Varizes gástricas: o que fazer? Cláudia Cozendey Parada - R2 Gastro Orientadora: Dra Mônica Soldan Caso clínico 1 • E.E.S., 40 anos, sexo masculino, branco 2007 • Hemorragia digestiva alta varicosa → ligadura elástica de varizes esofagianas + propranolol • US Doppler: fígado e baço aumentados, hipertensão porta, sem trombose Esquistossomose hepatoesplênica 2010 • Varizes esofagianas erradicadas (transfusão de plaquetas previamente) Caso clínico 1 2012 EDA: • Varizes esofagianas < 5 mm → escleroterapia • Varizes gástricas que formam uma rede e se estendem para pequena curvatura, em continuidade com varizes esofagianas (GOV 1) • Varizes no fundo gástrico: 2 cordões grossos, polipoides/enovelados, azulados, tortuosos, um maior que 5 mm, em continuidade com varizes esofagianas (GOV 2) US Doppler: hepatopatia crônica, baço aumentado, sem trombose 2014 EDA: • Varizes esofagianas < 5 mm → ligadura elástica • Varizes no fundo gástrico GOV 2 Caso clínico 1 2015 2016 HDA em fevereiro (melena em casa) → anemia + dor abdominal + ascite + febre = PBE EDA: • Varizes esofagianas erradicadas • Varizes isoladas no fundo gástrico: 3 cordões enovelados, sem sinais vermelhos (IGV 1) • Gastropatia hipertensiva portal leve TC: fígado crônico, ascite volumosa, trombose da junção esplenomesentérica com colaterais HDA em fevereiro (hematêmese): por gastropatia hipertensiva portal acentuada? EDA: • Varizes esofagianas < 5 mm, com sinais vermelhos → ligadura elástica • GOV 2 • Gastropatia hipertensiva portal acentuada, com erosões no antro Março: 2ª sessão ligadura elástica / propranolol / Child A6 / INR 1,43 / Plaq 62000 Caso clínico 1 Caso clínico 1 Caso clínico 1 Caso clínico 1 Caso clínico 2 M.A.R., 50 anos, sexo masculino, branco 2000: trombose venosa profunda no membro inferior direito após imobilização 2008: infarto enteromesentérico Trombose da veia porta e mesentérica superior e trombose parcial da veia esplênica Marevan → enoxaparina SC Deficiência de proteína S EDA prévias: varizes esofagianas > 5mm, GOV1 e IGV 1 Nunca sangrou / plaq 41000 (previamente < 30000) Propranolol Caso clínico 2 Caso clínico 2 O que fazer? 1. Qual o risco de sangrar? 2. Existe diferença de acordo com classificação? 3. Profilaxia primária? 4. E se sangrar? Varizes gástricas 20% tratamento varizes esofagianas 9% em 2 anos Sangramento: Sangram menos frequentemente que as esofagianas Grande monta Difícil hemostasia primária Mortalidade 10-20%, até 45% (IGV > GOV) Ressangramento: 35% a 90% após remissão espontânea Garcia-Tsao et al. Prevention and Management of Gastroesophageal Varices and Variceal Hemorrhage in Cirrhosis. AASLD. HEPATOLOGY, Vol. 46, No. 3, 2007. Qual o risco de sangrar? 25% em 2 anos 45% em 5 anos Até 65%/ano se Child C + varizes de fundo grandes Fatores de risco • • • • Tamanho > 10 mm Fundo (IGV1 > GOV2) Sinais vermelhos Cirrose descompensada / hepatocarcinoma • Outro fator: tratamento das varizes esofagianas Girotra M et al. Endoscopic management of gastric varices. World J Hepatol 2014 March 27; 6(3): 130-136. Risco de sangrar: Trombose da veia porta e anticoagulação Trombose da veia porta Maior prevalência de varizes Maior risco de sangramento gástricas (30-40%) Falência do controle endoscópico do sangramento e ressangramento Anticoagulação só após adequada profilaxia para sangramento Plaquetas < 50.000: complicações hemorrágicas sob anticoagulação EASL Clinical Practice Guidelines: Vascular diseases of the liver. Journal of Hepatology 2016 vol. 64 j 179–202. Classificação (Sarin) GOV 1 GOV 2 Extensão por 2-5 cm na cárdia pela pequena curvatura Extensão além da cárdia para o fundo 75% 60% somem após tratamento varizes esofagianas 21% 55% sangram 28% sangram Sarin SK et al. Prevalence, classification and natural history of gastric varices: a long-term follow-up study in 568 portal hypertension patients. Hepatology 1992 Dec;16(6):1343-9. Classificação (Sarin) IGV 1 IGV 2 Isolada Fundo gástrico Corpo gástrico, antro, piloro ou primeira porção duodenal 2% 4% Isolada Sarin SK et al. Prevalence, classification and natural history of gastric varices: a long-term follow-up study in 568 portal hypertension patients. Hepatology 1992 Dec;16(6):1343-9. Profilaxia primária? 1. Está indicada? 2. Quando discutir? 3. Como? 4. Qual o risco/benefício? 