1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA JULIANA KATO PACHECO FERRAZ A TELENOVELA REBELDE E A EROTIZAÇÃO DA INFÂNCIA: UM ESTUDO BASEADO NO MODELO DA APRENDIZAGEM SOCIAL SÃO CARLOS/SP 2009 2 A TELENOVELA REBELDE E A EROTIZAÇÃO DA INFÂNCIA: UM ESTUDO BASEADO NO MODELO DA APRENDIZAGEM SOCIAL 3 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA JULIANA KATO PACHECO FERRAZ A TELENOVELA REBELDE E A EROTIZAÇÃO DA INFÂNCIA: UM ESTUDO BASEADO NO MODELO DA APRENDIZAGEM SOCIAL Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Licenciatura em Pedagogia – da Universidade Federal de São Carlos, como requisito parcial para obtenção da licenciatura em Pedagogia. Orientação: Prof. Dr. João dos Santos Carmo. SÃO CARLOS/SP 2009 4 JULIANA KATO PACHECO FERRAZ A TELENOVELA REBELDE E A EROTIZAÇÃO DA INFÂNCIA: UM ESTUDO BASEADO NO MODELO DA APRENDIZAGEM SOCIAL Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da licenciatura em Pedagogia. Universidade Federal de São Carlos. São Carlos, 30 de Novembro de 2009 Orientador: João dos Santos Carmo Universidade Federal de São Carlos --------------------------------------------------------------------- Examinadora: Kelci Anne Pereira UAB/Universidade Federal de São Carlos 5 ----------------------------------------------------------------------------- Examinadora: Priscila Mara de Araújo Gualberto Universidade Federal de São Carlos ---------------------------------------------------------------------------- 6 Dedico este trabalho com todo o meu amor, aos meus pais, por todo o seu amor. 7 AGRADECIMENTOS Registro brevemente alguns agradecimentos às pessoas mais próximas de meu convívio social, àquelas que de perto acompanharam a elaboração desta monografia. Ao meu orientador e professor João dos Santos Carmo, por tamanha dedicação e paciência nos momentos de reunião, questionamentos e dúvidas. Agradeço pelas transmissões de saberes, visões e apontamentos, que muito me auxiliaram para a elaboração desta monografia. À minha família. Pelas tantas horas de apoiou durante a escrita deste trabalho, que mesmo com a distância me ouvia e me ajudava. Pela força e estímulo dado nos momentos de cansaço e esforço mental. Obrigada por sempre estarem comigo. Às minhas amigas mais próximas, consideradas como irmãs, que com certeza irão deixar saudades dos anos de faculdade. Obrigada pelo apoio, amizade, fraternidade, e paciência pelas horas falando sobre o trabalho de conclusão e curso, me escutando e estimulando. Agradeço a união e o amor compartilhados durantes estes anos. Agradeço também, ás minhas irmãs Márcia e Érica, pelo apoio e ajuda na elaboração deste trabalho. Obrigada pela companhia e amizade sempre! 8 “As coisas mudaram aos poucos: nosso olhar procurava a sossegada imagem de uma felicidade infantil em um mundo encantado, feito de vestidinhos de renda e blusas de marinheiro. Depois, desejosos de garantir à criança um acesso à vida adulta, (...) passamos a vesti-las de terno e gravada ou de saia plissée. Hoje _ síntese hegeliana _, elas seguem a imagem da felicidade dos adultos: roupa esporte e fantasias de Xuxa. Ao instantâneo desbotado do nenê sem sexo, à foto amarelada do homenzinho e da mulherzinha de blazer, se substituiu um cartão postal que se parece com o folheto publicitário de um pacote de férias, vôlei na praia e promessas eróticas.” (Contardo Calligaris) 9 RESUMO O objeto de estudo desta monografia são as possíveis influências que a mídia exerce sobre as crianças, tendo como foco a telenovela mexicana Rebelde; já que na época em que foi exibida obteve muito sucesso; alcançando um número elevado de fãs, que seguiam seus passos, e desejavam ser como os ídolos. Assim, neste trabalho iremos investigar em que medida essas telenovelas contribuem para a aprendizagem de padrões afetivos e sexuais na infância, tendo como base teórica o modelo da aprendizagem social. Esta pesquisa tem caráter teórico-documental, e foi escrita a partir de estudos e análises de textos teóricos, DVDs da terceira temporada da telenovela Rebelde e CDs da banda RBD. Destacam-se a teoria da aprendizagem social de Bandura (1980), a relação desta com a mídia; concepções de infância, influência da mídia no desenvolvimento infantil, assim como na erotização precoce das crianças. Abordam-se questões relacionadas às cenas e diálogos da terceira temporada de Rebelde, e trechos de músicas da banda RBD, de modo a analisar àquelas que influenciam e contribuem para a vivência precoce da sexualidade infantil. Discutem-se possíveis implicações educacionais visando uma educação para a mídia nos currículos escolares, a fim de formar crianças críticas e reflexivas, capazes de filtrar os ideais, concepções e modelos midiáticos favoráveis a sua formação da personalidade. A pesquisa buscou estudar e analisar exemplos que comprovem que telenovelas, como Rebelde, possuem conteúdos que abordam o tema sexualidade, de forma a contribuir para a erotização precoce na infância. Algumas das conclusões deste trabalho referem-se à forma como elementos sutis ou não, encontrados em telenovelas, principalmente expressos nos comportamentos de personagens significativos; influenciam e interferem diretamente no desenvolvimento infantil, podendo proporcionar uma erotização precoce na infância, além de interferir na construção de identidade da criança. Palavras-chave: Aprendizagem Social; Infância; Mídia; Rebelde; Erotização infantil; Educação. 10 ABSTRACT The object of this paper is the possible influences that the media has on children, focusing on the Mexican soap opera “Rebelde”, which was very successful when it was on TV, reaching a large number of fans who followed their footsteps, and wanted to be like the idols on the show. In this study we will investigate how these soap operas contribute to the learning of sexual and affective patterns on childhood, based on the model of social learning. This research has a theoretical and documentary character, and it was written starting from studies and analysis of theoretical texts, DVDs of the third season of the soap opera Rebelde and CDs of the band RBD. Highlights to the social learning theory of Bandura (1980), its relationship with the media, concepts of childhood, the influence of the media on child development, as well as the children‟s early eroticism. This study addresses issues related to the scenes and dialogues of the third season of “Rebelde”, and snippets of songs from the band “RBD”, in order to examine those that influence and contribute to the sexuality experience in childhood. On the paper, possible educational implications will be discussed aiming an education to the media on school, so that children will be taught about the effects of the media in order to form critical and reflective children, who will be able to filter the ideas, concepts and favorable models of media to form their personality. The research sought to examine and analyze evidences that comprobe that soap operas such as "Rebelde", have contents that address the subject sexuality contributing to the early eroticism on childhood. Some of the conclusions of this study relate the form as subtle elements or not so subtle, from soap operas, mainly expressed in the behaviors of significant characters from these novels; they influence and they interfere directly in the child development, could provide an early eroticism on childhood, besides interfering in the construction of the child's identity. Keywords: Social Learning; Childhood; Media; "Rebelde"; Erotization on childhood; Education. 11 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1. Foto dos personagens centrais da telenovela Rebelde e integrantes da banda RDB................................................................................................... 44 12 LISTA DE TABELAS Quadro 1. Categorias extraídas de cenas e diálogos presentes em alguns episódios da terceira temporada da telenovela Rebelde.......................................................... 48 Quadro 2. Categorias extraídas de trechos das letras de algumas músicas do grupo RBD................................................................................................................... 58 13 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 12 1 A TEORIA DA APRENDIZAGEM SOCIAL 15 1.1. Aprendizagem Social e Mídia 22 2 TEORIA, MÍDIA E EROTIZAÇÃO INFANTIL 26 2.1 Conceito de Infância 27 2.2 Novo conceito de infância e transformações da Modernidade 30 2.3 Influência da mídia no desenvolvimento infantil 32 2.4 Mídia e erotização da infância 35 3 TELENOVELA REBELDE E APRENDIZAGEM SOCIAL 42 3.1 Caracterização da telenovela 44 3.1.1 Personagens principais 45 3.2 Características atrativas da telenovela Rebelde 47 3.3 Categorias de análise 48 3.3.1 Cenas e Diálogos presentes na telenovela Rebelde 49 3.3.2 Letras e Músicas 59 3.4 Conclusões 65 4 EDUCAÇÃO COMO MEIO DE INTERVENÇÃO SOCIAL 68 4.1 Implicações educacionais na família 68 4.2 Implicações educacionais na escola 71 4.3 Implicações educacionais na sociedade 73 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 76 REFERÊNCIAS 79 14 INTRODUÇÃO Há tempos que a mídia vem ditando modos de vestir, comer, ser, pensar, enfim “ensina” a forma como o ser humano deve agir. Assim, corpos e modos de vida vão sendo criados e copiados pelos espectadores, pois estes modelos estão relacionados ao glamour, luxo e status, fazendo com que os seres humanos almejem esses ideais de vida que são representados em comerciais, telenovelas e demais meios de comunicação. Conseqüentemente, as crianças tornam-se alvos fáceis da mídia, já que, segundo Santos e Jablonski (2003), esta as considera como pequenos consumidores, pelo fato de ficarem muitas horas expostas na frente da televisão, assistindo desenhos, filmes, telenovelas, propagandas e tudo que é transmitido. Como na TV não existem filtros, fica a critério dos pais ou familiares a escolha do conteúdo que a criança irá assistir, isto quando a escolha não fica a cargo da própria criança que passa a assistir programas sem a supervisão ou conhecimento do adulto. Com isso, milhares de crianças e jovens ficam em contato com cenas, conteúdos e temas, desapropriados às faixas etárias, acabando por encontrarem na mídia temas como sexualidade e violência. Uma vez que estes são novos na infância, sendo pouco discutidos com pais e educadores, conseqüentemente, as crianças, identificadas com seus ídolos, observam e imitam o comportamento e personalidade destes, a fim de tornarem-se parecidas com estes. A partir desta observação e imitação, as crianças passam a adquirir conhecimentos, conforme a Teoria Social de Bandura (1980), que explica a forma como os sujeitos aprendem, partindo de observações e imitações de modelos significativos. Como a mídia de massa acredita que o conteúdo erótico é um dos temas que mais chama a atenção do público, ela acaba por expandi-lo de forma ilimitada, fazendo com que telenovelas e propagandas de produtos destinados ao público infantil contenham cenas com conteúdos sexuais e afetivos, que contribuem para a erotização precoce da infância. Visto que, muitas crianças nem entendem que atos, vestimentas e comportamentos podem influenciar em sua sexualidade, apenas aprenderam por meio da observação. Assim, o objetivo desta pesquisa consiste em analisar e estudar em que medida telenovelas, como Rebelde, influenciam e contribuem para a aprendizagem de padrões sexuais e afetivos na infância, partindo de um estudo do modelo teórico da aprendizagem social, pois este apresenta grandes possibilidades de análise dos comportamentos de observação e imitação, que constituem a aprendizagem social tão utilizada pelas mídias. 15 As análises realizadas na pesquisa foram pautadas na telenovela mexicana Rebelde, pelo fato desta ter proporcionado muito sucesso entre os espectadores, uma vez que seus conteúdos e temas eram próximos dos cotidianos do público alvo (infanto-juvenil), ocasionando uma forte identificação entre seu grupo de pares. Assim, muitas crianças identificadas com os personagens centrais da trama, acabavam por moldar seus comportamentos e modos de ser e pensar conforme os padrões de comportamentos dos ídolos; sem realizarem uma reflexão crítica do que estavam imitando e aprendendo por meio da observação dos personagens. A partir disto, o estudo sobre a influência da mídia, e especificamente, das telenovelas, na precocidade da erotização infantil se torna essencial para a compreensão de como a mídia constrói informações, reforça clichês, estereótipos e interfere na vida dos sujeitos. Assim, poderemos pensar e refletir em ações e formas de agir, visando conscientizar as crianças e jovens sobre a mídia e seus modelos midiáticos, de maneira a formar uma consciência crítica e reflexiva, capaz de selecionar os conteúdos apropriados para a construção das próprias personalidades. Quanto à metodologia utilizada para a elaboração deste estudo, este partirá de uma análise teórico-documental, em função de que há poucos estudos com essa característica sobre a temática escolhida, já que a maioria das pesquisas encontradas estabelece relações de adolescentes com a telenovela Rebelde, pelo conteúdo desta ser mais apropriado aos jovens, pelo alto erotismo presente nesta. Não há estudos que se refiram às repercussões da telenovela Rebeldes na erotização da infância e, portanto, este trabalho representa um primeiro passo para sistematizar uma análise teórica com base no modelo de aprendizagem social. Para conseguirmos alcançar os objetivos propostos, os procedimentos metodológicos consistiram em levantamentos de estudos sobre a aprendizagem social, objetivando construir o referencial teórico; busca de referências bibliográficas que discorressem sobre concepções de infância; relações entre mídia e erotização precoce na infância; análise da terceira temporada de Rebelde e da discografia da banda RBD, a fim de buscar dados que indicassem como as telenovelas podem contribuir para a vivência precoce da sexualidade infantil; e por fim, foi realizada uma reflexão sobre possíveis implicações educacionais, capazes de intervir no processo de erotização da infância. 16 Para tanto, esta monografia foi dividida em quatro capítulos que contemplará os seguintes estudos: o primeiro capítulo discorrerá sobre a teoria da aprendizagem social de Bandura (1980), delineando seus principais aspectos e demonstrando como nossos comportamentos sociais são, em grande parte, um efeito da observação e imitação de modelos significativos dados pela sociedade. Neste sentido, será enfatizado o papel da mídia como fornecedora de modelos que condicionam padrões de comportamento. O segundo capítulo estudará a história do conceito de infância, indicando suas mudanças e influências sofridas pela mídia, ocasionando a precocidade da erotização infantil; no terceiro capítulo estudaremos de forma categórica, as cenas, diálogos, trechos de letras de músicas presentes na telenovela Rebelde, visando análises e conclusões da forma como telenovelas contribuem para a aprendizagem de padrões afetivos e sexuais na infância; e por fim, o quarto capítulo contemplará implicações educacionais no âmbito da família, escola e sociedade, de maneira a refletir sobre possíveis intervenções na forma como as crianças lidam com a mídia e aprendizagens decorrentes deste meio. Enfim, o que o leitor encontrará neste trabalho são estudos que indicam como a mídia, e especificamente, telenovelas, como Rebelde, influencia e contribui para a vivência precoce da sexualidade infantil. Não pretende-se esgotar o tema, mas gerar inquietações e possíveis reflexões que despertem novos caminhos para futuras investigações. 17 Capítulo 1 A TEORIA DA APRENDIZAGEM SOCIAL Pensar em aprendizagem nos remete a inúmeros significados, pois se trata de um processo complexo que envolve os aspectos cognitivo, social, cultural, psíquico, emocional e orgânico dos indivíduos. Partindo de uma abordagem inicial sobre aprendizagem, podemos dizer que esta envolve mudanças; portanto, enquanto aprendemos, estamos modificando comportamentos, adquirindo novos conhecimentos, desenvolvendo habilidades e competências. Os indivíduos, desde o nascimento, estão predispostos aos processos de aprendizagem, pois em interação com o meio em que vivem passam por mudanças que determinam seu modo de ser e pensar. A condição de estar predisposto a aprender é natural do ser humano, e a partir de sua formação cultural, social e política, este passa a discriminar as aprendizagens de seu interesse. Porém, a aprendizagem pode ocorrer de várias formas, podendo ser um processo intencional, em que alguém incentiva e propicia certo ensinamento de forma explicita ou implícita, ou ainda pode ser não intencional, ou seja, o individuo aprende por uma casualidade em uma situação corriqueira; por exemplo, uma pessoa sem querer escuta uma conversa alheia sobre um conceito matemático e conseqüentemente acaba por aprender este. Ainda, a aprendizagem pode ser colateral, ou seja, certo conhecimento pode ser adquirido por meio de um contexto que desencadeou algo bom ou ruim para o indivíduo. Assim, uma pessoa pode aprender algo de situações que ocorrem no dia-a-dia, como por exemplo, um aluno ao invés de estudar para a prova, passa o dia brincando, após ver que seu desempenho na prova foi negativo, aprende que precisa estudar os conteúdos e não apenas se divertir. Por vivermos tipicamente em interação social, estamos em constante processo de aprendizagem, pois ao nos relacionarmos com outros e com o meio, estamos interagindo, e trocando informações a todo o momento, assim como presenciamos situações que nos levam à aquisição de conceitos e habilidades. Existem muitas formas de ocorrer a aprendizagem, mas a que estudaremos neste capítulo refere-se à obtida por meio da observação e imitação, chamada de Aprendizagem Social, proposta por Albert Bandura. Partindo desta perspectiva, Bandura (1980) acredita que toda aprendizagem direta pode acontecer por meio da observação e imitação do comportamento do outro. 18 Quando estamos em contato com outras pessoas, tendemos a observar o modo como estas se comportam; por exemplo, um indivíduo que utiliza o metrô pela primeira vez, vai observar as pessoas que estão ao seu redor que estão familiarizadas com a situação, para identificar comportamentos e expressões que estas utilizam, já que precisa saber como pedir para parar o metrô, ou como passar pela catraca. Assim, ele fica atento a estes comportamentos e os reproduz da maneira como observou no modelo, a fim de conseguir realizar suas tarefas. Desde pequenas, as crianças se identificam com seus pais, tornando-os modelos a serem seguidos. Logo, antes mesmo de falar, já conseguem imitar os comportamentos e atitudes dos pais, como gestos que fazem enquanto comem, se expressam com movimentos, entre outros, que a criança reproduz quando brinca com as bonecas ou em jogos simbólicos, dramáticos. Com isso, é essencial que os pais e educadores tomem cuidado na hora de pronunciar palavras de baixo calão, ou agir de forma incorreta quando lida com estas, pois basta uma única vez que a criança observa o comportamento do modelo, para que ela o imite. Bandura (1980) classifica como aprendizagem vicariante o fato de observar e imitar comportamentos de um modelo, sendo que este é aquele que primeiro realiza o comportamento. As pessoas são influenciadas por observarem o modo como os outros se comportam; mas também se lêem ou ouvem informações sobre o modelo, podem utilizar estas informações para modelar seus próprios comportamentos. Os modelos podem ser reais, ou seja, o observador presencia e tem contato com o modelo, ou também podem ser simbólicos, que não estão presentes fisicamente junto com o observador. Exemplo a TV expõe e cria muitos modelos simbólicos, assim como filmes com seus personagens, livros, revistas e desenhos. Na maioria das vezes estamos em situações em que podemos observar o comportamento alheio, conseqüentemente, podemos ser influenciados por modelos sociais muitas vezes ao longo do dia. Tal modelação social pode ser sutil ou escancarada, ou seja, uma pessoa pode escutar outra falando com palavras sofisticadas e se identificar com isso, e logo ela passa a utilizar as mesmas palavras que escutou do modelo. Essa imitação pode ser tão sutil ao ponto das outras pessoas nem notarem a diferença, ou ela pode utilizar esse novo vocabulário de forma “gritante”, ao passo que as pessoas que a rodeiam logo notarão a diferença. 