distribuição das hemoglobinopatias na população brasileira e suas

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DISTRIBUIÇÃO DAS HEMOGLOBINOPATIAS NA POPULAÇÃO BRASILEIRA E SUAS
CONSEQUENCIAS FISIOPATOLÓGICAS: UMA REVISÃO DA LITERATURA
DISTRIBUTION OF HEMOGLOBINOPATHIES IN BRAZILIAN POPULATION AND ITS
CONSEQUENCES PATHOPHYSIOLOGICAL: A LITERATURE REVIEW
João Paulo dos Santos1, Lúcia Helena Ferreira Santos2, Ilton Palmeira Silva3, Fernando Wagner da
Silva4, Angela dos Santos Martinez Alzamora5, Patrícia Silva Batista6, Tatiana Almeida Omura de
Paula7, Regianne Dourado de Oliveira8
RESUMO – Hemoglobinopatias são grupos heterogêneos de distúrbios herdados recessivamente caracterizados como doenças
genéticas resultantes de alterações estruturais e/ ou funcionais das moléculas de hemoglobina, sendo responsáveis por considerável
morbidade e mortalidade no mundo. Estas alterações genéticas ocorrem como consequência de defeito nos genes que codificam as
cadeias globínicas alfa e beta da molécula de hemoglobina. Os defeitos estruturais são característicos da anemia falciforme,
enquanto os defeitos funcionais ou quantitativos levam aos quadros de talassemias. Objetivo. Destacar a distribuição das
hemoglonopatias na população brasileira e a correlação com as doenças fisiopatológicas nos indivíduos portadores desta doença
genética. Ademais, fornecer a sociedade informações sobre a análise eletroforética, aconselhamento genético, suporte clínico e
psicológico dos programas preventivos. Conclusão. No Brasil, a introdução das hemoglobinopatias ocorreu com a entrada dos
escravos negros africanos e da subsequente mistura racial, a qual teve grande influência na dispersão dos genes anormais. A
distribuição das hemoglobinas anormais, provenientes de formas variantes e talassemias, estão relacionadas com as etnias que
compõem nossa população. Dentre as hemoglobinas variantes, as mais freqüentes na população brasileira são a hemoglobina S
(HbS) e C (HbC), ambas de origem africana, mostrando a intensa participação do negro na composição populacional brasileira.
Contudo, em regiões que tiveram maior participação da colonização italiana, as talassemias são mais freqüentes. No presente estudo
é exposta a importância do diagnóstico laboratorial de hemoglobinopatias, bem como as atividades de prevenção que permitem o
aconselhamento genético e o tratamento precoce nos casos de homozigose. Ressalta-se, ainda, a importância do estudo populacional,
que permite uma visualização da distribuição das hemoglobinopatias na população brasileira, auxiliando na elaboração de
programas preventivos, pois podem auxiliar a comunidade por meio de campanhas de esclarecimento nas escolas e em serviços de
saúde da rede pública e privada, nas quais se faz necessário o diagnóstico de indivíduos heterozigotos, o aconselhamento genético e
o diagnóstico neonatal, pois a prevenção das anemias hereditárias deve começar o mais precoce possível e deve ser feita através de
ações educadoras, de um diagnóstico laboratorial realizado por profissionais capacitados e por estudo familiar. Ademais, ansiamos
despertar na comunidade científica o interesse por uma melhor investigação das anemias hereditárias, e na formação de equipe
multidisciplinar para participar de programas de educação, orientação e aconselhamento genético dos afetados, tanto de
homozigotos quanto de heterozigotos sem, contudo, ferir preceitos ético ou morais, ou mesmo induzir a qualquer forma de
segregação, e invasão de privacidade do paciente.
PALAVRAS-CHAVE - Hemoglobinopatias, Doença falciforme, talassemias, diagnóstico laboratorial.
.
SUMMARY - Hemoglobinopathies are a heterogeneous group of recessively inherited disorders characterized as genetic
disorders resulting from structural and / or functional hemoglobin molecules are responsible for considerable morbidity and
mortality worldwide. These genetic changes occur as a result of defects in genes encoding the globin alpha and beta chains of the
hemoglobin molecule. Structural defects are characteristic of sickle cell anemia, while functional or quantitative defects lead to
pictures of thalassemia. Goal. Highlight the distribution of hemoglonopatias the Brazilian population and the correlation with the
pathophysiological disease in individuals with this genetic disease. In addition, provide the information society on the
electrophoretic analysis, genetic counseling, medical and psychological support of preventive programs. Conclusion. In Brazil, the
introduction of hemoglobinopathies occurred with the arrival of African slaves and the subsequent racial mixture, which had great
influence on the spread of abnormal genes. The distribution of abnormal hemoglobins from thalassemia variants and forms, are
related to the ethnic groups in our population. Among the hemoglobin variants, the most frequent in the Brazilian population are
hemoglobin S (HbS) and C (HbC), both of African origin, showing the intense participation of blacks in Brazilian population
composition. However, in regions that had higher participation of Italian colonization, thalassemia are more frequent. In this study is
exposed the importance of laboratory diagnosis of hemoglobinopathies and prevention activities that allow genetic counseling and
early treatment in cases of homozygosity. It is emphasized also the importance of the study population, which allows a distribution
view of hemoglobinopathies in the Brazilian population, assisting in the development of preventive programs, they can help the
community through awareness campaigns in schools and health services public and private, in which the diagnosis of heterozygous
individuals is necessary, genetic counseling and neonatal diagnosis, for the prevention of hereditary anemias should start as early as
possible and should be done by educators shares, an accomplished laboratory diagnosis by trained professionals and familiar.
Moreover study, we long to awaken the scientific community interest in better research of hereditary anemias, and multidisciplinary
team training to participate in education programs, counseling and genetic counseling of affected, both homozygous much
heterozygotes, but without hurting ethical or moral precepts, or induce any form of segregation, and patient privacy invasion.
