“A, E, I, O, U - CABEÇA DE PERU”: O BRINCAR NA EDUCAÇÃO

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“A, E, I, O, U - CABEÇA DE PERU”:
O BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL
RESUMO
Paula Tauana Santos*
Lais de Santana Araújo*
Maria Helena Xavier Vieira*
O presente artigo analisa o resultado do projeto de
extensão “A, E, I, O, U - CABEÇA DE PERU”, que teve
a finalidade de integrar o acadêmico em Pedagogia
da Universidade Tiradentes, no contexto socioeducacional, fator que contribui para sua formação profissional através de atividades práticas voltadas para o
lúdico. Tal atividade busca a ampliação de uma ação
pedagógica contextualizada, propiciando o desenvolvimento integral do aluno. O projeto foi realizado
na instituição filantrópica Amelie Boudet que atende
crianças de educação infantil em período integral. Na
realização das atividades constatou-se que a Educação
Infantil, em alguns momentos, estava direcionada às
Roberta Alves Feitosa *
Isabel dos Santos Lima*
atividades recreativas numa perspectiva assistencialista; em outros, voltada para a alfabetização, numa
perspectiva conteudista, e o professor não tinha uma
formação específica para atuar na educação infantil.
Assim, espera-se contribuir para uma reflexão acerca do ensino infantil direcionado ao atendimento de
crianças de zero a cinco anos, enfatizando a importância da Didática na formação do educador.
PALAVRAS-CHAVE
Prática pedagógica, educação infantil, lúdico.
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ABSTRACT
This article analyzes the result of the extension
project called “A, E, I, O, U - HEAD OF TURKEY”, a
project which aimed to integrate the academic in the
Educational field of Universidade Tiradentes, in the
socio-educational context. This factor contributes to
the professional training through practical activities
aimed at entertaining. This activity seeks to expand a
contextualized pedagogical action, providing the full
development of the student. The project was carried
out on the philanthropic institution called Amélie
Boudet, which serves children from kindergarten
full time. During the activities, it was found that
early childhood education, at times, was directed
to recreational activities in a welfare perspective, in
others, it was focused on literacy, within a content
perspective, and the teacher had no specific training
to work in early childhood education. Thus, we
intend to contribute to a reflection about teaching
children from zero to five years old, emphasizing the
importance of didactics in teacher training.
KEYWORDS
Pedagogical practice, early childhood education,
entertainment.
1 INTRODUÇÃO
A educação infantil é uma das fases mais complexa do desenvolvimento emocional, intelectual,
motor e social do ser humano. Durante muito tempo
o ensino destinado aos pequeninos era voltado para o
assistencialismo. Não existia uma preocupação didática com uma proposta pedagógica que estimulasse
seu processo de aprendizagem. Depois, educação infantil foi destinada a preparar o aluno para o ensino
fundamental e tornou-se apenas preparatória, uma
visão compensatória, um ensino conteudista, que tinha apenas a função de transmitir conhecimentos.
No decorrer dos anos, a Educação Infantil passou por
transformações direcionadas para uma proposta pedagógica contextualizada, respeitando-se o ser criança, estimulando a capacidade de pensar, explorando o
lúdico como forma de aprendizagem tão presente no
contexto infantil. Através do brincar, a criança desenvolve o cognitivo, o emocional, o afetivo, o social e a
coordenação motora ampla.
A fim de que essa função se efetive na prática, o
trabalho pedagógico precisa ser direcionado para
uma perspectiva na qual o papel do professor seja
justamente saber compreender o ser criança, e proporcionar uma metodologia participativa, com a finalidade de que sua inserção social e no espaço escolar
seja construtiva, para tanto desenvolvendo sua autonomia, identidade, cooperação, respeito e solidariedade com os demais.
Diante disso, a função do educador não é apenas
transmitir os conteúdos, mas dar oportunidade para
a criança pensar, questionar e levantar hipóteses,
ou seja, criar condições para sua autodescoberta. É
através dessa prática investigativa, participativa e
dialógica que a criança desenvolve competências e
habilidades.