19 Quando um indivíduo se expõe às influências modeladoras podem ocorrer três processos diferentes, que são determinados por um conjunto de variáveis: aprendizagem observacional, efeitos de modelação inibitórios e desinibitórios e efeitos facilitadores de respostas. A aprendizagem observacional acontece quando o observador adquire novos comportamentos que antes não existiam em seu repertório comportamental. E isso ocorre quando o modelo mostra respostas novas e desconhecidas para o observador, a fim de que este aprenda e passe a reproduzir de forma igual. O observador pode imitar o comportamento do modelo que nunca havia feito antes apenas assistindo-o. Por exemplo, uma garotinha pode observar a mãe mexendo uma panela, e, assim, ela pega um objeto e começa a imitar o comportamento desta. Isto não garante que a garota irá se aperfeiçoar em culinária, mas a observação permite que aprendamos uma infinidade de novas atividades. E ainda, se o nível de desenvolvimento do observador estiver próximo ao do comportamento do modelo, ele será capaz de imitar e aprender pela observação sem ficar muito tempo praticando. Segundo Baldwin e Baldwin (1998), os efeitos do processo de modelação que inibem ou desinibem respostas no observador variam conforme a reposta obtida pelo modelo, podendo ser positiva ou negativa. Assim, se um observador presencia um modelo executando uma ação que trouxe para ele respostas positivas, tanto o observador, quanto o modelo irão repetir esse comportamento, visto que este efeito é considerado desinibitório, pois é reforçador. Mas, se o observador notar que certo comportamento executado pelo modelo lhe causou conseqüências negativas, ele passará a não imitar o modelo, sendo que isto é considerada uma resposta inibitória, pois inibiu a resposta do observador perante o comportamento do modelo. Exemplificando esse efeito, podemos citar uma garota que acaba de entrar em uma escola nova e percebe que a maioria das garotas usa roupas cor de rosa; conseqüentemente, ela passa a utilizar roupas rosa para garantir sua aceitação no meio escolar, ou seja, este efeito foi reforçador para ela. Porém, se ela era dedicada ao estudo de matemática no antigo colégio, e percebe que suas novas amigas detestam quem se destaca nesta disciplina, poderá passar a depreciar a matemática para ser aceita no grupo, visto que este efeito inibiu um comportamento da observadora. Um último efeito que a modelação proporciona ocorre quando um comportamento de um modelo serve como facilitador e induz um observador a realizar o mesmo. Mas estes efeitos facilitadores, assim como os inibidores ou desinibidores (citados acima), não 20 envolvem novos aprendizados para os observadores, sendo que os efeitos facilitadores são momentâneos, ou seja, servem apenas como um estímulo para que um observador realize o mesmo comportamento do modelo, mas não influenciam no aumento ou diminuição da execução da mesma ação futuramente. Por exemplo, se uma pessoa está andando na rua e observa que as pessoas estão se abaixando para evitarem balas perdidas, ela provavelmente se abaixará também. Neste ato, ela não obteve nenhum aprendizado novo, mas foi induzida a realizar um comportamento. No estudo do comportamento, muitos autores estudaram a teoria da aprendizagem, mas três se destacaram por a abordarem de forma diferente, mas que acabam se complementando. Skinner afirmava que apenas os fatores do meio (externos) influenciavam o comportamento; Freud explicava que o comportamento era resultado do “id”, e Bandura afirmava que era a interação do meio externo com os aspectos pessoais do indivíduo, juntamente como o seu comportamento, que permitiam um estudo sobre a aprendizagem social. Da mesma forma que houve controvérsias sobre a teoria da aprendizagem, ocorreram discussões sobre o processo de modelação, que antes foi considerado inato nas pessoas, mas posteriormente, psicólogos como Humphrey (1921), Allport (1924) e Holt (1931) fundamentaram seus estudos na teoria associativa, a qual afirmava que, se um adulto imitasse a resposta de uma criança, ela tenderia a repetir o comportamento do adulto, e à medida que este ciclo associativo perdurasse, o comportamento do adulto se tornaria um estímulo eficaz crescente para as respostas das crianças, sendo que, se neste meio tempo o adulto introduzisse algo novo para a criança, esta o imitaria. Mas, com o advento de novas idéias, esta teoria da associação foi substituída pela teoria do reforçamento, tendo Skinner como autor principal desta. Assim, por esta teoria, para ocorrer a aprendizagem por modelação seria necessário um indivíduo motivado pelos reforços positivos que recebeu por imitar as respostas corretas de um modelo. Entretanto, esta teoria não considera quando um indivíduo imita o comportamento do outro sem receber um incentivo, realizando-o apenas pelo fato de querer ser como o modelo. Segundo Bandura (1980), as principais discussões entre as teorias vicariantes estão sobre a questão de saber quais são as condições necessárias e suficientes para adquirir novas respostas em observações. Sendo que, naturalmente, pessoas aprendem por imitação de modelos sem receber nenhuma recompensa (reforço). E isto pode ocorre porque as pessoas, na medida em que se interessam pelo comportamento de outrem, acabam por imitá-lo. Ou 21 seja, as pessoas possuem uma reprodução seletiva, que é regulada pelo valor utilitário que elas colocam sobre a imitação. Visto que este valor varia conforme os interesses do sujeito, cultura e meio a que pertence, enfim, por diversos fatores que não são considerados nos testes em laboratórios realizados por estudiosos e pesquisadores sobre a teoria da aprendizagem. Os fatores que influenciam os processos vicariantes podem ser emocionais, ou seja, aqueles estímulos condicionados que são despertados no observador pelas emoções do modelo; por exemplo, quando vemos uma criança muito feliz ao ganhar um presente, nós somos estimulados pelo seu comportamento e passamos a desempenhar uma reação parecida com a criança, no caso somos levados a sorrir e sentir prazer neste momento. Assim como, quando vemos modelos muito tristes, recebemos estímulos condicionados que nos levam a ter respostas emocionais que demonstram tristeza e angústia. Estes estímulos condicionados podem servir como recompensas ou punições, que podem facilitar ou impedir respostas nos observadores, visto que estas são muito importantes para o aprendizado observacional de comportamentos. Assim, consideramos uma recompensa para a aprendizagem vicariante, quando, por exemplo, uma garota possui uma amiga que gosta de dançar balé, e o modo como esta se expressa proporciona respostas emocionais para a garota, fazendo-a se interessar pela dança. Dessa forma, se em um momento a amiga sorri para ela quando está fazendo um movimento próprio do balé, isso se torna uma recompensa para esta, facilitando a aprendizagem social. Já a punição acontece quando, por exemplo, uma pessoa está envolvida com algum jogo, e, de repente, aparece neste uma cena agressiva a qual mostra uma mulher sendo assassinada. Se esta cena lhe proporcionar resposta emocional condicionada de tristeza, estes se tornarão punições, que irão desestimular a pessoa a jogar. O processo de aprendizagem observacional é influenciado por muitas variáveis que determinam a seleção das respostas pelo observador. Assim, enquanto um indivíduo está mudando seu comportamento por meio do aprendizado observacional, dois fatores interferem nesta aprendizagem: a aquisição da resposta e o desempenho desta. Sendo que o primeiro é o pré-requisito para que ocorra o segundo, e ao considerar esta lógica, deve-se ponderar que uma pessoa pode adquirir um comportamento em um momento, mas passa a executá-lo semanas depois, ou até mesmo pode nunca tê-lo desempenhado. (BANDURA, 1980). Para comprovar esta separação entre aquisição e desempenho, Bandura (1965) realizou um experimento no qual colocava três crianças diante de um modelo filmado contendo cenas agressivas (verbais e físicas) novas para as crianças. No primeiro momento, o modelo foi severamente punido por exibir comportamento agressivo, no segundo, o modelo foi 22 recompensado com guloseimas, e no terceiro, não recebeu nenhuma resposta por seu comportamento. O resultado deste experimento foi diferente quanto aos graus de comportamento. Dessa forma, as crianças que viram o segundo e terceiro modelo apresentaram maior grau imitativo que no primeiro caso (punição). E isso pode ser explicado pela recompensa que foi dada ao modelo por agir de forma agressiva, visto que recompensas positivas dadas por um comportamento fazem com que este ganhe um valor prático; ou seja, o comportamento do modelo garante satisfação e é digno socialmente, pois recebeu uma recompensa positiva pela ação. Logo estes facilitam a aprendizagem observacional. Outro ponto a se discutir neste estudo refere-se ao fato dos meninos se comportarem mais agressivamente conforme o modelo, do que as meninas. Esta questão de gênero na aprendizagem observacional é conseqüência da ideologia presente na sociedade e bagagem cultural de cada indivíduo, já que na sociedade em que vivemos, é muito forte e presente, a idéia de que os meninos devem brincar de jogos que envolvem ação e comportamentos agressivos, e as meninas são mais dóceis, brincam de fazer “comidinha” e não se comportam agressivamente. A partir disto, podemos perceber que a aprendizagem social varia conforme a cultura dos sujeitos, pois se uma pessoa tem internalizado a idéia de que se comportar de forma agressiva é algo bom e permite satisfação pessoal, ela prontamente irá se identificar com o comportamento do modelo e passará a imitá-lo. Ainda sobre o experimento, em outro momento, as crianças dos três grupos receberam incentivos após os atos imitados, a fim de garantir que estas desempenhassem o que adquiriram pela observação do modelo. E o resultado constatou que as mudanças antes analisadas desapareceram, pois as crianças se comportaram quase igual, sendo que as diferenças que ocorreram de gênero também foram eliminadas, pela presença do incentivo positivo. Com isso, vemos a diferença na análise da aprendizagem e do desempenho. A primeira diz respeito à forma pela qual variáveis em operação, pela exposição aos estímulos modeladores, resultam no grau de aprendizagem do comportamento modelado. Já o segundo refere-se aos fatores que dirigem a vontade das pessoas para executarem a resposta que aprenderam. Muitos aspectos influenciam para a aquisição de novos comportamentos por meio da observação, como o fato do observador admirar o modelo, pois, se este considera o modelo 23 como uma pessoa de status, maravilhosa e importante socialmente, o observador tenderá a imitar os comportamentos do modelo apenas por considerá-lo possuidor de qualidades respeitosas que estão ligadas a sua figura. Por exemplo, se uma pessoa é fã de determinado cantor, ela receberá recompensas vicariantes só de prestar atenção nos comportamentos dele, pois esta pessoa possui amor e admiração pelo cantor que lhe faz querer ser igual a ele. Outros fatores que facilitam a aprendizagem social estão relacionados ao fato de como o observador se identifica com o modelo ao qual se assemelha. Por exemplo, se uma garota organizada vê dois modelos arrumando uma cama, mas um é organizado e o outro bagunceiro, a garota irá imitar o modelo que se parece com ela. E também, em como o observador tende a imitar o modelo quando estão realizando uma mesma atividade, pois isso faz com que a pessoa que observa imite o comportamento dos modelos que realizam a atividade primeiro. A teoria da aprendizagem por observação envolve vários processos de caráter modelador, como o processo de atenção, retenção, reprodução motora e de estímulos reforçadores. O primeiro é responsável por prender a atenção do observador em alguns aspectos característicos do modelo que despertam seu interesse, de modo a diferenciá-lo de outros modelos. Estes aspectos podem ser qualidades positivas, poder social, status, ser uma celebridade, idade, sexo, entre outras, que facilitam a aprendizagem por serem fatores de identificação dos observadores. Podem ocorrer diferenças nos níveis de aquisição de respostas entre pessoas em uma mesma condição de estimulação modeladora, pelo fato das características prévias dos observadores serem determinantes na aprendizagem observacional. O processo de retenção ocorre sem a presença de um modelo, visto que envolve aspectos cognitivos, pois reterá as informações de forma simbólica, que permitem que o observador adquira certo comportamento em um momento, mas o execute tempos depois, já que estes ficam armazenados em períodos variáveis. No processo de reprodução motora, a aprendizagem por observação envolve movimentos e esta pode ocorrer por meio da observação de comportamentos de um modelo, ou a partir de explicações que ensinam como executar tais respostas. E por fim, alguns fatores servem como motivacionais e de estímulo. Dessa forma, dependendo do incentivo que a pessoa recebe ao imitar o modelo, ela pode ou não transformar a aprendizagem observacional em ação. Assim, se o incentivo for negativo uma pessoa pode 24 não manifestar resultados do que adquiriu nos eventos modelados. Ou se o incentivo for positivo ela rapidamente adquire os resultados manifestos. Com isso, este fator pode se apresentar como um facilitador da atenção e também da retenção seletiva, pois o observador irá selecionar o que considera útil. 1.1. Aprendizagem Social e Mídia Partindo desse estudo sobre a aprendizagem social, podemos fazer uma ponte com relação à mídia, mais especificamente a TV, que usufrui desse tipo de aprendizagem para ditar regras, padrões de vida, comportamentos, moda, enfim, uma infinidade de ideais que “constroem” os sujeitos. Segundo Santos e Jablonski (2003), pela programação televisiva ser assistida por todas as faixas etárias, ela possui forte influência na construção da personalidade infantil, sendo que a mídia de massa reforça o papel das crianças como consumidoras, pelas relações sociais ocorrerem no contexto de produção e consumo capitalista. Assim, a mídia aproveita-se deste papel das crianças como consumidoras para explorarem o universo infantil de forma desmedida, colocando em propagandas e programas destinados ao público infanto-juvenil conteúdos que garantam o consumo e imitação de modelos midiáticos, mesmo que estes não correspondam às faixas etárias a que foram destinadas. Ainda segundo os autores citados acima, pelo estilo de vida contemporâneo, repleto de mudanças e agitações, as pessoas acabam por escolher a TV como principal meio de comunicação para ficarem por dentro das informações, já que podem executar seus afazeres ao mesmo tempo em que se atualizam sobre o mundo. Assim, ela passa a ser o principal instrumento para socializar os indivíduos. Considerando que a televisão faz parte do cotidiano das pessoas, ela se torna uma das principais fontes que difundem não apenas imagens, mas também padrões sociais e modelos comportamentais, que ditam como os indivíduos devem ser, conforme a sociedade estipula. Dessa forma, as pessoas, deslumbradas pelo status e luxo que estes proporcionam aos telespectadores, acabam por almejarem esses ideais de vida, e, assim, passam a imitar e aprender pela observação os modelos de comportamento que a televisão mostra, a fim de serem aceitos socialmente. Porém, a maioria destes modelos expostos na mídia não é benéfica às pessoas, já que abusam da sexualidade, violência e valores sociais nocivos para a educação dos sujeitos, principalmente das crianças, que ficam horas na frente da TV, e, sem um 25 acompanhamento e instrução para lidar com as informações e imagens recebidas, se tornam os principais alvos fáceis das aprendizagens midiáticas, fazendo com que elas desejem ser como seus ídolos, e por tamanha exposição ao conteúdo televisivo, somado ao estágio de desenvolvimento e baixas condições de julgamento ético, acreditam que tudo que é transmitido é verdadeiro, passando a imitá-los ilimitadamente. A mídia proporciona um universo simbólico para as pessoas, sendo que estas são levadas a se espelharem nos comportamentos alheios, pela capacidade de simbolizar todos os aspectos que estão ligados direta ou indiretamente a sua vida, que os levam a compreensão do ambiente que os cerca. Já que é a partir dos símbolos que o homem compreende suas experiências, sendo que essa análise simbólica varia conforme a capacidade cognitiva dos sujeitos. A televisão em si possibilita a transmissão de expressões e sentimentos, que influenciam ainda mais para a aprendizagem observacional, visto que se um modelo midiático demonstra emoções prazerosas ao realizar tal comportamento ou quando obtém certos objetos, o telespectador recebe estímulos vicariantes que proporcionam respostas emocionais parecidas com as do modelo. Estas atuam como facilitadoras da aprendizagem social, e assim, milhares de pessoas passam a imitar o comportamento dos modelos. Dessa forma, a mídia explora esses conceitos ligados à aprendizagem observacional para vender seus produtos e formar identidades, pois relaciona a venda de certo objeto a imagem, repleta de símbolos e valores dos modelos, que são pessoas famosas ou em alta posição de status. Se um indivíduo deseja ser como esta celebridade, logo fará de tudo para ser como tal, e assim, comprará os objetos que ela usa, se vestirá como tal, e ainda, se comportará igualmente ou semelhante ao modelo, a fim de conseguir se adaptar e ser aceito no contexto social em que se encontra. Concluindo, a aprendizagem social é uma das formas mais rápidas dos sujeitos serem ensinados, porém, é necessário que tenhamos o cuidado para não nos tornamos vítimas da mídia, que exagera em seu universo simbólico para obter o que planeja, mesmo que para isso, ela precise abusar de conteúdos agressivos e eróticos, visto que considera que estes são os que mais proporcionam emoções vicariantes, que levam os telespectadores a não saírem de frente da TV e consumirem os produtos expostos. A mídia é um importante meio comunicativo que influencia o comportamento das pessoas, pois ela expõe modelos que despertam desejos nos sujeitos de serem como eles, pois 26 a sua imagem está ligada a ganhos sociais e conseqüências positivas para a pessoa que facilitam a imitação do comportamento. Assim, milhares de pessoas são levadas a se comportarem como a mídia “manda”, pois ela trabalha com os processos que governam a aprendizagem observacional, como o processo de atenção, uma vez que ela proporciona aos indivíduos a exposição de modelos e imagens de seus interesses funcionais e afetivos, conforme suas necessidades. Logo, é importante que sejamos seletivos aos modelos que iremos observar e aprender, pois nem todos possibilitam ganhos sociais, e alguns só nos trazem conseqüências negativas e desvaloração social. Segundo Ferreira e Souza (2008), a programação transmitida em rede nacional não permite uma formação humanizada, influenciando na construção de conceitos, valores, ideais, modos de comportamento e conduta sexual, visto que estas atribuições educativas corresponderiam aos pais e educadores, mas pela extrema exposição à mídia em que estamos sujeitos, estas acabam por serem ensinadas pela televisão. Consequentemente, modelos criados pela mídia se tornam ideais de modos de vida e comportamento de muitos sujeitos, os quais deslumbrados pela posição social que estes são colocados, acabam por imitarem seus comportamentos, sem juízo de valores, ou seja, sem questionarem se o tipo de comportamento que estão colocando como modelo será benéfico para si e para a sociedade. Assim, as crianças e adolescentes, que ainda estão em processo de formação da “personalidade” se tornam os principais alvos dessa aprendizagem observacional desmedida, pois como estão construindo suas identidades, acabam por moldarem seus comportamentos partindo da observação dos modelos que desejam na televisão. Dessa forma, os indivíduos são influenciados por diversos modelos e conteúdos televisivos, e cabe a eles, ao governo por meio de leis, ou aos pais e educadores, trabalharem com estes aspectos, de modo a construírem um senso crítico capaz de filtrar os conteúdos transmitidos na televisão, para que possam distinguir as informações e aprendizagens boas das ruins. Visto que a mídia abusa de conteúdos sexuais, criando modelos sensuais, já que estes garantem altos índices de audiência, por despertarem, mais facilmente, respostas emocionais nas pessoas. Assim, a mídia interfere diretamente na erotização infantil precoce, pois, as crianças observam e imitam seus ídolos, sem saberem que estes possuem comportamentos erotizados, já que não são instruídos por um adulto ou educador, que lhes falem o que é apreciado ou depreciado socialmente. 