Relatório do Ministro Relator Trata-se de auditoria de natureza operacional tendo por escopo a Política Nacional de Atenção Oncológica, com o objetivo de avaliar se a rede de atenção oncológica tem permitido aos doentes com câncer acesso tempestivo e equitativo ao diagnostico e ao tratamento, bem como se as condutas terapêuticas disponibilizadas aos pacientes do Sistema Único de Saúde se mostram suficientemente atualizadas. 2. Reproduzo a seguir, em sua essência, o criterioso relatório elaborado pela equipe de auditoria encarregada do feito, cujas conclusões foram devidamente endossadas pelos dirigentes da Secretaria de Fiscalização e Avaliação de Programas de Governo (peças 67, 68 e 69): "1. Introdução 1.1 Antecedentes 1. A incidência de câncer tem crescido no Brasil, assim como em todo mundo, acompanhando a mudança do perfil etário da população. Atualmente, o câncer já representa a segunda maior causa de morte no Brasil (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2009). Esse crescimento tem se refletido no aumento do número de tratamentos ambulatoriais, das taxas de internações hospitalares e dos recursos públicos demandados para custear os tratamentos. 2. Como decorrência disso, os gastos federais com tratamentos ambulatoriais e hospitalares de câncer têm crescido ano a ano. O somatório dos tratamentos ambulatoriais e hospitalares atingiu o montante de R$ 1,48 bilhões em 2008, passou a R$ 1,69 bilhões em 2009 e superou R$ 1,92 bilhões em 2010. 3. Esse contexto de aumento progressivo da demanda por diagnósticos e tratamentos torna especialmente importante que a rede de assistência oncológica esteja adequadamente estruturada e que seja capaz de possibilitar a ampliação da cobertura do atendimento, de forma a assegurar a universalidade, equidade e integralidade da atenção oncológica aos pacientes que dela necessitam. 4. Entretanto, o relatório de levantamento de natureza operacional na Função Saúde (TC 002.088/2009-2), elaborado para subsidiar a seleção de fiscalizações relacionadas à área da saúde, Tema de Maior Significância para o Tribunal no ano de 2009 (TMS-9), apontou um conjunto de deficiências na implementação da Política Nacional de Atenção Oncológica. Destacam-se as seguintes: insuficiência da estrutura da rede de atenção em oncologia, insuficiência ou inoperância dos equipamentos, inadequação da estrutura para o acolhimento e tratamento dos pacientes e insuficiência de recursos humanos. 5. Em razão do exposto e considerando, ainda, que o Plano de Fiscalização 2010 elegeu a Saúde e os Desvios e Desperdício de Recursos do SUS como Tema de Maior Significância para o Tribunal (TMS-3.1) em âmbito nacional, a Secretaria de Fiscalização e Avaliação de Programas de Governo (Seprog) propôs a realização de auditoria operacional para avaliar Política Nacional de Atenção Oncológica, com previsão de participação da 4ª Secretaria de Controle Externo (4ª Secex). A fiscalização foi autorizada pelo Exmo. Ministro José Jorge, relator do presente processo, com base no que dispõe o parágrafo 2º do art. 6º da Resolução - TCU 185/2005 (TC 031.401/2010-4). 1.2 Identificação do objeto de auditoria 6. A auditoria foi realizada no Ministério da Saúde, na Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) e no Instituto Nacional de Câncer (Inca), com o objetivo de avaliar a implementação da Política Nacional de Atenção Oncológica, especialmente em relação à oferta de serviços de diagnóstico e tratamento oncológicos à população brasileira que deles necessita. 7. A Política Nacional de Atenção Oncológica, estabelecida pela Portaria do Ministério da Saúde 2.439, de 8/12/2005, envolve a promoção da saúde, a prevenção, o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação do câncer, bem como os cuidados paliativos. Organiza-se de forma articulada entre o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde dos estados do Distrito Federal e dos municípios. 1.3 Objetivos e escopo da auditoria 8. As análises desenvolvidas durante a fase de planejamento do trabalho demonstraram que os principais problemas que têm afetado a efetividade da atenção oncológica dizem respeito a dificuldades para o acesso tempestivo a exames e tratamentos, a deficiências da assistência oncológica prestada aos pacientes, e ao aumento de gastos em função de fragilidades nos mecanismos de gestão e de controle. O Diagrama de Ishikawa, no Apêndice B, ilustra os principais problemas identificados e as interações entre os diversos fatores causais que os determinam. 9. Dada a natureza operacional do trabalho, julgou-se pertinente e oportuno priorizar a avaliação dos aspectos mais diretamente relacionados com as deficiências na prestação da assistência oncológica aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) e com as dificuldades de acesso tempestivo desses pacientes aos diagnósticos e aos tratamentos oncológicos, em especial, à quimioterapia, à radioterapia e às cirurgias, considerados procedimentos hospitalares de alta complexidade. A preocupação com esses fatores, em conjunto com os resultados das técnicas de diagnóstico de auditoria desenvolvidas (vide seção 1.5 Métodos utilizados), orientou a definição do escopo do trabalho e subsidiou a definição do problema e das questões de auditoria, apresentados no Quadro 1, a seguir: Quadro 1 - Problema e Questões de Auditoria 1.4 Critérios 10. Os critérios gerais utilizados para fundamentar a opinião da equipe foram os preceitos constitucionais e os princípios básicos do SUS, que asseguram o acesso universal igualitário da população aos serviços de saúde. Também foram consideradas as normas editadas pelo Ministério da Saúde sobre a estruturação dos serviços e a prestação da atenção oncológica. 11. Na análise da tempestividade do acesso à assistência oncológica de alta complexidade, foram utilizados alguns parâmetros internacionais, obtidos por meio de pesquisa bibliográfica. Além disso, foi considerada entre os critérios de auditoria a opinião de especialistas médicos que atuam diretamente no atendimento aos pacientes oncológicos, os quais se constituem em um segmento privilegiado para avaliar a adequação das práticas terapêuticas ofertadas pelo SUS. 12. Os parâmetros utilizados são mais bem explicitados nos capítulos que descrevem as constatações da auditoria, servindo como referência para que fique demonstrada a diferença entre o que esses critérios preconizam e a situação encontrada. 1.5 Métodos utilizados 13. Os trabalhos foram realizados em conformidade com as Normas de Auditoria do Tribunal de Contas da União (Portaria - TCU 280/2010) e com observância aos princípios e padrões estabelecidos pelo TCU no Manual de Auditoria Operacional. Nenhuma restrição foi imposta aos exames. 14. Durante a fase de planejamento da auditoria, foram realizadas pesquisas bibliográficas, reuniões com gestores do Ministério da Saúde e entrevistas com especialistas e com representantes de associações de apoio a pacientes. Além disso, como forma de aprofundar os conhecimentos sobre o tema objeto de estudo e com o objetivo de levantar os principais problemas que poderiam requerer maior atenção da equipe de auditoria e o aprofundamento da investigação, foram executadas, ainda, técnicas de diagnóstico de auditoria. 15. Na etapa de execução dos trabalhos, foram desenvolvidas análises quantitativas, com a utilização de bancos de dados sobre os tratamentos de câncer; pesquisa por correio eletrônico, com envio de questionários para médicos oncologistas, estabelecimentos habilitados e associações de apoio a pacientes; bem como estudos de caso em sete unidades da Federação, nos quais foram realizadas entrevistas com gestores, profissionais de saúde e pacientes. 16. As técnicas de diagnóstico desenvolvidas durante a fase de planejamento, assim como a estratégia metodológica empregada durante a etapa de execução dos trabalhos estão descritas no Apêndice A - Detalhamento dos métodos utilizados, que também discorre sobre os critérios de seleção das localidades visitadas e sobre as limitações impostas ao trabalho. 1.6 Organização do Relatório 17. Como resultado das pesquisas realizadas, o relatório apresenta, no Capítulo 2, a seguir, uma visão geral da atenção oncológica, que descreve, em subtítulos próprios, o problema do câncer, a Política Nacional de Atenção Oncológica, a legislação aplicável, aspectos orçamentários e financeiros relacionados ao tema, as principais unidades envolvidas e a descrição sucinta de como se processam as habilitações dos estabelecimentos e os tratamentos em oncologia. O Capítulo 3 discorre sobre as constatações relacionadas ao exame da adequação da rede de atenção oncológica para assegurar o acesso tempestivo e equitativo a diagnósticos e tratamentos. O Capítulo 4, por sua vez, trata do exame da suficiência da atualização das condutas terapêuticas adotadas pelo SUS, segundo a visão dos especialistas no tema. O Capítulo 5 destina-se ao registro e à análise dos comentários oferecidos pelos gestores. O relatório é finalizado pelos capítulos que trazem a conclusão e a proposta de encaminhamento, a qual sintetiza as recomendações propostas pela equipe de auditoria ao longo do relatório. 2. Visão geral 2.1 O problema do Câncer 18. O termo câncer é utilizado para representar de forma genérica um conjunto de mais de cem enfermidades, que abrangem neoplasias malignas de localizações diversas, sendo responsável por cerca de 17% dos óbitos por causa conhecida ocorridos no Brasil. Deve-se destacar o caráter múltiplo da doença, com apresentação de manifestações variadas, diferentes taxas de letalidade e sobrevida, assim como diversas formas de abordagens terapêuticas e preventivas. Há tipos de câncer com melhor prognóstico, como é o caso dos tumores de pele não melanoma, mama feminina, colo do útero, cólon e reto, e próstata. Outros tipos de câncer apresentam taxa de sobrevida relativamente baixa, como no caso do câncer de pulmão e de estômago (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2009, p. 7 e 23). 19. As ações de combate ao câncer envolvem desde cuidados de saúde preventiva, associada à atenção básica, até a alta tecnologia, aplicada à realização de exames e a modernos tipos de tratamentos, relacionados à assistência de alta complexidade. Os desafios colocados pela doença também demandam investimentos constantes em pesquisas, para a descoberta de formas de prevenção, bem como de tratamentos mais efetivos, com a promoção de benefícios científicos e melhorias para a saúde pública. 20. No mundo, o impacto do câncer mais que dobrou em trinta anos. As estimativas para o ano de 2008 foram de cerca de doze milhões de casos novos e de sete milhões de óbitos. O crescimento populacional contínuo e o envelhecimento da população mundial deverão potencializar ainda mais o impacto do câncer no mundo. Esse impacto deverá ser mais acentuado em países de médio e baixo desenvolvimento, para os quais foram estimados metade dos casos novos e cerca de dois terços dos óbitos por câncer em 2008 (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2008). Essa realidade demonstra a importância de investimentos na área de prevenção e tratamento em oncologia, principalmente em países menos desenvolvidos. 21. Os tipos de câncer mais comuns em termos de incidência no mundo foram o câncer de pulmão (1,52 milhões de casos novos), mama (1,29 milhões) e cólon e reto (1,15 milhões). Em função do seu mau prognóstico, o câncer de pulmão foi a principal causa de morte (1,31 milhões), seguido pelo câncer de estômago (780 mil óbitos) e pelo câncer de fígado (699 mil óbitos) (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2008). 22. Levantamento brasileiro realizado pelo Inca estimou para o ano de 2010 a ocorrência de 489.270 casos novos de câncer. Os tipos de maior incidência, com exceção do câncer de pele do tipo não melanoma (de lenta evolução e com baixo potencial de metastização), são os cânceres de próstata e de pulmão, no sexo masculino, e os cânceres de mama e do colo do útero, no sexo feminino. No panorama geral, as estimativas apontam que o câncer de pele do tipo não melanoma (114 mil casos novos) é o mais incidente na população brasileira, seguido pelos tumores de próstata (52 mil), mama feminina (49 mil), cólon e reto (28 mil), pulmão (28 mil), estômago (21 mil) e colo do útero (18 mil) (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2009, p. 24). 2.2 A Política Nacional de Atenção Oncológica 23. A Política Nacional de Atenção Oncológica, objeto de estudo da presente auditoria, contempla ações de promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos. A Portaria GM/MS 2.439/2005 que a instituiu, estabeleceu que a Política deveria ser organizada de forma articulada com o Ministério da Saúde e com as Secretarias de Saúde dos estados e município, respeitandose as competências das três esferas de gestão. 