UEFS Disciplina: Análise Microeconômica I Prof.(a) : Maria Margarida R. Costa Notas de Aula sobre a Demanda 1. O problema do consumidor As preferências e a reta orçamentária contêm informações sobre o comportamento do consumidor. As preferências ou as utilidades refletem o gosto do consumidor, sem considerar o que de fato pode ser adquirido. A reta orçamentária reflete as possibilidades de compra do consumidor, sem considerar suas preferências. Desta forma, o problema do consumidor associa esses dois conceitos ao caracterizar o problema como a maximização da utilidade sujeita à restrição orçamentária. O consumidor pode escolher entre n bens, x1, x2, .... , xn, que podem ser comprados pelos preços de mercado p1, p2......, pn, respectivamente. Denotamos uma cesta de bens por x = (x1, x2, ...., xn) e um vetor de preços por p = (p1, p2, ...., pn). O problema do consumidor pode ser escrito como: Dadas estas condições o consumidor escolhe os bens que maximizam a sua utilidade e que estão dentro da sua possibilidade de consumo, i.e., satisfazem a sua restrição orçamentária. Para resolver esse problema, montamos a “função Lagrange”: , onde λ é o multiplicador de Lagrange. As condições de primeira ordem (CPO) desse problema são: As condições de primeira ordem (CPO) são necessárias, mas não suficientes para garantir a “otimalidade” da solução. Para confirmar que as cestas encontradas usando as CPO são ótimas é necessário verificar as condições de segunda ordem (CSO) do 1-1 2009 – Microeconomia I Notas de Aula problema. No entanto, assumiremos que as CSO para o problema do consumidor estão satisfeitas. Se dividirmos as duas das primeiras equações acima, obtemos (3) O lado esquerdo da equação é a TMS, que representa o valor marginal do bem i em termos do bem j (a inclinação da Curva de Indiferença). O lado direito dessa equação é o custo de mercado do bem i em termos do bem j ( a inclinação da Restrição Orçamentária). A equação (3) diz que para a escolha ótima do consumidor, para quaisquer dois bens, o valor relativo deles em termos das preferências do consumidor deve ser igual ao valor de mercado desses bens. Graficamente: no ponto ótimo de consumo, a inclinação da curva de indiferença nesse ponto (que mede a TMS) é igual à inclinação da restrição orçamentária (que mede a taxa de troca de mercado dos dois bens). A figura abaixo ilustra essa situação, onde o ponto de equilíbrio (ponto ótimo) de consumo é representado por E, o ponto de tangência da curva de indiferença com a restrição orçamentária (o ponto onde essas duas curvas têm a mesma inclinação). 1-2 2009 – Microeconomia I Notas de Aula 2. Funções de Demanda A solução do problema do consumidor corresponde às demandas dos bens como funções dos preços de do nível de renda: As funções de demanda acima são chamadas demandas Marshallianas. Revelam qual é a escolha ótima do consumidor quando os preços são p1, p2,... ,pn e a renda m. 3. Exemplos 3.1 Bens Substitutos. Dois bens são substitutos perfeitos se o consumidor aceita substituir um pelo outro a uma taxa constante. Se x1 e x2 são bens substitutos, a função utilidade que representa essa relação é dada por U(x1, x2) = ax1 + bx2; a > 0; b > 0 Os parâmetros a e b determinam a taxa de substituição entre os bens. No exemplo de gasolina e álcool para um carro flex, a = b, são iguais a 1. Graficamente: x2 U = x 1 + x2 𝑚 𝑝2 Hip: p2 = 2p1 E 𝑚 𝑝1 X1 1-3 2009 – Microeconomia I Notas de Aula O problema do consumidor é atingir a curva de indiferença mais alta, dada a restrição orçamentária. Então ele comprará o bem que for relativamente mais barato. Se a = b = 1 e U(x1; x2) = x1 + x2, o consumidor compra o bem que tiver o preço menor (se os dois bens tiverem o mesmo preço, tanto faz para o consumidor, ele comprará qualquer cesta dos dois bens). A função de demanda é: Graficamente: P1 X2 Curvas de indiferença Curva de demanda p1=p2 Curva de preçoconsumo X1 X1 m/p1 1-4 2009 – Microeconomia I Notas de Aula 3.2. Bens Complementares perfeitos - Dois bens são complementares perfeitos se são consumidos conjuntamente, em combinações fixas. Se x1 e x2 são bens complementares perfeitos, a função de utilidade que representa essa relação é dada por: U(x1; x2) = min {ax1, bx2 }; a > 0; b > 0 Os números a e b refletem o grau de complementaridade dos bens. No caso de sapatos, a = b = 1. No caso dos óculos, 2 lentes (bem x1) para 1 armação (bem x2), então a = 2b. Graficamente, a escolha ótima é dada por : x2 P1 x2 = x1 E’ ” U3 Curva de demanda U2 U1 x1 x1 O consumidor escolhe a cesta de bens na curva de indiferença que representa o maior nível de satisfação possível – ponto E. A cesta de bens ótima significa consumir quantidades iguais do bem (quando a = b = 1). Como não há como substituir os bens: se a = b = 1, então U(x1; x2) = min {x1, x2}, o consumidor compra os dois bens em quantidades iguais, independente da relação dos preços. Portanto x1 = x2 = x* e substituindo na restrição orçamentária, termos: x1(p1,p2,m) = x2(p1,p2,m) = 𝒎 𝒑𝟏+𝒑𝟐 1-5 2009 – Microeconomia I Notas de Aula 3.3. Utilidade Cobb-Douglas. Para o caso de dois bens, vimos que as demandas geradas por uma utilidade Cobb-Douglas U(x1,x2) = x1αx21-α 0 < α < 1, são x1 = α 𝒎 e 𝒑𝟏 x2 = (1-α) 𝒎 𝒑𝟐 4. A Curva de demanda É (quase sempre) negativamente inclinada: se o preço do bem aumenta, compramos menos desse bem. Essa propriedade é chamada de lei da demanda. A exceção é o caso dos bens de Giffen. 