27 A partir desta relevância quanto à erotização infantil, no próximo capítulo será abordado esta temática, de forma a analisar a aplicação da teoria da aprendizagem social ao entendimento da relação que se estabelece entre mídia e erotização. 28 Capítulo 2 TEORIA, MÍDIA E EROTIZAÇÃO INFANTIL Ao Considerar que a mídia influencia no comportamento das crianças, de modo que estas, interessadas pelos modelos expostos pelos meios de comunicação, aprendem observando e imitando, conforme a teoria da Aprendizagem Social de Bandura (1980) é essencial que entendamos a forma como esta influência interfere no desenvolvimento infantil, especificamente na temática da erotização da infância. Os meios de comunicação de massa, principalmente a televisão, expõem modelos que se comportam conforme padrões estipulados pelo capital, que exageram na agressividade, culto ao corpo, sexualidade, entre tantos outros valores que acabam por selecionar “tipos” padronizados de comportamentos e corpos. E para compreender como as crianças e jovens, sem notarem, são modelados pela mídia, é necessário que nos aprofundemos no estudo da infância, enfatizando sua historicidade e possíveis entendimentos, assim como na influência da mídia para uma possível mudança na concepção de infância e uma erotização precoce desta. O estudo acerca da erotização da infância se torna essencial para uma melhor compreensão do conflito estabelecido pelo conceito moderno, segundo Postman (2005), de inocência infantil, que acredita na pureza e ingenuidade das crianças, e as atuais formas de manifestações e atuações infantis para se inserirem no mundo. É preciso considerar que as possíveis formas da criança buscar e construir identidades varia conforme os contextos históricos, sociais, econômicos, políticos e culturais, na qual elas crescem e se desenvolvem. Assim, são construídas diferentes concepções de infância, pois estas acompanham o tempo e o contexto social, logo, não podemos estipular que toda criança é ingênua e inocente, pois as diversas modificações sociais influenciam nas atuações e pensamentos infantis. Logo, se a mídia se torna, na atualidade, um instrumento de forte poder sobre a educação das crianças e adolescentes, e principalmente a televisão que não se importa com a carga de conteúdos inapropriados para crianças em seus programas e propagandas, muitas crianças acabam por formar suas personalidades, baseando-se nestas informações. Sendo que, segundo Ferreira e Souza (2008) a programação que se veicula nas principais emissoras de TV não contribui para uma formação humanizadora, fazendo com que o público infantil seja influenciado em seus comportamentos, linguagem, visões de certo e errado por meio das informações adquiridas na televisão. 29 Os autores ainda complementam que “As emissoras não estão atentas à qualidade, prioritariamente, estão interessadas na quantidade de informações transmitidas, esteja quem estiver assistindo.” (FERREIRA e SOUZA, 2008, p. 3) Este capítulo tem como objetivo entender a maneira como a mídia influencia os comportamentos das crianças, as quais sem um acompanhamento de um adulto ou educador, acabam muitas vezes vítimas dos modelos midiáticos, pois aprendem certos modos de ser e pensar dos seus ídolos observando-os e imitando-os, sem consciência dos valores impregnados em tais comportamentos. Assim, iremos analisar a construção do conceito de infância na sociedade, relacionando-o com a mídia e principalmente a TV, a fim de buscar relações que demonstrem a forma como este meio comunicativo influencia na vivência precoce da sexualidade das crianças, uma vez que delimita conteúdos próprios para cada fase do desenvolvimento, de acordo com seus interesses, e ainda abusa de conteúdo erótico em programas, novelas e comerciais destinados às crianças. 2.1 Conceito de Infância Considerando que a concepção de infância varia conforme a cultura e a época, é essencial estudarmos a sua história, a fim de analisarmos a noção predominante acerca deste período da vida em diferentes contextos. A partir disto, estabeleceremos relações com a mídia e a erotização precoce da infância. O conceito de infância sofreu muitas alterações ao longo da história. Os estudos de Phillippe Ariès contribuíram para o entendimento dessas alterações. Ariès (1981) descreve que a noção de infância é conseqüência de processos sociais, históricos e políticos no ocidente, e não por motivos puramente fisiológicos ou naturalistas, que afirmavam que os indivíduos já nasciam gostando e amando as crianças. Neste mesmo ideal de amor às crianças, Badinter (1986) questiona o amor materno, quanto a sua naturalidade, já que temos internalizado esse ideal em nossa cultura desde o século XIX. Dessa forma, a autora afirma que nem sempre essa relação maternal foi assim, visto que esta era muito mais biológica do que afetiva nos séculos XVII e XVIII, uma vez que as mães deixavam seus filhos, no momento em que nasciam, com as amas de leite (mulheres que amamentavam e cuidavam dos filhos de outras mulheres, as quais, por estética e status 30 social, não queriam realizar esta função) até que as crianças completassem cinco anos de idade. Segundo a mesma autora, o amor materno é algo construído socialmente, pois depende do afeto, da proximidade física e emocional, sendo conquistado com a convivência. Ele varia conforme os costumes e a época, e por ser um sentimento humano, ele é frágil, imperfeito, podendo existir ou não, variando de acordo com condições que mãe e filho se encontram. Portanto, não pode ser considerado inato. Esta consideração é importante para o estudo da infância, pois acrescenta em seu processo histórico, dados que indicam que o amor pela criança e infância não foi algo que sempre existiu, ou seja, provavelmente não é natural do ser humano. Assim, a partir destas constatações, podemos entender que o conceito da infância foi construído e alterado ao longo dos séculos, uma vez que descobrindo que este amor não é inato, consequentemente o estudo da infância também não pode ser considerado presente em todas as épocas, já que existiu momentos em que esta fase do desenvolvimento não era importante para a sociedade. A infância não era diferenciada da fase adulta, não possuindo estudos específicos sobre ela, as quais destacassem sua importância e necessidades especiais. Ariès (1981) inicia seu estudo sobre o conceito de infância, escrevendo que seu processo de construção iniciou-se no século XVI, quando o conceito de idade se torna objeto de atenção especial para a civilização, uma vez que “é escrita nos retratos como um sinal suplementar de individualização, de exatidão e de autenticidade.” (ARIÈS, 1981, p. 31). As idades da vida eram muito importantes na Idade Média; dessa forma, tinham-se: infância e puerilidade, juventude e adolescência e velhice e senilidade. Estas também significavam formas de evidenciar a biologia humana. Assim, a partir desses estudos sobre a idade, o autor parte para a análise do conceito de infância nos séculos anteriores. Para ele, na Idade Média, não existiu o sentimento de infância, visto que o autor se refere não a afeição pelas crianças, mas à consciência da particularidade infantil, ou seja, a essência que distingue a criança do adulto. As crianças foram, por muito tempo, tratadas como adultos em miniatura, sendo que isto era evidenciado no modo como eram vestidas (elas trajavam as mesmas roupas dos adultos pertencentes a sua classe social), em seus jogos e brincadeiras (xadrez, arco e flecha, cartas, entre outros), nas participações em festas e reuniões, na forma como os adultos se 31 relacionavam com as crianças, como também na maneira que falavam com estas, visto que diziam palavras grosseiras e discutiam assuntos diversos, inclusive sobre sexualidade, uma vez que eles não acreditavam na inocência infantil. Por muitos séculos houve altas taxas de mortalidade infantil e infanticídio, no qual as crianças eram jogadas fora e substituídas por outras “melhores”, com mais saúde, ou mais fortes, por exemplo. Este fato ocorria porque os adultos e pais não se importavam com as crianças, já que não reconheciam as suas almas, a forma como se expressavam, comunicavam e se movimentavam. Elas eram insignificantes e a sociedade não possuía sensibilidade para com elas. (ARIÈS, 1981) Com o passar dos tempos foi aparecendo uma preocupação maior com as crianças, reconhecendo que suas almas eram imortais, e também quanto à saúde, diminuindo a taxa de mortalidade infantil. No fim do século XVI, surge um respeito pelas crianças quando os educadores e moralistas deixam de permitir livros destinados a elas, que possuíssem conteúdos duvidosos, assim, poderiam apenas fornecer às crianças edições expurgadas dos clássicos. No século XVII, aparece a idéia de inocência infantil, e, a partir destas modificações no conceito de infância, o sentimento por esta começa a surgir entre os eclesiásticos e moralistas que se preocupavam com a disciplina e racionalidade dos costumes. Eles não se conformavam com a idéia das crianças servirem apenas como distrações para os adultos, já que as consideravam criaturas frágeis e que necessitavam de cuidados e disciplina. (ARIÈS, 1981) No século XVIII, este sentimento pela infância se concretiza; assim, as famílias passaram a se preocupar com a higiene e saúde dos filhos, e as crianças se tornaram fontes de estudos sobre as particularidades da infância, ocupando um lugar digno na sociedade, que as diferenciavam dos adultos, quanto à psicologia, valores morais, educação, saúde, entre outros estudos. Frota (2007) acrescenta que “A infância e a criança tornam-se objetos de estudos e saberes de diferentes áreas, constituindo-se num campo temático de natureza interdisciplinar. Independente da forma como era olhada, do posicionamento teórico que se tivesse sobre ela, a infância tornou-se visível como um estatuto teórico.” (FROTA, 2007, p. 149) 32 A partir deste conceito moderno sobre a infância, o protótipo da família moderna também foi alterado, uma vez que a criança passa de figura insignificante, para o centro das atenções e dinâmicas familiares. Este novo conceito de infância, que evidencia as crianças quanto a sua inocência, adoração, fragilidade e particularidades, se torna fonte principal de estudos teóricos. Segundo Postman (2005) o período entre 1850 e 1950 representou o ponto alto do conceito moderno e tradicional de infância, uma vez que as crianças foram tiradas das fábricas para ocuparem lugar dentro das escolas, com suas próprias roupas, jogos e mundo social. Assim, um conjunto significativo de leis e normas visando o bem social e proteção da criança foram criadas, destacando as diferenças destas perante os adultos. Nesse período, os pais passaram a ter um alto grau de empatia pelos filhos, além de se responsabilizarem por estes. Este ideal de infância se propagou tanto que, “ (...) na virada do século a infância chegara a ser considerada como direito inato de cada pessoa, um ideal que transcendia a classe social e econômica. Inevitavelmente, a infância veio a ser definida como uma categoria biológica, não um produto da cultura.” (POSTMAN, 2005, p. 81) Este apanhado histórico acerca da infância é importante para notarmos como o conceito de infância se modificou ao longo dos tempos, não podendo ser classificado como presente em todas as épocas históricas. Já que muitas pessoas acreditam que a infância sempre foi importante na sociedade, com suas especificidades e cuidados especiais, como se fosse algo fisiológico do ser humano, como se estivéssemos “programados” para amar as crianças. Dessa forma Badinter (1986) discorda do “amor materno” que muitos acreditavam. Logo, cada contexto cultural pode construir uma concepção particular de criança, visto que as maneiras de se relacionar com ela, e a própria função desta na sociedade, resultam de um complicado jogo de valores e regras predominantes nesta sociedade. 2.2 Novo conceito de infância e transformações da Modernidade Em meio às transformações ocorridas na Modernidade, a sociedade enfrentou mudanças de cunho social, político, econômico e cultural, sendo que estas foram refletidas no modo como os sujeitos e a sociedade passaram a se organizar. 33 Dessa forma, também ocorreram mudanças na educação das crianças, na forma como se desempenhavam em seu mundo social, nas dinâmicas familiares, funções dos pais e educadores, enfim, na própria maneira de “vermos” a infância, e como as crianças passaram a se desenvolver na sociedade. Postman (2005) acredita que após a criação do telégrafo elétrico ocorreu uma grande transformação no meio social que influenciou na criação das crianças e consequentemente no conceito de infância. Segundo o autor, o telégrafo quebrou com o vínculo entre transporte e comunicação, já que, pela primeira vez, a velocidade da mensagem ultrapassava a do corpo humano, gerando um mundo de simultaneidade e instantaneidade. O telégrafo transformou uma informação pessoal em mercadoria de valor mundial, criando a “indústria da notícia”. Esta perda de controle das notícias influenciou diretamente a infância, já que este meio de comunicação expandiu o tipo de informações que as crianças recebiam (que antes se concentravam em conteúdos escolares ou assuntos familiares). E com o telégrafo as informações extravasaram para todos os lados, sem especificar quantidade, qualidade e público alvo, possibilitando assim que crianças entrassem em contato com os mais variados conteúdos, incluindo violência e sexo. Segundo Postman (2005), junto com a expansão da comunicação elétrica se desenvolveu o “mundo gráfico” e simbólico como os desenhos, cartazes, figuras e estampas. E como estes passaram a caminhar juntos, ocorreu uma grande revolução no meio comunicacional, já que a imagem mudou a forma da informação, transformando-se de racionalista para ser emotiva, de discursiva a não-discursiva e de proposicional a apresentacional. Uma vez que as imagens exigiam respostas emotivas dos observadores, e não certificação de hipóteses e veracidade como exigiam da linguagem e da palavra impressa. Este mesmo autor aponta o paradoxo que se instaurou durante o período de 1850 a 1950, pois ao mesmo tempo em que, especificamente os EUA, se esforçavam para se tornarem letrados, tirando as crianças das fábricas e as colocando nas escolas, ocorria a revolução da comunicação e da imagem que contribuíram para acabar com esse objetivo, já que assistir TV não implica grandes habilidades e esforços mentais como a palavra escrita, que necessita destas para ser compreendida. O paradoxo estava na idéia de que ao mesmo tempo em que os EUA estavam preocupados com a educação das pessoas, este artefato midiático contribuía para que estas não necessitassem de muitos esforços para adquirirem informações, substituindo livros e escritos pelas imagens e televisão. Em 1950 ocorreu um 34 agravamento dessa situação, pois foi nesse ano que a televisão ficou disponível nos lares dos sujeitos, e a partir deste momento que podemos dizer que a linha divisória entre infância e fase adulta começou a ser destruída, uma vez que a TV é um dos fatores que contribui para este processo. A televisão contribui para o desaparecimento do conceito moderno de infância (aquele em que a sociedade, ao mesmo tempo em que protege e enfatiza as crianças, também pode as colocar em situação de risco, ao passo que os avanços tecnológicos e transformações nos diversos setores da sociedade influenciam em sua formação) e um fator crucial foi o fato dela disponibilizar o acesso à informação de forma banalizada, possibilitando que todos recebessem as notícias e as interpretassem como lhes fossem convenientes. Quando as pessoas vêem TV, o que lhes chamam a atenção são as imagens e não as informações orais, uma vez que, “embora a linguagem seja ouvida na televisão e às vezes assuma uma certa importância, é a imagem que domina a consciência do telespectador e comporta os significados cruciais”. (POSTMAN, 2005, p. 92). Logo, os sujeitos apenas vêem TV, sendo que este meio apesar de exigir um entendimento imediato das informações, fato este que é possível por meio das imagens, ver TV não implica em nenhuma habilidade, o que a torna acessível a todos. Assim, as crianças começam a ver televisão muito cedo e toda “programação infantil” é destinada para todos, pois a TV não estipula quem deve assistir tais programações e conteúdos televisivos, as imagens são destinadas a qualquer pessoa, não possuindo diferenças entre crianças e adultos. Dessa forma, este meio de comunicação de massa acaba mesclando a infância com a fase adulta, pois todos sem distinção de idade podem vê-la, e por não precisar de esforço mental para interpretá-la ou assisti-la, as crianças recebem as mesmas informações que os adultos, ocasionando um processo de adultificação da criança, pois permite que esta entre em contato com assuntos, como sexo, sendo abordado a partir de vivências e valores do mundo adulto. 2.3. Influência da mídia no desenvolvimento infantil A partir do advento da TV, a mídia, compreendida como qualquer dispositivo (TV, propagandas, livros, revistas, etc.), mas principalmente a TV, por seus diversos modos de “atingir” o telespectador e universalizar o acesso às informações, mais do que outro dispositivo, influencia no comportamento das crianças. Estas ficam muitas horas expostas a 35 programas diversos, sendo que na maioria das vezes permanecem sozinhas, sem um acompanhante responsável que selecione os conteúdos próprios para a faixa etária. Com isso, elas entram em contato com vários conteúdos, independente se são apropriados ou não para a idade, como sexo e violência, grandes temas explorados pela mídia, e que atualmente estão inseridos em desenhos infantis, propagandas, ou seriados destinados ao público infanto-juvenil. Como exemplo, podemos citar a telenovela “Rebelde” (produzida pela rede televisiva mexicana “Televisa”, mas que foi exibida no Brasil pela emissora de TV “SBT”). Apesar de ser destinada a crianças e adolescentes, a novela apresentava conteúdos impróprios para a idade, pois, em seu enredo, possuía os seguintes elementos: apelos eróticos (no modo como algumas personagens se insinuavam para outros, nos figurinos dos personagens, entre outros); descobertas sexuais, que deveriam ser introduzidas pelos pais e não pela TV; valores como inveja, ambição, traição, os quais, se não forem bem trabalhados com as crianças, estas podem interpretá-los de qualquer forma e se comportarem guiados por estes; entre outros. Enfim, a telenovela obteve tanto sucesso que as crianças acabaram se comportando da mesma maneira que os ídolos, por desejarem ser como eles, uma vez que se identificaram com os personagens, facilitando assim a aprendizagem observacional, e consequentemente, as crianças acabaram realizando ações, falando e se vestindo como tais, e descobrindo informações inapropriadas para a idade. Dessa forma, podemos ver como este veículo de comunicação é capaz de intervir na vida das pessoas e na organização social. Já que, por meio da TV a cultura foi banalizada, pois o que antes era um tabu, algo escondido, após a TV foi escancarado e mostrado ao público (POSTMAN, 2005). A “inocência” das crianças foi perdida, ao passo que a TV mostrava a elas conteúdos que eram apenas do saber do adulto; com isso, ela acabou igualando crianças e adultos, podendo-se comparar ao contexto da Idade Média, em que os adultos falavam sobre sexo com as crianças, pois não distinguiam a infância da fase adulta, além de não possuírem o conceito de inocência infantil. Por tamanha exposição das crianças à TV, Postman (2005) afirma que elas passam a entender sobre os assuntos dos adultos, e, muitas vezes, acreditam mais nas informações adquiridas pela mídia, do que nas fornecidas pelos adultos, e ainda, as crianças entram em contato e recebem respostas a perguntas que nunca elaboraram. 