Como diz Piaget (1997), cada vez que tentamos
ensinar algo a uma criança estamos impedindo que
ela descubra por conta própria e, consequentemente,
que compreenda efetivamente. É necessário aceitar
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que, desde seus primeiros anos escolares, a criança
deva ser exposta à descoberta através de atividades
lúdicas que proporcionem seu desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo possibilitando um ambiente
escolar estimulante e afetivo.
A formação do profissional em educação infantil
é de suma importância para compreender e desenvolver uma proposta educacional de qualidade. Para
tanto deve ser fundamentada nos princípios da concepção de Didática, compreendendo-se a sua importância, que não é unívoca entre os teóricos da educação, sofrendo influência dos paradigmas que os
orientam. Para o clássico Comenius (1997), Didática
seria “a arte de ensinar tudo a todos”, o que aponta
para a perspectiva inclusiva. Interessante notar que
essa condição seja do século XVII, logo, não é de hoje
que se discute a educação inclusiva. Cordeiro (2009)
chama a atenção para a origem etimológica da palavra didática, que vem do verbo grego didaska, que
significa ensinar ou instruir. Segundo Luckesi (2001),
a função da Didática é a de criar condições para que
o educador se prepare técnica, científica, filosófica e
efetivamente para o tipo de ação que vai exercer.
A formação do professor de educação infantil
requer qualidades diversificadas desde o gostar de
crianças e saber como lidar com suas características
até compreender a evolução do seu desenvolvimento
cognitivo, motor e emocional, observando a evolução
das fases de desenvolvimento abordadas por Piaget,
a evolução do grafismo e sabendo explorar essas características na sala de aula. Ou seja, reconhecer as
crianças como seres sociais. Ter numa sala de aula
um professor que domina os conteúdos, possui um
bom planejamento e alunos motivados, não significa
que a aprendizagem aconteça naquele local. Para que
aconteça a relação ensino-aprendizagem, será necessário adotar diferentes procedimentos, selecionar
conteúdos, livros de histórias infantis, atividades de
artes que envolvam a música, a dança, as artes visuais
e o teatro. Também é desejável buscar complementá-las a fim de ampliar o acesso às informações e às
atividades propostas no material adotado, ou, ainda,
com o objetivo de adequá-lo ao grupo de alunos que
o utilizam.
Nesse contexto e com essas finalidades, propõe-se
que a Didática na Educação Infantil, longe de ser um
método ou uma receita, subsidie, através da relação
pedagógica, a oferta qualitativa do ensino em suas
dimensões linguística, pessoal e cognitiva. “Pensar o
ensino e a aprendizagem em termos da relação pedagógica implica admitir a complexidade da situação da
sala de aula e considerar as questões de ensino de um
ponto de vista dinâmico.” (CORDEIRO, 2009, p. 98)
Na contemporaneidade, a proposta da Educação
Infantil direciona para a importância de um trabalho
capaz de levar o educando ao desenvolvimento da
capacidade de pensar que está associada ao esforço
da educação, em todos os níveis, principalmente nos
primeiros anos escolares. No Brasil, a Constituição de
1988 reconhece como dever do Estado a obrigatoriedade da Educação Infantil como direito das crianças de
zero a cinco anos; além disso, ela também está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente. Ademais,
a Lei de Diretrizes e Bases na Educação nacional, de
1996, reconhece a Educação Infantil como primeira
etapa da educação básica. Em 1988, o MEC publicou
o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – o RCNEI, em três volumes oferecendo subsídios
para os projetos pedagógicos das prefeituras e das unidades de educação infantil. Cite-se, ainda, o Plano Nacional da Educação (2001) que aborda a importância
de desenvolver metas para proporcionar uma educação
de qualidade à primeira infância.