24. A Política foi concebida de forma a permitir as seguintes ações: a) o desenvolvimento de estratégias coerentes com a política nacional de promoção da saúde voltadas para a identificação dos fatores determinantes e condicionantes das neoplasias malignas mais prevalentes e orientadas para o desenvolvimento de ações que promovam a redução de danos e a proteção da vida, de forma a assegurar a equidade e a autonomia de indivíduos e coletividades; b) a organização de uma linha de cuidados que perpasse todos os níveis de atenção, desde a atenção básica até a atenção especializada de média e alta complexidade, e de atendimento contemplados pela política (promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos); c) a constituição de Redes Estaduais ou Regionais de Atenção Oncológica, formalizadas nos Planos Estaduais de Saúde, com estabelecimento de fluxos de referência e contrarreferência, de forma a garantir o acesso e atendimento integrais; d) a definição de critérios técnicos adequados para o funcionamento e para a avaliação dos serviços públicos e privados que atuam na atenção oncológica, assim como sistemática para sua monitoração; e) a ampliação da cobertura do atendimento aos doentes de câncer, de forma a assegurar a universalidade, a equidade, a integralidade, o controle social e o acesso à assistência oncológica; f) o fomento, a coordenação e a execução de projetos de incorporação tecnológica, por meio de estudos de custo-efetividade, eficácia e qualidade da atenção oncológica no Brasil; g) o auxílio ao desenvolvimento de processos e métodos de coleta, análise e organização dos resultados das ações decorrentes da Política, de forma a permitir o aprimoramento da gestão e a disseminação das informações; h) a promoção do intercâmbio com outros subsistemas de informações setoriais, de forma a aperfeiçoar a produção de dados e a democratização das informações; i) a qualificação da assistência e a promoção da educação permanente dos profissionais de saúde envolvidos com a implantação da Política, de acordo com os princípios da integralidade e da humanização; j) o fomento à formação e à especialização dos recursos humanos para atuação na rede de atenção oncológica; k) o incentivo à pesquisa sobre a atenção oncológica; de acordo com os objetivos da Política Nacional de Ciência e Tecnologia em Saúde. 25. A Portaria GM/MS 2.439/2005 definiu, ainda, os componentes fundamentais da política, dentre os quais, destacam-se os seguintes: a) a promoção e a vigilância em saúde, que devem utilizar, entre outras, ações que proporcionem a redução de fatores de risco para as neoplasias; b) a atenção básica, com previsão de ações voltadas para a promoção da saúde, a prevenção do câncer, o diagnóstico precoce, o apoio à terapêutica, aos cuidados paliativos e ao seguimento dos doentes; c) média complexidade, assistência que deve ser garantida por meio do processo de referência e contrarreferência dos pacientes; d) alta complexidade, organizada de forma a assegurar o acesso dos doentes com diagnóstico definitivo, deverá determinar o estadiamento da doença, tratar os pacientes com qualidade e de acordo com as condutas estabelecidas em Unidades e Centros de Alta Complexidade em Oncologia; e) sistema de informação, que deve possibilitar aos gestores subsídios para a tomada de decisões e promover a disseminação de informações; f) diretrizes nacionais para a atenção oncológica, envolvendo todos os níveis de atenção, que possibilitem o aprimoramento da atenção, da regulação, da avaliação e dos controles; g) avaliação tecnológica, que deve oferecer subsídios para a tomada de decisões no processo de incorporação de novas tecnologias; h) a educação permanente e capacitação das equipes em todos os níveis de atenção. 2.3 Legislação envolvida 26. A Declaração Universal dos Direitos Humanos preceitua, em seu artigo 25, que toda pessoa tem direito a saúde e a cuidados médicos em caso de doença. A Constituição Federal de 1988 materializa esses direitos na Seção II do Título VIII - Da Ordem Social -, que se dedica, especialmente, ao tema da Saúde. O art. 196 assevera que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, que deve ser garantido por meio de políticas que visem ao acesso universal e igualitário aos serviços de saúde. O art. 198 nomeia como um das diretrizes do SUS o atendimento integral da população. 27. A Lei 8.080/1990 (Lei Orgânica do SUS), em conformidade com a Constituição, em seu art. 7º, relaciona entre os princípios do SUS, o princípio da "universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência" e princípio da integralidade de assistência. A mesma lei, ao delimitar os campos de atuação do SUS, estabelece que a execução das ações deve abranger a assistência terapêutica integral, inclusive a farmacêutica (art. 6º, inciso I, alínea "d"). 28. A Política Nacional de Atenção Oncológica foi instituída pela Portaria MS/GM 2.439 do Ministério da Saúde, de 8/12/2005, de forma coerente com os princípios já expressados. 29. Portaria SAS/MS 741, de 19/12/2005, editada com o objetivo de estruturar determinados aspectos da Política, definiu as normas de classificação, credenciamento e habilitação, assim como os parâmetros de distribuição demográfica, produção e avaliação das Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacons), dos Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacons) e dos Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia (Cracons). 30. É importante mencionar, ainda, a Portaria SAS 62, de 11/3/2009, que determinou que a Coordenação-Geral da Alta Complexidade, em conjunto com o Inca e com a Coordenação-Geral de Regulação e Avaliação mantenham monitoramento e avaliação contínua e anual dos estabelecimentos habilitados para prestar serviços de oncologia. A referida portaria também manteve determinação no sentido de que as Secretarias de Estado da Saúde avaliem a produção desses estabelecimentos a cada doze meses, de forma a poderem propor os ajustes de cadastro ou assistenciais cabíveis. 31. O Apêndice D apresenta a relação das principais normas legais e infralegais sobre a prestação da assistência oncológica e sobre temas correlatos. 2.4 Aspectos orçamentários e financeiros 32. O financiamento da atenção oncológica no âmbito do Plano Plurianual (PPA) 2008-2011é realizado por meio do Programa 1220 Assistência Ambulatorial e Hospitalar Especializada, que tem como objetivo de governo "promover o acesso com qualidade à Seguridade Social, sob a perspectiva da universalidade e da equidade, assegurando-se o seu caráter democrático e a descentralização" e como objetivo setorial "ampliar o acesso da população aos serviços de que necessita e promover a qualidade e a humanização na atenção à saúde". 33. Os dispêndios realizados pelo Governo Federal com os tratamentos oncológicos são suportados pela ação orçamentária 8585 Atenção à Saúde da População para Procedimentos em Média e Alta Complexidade. A referida ação também se destina ao custeio de toda a assistência hospitalar e ambulatorial pública. A maior parte dos valores alocados para as despesas com a assistência oncológica integram o Teto da Média e Alta Complexidade (MAC). Mas determinados procedimentos também são financiados pelo Fundo de Ações Estratégicas de Compensação (FAEC), como os exames de mamografia bilateral para o rastreamento de câncer de mama, assim como os transplantes de medula. A distribuição dos tetos financeiros MAC para cada unidade da Federação considera a série histórica da produção ambulatorial e hospitalar, entre outros fatores como a população residente e a capacidade instalada. Os recursos do FAEC são distribuídos segundo a produção informada (TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, 2009a). 34. O PPA 2008-2011 também é integrado pelas seguintes ações orçamentárias destinadas à realização de dispêndios com a atenção oncológica: Ação 110H - Elaboração do Projeto de Integração das Instalações do Instituto Nacional de Câncer - Inca, no Rio de Janeiro/RJ; Ação 125H - Implantação do Complexo Integrado do Instituto Nacional de Câncer - Inca; Ação 7833 - Implantação de Centros de Alta Complexidade em Oncologia - Cacon; Ação 8758 - Aperfeiçoamento, Avaliação e Desenvolvimento de Ações e Serviços Especializados em Oncologia - Inca. As metas definidas pelo PPA 2008-2011 para cada uma das ações são apresentadas no Apêndice G - Metas e indicadores definidos para a atenção oncológica. A Tabela 1, a seguir, apresenta as ações orçamentárias associadas à atenção oncológica, seguidas das respectivas finalidades. Tabela 1 - Finalidade das ações orçamentárias envolvidas Ação: 110H - Elaboração do Projeto de Integração das Instalações do Instituto Nacional do Câncer - INCA, no Rio de Janeiro/RJ Finalidade: Elaborar projeto de integração das unidades do Instituto Nacional do Cancêr INCa em um único complexo. Ação: 125H - Implantação do Complexo Integrado do Instituto Nacional de Câncer - INCA Finalidade: Proporcionar a reorganização físico-funcional das unidades que compõe o Instituto Nacional de Câncer com a construção de um complexo integrado na cidade do Rio de Janeiro e adequar as unidades de modo a permitir maior flexibilidade para futuras expansões das atividades e absorção de novos equipamentos, com vistas a acompanhar o acelerado avanço tecnológico, garantindo maior eficiência na operação e manutenção de suas instalações, otimizando os recursos humanos, materiais e financeiros. Ação: 7833 - Implantação de Centros de Alta Complexidade em Oncologia - CACON Finalidade: Contribuir para a garantia e qualificação do acesso dos usuários aos serviços de saúde de alta complexidade na especialidade de oncologia. Ação: 8585 - Atenção à Saúde da População para Procedimentos em Média e Alta Complexidade Finalidade: Viabilizar, de forma descentralizada, a Atenção à Saúde da População nos Estados e Municípios habilitados em Gestão Plena do Sistema e nos Estados Habilitados em Gestão Plena do Sistema Estadual. Ação: 8758 - Aperfeiçoamento, Avaliação e Desenvolvimento de Ações e Serviços Especializados em Oncologia - INCA Finalidade: Operacionalizar as ações nacionais de articulação, regulação, assessoria técnica, ensino e pesquisa na área do câncer, atendimento qualificado e integral aos pacientes de câncer das unidades hospitalares do INCA e transferência de conhecimento técnico-científico e gerencial gerado no Instituto, para os órgãos e instituições que lidam com câncer no país. Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Cadastro de Ações. Disponível em: . Acesso em: 22 jul. 2011. 35. As ações associadas à atenção oncológica apresentam elevada materialidade. Os valores liquidados de 2008 a 2010 em cada uma das ações são apresentados na Tabela 2, abaixo. Tabela 2 - Valores liquidados das ações orçamentárias envolvidas - 2008 Cód. Ação orçamentária 2008 2009 2010 110H Elaboração do Projeto de Integração das Instalações do Instituto Nacional do Câncer INCa, no Rio de Janeiro/RJ 0 10.706.679 0 125H Implantação do Complexo Integrado do Instituto Nacional de Câncer - INCa 3.930.103 2.569.897 7833 Implantação de Centros de Alta Complexidade em Oncologia - CACON 11.560.000 8.509.692 14.441.609 8585 Atenção à Saúde da População para Procedimentos em Média e Alta Complexidade 22.260.543.193 24.902.184.223 26.934.740.270 8758 Aperfeiçoamento, Avaliação e Desenvolvimento de Ações e Serviços Especializados em Oncologia - INCa 195.999.754 211.763.337 225.808.452 Fonte: Câmara dos Deputados (Banco de Dados de Acompanhamento da Execução Orçamentária e Restos a Pagar da União). 36. É importante ressaltar que a Ação Atenção à Saúde da População para Procedimentos em Média e Alta Complexidade suporta também gastos com todos os demais exames e tratamentos ambulatoriais e hospitalares de média e alta complexidade. O valor total despendido na referida ação para o pagamento apenas de despesas com tratamentos de câncer (cirurgia oncológica, radioterapia, quimioterapia e iodoterapia) atingiu, em 2010, o montante de R$ 1.921.378.041. 37. O Gráfico 1 demonstra como os gastos do SUS com tratamentos oncológicos vêm crescendo de forma constante ao longo dos últimos anos. O Gráfico 2, por sua vez, evidencia a distribuição desses gastos por tipo de tratamento. Pode-se observar a grande prevalência de despesas com quimioterapia, que responde por, praticamente, três quartos dos gastos totais. 38. Há que se considerar que esses valores despendidos com os tratamentos representam apenas parte dos recursos totais aplicados pelo SUS na atenção oncológica. Para que se pudesse apurar a totalidade dos gastos com a assistência aos pacientes com câncer, ter-se-ia de considerar, ainda, os dispêndios com consultas, com exames para diagnóstico e, mesmo, procedimentos cirúrgicos em pacientes com câncer, realizados fora dos centros habilitados em oncologia, assim como os valores aplicados pelos governos estaduais e municipais. 