36 Postman aponta que a TV, ao revelar os segredos do sexo, praticamente acabou com o conceito de aberração sexual, desmistificando, até mesmo, o fato dos adultos cobiçarem meninas jovens ou crianças. Assim, a TV mostra meninas de doze e treze anos como objetos eróticos, pois isto se tornou socialmente aceito, deixando de ser um segredo 1 que os homens guardavam para si. A TV, por acabar com os mistérios e expor todos os assuntos sem restrições, interfere diretamente na erotização infantil, pois as crianças estão acostumadas a receberem e verem conteúdos sexuais pela mídia. A partir disto, elas notam que apresentar comportamentos eróticos é aceito na sociedade, uma vez que elas não vêem os modelos serem punidos, pelo contrário, são gratificados e aplaudidos pela mídia. Logo, as crianças acabam imitando, pela aprendizagem observacional, e consequentemente, contribuindo para a banalização pela sociedade da erotização infantil. Este tema (erotização infantil) já se tornou tão comum na sociedade, por conta da mídia, que muitos pais e adultos acham “bonitinho” seus filhos rebolando como um artista famoso, falando sobre assuntos de adultos, ou querendo se vestir e se portar de forma erótica para atrair o sexo oposto. Esses tipos de comportamentos são tão usuais na mídia que as crianças imitam e gostam, pois não sabem o que estão fazendo, pelo fato de a TV não restringir conteúdos. Com isso, gradativamente as crianças vão perdendo a sua infância, já que as particularidades desta fase vão se descaracterizando e mesclando-se com a fase adulta. Conforme Postman (2005), a TV transmite informações e conhecimentos que são destituídos de continuidade histórica ou de um contexto histórico. Assim, estes são passados em uma sucessão rápida e fragmentada, fazendo com que as informações fiquem “jogadas‟‟, pois estão descontextualizadas. Já que este meio de comunicação enfatiza o presente, instantâneo, assim, inadvertidamente muitos pais não percebem o controle sutil que a mídia exerce sobre o comportamento de seus filhos, de forma que acabam aceitando que as crianças desejem a satisfação momentânea, como também a indiferença destas perante as conseqüências de seus atos, visto que isto se tornou tão comum na mídia que os adultos consideram normal tais atitudes. 1 Este conceito sobre os “segredos” entre a infância e a fase adulta será mais bem discutido no capítulo quatro desta monografia. 37 A mídia, além de expor modelos a serem seguidos por seus telespectadores, induz as crianças a se tornarem consumistas, pois as imagens dos comerciais despertam desejos imediatos (que precisam ser satisfeitos) no público. Com isso, as crianças querem ter os produtos para se tornarem parecidos com os seus ídolos, para terem a satisfação imediata, sem perceberem os valores que estão ocultos nas ações e desejos, e em como a mídia modela seus comportamentos, gostos e subjetividades. 2.4 Mídia e erotização da infância Um dos problemas decorrentes da influência que a mídia desencadeia no público infanto-juvenil está no fato de que, “Mesmo que os pais desejem dialogar sobre sexo com seus filhos antes que estes atinjam a maturidade sexual, antes mesmo que surjam as conversas sobre sexo entre colegas, forma predominante de acesso a informações entre pré-adolescentes, a mídia a que todos estamos expostos já fez seu papel na transmissão da informação sexual recheada de clichês, estereótipos e preconceitos.” (SANTOS e JABLONSKI, 2003, p. 39) Dessa forma, milhares de crianças e adolescentes se informam sobre sexualidade, porém de uma maneira errônea, já que a mídia, principalmente a TV, expõe e discute sobre este tema com crenças e idéias prontas que se baseiam em valores que julgam a beleza, corpo físico magro e forte, sedução, sensualismo, insatisfação com a inexperiência sexual, entre outros que acabam por proporcionar dúvidas e questões sobre a própria sexualidade e atratividade física das crianças. Por este tema ser novo na infância, as crianças o compreendem como a mídia mostra, de forma que iniciam sua vida sexual precocemente, sem ao menos terem conhecimento sobre relações amorosas, sexo, valores morais, entre outras considerações que deveriam auxiliar as crianças antes da primeira relação sexual. Com isso, muitas delas passam por desilusões e traumas que interferirão na vida adulta, ocasionando diversas falhas de personalidade ou problemas psicossociais. Além de estimular a erotização precoce nestas, despertando desejos sexuais e apontando visões sobre sexualidade recheadas de clichês, estereótipos e preconceitos, os quais, segundo Santos e Jablonski (2003), influenciam os jovens, com pouca ou nenhuma experiência sexual, na forma como constroem suas estruturas de idéias, crenças e atitudes sobre sexo. Como exemplo, os autores citados acima, discorrem sobre o fato dos jovens não alcançarem a gratificação sexual imediata mostrada na mídia, na vida real, 38 podendo causar frustrações e malefícios na construção dos próprios valores e comportamentos. Conforme estudos de Santos e Jablonski, as imagens das pessoas que a TV e a mídia transmitem aos telespectadores e consumidores são todas belas, sadias, sensuais, bronzeadas, enfim padronizadas, uma vez que a mídia molda o ideal de ser humano bem sucedido e feliz, estipulando assim modos de vestir, comer, falar, se portar e comportar. Porém, essas imagens fazem com que os indivíduos almejem tais ideais de estilos de vida e estereótipos de corpo, já que eles sempre estão relacionados, nas propagandas e programas televisivos, à felicidade e realização pessoal. Visto que se as pessoas não alcançam tais ideais apontados na mídia, estas acabam insatisfeitas com si próprias. Para os mesmos autores, as visões e imagens de mulher que a mídia retrata estão quase sempre relacionadas com esta sendo objeto sexual dos homens, ou a mulher dependente do marido, como sendo o sexo frágil, entre outras. Assim, muitas crianças formam identidades baseadas nestes valores concebidos às mulheres, fazendo com que se erotizem para chamar a atenção dos homens, que se rebaixem perante estes. Enfim, a mídia “produz” crianças erotizadas, que acreditam que para cumprirem seus papéis como mulheres (mostradas na mídia), precisam se comportar do modo como elas vêem na televisão, ou outros meios. Estas questões referentes ao cumprimento dos papéis, e a própria criação destes, advém de um processo denominado, segundo Duarte Jr (1989), de “tipificação”, que impõe padrões de interações entre os indivíduos, nos fazendo ver o outro conforme as classificações que lhes são dadas. É a partir deste processo que a estrutura social vai se delineando, pois vão se estabelecendo as funções de cada um, permitindo uma relação mais estável para seus membros. Como resultado deste processo de tipificação, as pessoas vão formando hábitos, pois os comportamentos só podem se tornar previsíveis e conhecidos no meio social se houver a criação de uma rotina padronizada decorrente dos padrões de interação humana. Feito isso, é ocasionado o processo de institucionalização ou naturalização, que ocorre por meio da tipificação recíproca entre os indivíduos em interação, já que uma vez estabelecidos os padrões de comportamento e rotina, essa tipificação é percebida de modo objetivo, ou seja, como sendo função própria de certos papéis sociais, que podem ser desempenhados por qualquer pessoa que assumi-los. 39 Dessa forma, na medida em que algumas ações adquirem um padrão, baseado nas tipificações, estas ações podem vir a ser executadas por diversas pessoas da mesma forma, pois estas foram institucionalizadas, se tornando previsíveis a todos. Duarte Jr (1989) ainda afirma, “é como se as instituições tivessem uma realidade própria, cuja existência não mais é percebida como criação humana. Elas adquirem uma objetividade, uma solidez de coisa dada." (DUARTE JR, 1989, p. 42) As instituições possuem uma origem histórica, já que surgiram com uma finalidade específica pelos seus criadores. Mas, na medida em que são passadas de gerações a gerações elas se "cristalizam", ou seja, passam a ser independentes dos indivíduos que as mantêm. Assim, as instituições se tornam mais importantes que os homens, como se possuíssem uma vida própria, ou como se fosse uma criação independente dos homens. Isto ocorre, conforme Duarte Jr, pelo fato dos seres humanos não notarem que a estrutura social se fez assim por causa deles. Pois, para os sujeitos ela sempre se apresentou dessa forma, uma vez que nascemos e ela já estava presente e também, pelo fato de acreditarmos que ela provavelmente irá permanecer contínua após a nossa morte. Este fenômeno é chamado, pelo autor citado acima, de "reificação", visto que a realidade socialmente construída é sempre reificada, ou seja, transformada em coisa, adquirindo um estatuto de natural. Logo, a institucionalização pela qual se edifica a realidade possui um controle social, já que como os seres humanos acreditam que elas são naturais, não procuram alterá-las, mas apenas se adaptam a estas, caso contrário acreditam estarem caminhando contra o estado natural da estrutura social. Assim, essa possível realidade objetiva acaba por condicionar a consciência dos homens em seu processo de socialização. Enfim, estes processos descritos acima são importantes para o entendimento do modo como os papéis sociais são estabelecidos e aceitos como naturais pela sociedade, pois cada um deles prescreve modos específicos de nos comportarmos perante os outros, retirando-nos a possibilidade de realizarmos nossos desejos individuais. A partir disto, podemos estudar o fato da "reificação" no fenômeno de exploração do prazer e corpo feminino pela mídia, já que este, de tanto ser usufruído pelos meios de comunicação, acabou se tornando naturalizado socialmente, de forma que os indivíduos passaram a aceitar tais classificações dadas à imagem da mulher, como se o papel dela fosse realmente ligado à sensualidade destinada aos homens, ou como se fosse dependente destes. Assim, a mulher e a própria sociedade aceitam 40 esta visão exibida pela mídia, pois uma vez que ela sofreu o processo de reificação, se tornou uma criação independente dos seres humanos. A fim de exemplificar tais afirmações, Santos e Jablonski (2003) discorrem sobre a forma como a mídia explora a imagem da mulher, e impõe ideais de feminilidade, como também constrói a masculinidade, que exige dos homens afirmação e desempenho sexual, fazendo com que meninos, desde cedo, internalizem esses valores e busquem a satisfação sexual, despertando seus desejos, tornando-se também uma das causas da erotização precoce na infância. Segundo Ferreira e Souza (2008), os conteúdos inapropriados para as crianças, com os quais elas possuem contato e até se educam, fazem com que elas “pulem” etapas do desenvolvimento, pois despertam um amadurecimento precoce, fazendo com que as crianças ao invés de desejarem, brincar e se vestirem de forma apropriada para a idade, por serem expostas às imagens sexualizadas de homens e mulheres que a mídia constrói, elas passam a se “adultificarem”, ou seja, desejando vestir roupas de adultos que afirmem sua sexualidade, e se comportando como os sujeitos padronizados pela mídia, que apesar de expressarem péssimos valores e comportamentos, na mídia, possuem altas posições de status social. A mídia de massa, além de despertar a erotização precoce das crianças, ainda veicula em seus meios, imagens erotizadas destas, pois usufrui de meninas como sendo objetos sexuais de adultos em propagandas e programas televisivos. A exploração da pornografia infantil pode ser causa dos inúmeros abusos sexuais com crianças, gravidez na infância e adolescência, prostituição infantil, venda de corpos de menores pelos próprios pais, que necessitando de dinheiro prostituem as filhas, como forma de renda financeira, entre tantas outras formas que relacionam infância e sexualidade, de maneira a utilizar a crianças como objeto do sexo reificado, ou seja, tornado como coisa; naturalizado na sociedade, por tamanha exposição da mídia. Conforme Felipe e Guizzo (2003), neste contexto, podemos encontrar um paradoxo em nossa cultura, ao passo que enquanto a mídia produz e divulga imagens erotizadas de crianças, veiculam-se na sociedade discursos e manifestos que são contra qualquer relação sexual entre adultos e crianças. Com isso, podemos questionar até que ponto a sexualidade infantil se torna um problema social, pois apesar de inúmeros discursos que desaprovam a erotização precoce na 41 infância, a mídia continua abusando de imagens que influenciam no comportamento sexual das crianças, por fins lucrativos. Enfim, a mídia se constitui de um meio de comunicação que interfere na formação da personalidade dos sujeitos, e principalmente das crianças. Já que estas, por estarem em tamanha exposição de seus meios, acabam adquirindo conhecimentos através destas, e conseqüentemente se erotizando precocemente. Visto que, as crianças desejam ser como os adultos que a mídia padroniza e coloca como ideal de vida e satisfação pessoal, independente dos valores que estão agregados a estes modelos, pois muito do que as crianças aprendem advém do que elas observam e imitam em seu cotidiano, baseando-se em modelos ou informações que despertam seus interesses, a fim de se transformarem ou chegarem perto de se tornarem e comportarem-se como os modelos criados pela mídia. Enfim, esta abordagem dada à erotização infantil decorrente da mídia é algo que, por mais que ocorram discursos contra a utilização da imagem da criança exposta em propagandas com o fim de seduzir o público adulto, entre outras abordagens que podem ocasionar a precocidade da vivência sexual na infância, dificilmente deixarão de ser veiculadas na mídia, mesmo porque, por tamanha exposição destas imagens na sociedade, muitas pessoas passaram a naturalizarem este fato, não se importando com a erotização infantil. Com isso, torna-se necessário uma conscientização dos pais, educadores e das próprias crianças quanto aos meios de comunicação de massa, com ênfase na TV, e quanto à sexualidade. Pois, conforme Hamann (2002), a criança de hoje, não é mais aquela inocente e vulnerável. Agora ela pode manifestar-se sob uma multiplicidade de faces: a criança que deseja o consumo, aquela que precisa lidar com a ausência parcial (ou total) dos pais, crianças que se deixa educar pela televisão, pelo videogame, e pela mídia, ou aquela que vai à escola para tornar-se adulta. Segundo Bujes (2002, apud FELIPE e GUIZZO, 2003, p. 121), o conceito de infância passou por um longo processo de construção e elaboração, partindo de inúmeras teorias dos diferentes campos do conhecimento. Várias concepções foram se delineando, na área médica, psicológica, jurídica, pedagógica, antropológica e sociológica, da maneira que, atualmente, não podemos classificar o conceito de infância como estável, “natural” e homogêneo. 42 Assim, conforme Felipe e Guizzo, podemos falar que existem inúmeras infâncias em constantes processos de ressignificação e transformação, que variam conforme o tempo, classe social, gênero, cultura em que as crianças estão inseridas. Já que, como Hamman (2002) afirma, existe uma multiplicidade de faces em que a criança se manifesta, logo, podemos dizer que o conceito de infância é plural, ou seja, não existe uma concepção de infância única e imutável, mas existem “infâncias”, que variam conforme os modos de atuações das crianças na sociedade, em diversos contextos. Para Belloni (2007), podemos considerar as crianças como atores sociais que participam da sociedade, pois decorrente das transformações sociais que as crianças acompanham, estas sofrem mudanças, e se tornam alvo de visibilidade, status e direitos destinados a elas. Ao passo que em meio a estas transformações na sociedade, as crianças se tornaram cidadãos plenos, e consumidores reais e potenciais. Assim, evidencia ainda mais as diversas formas de atuação das crianças, e as mudanças que a concepção de infância passa, confirmando a pluralidade do seu conceito. Considerando estas mudanças no cenário infantil, não podemos simplesmente privar as crianças dos conteúdos erotizados transmitidos em determinados programas, já que, segundo Hamann, devemos considerar dois pressupostos: “1. É quase inviável controlar absolutamente todos os conteúdos televisivos a que as crianças têm acesso - mesmo porque, como vimos, cenas de sexo e violência são transmitidas até nos intervalos entre os programas infantis; e 2. Não se deve considerar a criança como um telespectador passivo, subestimando-a enquanto mero receptáculo de informações, e sim trabalhar para que ela desenvolva um senso crítico e possa, ativamente, refletir sobre as mensagens televisivas.” (HAMANN, 2002, p. 69-70) Dessa forma, precisamos levar a educação sobre a mídia para o currículo das escolas do Brasil, já que, conforme Belloni (1991, Apud HAMANN, 2002, p. 70) a TV é um dos meios socializadores mais importantes, por sua onipresença na vida cotidiana de várias pessoas e pela suposta objetividade de suas imagens, estas acabam ganhando credibilidade dos telespectadores, e afirmando sua legitimidade no processo de socialização. Belloni afirma que certamente este processo não seria fácil, já que muitas escolas públicas enfrentam problemas financeiros, e sofrem pela falta de recursos materiais e pedagógicos para ensinar os educadores quanto a esta disciplina. Mas, esse ideal de educação para a mídia seria benéfico para instruir as crianças quanto aos apelos midiáticos, que possuem uma carga de valores morais, visões de mundo, estereótipos, além de explorar o tema sexualidade e violência (temas frequentemente utilizados pela mídia) que necessitam ser 43 discutidos com um educador ou adulto, a fim de educar as crianças, para que estas não se deixem moldar pelas informações recebidas pela mídia, e possam construir suas personalidades refletindo sobre as mensagens televisivas. Assim, no capítulo seguinte iremos expor e exemplificar a erotização infantil mostrada na mídia, especificamente na telenovela mexicana “Rebelde”, que obteve muito sucesso, influenciando o modo de comportamento de muitas crianças e adolescentes. Visto que, ainda possuía conteúdos impróprios para a faixa etária a qual foi proposta, como por exemplo, explorava a sexualidade (tema temido pelos pais, por causar certo constrangimento, advindo da cultural social, mas que precisava ser discutido com as crianças, antes delas se educarem pela televisão, a fim de esclarecer as questões destas e evitar a erotização precoce). 