Capítulo III – A ESSÊNCIA DA MORAL (síntese elaborada p/ Luiz Gilberto Kronbauer*) 1. O normativo e o fatual – Partindo da definição de que a moral é o conjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regula o comportamento individual e social dos homens, o autor mostra a relação entre o normativo e o fatual. O normativo é constituído pelas normas de ação e pelos imperativos que enunciam algo que deve ser. O fatual é o das ações concretas, que nem sempre condizem com o dever-ser das normas. No entanto, o normativo, enunciando um dever-ser, existe para ser realizado e o fatual (as ações concretas) adquire significado moral diante das normas. As ações que se conformam às normas são consideradas moralmente positivas; as que se opõem ou que violam as normas têm significado moral negativo. O normativo visa à ação concreta, exige realização e o fatual adquire significado moral enquanto referido ao normativo. E, mesmo o não cumprimento de uma norma por parte dos indivíduos de uma sociedade, não invalida as normas. 2. Moral e moralidade – A distinção pode ser entendida a partir da anterior, no sentido de que a moral corresponderia ao normativo e a moralidade às ações efetivas, ao conjunto de relações efetivas, que adquirem significado moral quando referidas às normas da moral vigente. 3. Caráter social da moral – Referendando a afirmação dos primeiros capítulos, a moral é social: é a forma de comportamento que possui a característica de um ser que, inclusive no comportamento individual, comporta-se como um ser social. O autor ressalta três aspectos da qualidade social da moral: - Os indivíduos, que se comportam como seres sociais, sujeitam-se a princípios, normas ou valores socialmente estabelecidos. - Enquanto social, a moral regula somente atos e relações que acarretam conseqüências para outros e que estão sujeitos à sanção dos outros. - A moral cumpre a função social de induzir os indivíduos a aceitar livre e conscientemente determinados princípios,valores ou interesses; tem a função de regular as relações dos indivíduos entre si e cada um deles com o grupo, para garantir uma determinada ordem social. 4. O individual e o coletivo na moral. – Pelo fato de ser social implica a relação entre o individual e o coletivo. Habitualmente, devido à eficiência dos meios de transmissão da moral, os indivíduos se conformam à moral vigente de modo espontâneo, habitual, quase instintivo. Dado a força do costume, o normativo e o fatual fundem-se.e esta é a forma mais estável de permanência de uma determinada moral. Isso não significa que as ações dos indivíduos não tenham valor moral. A convicção geral de que “o que foi ontem deve ser também hoje” confere valor à regulamentação habitual do comportamento. No entanto, por mais fortes que sejam os elementos objetivos, o sujeito que age é uma pessoa singular, supostamente livre, consciente e responsável. Por outro lado, mesmo quando o indivíduo pensa estar agindo exclusivamente de acordo com a sua consciência ou sua livre vontade, ele age sob influência das convicções da sociedade de que participa. Assim, na sociedade de mercado, talvez seja difícil alguém não assumir o “dever de consumir” como um dever para consigo mesmo e com a sociedade. Resumindo, a moral implica sempre uma consciência individual, que interiorizou as normas de ação vigentes, o que já implica a influência das relações e das condições sociais dominantes na sociedade. Assim como não existe indivíduo isolado não existe uma moral estritamente pessoal. Existem indivíduos concretos, numa sociedade determinada, e suas ações têm caráter social, sem negar a subjetividade. 5- Estrutura do ato moral (Condições para a moralidade da ação). A primeira observação do autor é a de que o ato moral é um ato sujeito à sanção dos demais; é passível de aprovação ou de reprovação, obviamente de acordo com as normas comumente aceitas. Uma ação que não podia ser evitada ou cujos resultados não podiam ser previstos não é uma ação moral. A primeira condição salientada pelo autor é o motivo da ação, aquilo que impulsiona para a ação ou para a busca de um fim determinado. O sujeito deve poder reconhecer o motivo que o impulsiona, isto é, sua ação de vê ter um caráter consciente. Motivos inconscientes ou de que não se tem consciência descaracterizam a moralidade da ação. Em segundo lugar, não em ordem de importância, está a consciência do fim visado, a antecipação ideal do resultado pretendido e a decisão de alcançá-lo, o que qualifica o ato moral como ato voluntário ou livre, distinguindo-o de outros tipos de aos que se produzem no indivíduo sem a sua deliberação. A consciência do fim visado e a decisão de realizá-lo implica, em muitos casos, a escolha entre vários fins possíveis, que leva em conta a situação concreta em que se dá a escolha e a decisão. O ato moral não se completa na tomada de decisão, mas no resultado efetivo da ação, que implica na consciência dos meios para atingir o fim escolhido e o seu emprego para obter o resultado desejado. Em se tratando da ação moral, a eficiência dos meios para atingir o fim não é critério suficiente para justificar a escolha. Os meios devem ser moralmente justificáveis, não apenas tecnicamente eficientes. Por outro lado, a escolha dos meios deve considerar a situação concreta na qual se dará a ação. Deve-se considerar ainda que da parte do agente o ato moral efetiva-se no resultado, daí a necessidade de ter consciência também das possíveis conseqüências decorrentes da ação. O ato moral pressupõe um sujeito dotado de consciência moral enquanto consciência do fim desejado, consciência dos meios e do resultado; de um sujeito que decide e, conseqüentemente, age com responsabilidade, embora sua ação se qualifique moralmente pela sua relação com as normas vigentes na sociedade. Subjetivamente o ato moral se caracteriza pelo motivo, a consciência do fim, a consciência dos meios e a decisão pessoal. Objetivamente, pelo emprego dos meios, pelo resultado objetivo e pelas conseqüências. O ato moral, enquanto ato consciente e voluntário, supõe sua realização, a participação livre do sujeito. Liberdade que é incompatível com a imposição externa de normas, mas não com a necessidade histórico-social que condiciona os seres humanos. * SANCHEZ VAZQUEZ, Adolfo. ÉTICA. 18ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira