Construções de Polígonos Regulares com Régua e Compasso

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Construções de Polígonos Regulares com Régua e Compasso
Cristian Vasconcellos Paoletti∗ and
Rosa Maria B. Chaves(orientadora)
Universidade de São Paulo (USP), Brazil
[email protected]
1.
Introdução
No projeto "Ensinar com Pesquisa", apoiado pela
Pró-Reitoria de Graduação e pela Comissão de
Graduação do IME-USP, nos propusemos a estudar
os axiomas do desenho geométrico, as construções
de perpendiculares, paralelas, ângulos e triângulos
e demais construções permitidas a partir destas
básicas. Este tema clássico costuma despertar bastante interesse nos estudantes pois tais construções
envolvem alguns postulados e propriedades fundamentais da Geometria, além de aspectos históricos.
Desde a época da Grécia Antiga, os matemáticos
consideravam estas construções como um jogo, que
continua a nos desaar até hoje. Na tentativa de
solucionar alguns dos problemas, surgiram algumas
surpresas, que os levaram a pensar se realmente
tais problemas teriam solução. Esta preocupação
é bastante natural, tendo em vista que para efetuar as construções, só é permitido utilizar como
instrumento a régua e o compasso. Além disso,
são impostas limitações para as operações a serem
feitas com esses instrumentos, através dos seguintes
axiomas (postulados):
(1) Além do papel, do lápis e da borracha, só
é permitido usar régua não-graduada e compasso
comum;
(2) Só é permitido traçar:
a) Um ponto, ou totalmente arbitrário, ou arbitrário sobre uma linha já traçada;
b) Uma reta, ou totalmente arbitrária, ou arbitrária
passando por um ponto; pode-se traçar a única reta
passando por dois pontos dados;
c) Uma circunferência, ou de centro e raio arbitrários, ou cujo centro é arbitrário e raio conhecido, ou
de centro dado e raio arbirtrário, ou conhecendo-se
o centro e um de seus pontos ou mesmo o próprio
raio;
d) Transportar um segmento dado sobre uma reta
dada;
∗ [email protected]
(3) Não é permitido fazer contas com dados do
problema para chegar à solução; só é permitido
considerar relações algébricas que darão suporte à
solução.
Devido a estas limitações, nem todos os problemas abordados puderam ser resolvidos. Como
exemplo, podemos citar os três problemas clássicos
das contruções com régua e compasso:
a) Dado um circulo de centro O e raio r, construir
o lado de um quadrado cuja área seja igual a do
circulo;
b) Dado um cubo, construir o lado de outro cubo
cujo volume seja o dobro do volume do primeiro;
c) Dado um ângulo qualquer, dividí-lo em 3 partes
iguais.
A partir dessas imposições dos axiomas, nosso roteiro para as Construções ca bem determindado
(essa era a intenção dos matemáticos antigos ao
colocá-los). Vale ressaltar também a importancia
das Construções no processo de ensino. Para um
estudante compreender melhor a Geometria plana,
é importante que ele possa aprender os conceitos
de forma concreta através da visualização proporcionada pelas Construções.
2.
Preliminares
Tomaremos como pressuposto algumas verdades da
Geometria plana, que serão utilizadas na construção
dos polígonos, porém sem justicativas. Da mesma
forma, algumas Construções Fundamentais que utilizaremos serão tidas como já conhecidas, tais como:
I) A mediatriz r de um segmento AB dado; II) A
reta s, perpendicular à uma reta r dada, passando
por um ponto P dado; III) A reta t, paralela à uma
reta s dada, passando por um ponto Q dado; IV)
O transporte de um segmento AB dado sobre uma
reta r à partir de um ponto C; o transporte de um
ângulo PQR dado sobre uma semi-reta AB; o transporte de uma medida k dada à partir de um ponto
A; V) A bissetriz AD de um ângulo BÂC dado; VI)
A trisecção de um ângulo reto; VII) Um triângulo,
dado os três lados, ou dois lados e um ângulo, ou dois
ângulos e um lado; VIII) A divisão de um segmento
AB dado em partes proporcionais aos comprimentos
de n segmentos dados; IX) Dados dois segmentos de
medidas
a e b, constrói-se
os segmentos:
de medida
√
√
√
2 + b2 e
2 + b2 , com a > b;
ab; de medidas
a
a
√
√
√
de medidas a 2, a 3, a 5, e assim por diante. X)
O segmento áureo EF de um segmento EG dado;
ou
√
m 5
seja, se m é a medida de EG, então EF = 2 − m2
Agora podemos estudar a construção dos polígonos regulares.
