RETROSPECTIVA DAS CRISES ECONÔMICAS Fonte: http://pixabay.com/pt/crise-financeira-bolsa-de-valores-544944/ A história das crises econômicas está relacionada em grande medida à história da humanidade. Sobretudo a partir do momento em que grandes civilizações e sociedades passaram a se desenvolver, seja através do crescimento demográfico, seja através do aumento progressivo do grau de complexidade das atividades técnicas e do trabalho. A economia, por sua vez, surge dessa necessidade cada vez mais complexa de gerir os recursos humanos, a produção alimentícia, a produção de matéria prima, o valor dos impostos, entre outros. O termo “economia” advém do grego οικονομία, cujo sentido básico seria a ideia de “gestão ou administração das regras da casa”. Os estudos econômicos e seus modelos tiveram sua gênese na economia política do final do século XIX na Europa. De maneira simplificada, poderíamos dizer que as ciências econômicas concentram seus estudos na análise da produção, da distribuição e do consumo de bens e serviços. Quando nos referimos a crises econômicas, estamos nos referindo, então, a momentos de desequilíbrios que envolvem um ou mais setores da economia. Ao longo da história, houve desequilíbrios de diversas magnitudes e diferentes escalas. À medida que a economia tornou-se mais complexa e internacionalizada, mais difícil passou a ser a análise das causas e das soluções para as crises. Em uma fase anterior ao capitalismo, as crises eram mais localizadas e estavam diretamente associadas a eventos de ordem natural – como secas ou outros desastres naturais que interferiam no fornecimento de alimentos, por exemplo. Já ao longo do desenvolvimento e sofisticação do capitalismo, novas variáveis passaram a ser analisadas na interpretação dessas crises. Além disso, distintas teorias surgiram na busca de compreender melhor esse fenômeno, suas causas e seu comportamento. Vejamos a seguir algumas dessas principais teorias. A “destruição criadora” foi uma interpretação para as crises apresentada pelo autor americano Joseph Schumpeter , em 1911, através de sua obra intitulada de A Teoria do Desenvolvimento Econômico (Theorie der Wirtschaftichen Entwicklung). Sua teoria, ao analisar alguns ciclos de desenvolvimento tecnológico num cenário cada vez mais competitivo, sugeria que a inovação tecnológica – seja a invenção de uma nova mercadoria ou o desenvolvimento de um novo modelo de produção - era capaz de comprometer cadeias produtivas obsoletas e, consequentemente, gerar um quebra-quebra de determinados setores. Nessa perspectiva, Schumpeter já concebia a ocorrência de crise como algo cíclico no capitalismo, como apresentara em Ciclos Econômicos (Business Cycles, 1939). Fonte: http://pixabay.com/pt/euro-bill-moeda-bola-sobre-447209/ A noção de ciclos econômicos trazida por Schumpeter está relacionada a variações cíclicas das atividades econômicas no longo prazo. Esse comportamento seria marcado por quatro fazes distintas: boom, recessão, depressão e recuperação. Ou seja, uma oscilação entre fases de crescimento e declínio. Consolidando a interpretação apresentada por Schumpeter, surgiram diferentes propostas para o período desses ciclos, conhecidas como classificação dos ciclos econômicos, tais como os ciclos de Kitchin (3 a 4 anos); os ciclos de Juglar (de 7 a 10 anos), os ciclos de Kuznets (de 15 a 20 anos), os ciclos de Kondratiev (por volta de 50 anos) e, ainda, os ciclos de Sartone, com períodos de duração acima de 50 anos. Cada um desses ciclos tiveram como base diferentes atividades em distintos períodos históricos. Em livros de história estão registrados inúmeros exemplos de crises de dimensão local e regional, No entanto poderíamos afirmar que a crise de 1929, também conhecida como crise de 30, foi um marco na história das crises econômicas de caráter mundial. Podemos afirmar que foi uma das piores crises. Cujas consequências atingiram milhões de pessoas espalhadas pelo mundo, tamanho era o grau de integração entre os mercados de vários cantos do globo. Desde então, passaram a ser cada vez mais recorrente crises de dimensão global, haja vista a globalização da produção e das trocas comerciais. Vejamos, a seguir, a começar pela crise de 1929, um breve resumo histórico das crises que afetaram sociedades espalhadas pelo mundo. Crack da bolsa de 1929 – uma crise sem precedentes. Os anos 20, também conhecidos como “anos dourados”, marcaram a ascensão econômica norte-americana. Em um contexto de pós 1ª Guerra Mundial, a indústria dos EUA figurava entre as mais aquecidas do mundo. O padrão