Numa perspectiva de investir no processo pedagógico da primeira infância, é papel fundamental do
educador ter um embasamento teórico necessário à
compreensão do ser criança para que possa, na sua
práxis pedagógica, estimular e criar condições para
que o educando possa explorar as riquezas do seu
meio; deve ainda o educador, oferecer-lhe uma diversidade de materiais, cujo manuseio lhe permita
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crescer e se desenvolver através da descoberta, pois a
manipulação com materiais concretos estará estimulando intelectualmente a criança. Com essa amplitude, a Didática apresenta-se como importante e capaz
de influenciar no processo de educar, em seu sentido lato que ultrapassa as relações escolares, embora
não possa ser considerada a única responsável pelos
resultados obtidos, sejam eles de sucesso ou de fracasso escolar. O ensino e a aprendizagem ocorrem a
partir da relação triádica entre o professor, os alunos
e o conhecimento, como esclarece Cordeiro (2009).
A criança que desde cedo é estimulada a pensar, a
questionar, através de propostas pedagógicas contextualizadas, terá oportunidade de aprender fazendo;
nesse cenário, o professor não é apenas o transmissor
de conhecimento e sim um mediador que explora a
criatividade do aluno de forma lúdica, utilizando uma
didática interligada ao desenvolvimento de capacidades cognitivas, psicomotoras e socioafetivas.
Dessa maneira, o presente artigo pretende abordar a prática extensionista realizada numa instituição
filantrópica na disciplina Fundamentos de Educação
Infantil, realizadas pelas alunas de Pedagogia da
Universidade Tiradentes, em Sergipe, como também
contribuir para uma reflexão acerca do ensino da Educação Infantil, destacando a importância da Didática
na formação do educador, a partir de pesquisa bibliográfica, que dá suporte teórico e do projeto de extensão desenvolvido com as alunas. O ponto de partida
foi realizar atividades que estimulassem o aprender
através da brincadeira em que as mesmas poderiam
vivenciar a função de ser professor.
O interesse para se desenvolver um projeto de extensão desse nível, surgiu devido à observação de que
as crianças, nessa instituição, estavam agressivas,
desestimuladas e o ensino ainda voltado para uma pedagogia tradicional. Percebeu-se também que o corpo
docente sentia dificuldade em desenvolver atividades
lúdicas contextualizadas, as crianças estavam condicionadas a copiar, a estudar o alfabeto, cobrir letri-
nhas, e ficavam muito tempo sentadas, fato este que
as deixavam impacientes, pois as mesmas permanecem período integral na instituição.
Diante das observações realizadas, como primeira
etapa para elaboração do projeto, foram detectados
os problemas e ouvidas as queixas dos professores
e alunos. A partir daí, como atividade da disciplina,
foram iniciados debates, pesquisa bibliográfica para
fundamentação teórica e organização do planejamento, com a finalidade de atuar em sala de aula. Assim
no LABRIME (Laboratório de Brinquedos e Materiais
Educativos ) foram realizadas as oficinas para a criação de jogos e brinquedos, como também oficinas de
arte no LAPEN ( Laboratório de Prática de Ensino):
englobando artes visuais, música, dança e confecção
de fantoches. Na atividade, os alunos tiveram oportunidade de criar e aprender a utilizar materiais que
muitas vezes são destinados ao lixo, mas podem ser
transformados em recursos didáticos para complementação das aulas.
A didática utilizada foi a direcionada a atender o
desenvolvimento infantil, resgatar sua função pedagógica que é proporcionar às crianças oportunidades
de vivenciar sua fantasia, o faz de conta de forma criativa e participativa. É motivo para a escola valorizar e
incentivar as crianças a pôr a mão na massa, transformando a curiosidade em algo produtivo, estimulando-a a relacionar o ensino ao seu cotidiano, despertando
o desejo de aprender. Para isso, é pertinente analisar
as necessidades de formação continuada do professor
destinado a agir nessa nova perspectiva, e as transformações necessárias para o atendimento a essa diversidade de formas de vida, num compromisso com
uma educação que mostre a participação da educação
infantil para o desenvolvimento integral da criança.
Segundo dados da Política de Educação Infantil
(Relatório de Avaliação 2009), o ensino ainda passa
por entraves que vai desde a formação do professor,
metodologia, como também espaços inadequados
para atender as crianças de zero a cinco.
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A base teórica que fundamenta nossa posição circunscrever-se-á aos estudos de Piaget (1977), Edgar
Morin (2002), Charlot (2006), Kramer (2004); documentos como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB, 1996) e Parâmetros Curriculares Nacionais (1977), entre outros renomados educadores.
O objetivo dessa proposta é mostrar que, a partir
de uma via metodológica alternativa, pode-se corroborar e superar o processo de ensinar e aprender fragmentado, disciplinar, descontextualizado, unilateral,
direcionador que se constata ainda nas práticas pedagógicas dos professores na Educação Infantil.
Nesse sentido, embasamo-nos teoricamente e
metodologicamente a fim de analisar e refletir acerca da realidade observada, no intuito de trazer algumas contribuições quanto à proposta do ensino para
a educação infantil, numa visão contextualizada promovendo um ambiente estimulante na promoção da
cidadania.
2 EDUCAÇÃO INFANTIL E A PRÁXIS PEDAGÓGICA
DOCENTE
No contexto do modelo capitalista, a educação
está voltada para as características regentes desse
modo de produção da existência como: exploração,
lucro e produtividade. A educação passa a ser uma
atividade planejada, que tem objetivos e que requer
resultados visando a participar do processo de desenvolvimento econômico em que ciência e tecnologia são vistas como meios de produção e a educação,
necessariamente, como formadora de mão de obra,
mediante o trabalho escolar de pesquisa, ensino e extensão. Embora a educação na sociedade capitalista
acabe sendo considerada uma mercadoria ou até capital humano, é de fato um bem disputado como direito humano subjetivo e pelo próprio desenvolvimento
capitalista que requer qualidade desde a educação
básica até a superior, demandando novos atributos na
formação do trabalhador.
O processo histórico da educação brasileira, assim
como em vários países, é caracterizado pelas determinações de dois modelos de sociedade: a feudal e a
capitalista. Na sociedade feudal, a educação oferecida estava fundamentada na escolástica.
Este ensino priorizava a forma lógica de organização do pensamento do professor para a exposição de
argumentos “pró” e “contra” uma questão colocada
por ele. A esta, o aluno devia apresentar argumentos e
objeções, até chegar a um argumento único que geralmente revela a posição do mestre. (DAMIS, 2010, p.17)
A educação deve ser vista como uma mediação
entre as relações sociais. Também, passa a ser reconhecida em três modalidades: a educação formal, que
acontece na escola, a informal, que se desenvolve nas
relações sociais e a educação não formal, que acontece na família, na igreja, em associações, em empresas
etc. A aprendizagem ocorre nos diversos espaços.
Desde o século XVII, quando surgiu à didática, o
seu conceito vem sendo tema de discussão. Comenius, Herbart, Montessori, Alain, Dewey, Decroly,
Lourenço Filho, Freinet, Neill, Paulo Freire, Snyders,
entre outros, construíram modelos didáticos que ora
se igualam, ora se contradizem, isso porque eles tentaram responder aos problemas educacionais de suas
respectivas época. Em cada situação a didática adotada por eles significou muito para o progresso do
ensino.
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Tomar consciência que a Didática hoje oscila entre
diferentes paradigmas pode ser algo muito auspicioso
para a comunidade pedagógica. Na verdade ela nunca
foi monolítica: é o que prova a própria necessidade de
adjetivação adotada tantas vezes: Didática renovada,
ativa, nova, tradicional, experimental, psicológica,
sociológica, filosófica, moderna, geral, especial etc..