2.5 Principais unidades envolvidas na operacionalização da assistência oncológica 39. No âmbito do Ministério da Saúde, a operacionalização da atenção oncológica está afeta à Secretaria de Atenção à Saúde (SAS), mais especificamente, ao Departamento de Atenção Especializada (DAE). Mas a Coordenação-Geral de Média e Alta Complexidade (CGMAC), que integra o Departamento de Atenção Especializada (DAE), é a responsável mais direta pelas ações que envolvem a Política de Oncologia. Entre suas competências regimentais, podem ser destacadas as seguintes (art. 264, do Anexo à Portaria GM/MS 2.965/2010, que aprovou os regimentos internos dos órgãos do Ministério da Saúde): a) o planejamento e a coordenação da elaboração de programas nacionais da área de média e alta complexidade do SUS; b) a coordenação da elaboração de normas, diretrizes e orientações para a execução de procedimentos de média e alta complexidade nos serviços de saúde do SUS em relação às políticas sob sua responsabilidade direta; c) a promoção da implantação de mecanismos para o acompanhamento dos procedimentos de média e alta complexidade desenvolvidos nas unidades do SUS referentes às políticas sob sua responsabilidade direta; d) o desenvolvimento de sistemas de registro das informações sobre os procedimentos de média e alta complexidade realizados no âmbito do SUS relacionados às políticas sob sua responsabilidade direta; e) a coordenação das ações de cooperação técnica junto às instâncias gestoras do SUS, no que diz respeito às normas e diretrizes para execução de procedimentos de média e alta complexidade; f) definir indicadores para monitoramento e avaliação das ações sob sua coordenação. 40. Ainda no âmbito da organização do sistema de atendimento oncológico, integrando a SAS, há o Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas (DRAC). O DRAC é o setor responsável pelas políticas nacionais de regulação em saúde e operacionaliza a Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC), que tem como objetivo coordenar as referências interestaduais de pacientes que necessitem de assistência hospitalar de alta complexidade, conforme Portaria GM/MS 2.309/2001. 41. A SAS agrega também o Instituto Nacional de Câncer (Inca) que tem entre suas competências a formulação e a execução de programas nacionais de enfrentamento ao câncer, a formação de recursos humanos e a realização de pesquisas na área oncológica. O Inca é responsável, ainda, pela prestação de serviços assistenciais diretamente aos portadores de câncer por meio dos quatro Hospitais do Câncer que integram a sua estrutura. O Inca também participa da melhoria das condições estruturais da rede de atendimento, mediante a cessão e doação de equipamentos para estados, instituições públicas e filantrópicas no país para o rastreamento do câncer de mama e tratamento radioterápico dos pacientes oncológicos (INCA, 2010). 42. Os gestores locais de estados e municípios, por meio das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, são responsáveis solidários com o Ministério da Saúde pela prestação dos serviços para as suas populações. Assim, executam a formalização de contratos e convênios com prestadores de serviço, o processamento do faturamento desses serviços, bem como o pagamento aos estabelecimentos de saúde. 43. Os gestores estaduais responsabilizam-se pela gestão da política de alta complexidade em âmbito estadual. Entretanto, os municípios habilitados em Gestão Plena do Sistema Municipal e com serviços de alta complexidade em seus territórios serão responsáveis pela organização desses serviços, exercendo o comando único sobre os prestadores (arts. 24 e 25 da Portaria GM/MS 373/2002 - Norma Operacional da Assistência à Saúde - NOAS-SUS 01/2002). 44. A rede de atenção oncológica de alta complexidade é composta pelos Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacons), pelas Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacons) e por serviços isolados (Portaria SAS/MS 741/2005). 45. Os Unacons são hospitais que possuem condições técnicas, instalações, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência de alta complexidade para a realização de diagnóstico definitivo e tratamento dos tipos de câncer mais prevalentes no Brasil e deve contar com, no mínimo, Serviço de Cirurgia Oncológica e Serviço de Oncologia Clínica. 46. Os Cacons são hospitais que apresentam condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos apropriados para a prestação de assistência especializada de alta complexidade, que envolva o diagnóstico e tratamento de todos os tipos de câncer. Ademais, os Cacons devem, obrigatoriamente, contar com serviços de cirurgia oncológica, oncologia clínica radioterapia e hematologia. 47. A Portaria SAS/MS 741/2005 definiu que os Cacons que desempenham papel auxiliar, de caráter técnico, em apoio ao gestor do SUS nas políticas de atenção oncológica constituem-se em Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia (Cracons). Entretanto, salvo o Inca, que é o Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia do Ministério da Saúde, nenhum outro Cacon foi autorizado como centro de referência. 48. Os serviços isolados são estabelecimentos que prestam atendimento em radioterapia e quimioterapia associados a um hospital de maior nível de complexidade (Unacon ou Cacon), atuando de forma complementar na prestação dos serviços. A Portaria SAS/MS 741/2005 vedou o credenciamento de novos serviços isolados. Conforme consta do § 9º do art. 1º da Portaria SAS/MS 62/2009, o credenciamento dos serviços isolados remanescentes de radioterapia têm prazo de vigência apenas até dezembro de 2011. Após esta data, apenas poderão continuar prestando atendimento os serviços que se integrarem a um hospital habilitado ou em condições de se habilitar, conformando um complexo hospitalar. 49. Além dos centros de atendimentos mencionados, também foram concedidas habilitações para determinados hospitais gerais realizassem cirurgias oncológicas (Portaria SAS/MS 361/2007). 50. Em junho de 2011, a rede de atenção oncológica compunha-se de 280 estabelecimentos habilitados, sendo, 42 Cacons, 213 Unacons, 9 hospitais gerais habilitados para realizar cirurgias oncológicas e, ainda, 1 serviço isolado de quimioterapia e 15 serviços isolados de radioterapia (Vide Apêndice H - Quantidade de estabelecimentos habilitados em oncologia por unidade da Federação). 2.6 Estruturação da rede e prestação dos serviços oncológicos 51. Segundo preconiza a Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS-SUS 01/2001), aprovada pela Portaria GM/MS 95/2001, o ordenamento da assistência em saúde em cada estado e no Distrito Federal deve ser realizado por meio da elaboração por parte das Secretarias de Estado da Saúde e do Distrito Federal do Plano Diretor de Regionalização (PDR), que deve guardar coerência com o Plano Estadual de Saúde. O PDR é o instrumento de ordenamento territorial que se destina a organizar os fluxos de usuários do SUS, de forma a otimizar a utilização dos recursos físicos disponíveis, bem como identificar as necessidades de investimentos em uma determinada região. Deverá ser elaborado com a perspectiva de garantir o acesso dos cidadãos aos serviços necessários à resolução de seus problemas de saúde. O PDR, por sua vez, possui dois planos complementares, o Plano Diretor de Investimentos (PDI) e a Programação Pactuada e Integrada (PPI). O PDI informa quais os investimentos físicos e financeiros que serão necessários para atender as prioridades identificadas, enquanto a PPI dispõe sobre a programação e alocação de recursos da assistência, as despesas correntes. 52. No âmbito dos estabelecimentos de saúde, a adequação da infraestrutura para prestação de serviços em oncologia processa-se por meio da aquisição de equipamentos e da realização de obras civis. Esses dispêndios podem ser realizados com recursos provenientes de convênios firmados com a União, acessíveis a hospitais filantrópicos, Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde e hospitais universitários; por meio de repasses fundo a fundo direto do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos de Saúde estaduais e municipais; ou com recursos próprios dos prestadores, no caso de esses serem particulares ou filantrópicos. Além disso, a estruturação dos prestadores de serviço em oncologia também pode se dar por meio da cessão ou da doação de equipamentos por parte do Inca. É importante esclarecer que a estruturação dos estabelecimentos de saúde para a disponibilização de tratamentos oncológicos pode demandar a realização de vultosos investimentos, especialmente em relação à prestação de serviços de radioterapia, que requerem a aquisição de equipamentos de custo elevado e a realização de obras de engenharia especiais para a preparação das instalações. Devidamente estruturados e equipados, os centros de atendimento podem ser habilitados para prestarem assistência oncológica pelo SUS. 53. O processo de credenciamento inicia-se com a solicitação apresentada pelo prestador ao gestor do SUS ou por proposta do gestor do SUS ao estabelecimento. O respectivo gestor, em sua análise, deve levar em conta as necessidades locais e verificar o atendimento dos critérios estratégicos e técnicos para credenciamento definidos na Portaria SAS/MS 741/2005 e seus anexos. O processo de credenciamento deve ser aprovado, também, pela Comissão Intergestores Bipartite (CIB). 54. Concluído o processo de credenciamento, a Secretaria de Estado da Saúde deverá encaminhar à SAS o formulário de vistoria do estabelecimento assinado pelo respectivo Secretário de Estado da Saúde. Caso a avaliação seja favorável, a SAS realizará a publicação da habilitação do estabelecimento. 55. Publicada a habilitação, os estabelecimentos tornam-se aptos a realizar os procedimentos de diagnóstico e os tratamentos por intermédio do SUS. Em geral, os pacientes são encaminhados pelas unidades básicas de saúde e pelos serviços de emergência, muitas vezes, com a interveniência das centrais de regulação. A sua distribuição deve ser realizada com base no PDR e na PPI. A PPI define os fluxos assistenciais das redes regionais de serviços pactuados pelos gestores e os limites financeiros destinados a cada município, incluindo a definição das parcelas destinadas à assistência da população residente e à população referenciada de outros municípios. Ademais, subsidia a elaboração pelos gestores locais do SUS da Ficha de Programação Orçamentária (FPO), que estabelece o teto de procedimentos para cada prestador. 56. A remuneração pela prestação dos serviços ocorre de diferentes maneiras, dependendo do tipo de prestador e de sua natureza jurídica. 57. No caso de prestadores de serviços privados com fins lucrativos a remuneração pelos serviços previstos em contrato é realizada pelos procedimentos produzidos. Ocorre a emissão pelos gestores locais do SUS da Autorização para Procedimento de Alta Complexidade (Apac), para os atendimentos realizados em nível ambulatorial, ou da Autorização para Internação Hospitalar (AIH), para os serviços prestados durante uma internação hospitalar. O processamento dessas autorizações gera o pagamento dos procedimentos oncológicos realizados. 58. Para os hospitais filantrópicos sem fins lucrativos, o pagamento também pode se dar pelos procedimentos produzidos ou de acordo com convênio formalizado com a gestão local do SUS. É importante acrescentar que, se o hospital filantrópico aderiu ao Programa de Reestruturação e Contratualização dos Hospitais Filantrópicos no SUS (Portaria MS/GM 1.721/2005), ou ao Programa de Reestruturação dos Hospitais de Ensino no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS (Portaria GM/MS 1.702/2004) recebe pela prestação de serviços de média complexidade por meio de uma parcela fixa, relacionada a metas físicas definidas; e de uma parcela variável, paga conforme se observa o cumprimento de metas de qualidade da assistência e de gestão. 59. Essa mesma regra também vale para os hospitais públicos que aderiram ao Programa de Reestruturação dos Hospitais de Ensino e para os Hospitais Federais Universitários do Ministério da Educação (MEC) (Portaria Interministerial MEC/MS 1.006/2004), contudo a folha de pagamento dos servidores desses estabelecimentos é custeada diretamente pelas respectivas esferas governamentais responsáveis ou pelo MEC, conforme o caso. 60. No caso das demais entidades públicas, os recursos da União, estados e municípios são utilizados diretamente para o custeio dos recursos humanos e para aquisição de insumos e serviços necessários aos tratamentos realizados. 3. O acesso à atenção oncológica 61. O presente capítulo discorre sobre a investigação da primeira questão de auditoria, que busca responder se a estrutura da rede de atenção oncológica vem possibilitando aos pacientes de câncer acesso tempestivo e equitativo a diagnóstico e a tratamento. 62. A elucidação dessa questão envolveu a realização de entrevistas com gestores, profissionais de saúde e pacientes oncológicos. Foram também analisadas informações obtidas por meio da pesquisa realizada via correio eletrônico com os estabelecimentos de saúde, com médicos oncologistas e com associações de apoio a pacientes. Além disso, foram realizadas análises quantitativas para apurar a adequação da estrutura da rede de atenção oncológica, assim como para levantar o nível de estadiamento dos tumores no momento dos diagnósticos e os prazos de espera para o início dos tratamentos. 