PAULO FREIRE E A INTERCONEXÃO PLANETÁRIA: A EXPANSÃO DA CONSCIÊNCIA NA SOCIEDADE DO CONHECIMENTO Edna Gusmão de Góes Brennand “Não temos mais modelos. Somos os primeiros a entrar em um espaço completamente novo. Entramos no futuro que inventamos percorrendo a passos largos nosso planeta” Piérre Lévy "E nos pareceu que a primeira dimensão deste novo conteúdo com que ajudaríamos o analfabeto, ainda antes de iniciar sua alfabetização, para conseguir a superação de sua compreensão ‘ mágica’… seria o conceito antropológico de cultura, isto é a distinção entre os dois mundos : o da natureza e o da cultura ; o papel ativo do homem na sua realidade e com a sua realidade, o sentido da mediação que tem a natureza para as relações e a comunicação entre os homens… a cultura como aquisição sistemática da experiência humana ” Paulo Freire Tecendo os fios da rede Os anos 90 foram uma década que teve como marca o fortalecimento do capitalismo internacional, combinado com a emergência da sociedade em rede. Diversas nuances deram forma a um panorama de globalização marcado pelo aumento dos serviços de informação. Pesquisas documentaram o aumento do uso das tecnologias da informação e comunicação no comércio, na indústria, na educação, na pesquisa e desenvolvimento dando- nos a impressão que “tudo que é sólido desmancha- se no ar”, isto é, nos espaços virtuais construídos por novos símbolos e signos. A revolução do chip, dispositivos cada vez menores capazes de fazer compartilhar computadores e máquinas de comunicações é a pedra angular desta era da informação. Suas características configuradas pela sua capacidade de condução (mícrons), sua capacidade de memória (Kbytes e megabytes) e velocidade (megahertz) lhe confere o papel de ator principal do novo paradigma onde a informação é a matéria - prima por excelência. A grande maioria dos avanços eletrônicos basearam- se no aperfeiçoamento do chip, reduzindo o tamanho dos computadores de alguns metros para alguns centímetros. Deslocados dos fins militares para os quais foram criados, eles agora invadem os espaços do mercado e os espaços individuais alargando aplicações sociais tão diversificadas que não se pode mais pensar as ferramentas tecnológicas sem pensar a sociedade. A revolução tecnológica que estamos presenciando expressa e organiza as forças sociais dominantes, criando entrelaçamentos em todos os níveis: na economia, na política, na cultura, nas identidades e nas subjetividades dos sujeitos. A força das redes, da imagem, dos novos signos, incidem sobre nossas formas de pensar e sentir influenciando e estruturando as relações sociais nos espaços da produção ( bens e serviços), na experiência (ação dos sujeitos sobre si mesmos) e poder relação entre os sujeitos humanos com base na produção e experiência) Castels (1999). A forma de difusão da tecnologia está reconfigurando as experiências de uso e conseqüentemente novas formas de aplicações, o que tem ocasionado mudanças substantivas nas formas de aprendizagem dos sujeitos alterando sobremaneira a autonomia da mente humana e os sistemas culturais. Embora alguns estudos empíricos defendam a tese de que a mídia é uma variável independente na indução de comportamentos já que indivíduos contextualizados em espaços sociais diferenciados processam de forma diferenciada os conteúdos das mensagens veiculadas, não podemos escamotear o fato de que atualmente, grande parte de nossos estímulos simbólicos são mediados pelos meios de comunicação. É evidente que este mundo da multimídia é habitado por dois tipos de usuários: produtores e receptores de mensagens de classe, raça, sexo e cultura diferenciados que interagem dialeticamente, criando um espaço multifacetado de contextos semânticos de vários sentidos. Assim sendo, é possível afirmar o caráter não totalitário dos vários sentidos da mensagens veiculadas. Embora seja necessário reconhecer uma certa integração de um padrão cognitivo comum é possível reconhecer, também, que as mídias podem potencializar a capacidade a comunicabilidade e as formas de compreensão das expressões culturais. Este processo, do ponto de vista de Castels (1999), introduz uma nova forma urbana caracterizada por uma diversidade extraordinária de contextos físicos e culturais baseada em uma arquitetura informacional com base no conheciment o. Aparentemente simples, esta cidade informacional possui uma intrincada rede de significados que esconde a complexidade de interesses e valores opostos. Conflitos e estratégias se mesclam para compor uma dinâmica social herdada das tendências contraditórias e que redefinem o conceito de tempo e espaço. No terreno da cidade informacional a organização do trabalho, o devir coletivo, os discursos e os símbolos são desteritorializados e mudam suas qualidades de maneira tão rápida que os grupos humanos caem num processo de