3.
Construção dos polígonos
regulares com régua e compasso
Dados um plano Π e um conjunto A1 , A2 , ..., An de
n pontos de Π , n ≥ 3, dizemos que o conjunto
P = A1 A2 ∪ A2 A3 ∪ · · · ∪ An − 1An ∪ An A1 é um
polígono se os n segmentos acima satisfazem: (a)
Dois segmentos quaisquer não se intersectam, exceto
eventualmente em seus extremos; (b) Dois segmentos
com um extremo comum não são colineares.
Se P é um polígono de n lados, podemos chamá-lo
de n-ágono (ou, para os mais comuns, por um prexo grego que indique o número de lados). Os n
pontos são chamados de vértices do polígono P, e os
n segmentos são chamados de lados de P. Os ângulos
Ai−1 Aˆi Ai+1 são chamados ângulos de P. Dois vértices que são extremos do mesmo segmento são ditos
adjacentes; dois lados com um extremo comum são
ditos também adjacentes.
Dizemos que P é um polígono convexo se, para
todo par de vértices adjacentes X e Y, todos os demais vértices de P estão num mesmo semi-plano determinado pela reta XY. Por m, se P é convexo
e possui todos os lados e todos os ângulos internos
congruentes, dizemos que P é um polígono regular.
Pode-se provar que a soma dos ângulos internos
de um n-ágono convexo é dada por S = (n − 2)180.
Da mesma forma, prova-se que todo polígono regular está inscrito em uma circunferência. A partir
desse fato, poderemos utilizar sempre uma circunferência de apoio para construirmos um polígono regular.
3.1
O 3-ágono regular e seus derivados
Começaremos com o roteiro para construir um triângulo equilátero (3- ágono regular). Como n = 3,
cada ângulo central (medido a partir do centro O da
circunferência circunscrita) medirá 360◦ /3 = 120◦
(por causa da congruência dos lados). Então:
(1) Sobre uma circunferência inicial C qualquer,
de apoio, de centro O, tome uma reta qualquer que
passe pelo centro; (2) Chamando de P e Q os pontos
de intersecção entre a reta e a circunferência, trace
duas circunferências de centros em P e em Q, ambas
passando por O; (3) Chamando de R, S, T e U os
pontos de intersecção entre a circunferência inicial C
e as duas traçadas, ligamos alternadamente os pontos obtidos na circunferência. Obteremos, então, o
3-ágono regular. A partir dele, podemos bissectar
seus ângulos centrais e construir todos os n-ágonos
tais que n = 3 2k , k = 0, 1, 2, · · · .
3.2
O 4-ágono regular e seus derivados
Agora, um roteiro para a construção de um quadrado
(4-ágono regular). Como n=4, cada ângulo central
dele, pela mesma razão que no caso anterior, medirá
360◦ /4 = 90◦ . Então, tomando novamente uma circunferência C qualquer, de apoio, de centro O, e dois
pontos P e Q extremos de um mesmo diâmetro, traçamos a mediatriz r do segmento P Q. Chamando de
R e S a intersecção de r com a circunferência inicial
C, os quatro pontos obtidos determinam os vértices
do quadrado. Da mesma forma que no caso anterior, bissectando-se os ângulos centrais do quadrado
obtido, teremos a construção dos n-ágonos tais que
n = 2k , k = 2, 3, 4, · · · .