(CASTRO, 1991, p.21)
Na maioria das vezes, a tendência de didática que
predomina está relacionada ao aspecto técnico e instrumental, ou seja, à forma como o professor deve organizar e desenvolver o ensino dos conteúdos. Tomando como referência a didática proposta por Comenius,
criada no período de transição do feudalismo para o
capitalismo, século XVII, a Didática Magna, “toda juventude, com tão diversas índoles, pode ser educada e
formada por um único método, primeiro, único e idêntico” (COMENIUS, 1997), com nove princípios básicos:
Primeiro princípio: A natureza aguarda o momento
propício.
Segundo princípio: A natureza prepara a matéria antes
de começar a introduzir-lhe a forma.
Terceiro princípio: Ao obrar, a natureza toma um indivíduo apto e prepara-o antes, oportunamente.
Quarto princípio: Em suas obras, a natureza não procede confusamente, mas de modo claro.
Quinto princípio: A natureza começa todas as operações pelas partes mais internas.
Sexto princípio: A natureza inicia todas as suas formações pelas coisas mais gerais e acaba pelas mais
particulares.
Sétimo princípio: a natureza não procede por saltos,
mas gradualmente.
Oitavo princípio: depois e iniciar uma obra, a natureza
não a interrompe, mas conclui.
Nono princípio: a natureza está sempre atenta para
evitar as coisas contrárias e nocivas. (COMENIUS,
1997, p. 147-163)
A arte de ensinar sugerida por Comenius, através
do seu modelo didático, dá ênfase ao processo de
ensino, porém está restrita apenas ao aspecto técnico e metodológico: o como ensinar e o para quê. Na
atualidade, a didática que está envolvida na prática
educativa deve ser vista a partir da relação sociedade-educação, segundo a qual a prática não é neutra.
Sendo assim, tomando consciência ou não da função
ideológica que tem a sua prática, o educador sempre
reproduz uma ideologia.
Nesse sentido, Damis (2010) sugere compreender
a didática a partir de uma forma teórico-prática que
visa à convivência do homem em sociedade:
O objeto de estudo passa a ser uma forma de ensino que busca adequar e preparar o aluno para a vida
social, essa forma, além do aspecto técnico-operacional, possui um conteúdo que é determinado pelas
condições e necessidades predominantes na prática
social mais ampla. (DAMIS, 2010, p.22)
Essa concepção de didática visa a auxiliar na compreensão crítica da arte de ensinar. Sabendo que a didática muda conforme a mudança dos paradigmas, e
dizendo que o seu objeto de estudo é ensino-aprendizagem do aluno, é possível afirmar que diante do contexto social em que vivemos, a didática que ajudará
ao educador em sua prática pedagógica é aquela que
permite o desenvolvimento do ser humano em todas
as áreas, e não aquela que se limita ao avanço cognitivo intelectual (CASTRO, 1991). Para cumprir essa função ela deverá apresentar-se como mediação entre o
fazer pedagógico e o contexto sociopolítico e cultural.
O papel da Didática na formação do educador é
fundamental para ajudá-lo em sua práxis pedagógica,
pois a contribuição que ela desempenha no campo
educacional nenhuma outra disciplina poderá cumprir, como elucida Castro (1991).
O ensino só tem eficiência quando o educador
deixa de ver a didática como orientações mecânicas
e tecnológicas e passa a tê-la como um meio de fazer
despertar o gosto por conhecer e aprender. O educador pode desenvolver essas aptidões através de projetos.
O projeto ainda pode propiciar diferentes mecanismos de trabalhar o processo de aprendizagem não
só na área cognitiva, mas também na motora, quando
colocamos o corpo para resolver determinadas situa-
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ções-problema, assim como nas áreas afetiva, social,
emocional, etc. ao buscar o equilíbrio e desenvolvimento das inteligências inter e intrapessoal. Outra
característica marcante nos projetos é a possibilidade
do desenvolvimento em múltiplas áreas do conhecimento. (NOGUEIRA, 2005, p.95)
A didática se apresenta como uma proposta de
ação reflexiva, através da qual o educador faz acontecer, porém ciente do seu papel transformador na
sociedade. Há quem diga que essa é uma idealização
do profissional educador, porém acreditamos nessa
possibilidade de intervenção.
A Educação Infantil, numa proposta contextualizada, ressalta um trabalho pedagógico diferenciado
da pedagogia tradicional. Esta percebe o mundo de
forma estática e homogênea, cabendo ao professor o
papel de transmitir informações prescritas a alunos
passivos, produzindo um processo de desumanização
das relações, esvaziando o processo de ensino–aprendizagem de todo sentimento que o envolve. Uma situação bastante comum nas escolas infantis – a de
preparar as crianças para o ensino fundamental.
A preparação da prontidão, como é chamada, não
se constitui, entretanto, em uma tendência pedagógica da educação de crianças menores de 6 anos. Ela representa, na verdade, uma desconsideração quanto à
especificidade dessa educação e uma espécie de “prolongamento para baixo” ou antecipação da perspectiva
mais tradicional da educação do Ensino Fundamental.
Baseada em treinamentos, a “preparação” visaria, assim, à “aceleração” ou à compensação de carências.
Tal forma de encarar a função da educação infantil
pode ser encontrada tanto em muitas propostas “românticas” quanto em algumas cognitivas, principalmente quando as crianças se aproximam de 06 anos
de idade. Por não levarem em consideração os determinantes sociológicos e antropológicos do processo
educacional, e por terem uma concepção da criança
apenas como “futuro adulto” é que estratégias se voltam apenas para a preparação. (KRAMER, 1999, p.25)
A proposta pedagógica deve ser voltada para os
princípios didáticos de valorização dos interesses e
necessidades das crianças, além do respeito ao processo de maturação, desenvolvimento natural e o estímulo de atividades lúdicas que envolvem o mundo
infantil como o faz de conta, a imaginação, a imitação,
tão presentes no seu cotidiano, nas suas brincadeiras.
A mágica de transformar carteiras em trenzinhos para
brincar, a vassoura em um cavalo para cavalgar ou
mesmo falar “a, e i, o, u cabeça de peru!” mostra como
a criança é esperta, criativa; e, partindo dessas habilidades, é que os educadores devem propiciar uma
práxis pedagógica prazerosa.
O educar é justamente valorizar as histórias de
vida das crianças, ter carinho, afetividade no processo de construção do saber contribuindo para o seu
desenvolvimento, o respeito a si mesmo e ao próximo.
Saberes são construídos e ampliados através da
vivência. É possível pensar numa educação que desde
a tenra infância trabalhe para a construção contextualizada do conhecimento valorizando a complexidade dos saberes que permeia o contexto social em
que vivemos. Cabe ao educador em educação infantil
perceber que o processo de ensinagem vai mais além
do que apenas informar ou brincar, mas sim ter um
olhar diferenciado, desenvolver uma práxis reflexiva
para proporcionar às crianças o prazer em aprender.
3 O LÚDICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
No início do séc. XX começou-se a questionar o
ensino conteudista. Nessa época surgiram novos métodos de ensino que valorizavam o contexto social do
aluno, tanto o seu conhecimento, como respeitando a
sua singularidade.
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Nessa perspectiva, o indivíduo não é mais visto
como um ser isolado, que não tem nenhuma bagagem
de conhecimento e precisa que a escola insira o saber
de uma classe dominante, como referencial para ter
uma vida digna e sucesso social e profissional. Esses,
foram tempos de rupturas, de valorização do indivíduo
dentro do seu contexto e de sua cultura, com respeito
a sua história de vida.
Entretanto observamos que os vestígios do ensino
tradicional ainda são muito fortes no contexto educacional. A criança ainda é vista como um depósito de
conhecimento, com cita Paulo Freire nos seus estudos, nos quais enfatiza a importância de uma educação libertadora que estimule o pensamento crítico e
o conhecimento cotidiano no contexto sócio cultural
do sujeito.
Para tanto, é importante que o professor aceite a
posição de aprendiz junto ao aluno, e não se veja como
depositário absoluto do saber. O professor deve ser o
incentivador do trabalho do aluno, não dar respostas
e sim fazê-los descobrir e apresentar sua resposta.
Professor tem o papel de mediador do conhecimento,
os alunos, por seus próprios passos, devem procurar
solucionar os problemas que são lançados para eles.
Isso é construir um saber de uma forma compartilhada, estabelecendo vínculos e compartilhando
saberes. O professor é aquele que cria situações que
possibilitem o desenvolvimento de conceitos e habilidades. Somente se assumir esta função, o professor
conseguirá, efetivamente, que o aluno consiga aprender. Caso contrário o desinteresse pela disciplina leva
os alunos a uma situação de fracasso escolar.
Existem, é claro, alunos que não conseguem
acompanhar o ensino que lhes é dispensado, que não
adquirem os saberes que supostamente deveriam adquirir que não constroem certas competências, que
não são orientados para a habilitação que desejariam alunos que naufragam e reagem com condutas
de retração, desordem agressão. É o conjunto desses
fenômenos, observáveis, comprovados que a opinião,
a mídia, os docentes agrupam sob o nome de “fracas-
so escolar”. [...] O fracasso escolar não é o monstro
escondido no fundo das escolas e que se joga sobre
as crianças mais frágeis, um monstro que a pesquisa
deveria desemboscar, domesticar, abater. O “fracasso
escolar” não existe; o que existe são alunos fracassados, situações de fracasso, histórias escolares que
terminam mal. (CHARLOT, 2000, p.14)
Enfim, isso exige da escola clareza quanto às suas
intenções e suas ações. As situações de ensino-aprendizagem, nessa perspectiva, hão de dar conta do que
é concreto e significativo na realidade do aluno e, ainda, daquilo que ele precisa alcançar em matéria de
conhecimento elaborado, para tornar maior seu entendimento sobre o real e potencializar uma atuação
mais consciente, consequente e eficaz. O ensino deve
informar e interpretar a vida, produzindo aprendizagens significativas que desenvolvam as potencialidades, habilidades, aptidões, capacidades mentais e, ao
mesmo tempo, fortaleçam a autonomia, o sentido de
partilha, de cooperação, de ajuda mútua, assim como
o sentimento de solidariedade, de coesão e união e de
comprometimento consigo mesmo, com o outro, com
o grupo e com a própria vida.
O aprender brincando proporciona prazer e desperta o desejo de aprender. As brincadeiras, histórias,
dramatizações, músicas proporcionam um mundo
mágico para as crianças. Isso não impede que os saberes formais do contexto escolar sejam introduzidos
pelo professor a todo o momento, pois estão interligados. Não há necessidade de momentos para matemática, momentos para português, etc.. Os saberes estão
voltados para a transdisciplinaridade. A complexidade
dos saberes é pertinente a um conhecimento integrado ao contexto desenvolvido em sala de aula, proporcionando a construção de conhecimentos; construção
de si mesmo, como sujeito criativo e pensante.
Brincar permite –nos fazer a experiência de tomar
a realidade do objeto para transformá-la ou, o que
é o mesmo, de transformar a realidade aceitando os
limites que ela nos impõe .O pensamento nasce nesse momento com o intuito de resolver tal desafio.
(FERNANDEZ,2001,p. 128)
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Assim percebemos que o ato de brincar como proposta pedagógica na Educação Infantil vai mais além
do que passar tempo, mas solidifica saberes e cria
autonomia, responsabilidade, libera a inteligência
e proporciona momentos de prazer e satisfação em
aprender.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto conclui-se que, mesmo com
a dificuldade de recursos didáticos e falta de espaço adequado para realizar as tarefas, a aplicação do
projeto contribuiu para o desenvolvimento cognitivo,
afetivo, e social das crianças, estimulou o professor
a realizar uma metodologia participativa com seus
alunos e proporcionou aos alunos uma vivência enriquecedora, possibilitando o seu crescimento social e
profissional como futuros educadores.
Na instituição observada detectou-se a necessidade de um novo olhar sobre a proposta de ensino
na área da educação infantil, mais contextualizada e
relacionada com o brincar, tão presente na vida das
crianças. Elas gostavam das brincadeiras proporcionadas pelos estudantes e pediam que as repetissem.
Constatou-se que o barulho, a dispersão não aconteceu, elas ficavam atentas, e todos queriam participar.
Por outro lado, o professor reclama da falta de recursos pedagógicos que dificultam o ensinar através de
atividades lúdicas integradas ao desenvolvimento
global da criança.
A Educação Infantil perpassa por momentos de reflexão e questionamentos. O Ministério da Educação
(MEC) está desenvolvendo ações para implementação
de políticas públicas que atendam de forma digna as
crianças das creches e da pré-escola. Crianças são cidadãs e têm o direito à educação, saúde, assistência,
acesso a bens e serviços.
Como afirma Kramer (1999), crianças são sujeitos
sociais e históricos, marcados pelas contradições das
sociedades em que estão inseridas. Nessa visão reco-
nhece o papel da educação infantil, o que é fundamental na infância – seu poder de imaginação, criação,
fantasia, o brincar na construção do conhecimento. A
maneira de ver as crianças numa perspectiva contextualizada proporciona não só entendê-las, mas ver o
mundo a partir do ponto de vista da infância. Propostas pedagógicas que respeitem a singularidade de ser
criança, possibilitando estimular o seu pensamento
crítico através de atividades práticas e contextualizadas, envolvem uma perspectiva de concepções que
precisam ser trabalhadas pela escola, pois o aprender
se torna fascinante quando não fica só na teoria.
No entanto, a eficiência no ensino depende de
medidas que subsidiem uma educação de qualidade,
respeitando as diferenças, investindo no espaço físico, materiais didáticos, valorização do profissional em
educação infantil, com um número pequeno de crianças por professor, pois, nessa faixa etária, as crianças
precisam de atenção bastante individualizada em
muitas circunstâncias e requerem mais cuidados dos
adultos. Além disso, é necessário e importante o investimento na formação continuada do professor.
Assim, a educação infantil é fundamental para desenvolver na criança o espírito da solidariedade, respeito ao seu semelhante, saber compartilhar, aprender a viver juntos, desenvolvendo o conhecimento
acerca dos outros, da sua história. A educação infantil
é essencial para a plena realização do ser humano e a
sua integração social e, consequentemente, é necessário estar implícito no currículo respeitando a diversidade, no que se refere à classe social, etnia, cultura,
sexo.
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Neste sentido, é fundamental na formação do educador uma educação para a cidadania, através da qual
a didática tenha papel relevante na formação do cidadão, utilizada do ponto de vista da relação sociedade-educação, onde a prática da educação é reconhecida como intencional e que busca a emancipação do
indivíduo, ou seja, que contribui para o exercício da
cidadania, para a convivência social.
Porém, quando reduzida apenas como um subsídio
metodológico, ela pode representar um perigo, já que
nessa prática o educador sempre reflete uma ideologia, e se ele não está consciente acaba reproduzindo
a ideologia dominante que prepara o indivíduo apenas
para um mercado de trabalho altamente excludente e
aprisiona o saber espontâneo da criança, tornando-a
um mero depósito de informações, ou seja, objeto e
não sujeito atuante na história.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: da Educação Infantil /Secretaria de Educação Fundamental.
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Recebido em: 12 de junho de 2012
Avaliado em: 25 de junho de 2012
Aceito em: 10 de julho de 2012
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