americano de consumo da época serviu não apenas de vitrine para a ideologia capitalista, como também, para elevar o otimismo dos investidores na bolsa de valores de Wall Street. Por outro lado, as principais economias industrializadas da Europa, gradativamente se recuperavam da guerra e aumentavam a oferta de mercadorias industrializadas, aumentando a concorrência no mercado. Eis a famosa crise de superprodução. Baseada numa logística de estoque de mercadorias, a indústria estadunidense, responsável por abastecer os mercados europeus até então, passou a ter uma oferta além da demanda. Isso foi responsável não só pela quebra de várias fábricas no país, como também por uma inédita desvalorização das ações dessas empresas, muitas delas, inclusive, alvo de pura especulação nas bolsas de valores. O resultado foi o pior possível. Falência de várias empresas e desemprego de aproximadamente um terço da população. Vejamos o raciocínio lógico básico para entender esse tipo de crise. Se fábricas fecham e pessoas são demitidas, consequentemente, o poder de compra das pessoas diminui e reduz o volume de vendas. Os valores das mercadorias com oferta elevada, portanto, diminuem e passam a não ser suficientes para arcar com os custos de produção. Dessa maneira, o capitalista corta novos postos de trabalho, gerando ainda mais desemprego. Isto gera um ciclo vicioso característico de uma fase de recessão econômica. O Brasil foi bastante afetado nesse contexto por depender significativamente da exportação do café. Entretanto, essa crise foi um dos principais motivos para o incipiente desenvolvimento da indústria nacional. A política econômica Keynesiana foi uma das chaves para a saída da crise. Apesar de ter tido grande dificuldade de enfrentar a ortodoxia dos economistas liberais, a ideia de o Estado assumir investimentos em obras de grande porte através do New Deal foi suficiente para a retomada do emprego e da demanda nos Estados Unidos. http://pixabay.com/pt/dinheiro-dollar-moeda-%C3%A1gua-onda-598816/ Crise de 1970 Diante de um novo contexto de recessão econômica, marcado por um rearranjo na estrutura produtiva e uma ascensão do poder político dos sindicatos, a disputa entre teóricos seguidores do keynesianismo e do neoliberalismo se tornava cada vez mais acirrada. Na ocasião, os teóricos neoliberais conseguiram ir mais adiante com seus planos, o que enfraqueceu o poder dos trabalhadores e reduziu a participação do Estado na economia. Tal processo de privatização e modernização da produção acabou elevando novamente o número de desempregados. Como se não bastasse, em 1973, o conflito árabe-Israelense no Oriente médio após a Guerra de Yom Kippur teve um desfecho devastador do ponto de vista econômico. Isso porque a OPEP – organização dos países árabes produtores de petróleo – reduziu a oferta do óleo aos países que apoiaram o Estado de Israel. Tal ato elevou significativamente o preço do barril de petróleo no mercado mundial e deu nome à conhecida “Crise do petróleo”. O Brasil sentiu os efeitos do aumento do preço do barril de petróleo através da interrupção da fase de crescimento que ficou conhecida como “milagre econômico”. Por outro lado, a crise foi um dos principais motivos para a criação do Proálcool, cujo objetivo era reduzir a dependência brasileira da gasolina, combustível derivado do petróleo. Apesar de não ter tido muito sucesso, o programa serviu para o surgimento de uma nova indústria que viria, anos mais tarde, eclodir na atual produção e exportação do etanol. A crise na perspectiva marxista A perspectiva marxista das crises econômicas entende a crise como algo inerente ao capitalismo. Ou seja, o capitalismo em seu desenvolvimento produz, contraditoriamente, as condições críticas. Em A Teoria da Acumulação Capitalista, Karl Marx elenca três condições básicas para que a acumulação do capital se concretize. São elas: a disponibilidade de meios de produção (que englobaria infraestrutura como máquinas, a disponibilidade de matéria prima e energia etc); a disponibilidade de força de trabalho (mão de obra) excedente – sinônimo de baixos salários e uma maior mais-valia-; e a existência de demanda efetiva (poder de compra). Para Marx, quando alguma dessas condições não é atendida, não há taxa de crescimento econômico satisfatório que possibilite o acúmulo de capitais. Esse quadro representaria, portanto, um estado de crise. Considerando essa análise e o aumento da concorrência industrial, fica mais fácil entender algumas guerras e conflitos envolvendo a busca de novos mercados consumidores e