KEYWORDS- Hemoglobinopathies, sickle cell disease, thalassemia, laboratory diagnosis.
1. Biomédico, Centro de Estudos Superíores de Maceió - CESMAC, Especialista em Hemoterapia e Imuno-Hematologia, Departamento de
Oncologia Clínica e Experimental, Disciplina de Hematologia e Hemoterapia da Universidade Federal de São Paulo- UNIFESP – EPM, Mestrando
em Reumatologia, Universidade Federal de São Paulo UNIFESP – EPM, Analista de Hemoterapia, Hospital Israelita Albert Einstein-HMVSC.
2. Biomédica Graduada pelo Centro de Estudos Superíores de Maceió - CESMAC.
3. Coordenador do curso de Biomedicina da Faculdade Sete de Setembro – FASETE, Paulo Afonso- BA.
4. Doutorando em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Alagoas. Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Alagoas
- UFAL (2008). Coordenador da Pós-Graduação Lato-Senso em Hemoterapia e Professor de Hematologia Clínica e Imuno-Hematologia do Centro
de Estudos Superíores de Maceió - CESMAC. Professor Substituto da disciplina de Anatomia Humana na Universidade Federal de Alagoas –
UFAL. Gerente da Agência Transfusional da Maternidade Escola Santa Mônica.
5. Biomédica, Centro Universitário Lusíada, Especialista em Hemoterapia, Senac - SP, Analista de Hemoterapia Pleno, Hospital Israelita Albert
Einstein-HMVSC.
6. Bióloga, Universidade Cruzeiro do Sul, Especialista em Hemoterapia e Hematologia Clínica, IPESP, Especialista em Biologia Molecular e
Citogenética Humana, IPESP - SP Analista de Hemoterapia Pleno, Hospital Israelita Albert Einstein-HMVSC.
7. Bióloga, Especialista em Hemoterapia, Senac - SP, Coordenadora Hemoterapia,Hospital Israelita Albert Einstein-HMVSC.
8. Farmacêutica, Uninove, Analista de Hemoterapia Pleno, Hospital Israelita Albert Einstein-HMVSC
Instituição: Centro de Estudos Superiores de Maceió-CESMAC. Rua. Cônego Machado, nº 918, CEP 57051 -160 –
Maceió-AL.Correspondência para: João Paulo dos Santos. Rua Jornal de Alagoas, 41, Farol. Maceió-AL, CEP: 57051420. Email: [email protected]. Tel. (11) 96473-7972.
INTRODUÇÃO
Hemoglobinopatias
são
grupos
heterogêneos
de
distúrbios
herdados
recessivamente e caracterizados como doenças genéticas resultantes de alterações
estruturais e/ ou funcionais das moléculas de hemoglobina. Estas alterações genéticas
ocorrem como consequência de defeito nos genes que codificam as cadeias globínicas
alfa e beta da molécula de hemoglobina e são responsáveis por considerável morbidade
e mortalidade no mundo. Os defeitos estruturais são característicos da anemia
falciforme, enquanto os defeitos funcionais ou quantitativos levam aos quadros de
talassemias (NAOUM, 2004).
As hemoglobinopatias surgiram isoladamente ao longo do processo evolutivo e
juntamente com a migração e o coito entre indivíduos de diferentes populações, os
genes de globinas anormais espalharam-se globalmente. Vários estudos apontam que as
primeiras mutações na moléculas de hemoglobina apareceram há 100 milhões de anos
no continente africano, onde os genes codificadores das globinas alfa e beta se
diferenciaram e seguiram rotas evolutivas independentes (NAOUM, 1987).
Acredita-se que a própria evolução humana tenha sido influenciada pela
transformação evolutiva da hemoglobina (NAOUM, 2004). Contudo, a relação entre o
desenvolvimento da espécie humana e o da hemoglobina pressupõe a existência de
situações adaptativas e da pressão seletiva exercida pelo ambiente. Exemplos notáveis
do processo evolutivo-adaptativo das hemoglobinas são encontrados na natureza tais
como o aumento da concentração dessa moléculas em indivíduos que vivem em regiões
acima de três mil metros, e a presença do Plasmodium falciparum em determinadas
regiões geográficas que favoreceu o aparecimento e fixação do alelo Hb S (NAOUM,
2004).
Milhões de pessoas trazem em sua herança genética, hemoglobinas anormais em
várias combinações como consequências que variam das quase imperceptíveis às letais,
motivo pelo qual as anemias hereditárias compreendem um grupo de condições de
considerável complexidade (Bonini-Domingos, 1993).
No Brasil, a introdução das hemoglobinopatias ocorreu com a entrada dos
escravos e da subsequente mistura racial, a qual teve grande influência na dispersão dos
genes anormais. As mutações nos genes das globinas alfa e beta deram origem à Hb S,
Hb C, Hb D, as talassemias alfa e beta entre outras. Consequentemente, ao longo da
colonização e do desenvolvimento do Brasil, fluxos migratórios trouxeram imigrantes
europeus, judeus, japoneses entre outros que frente a mistura racial contribuíram com o
fluxo de genes anormais das globinas e em geral com o nosso quadro de
hemoglobinopatias (NAOUM, 1984), De SOUZA, 2006).
Dentre as hemoglobinas variantes, as mais freqüentes na população brasileira
são a hemoglobina S (HbS) e C (HbC), ambas de origem africana, mostrando a intensa
participação do negro na composição populacional brasileira (Naoum et al 1979;
Naoum, 1984; Álvares Filho, 1988). As talassemias são mais freqüentes em regiões que
tiveram maior participação da colonização italiana, espanhóis gregos e turcos (Ramalho,
1986 ORLANDO et al., 2000; ANVISA, 2001).
Há dados que comprovam que indígenas brasileiros não-miscigenados de
diferentes regiões não apresentam hemoglobinas anormais (GUILHERME et al, 2000).