89 cirróticos com GOV2 ou IGV1 maiores que 10 mm randomizados em 3 grupos, seguidos por 3 anos 1- Cianoacrilato (30) 10% sangramento 2- Propranolol (29) 38% sangramento 3- Nada (30) 53% sangramento Sem complicações Estudo retrospectivo: 27 cirróticos fizeram cianoacrilato como profilaxia primária de sangramento por varizes gástricas de alto risco. Em 21 (77%), somente 1 injeção de cianoacrilato foi necessária. Os outros 6 receberam mais sessões por obliteração incompleta. Nenhuma complicação foi encontrada na profilaxia primária. Profilaxia primária Baveno V (2010) Baveno VI (2015) A despeito da falta de dados específicos em estudos profiláticos, pacientes com varizes gástricas podem ser tratados com betabloqueadores não seletivos. Embora um único estudo tenha sugerido que a injeção de cianoacrilato seja mais efetiva em prevenir o primeiro episódio de sangramento em pacientes com varizes gastroesofágicas tipo 2 de grande calibre ou varizes gástricas isoladas tipo 1 (1b;A), mais estudos são necessários para avaliar o risco/benefício do uso do cianoacrilato antes que uma recomendação possa ser feita (5;D). Baveno VI Consensus Workshop. Journal of Hepatology 2015 vol. 63 j 743–752. Profilaxia primária Está indicada? • Faltam estudos... • Apenas um mostrando benefício do cianoacrilato (x propranolol x nada) Quando discutir? • Varizes de alto risco: >10-20 mm, fundo, sinais vermelhos, Child C • Plaquetas < 50.000 + anticoagulação??? Como? • Cianoacrilato (sem recomendação formal) • Propranolol (maioria dos consensos, apesar da falta de evidência) • Comparar com carvedilol??? Qual o risco/benefício do uso de cianoacrilato? • Benefício: redução do sangramento de 45% para 13% • 2 estudos: sem complicações no uso profilático (e em mãos menos experientes???) E se sangrar? E se sangrar? 1. Como manejar inicialmente? 2. Qual o tratamento de primeira linha? 3. Quais as alternativas? 4. Qual o tratamento dos casos refratários? Como manejar inicialmente? Reposição volêmica Antibiótico profilático: cirrose + hemorragia digestiva (ceftriaxone 1g/24h > quinolona) Concentrado de hemácias Hb 7- 8 g/dl Prevenção de encefalopatia hepática (lactulose ou rifaximina) Sem recomendação sobre trombocitopenia e a coagulopatia INR não é bom indicador da coagulação nos cirróticos Drogas vasoativas (terlipressina, somatostatina e octreotide): em combinação com terapia endoscópica e mantidas por até 5 dias Baveno VI Consensus Workshop. Journal of Hepatology 2015 vol. 63 j 743–752. Tratamento endoscópico (1ª linha) EDA nas primeiras 12 horas Eritromicina 250mg IV em 30-120 minutos antes da EDA IGV e GOV 2: terapia com cola tecidual (Nbutil-cianoacrilato) GOV 1: ligadura elástica ou cola tecidual Baveno VI Consensus Workshop. Journal of Hepatology 2015 vol. 63 j 743–752 Tratamento endoscópico Escleroterapia Ligadura elástica Cianoacrilato • Controle 60-100% • GOV 1 • Mais complicação • Alternativa para os outros tipos • Controle 90% • Cuidado com uso nas de maior calibre • Varizes esofagianas em Child C • Ressangramento até 90% (GOV 2 e IGV 1) • Varizes de fundo gástrico • Altas taxas de ressangramento Anticoagulado + plaquetopenia sem cirrose??? Girotra M et al . Endoscopic management of gastric varices. World J Hepatol 2014 March 27; 6(3): 130-136 Terapia com cola tecidual (cianoacrilato) Lubrificar estrutura externa distal e canal de trabalho com silicone ou lipiodol Preparar solução habitual de 1:1 de cianoacrilato e lipiodol Após punção da variz, injetar solução de cianoacrilato e seguir com injeção de salina para total remoção do adesivo de dentro do cateter Após retirar agulha do interior do vaso (de forma ágil), nova injeção de salina para lavagem completa do cateter na luz gástrica Logo após hemostasia, retirar aparelho com agulha recolhida e cateter no seu interior. Com aparelho removido do paciente, expor cateter e cortar sua ponta. Hemostasia > 90% (86-100%) Ressangramento em 22% (7–28%) Complicações em 50%: - Febre (34%) e dor abdominal (14%) até 24 horas - Sepse em 1% (abscesso adrenal, infecção por Klebsiella pneumonia e Escherichia coli) - Embolização em 1% (pulmonar, cerebral, esplênica) – lipiodol para detecção - Mortalidade 0,5% Terapia com cola tecidual (cianoacrilato) Terapia endoscópica ecoguiada combinada Colocação de molas + cianoacrilato guiada por US endoscópico Promissora, ainda faltando estudos para recomendação rotineira Relato recente Obliteração de variz gástrica com 1 sessão em 96% Ressangramento em 1 paciente, tratado com nova sessão 30 pacientes Hemostasia