perplexidade crescente, dado que não reconhecem mais suas pertenças nem seus espaços. Um estranhamento coletivo parece apontar para um horizonte nebuloso de linguagens múltiplas onde a indeterminação e a ambigüidade favorecem o declínio da verdade, da objetividade e da crítica. Do ponto de vista da ciência, diríamos que emerge uma nova ecologia cognitiva onde o conhecimento se encontra em permanente metamorfose. Certamente, que mesmo reconhecendo este estranhamento no interior de grupos sociais, a perplexidade diante do rit mo das transformações tecnológicas, e este estado de metamorfose permanente do conhecimento, não podemos deixar de considerar que é possível abrir caminhos e clareiras, pois os coletivos humanos enquanto atores, podem produzir movimentos entre coisas e pessoas, sujeitos pensantes e objetos pensados trazendo à tona epidemiologias de representações propagando ondas de transformações significativas (Lévy, 1999). A última década do século XX foi caracterizada pela travessia de um processo de planetarização de processos econômicos, políticos e culturais onde os capitais quer econômicos ou culturais dançam ao redor do mundo entrelaçados nas fibras óticas das redes ocasionando fusões variadas, diminuindo distâncias, reconfigurando territórios, estendendo fronteiras, criando conflitos. Este processo está fortalecendo conexões de poder onde o centro está a cada dia mais densamente conectado a si mesmo e a periferia mal conectada consigo mesma. A alta magnitude deste fluxo cria um centro virtual, um instrumento novo de poder, nebuloso e difícil de ser localizado (Lévy, 2001). Neste contexto, o conhecimento passa a ser o mais importante capital e a informação a riqueza. Duas novas categorias entram em cena: os inforicos e infopobres. Os impactos deste processo na capacidade de aprendizagem social dos sujeitos têm levado ao reconhecimento de que a sociedade em rede está modificando a maioria das nossas capacidades cognitivas. Raciocínio, memória, capacidade de representação mental e percepção estão sendo constantemente alteradas pela contato com os bancos de dados, modelização digital, simulações interativas etc. Este processo reforça diferenças em função da capacidade de acesso às tecnologias de cada sociedade. Os grupos humanos mais conectados terão sua capacidade de inteligência mais desenvolvida enquanto que as periferias menos conectadas acumulam de forma lenta esta capacidade. Disparidades estão sendo reforçadas e desigualdades aprofundadas. Mas é preciso acreditar que a dinâmica geral deste processo permita a ampliação da capacidade de aprendizagem dos menos conectados. O centro (inforicos) ao invadir virtualmente a periferia (infopobres) adensa a interconexão das redes misturando incluídos e marginalizados e impulsionando a periferia em direção ao centro e reduzindo as distâncias. Esta dialética desloca entraves e limites, fronteiras e territórios. Emerge daí a luta pelo acesso ao conhecimento. Uma infovia de Esperança: a Pedagogia do Diálogo O ciberespaço não se reduz à interconexão de informações, mas redesenha uma consolidação de metarrelatos (religiosos, filosóficos e políticos) com dimensões tecnológicas, socio -culturais, políticas e econômicas acenando para a revisão de conceitos e esquemas teóricos para análise de fatos e proc essos. Esta estrutura infoeletrônica transnacional e interativa, vem ajudar a redimensionar a compreensão do território, que agora passa a perder sua característica de espaço imóvel, para se tornar um espaço móvel, poroso, sem fronteiras definidas. Desterritorializados signos, saberes, falas, imagens renovam-se e circulam numa velocidade jamais vista. Uma das contribuições do pensamento de Paulo Freire para as reflexões sobre estas mudanças e sobre o fenômeno educativo no horizonte da Sociedade do Conhecimento, é a defesa de que a educação também gera o novo, cria novos elementos e novas relações, gera resistências. A educação, não apenas reproduz mas também produz significados. O ato educativo como um elemento da práxis humana faz reprodução e produção, inculcação e resistência, descontinuidade e continuidade, repetição e ruptura, manutenção e renovação num movimento dialético que caracteriza a dinâmica social. A educação para Freire deve ser potencializadora da personalidade integral do educando. Partindo da crítica à razão instrumental como marca indelével do desenvolvimento capitalista, Freire incorpora os conceitos de conflito e resistência como ponto de partida para redefinir a importância do poder da ideologia e da cultura como constructos centrais de uma teoria da educação que seja capaz de fornecer a reflexividade necessária para interpretação e redirecionamento da experiência concreta. Do ponto de vista teórico esta é uma nova alavanca para reestruturar modos de fazer em educação na nova sociedade do conhecimento. Sua função reveladora fornece oportunidades teóricas para auto-reflexão sobre o uso das mídias na educação, de forma que estas sejam potencializadoras da emancipação social. A resistência como princípio educacional possui um valor pedagógico pelo fato de permitir situar as noções de estrutura e ação humana e os conceitos de cultura e autoformação. Permite rejeitar a compreensão do processo educacional como simples instrução. Ao fazer isto não apenas politiza a noção de cultura, como coloca também a necessidade de analisar a cultura da escola e dos movimentos sociais dentro do terreno cambiante de luta e contestação. Desta forma, o conhecimento, os valores e as relações sociais podem ser examinados conforme suas expressões dentro de práticas educativas. A noção Freiriana de resistência, diálogo e consciência crítica, permite entender que dentro dos diferentes conjuntos de experiências vivenciadas numa prática pedagógica, é possível aos educadores e educandos redescobrir suas vozes e resgatar dimensões positivas de suas próprias culturas e histórias. Alem disso, pode ajudar educandos e educadores desenvolver o pensamento crítico, o discurso analítico e novos modos de apropriação intelectual, hoje exigência indiscutível dos novos contornos da formação. É dentro desta perspectiva dialética de conceber a educação como uma possibilidade das classes subalternas reinventarem e criarem os instrumentos ideológicos e materiais para romper os mitos e estruturas que os impedem de transformar sua realidade social opressiva que situamos a contribuição de Paulo Freire Se tomamos os conceitos de conflito e resistência como fundamento da prática educativa, podemos pensar que as tecnologias da informação e comunicação, não mudam, por si mesmas a relação pedagógica. Tanto servem para reforçar uma visão conservadora, individualista como uma visão progressista. A pessoa autoritária utilizará o computador, a TV, o rádio e a mídia impressa para reforçar ainda mais o seu controle sobre os outros. Por outro lado, uma mente aberta, interativa, participativa encontrará nas tecnologias ferramentas importantes para ampliar a interação. As tecnologias de comunicação não substituem o professor, mas modificam algumas das suas funções. O docente preocupado com a ruptura da educação bancária (Freire, 1982) se transforma no estimulador da curiosidade do educando no processo de querer conhecer, pesquisar, buscar a informação mais relevante. Ao incentivar o desabrochar da consciência crítica, buscará questionar informações recolhidas, contextualizará os resultados de pesquisas. Transformará informação em conhecimento e conhecimento em saber, em vida, em sabedoria. Desenvolverá o conhecimento com ética, e esta é sem dúvida, o âmago da pedagogia Freiriana. As tecnologias, utilizadas como ferramentas pedagógicas, como suporte de aprendizagem reforça a preocupação Freiriana (1997) que ler um texto ou hipertexto implica o adentramento na intimidade do texto para apreender sua significação. É necessário, que a lut a pelo acesso às mídias integre a luta pelo acesso à uma educação de qualidade. Num mundo que se constrói e reconstrói pelo avanço da ciência e da tecnologia não terá significado social uma educação que não integre o avanço destas conquistas. O universo educacional que se configura neste novo século exige o contato cotidiano com novos textos e hipertextos, imagens, signos e significados. Isto exige uma compreensão ampla de formação que implica buscar novas formas de desenvolvimento de práticas educativas. Freire vem reforçar esta constatação. Já nos anos 70 ele argumentava que o indivíduo não se reduz aos limites do tempo e do espaço. Suas raízes não deve ser um problema de desenvolvimento. Ele é sujeito por vocação o que lhe permite ultrapassar os limites do tempo e se lançar num domínio que lhe é exclusivo: construir sua história e sua cultura. Como um ser da práxis ele interage dialéticamente com a natureza e transforma- a. Pela sua capacidade de discernimento ele é impulsionado a tomar consciência de sua temporalidade e de sua transcendência. Há uma pluralidade das relações do homem com o mundo, na medida em que ele responde à ampla variedade de seus desafios. Em que não se esgota num tipo padronizado de respostas. A sua pluralidade não é só em face dos diferentes desafios que partem do seu contexto mais em face do mesmo desafio. No jogo constante de suas respostas, altera-se no próprio ato de responder. Organiza-se. Escolhe a melhor resposta. Testa- se. Age. (Freire, 1982 a, p.41) A forma como o indivíduo capta e interpreta a sua realidade vai determinar sua relação com o mundo objetivo e sua pluralidade de significações. É na cultura que ele vai encontrar os primeiros elementos para construção de discernimentos, ou seja a consciência de sua temporalidade e de sua