A conscientização das comunidades afetadas, por meio da informação, sobre o tipo de
mutação causada na hemoglobina e o apoio clínico, psicológico e genético ao portador e
seus familiares é de fundamental importância para o desenvolvimento de programas
preventivos nesta área (ORLANDO et al, 2000).
O Ministério da Saúde busca trabalhar com uma proposta de um tratamento aos
portadores de tais anomalias, assim como na conscientização sobre o quê são essas
doenças e como realizar um tratamento paliativo a fim de evitar sofrimentos, bem como
alertar os portadores dos genes dessas globinas anormais sobre os riscos de se ter um
filho com hemoglobinopatia. O diagnóstico e o tratamento são considerados elementos
fundamentais para assegurar a qualidade e a expectativa de vida de uma pessoa com
doença genética (De SOUZA, 2006).
O presente estudo tem por objetivo destacar a distribuição das hemoglonopatias
na população brasileira e a correlação com as doenças fisiopatológicas nos indivíduos
portadores desta doença genética. Ao mesmo tempo, fornecer a sociedade informações
sobre a análise eletroforética, aconselhamento genético, suporte clínico e psicológico
dos programas preventivos.
MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada na Biblioteca Central Craveiro Costa do Centro de
Estudos Superíores de Maceió – CESMAC, revisando a literatura por meio de visitas a
sites especializados, com consultas a periódicos, assim como, livros e teses sobre os
temas, hemoglobinopatias, anemia falciforme, talassemias, doença falciforme,
fisiopatologia e formas de diagnósticos.
REVISÃO DE LITERATURA
1. ANEMIA FALCIFORME
Descrita pela primeira vez em 1904 por James Herrick, a anemia falciforme é a
hemoglobinopatia mais comum no Brasil. Sua etiologia é gênica, com padrão
autossômico recessivo devido a uma mutação de ponto (GAG->GTG) no gene da beta
globina, resultando no aparecimento de uma hemoglobina anormal, denominada
hemoglobina S (HbS).Tal alteração é devido a uma substituição do ácido glutâmico por
uma valina na posição 6 do segmento da cadeia polipeptídica beta. Esta modificação dá
origem a HbS e com a baixa tensão de O2 essa hemoglobina se polimerize acarretando
numa deformação das hemácias que assumem forma de foice sendo estas formas
responsáveis por vaso-oclusão e episódios de dor e lesões de órgãos (NAOUM, 1987;
THOMPSON et al, 2004).
No Brasil, aproximadamente 78,6% dos óbitos devidos à doença falciforme
ocorrem até os 29 anos de idade (figura 1). Contudo, a literatura existente no Brasil
ainda fornece pouca informação sobre o comportamento e desenvolvimento da doença
falciforme em seus diversos aspectos (LOUREIRO; ROZENFELD, 2005, ALVES,
1996).
Figura 1 – Número de óbitos com doenças falciformes no Brasil entre os anos de 2000
a 2005 (dados do Ministério da Saúde, Comitê de Hemoglobinopatias).
Fonte: SIMOES, Belinda P. et al, 2010.
Em Minas Gerais foi relatada a incidência de um novo caso homozigoto da
doença falciforme para cada 2.800 nascimentos (PAIXÃO et al, 2001). No Estado do
Rio de Janeiro foi relatada a incidência de um novo caso a cada 1.196 nascimentos
(LOUREIRO; ROZENFELD, 2005).
Diagnosticar precocemente é tão importante que em 2001, mediante a portaria
nº 822/01 do ministério da saúde, foi criado o programa nacional de triagem neonatal
(PNTN), incluindo a triagem para as hemoglobinopatias (CANÇADO; JESUS, 2007).
Na tabela 1 é demostrado a proporção de nascidos vivos diagnosticados com doença
falciforme de acordo com o PNTN. Na tabela 2 é demostrado a proporção de nascidos
vivos diagnosticados com o traço falciforme de acordo com o PNTN.
Tabela – 1 Proporção de nascidos vivos diagnosticados com doença falciforme
de acordo com o PNTN.
Fonte: Modificado do Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN).
(http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/oministerio/principal/secretarias/sas/dahu/programanacional-de-triagem-neonatal).
Tabela – 2 Proporção de nascidos vivos diagnosticados com o traço falciforme
de acordo com o PNTN.
Fonte: Modificado do Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN).
(http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/oministerio/principal/secretarias/sas/dahu/programanacional-de-triagem-neonatal).
.
Dentre as conquistas dessa portaria, deve-se aludir a restauração de um dos
princípios básicos da Ética Médica, que é o da igualdade, garantindo acesso igual aos
testes de triagem (teste de falcização e solubilidade) a todos recém-nascidos brasileiros,
independentemente da origem geográfica, étnica e classe sócio-econômica. Portanto,
uma vez que tal portaria se encontra em fase inicial de implantação, é imprescindível
uma ampla divulgação das hemoglobinopatias entre os profissionais de saúde,
principalmente entre os que atuam na triagem neonatal (RAMALHO, 2003).
O diagnóstico neonatal, a pronta instituição do tratamento (vacinas, penicilina
profilática) e a orientação do reconhecimento precoce do seqüestro esplênico pelas mães
ou cuidadoras contribuíram para a redução da mortalidade das crianças nos primeiros
cinco anos de vida. Logo, fica evidente que o diagnostico precoce, sobretudo ao
nascimento e o tratamento adequado, ajudam significativamente a taxa de sobrevida e a
qualidade de vida dos doentes. Além do mais, alertado há tempo sobre o risco de
ocorrência da doença na família, os pais podem se beneficiar do aconselhamento
genético e/ou do diagnóstico pré-natal para uma futura gestação (ANVISA, 2001;
ORLANDO et al, 2000; ).
