A MATEMÁTICA COM CARINHO E COM AFETO Por Sandra Magina1 Ao pensarmos no ser humano, temos que considerá-lo tendo em mente três óticas indissociáveis, por meio das quais esse ser é constituído. São Elas: a ótica da Biologia, da Sociologia e da Psicologia. Em outras palavras, o homem é um ser bio-psico-social. Assim é que como um ser biológico, fazemos parte do reino animal, mais especificamente dos animais vertebrados e, dentre esses dos mamíferos. Nossa classe de mamíferos são os primatas e nossa espécie é a homo sapiens. Sob essa ótica temos necessidades intrínsecas a nossa espécie as quais têm que ser atendidas para que possamos continuar vivos, tais como a necessidade do sono, da água, da luz, do oxigênio, etc. Do ponto de vista social, somos uma espécie de animal que, por sua fragilidade, precisa viver em comunidade. Assim é que somos eminentemente social. E a natureza social se manifesta de sobre maneira por meio da linguagem. Dentre todo o reino animal, somos a única espécie a ter linguagem. É por meio dela, a linguagem, que transmitimos o conhecimento. Por fim, mas não menos importante para a sobrevivência e expansão da espécie, ha a porção psicológica do ser humano. Sabemos que além do cérebro existe a mente e que os dois juntos formam a psique. A psique é, assim, responsável por duas partes importantíssimas: a cognição (pensamento, razão) e a afetividade. Psiaget (1995) ja era explícito em afirmar que não existe ato cognitivo dissociado da emoção “Não existe conduta, por mais intelectual que seja, que não comporte […] fatores emocionais” (p. 133). Nessa direção, o dito popular é muito sábio ao afirmar que “gostamos do que sabemos e sabemos do que gostamos”, deixando bem claro a estreita relação entre o saber, ligado à cognição, e o gostar, ligado ao afeto. Dentro desse panorama está a escola e dentro dela as aulas de Matemática. E assim nos perguntamos: como pensar numa Matemática, 1 - PhD pela Universidade de Londres, Pós-Doutora pela Universidade de Lisboa, Professora titular do Departamento de Matemática da PUC/SP, membro do colegiado do Programa Pós-graduado em Educação Matemática da PUC/SP e lider do grupo de pesquisa REPARE em EdMat (Reflexão, Planejamento, Ação, Reflexão em Educação Matemática) eminentemente relacionada à racionalidade e, portanto, à cognição, sob as óticas do carinho e do afeto? Na busca de uma boa resposta para a pergunta posta acima, partimos do pressuposto de que uma Matemática com carinho e com afeto implica em: a) Oferecer ao estudante um ambiente facilitador da aprendizagem, facilitador da construção do seu próprio conhecimento construtivismo (PIAGET, 1990; VERGNAUD, 1996; VIGOTISKI, 2001); b) Permitir que o estudante, na formação de cada conceito, interaja com um grande número de situações que dê significado ao conceito Teoria dos CamposConceituais (VERGNAUD, 1990; MAGINA et al, 2001); c) Explorar os invariantes operatórios de modo a torná-los explícitos para os estudantes, nas suas interações com as situações, paropriem-se de um determinado objeto matemático (VERGNAUD, 2009); d) Auxiliar o estudante a fazer uso de sua memória lógica e da atenção deliberada (VIGOTSKY, 2001); e e) estimular a comunicação dos estudantes, no sentido de permitir com que eles possam expor suas estratégias na resolução de problemas e que igualmente tenham espaço para defender suas ideias. Nesse caso a comunicação é vista como um processo reflexivo, de negociação de significados, através do qual emerge esse conhecimento (PONTE et al 2007). Analogamente, uma Matemática com brutalidade e desafeto implica em: a) Ter como fim o ensino de Algoritmos mecânicos e vazios, desprovidos de qualquer significado ou uso lógico; b) Auxiliar o estudante oferecendo palavras-dicas para que este distinga que caminho seguir na resolução de um problema, em detrimento de auxiliá-lo na compreensão do conceito; c) Admitir uma única solução e, pior ainda, um único caminho para se chegar a essa solução. É na reflexão sobre as implicações educacionais que cada um desses dois pólos traz para formação matemática do estudante, que versa a presente conferência. REFERÊNCIAS MAGINA, Sandra; CAMPOS, Tânia, M. M.; NUNES, Terezinha e GITIRANA, Verônica. Repensando adição e subtração: contribuições da teoria dos campos conceituais. São Paulo: PROEM, 2001. PIAGET, Jean Psicologia da Inteligência. Rio de Janeiro: Zahar Editora. 2ª Edição, 1983. _______ Epistemologia Genética. São Paulo: Martins Fontes, 1990. _______. A Psicologia da Criança. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 14ª edição, 1995. Ponte, J. P., Guerreiro, A., Cunha, H., Duarte, J., Martinho, H., Martins, C., Menezes, L., Menino, H., Pinto, H., Santos, L., Varandas, J. M., Veia, L., & Viseu, F. A comunicação nas práticas de jovens professores de Matemática. Revista Portuguesa de Educação, 2007 20(2), 39-74. VERGNAUD, Gerard. Epistemology and Psychology of Mathematics Education, in NESHER & KILPATRICK Cognition and Practice, Cambridge, Cambridge Press, Cambridge, 1990b, p. 1-30. ______ A teoria dos campos conceituais. In. BRUN, J. (Org.). Didáctica das matemáticas. Tradução de Figueiredo, M. J. Lisboa: Instituto Piaget, 1996. p. 155-191. ______. A Comprehensive Theory of Representation for Mathematics Education. JMB, V.17, N.2, pp.167-181, 1998 ______. A Criança, a Matemática e a Realidade. (M. L. F. Mouro, Trad). Curitiba: Ed. UFPR, 2009. VIGOSTSKI, Lev. A Construção do Pensamento e da linguagem. Tradução de Bezerra, P. São Paulo: Martins Fontes. 1ª edição, 2001