a disponibilidade de matérias-primas como o petróleo. Ajuda, ainda, a entender a negatividade, do ponto de vista capitalista, de uma situação de pleno emprego. Em uma análise marxista recente, o geógrafo inglês David Harvey, defende que uma das soluções encontradas para a solução dessas crises, além das guerras, é a globalização. No caso, expansão e diversificação da produção para outras partes do mundo. Em busca de novos mercados, força de trabalho barata e matéria-prima. Daí o interesse das economias ricas incentivarem o desenvolvimento industrial de outros países, hoje, considerados emergentes. Harvey, no entanto, aponta para a grande dificuldade de se compreender esse mecanismo nos últimos 30 anos em função do processo de “financeirização” da economia. Atualmente, não só mercadorias como smarthphones, notebooks e automóveis são comercializados. O maior volume das transações comerciais, hoje, está relacionado a ações, títulos de dívidas, hipotecas, entre outros. Ou seja, boa parte dos capitais que se acumula não possui uma base produtiva, são produtos da especulação no mercado financeiro. Isso ajuda a alta volatilidade desses capitais, capazes de se instalar e abandonar várias economias ao longo do mundo, numa velocidade jamais vista. O processo de globalização da produção e a volatilidade dos capitais especulativos ajudam a entender uma série de crises que eclodiram no final do século XX e início do século XXI. A crise do México em 1982 e a crise inflacionária no Brasil na chamada década perdida tiveram forte relação com o aumento dos juros nos EUA, prejudicando as economias emergentes financiadas com créditos do FMI – Fundo monetário internacional. Após um novo crack na bolsa de Nova York em 1987, dessa vez com rápida recuperação, a crise que tomou conta dos holofotes midiáticos foi a Crise Asiática em 1997. Uma crise financeira marcada pela rápida fuga de capitais das economias dos Tigres Asiáticos (no caso, Indonésia, Filipinas, Hong Kong, Tailândia, Malásia e Coréia do Sul) e uma desvalorização do câmbio não sustentaram a confiança de investidores internacionais. Em seguida, similar a uma bola de neve, a crise se espalhou para outras economias emergentes fortemente dependentes da exportação de commodities para a Ásia, caso da Rússia e do Brasil por volta de 1998. No Brasil, as consequências foram a elevação da inflação e, consequentemente, o aumento das taxas de juros, na busca por controlar a alta dos preços. Houve, ainda, a desvalorização do real em relação ao dólar para beneficiar as exportações. Já na primeira década do século XXI, tivemos a eclosão de duas crises financeiras, uma moderada, consequência dos ataques de 11 de setembro nos EUA e outra prolongada, atrelada ao mercado imobiliário norte americano. Esta eclode nos EUA e se espalha pela Europa, atingindo principalmente as economias dos países mais ricos em um primeiro momento. Atualmente, as consequências dessa crise tornam-se mais evidentes em países emergentes com a redução das exportações, acompanhadas de uma desaceleração da economia chinesa. Crise de 2008 A crise de 2008 eclodiu nos EUA, em virtude de um colapso da bolha especulativa no mercado imobiliário. Tal situação esteve relacionada à expansão do crédito bancário e redução dos juros, em anos anteriores, associadas a práticas financeiras pouco reguladas. Isso porque os créditos eram oferecidos deliberadamente, inclusive, a clientes inadimplentes. Empréstimos de alto risco (subprimes), vinculados às hipotecas, aquecendo o mercado imobiliário. Os títulos dessas dívidas e hipotecas, por sua vez, eram repassados para outros compradores, bancos e outros tipos de investidores, que as negociavam no sistema financeiro. Entretanto tamanha euforia foi substituída por uma série de falências (inclusive de bancos), à medida que os juros foram elevados, em 2006, para controle inflacionário. Isso porque, o aumento dos juros rebaixou o valor dos imóveis e dificultou novos financiamentos para os clientes subprime. Resultado: a inadimplência desses clientes virou um efeito dominó de calotes no sistema financeiro. Com isso, a oferta de crédito bancário para investimentos produtivos reduziu drasticamente, diante da ameaça de calote, o que impactou fortemente a produção industrial em várias economias do mundo. No Brasil os efeitos da crise não foram nulos. No entanto, foram mais amenos do que os ocorridos em grandes economias europeias, marcadas por elevadas taxas de crescimento negativo e elevados índices de desemprego. 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