4.1. Lei da Demanda: Para qualquer bem ou serviço, a lei da demanda afirma que se consome mais quando o preço diminui (ou que se consome menos quando o preço aumenta), mantendo–se as demais variáveis constantes (condição ceteris paribus). preço Curva de demanda quantidade Existem duas formas de se interpretar a curva de demanda: a. Para cada preço alternativo, sabemos qual será a quantidade demandada pelo consumidor, ou b. Dado que a demanda é negativamente inclinada , pode-se afirmar que o valor marginal de um bem é decrescente. A função de demanda inversa p(x) mede essa relação do valor marginal com a quantidade consumida: quanto o consumidor está disposto a pagar pela última unidade x consumida. Sempre que a função de demanda for negativamente inclinada, podemos achar a função de demanda inversa desse consumidor. 1-6 2009 – Microeconomia I Notas de Aula 4.2. Mudanças na curva e da curva Quando estudamos o que ocorre com a quantidade demandada quando o preço do bem varia, todo o resto constante, estamos estudando uma mudança ao longo da curva de demanda: p Alteração no preço do bem D x A quantidade de um bem a ser demandada é uma função do preço do produto e de um conjunto de outros fatores, como os preços de outros bens e a renda, expressos explicitamente na função de demanda e também de fatores implícitos, como o tamanho da população, a renda per capita, os gostos, a expectativa sobre preços futuros, o clima, etc. Se esses outros determinantes da demanda não se alterarem, uma mudança no preço do bem provocará uma mudança na quantidade demandada. Ou seja, um movimento ao longo da curva, como mostra o gráfico acima. Se algum dos outros determinantes da demanda mudar, o resultado será um deslocamento de toda a curva de demanda, que pode gerar tanto um aumento como uma queda da quantidade demandada para cada nível de preço dependendo da direção do deslocamento. p Alteração de outra variável D’ D x 2009 – Microeconomia I Notas de Aula 1-7 5. Função de Utilidade Quase-linear Para o caso de dois bens, essa utilidade é dada por: U(x1, x2) = v(x1) + x2 ou seja, a utilidade_é linear em um bem apenas. Essa utilidade gera demandas com características importantes. O problema do consumidor nesse caso é dado por: Max g(x1) + x2 s.a p1x1 + p2x2 = m Usando a reta orçamentária, obtemos que x2 = m/p2 - (p1/p2)x1. Substituindo esse valor de x2 na função utilidade, obtemos: Nesse caso a solução é interior A curva de demanda inversa é dada por 𝒑𝟏(𝒙𝟏) = 𝒈′ (𝒙𝟏)𝒑𝟐 . Isto é a função de demanda inversa do bem 1 é a derivada da função de utilidade multiplicada por p2. A demanda do bem 1 depende apenas da relação de preços dos bens. A demanda do outro bem é obtida substituindo a demanda do bem 1 na restrição orçamentária: As demandas quase lineares apresentam essa propriedade da demanda de um dos bens não depender da renda . O efeito de uma alteração da renda na demanda do bem 1 é nulo: uma variação na renda não altera a quantidade consumida do bem 1. Qualquer modificação na renda afeta apenas a demanda do bem 2. Por exemplo, se a renda do consumidor aumentar, todo esse aumento será gasto apenas no bem 2. IMPORTANTE: a demanda não será independente da renda para todos os valores da renda: se a renda for muito baixa, o consumidor não conseguirá comprar nada do bem 1. Graficamente, as curvas de indiferença de uma função de utilidade quase linear são verticalmente paralelas: para qualquer quantidade do bem, as inclinações de duas curvas de indiferença diferentes serão iguais. 1-8 2009 – Microeconomia I Notas de Aula Exemplo retirado do livro de Varian (p. 123) Seja U(x1; x2) = ln x1 + x2. O problema do consumidor é: max x1 ln x1 + m/p2 - (p1/p2)x1 A CPO (condição de primeira ordem) é : A demanda do outro bem é obtida substituindo a demanda do bem 1 na restrição orçamentária IMPORTANTE: Observe que se p2 > m, o consumidor não consegue comprar a quantidade p2/p1 do bem 1. Nesse caso, o consumidor compra apenas o bem 1, e portanto x2* = 0 As funções de utilidade quase-lineares, devido ao fato de gerarem demandas com uma estrutura simples, são muito usadas em economia, especialmente na análise de bemestar. 1-9 2009 – Microeconomia I Notas de Aula Lembre-se que as curvas de indiferença para funções quase-lineares são versões “deslocadas” de uma curva de indiferença. Se deslocarmos a restrição orçamentária para fora, se uma curva de indiferença tangenciar a reta orçamentária numa cesta (x1*, x2*), então, outra curva de indiferença tangenciará em (x1*, x2*+ k) para qualquer constante k. O aumento da renda não altera em nada a demanda do bem 1, e toda a renda adicional vai para o consumo do bem 2 – Efeito-renda nulo. Graficamente vemos que a curva de Engel para o bem 1 é uma linha vertical. x2 Curva de renda consumo m Curva de Engel Curvas de indiferença Retas orçamentárias x1 x1 Referências: Varian, H. – Microeeconomia – Princípios Básicos, Cap. 6 1 - 10 2009 – Microeconomia I Notas de Aula