63. As seções seguintes descrevem as constatações decorrentes da investigação. Tratam, inicialmente, das carências identificadas na rede de atenção oncológica e, em seguida, realiza-se uma análise da tempestividade do acesso dos pacientes aos diagnósticos e aos tratamentos. 3.1 As carências estruturais da rede de atenção oncológica 64. As análises desenvolvidas com base na documentação levantada sobre o tema e a partir das entrevistas realizadas durante os trabalhos de campo evidenciaram que a rede de atenção oncológica não está suficientemente estruturada para possibilitar aos pacientes de câncer acesso tempestivo e equitativo ao diagnóstico e ao tratamento de câncer. 65. A Constituição Federal, em seu art. 196, assegura o acesso universal da população aos serviços de saúde, sendo este um dos princípios do SUS, conforme é definido pelo art. 7º da Lei 8.080/1990, a Lei Orgânica da Saúde. A Lei 8.080 (art. 16, inciso III, alínea "a") estabelece, ainda, que à direção nacional do SUS compete definir e coordenar sistemas "de redes integradas de assistência de alta complexidade". 66. Conforme preconiza a Portaria GM/MS 2.439/2005, a rede de serviços deve ser estruturada de tal forma que garanta atenção integral à população e o acesso a consultas e exames para o diagnóstico de câncer. Nesse sentido, a Portaria SAS/MS 741/2005, em seu Anexo III, estabelece que, em geral, excetuando-se os casos de câncer de pele não melanótico, para cada 1000 casos novos de câncer, espera-se que 500 a 600 necessitem de cirurgia oncológica, 700 necessitem de quimioterapia e 600 necessitem de radioterapia. O número de Unacons e Cacons é calculado para atenderem a, no mínimo, 1.000 casos novos anuais. 67. Entretanto, a rede de atenção oncológica não se mostra suficiente para atender a toda a demanda dos pacientes por diagnóstico e tratamento de câncer. Levantamento da capacidade instalada e da produção da rede de oncologia desenvolvido pela Divisão de Apoio à Rede de Atenção Oncológica (Darao) do Inca, atualizado até 3/6/2011, estima para todo o território nacional a necessidade de 375 Unacons e Cacons. Essa estimativa é realizada considerando uma unidade de atendimento, Cacon ou Unacon, para cada 1.000 casos novos de câncer estimados, desconsiderando o câncer de pele não melanoma, conforme é definido no Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005. Na época do levantamento, existiam 264 estabelecimentos habilitados, sendo que alguns destes possuíam capacidade instalada para determinados tipos de tratamento equivalente a mais de um Unacon ou Cacon. O levantamento do Inca evidencia déficit na capacidade instalada de cirurgia, de 44 unidades de atendimento; de quimioterapia, de 39 unidades de atendimento; e de radioterapia de 135 unidades de atendimento ou equipamentos (vide Anexo A - Déficit da capacidade instalada da rede de assistência oncológica). 68. Caso se considerasse os equipamentos privados que não prestam serviço para o SUS como também integrantes da rede, o déficit apurado pelo Inca reduzir-se-ia a 57 equipamentos de radioterapia. O levantamento aponta que as maiores carências de equipamentos de radioterapia da rede do SUS, em número de equipamentos, estão localizadas em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Em termos relativos, as carências mais significativas localizam-se nos estados de Amazonas, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia e Tocantins, em que o déficit é igual ou superior a 50% das necessidades, além de Amapá e Roraima, onde não há serviços de radioterapia. 69. É importante assinalar que o déficit de equipamentos de radioterapia é ainda maior que o apontado, pois o Inca não deixou de computar os estabelecimentos que sofreram interrupção na prestação dos serviços. Somente em 2010, 23 estabelecimentos oncológicos, cujos equipamentos de radioterapia são contados na tabela do Inca, tiveram sua produção radioterápica descontinuada. Desses, seis não tiveram qualquer produção de radioterapia durante todo o ano. 70. Segundo foi possível apurar, as causas para a interrupção da produção vão desde a demora na realização de consertos nos equipamentos danificados, como é o caso dos equipamentos de radioterapia do Hospital Universitário do Mato Grosso do Sul, em Campo Grande (ARRUDA, 2010), e do Centro Oncológico de Dourados, no mesmo estado (FOLHA DO MS, 2009), até atrasos na instalação dos equipamentos, que permanecem encaixotados por longos períodos. Esse foi o caso do Hospital Regional de Santarém (PA) (G1. GLOBO.COM, 2010) e do Hospital Universitário em Brasília, que manteve equipamentos de radioterapia encaixotados por mais de 5 anos (MADER, 2009) (vide processo do TCU 007.141/2007-8). 71. É importante considerar, ainda, que entre, os estabelecimentos habilitados para prestar serviços de radioterapia, existiam, em junho de 2011, quinze serviços isolados, que somente têm prazo para continuar funcionando até dezembro do mesmo ano. O relatório de gestão da SAS de 2010 esclareceu que "o Ministério da Saúde pretende finalizar com todos os serviços isolados ainda existentes no país, pois se sabe que raros são os casos de câncer que precisam de apenas uma modalidade terapêutica oncológica (cirurgia, radioterapia, quimioterapia ou iodoterapia)." Informa, ainda, que, desde 2008, o Ministério tem procurado "sensibilizar os gestores e prestadores do SUS quanto à necessidade de integração dos serviços dentro de um hospital para que o doente de câncer tenha um tratamento adequado, integral e integralizado" (BRASIL, 2011f). 72. Como forma de confirmar as carências dos serviços de radioterapia apontadas nos controles do Inca, decidiu-se confrontar o número de atendimentos realizados com as necessidades estimadas. Para o cálculo do número de pacientes atendidos foram computadas todas as Apacs de radioterapia iniciais ou únicas processadas durante o ano de 2010 (foram excluídas as Apacs de continuidade). A estimativa da demanda por atendimento foi realizada tomando por base os parâmetros definidos na Portaria SAS/MS 741/2005, que prevê cerca de 600 tratamentos de radioterapia por cada mil casos de câncer, aplicada sobre as estimativas para novos casos de câncer realizadas pelo Inca para o ano de 2010 (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2009). Nas unidades da Federação com serviços de radioterapia não credenciados ao SUS, o cálculo da demanda dirigida ao SUS descontou da demanda total estimada os atendimentos que teriam sido direcionados aos serviços privados, proporcionalmente ao percentual da população coberta por planos de saúde. 73. Constatou-se que, em âmbito nacional, a produção observada cobriu apenas 65,9% das necessidades estimadas. Conforme se pode visualizar na Tabela 3, as maiores defasagens de cobertura, superiores a 50%, foram observadas nos estados de Amazonas, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Sergipe e, também, no Distrito Federal, além do Amapá e Roraima, que não possuem serviço de radioterapia. 74. As entrevistas realizadas nos trabalhos de campo também evidenciaram as carências existentes na oferta de serviços de radioterapia. Nos estados da Bahia, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, São Paulo e, também, no Distrito Federal, ou seja, em seis das sete localidades visitadas, foram mencionadas dificuldades para suprir as necessidades de radioterapia. 75. As atas das reuniões realizadas no Conselho Consultivo do Inca (Consinca) também expressaram as carências na rede de atenção oncológica em relação à oferta de serviços de radioterapia. A ata da reunião de 13/4/2005 trouxe um relato dos problemas que já afligiam a oferta de radioterapia à época: "(...) mais de 100 mil pessoas ficam sem tratamento, em função do "déficit" de equipamentos, que evoluem para cuidados paliativos, fora de possibilidade de tratamento, precisando de outros cuidados que vão onerar ainda mais a União (...)" (CONSELHO CONSULTIVO DO INCA, 2005). Passados quatro anos, na ata do Consinca de 15/4/2009 constou: "(...) embora no Brasil, ainda haja 90 mil pessoas que não têm acesso ao tratamento de RT, reconhece o esforço feito (...)" Em outro ponto do mesmo registro, menciona-se que "estão vivendo um caos na RT, no Brasil, com uma grande demanda reprimida." (CONSELHO CONSULTIVO DO INCA, 2009). Essa mesma ata apresenta os resultados de Grupo de Trabalho constituído para discutir diretrizes da radioterapia para a Política Nacional de Atenção Oncológica. No relato, afirma-se: "o déficit de oferta regional de radioterapia é reconhecido pelo Programa "Mais Saúde" e pela Portaria SAS Nº 62/2009". Tabela 3 - Comparação entre os atendimentos de radioterapia, quimioterapia e cirurgias oncológicas e a demanda estimada - Brasil - 2010 Radioterapia Quimioterapia Cirurgias oncológicas UF Pacientes atendidos (SUS) Demanda dirigida ao SUS Atend. da demanda dirigida ao SUS Pacientes atendidos (SUS) Demanda dirigida ao SUS Atend. da demanda dirigida ao SUS Pacientes atendidos por hospitais habilitados Demanda dirigida ao SUS Atend. da demanda dirigida ao SUS pelos hospitais habilitados AC 276 282 97,9% 481 309 155,7% 125 243 51,4% AL 1.315 1.446 90,9% 2.750 1.531 179,6% 343 1.203 28,5% AM 1.167 2.454 47,6% 1.954 2.558 76,4% 817 2.010 40,6% AP 0 330 0,0% 149 349 42,7% 42 274 15,2% BA 5.157 8.466 60,9% 11.898 8.940 133,1% 3.013 7.024 42,9% CE 3.711 6.834 54,3% 13.885 7.073 196,3% 3.384 5.557 60,9% DF 746 2.246 33,2% 4.208 2.621 160,5% 915 2.059 44,4% ES 2.349 3.152 74,5% 6.735 3.677 183,1% 1.753 2.889 60,7% GO 2.472 4.568 54,1% 5.311 5.329 99,7% 2.253 4.187 53,8% MA 1.565 2.724 57,5% 2.153 3.034 71,0% 1.157 2.384 48,5% MG 13.562 17.928 75,6% 33.710 20.916 161,2% 7.898 16.434 48,1% MS 845 2.496 33,9% 3.790 2.912 130,2% 788 2.288 34,4% MT 1.578 2.172 72,6% 2.798 2.534 110,4% 584 1.991 29,3% PA 1.929 3.121 61,8% 1.471 3.641 40,4% 514 2.861 18,0% PB 2.349 2.304 102,0% 4.573 2.459 186,0% 952 1.932 49,3% PE 4.392 6.824 64,4% 14.717 7.962 184,9% 3.796 6.255 60,7% PI 1.971 1.512 130,4% 3.820 1.662 229,9% 1.023 1.306 78,4% PR 9.849 12.241 80,5% 19.478 14.281 136,4% 8.211 11.221 73,2% RJ 7.461 17.903 41,7% 21.577 20.887 103,3% 4.773 16.411 29,1% RN 2.272 2.004 113,4% 6.497 1.999 325,0% 923 1.571 58,7% RO 587 996 58,9% 785 1.050 74,7% 49 825 6,0% RR 0 312 0,0% 196 343 57,0% 113 270 41,7% RS 8.383 18.950 44,2% 30.705 22.108 138,9% 6.150 17.371 35,4% SC 3.882 5.587 69,5% 13.107 6.518 201,1% 3.075 5.122 60,0% SE 560 1.524 36,7% 1.536 1.583 97,0% 340 1.244 27,3% SP 32.417 39.881 81,3% 82.843 46.527 178,1% 18.008 36.557 49,3% TO 769 1.080 71,2% 1.483 1.193 124,3% 285 938 30,4% Total 111.564 169.337 65,9% 292.610 193.999 150,8% 71.280 152.428 46,8% Fontes: INCA (Estimativas de Câncer 2010; e capacidade instalada da radioterapia não SUS); Datasus (ANS Tabnet - Informações em Saúde Suplementar; população residente; e bancos de dados das Apacs). Nota: I - A demanda dirigida ao SUS foi calculada por meio da multiplicação do percentual de cobertura dos planos de saúde pela demanda estimada total (no caso da demanda por radioterapia, esta operação somente foi realizada nas UFs nas quais existe capacidade instalada de radioterapia não dirigida ao SUS) II - O Apêndice I traz tabelas mais detalhadas sobre a comparação entre os atendimentos e a demanda estimada de radioterapia, quimioterapia e procedimentos cirúrgicos oncológicos. 76. O documento que comunica os resultados do mencionado Grupo de Trabalho apresentou um conjunto de propostas, que foram estruturadas em "eixos", conforme discriminado a seguir (BRASIL, 2011e): a) Eixo 1: Ampliação da assistência em radioterapia: proposta de criação de novos serviços e a ampliação da capacidade instalada dos serviços existentes; b) Eixo 2: Sustentabilidade econômica dos serviços de radioterapia: proposição de reavaliação da tabela de procedimentos e implantação de política de redução ou isenção de impostos; c) Eixo 3: Recursos Humanos: previsão de regulamentação da atividade profissional de físicos para atuação em radioterapia, bem como de cursos de especialização para esses profissionais, além de cursos de qualificação para tecnólogos e técnicos; d) Eixo 4: Regulação, avaliação e controle da assistência em radioterapia: previsão de integração hospitalar dos serviços isolados de radioterapia, de manutenção e ampliação do programa de qualidade, de avaliação da produção, além da definição de incentivos para o desenvolvimento de "estudos que avaliem o custo-efetividade para subsidiar a incorporação de novas tecnologias no âmbito do SUS." 77. Em relação ao Programa Mais Saúde: Direito de Todos 2008 - 2011, lançado em 5/12/2007, de fato, as metas definidas confirmam a necessidade de ações visando à melhor estruturação da rede de atenção oncológica. Inicialmente, foram estabelecidas as seguintes metas: aquisição de 24 equipamentos de megavoltagem de radioterapia, ao custo de R$ 2 milhões cada; implantação de 20 novos Cacons, ao custo de R$ 6 milhões por Cacon; e ampliação do acesso aos serviços de oncologia por meio da habilitação e custeio de 40 Cacons, ao custo unitário anual de R$ 5 milhões (BRASIL, 2007). Posteriormente, essas metas foram revistas. De 24 equipamentos de radioterapia inicialmente previstos, a meta foi reformulada para apenas 8 equipamentos, destes, 5 já teriam sido adquiridos. A meta de instalação de Cacons foi reduzida de 20 para 10, sendo que, até 2010, 6 já teriam sido instalados (Vide Apêndice G - Metas e indicadores definidos para a atenção oncológica). 78. Em relação à oferta de serviços de quimioterapia, o confronto do número de tratamentos realizados no ano de 2010 com as necessidades estimadas não evidencia a existência de déficit. O Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005 define que, em média, os pacientes de câncer que recebem quimioterapia permanecem de seis a nove meses em tratamento. Em razão disso, estimou-se o número de pacientes atendidos pela divisão do número total de procedimentos realizados durante o ano de 2010 por 7,5 meses, que representa o tempo médio em tratamento. O resultado obtido indica que, durante o ano de 2010, 292.610 pessoas teriam realizado quimioterapia pelo SUS, o que representa 111,3% da demanda estimada de quimioterapia para todo o Brasil, da ordem de 262.794 tratamentos. Caso se desconte da demanda total os atendimentos que teriam sido dirigidos aos serviços de quimioterapia que não prestam serviços ao SUS, proporcionalmente ao percentual de cobertura dos planos de saúde em cada unidade da Federação, a demanda estimada reduz-se para 193.999 tratamentos e a produção observada passa a representar 150,8% desse valor, conforme pode ser visualizado na Tabela 3. Portanto, o que se observa ao se utilizar os parâmetros definidos pela Portaria SAS/MS 741/2005 para todo o Brasil é que estaria havendo uma superprodução de quimioterapia. 79. Não obstante, quando se considera a cobertura da produção em cada uma das unidades da Federação, ainda é possível encontrar carências importantes na prestação dos serviços de quimioterapia nos estados do Pará, Amapá, Roraima, Maranhão, Rondônia e Amazonas. O resultado que chama mais atenção é o apurado para o estado do Pará, que supre apenas 40,4% da demanda estimada. 80. Esse resultado é compatível com os relatos ouvidos nas entrevistas realizadas com os gestores da saúde do Pará e da cidade de Belém (PA), que apontaram dificuldades para o atendimento da demanda por quimioterapia, em razão de atrasos para compra de fármacos e de falta de leitos para internação. Outro estado visitado que apresentou déficit de produção de quimioterapia em relação à demanda estimada foi o Maranhão, o que também foi corroborado pelas manifestações dos gestores de saúde do município de São Luís (MA), que relataram carências na oferta desse tipo de tratamento. 81. Um dos fatores que pode explicar o descompasso entre a produção observada e as necessidades estimadas de quimioterapia em determinadas unidades da Federação é a falta de oferta de radioterapia, que leva determinados contingentes de pacientes a realizarem todo o seu tratamento em outros estados. Essa é, seguramente, a situação que ocorre com os residentes nos estados de Amapá e Roraima, que sequer oferecem serviços de radioterapia. 82. Também foi realizada análise da produção de cirurgias oncológicas em relação às necessidades estimadas. O número de procedimentos cirúrgicos em oncologia (com código de grupo 04 e subgrupo 16), que somente podem ser realizados em estabelecimentos habilitados, foram confrontados com as estimativas de demanda por cirurgia, considerando o número médio de 550 cirurgias para cada 1.000 novos casos de câncer (o Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005 informa que, de forma geral, para cada 1.000 casos, 500 a 600 necessitam de cirurgia oncológica). O resultado evidencia um déficit considerável: em 2010, os centros habilitados realizaram apenas 85.536 procedimentos cirúrgicos, que representam 34,5% da demanda total por cirurgia oncológica, calculada em 206.481, e 46,8% da demanda dirigida ao SUS, descontados os pacientes detentores de planos de saúde, estimada em 152.428 cirurgias (vide a Tabela 3). 83. Esses resultados são coerentes com as manifestações dos gestores hospitalares e das secretarias de saúde e entrevistados durante os trabalhos de campo, que relataram dificuldades para que os pacientes tenham acesso às cirurgias oncológicas de que necessitam. Os gestores dos estados de Santa Catarina e das cidades de Salvador (BA) e São Luís (MA) informaram a existência de filas para a realização das cirurgias oncológicas. Gestores entrevistados no estado do Pará e no município de Salvador também mencionaram que encontram dificuldades para a realização de procedimentos cirúrgicos, especialmente de cabeça e pescoço. Além disso, gestores hospitalares de hospitais visitados nesses estados, Bahia, Maranhão, Pará e Santa Catarina, assim como no Distrito Federal, informaram a existência de demanda reprimida para a realização de cirurgias oncológicas. 84. Entretanto, quando se analisam as peculiaridades inerentes aos tratamentos cirúrgicos oncológicos, há um aspecto importante que não pode ser desconsiderado. Toda a rede do SUS está autorizada a realizar determinadas cirurgias que podem se constituir em opção terapêutica para tratamentos de câncer. Quando se considera a totalidade dessas cirurgias realizadas pelo SUS em 2010 para pacientes com diagnóstico de câncer e não somente aquelas realizadas em estabelecimentos habilitados, observa-se que os parâmetros definidos pela Portaria SAS/MS 741/2005 foram, na verdade, superados, ou seja, a produção observada, 218.930 cirurgias, representou 119,7% da demanda estimada especificamente para o SUS (vide Apêndice I). Segundo informações obtidas com os gestores, o parâmetro que estima a quantidade de cirurgias por 1.000 casos de câncer foi construído a partir da realidade observada nas instalações do Inca, levando em conta, também, padrões internacionais. O fato de se ter utilizado como balizador a produção observada no Inca, que é uma unidade especializada em atendimento oncológico, pode ter contribuído para que o parâmetro tenha sido superado ao se considerar a totalidade de cirurgias, incluídas as realizadas em hospitais não especializados, indicando que esse parâmetro não seria adequado para se estimar a quantidade de cirurgias necessárias, quando se considera toda a rede do SUS. 85. A necessidade de se melhorar o acesso aos procedimentos cirúrgicos vinculados à oncologia, não é uma situação recente. Já havia sido mencionada na Nota Técnica 26ª do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) sobre a Política Nacional de Atenção Oncológica, divulgada em 2005, na qual consta que "atualmente um dos grandes problemas de assistência oncológica é a melhoria do acesso à cirurgia oncológica". 86. Quando se procura identificar as causas para o atual quadro de carências observado, conclui-se que os investimentos governamentais realizados com o objetivo de dotar a rede de atenção oncológica de estrutura adequada para atender a demanda por tratamento não têm sido suficientes, especialmente em relação aos equipamentos de radioterapia. 87. Além disso, os mecanismos existentes para possibilitar a estruturação dos serviços de radioterapia não têm se mostrado efetivos no sentido de solucionar as carências identificadas. Atualmente, as doações de equipamentos por parte do Ministério da Saúde desenvolvem-se a partir de demanda apresentada pelos gestores locais. Com base em documentos solicitados ao Inca, observou-se que, mesmo que todos os pedidos de doações de equipamentos apresentados a partir de 2009 tivessem sido atendidos, o déficit de serviços de radioterapia não teria sido solucionado. Relação disponibilizada pelo Inca listou solicitações atendidas de 2009 a 2010 envolvendo oito municípios e solicitações pendentes de atendimento de outros seis municípios. 88. No mesmo sentido, a sistemática de habilitação de novos estabelecimentos, também realizada a partir da iniciativa dos gestores locais, igualmente, não tem sido efetiva no sentido de adequar a rede às necessidades de atendimento. A partir da análise de planilha de controle das habilitações da rede de atenção oncológica fornecida pela CGMAC, constatou-se que, mesmo que se somassem todos os serviços de radioterapia em vias de habilitação com os previstos, mas com documentos pendentes, e, ainda, com aqueles não habilitados em função de pendências inviabilizantes, chegar-se-ia a tão somente mais 12 unidades, insuficientes para superarar as carências existentes. 89. Outro fator que contribui para a permanência das carências estruturais da rede de atenção oncológica é a inexistência de um acompanhamento efetivo da prestação dos serviços por parte dos estabelecimentos habilitados. A Portaria SAS/MS 62/2009 reeditou o que já constava da Portaria SAS/MS 146/2008, que havia estabelecido que a CGMAC, o Inca e a CoordenaçãoGeral de Regulação e Avaliação (CGRA) deveriam manter o monitoramento e a avaliação contínua e anual dos estabelecimentos habilitados, em termos do enquadramento nos parâmetros estabelecidos para habilitação, da avaliação da produção alcançada, assim como da resolução de pendências eventualmente remanescentes à habilitação. As mesmas portarias determinaram que, a cada ano, as Secretarias de Estado da Saúde avaliassem a produção desses estabelecimentos e os indicadores divulgados pela CGMAC, de forma a poderem propor o que considerassem cabível em termos de ajustes nas habilitações estabelecidas. O acompanhamento da produção dos estabelecimentos promovido pela SAS tem se caracterizado pela coleta e divulgação anual dos indicadores de produtividade. Entretanto, essas medidas não têm sido suficientes para induzir a adoção de ações corretivas visando à solução dos problemas identificados e para assegurar a recomposição da rede de atenção oncológica. A título de exemplificação, convém lembrar que os controles de déficit de equipamentos do Inca sequer levam em conta longas interrupções no funcionamento dos equipamentos. 90. Outro fator que pode contribuir para a insuficiência da rede de atenção oncológica é a falta de atualização periódica das tabelas do SUS, na medida em que a remuneração insuficiente de algum procedimento pode desestimular a oferta de determinado serviço. Como exemplo, pode-se citar a remuneração por serviços de radioterapia, que foi revista por meio da Portaria SAS/MS 420, de 25 de agosto de 2010, depois de permanecer por muitos anos sem ser atualizada. Essa Portaria reajustou procedimentos importantes de radioterapia em percentuais variados, como a braquiterapia de alta taxa de dose (por inserção), em 79,66%; a cobaltoterapia (por campo), em 72,21%; a roentgenterapia (por campo), em 298,72%; a radioterapia com acelerador linear só de fótons (por campo), em 72,22%; a radioterapia com acelerador linear de fótons e elétrons (por campo), em 76,77%. Os valores anteriores para os mesmos procedimentos já haviam sido definidos pela Portaria GM/MS 1.095, de 5/7/2005. 91. As carências estruturais descritas levam a atrasos na prestação da assistência oncológica e, ainda mais grave, constituem-se em barreiras para o acesso de parte dos doentes de câncer a essa assistência. Além disso, pode-se identificar, ainda, falta de equidade no acesso aos tratamentos, tendo em vista as realidades diferenciadas vivenciadas pelos diversos estados em termos de estruturação da rede de atenção oncológica, conforme demonstram a Tabela 3 e o Anexo A. 92. Em razão do exposto, considera-se fundamental recomendar ao Ministério da Saúde que desenvolva plano para sanar de forma efetiva a insuficiência da estrutura da rede de atenção oncológica, o qual deverá ser conduzido em articulação com os gestores locais do SUS, de forma a considerar a realidade e as necessidades presentes em cada região. O referido plano deverá prever a aquisição e instalação de equipamentos ou contratação dos serviços e a definição de prazos e metas progressivos até a completa solução das carências existentes, especialmente, em relação à oferta de serviços de radioterapia, de cirurgias oncológicas e dos principais exames para diagnóstico oncológico. Deverá contemplar, ainda, a elaboração de sistemática de atualização dos valores dos procedimentos custeados pelo SUS com base na avaliação periódica dos custos efetivos, com o objetivo de não desestimular a oferta dos serviços de saúde, assim como a mensuração do impacto financeiro das medidas planejadas. Além disso, considera-se pertinente recomendar que o Ministério estabeleça rotina de acompanhamento constante da evolução do plano que possibilite a divulgação periódica dos seus resultados. 93. Entende-se que a adoção dessas medidas deverá contribuir para adequada estruturação da rede de atenção oncológica, de forma a conferir maior tempestividade aos tratamentos de câncer e tornar realidade o acesso universal da população à assistência oncológica. Como consequência disso, espera-se que seja possível o aumento das perspectivas de cura dos pacientes e a melhoria das suas condições de vida durante os tratamentos. 94. Como forma de demonstrar como um planejamento adequado pode ensejar resultados importantes na adoção de políticas de combate ao câncer, transcreve-se trecho retirado do documento Cancer Reform Strategy, do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, que relata parte dos progressos havidos naquele país a partir da adoção de um plano para o combate ao câncer no ano de 2000: 1.3 Durante os anos 1980 e 1990 o Reino Unido estava em uma posição inaceitável em taxas de sobrevida, que estavam entre as mais pobres da Europa Ocidental. Os pacientes, muitas vezes, esperavam por longos períodos por diagnóstico e tratamento. (...) É por isso que o governo definiu planos ambiciosos para melhorar os serviços de câncer no NHS Cancer Plan, publicado em 2000. 1.4 Desde então, os resultados têm melhorado: - Mortalidade por câncer em pessoas com menos de 75 caiu mais de 17% entre 1996 e 2005. Isso equivale a cerca de 60 mil vidas salvas durante este período; (...) - As taxas de sobrevivência para alguns tipos de câncer (como colorretal e de mama) estão melhorando ano após ano, da mesma forma que em outros países europeus, e (...) 1.6 Desde a implementação do NHS Cancer Plan, agora temos: (...) - Diagnóstico e tratamento mais rápidos - tempos de espera para assistência oncológica reduziram-se dramaticamente: (...) - Mais de 99% dos pacientes agora recebem seu primeiro tratamento para câncer dentro de um mês do diagnóstico (em 1999/2000 apenas 31% dos pacientes pesquisados ¿¿relataram que receberam o seu primeiro tratamento dentro de um mês da sua primeira consulta hospitalar)". NATIONAL HEALTH SERVICE (NHS). Reino Unido. Cancer Reform Strategy. Department of Health, Londres, 2007. 95. Adicionalmente, em função das inconsistências reveladas pelas análises quantitativas realizadas com objetivo de avaliar a produção observada frente às estimativas de necessidades de tratamento, entende-se pertinente recomendar, ainda, que a SAS desenvolva estudos com o objetivo de revisar os parâmetros de necessidade estabelecidos no Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005 para os tratamentos de radioterapia, quimioterapia e para os procedimentos cirúrgicos, de forma a assegurar que o acompanhamento dos resultados seja realizado com base em indicadores adequados. Cabe recomendar, ainda, que, uma vez estabelecidos novos parâmetros ou ratificados os atuais, a SAS estabeleça rotina com o objetivo de levantar os casos de produção excessiva por unidade da Federação e estabelecimento, de forma a possibilitar o encaminhamento dos casos que se constituírem em indícios de fraude na cobrança de recursos ao SUS aos órgãos locais de auditoria e ao Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus). Como forma de dar o devido tratamento às ocorrências observadas na produção do ano de 2010, entende-se pertinente recomendar que a rotina seja iniciada a partir dos procedimentos processados durante esse ano. 96. A adoção de tais medidas deverá contribuir para que haja um controle mais efetivo dos recursos do SUS aplicados na atenção oncológica e para a identificação tempestiva de distorções decorrentes de fraudes perpetradas na prestação dos serviços correspondentes. 3.2 A falta de tempestividade no acesso à atenção oncológica 97. As análises quantitativas realizadas com dados extraídos do Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS) e dos Registros Hospitalares de Câncer (RHC) organizados pelo Inca e pela Fundação Oncocentro de São Paulo (Fosp) demonstraram que os tratamentos oncológicos providos pelo SUS não têm sido tempestivos. 98. No Reino Unido, considerando o conjunto de tratamentos oncológicos, mais de 99% dos pacientes receberam, em 2007, seu primeiro tratamento para câncer dentro de um mês a contar do diagnóstico (DEPARTMENT OF HEALTH, 2007). Além disso, em relação aos tratamentos radioterápicos, tem-se como meta que o intervalo entre o diagnóstico (decisão de tratar) e o primeiro tratamento seja menor ou igual a um mês. Em auditoria realizada em 2007, o Royal College of Radiologists constatou que 92% dos tratamentos radioterápicos ficaram dentro dessa meta (DRINKWATER, K. J.; WILLIAMS, M. V , 2008). 99. Outra referência em tratamento de câncer vem do Canadá, que adota o padrão de ter, ao menos, 75% dos tratamentos radioterápicos iniciados em até 28 dias da data em que o paciente está pronto para ser tratado. Um estudo comparativo entre as dez províncias canadenses acerca de tempos de espera em serviços de saúde indicou que, no período de abril a setembro de 2009, em oito delas ao menos 88% dos pacientes iniciaram radioterapia dentro do prazo de 28 dias de espera, superando, portanto, o padrão estabelecido (CANADIAN INSTITUTE FOR HEALTH INFORMATION , 2010). 100. No Brasil, os bancos de dados que armazenam informações sobre os casos de câncer não vêm sendo utilizados para o cálculo da tempestividade para o início dos tratamentos. Em razão disso, considerando a importância da tempestividade para o sucesso terapêutico dos casos de câncer, procurouse apurar os lapsos temporais entre as datas de diagnósticos e de início dos tratamentos a partir dos dados armazenados nas Apacs de radioterapia e quimioterapia processadas no SIA/SUS em 2010. Como forma de conferir maior segurança às estimativas realizadas, procedeu-se ao mesmo tipo de análise com os dados do RHC disponibilizados pelo Inca e também pela Fosp. 101. Há que se examinar com cautela os resultados obtidos em função de uma série de limitações presentes nessas bases de dados. Entre as Apacs processadas em 2010, foram observados diversos registros com dados manifestamente inconsistentes, como anos de início de tratamento variando entre 1951 e 2501 e anos de diagnóstico anteriores a 1900. É importante considerar que o sistema SIA/SUS não realiza crítica para campos importantes para a análise de tempestividade, tais como data do diagnóstico e data de início do tratamento. 102. Como forma de eliminar os dados inconsistentes, foram excluídos da base de Apacs os casos que apresentavam data de tratamento posterior a 2010, data de diagnóstico posterior à data de início de tratamento, além de lapsos entre diagnóstico e início de tratamento superiores a um ano. Também foram desconsiderados casos com tratamento iniciado antes de 2010, casos com tratamento anterior ou continuidade de tratamento e casos de tratamentos adjuvantes, assim definidos aqueles que se seguem à realização de uma cirurgia de câncer. Com o objetivo de não permitir o cálculo de resultados piores que os reais, decidiu-se manter os registros em que as datas de diagnóstico e tratamento eram iguais, mesmo entendendo que parte desses casos possam ter decorrido de erros de preenchimento. 103. O resultado da análise dos dados das Apacs de quimioterapia indicou que o tempo médio de espera entre a data do diagnóstico e o início dos tratamentos foi de 76,3 dias. Os mesmos dados demonstraram que, em 2010, apenas 35,6% dos pacientes que se enquadravam nas condições definidas para a análise conseguiram iniciar seus tratamentos nos primeiros 30 dias a partir do diagnóstico. 104. Os indicadores calculados para a tempestividade da radioterapia mostraram-se ainda mais críticos. O tempo médio de espera calculado entre a data do diagnóstico e o início dos tratamentos foi de 113,4 dias. Apenas 15,9% dos pacientes de radioterapia conseguem iniciar seus tratamentos dentro de 30 dias desde o diagnóstico. 105. A análise dos dados do RHC da Fosp de São Paulo foi realizada com os casos diagnosticados em 2009, em função da desatualização dos dados referentes ao ano de 2010. Nessas análises também foi necessário excluir casos que não traziam a data de início dos tratamentos, sem informação do tratamento realizado e com lapsos de espera superiores a um ano. 106. Os resultados obtidos demonstram que os tratamentos não foram tempestivos. O tempo de espera médio para o início dos tratamentos foi de 46,6 dias. Quando se calcula a espera para o início dos tratamentos dos pacientes que se submeteram exclusivamente à quimioterapia, obtém-se o lapso de 49,9 dias, para os pacientes que somente realizaram radioterapia o resultado calculado foi de 91,3 dias; e para os pacientes que se submeteram apenas a cirurgias foi de 35 dias. Somente 52,4% dos tratamentos começaram em até 30 dias do diagnóstico. É importante considerar que o RHC de São Paulo conta com a adesão voluntária de hospitais que não fazem parte da rede do SUS. 107. A análise dos dados do RHC organizado pelo Inca, que deveria trazer informações de câncer de todos os estados do Brasil, foi realizada com os casos diagnosticados em 2007, em função da grande limitação na cobertura dos registros referentes aos anos mais recentes. Esses registros de 2007, todavia, provieram de menos de 50% dos estabelecimentos habilitados e, preponderantemente, de cinco estados, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, responsáveis por 82,1% das informações. Além disso, esse banco de dados continha uma grande quantidade de inconsistências, como a falta da data de início de tratamento, código de tratamento inválido e data de diagnóstico posterior à data de início de tratamento. Esses registros também foram descartados, juntamente com os casos que apresentavam lapsos entre diagnóstico e início de tratamento superiores a um ano. 108. Os resultados obtidos com os dados do RHC do Inca são coerentes com os dados de tempestividade estimados com os demais bancos de dados. O tempo médio de espera apurado para o início dos tratamentos foi de 70,3 dias e somente 38,4% dos pacientes iniciam seus tratamentos dentro dos primeiros 30 dias após o diagnóstico. Se considerarmos apenas os pacientes cujo primeiro tratamento foi quimioterapia, o tempo médio de espera foi de 58,2 dias; para os pacientes cujo primeiro tratamento foi de radioterapia, o prazo médio apurado foi de 100,6 dias; e para aqueles pacientes que, inicialmente, foram submetidos a cirurgia, o prazo de espera foi calculado em 54,4 dias. Tabela 4 - Tempos de espera para iniciar radioterapia a contar da data de diagnóstico comparação entre Brasil, Reino Unido e Canadá. Local Ano Fonte de dados Tratamentos iniciados em até 30 dias Mediana (dias) Média (dias) Canadá (Província de Manitoba) 2009 Canadian Institute for Health Information 100,0% 6 --Reino Unido 2007 The Royal College of Radiologists 92,0% 15 --Canadá (Província de Nova Escócia) 2009 Canadian Institute for Health Information 62,0% 21 --Brasil 2007 RHC - Inca 15,7% 77 100,6 Brasil 2009 RHC - FOSP 17,1% 80 91,3 Brasil 2010 SIA/SUS 15,9% 89 113,4 Fontes: Conforme tabela. Notas: I - Entre as dez províncias canadenses constantes da pesquisa do CIHI, são apresentadas nesta tabela apenas a de melhor e a de pior desempenho. II - Nos indicadores calculados para o Brasil, foram excluídos casos que se enquadravam nas seguintes situações: data de tratamento posterior a 2010; data de diagnóstico posterior à data de início de tratamento; lapsos entre diagnóstico e início de tratamento superiores a um ano; com tratamento iniciado antes de 2010; com tratamento anterior ou continuidade de tratamento; e de tratamentos adjuvantes. Foram mantidos para análise, após a aplicação dos critérios de exclusão mencionados, 20,2%, 59,4% e 99,1% dos casos de radioterapia presentes nos bancos de dados do SIA/SUS, RHC Inca e RHC FOSP, respectivamente. 109. De fato, os tempos de espera dos doentes de câncer no Brasil estão bem distantes dos padrões internacionais mencionados, conforme se pode observar na Tabela 4, que sintetiza os resultados estimados exclusivamente para radioterapia e os confronta com alguns resultados retirados de casos consultados referentes a outros países. Os tempos de espera para iniciar radioterapia no Brasil, expressos pela mediana, são mais do que cinco vezes maiores do que o mesmo índice no Reino Unido. Os percentuais de radioterapias iniciadas antes de um mês no Brasil equivalem a cerca de um quarto do percentual exibido pela província canadense de pior desempenho nesse indicador (Nova Escócia). 110. A pesquisa realizada por correio eletrônico com médicos oncologistas também evidenciou problemas de tempestividade para o atendimento da demanda por diagnóstico e por tratamentos de câncer. Para 88,1% dos respondentes, a demora na realização de exames e de outros procedimentos para diagnóstico tem dificultado a prestação da assistência oncológica. Este foi o item mais mencionado. Para 77,5% dos médicos participantes, outro fator dificultador da prestação da assistência tem sido a demora no acesso dos pacientes ao início dos tratamentos. 111. Além disso, a maioria dos respondentes classificou como demorados ou excessivamente demorados os tempos de espera para os seguintes exames: biópsia de mama (58,3%); biópsia de próstata (60,3%); outras biopsias (73,5%); e endoscopia, colonoscopia e exames anátomo-patológicos (72,9%). A situação mais crítica é a dos exames de tomografia computadorizada e de imunohistoquímica, que são demorados ou excessivamente demorados para 78,8% e 85,4% dos especialistas, respectivamente. 112. O tempo de espera para a realização de procedimentos cirúrgicos também foi classificado como demorado ou excessivamente demorado por 86,8% dos oncologistas que responderam à pesquisa. Além disso, 74,2% dos oncologistas avaliaram da mesma forma o tempo de espera para radioterapia. [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] 113. As respostas das associações de apoio a pacientes que participaram da pesquisa também revelaram problemas de tempestividade. Destas, 90,9% apontaram a demora na realização de exames para diagnóstico como o maior fator que dificulta o acesso dos pacientes à atenção oncológica. A demora para o início dos tratamentos também foi apontada por 56,8% das associações respondentes. 114. Na avaliação dos tratamentos para os quais há maior dificuldade de acesso, a falta de tempestividade para a realização de procedimentos cirúrgicos foi o item mais assinalado pelas associações respondentes, com 56,8% das respostas. 115. As entrevistas realizadas durante os trabalhos de campo também evidenciaram que a rede de atenção oncológica não tem conseguido atender adequadamente a demanda por diagnóstico e tratamento. Os gestores da área da saúde da Bahia, Distrito Federal, Maranhão e Mato Grosso do Sul, assim como os gestores das capitais dos respectivos estados esclareceram que a rede de atenção oncológica não tem suprido adequadamente as necessidades de atendimento da população. 116. Além disso, com exceção de um, todos os gestores dos hospitais visitados informaram que existe demanda reprimida para determinados tratamentos de oncologia. Os problemas mais citados estão associados à realização de procedimentos cirúrgicos e de radioterapia 117. Adicionalmente, a grande maioria dos médicos entrevistados durante os trabalhos de campo classificou o tempo de espera para a realização de exames para diagnóstico como demorado ou excessivamente demorado (31 em 35 entrevistas). A maior parte dos médicos também considerou demorado ou excessivamente demorado o acesso às cirurgias (22 entrevistados) e aos tratamentos de radioterapia (25 entrevistados). 118. Diversos fatores contribuem para as dificuldades de acesso da população necessitada à atenção oncológica e para a falta de tempestividade na realização de diagnósticos e tratamentos. Entre esses fatores, pode-se mencionar a incipiência do sistema de regulação de acesso de pacientes. Durante o desenvolvimento dos trabalhos de campo, verificou-se que os sistemas de regulação de acesso nos estados visitados apresentam configurações variadas e encontram-se em processo de implantação ou consolidação, com diferentes estágios de desenvolvimento. Em auditoria realizada em 2009 sobre a regulação assistencial do SUS, o TCU já havia constatado que, "na maior parte dos estados, a operacionalização da regulação não é instrumentalizada plenamente por protocolos operacionais". Constatou, ainda, que "a informatização dos complexos reguladores ainda é incipiente na maioria dos estados" (TCU, 2009b, p.4). 119. Além disso, durante os trabalhos de campo, a presente auditoria registrou manifestações no sentido de que as centrais de regulação não têm contribuído para facilitar o acesso dos pacientes aos exames e tratamentos. Entre os gestores hospitalares entrevistados, seis entre treze opinaram que as centrais de regulação não têm organizado a gestão dos serviços e facilitado o acesso dos pacientes. 120. As respostas obtidas na pesquisa realizada por correio eletrônico também corroboram as dificuldades enfrentadas durante o processo de regulação do acesso dos pacientes. Dos médicos oncologistas que participaram da pesquisa, 62,2% informaram que as deficiências na regulação também têm criado dificuldades para a prestação da assistência oncológica pelo SUS. Ademais, 59,6% classificaram o papel desempenhado pelas centrais de regulação como ruim ou péssimo. É interessante observar que apenas 10% dos respondentes classificaram o papel desempenhado pelas centrais como bom ou ótimo. 121. Das associações de apoio aos doentes que responderam à pesquisa, 54,5% também mencionaram as deficiências das centrais de regulação como fatores que dificultam o acesso dos pacientes à atenção oncológica. 122. A carência de profissionais também se configura em um fator que contribui para a menor tempestividade da atenção oncológica. Por exemplo, a insuficiência de médicos patologistas concorre para a ocorrência de atrasos na divulgação de resultados de exames. Esta especialidade foi a mais assinalada entre as carências profissionais apontadas pelos oncologistas que participaram da pesquisa (58,9% dos respondentes). Essa insuficiência também foi apontada em entrevista realizada com equipe da Divisão de Apoio à Rede de Atenção Oncológica (Darao) do Inca. Entre os estabelecimentos habilitados, o item mais assinalado foi a falta de médicos oncologistas, apontado por 38,2% dos estabelecimentos que responderam à pesquisa. 123. Outro fator que contribui para a demora dos atendimentos em oncologia é a inexistência de indicadores confiáveis de tempestividade. A ausência desses indicadores deixa os gestores envolvidos sem informações objetivas para adotar ações corretivas diante da formação de filas de espera e de outras barreiras ao acesso, que podem ter impacto fundamental para determinar as chances de cura dos pacientes. 124. Os esforços do Inca para estruturar um sistema de registro de casos de câncer (RHC), que poderia proporcionar dados confiáveis sobre os tempos de espera para a realização de diversos procedimentos, não têm sido eficazes. É importante considerar que a Portaria SAS/MS 741/2005 estabeleceu que, a partir de 2007, os centros habilitados deveriam enviar anualmente ao Inca os dados dos seus RHC. Entretanto, até a realização da presente auditoria, o Inca apenas conseguiu reunir dados de menos da metade dos estabelecimentos e isso, tão somente, dos casos diagnosticados até 2007. 125. Além disso, o sistema SIA/SUS também não tem contribuído para a construção de indicadores confiáveis para a área da atenção oncológica. Não possui crítica contra a entrada de dados inconsistentes em campos das Apacs de quimioterapia e radioterapia que são importantes para o cálculo da tempestividade dos atendimentos, como as datas de diagnóstico e de início dos tratamentos. O sistema também permite outras inconsistências na entrada de dados das Apacs que prejudicam a confiabilidade desses registros. A análise dos dados evidenciaram diversos casos com incompatibilidades entre os conteúdos dos campos que registram se houve tratamento anterior, as datas dos tratamentos anteriores, o número da Apac anterior, se houve continuidade do tratamento e se a Apac é do tipo continuidade. 126. É importante observar que os indicadores utilizados pela CGACA, de maneira geral, privilegiam a mensuração de distorções observadas na produção dos estabelecimentos e não se dedicam a mensurar a tempestividade dos atendimentos (Vide a Tabela 9, constante do Apêndice G - Metas e indicadores definidos para a atenção oncológica). 127. Uma boa prática relacionada ao cálculo de indicadores de desempenho importantes para o gerenciamento da qualidade da atenção oncológica encontra-se na Fundação Oncocentro do Estado de São Paulo (Fosp), que acompanha o RHC do Estado de São Paulo e calcula a sobrevida dos pacientes tratados. 128. O problema da falta de tempestividade da assistência oncológica também pode ser atribuído à estrutura deficiente de rede de saúde de média complexidade, responsável pela realização de procedimentos de diagnóstico oncológico. Muitas vezes essa situação acaba sendo agravada pela resistência de alguns hospitais habilitados em oncologia de assumirem essa tarefa para pacientes de câncer com diagnóstico ainda não fechado. Esse foi um dos problemas mencionados nas entrevistas realizadas com os gestores. 129. Outra importante causa para intempestividade da atenção oncológica é o despreparo da atenção primária para rastrear precocemente os casos de câncer e encaminhá-los para a atenção especializada. Essa deficiência foi apontada como fator que dificulta o acesso à atenção oncológica por 84,1% dos médicos oncologistas e por 77,3% das associações de apoio aos pacientes que participaram das pesquisas realizadas por correio eletrônico. 130. Essa deficiência acaba se refletindo no diagnóstico tardio da doença. Isso fica demonstrado quando se analisa o estadiamento dos tumores no momento do diagnóstico registrado nas Apacs de quimioterapia e radioterapia. A análise das Apacs processadas em 2010 revelou que 60,5% dos pacientes foram diagnosticados em 2010 em estadiamento avançado, níveis 3 e 4. A situação mais grave foi encontrada nas neoplasias de brônquios e pulmões, que alcançaram 87,9% dos casos com estadiamento 3 e 4. 131. Os mesmos dados indicaram a seguinte distribuição para o câncer de mama: 5,2% no estadiamento 0; 15,2% no estadiamento 1; 25,7% no estadiamento 2; 41,4% no estadiamento 3; e 12,5% no estadiamento 4. Para efeito de comparação, é importante mencionar que trabalho realizado no Reino Unido (CUTHBERTSON; GOYDER; POOLE , 2009) com registro de casos de câncer de mama do período de 1998 a 2006 verificou que apenas 3,1% das pacientes eram diagnosticadas no estágio 4. Um estudo americano (LEGORRETA et al; 2004), que comparou o estadiamento de casos de câncer de mama recém-diagnosticados, encontrou os seguintes percentuais por estadiamento (ccorte 95): 7,62% para o estadiamento 0, 45,59% para o 1, 39,54% para o 2, 5,08% para o 3 e apenas 2,18% para o 4. Gráfico 6 - Estadiamento no momento do diagnóstico - Brasil - 2010 [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] Fonte: Elaboração própria (com base em dados das Apacs de quimioterapia e radioterapia). Nota: Consideraram-se apenas os casos com diagnóstico realizado em 2010. 132. Outro fator que impacta a tempestividade dos tratamentos são as deficiências existentes na prevenção do câncer. Este item foi apontado como dificultador do acesso dos pacientes aos tratamentos por 69,5% dos oncologistas e por 59,1% das associações de apoio a pacientes que participaram da pesquisa. 133. Por fim, há que se considerar, ainda, os efeitos deletérios gerados para a tempestividade dos tratamentos pelas deficiências observadas na estrutura da rede de atenção oncológica, discutidas na seção anterior. 134. Os elevados tempos de espera para a realização dos diagnósticos e dos tratamentos de câncer podem produzir consequências graves para os pacientes, como a diminuição das suas chances de cura e do tempo de sobrevida. Além disso, um tratamento realizado tardiamente pode trazer prejuízos à qualidade de vida dos pacientes durante os tratamentos. É importante considerar, ainda, as consequências para o país, como o aumento de gastos com tratamentos mais caros e prolongados para pacientes que poderiam ter sido diagnosticados com baixo estadiamento nas fases iniciais da doença, além dos custos previdenciários decorrentes do prolongado afastamento desses pacientes do trabalho. 135. Em razão do exposto, diversas medidas fazem-se necessárias visando a tornar mais ágil o acesso à assistência oncológica no Brasil. Em primeiro lugar, é fundamental a disponibilidade de informação de qualidade que viabilize o acompanhamento do desempenho da rede de atenção oncológica. 136. Nesse sentido, considera-se importante recomendar ao Ministério da Saúde que adote medidas com o objetivo de tornar efetivo o RHC em âmbito nacional. Tais medidas deverão assegurar a participação de todos os estabelecimentos habilitados, com a previsão de divulgação do seu grau de adesão. Entende-se oportuno propor, também, a criação de incentivos para os estabelecimentos que apresentarem bons resultados no nível de adesão ao RHC e de sanções para aqueles que não atingirem as metas definidas. Cabe recomendar, ainda, que esses dados passem a ser utilizados para o cálculo de indicadores de tempestividade dos atendimentos e da sobrevida dos pacientes e que sejam definidas metas para esses indicadores. 137. Entende-se que um RHC completo e atualizado, além de municiar os gestores que atuam na Política Nacional de Atenção Oncológica com indicadores de tempestividade e efetividade de tratamento, poderá se configurar em um instrumento fundamental para orientar as ações adotadas pelos complexos reguladores, no sentido de aumentar a agilidade no encaminhamento dos pacientes para a realização de exames e tratamentos. 138. Além disso, a divulgação de indicadores de sobrevida poderá possibilitar o efetivo acompanhamento da qualidade da atenção oncológica e estimular os esforços para a melhoria contínua da prestação dos serviços pelos estabelecimentos habilitados. 139. Ainda visando à qualidade da informação, cabe recomendar que o Ministério da Saúde institua crítica na entrada de dados das Apacs de quimioterapia e de radioterapia, de forma a não permitir o registro de dados inconsistentes para os seguintes campos: data do diagnóstico; datas de início de tratamentos anteriores; data de início do tratamento; tratamento anterior; continuidade de tratamento; tipo de Apac; e número de Apac anterior. 