historicidade. Assim, vislumbramos no pensamento Freiriano a possibilidade de que as TICs possam permitir um novo encantamento na educação. A possibilidade de transcender paredes e possibilitar que os educandos e educadores conversem e pesquisem com outros sujeitos da mesma cidade, país ou do exterior, no seu próprio ritmo. Os trabalhos de pesquisa podem ser compartilhados por outros e divulgados instantaneamente na rede para quem se interessar. Educandos e educadores podem conjuntamente encontrar inúmeras bibliotecas eletrônicas, revistas on line, com muitos textos, imagens e sons, que facilitam a aprendizagem. Ao minimizar distâncias, as mídias integradas permitem que ao sujeitos educativos convivam mais estreitamente e ampliem as possibilidades do diálogo, e assim mais uma vez, Freire nos abre uma janela. Freire percebeu a emergência do espaço vivido como o lugar privilegiado para se promover o diálogo, sobretudo para dar voz à uma grande parcela de crianças, jovens e adultos marginalizadas do espaço escolar tradicional. O diálogo é, então, visto como um instrumento importante para superação da consciência ingênua e a construção de uma concepção descentrada de mundo. Pela ação-reflexão proporcionada pelo diálogo é possível compreender o rea l que se coloca como dado. Outro aspecto do diálogo que Freire prioriza é o seu caráter horizontal. Na relação horizontal entre educador-educando os elementos traduzidos na relação eu- tu- nós pauta- se na liberdade de expressão importante ao ato comunicativo isento de imposição. No diálogo autêntico, dentro do princípio da horizontalidade falantes e ouvintes emergem como sujeitos e os interesses de ambos são validados numa reflexão conjunta que possibilita o discernimento, isto é, a criticidade racional. Na concepção de Freire o processo de interação permite aos sujeitos a construção de uma ‘arqueologia do conhecimento ‘ onde seja possível interrogar sua estrutura e a do conhecimento do outro buscando clarificar sua consciência. E não podemos ignorar que as TICs se utilizadas por atores críticos permitem pela ampliação e diversificação das fontes de informação, ampliação da capacidade dos sujeitos de construir esta arqueologia. Segundo Freire a razão se expande no diálogo. O seu caráter relacional dá força à exteriorização da razão subjetiva e permite ao indivíduo participar da construção de sua história de forma consciente, reflexiva. Não pode existir diálogo para Freire se os participantes admitem que só indivíduos seletos possuem a tarefa de ‘ pronunciar’, se a contribuição de todos os participantes não é reconhecida. É a recusa explícita da pedagogia tradicional, da concepção de educação onde os educandos são meros receptores de conteúdos, da relação antidialógica entre educador- educando. A possibilidade de participar de diálogos sem fronteiras, no contexto do ciberespaço, pode levar as classes populares a alargar seu poder de luta pela inserção em processos amplos de democratização do conhecimento. O diálogo para Freire, no sentido genérico é a postura necessária entre os indivíduos para que possam refletir sobre sua realidade tal como a fazem e refazem. Não é uma simples comunicação com uma linguagem simbólica como fazem os animais, é um evento social com dimensões individuais que sela o relacionamento entre os sujeitos cognitivos. No sentido educacional é uma posição epistemológica. A educação dialógica é o lugar das metamorfoses, das aprendizagens múltiplas, pois, o espaço do saber é móvel e extensivo ao mundo da vida. Não possui fronteiras, une processos de subjetivação individual e coletiva, não se circunscreve aos discursos racionais, constrói universos e significações. O espaço do saber é uma criação antropológica e o diálogo a infovia que o reorganiza, hierarquiza e distribui. O saber é partilhado no sujeito coletivo e o diálogo sua manifestação democrática. A emergência da consciência na sociedade do conhecimento A concepção de consciência crítica de Freire, neste novo momento, toma força dado que a árvore do conhecimento é cada vez mais desorganizada pela explosão das informações. Os sujeitos sociais são cada vez mais solicitados a utilizar a consciência crítica para entender o mosaico da organização e distribuição das informações. A consciência crítica vai, então, permitir aos indivíduos captar e perc eber os fatos conseguindo desocultar as razões que os explicam. Ela é cada vez mais necessária para compreender os nexos causais e circunstanciais dos diversos fenômenos. Ao ser capaz de desvelar a realidade os sujeitos serão cada vez mais inseridos em diá logos múltiplos e sendo conduzidos à sua vocação ontológica de humanizar-se. A consciência crítica fundamenta a criatividade e estimula a reflexão dando origem a ações verdadeiras sobre a realidade. Tem uma característica de inquietude e busca constantemente