Vale ressaltar que, no período neonatal, devido a grande quantidade de HbF, o
teste de falcização e solubilidade costumam apresentarem negativos. Esse último
apresenta uma boa sensibilidade para a triagem de HbS em outras faixas etárias além de
oferecer um custo mais baixo do que a eletroforese e uma execução mais fácil
(BANDEIRA et al., 2003). Vale lembrar que na anemia falciforme e em homozigotos
da talassemia beta, o aumento percentual da hemoglobina fetal se traduz em um melhor
prognóstico da doença (ZAGO, 2004).
A divulgação de dados sobre a distribuição populacional dos portadores da HbS
se faz basicamente através de programas de saúde controlados pelos governos
municipais, estaduais e federal. A base de dados pertencente ao Sistema Único de Saúde
(SUS) em relação a autorizações de internação hospitalar (AIH), que é disponibilizada
mensalmente em CD-ROM, vêm colaborando com a informação epidemiológica da
doença falciforme e outras hemoglobinopatias (LOUREIRO; ROZENFELD, 2005,
ALVES, 1996).
Recentemente Cançado e Jesus (2007) tabularam os dados do Ministério da
Saúde e fizeram uma análise sobre a distribuição quantitativa do gene HbS (figura 2).
Pela análise da figura 2, uma concentração maior de indivíduos heretozigotos (AS) é
observada justamente nas regiões onde se deu um elevado tráfego de escravos africanos.
Figura 2 – Freqüência do gene S em diferentes regiões do país.
Fonte: Cançado e Jesus, 2007. (DF = Doença Falciforme).
1.1. CONSEQUENCIAS FISIOPATOLÓGICAS
No paciente com doença falciforme ocorre crises vaso-oclusivas que são
caracterizadas por quadros dolorosos agudos e seus principais fatores desencadeantes
são variados e incluem: infecção, desidratação e tensão emocional. As crises dolorosas
tornam-se mais evidentes na terceira e quarta década de vida sendo, por isso, elevada a
taxa de mortalidade (figura 3). Ademais, pode ocorrer ainda: trombose arteriolar,
aumento de hemólise e ainda necrose celular, como conseqüências dos fenômenos
isquêmicos causados pelos trombos sanguíneos (LORENZI,1999).
A oclusão secundária à falcização das hemácias leva aos quadros de isquemia
tendo como conseqüência uma resposta inflamatória aguda. Há, com certa freqüência,
episódios agudos de dor e inchaço das mãos e pés – síndrome das mãos e pés, em
crianças no período de seis meses a dois anos de idade, contudo raras depois dos sete
anos (ZAGO, 2004).
Figura 3 - Células falciformes
Fonte: Modificado de www.ebah.com.br/content/ABAAAARRMAG/Bioquimica.
Tais quadros clínicos agravam-se quando as células sanguíneas concentram-se
de hemoglobina corpuscular média, apresentando baixa afinidade pelo oxigênio, pouca
deformidade e alta viscosidade, podendo acelerar ainda mais o processo de formação de
polímeros de HbS na desoxigenação e menor sobrevida destas células (FIGUEIREDO,
2007).
O valor basal da hemoglobina (Hb), no paciente com doença falciforme, resulta
do equilíbrio entre produção e destruição, equilíbrio que pode ser rompido em várias
situações, como: agudamente, por sangramentos, infecção, pelo Parvovírus (crise
aplástica), seqüestro esplênico ou hepático, hemólise por deficiência de glicose-6fosfato-dehidrogenas (G6PD), infecção por Mycoplasma ou Malária. Geralmente
manifesta-se por dispnéia, hipotensão, cansaço acentuado ou insuficiência cardíaca
congestiva, com Hb < 5 g/dl, podendo ocorrer morte súbita por colapso cardiovascular e
cronicamente, por insuficiência renal crônica (ROSSE et al, 1998).
Um dos processos fisiopatológicos mais conhecido, a desoxigenação, leva à
polimerização da hemoglobina S (HbS), e consequentemente à falcização das hemácias
e numerosos fatores condicionantes podem intensificar ou diminuir os efeitos, gerando
uma impressionante variabilidade clínica. Dentre os principais fatores que podem
influenciar o fenótipo das doenças falciformes pode-se destacar o genótipo da doença:
homozigose para HbS (anemia falciforme) ou genótipos compostos do tipo HbS/HbC,
HbS/beta-talassemia, HbS/HbD. Vale ressaltar que os fatores genéticos podem
influenciar no processo de polimerização da HbS, no fenômeno de falcização e na
hemólise. Fatores ambientais como o local onde vive o paciente, prevalência de doenças
infecto-contagiosas, condições socioeconômicas e acesso à assistência médica também
tem grande repercussão no quadro clínico da doença.( Zago e Pinto, 2007).
Outro órgão bastante afetado e que tem serias consequências clínicas é o
endotélio vascular constituindo um fator muito importante no processo inflamatório e de
vaso-oclusão. As células endoteliais participam na manutenção da hemostasia e
produzem óxido nítrico, substância vasodilatadora que regula o tônus vascular. O
endotélio lesado expõe fator tecidual, que desencadeia a cascata da coagulação e libera
multímeros de von Willebrand que participam da hemostasia primária. A hemólise
crônica de hemácias falciformes libera hemoglobina livre e arginase, enzima que utiliza
o substrato usado para a produção de NO. A depleção de substrato e o seqüestro de NO
causam redução local desta substância e vasoconstrição. O fenômeno de vasoconstrição,
por sua vez, retarda o fluxo sangüíneo e favorece a falcização das hemácias falciformes,
quadro bastante característico da crise vaso-oclusiva (Graido-Gonzales et al, 1998).
Outras consequencias fisiopatológicas da doença falciforme são a crise aplástica,
as crises hemolíticas e a crise de seqüestro esplênico. As crises aplásticas costuma
ocorrer nos primeiros anos de vida; diante da infecção por parvovírus, que provoca uma
parada passageira de eritropoese. Em indivíduos normais, a aplasia transitória produzida
pela infecção viral passa despercebida, pois resulta em queda pouco acentuada dos
níveis de hemoglobina. Todavia, em pacientes com anemia falciforme, já anêmicos
apesar de hiperplasia eritróide, a supressão da eritropoese por alguns dias é suficiente
para agravar acentuadamente a anemia (ZAGO; PINTO, 2007).
Alguns tipos de vírus estão associados à crise aplástica transitória em pacientes
com anemia falciforme principalmente o parvovírus B19 (Borsato et al, 2000). Seu
principal alvo é a célula eritróide imatura. Uma vez que os pacientes portadores de
anemias hemolíticas crônicas têm uma acentuada hiperplasia compensatória da série
eritróide, a infecção pelo parvovírus B19, além de outros vírus, promove uma destruição
das células eritróides imaturas, com conseqüente parada da produção de glóbulos
vermelhos, levando a uma intensificação da anemia já existente (Saarinem et al, 1986).
As crises hemolíticas caracterizam-se por um aumento brusco na taxa de
hemólise, estando tal crise associada a infecção por mycoplasma, deficiência de G6PD
ou esferocitose hereditária. É importante frisar que para se confirmar tais indícios é
nescessário afastar outras possibilidades que podem simular a mesma enfermidade
como: elevação de bilirrubinas na obstrução por cálculo de vesícula, hepatite ou ainda a
falcização hepática (ZAGO, 2004).
A maioria dos pacientes é transfundida em algum momento da vida (60% aos
20 anos de idade), havendo tendência de se formarem múltiplos anticorpos. Mesmo com
a possibilidade de 30% deles desaparecerem, poderão acontecer reações anamnésticas a
transfusões futuras, causando reações transfusionais, hemolíticas, tardias, 05 a 20 dias
após, por anticorpos indetectados no pré-transfusional, que poderão ocasionar piora da
anemia, CVO e morte (ROSSE et al, 1998).
As crises de seqüestro esplênico são marcadas pelo acúmulo rápido de sangue
no baço, baixos níveis de hemoglobina, hiperplasia compensatória de medula óssea e
aumento rápido do baço. Tais complicações são mais freqüentes após o sexto mês de
vida com redução das crises depois dos dois anos de vida (ZAGO, 2004). Caracterizado
por esplenomegalia, dolorosa, maciça, em crianças (baço 4-10 cm), acompanhado de
anemia, com queda da Hb de 2 g/dl abaixo do valor basal, plaquetopenia < 100.000 ml e
reticulocitose. Pode caminhar rapidamente para o choque hipovolêmico e morte, sendo,
portanto, uma emergência transfusional, devendo ser tratada com transfusão rápida de
eritrócitos 10-20 ml/kg em uma hora. Após a transfusão, há a possibilidade de ocorrer o
fenômeno de overshoot, ou seja, hiperviscosidade por grande elevação do Ht, por causa
da liberação dos eritrócitos sequestrados (ROSSE et al, 1998).
A recorrência da crise é em torno de 50%, podendo ocorrer, inclusive, em
adultos com hemoglobinopatia SC, e o tratamento definitivo é esplenectomia.
Recomenda-se que o paciente seja vacinado e mantido em profilaxia penicilínica a vida
toda, após a cirurgia (ROSSE et al, 1998).
2. HEMOGLOBINOPATIA C
A hemoglobinopatia C é constituída por duas cadeias de alfa globina e por duas
variantes da globina beta em que o radical lisina é substituído pelo ácido glutâmico. A
hemoglobina torna-se instável e precipita-se formando cristais no interior dos eritrócitos
diminuindo, dessa forma, a elasticidade das hemácias tendo com conseqüência o
aumento da viscosidade do sangue (NAOUM, 1987).
Há uma prevalência desta sindrome entre 5 e 30% em varias regiões da África
(NAOUM, 1985). Na forma heterozigota, esta condição é assintomática, todavia os
indivíduos homozigotos para esta variante são sintomáticos caracterizados pela anemia
hemolítica de leve a moderada. Este quadro clínico proporcionado pela HbC deve-se a
sua capacidade de induzir a desidratação dos eritrócitos e a formação intra celular de
cristais. A dupla heterozigose HbS/C leva a uma desordem falciforme grave, contudo,
menos severa que a anemia falciforme (SOMMER et al., 2006).
A HbC é menos solúvel que a HbA em tampão fosfato diluído, mesmo dentro
dos eritrócitos. Essa característica físico-química da HbC permite, sob condições
especiais de secagem parcial, observar células em alvo e a formação de cristais dentro
dos eritrócitos (NAOUM, 1987).
Esta mesma variante teve origem na áfrica e sua propagação foi extensa nas
regiões do Mediterrâneo e Américas por meio do tráfico de escravos, em várias épocas
da história da humanidade. Tal processo de distribuição de gene da hemoglobina
possibilitou a sua interação com outras hemoglobinas variantes e talassemias, tão
intensamente observado na população brasileira (SOMMER et al., 2006).
3. HEMOGLOBINOPATIA D
A hemoglobinopatia D é uma variante que apresenta mobilidade eletroforética
semelhante a da HbS, entretanto não ocorre o fenômeno da falcização dos eritrócitos.
Tal ocorrência torna-se possível quando há associação desta variante com a HbS(forma
heterozigota). Somente a forma HbDD causa discretas anemia e esplenomegalia
(LORENZI, 1999).
O diagnóstico da homozigose torna-se possível excluindo-se com cautela
estudos familiares, a interação da HbD com a beta talassemia com supressão. Há
também uma preocupação no tocante a uma diferenciação de um paciente com HbSS
devendo, nessa situação, ser feito eletroforese em PH ácido para a distinção de um
paciente HbSS e de um paciente HbSD. Para maior segurança no resultado laboratorial,
ressalta-se,quando possível, a realização de análise das hemoglobinas dos pais
(CANÇADO; JESUS, 2007).
A introdução da hidroxiuréia (HU) também teve impacto na qualidade de vida
desses pacientes reduzindo o número de crises vaso-oclusivas, número de
hospitalização, tempo de internação, a ocorrência de Síndrome de tórax Agudo(STA) e,
possivelmente, de eventos neurológicos agudos (Steinberg, 2003). A observação de que
valores aumentados de Hb fetal (Hb F) previnem várias complicações da doença
falciforme (DF) conduziu os pesquisadores à busca por fármacos que estimulassem a
síntese de cadeias globínicas gama e aumentassem a síntese intraeritrocitária de Hb
F(Stevens, 1999).
A partir de fevereiro de 1998, a HU passou a fazer parte do arsenal terapêutico
para pacientes com DF e se tornou, nos anos subsequentes, o primeiro medicamento que
comprovadamente previne complicações clínicas, melhora a qualidade de vida e
aumenta a sobrevida de pacientes com DF (Charache et al 1995; Ballas et al, 2006).
4. DIAGNÓSTICO DA ANEMIA FALCIFORME
O diagnóstico da síndrome falcemica, fundamentado no diagnóstico laboratorial.
Os diferentes tipos de associação genética da Hb S, com destaque para a homozigose ou
Hb SS, interação com talassemia beta ou Hb S/Beta Tal, interação com talassemia alfa
ou Hb SH, e as duplas heterozigoses, Hb SC e Hb SD, necessitam de métodos
complementares como: eletroforese em agarácido, dosagem de Hb Fetal, pesquisa de
Hb H, etc) e, em especial o eritrograma.
A maior dificuldade é observada quando a eletroforese fraciona a Hb S com Hb
Fetal elevada (ex.: 15% de Hb Fetal), caracterizando a Hb SF. Nesses casos, a Hb Fetal
elevada pode estar relacionada a uma dessas três causas: persistência hereditária de Hb
Fetal associada à anemia falciforme; Hb Fetal elevada devido ao tratamento com
hidroxiuréia em paciente com anemia falciforme; interação Hb S/Beta talassemia
(Naoum, 2004).
A definição do provável diagnóstico laboratorial das doenças falciformes,
estabelecidas com base em procedimentos eletroforéticos, análise do eritrograma e
morfologia eritrocitária, pode ser completada pelas avaliações quantitativas das frações
de hemoglobinas e perfil cromatográfico, com rapidez e segurança, pela Cromatografia
Líquida de Alta Perfomance – HPLC.
A combinação desses resultados laboratoriais define condutas metodológicas
pré-moleculares e afastam as interações com as hemoglobinas similares à Hb S, como
são os casos da Hb D, Hb Korle-Bu e Hb G.( Bonini-Domingos e Zamaro, 2006). As
figuras 4 e 5 ilustram os procedimentos eletroforéticos em pH alcalino e ácido, onde se
fundamenta o diagnóstico das principais hemoglobinopatias.
Figura 4. Eletroforese em acetato de celulose pH 8,6
Observação: as setas na fita 2 indicam a presença de metahemoglobina, devido ao
envelhecimento de algumas amostras. Na fita 3, a seta indica a presença da mutante de
cadeia delta AB2
Figura 5. Eletroforese em pH 6,2 ágar - fosfato para diferenciação
F: Hemoglobina Fetal
A: Hemoglobina A
S: Hemoglobina S
5.1 Eletroforese de hemoglobina em meio alcalino (ph 8,0 – 9,0)
A hemoglobina é uma proteína carregada negativamente, migrando em direção
ao pólo positivo. Esse método identifica as hemoglobinas normais e grande parte das
variantes. As diferentes mobilidades verificadas entre as diversas hemoglobinas com
defeitos estruturais se devem as alterações de cargas elétricas, causadas por
substituições de aminoácidos de diferentes pontos isoelétricos. As hemoglobinas que
envolvem
alterações
de
carga
elétricas,
geralmente
apresentam
mobilidade
eletroforética semelhante à da Hb A; nesse grupo situam-se as maiorias das
hemoglobinas instáveis (BANDEIRA et al, 2003).
5.2 Eletroforese de hb em ph meio ácido
O emprego da eletroforese em ágar pH 6,2 é específico para diferenciar alguns
tipos de hemoglobinas mais lentas do que a Hb A, quais sejam: HbS da HbD e HbC da
HbE, que migram em posições similares em eletroforeses alcalinas. Por essa técnica as
hemoglobinas S e C separam-se da Hb A, enquanto as hemoglobinas D e E migram na
mesma posição da hemoglobina A (BANDEIRA et al, 2003).
6. TALASSEMIAS
São caracterizadas por apresentarem defeitos na taxa de produção das cadeias de
hemoglobinas, ou seja, quando a síntese de globina alfa está diminuída em relação à globina
beta, denomina-se talassemia alfa e quando ocorre o inverso, trata-se da talassemia beta.
Erros nas proporções de globinas alfa e/ou betas sintetizadas acarretam nas talassemias (alfa
ou beta-talassemia, de acordo com a cadeia cuja síntese está prejudicada). As talassemias
podem ser resultantes de deleções como é o caso das alfa-talassemias. Tais deleções
decorrem como conseqüência de trocas desiguais entre duas regiões homologas entre os
genes a-1 e a-2. Outra conseqüência dessas recombinações é a produção de cromossomos
com três genes a (figura 2) (NAOUM, 1987).
Figura 7 - Esquema representativo dos prováveis mecanismos que originam as αtalassemias. O deslizamento, o pareamento homólogo e a recombinação entre o gene α1
e o gene α2 resultam na deleção ou no ganho de um gene α.
Fonte: THOMPSON et al, 2004.
Essas doenças são marcadas clinicamente pela presença de anemia e são mais
freqüentes em populações descendentes de grupos originários do Mediterrâneo
(italianos, espanhóis, entre outros).
Quanto às manifestações clínicas, estas dependem do número de genes
talassémicos presentes. Por exemplo, surge o quadro de hidroxsia com morte fetal
quando se expressa à forma homozigótica, na qual quatro genes estão afetados, sendo
considerada a forma mais grave. Tal gravidade diminui à medida que existem três, dois
ou apenas um gene talassêmico (LORENZI, 1999).
No feto, a deficiência de globina α produz um excesso de cadeias ‫ ﻻ‬e, após o
sexto mês de vida, o excesso deve-se à globina β, que se tornam livres. Essas cadeias
livres formam tetrâmeros denominados de Hb Bart`s (‫ﻻ‬4) e Hb H (β4). A formação
desses tetrâmeros condiciona a fisiopatologia da talassemia α. As talassemias α são
classificadas em quatro categorias de acordo com o nível de expressão do gene α: (1)
portador silencioso, com perda de um único gene (-α/αα); (2) o traço alfa talassêmico,
no qual há perda de dois genes alfa de um único cromossomo (--/αα) ou de um gene α
de ambos os cromossomos (-α/- α); (3) a doença da hemoglobina H, na qual apenas um
gene alfa é funcional (--/-α) e (4) a hidropsia fetal, caracterizada pela a ausência dos
quatros genes alfa (--/--). (SANDRINE et al., 2005).
As talassemias alfa se devem principalmente por defeitos herdados na
expressão dos genes que codificam as globinas α atingindo de um a quatro destes genes,
embora, defeitos de síntese também podem ocorrer de forma adquirida (WAGNER et.
al., 2005).
As Talassemias surgiram no Brasil ao longo do processo evolutivo e
juntamente com a migração. Exemplo disso foi o ciclo do ouro em Goiás. A exploração
do ouro em Goiás trouxe um grande impacto na qualidade de vida do povo goiano, com
alterações hereditárias das hemoglobinas representadas principalmente pela talassemia
alfa. Isso por sua vez, devido à introdução e contribuição de forma aleatória e sem
controle de diferentes etnias assinaladas por escravos, italianos, alemães, espanhóis,
japoneses, tailandeses, libaneses, sírios, gregos e por migrações internas de diferentes
lugares como, por exemplo, Minas Gerais, Pará, Maranhão, Bahia, São Paulo (MELOREIS, Paulo Roberto de et al, 2010).
Conforme dados da Associação Brasileira de Talassemia (Abrasta), a Região
Sudeste do Brasil, sobretudo o estado de São Paulo, possui o maior número de casos de
Talassemia. Na Região Nordeste, o estado de Pernambuco é o que mais apresenta
números de casos cadastrados. Dados representados nas tabelas 3, 4 e 5 (Abrasta).
Tabela -3 Número de casos de Talassemia Maior no Brasil
Fonte: Modificado de http://www.abrasta.org.br/
Tabela -4 Número de casos de Talassemia Intermediaria no Brasil.
Fonte: Modificado de http://www.abrasta.org.br/
Tabela - 5 Número de casos de Talassemia S-Beta no Brasil
Fonte: Modificado de http://www.abrasta.org.br/
Aproximadamente 2,7 milhões de brasileiros em 65 cidades de 16 estados do
Brasil, são portadores da talassemia minor. Esse tipo de talassemia, não demanda
tratamento por ser apenas uma característica genética, e não uma enfermidade. O
portador não apresenta sintomas e pode viver com esse traço sem nunca saber (Reis
PRM et al, 2005, Steagall, M).
No tocante a beta talassemia minor ocorre em praticamente todos os grupos
étnicos, sendo rara nos indivíduos brancos de origem norte-européia. É comum na
Grécia, Itália e não só entre os cipriotas gregos como entre os turcos, onde em algumas
regiões variam de 15 a 20%. Há também, uma prevalência de 5 a 10% na Índia, na
Tailândia e outras partes do sudeste da Ásia (BAIN, 2004).
As Beta-talassemias major são em muitos aspectos semelhantes às α talassemias.
Entretanto, a produção reduzida de b-globina causa uma anemia
microcítica hipocrômica e precipitação das cadeias a em excesso nas células precursoras
das hemácias, resultando numa eritropoiese ineficaz. Pacientes com deleções que
deixam pelo menos um dos genes g intactos têm uma de duas apresentações clínicas
dependendo da deleção: dbº-talassemia, ou um estado clinicamente benigno
denominado persistência hereditária da hemoglobina fetal (PHHF) (THOMPSON et al,
2004).
Os homozigotos com uma dessas afecções são viáveis porque o(s) gene(s) g
remanescentes permanecem ativos após o nascimento compensando a ausência de Hb A
pela síntese de Hb F. Alguns pacientes com PHHF não apresentam deleções, mas sim
substituições de um único par de bases. Supõe-se que tais mutações alterem a afinidade
de proteínas reguladoras essenciais à repressão pós-natal da expressão dos genes g
(THOMPSON et al, 2004).
7. DIAGNÓSTICO DAS TALASSEMIAS
Os diagnósticos diferencias imprescindíveis da beta talassemia minor precisam
serem elaborados com o traço alfa talassemico e anemia ferropênica. Com relação à beta
talassemia maior, esta apresenta hiperplasia eritróide acentuada e eritropoese ineficaz,
devido ao dano aos eritroblastos em desenvolvimento. Clinicamente, o paciente se
mostra com anemia grave, hepatomegalia, esplenomegalia e retardo de crescimento
(BAIN, 2004).
O diagnóstico da talassemia maior é sugerido pela presença de anemia grave
com eritrócitos muito hipocrônicos, numero moderado de células em alvo e história
familiar do mediterrâneo, contudo o diagnostico definitivo depende do numero elevado
de Hb F. No que se refere ao diagnostico da talassemia menor, esta apresenta RDW
normal, reticulócitos superior a 5%, CHCM de 30% ou mais e níveis elevados de Hb F
(RAVEL, 2005). No diagnostico diferencial a Hb costuma esta acima de 7 a 8g/dl e os
demais achados do sangue periférico também são intermediário entre os da talassemia
maior e os da talassemia minor. Ressalta-se a importância de exames adicionais nos
casos duvidosos, como a eletroforese da hemoglobina ou HPLC (BAIN, 2004).
8. DISCURSÃO
A população brasileira caracteriza–se por apresentar grande heterogeneidade
genética, derivada da contribuição dos seus grupos raciais formadores, por si também já
muito diversificados, e dos diferentes graus com que eles se intercruzaram nas várias
regiões do país. A miscigenação da população brasileira é resultante das imigrações que
ocorreram no período da colonização compreendido entre os séculos XVI e XIX, nos
quais o Brasil recebeu milhões de imigrantes europeus e asiáticos. A freqüência das
anemias hereditárias reflete a diversidade de origens raciais e os diferentes graus de
mistura entre brasileiros de cada região do país. (Salzano, 1982; Naoum, 1983; Teixeira
e Ramalho, 1994).
Assim, vale ressaltar que a detecção de indivíduos portadores das formas
imperceptíveis de hemoglobinopatias, os heterozigotos, são extremamente importantes
para a saúde pública, pois, além de representarem fonte de novos heterozigotos, podem,
através de casamentos entre portadores, originar indivíduos homozigotos e duplos
heterozigotos. Os indivíduos homozigotos diagnosticados deverão ser devidamente
encaminhados à orientação médica para tratamento precoce, minimizando as
manifestações clínicas. Dessa forma, os pontos fundamentais de um programa
preventivo de hemoglobinopatias compreende a divulgação da informação à população,
o reconhecimento de heterozigotos, diagnóstico neonatal, e aconselhamento genético
(Silvestroni, 1978).
Logo se infere que a prevalência das anemias hereditárias na população é
variável entre as várias regiões brasileiras, pois está intimamente ligada ao processo de
formação étnica de cada uma delas (Viana-Baracioli et al, 2001), o que se torna cada
vez mais evidente que os casos de anemia hereditária devem ser pesquisados
habitualmente em todos os pacientes que tenham ou não alteração no eritrograma, uma
vez que, quanto mais precocemente houver o diagnóstico, acompanhamento médico e
aconselhamento genético, mais chances de diminuição da morbidade, mortalidade e
transmissãogênica.
Para o diagnóstico neonatal utiliza-se, geralmente, o sangue de cordão
umbilical, e nesta fase de vida, os componentes hemoglobínicos que predominam são a
HbF (90 a 100%), a HbA (0 a 10%) e a Hb A2 (0 a 1%). Após o nascimento e até
aproximadamente seis meses de vida haverá a inversão na produção das cadeias
hemoglobínicas, podendo ser observados os valores definitivos do indivíduo adulto:
HbA (96 a 98%), HbA2 (2,5 a 3,7%) e HbF (0 a 1%). Já o diagnóstico neonatal,
principalmente nas alterações de cadeia beta, como é o caso das falcemias, só são
encontrados os traçados eletroforéticos característicos após o sexto mês de vida. Na fase
neonatal apenas traços das hemoglobinas anormais de cadeia beta podem ser
visualizados (Naoum, 1987).
Com relação aos programas preventivos de anemia falciforme em neonatos, são
utilizadas eletroforeses alcalina e ácida. Os testes de solubilidade para a triagem de HbS
são desaconselhados, uma vez que, estes não permitem distinguir indivíduos AS, SS ou
SC. Além disso, em neonatos, estes testes costumam ser negativos devido à pequena
concentração da HbS. Entretanto, podem ser utilizados como testes de confirmação após
a eletroforese alcalina (Naoum, 1987; Dumars
et al, 1996). É importante uma
tecnologia adequada para o diagnóstico, utilizando vários testes laboratoriais seletivos e
de confirmação, dados clínicos e estudo familial, bem como a formação de pessoal
capacitado para o diagnóstico laboratorial correto.
9. CONCLUSÕES
No Brasil, a introdução das hemoglobinopatias ocorreu com a entrada dos
escravos negros africanos e da subsequente mistura racial, a qual teve grande influência
na dispersão dos genes anormais. A distribuição das hemoglobinas anormais,
provenientes de formas variantes e talassemias, estão relacionadas com as etnias que
compõem nossa população. Dentre as hemoglobinas variantes, as mais freqüentes na
população brasileira são a hemoglobina S (HbS) e C (HbC), ambas de origem africana,
mostrando a intensa participação do negro na composição populacional brasileira.
Contudo, em regiões que tiveram maior participação da colonização italiana, as
talassemias são mais freqüentes. No presente estudo é exposta a importância do
diagnóstico laboratorial de hemoglobinopatias, bem como as atividades de prevenção
que permitem o aconselhamento genético e o tratamento precoce nos casos de
homozigose. Ressalta-se, ainda, a importância do estudo populacional, que permite uma
visualização da distribuição das hemoglobinopatias na população brasileira, auxiliando
na elaboração de programas preventivos, pois podem auxiliar a comunidade por meio de
campanhas de esclarecimento nas escolas e em serviços de saúde da rede pública e
privada, nas quais se faz necessário o diagnóstico de indivíduos heterozigotos, o
aconselhamento genético e o diagnóstico neonatal, pois a
prevenção das anemias
hereditárias deve começar o mais precoce possível e deve ser feita através de ações
educadoras, de um diagnóstico laboratorial realizado por profissionais capacitados e por
estudo familiar. Ademais, ansiamos despertar na comunidade científica o interesse por
uma melhor investigação das anemias hereditárias, e na formação de equipe
multidisciplinar para participar de programas de educação, orientação e aconselhamento
genético dos afetados, tanto de homozigotos quanto de heterozigotos sem, contudo, ferir
preceitos ético ou morais, ou mesmo induzir a qualquer forma de segregação, e invasão
de privacidade do paciente.
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