44 Capítulo 3 TELENOVELA REBELDE E APRENDIZAGEM SOCIAL Após compreendermos as teorias que envolvem o meio midiático, principalmente no que se refere à televisão, e o modo como esta pode proporcionar e influenciar o aprendizado de milhares de pessoas, que observando e imitando os “tipos” e modelos apresentados pela mídia acabam por se educar, conforme explica a teoria da aprendizagem social, neste capítulo iremos estudar, tendo como base a telenovela mexicana Rebelde, os aspectos mais relevantes quanto à temática sexualidade e mídia, que pode ser causa de uma erotização precoce na infância. Para tanto, iremos analisar a telenovela, partindo de categorias, que serão agrupadas conforme a recorrência de alguns temas retratados em Rebelde, pois assim, poderemos efetuar um estudo com base em trechos de cenas, falas, letras e músicas, que podem influenciar na vivência precoce da sexualidade na infância, com isso pretendemos realizar um estudo crítico da forma como a mídia, especificamente a televisão, pode influenciar seus receptores, quanto à aquisição de novos comportamentos e aprendizagens. Este estudo terá como respaldo teórico as teorias apresentadas nos dois primeiros capítulos desta monografia. Como o propósito desta monografia é analisar a influência de telenovelas, como Rebelde, no comportamento e precocidade da sexualidade infantil, partindo de um estudo baseado no modelo da aprendizagem social. Este capítulo tem como objetivo analisar os dados extraídos tanto da telenovela, como das letras e músicas da banda RBD (acoplada à telenovela Rebelde), a fim de realizar um estudo que direcione e indique alguns aspectos encontrados na telenovela, que possam contribuir para a aprendizagem de padrões sexuais e afetivos na infância. A telenovela Rebelde foi escolhida para análise neste trabalho porque obteve grande sucesso entre o público infanto-juvenil, de modo que crianças e adolescentes se identificaram tanto com os personagens da trama, que muitos deles moldaram seus comportamentos a partir de observações e imitações de seus ídolos, sem uma consciência crítica dos valores e ideais impregnados em certos comportamentos e atitudes dos artistas. Visto que muitas vezes, as emissoras de TV e produtores de telenovelas, para garantir a audiência, abusam de conteúdos impróprios para a faixa etária à qual é destinado o programa ou novela, fazendo com que crianças entrem em contato com temas desconhecidos ou ainda não discutidos; aprendendo por meio do que é exposto na televisão conceitos sobre sexualidade com visões elaboradas 45 pela mídia, que incorpora valores e crenças repletas de preconceitos e clichês. Como afirmam Santos e Jablonski (2003), acabam por influenciar a criança ou jovem no modo como constrói sua concepção sobre sexo, já que este assunto é novo na infância. Assim, é essencial discutirmos sobre esse assunto, tendo como exemplo a telenovela Rebelde, a fim de construímos um estudo de caso objetivando compreender como uma simples manifestação de uma criança desejar usar uniformes curtos e botas de cano alto, como os personagens favoritos utilizam, pode influenciar no modo como conduzirá seu ideal de sexualidade e ainda ocasionar uma precocidade na erotização infantil. Logo, se compreendermos a maneira como telenovelas interferem nos padrões afetivos e sexuais na infância, poderemos estabelecer formas de auxiliar e orientar os diversos tipos de crianças e infâncias para que se conscientizem e se eduquem sobre a mídia e sobre as informações que ela veicula. A telenovela Rebelde é composta por três temporadas que contam a história dos alunos da Elite Way School. No decorrer dos capítulos, os personagens passam por diversas situações, que os levam a novas descobertas, conflitos amorosos, familiares, criação de laços afetivos, entre outros. Esta monografia analisará a terceira temporada desta telenovela, pois os personagens principais já estão no último ano do colégio e o tema sexualidade e erotização é mais bem explorado nesta temporada, uma vez que o casal principal de Rebelde começa a pensar na primeira relação sexual, e outros personagens também conversam sobre esta temática. Na primeira e segunda temporada, alguns aspectos como sensualidade e “azaração” 2 permeiam a telenovela, mas é na última temporada que estes ficam mais evidentes para o telespectador, pelo fato dos personagens demonstrarem em falas e cenas que esperam ansiosamente as experiências sexuais. Dessa forma, as principais fontes de dados referentes à Rebelde foram os DVDs da última temporada, e também um apanhado das músicas interpretadas pelos integrantes da banda RBD, de forma a categorizar os temas mais freqüentes, que se unem à discussão sobre sexualidade na mídia e a decorrência desta para as crianças. 3.1. Caracterização da telenovela 2 Esta gíria permeia o ambiente jovem e possui significado similar a paquerar. 46 Rebelde é uma telenovela mexicana produzida pela emissora Televisa, exibida no México de 04 de outubro de 2004 até 02 de junho de 2006, dividida em três temporadas. No Brasil foi transmitida pelo Sistema Brasileiro de Televisão - SBT no período de 15 de agosto de 2005 até 29 de dezembro de 2006, totalizado em 440 episódios, sendo transmitida às 18h30min. Sua história é baseada, sem muitas alterações, no enredo de produção argentina Rebelde Way, produzido pela emissora Cris Morena Group. Nesta telenovela os personagens principais formam a banda Erreway, que alcançou muito sucesso nos países em que foi transmitida. A trama se passa em uma escola particular de elite chamada Elite Way School, que abrange filhos de pessoas ricas e famosas, como celebridades, políticos, empresários, etc. Este colégio é como um semi-internato de Ensino Médio, que tem a função de fornecer uma educação exemplar para o futuro promissor dos jovens que freqüentam este local. Esta instituição possui um sistema de regras próprias, que se diferencia das demais escolas; assim, foi estabelecido com o governo que as regras seriam aceitas, se a direção da escola fornecesse bolsas de estudos para pessoas de baixa renda. Porém, poucos bolsistas conseguem se formar, pois são perseguidos por uma sociedade secreta chamada La Logia (“A seita”, em português), que objetiva manter a “pureza” da elite. O que chama a atenção na novela são as vestimentas que os personagens usam, como por exemplo, as meninas, que se vestem com camisetes, gravatas desalinhadas, minissaias e botas de cano alto, sendo que estas roupas são sensuais, atrativas e parecem despertar desejos no sexo oposto. Podemos dizer que os personagens centrais alcançaram sucesso por manifestarem uma suposta rebeldia contra algumas atitudes dos pais e sistema escolar, proporcionando identificação com as crianças e jovens espectadoras que também passam por momentos inconstantes na vida, relacionando a telenovela com a vida real. Em síntese, o enredo da novela é constituído por temas corriqueiros, como relações amorosas, conflitos familiares, corrupções políticas, sexo, gravidez, intrigas, preconceito, entre outros assuntos que nos remetem à vida cotidiana. Estes são explorados na vivência dos adolescentes que desejam expressar sua rebeldia na busca pela identidade. São seis os personagens principais desta novela, os quais, apesar de possuírem personalidades distintas, se unem pelo amor à música, construindo no decorrer da trama o 47 grupo musical chamado RBD composto pelos mesmos atores principais da novela (Anahí, Dulce Maria, Maite, Christian, Alfonso e Christopher). O grupo obteve tanto sucesso na telenovela, que passou a se tornar real, com a realização de shows e gravações de CDs, “arrastando” legiões de fãs por todos os países em que Rebelde foi transmitida. Segundo Budag (2008), esta telenovela foi exibida em mais de 70 países, entre eles: México, Chile, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Estados Unidos, Porto Rico, Peru, Venezuela, Brasil, Espanha, Angola, República Dominicana, Paraguai, Guatemala, Bolívia, Indonésia, Nicarágua, Japão, Romênia, Canadá, Rússia, Índia, Inglaterra e Equador. 3.1.1 Personagens principais O grupo dos personagens principais, conforme mostrado na Figura 1, é composto por Mía Colucci, interpretada pela atriz Anahí Portilla; Roberta Pardo Rey, interpretada por Dulce Maria Espinoza Saviñon; Diego Bustamante, interpretado por Christopher Alexander Luis Casillas von Uckermann; Miguel Arango, interpretado por Alfonso Herrera Rodriguez; Lupita Fernández, interpretada por Maite Perroni Beoriegui e Giovanni Méndez López, interpretado por Christian Chávez Garza. Figura 1. Personagens centrais de Rebelde e integrantes da banda RBD. Da esquerda para a direita temos: Diego Bustamante, Roberta, Giovanni, Mía Colucci, Lupita e Miguel Arango. Os perfis destes personagens se configuram da seguinte maneira: Mia é uma garota rica de 17 anos, com fama de “patricinha” 3, cheia de caprichos, gosta de ser o centro das atenções no colégio. Sofre pela ausência do pai Franco Colucci, que sempre está viajando e não pode acompanhar o crescimento e descobertas da filha, assim como sente falta da mãe, 3 Este termo é dado às meninas ricas, mimadas pelos pais, que gostam de fazer compras, e possuem como características principais a futilidade e o consumismo. 48 que supostamente faleceu quando Mía ainda era criança. Ela se apaixona pelo garoto mais improvável do colégio, Miguel, o qual classificava como “caipira”. Roberta tem 17 anos, e pode ser considerada a pessoa mais rebelde da telenovela, pois não mede palavras para discutir com os outros e ainda possui personalidade forte. É filha da cantora famosa e símbolo sexual Alma Rey (interpretada por Ninel Conde), mas não demonstra um bom relacionamento com a mãe, já que sempre estão em conflitos e desentendimentos. Ela odeia “patricinha” e moda, por isso está sempre brigando com Mía. Na trama vai se envolver com Diego de forma turbulenta e inconstante. Diego, por sua vez, é um menino de 17 anos, filho de um político corrupto famoso, o qual não consegue enfrentá-lo, deixando-se levar pelos valores machistas e conservadores do pai, que deseja que o filho tenha uma carreira na vida política e não em uma banda musical. Diego gosta de Roberta, mas ambos não admitem isto, assim, passam a maior parte da novela brigando. Miguel é um garoto de 19 anos, já formado, mas que vai estudar no Elite Way pelo programa de bolsas de estudo, com o fim de vingar o suposto assassino do seu pai (Franco Colucci). Assim, pensando em destruir a vida da filha do Sr. Colucci, acaba se envolvendo com Mía e se apaixonando por esta, ficando, assim, em um conflito pessoal. Lupita é uma menina de 17 anos, que sempre está disposta a ajudar as pessoas. É muito boa e romântica. Na trama possui uma irmã chamada Lola, que possui ciúmes da irmã por considerar que os pais gostam mais dela. Por fim, Giovanni é um menino de 18 anos, muito interesseiro. De origem pobre, o qual se envergonha e esconde de todos, ficou rico após os pais ganharem na loteria. Os personagens centrais de Rebelde são donos de personalidades fortes e marcantes, com características que chamam a atenção dos telespectadores, como a estética das roupas e cabelos ou jeito de falar, fazendo com que muitas crianças e adolescentes se deixem influenciar pelos comportamentos dos ídolos na novela. Assim, “tipos” vão sendo criados pela mídia, que explora cada detalhe da roupa, cabelo, acessório, modo de falar, porta-se e pensar dos personagens em evidência. Já que se esses padrões de comportamentos forem aceitos e desejados pelo público, a mídia pode vender seus produtos, impor valores, e moldar os sujeitos mais facilmente. Conforme a teoria da aprendizagem social de Bandura (1980), as pessoas têm a capacidade de aprender a partir de observações e imitações de modelos que de, alguma forma, despertaram seu interesse, facilitando a aprendizagem para a aquisição de novos comportamentos que antes inexistiam em seu repertório comportamental. Dessa forma, se uma criança está assistindo a telenovela Rebelde e se identificou com a personagem Mía, no 49 modo de falar, vestir-se e se comportar (já que esta, na telenovela, sempre tem êxito em sua vida, e ainda se destaca entre as demais, alcançando um sucesso entre as garotas do colégio), a criança receberá um estímulo reforçador para imitar a ídola, uma vez que ela observa que as respostas do comportamento da personagem são positivas, assim, passa a imitá-la a fim de conquistar a posição de status e de destaque como Mía apresenta ter na telenovela. 3.2. Características atrativas da telenovela Rebelde A partir destas considerações sobre o modo como os telespectadores são influenciados pelos personagens preferidos, uma consideração acerca do conceito sobre melodrama e telenovela são importantes para compreendermos o motivo pelo qual são tão atrativas ao público. Assim, segundo Budag e Baccega (2008) “(...) o melodrama data do século XVIII e constitui a matriz cultural da telenovela: a telenovela apropria-se da base estética e emocional do melodrama.” (BUDAG e BACCEGA, 2008, p. 2). Apesar de algumas mudanças e adaptações feitas nas novelas, a base de formação discursiva e audiovisual advêm do melodrama. Conforme as mesmas autoras, as características peculiares das telenovelas, como a dramaturgia, linguagem e demais elementos que as compõem, de gênero figurativo, conseguem expor conceitos e idéias de forma ágil, facilitando a persuasão do público em geral. A telenovela trabalha com aspectos da realidade, apresentando-a no campo simbólico, assim, pode até mesmo mudar a visão e concepções de muitos indivíduos, tanto de forma escancarada, como discreta. Por exemplo, uma telenovela pode apresentar conteúdos repletos de ideologias, assim, ela pode expor estas nas falas de personagens, ou no modo como é conduzida a telenovela, a fim de divulgar estes conceitos para todos, ou ela pode simplesmente expressá-las de forma sutil, que o receptor nem se dá conta que mudou seu ponto de vista. Assim, podemos entender como Rebelde alcançou tanto sucesso com o público infanto-juvenil, já que suas temáticas principais circundam as vivências, experiências, dúvidas, anseios do público para qual a novela é destinada. Os temas mais recorrentes em cenas, músicas e do enredo são próximos dos telespectadores, por se tratarem de fatos do cotidiano, de suas realidades. Sendo assim, em Rebelde suas temáticas principais são: amor; rebeldia; busca pela identidade; desavenças familiares; amizade; música; sexualidade; drogas; dentre outros aspectos ligados aos jovens. 50 Esta telenovela proporcionou tanta audiência para as emissoras para as quais estava sendo transmitida, que teve a duração de três temporadas, sendo que cada uma destas possuem 06 DVDs, com o tempo de 13 horas para cada temporada. Junto com o sucesso da telenovela, ocorreu a “explosão” musical da banda formada pelos integrantes centrais desta, denominada RBD, que foi muito importante para tamanha repercussão que a novela causou nos lugares em que foi transmitida, sendo que segundo Budag (2008), Rebelde conseguiu interferir com intensidade nas práticas de consumo material e simbólico dos sujeitos, pois concede muito destaque para a música da telenovela, e para o RBD. Basicamente, o enredo da terceira temporada irá percorrer os caminhos e amadurecimentos dos personagens da telenovela, os quais, estando no último ano do Ensino Médio, demonstram seus anseios perante a formatura, separações amorosas, desentendimentos familiares, descobertas pessoais, traições, início das experiências sexuais, e sucesso do grupo musical RBD, que os levam a descobertas sobre o amor, amizade, família, amor pela música e entre eles. Feita esta breve caracterização da telenovela, iniciaremos as categorizações realizadas a partir das cenas e falas coletadas na terceira temporada de Rebelde, e, posteriormente, uma análise crítica sobre os dados, objetivando compreender a forma como a telenovela pode influenciar na erotização precoce da infância, e como a aprendizagem social contribui para a educação de comportamentos e valores colocados pela mídia, representados pela personalidade dos personagens. 3.3. Categorias de análise Damos início a uma análise das cenas, diálogos, letras e músicas da telenovela Rebelde, focada em dois objetivos. O primeiro consiste em selecionar por categorias os valores e temas mais recorrentes em falas e cenas da novela, que estejam relacionados ao tema sexualidade e erotização e, em seguida, iremos analisar estes dados, a fim de identificar os padrões sexuais encontrados na telenovela e que podem influenciar na erotização precoce das crianças. O segundo objetivo é realizar este mesmo procedimento com as letras e músicas tocadas na novela, pertencentes à banda RBD. Para a categorização das cenas e diálogos presentes na telenovela Rebelde foram analisados trinta episódios, totalizando treze horas de vídeo. Em vinte e quatro destes 51 episódios foram encontrados diálogos e cenas que contribuíram para a análise da telenovela como possível fator contribuinte para a aprendizagem precoce de padrões afetivos e sexuais na infância. As categorias foram estipuladas a partir da análise da terceira temporada de Rebelde, de forma a agrupar os temas mais recorrentes nos episódios relacionando com o tema do presente trabalho. Quanto à análise das músicas da banda RBD, foram analisados cinco CDs totalizando 66 músicas. As categorias sobre os diferentes tipos de amor foram construídas após a análise das músicas, de modo a selecionar as temáticas mais recorrentes e que poderiam contribuir para a aprendizagem de padrões sexuais e afetivos na infância. 3.3.1 Cenas e Diálogos presentes na telenovela Rebelde Primeiramente, analisaremos as cenas e diálogos relacionados ao tema desta monografia (sendo que as falas e diálogos, no quadro, são apresentados em itálico e entre aspas, para uma melhor visualização do/a leitor/a.). Estes dados foram retirados dos DVDs 4 da terceira temporada desta telenovela, e assistindo-os podemos criar as seguintes categorias de análise: Relacionamento Amoroso; Traição; Sexualidade; Insinuações Sexuais e Sexo. A partir da elaboração do quadro de análises (ver Quadro 1), podemos refletir sobre os exemplos retirados de cenas e diálogos da telenovela, visando estabelecer de que forma falas e modos de comportamentos dos personagens podem interferir diretamente no comportamento dos sujeitos, já que muitas crianças e jovens querem ser igual aos ídolos, independente se os valores contidos em ações ou modos de falar forem ruins para seus desenvolvimentos. Por exemplo, muitas vezes, as crianças imitam certos comportamentos sem ao menos entendê-los, ou seja, sem saber que tal ato poderia demonstrar um comportamento erotizado. Quadro 1. Categorias extraídas de cenas e diálogos presentes em alguns episódios da terceira temporada da telenovela Rebelde. Categorias A.) Relacionamento Amoroso Exemplos de cenas e diálogos *1. Cena de beijo entre Mía e Miguel. (capítulo 1 – “Orfanato”.) *2. Cena de beijo entre Lola e Diego. (Capítulo 3 – “O 4 REBELDE – terceira temporada da novela. EMI Music, 2007. 3 DVD, (780min), son., color. 52 Flagra”.) *3. Cena de beijo entre Roberta e Diego e cena de carinhos entre Pilar e Tomás. (capítulo 16 – “Na praia”.) *4. Cena de beijo entre Roberta e Diego. (capítulo 24 – “Miguel em coma”.) *5. Cena de Mía e Miguel conversando. Mía: - “Ah! Eu quero que você seja o primeiro e único homem de minha vida. Você quer?” Miguel: “Eu quero muito!” (capítulo 4 – “Trair”.) *6. Cena de Mía e Miguel no quarto, prontos para terem a primeira relação sexual. Mía: - “Bebê, eu te amo. E quero que saiba que estou me entregando a você, porque é a pessoa mais legal do mundo. E que eu mais confio.” (capítulo 10 – “O Problema de Mía”.) B.) Traição *1. Cena em que Isac trai Roberta com uma “suposta” prima, mas que na verdade é namorada dele. (capítulo 2 – “Paloma e Roberta”.) *2. Cena entre Miguel e Sabrina sentados no sofá da casa dela. (Sabrina): - “Se eu fosse sua namorada, eu te daria tudo o que me pedisse”. Neste momento Miguel a beija e ambos deitam no sofá, ele fica passando a mão na perna dela e querendo por a mão embaixo da saia que a personagem estava vestindo. Neste momento fica subtendido que o casal irá ter relações sexuais. (capítulo 3 – “O Flagra”.) C.) Sexualidade *1. Cena de Miguel desabafando e chorando para os amigos. Miguel: - “Eu bebi muito ontem... não sabia o que estava fazendo..aí não me cuidei...” Amigos: - “Que? Como não se cuidou?” Miguel: - “Pois é... lá na hora do bem e bom e nas condições que eu me encontrava...”(alcoolizado) Santos: “Você é burro? Tem que estar sempre com camisinha!” Miguel: - “Ah ta! Tá na moda ficar levando camisinha toda hora, né?!” Miguel: - “Tá, eu não tinha camisinha... e o que vocês queriam que eu tivesse feito? Ah?” Miguel desesperado grita: - “Nossa! E se a Sabrina ficar 53 grávida?!” Santos: - “Vocês são idiotas?! Uma única vez já basta para engravidar uma mulher.” (capítulo 4 – “Trair”.) *2. Cena de Miguel e Mía conversando. Mía: - “Miguel, eu queria ir no médico antes da gente fazer...para ver como que é esse lance de engravidar, sabe?!” Miguel: - “É ele também pode falar sobre as doenças...a AIDS...” Mía: - “Ah! Mas isso você não precisa se preocupar, porque eu nunca tive relação com ninguém... E você teve?” Miguel: - “Tive... Mas foi há muito tempo... eu nem tinha te conhecido.” Mía: - “Mas, você se cuidou?” Miguel: - “Não...” Mía: - “Miguel, você precisa fazer seus exames.” Miguel: - “Mas, eu vou fazer com camisinha...” Mía: - “Mas, a Vick falou que elas rasgam.” (capítulo 4 – “Trair”.) *3. Cena de Mía e Roberta no ginecologista. Elas perguntam sobe os métodos contraceptivos. E o médico fala sobre a AIDS e doenças venéreas. Roberta pergunta se é verdade que quando faz com camisinha não sente nada, e o médico afirma que isso é mentira. (capítulo 4 – “Trair”.) *4. Cena em que o pai de Mía e a mãe de Roberta encontram as filhas saindo do consultório do ginecologista, e este parabeniza os pais pelo fato das filhas serem responsáveis por consultarem um profissional para saberem sobre sexo seguro. Neste momento o pai de Mía desmaia inconformado com a informação. (capítulo 5 – “Mentira”.) *5. Cena de Giovanni e Diego conversando. Diego: - “Não gostei da nova namorada do meu pai!” Giovanni: - “Por quê? Ela é super “peituda” e “boazuda”...” (capítulo 8 – “A Partida”.) *6. Cena de Celina e Max conversando. Celina: - “Eu não posso estar grávida!” Max: - “Não amor, às vezes esse atraso pode ser de outro problema.” (capítulo 24 – “Miguel em coma”.) 