas – com ênfase na sua municipalização requer [...] novas funções e competências” como: “atuar na esfera da formulação e avaliação de políticas, assim como do planejamento e gestão, inscritos em equipes multiprofissionais” (IAMAMOTO, 2001, p.27). 15 Cabe notar que o CFESS tem tido um papel relevante na defesa das conquistas garantidas na Constituição Federal de 1988, inclusive elaborando críticas a este programa numa clara defesa de uma perspectiva ampliada de seguridade social, para além da previdência, saúde e assistência social (CFESSManifesta, 2003, p. 34). Sustenta a necessidade de “uma reforma agrária radical e profunda, como condição para a ampliação da produção agrícola, capaz de oferecer os insumos necessários à produção agroindustrial, bem como de oferecer produtos locais com preços mais acessíveis a toda produção” cujo ponto central é enfrentar a desigual distribuição de terras. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 8 contribuído para estimular a responsabilização individual, as parcerias e a participação indiferenciada das classes, levando os assistentes sociais a se defrontarem com a necessidade – independentemente de sua auto-representação – de adaptar-se às demandas do mercado, revelando a retomada de uma concepção que recoloca a “questão social” na condição de problema social16 com a tendência de criminalização da questão social. No tocante ao Serviço Social a não resistência ao projeto neoliberal pode significar o retorno ao conservadorismo, com práticas adaptativas e reintegradoras dos indivíduos à nova ordem mundial17. Na ampliação das competências e atribuições privativas do Serviço Social para além daquelas previstas no artigo 4° e 5º, respectivamente, da Lei de Regulamentação da Profissão (Nº. 3.852/57) que expressam em seu conjunto as funções de: elaborar, implementar, executar e avaliar políticas sociais junto a órgãos da administração pública direta ou indireta, empresas, entidades e organizações populares; dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades públicas ou privadas; elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com participação da sociedade civil, entre outros. Por isto, não é de menor importância o fato de que, a partir de 2000 constata-se no interior da profissão o renascimento de uma tendência que visa resgatar a vertente psicossocial ou “terapêutica” do Serviço Social a fim de restaurar práticas que colocam em questão o perfil profissional que tem sido construído nos últimos vinte e cinco anos, cujo horizonte está na construção de uma teleologia pautada na emancipação humana. O próprio CRESS-7ª Região em conjunto com o Programa de Pós-Graduação da FSS da UERJ enfrentaram esta perspectiva e demonstraram que a mesma não mantém qualquer vinculação com as Diretrizes Curriculares da ABEPSS, com a Lei que regulamenta a profissão e com o Código de Ética em vigor.18 16 Compreendemos que a conseqüência desse processo para o Serviço Social não é de pouca monta já que tratar a questão social como problema social significa apoiar-se em fundamentos de base conservadora cujos resultados é a psicologização, com fundamentos morais, da questão social. Para maior aprofundamento desta temática ver Netto (1982) e Barroco (2001). 17 Vale registrar aqui que o CEFSS manteve uma postura crítica quanto a estas posturas profissionais. O CRESS-RJ enfrentou o Serviço Social Clínico e nas suas atividades de qualificação profissional procurou aproximar o cotidiano profissional dos compromissos ético-políticos explicitados no Código de 93. Ver em especial a programação do mês de comemoração do Práxis neste período (1995–2005) na qual as diversas mesas redondas, palestras e mini-cursos enfatizam não só a direção social estratégica assumida pelas entidades da categoria desde fins dos anos 70, como também a defesa das políticas públicas. 18 Revista Em Foco. CRESS 7A Reg/UERJ, Rio de Janeiro, 2003: “O Serviço Social Clínico e o projeto éticopolítico do Serviço Social”. No próprio seminário sobre "abordagem terapêutica" do Assistente Social promovido pelo CRESS-SP 9ª Região em março de 2005, do qual eu mesma participei como debatedora, alguns participantes evocavam esta dimensão. É importante lembrar que nas Diretrizes Curriculares da década de 1990 reside a compreensão de que a “questão social” é a matéria prima do Serviço Social, assim como, a do trabalho como eixo privilegiado da organização curricular. Ele é a categoria central para entender a constituição da vida social e da profissão. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 9 Com efeito, o enfrentamento do neoliberalismo exige um duplo desafio: por um lado, o investimento permanente na capacitação dos Assistentes Sociais visando garantir a construção de um perfil profissional intelectual, com sólida formação teórica e com disposição para desenvolver uma prática profissional investigativa no seu cotidiano institucional. Por outro, a articulação orgânica das entidades da categoria dos Assistentes Sociais com outras categorias profissionais que compartilham os mesmos princípios éticos que defendemos e, sobretudo, com setores estratégicos da sociedade comprometidos com o aprofundamento e radicalização da democracia e da cidadania em nosso país. Podemos sustentar, tal como o fez Rodrigues (2003), que esta conjuntura põe o “desafio de dar maior visibilidade ao Serviço Social e seus compromissos ético-políticos”, o que deve implicar, portanto, “numa política de comunicação que dê suporte para estabelecer uma articulação [interna e externa ao Serviço Social] do conjunto CFESS/CRESS com atores sociais relevantes na luta [em defesa por uma Seguridade Social Pública]”. Assim, parece indispensável enfrentar este debate e avançar em direção à superação dos mecanismos que impedem a generalização da riqueza material e espiritual socialmente produzida para dar visibilidade às condições objetivas desta generalização contida nas potencialidades e nas contradições da forma-mercadoria. Em estudo anterior, indicamos que “a produção de bens (materiais e imateriais, produtos e serviços), no marco das relações sociais de produção capitalistas, demanda prioritariamente a manipulação que só o estoque de conhecimentos propiciado pelo desenvolvimento da racionalidade instrumental garante”. Chamamos a atenção para o fato de que essa atitude representa “o produtivismo do ethos capitalista [que] só pode ser assegurado pela potenciação da razão instrumental” e que apresenta como uma de suas conseqüências a despolitização da questão social (SANTOS, 1998, p. 61). Foi neste sentido que identificamos na razão emancipatória (e não na razão instrumental) – uma dimensão da racionalidade da Ilustração – os fundamentos de um projeto profissional vinculado a construção de uma nova ordem societária, sem dominaçãoexploração de classe, etnia e gênero, previsto no nosso Código de Ética. Cabe a nós realizar a crítica radical à racionalidade do capital para demonstrar o sentido que assumiu o serviço público na efetivação das políticas públicas no contexto neoliberal. REFERÊNCIAS BRAVERMAN, H. Trabalho e capital monopolista: a degradação do trabalho no século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 10 CÓDIGO de ética profissional. In: Assistente social: ética e direitos. coletânea de leis e resoluções. 4. ed. CRESS 7ª região, 2002. COSTA, Maria Dalva Horácio. Os serviços na contemporaneidade: notas sobre o trabalho nos serviços. In: MOTA, Ana Elizabeth (Org.). A nova fábrica de consensos. São Paulo, Cortez, 1998. IAMAMOTO, M. 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