a ação transformadora. Para Freire o diálogo não existe num vácuo político, ele se dá sempre dentro de um contexto e significa uma tensão permanente entre autoridade e liberdade, por isso, implica em alcançar objetivos com responsabilidade, direcionamento, determinação, disciplina. A liberdade implícita neste ato faz com que os educadores dialógicos compreendam que a ciência tem historicidade e que todo conhecimento novo surge a partir da necessidade de um novo momento (Grifo nosso). Então o rigor científico deve ser a base do pensamento crítico, da superação da compreensão ingênua do mundo. A emergência da sociedade do conhecimento assinala este novo momento. Cada indivíduo está sendo chamado a reorganizar sua relação consigo mesmo, com as múltiplas realidades que o cerca, com os novos signos que emergem. Os intelectuais coletivos são cada vez mais necessários para reorganizar este planeta onde o desenvolvimento da capacidade cognitiva define a participação ou a marginalização. Nunca a categoria diálogo foi tão necessária para a reconstrução dos territórios culturais hoje com fronteiras cada vez mais tênues e movediças. O educador dialógico é cada vez mais necessário. Ele não pode mais ser simplesmente ser um excelente especialista que faz com os educandos um jogo intelectual muito interessante - o jogo dos conceitos, o ‘ balé dos conceitos’. A educação dialógica parte da compreensão que os alunos quer da universidade, do primeiro grau, operários de um bairro urbano ou camponeses comecem a compreender o mundo a partir de suas experiências de vida… Por isso não dicotomizo as duas dimensões : senso comum do senso filosófico, na expressão de Gramsci. Começa- se do concreto para se chegar à uma compreensão rigorosa da realidade. Não compreendo conhecimento cient ífico ou crítico que não se submeta ao teste da realidade.(Freire 1982b, p.131) Freire acredita que não se trata de abolir os conceitos ou negá- los. Eles são absolutamente necessários, pois foram moldados através da história do pensamento, têm um significado importante para interpretação da realidade. A questão principal se coloca e : como utilizá- los? Como utilizar o padrão lingüístico dominante no universo lingüístico das classes populares? É importante, para o educador, refletir continuamente sobre como fortalecer o domínio da linguagem conceitual, pois esta linguagem está implícita no ato de conhecimento. O processo de ensino- aprendizagem em qualquer espaço educativo pode ganhar com as mídias um novo dinamismo, inovação e poder de comunicação inusitados. A questão reside não nas tecnologias - cada vez mais sedutoras - mas em nós educadores, na capacidade em tornar- nos dinâmicos e capazes de num mundo em grandes mudanças incentivarmos continuamente nos educandos a capacidade de crescer, evoluir, comunicar-se plenamente com tantas tecnologias de apoio. A linguagem diversificada da mídia interativa deverá ser utilizada, em países em desenvolvimento como o Brasil, para abrir espaços de participação e ampliar benefícios sociais. Os códigos e a dinâmica da sociedade da informação deverão ser potencializados para reforçar o acesso aos direitos, redirecionar projetos de identidade autônomos, viabilizar o acesso às informações, interagir com elas e superá- las com outras inovações. Por conseguinte, a educação em todos os níveis poderá indicar caminhos, abrir clareiras e ajudar a construir redes de mudança social. A educação na nova sociedade da informação deverá potencializar um projeto de convivência integrada com os outros espaço sociais e as mais recentes tecnologias Ao se tornar uma fomentadora da formação ampla dos indivíduos será uma ferramenta indispensável na construção de redes populares de produção e disseminação de saberes múltiplos, interativos, multifacetados. E esta é a essência da Pedagogia Freiriana. A expansão da consciência e a possibilidade do desenvolvimento de uma aprendizagem flexível e colaborativa sempre estiveram no cerne das preocupações de Paulo Freire. O esforço de contribuir para interconectar elite e povo, centro e periferia, razão e sentimento, objetividade e subjetividade foi a marca da sua vida e sua obra. O fim das fronteiras entre os que sabem e os que não sabem, entre opressores e oprimidos, a criação de uma rede de saberes em diálogo constante - esta é a grande utopia freiriana. Bibliografia BRENNAND, E. G. de G. Education et Globalisation : un dialogue entre Paulo Freire et Jürgen Habermas. Paris : Université de Paris I - Phathéon Sorbonne, 1999. (Thèse de Doctorat) CASTELS, M. A sociedade em rede . Rio de Janeiro : Paz e Terra,1999, v. 1. ________. O poder da identidade. Rio de Janeiro ; Paz e Terra, 1999. V. 2 HABERMAS, J. De l’éthique de la discussion. Paris : Éditions du CERF, 1992. LEVY, P. Cyberculture. 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