em 100% Sem complicações menor volume de cianoacrilato Romero-Castro R et al. EUS-guided coil versus cyanoacrylate therapy for the treatment of gastric varices: a multicenter study. Gastrointest Endosc 2013;78:711–21. Binmoeller KF et al. EUS-guided transesophageal treatment of gastric fundal varices with combined coiling and cyanoacrylate glue injection. Gastrointest Endosc 2011;74:1019–25. Tratamento endoscópico Injeção de trombina • Aparentemente segura • Hemostasia 70-100% • Ressangramento 7-27% • Após hemostasia inicial: injeções são repetidas a cada 2-3 semanas até erradicação • Sem recomendação rotineira – poucos dados (e evidência fraca) Hemospray • Relatos do uso no sangramento ativo por variz gástrica refratário a cianoacrilato • Ponte para TIPS em um deles • Contraindicação ao TIPS no outro • Sem ressangramento Girotra M et al . Endoscopic management of gastric varices. World J Hepatol 2014 March 27; 6(3): 130-136 Stanley AJ, Smith LA, Morris AJ. Use of hemostatic powder (Hemospray) in the management of refractory gastric variceal hemorrhage. Endoscopy 2013;45(Suppl 2 UCTN):E86–7.) Refratariedade ao tratamento endoscópico Balão: ponte, até 24h GOV1 e GOV2 com alto risco de ressangramento/ falência (Child C > 14 ou Child B com sangramento ativo) logo após terapia farmacológica e endoscópica inicial considerar colocação precoce de TIPS-PTFE nas primeiras 72 horas (ideal com menos de 24horas) Falência Sangramento persistente apesar da terapia farmacológica e endoscópica TIPS (ou BRTO - ASGE) Ressangramento Durante os primeiros 5 dias Pode terapia endoscópica (2ª abordagem) Se grave, TIPS é a melhor opção Baveno VI Consensus Workshop. Journal of Hepatology 2015 vol. 63 j 743–752 TIPS revestido Comparável ao cianoacrilato em: Piorar encefalopatia - Hemostasia Ocluir shunt ressangramento e vigilância da patência - Ressangramento - Sobrevida trombose da veia porta é contraindicação relativa Garcia Pagán et al. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2014;12:919–928 Triantafyllou M et al . Update on gastric varices. World J Gastrointest Endosc 2014 May 16; 6(5): 168-175 Obliteração transvenosa retrógrada por balão (BRTO) Garcia Pagán et al. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2014;12:919–928 Obliteração transvenosa retrógrada por balão (BRTO) Obliteração completa em 77100% Dor epigástrica (76%), febre (26%), hematuria transitória (53%) Ressangramento em 0-20% Peritonite bacteriana é rara Trombose portal ou renal (4%) Comparável ao TIPS em hemostasia e ressangramento Pode agravar hipertensão porta: ascite, edema intestinal, varizes esofagianas trombose da veia porta é contraindicação relativa Garcia Pagán et al. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2014;12:919–928 Triantafyllou M et al . Update on gastric varices. World J Gastrointest Endosc 2014 May 16; 6(5): 168-175 Cirurgia Controla sangramento ativo Ressangramento em 50% Mortalidade perioperatória > 40% UK guidelines on the management of variceal haemorrhage in cirrhotic patients.Tripathi D, et al. Gut 2015;64:1680–1704 Profilaxia secundária Baveno VI • Injeção adicional de cola tecidual após 2-4 semanas • Uso de betabloqueadores não seletivos GOV 1: ligadura elástica + betabloqueador • Cianoacrilato + betabloqueador • TIPS mais invasivo, menos disponível, encefalopatia Baveno VI Consensus Workshop. Journal of Hepatology 2015 vol. 63 j 743–752 67 pacientes com GOV2 e IGV 1 Em pouco mais de 2 anos: Cianoacrilato: ressangramento 15% / mortalidade 3% Betabloqueador: ressangramento 55% / mortalidade 25% 95 pacientes com GOV2 e IGV1 cianoacrilato com e sem betabloqueador não seletivo Após 1 ano e meio: Ressangramento e mortalidade foram similares nos 2 grupos Efeitos adversos foram mais comuns com a combinação Voltando aos casos... Caso 1 • 40 anos • Esquistossomose (+ cirrose?) + trombose da veia porta • HDA varicosas prévias (alguma por variz gástrica?) • Varizes esofagianas erradicadas, em uso de propranolol • Varizes grandes no fundo gástrico • Plaquetopenia (29-62.000) Caso 2 • 50 anos • Trombofilia hereditária (deficiência de proteína S) com trombose do sistema porta • Em anticoagulação plena, com plaquetas < 50.000 • Varizes esofagianas > 5 mm com sinais vermelhos profilaxia primária com propranolol • Varizes gástricas IGV 1 e GOV1 Garcia Pagán et al. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2014;12:919–928 Obrigada