54 *7. Cena de Celina, Vick e Pilar aflitas esperando o resultado do exame de gravidez feito por Celina. E o teste aponta positivo, Celina está grávida. Esta fica desesperada com a notícia. (capítulo 25 – “Celina grávida”.) D.) Insinuações sexuais *1. Cena entre Lola (irmã mais nova de Lupita) e Diego, em que a personagem quer ter relações sexuais com ele, mas Diego diz que ela é muito nova para “essas coisas”. Lola (vestindo apenas camisa do uniforme e bota de cano alto preta): - “Diego, me ajuda a tirar as botas?” Diego: - “Não! Coloque sua calça.” Neste momento são interrompidos por Lupita, que expressa espanto e logo manda a irmã se vestir, alegando que iria contar para os pais e para o diretor da escola, caso a irmã negasse a se vestir naquele instante. (capítulo 3 – “O Flagra”.) *2. Cena de Mía conversando com a amiga Vick sobre a primeira relação sexual. Vick: - “Já pensou em que como vai fazer?” Mía: - “Já! Vou me vestir como uma deusa, e vou colocar brilhantinhos no rosto, porque os meninos adoram!! E vou dizer: “Miguel, desculpe por ontem, eu fui uma boba!”(na cena a personagem demonstra que iria se portar sensualmente). (capítulo 3 – “O Flagra”.) *3. Cena em que as alunas estão vestidas de líderes de torcida do time do colégio e ficam rebolando vestidas com trajes bem curtos e sensuais (micro-saia, blusa curta deixando à mostra a barriga e botas de cano alto) de forma a se insinuarem para os meninos que estavam jogando bilhar. Neste mesmo momento, uma garota vai conversar com um destes meninos, e na hora em que a personagem virase de costas para voltar com as amigas, a câmera foca para suas nádegas, e depois aparece os meninos enlouquecidos com a cena. (capítulo 4 – “Trair”.) *4. Cena da mãe de Roberta, Alma Rey, responsável por ensaiar as danças com as líderes de torcida diz: Alma Rey: - “É importante que o mascote dance bem e sensualmente!” (capítulo 5 – “Mentira”.) *5. Cena de conversa entre Diego e Giovanni. Giovanni: - “Eu castiguei aquela lá com um chicote do meu desprezo todo fim de semana. Ela não vai demorar pra voltar e me pedir para voltar.” Diego: - “A Augustinha não é assim...” Neste momento as meninas entram na sala e aparece os 55 meninos olhando por debaixo da saia delas. (capítulo 23 – “Vamos gravar”.) E.) Sexo *1. Cena da personagem Mía contando para a amiga Vick que decidiu se entregar para o namorado Miguel para ter a primeira relação sexual com ele. Vick: - “Não acredito que decidiu!” Mía: - “Nem eu, mas eu já decidi. Ontem não falei para o Miguel porque fiquei nervosa, mas hoje, eu estou decidida, eu vou falar com ele!” Após essa conversa as amigas celebram a decisão. (capítulo 3 – “O Flagra”.) *2. Cena entre Mía e Roberta conversando. Mía: - “Roberta, eu queria fazer uma pergunta sobre coisas que os namorados fazem...” Roberta: - “Ah!Sexo?!” Mía desesperada manda a amiga calar a boca. Mía: - “Eu queria te perguntar porque você já fez, né?!” Roberta (em pensamentos): Se ela soubesse que sou mais virgem do que ela... Mía: - “Quando você fez pela primeira vez, como fez? Você se cuidou?” Roberta: - “Eu não sei explicar...” Mía: - “Que cuidado tomou?” Roberta: - “Você tem que se cuidar!Isso é o mais importante de tudo!...Tem muitos métodos...Ah!Vai a um ginecologista!” (capítulo 4 – “Trair”) *3. Cena de Miguel e Mía conversando com o seu pai sobre sexo. Franco Colucci: - “Pra mim não é fácil falar sobre sexo com vocês. Mas, esses casais terminam, fazem sexo, depois terminam...” Miguel: - “Mas, eu amo a Mía e não vou largá-la.” Mía: - “Eu também.” Franco: - “Ah, mas eu não sei falar de sexo com vocês, mas não vou me intrometer nisso, porque sei que vocês se amam.” (capítulo 5 – “Mentira”.) *4. Cena de Sabrina contando para Sol que transou com Miguel. (capítulo 6 – “A carta”.) *5. Cena de Sabrina conversando com Miguel. Sabrina: - “Miguel! Eu estou desesperada! Estou com 56 um atraso de dez dias!” Miguel: - “Atraso?!” Sabrina (chorando): - “Eu não queria dizer nada pra você... Perdão Miguel, foi minha culpa!” Miguel: - “A culpa não é sua, mas de nós dois...” (capítulo 11 – “Ciúmes”.) *6. Cena de amor de Celina e Max. (capítulo 23 – “Vamos Gravar”) Tendo como base as categorias acima, podemos efetuar as seguintes análises quanto à relação entre as cenas e diálogos e as possíveis influências nos comportamentos afetivos e sexuais dos telespectadores. A.) Relacionamento Amoroso A partir dos exemplos expostos nesta categoria de análise, percebemos que a telenovela é repleta de cenas e diálogos que demonstram relações afetivas e amorosas; como podemos citar as cenas de beijo entre os personagens Mía e Miguel ou Roberta e Diego (Ver cenas 1, 3 e 4 da categoria “A” do Quadro 1), os quais, em grande parte da telenovela estão envolvidos em relações amorosas. Esta temática é muito forte, ou seja, bastante explorada em telenovelas que tem como base estética e emocional o melodrama. As cenas que exibem os casais principais (Mía e Miguel e Roberta e Diego) despertam e “prendem” a atenção do público. Confirma-se que, segundo Budag (2008) uma das temáticas clássicas do melodrama é a busca pela realização amorosa, fato que é familiar aos interesses de muitos indivíduos. Lembrando que a forma como essa busca pela pessoa amada é exibida na telenovela, perpassa situações e aspectos relacionados aos interesses do público alvo desta (jovens e crianças), a fim de proporcionar maiores identificações entre os personagens, trama e os receptores, conseqüentemente maior audiência e popularidade. Assim, em Rebelde aparecem muitas cenas de beijos e carinhos entre os casais, que podem interferir no modo como as crianças e jovens lidam com este sentimento, pois se eles assistem que a personagem Mía, por exemplo, trata o personagem Miguel como se ele fosse um “bebezinho” dela, e na novela mostra que ele gosta de ser tratado assim, é bastante provável que alguns telespectadores, visando alcançar os mesmo objetivos (ou seja, arranjar um namorado e ficar bem com ele), irão se comportar como o modelo de casal preferido em 57 Rebelde, utilizando o mesmo linguajar, a mesma forma de acariciar o companheiro, entre outros comportamentos. Dessa forma, as crianças poderão construir ideais de histórias de amor, e até mesmo “receitas” de como manter um namorado, por exemplo, baseados nos comportamentos expostos pelos personagens. Uma vez que a imitação destes influencia diretamente nos padrões afetivos e sexuais das crianças, a telenovela pode induzi-las a iniciar a vida amorosa mais precocemente, ou levá-las a desejar o primeiro beijo mais desesperadamente, construindo “tipos” de casais, e a forma como estes devem se portar, espelhados na telenovela, e não partindo de experiências próprias que vão acontecendo naturalmente em suas vidas. Enfim, esta temática é importante para o estudo desta monografia pelas possíveis influências que as crianças podem sofrer no modo como constroem conceitos do significado do sentimento amor, das relações amorosas e namoros, já que observando os contextos dos casais da telenovela, as crianças podem se espelhar nos comportamentos destes, visando obter um namoro bem sucedido, como os personagens representam ter. Esta forma de aprendizagem, que ocorre por meio da observação e imitação de modelos, é chamada por Bandura (1980) de aprendizagem social, e, segundo este autor, as pessoas estão sujeitas a se influenciarem pela forma como se comportam estes modelos; sendo que os sujeitos selecionam, conforme interesses, contextos ou culturas, o que desejam aprender das observações e imitações advindas do modelo. Com isso, fica clara a importância de discutirmos com as crianças alguns comportamentos dos personagens da telenovela, pois na maioria das vezes, elas acabam agindo como os ídolos, pelo fato de se identificarem com eles; sem compreenderem os valores que estão exibindo em determinados padrões de comportamentos. B.) Traição entre casal Esta categoria é importante para os objetivos desta monografia, pois a traição é um comportamento que marca não somente a vida afetiva, mas também o caráter e personalidade do indivíduo, e se não trabalhado devidamente com as crianças e jovens, eles podem se basear nos modelos oferecidos pela mídia, que se comportam conforme as imposições midiáticas, independente dos estereótipos e clichês atribuídos em seus comportamentos, podendo, assim, 58 se deixarem influenciar pelos valores e condutas expressados pelos modelos no momento da construção dos conceitos e padrões de comportamentos. Assim, se as crianças observam seus ídolos traindo os parceiros, elas podem desejar imitar seus comportamentos, pois na novela elas viram que por mais que os personagens tenham traído suas namoradas, no final eles ficam juntos. E se este tema é tratado de forma banalizada em um relacionamento amoroso, as crianças sem um acompanhamento de um adulto, que as aconselhe e discuta a temática com elas, poderão desenvolver a noção de que a traição faz parte do relacionamento, é algo comum, esperado e até banal. C.) Sexualidade Esta categoria é muito importante para o entendimento das influências que telenovelas têm na precocidade da sexualidade infantil, pois é um tema que lida diretamente com esta questão. Uma vez que estes não são trabalhados com as crianças e jovens, eles podem aprender muitos conceitos e valores transmitidos pela mídia. Segundo Postman (2005), ela não se preocupa com a “programação infantil”, sendo destinada a qualquer pessoa, pois as imagens não escolhem tipos de telespectadores, e logo, não diferenciam crianças de adultos. Em Rebelde, principalmente na terceira temporada, o tema sexualidade permeia as histórias dos personagens que, mais maduros, desejam iniciar a vida sexual, descobrir sobre sexo, gravidez, doenças sexualmente transmissíveis, entre outros assuntos relacionados à temática. Por se tratar de um tema novo na infância e início da puberdade, precisa ser bem discutido e compreendido pelas crianças, com o auxílio de um adulto ou educador, que possa tirar as dúvidas, explicar conceitos, ensinar que nem tudo que aprendemos na mídia é o correto; enfim, introduzir estes conceitos antes que a mídia o faça, a fim de educá-los para a filtragem crítica dos valores e ideais que os meios de comunicação transmitem, visando uma formação crítica e reflexiva. Assim, nos exemplos de cenas e diálogos presentes na telenovela, encontramos diversos casos que nos remetem à sexualidade, como por exemplo, quando o personagem Miguel está conversando com seus amigos que não usou preservativo na relação sexual com Sabrina (Ver cena 1 da categoria “C” no Quadro 1). Nesta cena, Miguel tenta convencer seus amigos que não tinha como recusar a relação amorosa por falta de preservativos, mesmo sabendo das doenças e gravidez indesejada; porém, quando pensa na possibilidade de Sabrina estar grávida se desespera e chora. A partir da análise desta cena, podemos ver como a novela 59 lida com questões sexuais; logo, é de extrema importância que o assunto sexualidade seja discutido com as crianças, caso contrário, estas podem tirar aprendizados dos comportamentos dos personagens e agirem como tais, podendo até mesmo ocorrer situações inesperadas, como uma gravidez indesejada. Outra cena que nos mostra a exigência de introduzir este assunto para as crianças e jovens é a que exibe a personagem Celina preocupada com o resultado do teste de gravidez e seu desespero quando este aponta positivo (Ver cena 7 da categoria “C” no Quadro 1). Assim, devemos analisar e refletir sobre a educação para a mídia que Belloni (1991, Apud HAMANN, 2002, p. 70) sugere, visando educar e instruir as crianças quanto às cargas de valores morais, ideologias, estereótipos e exploração de temas que geram audiência, como sexo e violência, que a televisão e a mídia exageram em suas programações; se tais temas não forem discutidos em um ambiente educativo, as crianças podem se deixar modeladas pelas informações adquiridas em telenovelas, por exemplo, e também aprender conceitos que nem compreendem (pelo assunto inserido ser novo na fase do desenvolvimento). Porém, elas acabam imitando o comportamento dos ídolos, por verem que estes, por mais que sofram no início em que descobrem uma notícia, como gravidez, no fim da trama acabam com um final feliz, em que todos os amigos e familiares apóiam a personagem adolescente grávida. Com isso, é essencial que tomemos o cuidado para que estas informações recebidas pelos telespectadores não deixem influenciar e guiar seus comportamentos e construções de personalidades na infância. A TV mostra muitos conteúdos impróprios para as crianças (pelo fato das suas imagens serem transmitidas para qualquer indivíduo que possua acesso a um aparelho televisivo); dessa forma, devemos auxiliá-las perante as imagens assistidas e adquiridas através de telenovelas e outros meios midiáticos. D.) Insinuações sexuais A análise desta categoria é fundamental para o estudo da precocidade da erotização infantil, já que insinuações sexuais demonstradas pelos personagens favoritos de crianças e adolescentes, é um grande incentivo para que estes observem e imitem os comportamentos dos personagens da telenovela, visando uma identificação com os ídolos e a sensação aparente de uma aproximação com estes, por estarem se comportando como tais. Assim, devemos estudar estes fatores, que podem estar representados em falas de personagens, que afirmam desejar parecer sexy, ou dançar sensualmente para chamar a 60 atenção do sexo oposto, e até mesmo estilizar um uniforme. Com o objetivo de transparecer sensualidade, na forma como as gravatas são desalinhadas, a camisa amarrada para deixar a barriga à mostra e as botas de cano alto em conjunto com as micro-saias, que seduzem os homens. Enfim, é um conjunto de demonstrações de sensualidade sutis (e algumas vezes explícitas) que interferem nos padrões de comportamentos das crianças, pois estas, sem uma concepção clara do que é sexualidade e sensualidade, acabam imitando o comportamento, modo de falar e pensar dos personagens favoritos, mesmo que estes não representem valores que contribuam para uma formação crítica e reflexiva. As crianças, sem um adulto instruindo e ensinando que alguns valores não devem ser seguidos, terminam por imitarem comportamentos sensualizados que contribuem para a precocidade da erotização infantil. E.) Sexo Esta categoria refere-se às cenas envolvendo sexo exibidas em Rebelde. Após analisar as cenas e diálogos, podemos notar que este tema é bem explorado pelos personagens, pois eles desejam saber como que é a primeira experiência sexual, em algumas cenas os personagens dão a entender que vão ter relações sexuais; enfim, o conteúdo sexual é exibido na telenovela em vários contextos. Com isso, torna-se necessário uma introdução quanto à sexualidade para as crianças e jovens, já que não podemos simplesmente privar as crianças destes assuntos exibidos na mídia, pois segundo Hamman (2002), cenas de sexo e violência são transmitidas até em intervalos de programas infantis, e também, devemos trabalhar com as crianças para que elas desenvolvam um senso crítico capaz de refletir sobre o conteúdo televisivo. Fornecer esses elementos educativos sobre a mídia e relações sexuais, possibilitará às crianças refletir criticamente e selecionar quais aprendizagens elas gostariam de ter, baseando-se nas observações e imitações dos personagens da novela, já que sem uma instrução das crianças, estas poderiam desejar ter relações sexuais apenas para imitar os personagens, sem um entendimento e compreensão do que é sexo e demais assuntos relacionados a este tema. 61 3.3.2 Letras e Músicas Após a análise das cenas e diálogos presentes na telenovela, serão apresentadas categorias construídas a partir de algumas músicas, que muito contribuíram para que Rebelde alcançasse grandes índices de audiência, se tornando uma “febre” mundial entre jovens e adolescentes. A banda que foi criada na novela, denominada RBD, proporcionou tanto sucesso para seus integrantes, que estes ficaram ainda mais reconhecidos e populares em todo o mundo, tanto pela telenovela, quanto pelas músicas e shows que a banda realizava em diversos países. Assim, partindo de um quadro elaborado para denominar as categorias e exemplos destas, poderemos efetuar um estudo crítico acerca de como as letras das músicas podem influenciar nos comportamentos e pensamentos das crianças, a fim de compreendermos as possíveis aprendizagens decorrentes destas e também seus possíveis reflexos em comportamentos afetivos e erotizados. Para a construção deste quadro foram analisados os CDs mais vendidos da banda, que contemplavam a trilha sonora da telenovela. Logo, tiramos exemplos de trechos de músicas dos seguintes discos: Rebelde: Edição em Espanhol Lançamento: 2004, Gravadora: EMI; Rebelde: Edição Brasil Lançamento: 2005, Gravadora: EMI; Nuestro Amor Lançamento: 2005, Gravadora: EMI Nosso Amor - Edição Brasil Lançamento: 2006, Gravadora: EMI; Live in Hollywood Lançamento: 2006, Gravadora: EMI. Os exemplos expostos no quadro são trechos de algumas músicas da banda RBD, que foram traduzidos objetivando facilitar a leitura e compreensão das letras, e posterior análise crítica do conteúdo presente no quadro relacionado à temática “influência da mídia para a erotização precoce na infância”. Quadro 2. Categorias extraídas de trechos das letras de algumas músicas do grupo RBD. Categorias A.) Amor como sofrimento Exemplos de músicas “(...) Eu já não busco cor nem detalhe ou calor E me nego a pensar que ao seu lado eu brilharei E vou, arrumando cicatrizes no coração Que não, segue outra direção.” (trecho da letra da música Cuando El Amor Se Acaba – RBD – tradução em português) 62 “(...) Nas asas desse sentimento Com tristeza vou Mas você não consegue entender O que sua falta me causou.” (Trecho da letra da música Tenerte y Quererte – RBD – tradução em português) “(...)Sua voz já me faz muito mal São mais das quatro Entenda que não quero falar mais Não faz sentido Termina logo que eu vou desligar Eu vou te dizer Te amei como nunca amei ninguém Você brincou comigo, me machucou tanto” (Trecho da letra da música Fuera – RBD – tradução em português) B.) Amor como elemento necessário para a vida “(...)preciso de você pra respirar não há quem possa te querer tanto assim. Um pouco desse amor Para poder viver Um pouco desse amor Pra me fazer feliz Só um pouco desse amor Se não, não vivo!” (Trecho da letra da música Un Poco de Tu Amor – RBD – tradução em português) “(...)E não posso entender e nem quero compreender A razão dessa situação Mas não posso seguir dependente do seu amor Se o amor acabou, a paixão terminou e as Lembranças não fazem bem.” (Trecho da letra da música Cuando El Amor Se Acaba – RBD – tradução em português) “(...)Corro atrás da esperança Porque você não vai voltar Sobrevivo mesmo sem tentar Cheia de nós na garganta E penso em você ao nem pensar Pouco a pouco o coração 63 Vai perdendo a fé, perdendo a voz Salva-me do vazio! Salva-me da solidão! Salva-me desse frio! Vem depressa, vem me salvar!”(Trecho da música Sálvame – RBD – tradução em português) “(...) Te perdi e compreendi Que é difícil viver Sem seu amor,esse amor. ” (Trecho da letra da música Tenerte y Quererte – RBD – tradução em português) “(...)Como curar esta dor profunda Sinto correr por minhas veias, tua respiração Estou tão conectada a você... Que até em meus sonhos te vejo Sem você, eu morro... E este coração que você roubou Quando você se foi Você se foi com os meus beijos Com os meus beijos e meus sonhos” (Trecho da letra da música Este Corazón – RBD – tradução em português) C.) Amor como alegria “(...) Ouvindo uma canção Pra você e pra mim Que fale desse sentimento E que consiga explicar Tudo o que eu penso Porque eu te amo Te dedico esta canção” (Trecho da letra da música Una Cancion – RBD – tradução em português) “(...)Foi tão mágico o jeito que tomou O nosso amor(O nosso amor) O nosso doce amor Foi um lance que bateu dentro da gente O nosso amor Nosso incrível amor incrível amor Tudo foi como num sonho E em nosso amor as coisas não tem tempo” (Trecho da letra da música Nuestro Amor – RBD – tradução em português) “(...)Mas você vive em mim, junto a mim No meu interior, Neste coração confundido Por isso, te peço, por favor... 