3.3
O 5-ágono regular e seus derivados
Para o caso do decágono (10-ágono) regular, como
n = 10, cada ângulo central dele medirá 360◦ /10 =
36◦ . Observações: Olhando-se para um triângulo
AOB cujos lados são raios da circunferência de centro O circunscrita ao decágono, e cujo outro lado é
ˆ ,
um lado do dacágono, bissectando-se o ângulo AOB
◦
de 72 , chamando de C a intersecção da bissatriz com
o lado OB do triângulo, com algumas considerações
por semelhança dos triângulos AOB e ABC, vemos
que, algébricamente, sendo r a medida do raio da
circunferência e x a medida do lado do decágono regular nela inscrito, x é a razão áurea de r. A seguir
veremos os passos para a construção do decágono
regular:
(1) Novamente tomemos uma circunferência C
qualquer, de apoio, de centro O, e um diâmetro qualquer, de extremos P e Q; traçamos o ponto médio M
do raio P O. (2) Traçamos a mediatriz r do diâmetro
P Q, e chamamos de R um dos pontos de intersecção
de r com C; (3) Traçamos a circunferência W de centro M passando por R; (4) Chamando de S o ponto
de intersecção de W com o diâmetro P Q, o segmento
OS terá a medida x procurada; (5) A partir ou de
P ou de Q, transportar a medida x obtida acima,
e assim sucessivamente para cada ponto que surgirá
em C, até chegarmos novamente ao ponto inicial P
ou Q. Ligando-se todos os pontos obtidos, obtemos
o decágono regular.
Ligando-se os pontos obtidos alternadamente, teremos os segmentos que determinam um pentágono
regular. Da mesma forma que nos casos anteriores,
através da bissecção dos ângulos centrais do pentágono, poderemos construir todos os n-ágonos tais que
n = 5.2k , k = 0, 1, 2, · · · .
3.4
O 15-ágono regular e seus derivados
Para construirmos o polígono regular de 15 lados,
observemos que a medida do ângulo central desse
polígono é de 360◦ /15 = 24◦ , e que este ângulo pode
ser obtido pela diferença entre um ângulo de 60◦ e
um de 36◦ , que foi obtido anteriormente na construção do decágono regular. Então, partindo de uma
circunferência C qualquer, de apoio, de centro O,
traçamos uma semi-reta qualquer de origem em O, e
à partir dela transportamos o ângulo obtido acima.
Chamando de P e Q os pontos de intersecção do ângulo com a circunferência inicial C, transferimos a
medida PQ sucessivamente a partir ou de P ou de
Q, até chegarmos ao ponto escolhido.
Através da bissecção dos ângulos centrais do 15ágono, torna-se possível construirmos os n-ágonos
tais que n = 15 2k , k = 0, 1, 2, ....
A construção dos polígonos (regulares) é uma interessante forma de aplicar os conceitos fundamentais
do Desenho Geométrico, que sempre são trazidos à
tona.
4.
O Teorema de Gauss para os
Polígonos Construtíveis
Uma pergunta que surge naturalmente é: que polígonos regulares podemos construir apenas com régua e
compasso? A resposta, baseada num sosticado resultado de Carl Friedrich Gauss (1777 - 1855), está
a seguir:
Teorema 1.
Usando-se régua não-graduada e
compasso, a divisão da circunferência em n arcos
congruentes é possível se n puder ser escrito como:
i) n = 2k , k = 1, 2, 3, · · · ou ii) n = 2k p1 p2 ...pj , k =
0, 1, 2, · · · onde os p0i s são números primos distintos
m
da forma Fm = 22 + 1, m = 0, 1, 2, · · ·
Notemos que:
0
1
3 = 22 + 1; 4 = 22 ; 5 = 22 + 1; 15 = 20 3 5.
Isso mostra a validade do Teorema de Gauss para
os polígonos construídos até aqui.
Referências
"Introdução às Construções Geométricas"e
"Polígonos Regulares", 1st ed., Notas de aula, São Paulo,
[1] Sérgio Alves,
1991.
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