64 Ensina-me... A querer-te um pouco mais E a sentir contigo, amor que você me dá O frio desaparece Quero te ver já...” (Trecho da letra da música Enséñame – RBD – tradução em português) D.) Amor relacionado ao desejo “(...) O calor do meu corpo que se eleva quase sem controle (Por só te ver) Começa por minhas mãos e termina em meu coração Quando sinto sua falta. (...) E cada vez que te encontrar Você voltará a ser Como o desejo Que arde lentamente com meu fogo Sinto fogo em meu interior Fogo que vem de você E é mais do que pedi.(...)” ( Trecho da letra da música Fuego – RBD – tradução em português) “(...)Quero ter você,te querer Quero estar com você Te amar sem parar Te querer,te ter Não quero viver sem seu amor jamais Te ter,te querer” (Trecho da letra da música Tenerte y Quererte – RBD – tradução em português) “(...) E estou sentindo profundamente Como o fogo não apagou... Continua ardendo... Continua ardendo Enquanto existir o amor O amor não apagou.” (Trecho da letra da música Este Corazón – RBD – tradução em português) As categorias de análise das letras das músicas da banda RBD têm em comum a temática “amor”, já que a maioria delas falam sobre os relacionamentos amorosos, assim, foi preciso subdividir em quatro categorias (A, B, C e D) a fim de realizar um estudo mais 65 aprofundado sobre os diversos tipos de influências que um mesmo tema (amor) pode ocasionar conforme a relação e contexto em que se encontra, por exemplo, o amor relacionado ao sofrimento proporciona outros tipos de análises e resultados nos receptores, que a forma de amar relacionada ao desejo. Assim, analisaremos a temática sob quatro perspectivas, a fim de estabelecer as influências nas imitações e aprendizagem de padrões de comportamentos afetivos e sexuais na infância. A.) Amor como sofrimento O amor que ocasiona a tristeza e o sofrimento está em grande parte das músicas analisadas expostas no Quadro 2, ao passo, que esta categoria se inclui no grupo de análises, pois muitas crianças assistem à novela e escutam sua trilha sonora, de modo que despertam seus sentimentos e se envolvem com a trama, pois as cenas ligadas às músicas do RBD proporcionam emoção aos telespectadores, logo, estes acabam relacionando o conteúdo da música com a novela. Assim, as crianças escutam as músicas e na maioria das vezes pensam em seus personagens favoritos, podendo desejar sentir os mesmos sentimentos dos ídolos, que sofriam por términos de relacionamentos amorosos, traições, ou por não ter a pessoa amada. Dessa forma, as crianças podem manifestar seus anseios amorosos precocemente, apenas para se comportarem como os personagens, uma vez que se identificam com suas características e personalidades, mesmo que alguns atos não sejam benéficos para seus desenvolvimentos. Logo é essencial a conversa e discussão sobre esse assunto, para que as crianças não observem e construam conceitos que, por exemplo, classifiquem que em toda relação amorosa iremos sofrer e sermos traídos. Já que, a aprendizagem social é um dos meios mais comuns dos indivíduos se educarem, e se eles não realizarem uma análise crítica dos conteúdos com que entram em contato na mídia, poderão julgar e formar pensamentos baseados apenas no que a mídia dita em seus diversos meios comunicativos. B.) Amor como elemento necessário para a vida Nos trechos das músicas selecionadas para esta categoria, o amor aparece como algo essencial para a vida, como podemos ver na letra que diz “Só um pouco desse amor, senão não vivo” (Ver trecho da letra da música Un Poco de Tu Amor no Quadro 2). Esta maneira de lidar com o amor é algo que interfere na forma como as crianças e jovens constroem os conceitos relacionados ao amor ou relações amorosas, pois elas passam a relacionar o viver 66 com a pessoa amada, como se não existisse vida com a ausência da pessoa amada. Se as crianças concebem estes conceitos sobre o amor, elas podem se submeter a diversas situações, boas ou ruins, para alcançarem seus objetivos. E até mesmo, podem se sujeitar ou desejar ter relações sexuais precocemente, a fim de manter uma relação amorosa. C.) Amor como alegria Este modo de classificar o amor é o mais prazeroso para os sujeitos, já que a ele nos remete felicidade e prazer de amar, visto que nos trechos selecionados, o indivíduo expressa alegria de viver com o amado, sem pensar em sofrimentos ou outros sentimentos que as relações amorosas podem despertar. No trecho da música Nuestro Amor encontramos os seguintes versos “Tudo foi como num sonho/ E em nosso amor as coisas não tem tempo” (Ver categoria “C” no Quadro 2). Nestes versos, podemos notar a forma como o ato de amar é idealizado, e até comparado a um sonho; assim, uma criança que ainda não passou por essa experiência, poderá tomar como base para construir um relacionamento amoroso com o parceiro (a) as atitudes e comportamentos expressados nas músicas e na telenovela ligada a estas; por meio das observações e imitações, no caso das letras das músicas, das ações e concepções encontradas nos versos destas, mesmo que ainda não tenham vivenciado tais experiências. Este tipo de amor foi analisado, pois pode interferir na construção e aprendizagem de padrões afetivos na infância, uma vez que as crianças entram em contato com cenas e músicas que expressam esse sentimento, e se este não for discutido com as crianças, estas podem formar concepções sobre o amor do modo como ele é retratado na telenovela, cheio de estereótipos e clichês, como o amor entre pessoas magras e bonitas; relacionamento entre pessoas de classes sociais diferentes, entre outros. D.) Amor relacionado ao desejo Esta categoria de análise envolve o amor com o desejo de ter a pessoa amada, mas referindo-se a algo mais físico, por exemplo, na música “Fuego”, que possui os seguintes versos “ E cada vez que te encontrar/ Você voltará a ser/ Como o desejo/ Que arde lentamente com meu fogo” (Ver Quadro 2). Estes trechos deixam claro o desejo que a pessoa tem de ficar perto do (a) amado (a), principalmente na parte que diz que um fogo arde dentro dela; sendo que esse fogo pode ser interpretado como sendo um desejo sexual pela pessoa amada. 67 Com isso, se as crianças relacionarem a letra da música à telenovela, nos momentos em que esta apresenta cenas e diálogos sobre sexo e sexualidade, elas podem tomar como modelo os comportamentos erotizados de alguns personagens para conseguirem ficar com a pessoa de seu interesse, já que, observando os ídolos, as crianças, sem um devido cuidado e consciência crítica dos conteúdos expostos na telenovela, acabam aprendendo modos de comportamento que podem influenciar na vivência precoce da sexualidade infantil. Uma vez que os personagens apresentam comportamentos sensualizados, expressos no modo de falarem, vestirem-se, gesticularem e portarem-se, assim, as crianças entram em contato com diversas formas que demonstram erotismo, e por se identificarem com os personagens da novela, acabam imitando-os e aprendendo, conforme explicita a teoria da aprendizagem social de Bandura. 3.4. Conclusões A partir dos estudos realizados por meio da elaboração dos quadros e análises das cenas e diálogos presentes na terceira temporada de Rebelde, das letras das músicas da banda RBD, em conjunto com as teorias estudadas nos dois primeiros capítulos desta monografia, podemos concluir que os conteúdos expostos na telenovela Rebelde não correspondem a uma carga de valores e conceitos próprios para as crianças. Já que temas como sexualidade, são novos na infância e deveriam ser discutidos e apresentados primeiramente pelos pais, adultos ou educadores; uma vez que requerem discussões e compreensões de muitos valores, que não são abordados quando a mídia expõe esta temática; pois esta agrega aos comportamentos e demais formas de expressar sexualidade, modelos estereotipados, com visões de certo ou errado. Enfim, ela impõe formas de ser e se portar para o público, representados por meio de seus modelos midiáticos. Dessa forma, telenovelas, como Rebelde, podem agregar valores implícitos ou explícitos em comportamentos e formas de falar dos seus personagens, pois se esta proporcionar sucesso em seu público alvo, estes irão seguir os modelos que encontram na novela, uma vez que se identificam com os personagens, devidos ao fato do enredo compor aspectos do cotidiano, anseios e dúvidas que as crianças e jovens possuem diante de certos assuntos, música, figurinos e acessórios que chamam atenção, e inseridos em um ambiente de luxo e atraente, os telespectadores impulsionados pela posição de “status” dos personagens, e por se identificarem pelo modo como estes se comportam perante os conflitos e 68 desenvolvimentos da vida, milhares de crianças e jovens acabam por observarem e imitarem seus ídolos, proporcionando a aprendizagem social, na qual os indivíduos se educam através da observação e posterior imitação de modelos que lhes chamam a atenção por determinado motivo ou estímulo positivo e reforçador, que podem variar conforme os interesses do observador. Assim, se torna necessário que eduquemos as crianças visando uma conscientização crítica dos apelos midiáticos, que abusam de sexualidade e violência, e expõe estes temas de forma errônea repleto de clichês e estereótipos criados pela própria mídia de massa, como forma de divulgar seus ideais e valores pela sociedade, a fim de se tornarem aceitos e desejados pelos sujeitos, buscando manter-se no lugar de poder. Na telenovela estudada, a sensualidade aparece como ponto forte no enredo, uma vez que as meninas do colégio se vestiam de formas sensuais, utilizando minissaias e encurtando as camisas, visando atrair e serem desejadas por todos os garotos do colégio Elite Way School; um exemplo a citar é uma cena em que aparecem os meninos tentando olhar por debaixo da saia das meninas, sendo que estas atuavam como se estivessem gostando de tais atitudes dos garotos. Esta cena demonstra o teor de sexualidade presente na telenovela, e que precisa ser discutido com as crianças telespectadoras, pois por elas não compreenderem manifestações que despertam desejos no sexo oposto, e os valores que estão impregnados nestas atitudes, poderão se comportar da mesma forma, por considerarem legais e corretas, pelo fato dos ídolos se portarem com tais atitudes. Outra cena que se refere ao mesmo assunto é uma em que aparece a professora, que ensina as coreografias para as líderes de torcida do time do colégio, reforçando para as garotas dançarem de forma bem sensual, visando atrair o público masculino. Este comentário, que parecia inofensivo no contexto da telenovela, nos permite analisar o paradoxo em nossa cultura, já que, segundo Felipe e Guizzo (2003), enquanto a sociedade prega discursos que vão contra a qualquer relação sexual entre crianças e adultos, a mídia continua a divulgar e expor imagens de crianças erotizadas, e que objetivam despertar o desejo dos adultos. Temos como fator preocupante em nossa sociedade, o fato da erotização precoce na infância ter se tornado algo naturalizado, ou como Duarte Jr (1989) escreve, este processo se tornou reificado na sociedade, ou seja, a erotização precoce se transformou em coisa dada, adquirindo um estatuto de natural, por tamanha exploração da sexualidade na mídia. Assim, os indivíduos passam a aceitar esta condição, dificultando ainda mais a conscientização da 69 sociedade perante a erotização infantil, de forma a não refletir sobre formas de instruir as crianças (que representam uma multiplicidade de faces e infâncias diferentes, já que elas variam conforme os contextos e atuações das crianças na sociedade) para uma reflexão e estudo dos conteúdos que a mídia expõe, selecionando as informações televisivas e midiáticas que contribuem para uma formação humanizadora, e que contribuam para a construção da personalidade não portadora de pretensões de poder nas relações de gênero. Enfim, no capítulo seguinte iremos estudar as implicações educacionais e sociais que podem ser efetuadas, a fim de discernir este ideal de educar as crianças e jovens para a mídia, buscando elencar ações de educadores neste processo educativo, e visando garantir que a multiplicidade das infâncias não sejam igualadas, mas trabalhadas de forma a destacar seus contextos e significados diversos. Não adianta tentarmos privar as crianças dos conteúdos erotizados presentes na mídia, pois isso é praticamente impossível, porém, devemos buscar formas de conscientizar e educar as crianças para a recepção destes conteúdos em telenovelas e programações televisivas diversas, para que estas não se deixem modelar pelos “tipos” e modelos divulgados na mídia, mas selecionem conteúdos, valores e aprendizagens que desejem tomar como modelo, objetivando uma formação baseada nos próprios valores e ideais. 70 Capítulo 4 EDUCAÇÃO COMO MEIO DE INTERVENÇÃO SOCIAL Os estudos levantados nos capítulos anteriores foram importantes para compreendermos a forma como a mídia, com ênfase na TV, influencia e pode contribuir para a vivência precoce da sexualidade infantil. No presente capítulo refletiremos sobre as implicações educacionais nos âmbitos da família, escola e sociedade em geral a fim de discutirmos como a educação pode interferir no processo de imitação e aprendizagem de conceitos e idéias transmitidas na mídia pelas crianças e jovens, e de que maneira pode contribuir para que possamos trabalhar conceitos como sexualidade e erotização com as crianças de forma a não banalizar a temática e nem ser a favor da erotização, fazendo-as entender os conceitos de forma crítica, para que possam dialogar com as informações recebidas pela mídia, de modo a não se deixarem moldar pelos modelos criados por este meio, e construírem as próprias identidades. Apesar dos dois primeiros capítulos abordarem algumas implicações educacionais, apontando possíveis caminhos de intervenção em escolas ou em conversas com familiares, no presente capítulo iremos explorar esta temática de maneira mais aprofundada, organizando-se em três grandes blocos: implicações educacionais na família; implicações educacionais na escola; implicações educacionais na sociedade. 4.1. Implicações educacionais na família A intervenção educacional com ênfase na família é essencial para que possamos educar as crianças quanto às informações adquiridas tanto no meio social, quanto pela mídia, uma vez que este veículo comunicacional é tão forte e presente na sociedade, que os ideais e concepções transmitidas aos receptores, tanto de forma implícita quanto explícita, são refletidos na própria sociedade; tornando-se segundo Fisher (2002) um produtor, por excelência, de sentidos na sociedade. Conforme a mesma autora, a mídia, e especialmente os materiais televisivos, produzem tipos de linguagem e comunicação. Produz subjetividades, que são expressas por meio de formas de agir, sentir, atribuir valores, entre outras manifestações de modelos criados por ela, que acabam por construir e firmar no interior da sociedade concepções, ideais e perfis estipulados pelos dispositivos midiáticos, que por serem 71 altamente aclamados pela maioria dos receptores, se tornam “tipos” a seguir e imitar, pois representam altas posições de status na sociedade. Dessa forma, é importante que a família obtenha uma educação sobre a mídia, para que, após essa instrução, os pais e familiares possam educar seus filhos/as de maneira consciente e crítica sobre os dispositivos midiáticos. Isso porque, conforme Setton (2002), “(...) a educação no mundo moderno não conta apenas com a participação da escola e da família. Outras instituições, como a mídia, despontam como parceiras de uma ação pedagógica. Para o bem ou para o mal, a cultura de massa está presente em nossas vidas, transmitindo valores e padrões de conduta, socializando muitas gerações.” (SETTON, 2002, p. 109) Portanto, é preciso, antes de tudo, que eduquemos os pais quanto a essa cultura de massa, pois recebemos informações por todos os lados e, se não soubermos lidar e selecionar os conteúdos apropriados, podemos nos deixar levar pelas informações e concepções criadas pela mídia. Conseqüentemente, acabamos por aderir valores e modos de comportamento não adequados para uma formação crítica e reflexiva, tornando-nos produtos da mídia, ou seja, nos moldamos conforme as ideologias ditadas por este meio, que variam de acordo com os interesses de produção de sentido e competitividade, conceitos-chave no meio comunicacional. Outro ponto a se considerar diz respeito à aprendizagem observacional adquirida pelas crianças no meio familiar, já que a maioria delas acreditam que os pais ou familiares são os modelos que devem seguir. A partir disso, vemos como é necessário que os pais selecionem e filtrem as informações adquiridas na mídia, pois se eles se comportam como os modelos simbólicos propostos em programas de TV ou telenovelas, de forma a aderirem os padrões comportamentais dos ídolos e personagens, sem uma consciência crítica dos valores e ideais que estão subtendidos em cada ação, gesto, modo de falar, vestir ou portar-se destes modelos; as crianças podem observar que os pais ou familiares imitam seus ídolos de maneira ilimitada e sem a realização de um juízo de valores. Como resultado, os filhos acabam por imitar tais comportamentos, uma vez que as crianças se identificam com os pais e acreditam que todas as ações e comportamentos deles são adequados e corretos socialmente. Assim, é necessário um cuidado especial para interagir com as crianças, pois elas aprendem facilmente observando e imitando grande parte do que lhes interessa, sendo que os modelos, segundo Bandura (1980), podem ser reais, ou seja, aqueles com os quais o observador tem contato e presencia suas ações, como também podem ser simbólicos, 72 representados pelos modelos que não estão presentes fisicamente com o observador, como os personagens de filmes, novelas, desenhos e outros meios. Com a conscientização dos pais e familiares quanto aos possíveis malefícios que as informações e mecanismos midiáticos podem trazer para a educação, a formação da personalidade, a construção e a apreciação dos comportamentos das crianças e jovens, estes poderão refletir sobre maneiras de educar os filhos visando expor e promover diálogos sobre os conteúdos televisivos. Assim, poderão explicar que nem sempre os valores e ideais explorados pela mídia, contemplados em programas, desenhos, telenovelas e perfis de comportamentos dos personagens destes, são construtivos e benéficos para a formação da personalidade das pessoas. Assim, os pais deveriam discutir assuntos classificados como “segredos” da infância, como a sexualidade, com os/as filhos/as, de modo a introduzir alguns conceitos que a mídia distorce e „recheia‟ de padrões de sexualidade baseados em estereótipos e clichês afetivos e sexuais, tais como: relacionamento amoroso entre o rico e o pobre, relação sexual entre indivíduos ricos, bonitos e populares, entre outros perfis encontrados na mídia. Isto certamente produziria uma educação e construção de um “olhar” reflexivo, capaz de dialogar com as informações recebidas e desmistificar os clichês reforçados e criados pelos meios de comunicação. Ao introduzir este assunto, levantando e refletindo criticamente sobre os modelos e tipos de comportamentos evidenciados nestes meios, os pais poderão educar seus filhos sobre as ideologias e estereótipos encontrados em comportamentos dos ídolos ou personagens favoritos; indicando e possibilitando que a criança pense de forma crítica sobre os modelos, objetivando filtrar as informações e selecionar apenas os conteúdos e informações que contribuam para uma formação crítica e reflexiva das crianças. Para que a educação dos pais e crianças sobre a mídia seja efetivada socialmente, seria necessário uma intervenção no processo escolar das crianças, pois, dessa forma, os pais teriam o apoio da instituição escolar e governo, já que as políticas educacionais elaboradas a favor da implementação curricular em todas as escolas do conteúdo didático e disciplina sobre a mídia possibilitariam aos pais e às crianças uma melhor comunicação e compreensão dos conceitos conversados entre eles. Com a instrução das crianças sobre os conteúdos midiáticos, elas entenderiam com mais clareza o que os pais estavam ensinando, podendo, até mesmo, iniciar o diálogo com os pais e familiares sobre as possíveis influências da mídia em seus comportamentos, facilitando, assim, a formação de suas consciências críticas. 73 4.2. Implicações educacionais na escola As implicações educacionais referentes à escola correspondem àquelas apreendidas na instituição escolar; pautada em currículos, projetos pedagógicos, políticas educacionais, e que dependem dos profissionais da educação, como professores, gestores, educadores, entre outros membros da equipe escolar. Assim, neste tópico focaremos em propostas destinadas tanto aos professores, quanto às próprias instituições escolares, que teriam que elaborar projetos visando uma educação para a mídia, como afirma Belloni (2007). Retomando algumas idéias expostas no capítulo 2 desta monografia, a autora citada acima nos fornece uma grande contribuição para a reflexão das implicações educacionais na escola. Segundo Belloni (2007), as crianças passaram de simples figura, para alvo de estudos e visibilidade social: atualmente, elas são consideradas como consumidoras em potencial e também se constituem de diversas formas, ou seja, se expressam em múltiplas faces, garantindo uma pluralidade infantil. Com isso, não podemos mais defender a idéia de privar os conteúdos sexuais das crianças, pois seria impossível deter e vigiar toda a programação televisiva com a qual as crianças possuem contato. Assim, deveríamos discutir esses assuntos com elas, a fim de proporcionar debates e conversas que desenvolvam sensos críticos, possibilitando a elas refletirem criticamente sobre as mensagens e informações televisivas. Dessa forma, Belloni (1991, Apud HAMANN, 2002) propõe a introdução de disciplinas de educação para a mídia nos currículos das escolas do Brasil, pelo fato da televisão ser um meio socializador bastante usufruído pela população; logo, as escolas não devem atacar e censurar este meio, mas deve trabalhar em conjunto com ele, de maneira a refletir sobre as imagens e informações exibidas nas telas. Segundo Hamann (2002), seria impossível esperar que a mídia cedesse seu poder a favor da educação das crianças, da mesma forma, que é ilusório acreditar que com apenas as famílias conscientizando os filhos, conseguiríamos formar crianças críticas às mensagens televisivas. Assim, seria necessário uma ação em conjunto dos pais e familiares, propondo o diálogo e reflexão com os filhos, com a educação para mídia nos currículos escolares, para que pudéssemos iniciar uma conscientização crítica nas crianças acerca das informações adquiridas pelos meios de comunicação de massa, que favorecem para a erotização precoce da infância. Belloni (2007) afirma que seria necessário que a escola ensinasse para os alunos a história, avaliação, utilização da mídia como artes práticas e técnicas, assim como o lugar que ela ocupa socialmente; as conseqüências da comunicação midiatizada; a construção de 74 percepções e valores que ela impõe; acesso a mídia, entre outros conceitos. Assim, os alunos compreenderiam os mecanismos e formas de atuação dos meios de comunicação; a linguagem que eles utilizam; a forma como constroem sentidos e personalidades, impõem padrões de ser, vestir, falar, comportar; enfim, os alunos poderiam refletir sobre a mídia, de modo a identificar os objetivos implícitos e explícitos em cada ação ou comportamento de certo personagem, artista em evidência, refletindo criticamente sobre informações recebidas e visando não mais se deixarem moldar pelos modelos explorados em telenovelas, filmes, e outros meios. Porém, a mesma autora diz que esse processo não seria fácil, devido à precariedade financeira de muitas escolas públicas, falta de recursos, materiais pedagógicos, além de não possibilitar formação quanto a esta disciplina aos docentes. Mas, ressalta, que ele seria benéfico para instruir os alunos quantos aos apelos midiáticos repletos de conteúdos que exageram de sexualidade, violência, valores imorais e estereótipos, que influenciam para a vivência precoce do comportamento erotizado das crianças; uma vez que estas, sem o auxílio de educadores e adultos conscientes dessa erotização, podem moldar os padrões de comportamentos baseados em informações e modelos propostos em telenovelas que geram identificação com as crianças, levando-as a se portarem da mesma forma, sem ao menos compreenderem o que estão fazendo, e sem saber os valores impregnados em tais ações. Assim, é essencial que se discuta a temática “mídia e suas implicações sociais” com as crianças, para que estas possam filtrar os conteúdos e refletir sobre os assuntos novos para a fase do desenvolvimento, como sexo; de maneira a não se influenciar pelas concepções impostas nas relações afetivas e sexuais exploradas em telenovelas, por exemplo. Dessa forma, para que este conteúdo seja incorporado nos currículos de todas as instituições escolares, de forma a se criar uma disciplina própria sobre educação para a mídia, é de extrema importância que os professores sejam educados e formados para transmitir e discutir com os alunos os conteúdos desta disciplina. Logo, é necessário que os cursos de formação de professores disponibilizem disciplinas que contemplem a discussão e ensino sobre os avanços tecnológicos; intensificação da mídia na sociedade; modos de transmissão e recepção dos conteúdos midiáticos; influência destes nos indivíduos, entre outros estudos necessários para a compreensão do alto poder que estes meios de comunicação exercem sobre a sociedade. 75 Assim, podemos notar como o simples fato de incluir uma disciplina no currículo das escolas desencadeia vários aspectos relacionados à educação, pois, para que esta disciplina seja trabalhada com qualidade para os/as alunos/as, é essencial que haja profissionais capacitados e com uma formação adequada para ensinar as crianças e jovens sobre a mídia. Caso contrário, teríamos uma educação para a mídia que não alcançaria os objetivos propostos pela disciplina, e, assim, não conseguiríamos formar crianças com senso crítico e reflexivo, capazes de identificar os mecanismos midiáticos ruins para a sua formação da personalidade. 4.3. Implicações educacionais na sociedade As implicações educacionais na sociedade englobam tanto aquelas relacionadas à família, quanto as no interior da escola, pois ambas refletem diretamente no social, uma vez que, se houver uma conscientização reflexivo-crítica quanto à influência da mídia nos comportamentos das crianças e na precocidade da sexualidade infantil para a família e os educadores, estaríamos formando sujeitos conscientes dos apelos midiáticos, contribuindo assim para o bem social. Na sociedade moderna a questão da comunicação, tecnologia e mídia é muito forte e presente. Assim, precisamos saber lidar com esses novos mecanismos, a fim de compreendermos e sabermos como agir diante de relações sociais, que se intensificaram com tamanha facilidade comunicacional e interacional, e dos avanços tecnológicos, como a internet e informática, que acabaram por ocasionar mudanças sobre vários setores da sociedade, como o educacional, social, político, econômico e cultural. Estes precisam se adequar ás novas demandas sociais, a fim de formar pessoas capazes para lidar com essas mudanças tecnológicas. A própria construção de uma sociedade midiatizada, marcada pela onipresença destes veículos comunicacionais, interfere diretamente ou indiretamente em aspectos da vida cotidiana dos sujeitos. Faz com que eles aprendam conceitos e ideais expostos na mídia, pelo simples fato, segundo Ferreira e Souza (2008), da mídia retratar a realidade, de modo a gerar identificação entre os fatos e imagens exibidas na TV, por exemplo, com os acontecimentos diários dos indivíduos. 76 Com isso, muitas crianças acabam por se influenciar pelos conteúdos televisivos, e, apesar do Ministério da Comunicação estipular conteúdos inapropriados para faixas etárias, a TV não o faz, transmitindo tudo a todos e não se preocupando com a formação de valores, comportamentos, conceitos e ideais nos receptores, no caso as crianças. Assim, “As emissoras apresentam conteúdos de sexualidade, geralmente, em novelas, minisséries, filmes exibidos a tarde ou durante a sua programação noturna, não lhe pertencendo o direito de dizer quem deve ou não assistir. A programação é algo independente de cada uma.” (FERREIRA e SOUZA, 2008, p. 7) Como conseqüência deste processo, se uma criança assiste uma cena erótica sem um conhecimento prévio do conteúdo, ou seja, sem que um adulto ou educador tenha explorado alguns conceitos básicos sobre sexualidade, de modo a introduzir o assunto e permitir que a criança reflita sobre este, dialogando com o conhecimento e informação; e ela entender o significado do conteúdo erótico, ou já ter vivenciado uma situação de abuso sexual, esta poderá sofrer um trauma em decorrência da cena, que a prejudicará no futuro. Também, poderá despertar nesta criança a erotização precoce, já que, se a cena que ela assiste for atuada por ídolos e modelos televisivos de seu interesse, estes poderão fazer com que a crianças inicie sua vida sexual precocemente, pois, se ela desejar se aproximar do ídolo, poderá se comportar igual a ele, mesmo sem o consentimento de tais atos. A partir desses estudos, vemos a necessidade de refletir sobre a influência na vida cotidiana e na própria sociedade pelos meios de comunicação, e, principalmente, a TV, que explora muitos temas em telenovelas, que proporcionam audiência e identificação com as crianças; levando-as a uma observação e imitação dos personagens favoritos, sem o entendimento de muitos conteúdos levantados nos enredos, que são inapropriados para as crianças, por serem assuntos não dialogados e refletidos na infância. Dessa forma, ocorre um processo de “adultificação” das crianças, pois estas, encantadas pelas propagandas e publicidades da TV, segundo Ferreira e Souza (2008), acabam por almejarem se tornarem como os adultos, que são representados e elevados em posições de status na sociedade; ocasionando assim um amadurecimento precoce. Por conta dessa erotização precoce na infância, muitos discursos e manifestações contra esse processo veiculam na sociedade alegando que os indivíduos não devem aceitar qualquer tipo de relacionamento entre crianças e adultos, que se expressam em manifestos contra a pedofília, prostituição infantil, entre outros. Porém, conforme Felipe e Guizzo (2003), a sociedade e a mídia continuam a exibir imagens erotizadas de crianças, ostentando o desejo adulto. Esse processo se tornou tão banal e natural na sociedade, por conta do que Duarte Jr 77 (1989) intitula de processo de reificação, o qual naturaliza e “coisifica” algumas idéias que se tornaram aceitas na sociedade devido à tamanha circulação no meio social, que acabam afirmando os papéis sociais e algumas concepções. Como exemplo, podemos citar o fato de que a veiculação de imagens de crianças adultificadas e erotizadas se tornou tão usual, que os sujeitos passaram a aceitar de forma banal e natural que as crianças modernas “são assim mesmo”, sem refletirem sobre as causas dessa erotização e sem elaborarem planos para diminuir essa exposição da imagem infantil como objeto sexual dos adultos. Assim, pensando em implicações educacionais na sociedade, podemos refletir criticamente sobre a criação de manifestos sociais e políticos capazes de mobilizar os indivíduos quanto à exploração da mídia nas questões sexuais, já que exagera de conteúdos violentos e eróticos, uma vez que estes proporcionam mais audiência, e também são os que mais despertam emoções nos receptores. Dessa forma, se toda a sociedade se manifestar contra os abusos midiáticos, que expõe conceitos sobre sexualidade, ideais de feminilidade e masculinidade, que favorecem a erotização da infância, poderemos conscientizar a sociedade, de modo a exigir políticas públicas que garantam que a educação para a mídia seja introduzida nos currículos escolares e que haja ética na comunicação, pois assim estaríamos contribuindo de fato para que as crianças sejam instruídas quanto às informações recebidas. O objetivo é que sejam capazes de construírem um senso critico que possa filtrar conteúdos e não mais permitir que estas se deixem levar pelos comportamentos dos ídolos, ou pessoas de altas posições de status e privilégios sociais. Conscientes dos mecanismos que a mídia utiliza para conseguir seus objetivos, as crianças críticas saberão que certos padrões comportamentais exibidos em telenovelas e outros meios não são benéficos para a construção da identidade e personalidade. 78 Capítulo 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo central do presente estudo foi analisar em que medida a mídia, e especificamente, telenovelas, como Rebelde, influenciam na aprendizagem de comportamentos e padrões afetivos e sexuais na infância; tendo como base o modelo da aprendizagem social. Para alcançarmos este objetivo, estudamos a teoria da aprendizagem social; relações desta com a mídia; concepções de infância; papel da mídia no desenvolvimento infantil e vivência precoce da sexualidade nas crianças; análise da telenovela Rebelde, evidenciando cenas, falas e letras de músicas, que poderiam contribuir com a erotização da infância; e os estudos quanto às implicações educacionais na família, escola e sociedade. Após estes estudos podemos tecer algumas reflexões acerca da temática geral desta monografia, que corresponde à influência da mídia na erotização precoce da infância. A mídia, especificamente a TV, utiliza linguagens, impõe padrões de comportamentos, modelos estereotipados, valores, que contemplam ideologias e concepções, ora implícitas, ora explícitas, que fundamentalmente objetivam homogeneizar a sociedade, a fim de acabar com a multiplicidade de “faces” e “tipos” existentes, e impor seus ideais de vida e comportamentos, que respondam aos interesses mercadológicos da mídia, pois, uma vez que se padronizem os indivíduos, facilita que estes concordem com os modelos e valores criados por estes meios, e ainda faz com que os sujeitos comprem seus produtos e almejem o ideal de vida imposto na mídia. Dessa forma, os indivíduos acabam por desejarem ser como os modelos criados na TV, pois representam uma vida perfeita, de glamour e status. Objetivando se colocarem perto destes modelos, os sujeitos passam a observá-los e imitá-los, a fim de se comportarem como tais e obterem um falso sentimento de poder e status. Por meio destas imitações, eles passam a aprender conforme a teoria de Bandura explica, já que identificados com os modelos midiáticos, passam a aprender tudo que os ídolos fazem. Os principais alvos desta aprendizagem desmedida são as crianças, pois estão em fase de construção de identidade, e ao se identificarem com algum personagem de novela, ídolo, ou qualquer modelo que chame sua atenção, poderá se espelhar em seus comportamentos e modos de ser, falar e vestir, a fim de se parecerem com eles; conseguindo formar a identidade e personalidade rapidamente, sem conflitos ou reflexões que esta fase proporciona. 79 Como conseqüência destas imitações está a erotização da infância, já que as crianças acabam seguindo os artistas e modelos midiáticos, sem um esclarecimento dos valores e condutas expressos em alguns comportamentos erotizados. Conforme os autores/as estudados/as, a mídia de massa não mede esforços para explorar o tema sexualidade, e, ainda, não se preocupa com o público alvo, mostrando tudo a todos. Logo, é essencial que a sociedade perceba estes abusos midiáticos, e promova discursos que vão contra a exposição de imagens de crianças erotizadas, de conteúdos impróprios e repletos de clichês e estereótipos em programas destinados ao público infantil, a banalização da erotização infantil, entre outras formas nas quais a mídia interfere no desenvolvimento da infância. Para chegar às devidas conclusões, perpassamos e exploramos a forma como as crianças aprendem, partindo do modelo teórico da Aprendizagem Social de Bandura, retomamos um pouco da historização da criação do conceito de infância e suas devidas mudanças conforme os contextos históricos relacionados à sexualidade; analisamos e identificamos na telenovela Rebelde os padrões sexuais e afetivos representados, bem como estudamos a forma como as crianças aprendem e desejam imitar personagens significativos, e os padrões sexuais valorizados em seus grupos de pares e na sociedade. Por fim, refletimos quanto às implicações educacionais e sociais possíveis para superar este processo de erotização precoce na infância. Enfim, podemos dizer que a mídia, e especificamente telenovelas, como Rebelde, influenciam no comportamento erotizado das crianças, pois como vimos nos capítulos anteriores, teóricos e exemplos retirados da própria telenovela, serviram como base para demonstrar de que forma o comportamento erotizado presente em algum personagem significativo pode interferir no desenvolvimento infantil. Vimos, ainda, que, sem um acompanhamento e instruções que permitam que a criança desenvolva um senso crítico capaz de filtrar informações, esta fica sujeita a imitar o que acredita que seja correto, representado nos valores e padrões de comportamentos dos ídolos, mesmo que estes sejam maléficos para a construção da personalidade. Assim, a partir do estudo desta monografia, podemos entender alguns dos mecanismos midiáticos que influenciam para a vivência precoce da sexualidade na infância, como também algumas implicações educacionais possíveis para refletir sobre este tema. Porém, pelo tempo de elaboração deste trabalho ser relativamente curto e pela própria natureza de um TCC, alguns pontos da pesquisa ficaram limitados, pois se prolongássemos esta pesquisa, bem 80 como proporcionássemos uma abertura em sua temática, abrangendo as fontes de pesquisas, como filmes, telenovelas e propagandas, poderíamos refletir sobre inúmeros exemplos em que a mídia explora a sexualidade infantil, propiciando assim um amadurecimento e erotização precoce nas crianças. Como exemplo de pesquisas futuras, poder-se-ia analisar a telenovela Rebelde, com seus mais variados apelos sexuais, evidenciados em modos de falar, temáticas principais, vestimentas sensualizadas, e comportamento erótico; em contrapartida com os filmes da Disney “High School Musical” e “Hannah Montana: o filme”; ou as seqüências do filme “Harry Potter”, que abordam questões afetivas e sexuais, sem possuírem um conteúdo erotizado, visando despertar desejos, ou outras manifestações sexuais, que podem interferir no comportamento erotizado das crianças. Outra possibilidade de investigação seria a análise de propagandas de produtos destinados às crianças, que utilizam e promovem imagens de crianças como objetos sexuais de adultos, ou aquelas que utilizam uma linguagem e modelos utilizando acessórios infantis, expressando um comportamento adultizado, que reafirma conceitos criados pela mídia, no qual dizem que, para uma mulher ser feminina, esta precisa despertar o desejo sexual dos homens. Se uma criança, sem instrução do adulto ou educador, acredita e coloca como ideal de vida estes valores e concepções, poderá se portar eroticamente e sensualmente, visando cumprir seu papel como mulher na sociedade. Enfim, são muitos os exemplos que podemos estabelecer relação entre mídia e erotização da infância. Logo, devemos nos conscientizar sobre a importância desta temática a fim de propormos mudanças efetivas neste quadro, e, assim, contribuirmos para uma educação que contemple instruções e reflexões sobre os mecanismos midiáticos e a forma como selecioná-los criticamente. 81 REFERÊNCIAS ARIÈS, P. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman. 2 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981. BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. BALDWIN, J. D.; BALDWIN, J. I. Behavior principles in everyday life. 3 ed. New Jersey: Prentice- Hall, 1998. BANDURA, A. Modificação do comportamento. Rio de Janeiro: editora Interamericana do Brasil, 1980. BELLONI, M. L. Infância, Mídias e Educação: revisitando o conceito de socialização. Perspectiva, Florianópolis, v. 25, n. 1, 41-56, jan./jun. 2007. BUDAG, F. E. Comunicação, Recepção e Consumo: suas inter-relações em Rebelde-RBD. São Paulo: ESPM, 2008. BUDAG, F. E.; BACCEGA, M. A. 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