140. A inclusão dessas críticas na entrada de dados das Apacs deverá contribuir para a melhoria da qualidade das informações disponíveis, de forma a viabilizar a utilização dos bancos de dados armazenados no SIA/SUS correspondentes para o aperfeiçoamento das decisões gerenciais, assim como para a realização de estudos sobre a qualidade da atenção oncológica. Entende-se que a possibilidade de utilização dos dados armazenados é imprescindível para justificar os custos envolvidos com o seu preenchimento e processamento. Nesse sentido, é importante transcrever trecho de um trabalho da Agência Internacional para a Pesquisa em Câncer, que trata do assunto com propriedade: Utilização dos dados hospitalares é a única justificativa para a despesa com esta atividade. Em resumo, é responsabilidade do registrador, trabalhando em conjunto com o Comitê de Câncer, assegurar que os procedimentos e registros sejam adequados e acuradamente documentados, de que haja seguimento, que os casos sejam identificados e registrados dentro dos prazos, e que a informação dos registros clínicos seja correta e completamente resumida para uso do Registro de Câncer, de modo que dados de alta qualidade estejam disponíveis para utilização (INTERNATIONAL AGENCY FOR RESEARCH ON CANCER,1991 apud FOSP, 2009, p. 7). 141. É importante recomendar, ainda, que o Ministério da Saúde estabeleça sistemática para promover a formação e a capacitação de profissionais para atuarem na assistência oncológica, que deverá contemplar o mapeamento e o acompanhamento periódico das principais carências profissionais existentes e a articulação com o Ministério da Educação, com os gestores locais, assim como com os estabelecimentos habilitados visando à adoção de medidas para a ampliação da oferta de treinamentos, especializações ou residências médicas nas áreas que apresentam as maiores carências. Entende-se que essas medidas deverão contribuir para a regularização das carências profissionais existentes. 142. Adicionalmente, cabe recomendar ao Ministério da Saúde o desenvolvimento de estratégia de capacitação e de disseminação de informações sobre prevenção e diagnóstico precoce de câncer, que deverá ser dirigida aos profissionais de saúde que atuam na atenção primária em saúde, de forma que os diagnósticos possam ser realizados menos tardiamente e que os pacientes tenham condições de iniciar seus tratamentos em estágios menos avançados da doença. 4. A qualidade das condutas terapêuticas de oncologia oferecidas à população 143. O presente capítulo tem por objetivo avaliar o nível de atualização das condutas terapêuticas adotadas pelo SUS. Juntamente com a avaliação da estruturação da rede de atenção oncológica, examinada no capítulo anterior, esse aspecto integra o escopo da auditoria por afetar a qualidade da atenção oncológica oferecida à população. 144. Como se trata de questão eminentemente técnica, que depende do conhecimento de profissionais especializados na área de oncologia, buscou-se conhecer a opinião abalizada dos médicos que atuam cotidianamente no atendimento aos pacientes, os quais se constituem em um público privilegiado para a avaliação da efetividade das condutas terapêuticas e procedimentos diagnósticos adotados no âmbito do SUS. 145. A investigação dessa questão contemplou a realização de pesquisa via correio eletrônico com os médicos especialistas em oncologia, o levantamento de informações com os gestores sobre as medidas que vêm sendo adotadas para realizar a atualização dos esquemas e condutas terapêuticas instituídas, assim como a análise de indicadores de resultados dos tratamentos disponíveis para a área de oncologia. 4.1 A falta de atualização das condutas terapêuticas utilizadas no combate ao câncer pelo SUS 146. Os médicos especialistas em oncologia que responderam às pesquisas por correio eletrônico e às entrevistas realizadas durante os trabalhos de campo apontaram que existem procedimentos e exames para diagnóstico de câncer assim como condutas terapêuticas validadas cientificamente e importantes para o sucesso dos tratamentos que não são ofertados pelo SUS. 147. A Constituição Federal de 1988, ao abordar a questão do direito à saúde, estabelece de forma abrangente o dever do Estado de garantir a toda população o acesso igualitário aos serviços (art. 196). Define, ainda, como diretriz que a assistência seja oferecida integralmente, desde as atividades preventivas até os atendimentos assistenciais mais complexos (art. 198, inciso II). 148. A Lei 8.080/1990, corroborando os preceitos constitucionais, inclui no campo de atuação do SUS a execução de ações "de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica" (art. 6º, inciso I, alínea "d"), em conformidade com os princípios da "integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema", e da "igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie" (art. 7º, incisos II e IV). 149. Ademais, a Portaria GM/MS 2.439/2005 reconheceu a responsabilidade do Ministério da Saúde de definir diretrizes nacionais para a atenção oncológica e estabeleceu que Política Nacional de Atenção Oncológica deve permitir a execução de projetos de incorporação tecnológica, por meio de "estudos de custo-efetividade, eficácia e qualidade e avaliação tecnológica da atenção oncológica no Brasil" (art. 2º, inciso VI). 150. Entretanto, segundo a manifestação de 82,1% dos médicos oncologistas que participaram da pesquisa enviada por correio eletrônico, existem procedimentos e exames para o diagnóstico ou para o acompanhamento dos casos de câncer validados pela comunidade científica e importantes para o sucesso dos tratamentos que não são custeados pelo SUS. Além disso, 63,6% dos respondentes apontaram a desatualização dos procedimentos de diagnóstico como fatores que têm dificultado a prestação da assistência oncológica pelo SUS. 151. Os respondentes também foram convidados a mencionar quais seriam os procedimentos importantes não autorizados pelo SUS. O exame mais relacionado foi o Pet-CT (vide glossário), mencionado por 60,9% dos respondentes. Também foram bastante citados os exames de diagnóstico molecular (24,5%). 152. A pesquisa também indagou os profissionais quanto à adequação das condutas terapêuticas adotadas pelo SUS. Como resposta, 84,8% dos oncologistas pesquisados também informaram que existem alternativas para o tratamento do câncer validadas pela comunidade científica, que não são custeadas pelo SUS, mas que são importantes para o sucesso dos tratamentos. Verificou-se, ainda, que 64,9% dos respondentes também classificaram a desatualização dos esquemas terapêuticos ofertados pelo SUS como fatores que têm dificultado a prestação da assistência oncológica. 153. Dentre os esquemas terapêuticos ainda não custeados pelo SUS, os médicos que responderam à pesquisa, destacaram a importância das chamadas terapias alvo moleculares (vide glossário), mencionadas por 36,4% dos respondentes. A droga mais relacionada foi Trastuzumabe (15,2% dos respondentes). Outros quimioterápicos também foram mencionados com frequência, como o Imatinibe, a Temozolamida e o Cetuximabe. Também foi citada a necessidade de tratamentos radioterápicos mais modernos, mencionada por 19,9% dos respondentes. Foram mencionadas a radioterapia com intensidade modulada (IMRT), a radioterapia tridimensional ou conformacional, a radioterapia intraoperatória e a braquiterapia (vide glossário) para outros sítios. 154. As entrevistas realizadas com médicos oncologistas durante os trabalhos de campo também demonstraram que a grande maioria considera que existem procedimentos para diagnóstico e condutas terapêuticas importantes para os tratamentos, mas não são custeados pelo SUS. Ao se apurar o resultado das manifestações dos médicos entrevistados em termos percentuais, verifica-se que as respostas foram muito semelhantes às obtidas na pesquisa por correio eletrônico, na medida em que 85,7% dos respondentes apontaram a existência de procedimentos de diagnóstico importantes, mas não autorizados pelo SUS; enquanto 88,6% responderam da mesma forma em relação às condutas terapêuticas. 155. Em conformidade com a opinião dos médicos, na pesquisa realizada com estabelecimentos de saúde habilitados, os dois itens mais assinalados como fatores que dificultam o acesso à assistência oncológica dos pacientes foram a necessidade de utilização de procedimentos não cobertos e a desatualização dos valores dos procedimentos custeados pelo SUS, ambas alternativas assinaladas por 64,5% dos estabelecimentos que responderam a pesquisa. Em relação aos tratamentos quimioterápicos, essas duas questões estão relacionadas, uma vez que a incorporação de novas terapêuticas é limitada pelos valores atualmente repassados pelo Ministério da Saúde para cada linha de tratamento. Gráfico 9 - Pesquisa com estabelecimentos de saúde - Fatores que têm dificultado a prestação da assistência oncológica [VIDE GRÁFICO NO DOCUMENTO ORIGINAL] Fonte: Elaboração própria (pesquisa por correio eletrônico). 156. Discussões desenvolvidas no âmbito do Conselho Consultivo do Inca (Consinca) também evidenciam a necessidade de autorização de novos procedimentos entre os autorizados pelo SUS. A ata da reunião do Consinca realizada em 18/6/2010 registra que, não obstante ter havido atualização dos procedimentos de radioterapia custeados pelo SUS, a tabela, à época, ainda não contemplava novos procedimentos que já estavam reconhecidos pela própria ANS. A mesma ata registra reivindicação no sentido de que nos tratamentos para linfoma de grandes células, o medicamento Glivec pudesse ser ministrado para menores de dezoito anos. Na ata do Consinca de 13/4/2011, há nova menção de medicamentos que somente não foram liberados para utilização em crianças no Brasil: "Medicamentos de alto custo: Mesilato de Imatinib (Glivec): usado em leucemia mielóide crônica e alguns tipos de leucemia linfóide aguda. Doenças raras na infância (100 casos anos/Brasil) - tal medicação foi liberada para uso em crianças em todos os países do mundo, EXCETO no Brasil; clofarabina (Clolar) - usado em leucemia linfoide aguda em segunda recidiva (150 casos ano/Brasil) liberado para uso em crianças em vários países. No Brasil, usada tardiamente, sob mandado judicial, desperdiçando recursos." 157. De acordo com os resultados das pesquisas realizadas, uma das causas da defasagem das condutas assistenciais oferecidas pelo SUS seriam deficiências no processo de atualização dessas terapêuticas instituídas. A sistemática adotada pelo Ministério da Saúde para a atualização das condutas terapêuticas e dos protocolos clínicos de oncologia utilizados foi considerada inadequada por 66,9% dos médicos oncologistas que participaram da pesquisa. Apenas 18,5% classificaram a sistemática como adequada. 158. Os participantes da pesquisa registraram que há protocolos defasados e inadequados, que existe demora no processo de atualização das terapêuticas (problema mais mencionado), ausência de uma sistemática para a atualização das condutas, falta de transparência na sistemática de atualização, além de falta de critérios técnicos e falta de discussão com as sociedades médicas e com a comunidade científica. 159. Um dos fatores determinantes para a configuração do panorama atual no que diz respeito à atualização das condutas terapêuticas ofertadas pelo SUS foi a ausência da divulgação por parte do Ministério da Saúde de diretrizes nacionais para a assistência oncológica para os casos de câncer mais prevalentes. A Portaria GM/MS 2.439, de 8/12/2005, que estabeleceu a Política Nacional de Atenção Oncológica, reconheceu a responsabilidade do Ministério de estabelecer diretrizes nacionais para atenção oncológica. Além disso, relacionou as diretrizes nacionais para a atenção oncológica como componentes fundamentais da Política Nacional de Atenção Oncológica (inciso XI, do art. 3º). 160. A Portaria SAS/MS 741, de 19/12/2005, por sua vez, estabeleceu em seu art. 19 prazo de doze meses para que a SAS publicasse e divulgasse as Diretrizes Nacionais para a Atenção Oncológica que contemplassem as neoplasias malignas mais prevalentes no Brasil, que deveriam ser elaboradas sob a coordenação do Inca. O parágrafo único, do mesmo art.19, ainda determinava que as diretrizes nacionais deveriam ser atualizadas, pelo menos, a cada quatro anos. Até a presente data, as providências preconizadas ainda não foram cumpridas. 161. As portarias publicadas para a divulgação de protocolos clínicos e diretrizes diagnósticas e terapêuticas para a área de oncologia são as seguintes: a) Portaria GM/MS 1.655, de 13/9/2002, divulga Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Tumor do Estroma Gastrointestinal; b) Portaria SAS/MS 757, de 27/12/2005, divulga Diretrizes de Procedimentos de Alta Complexidade e Alto Custo para Radioterapia Cerebral; c) Portaria SAS/MS 466, de 20/8/2007, divulga diretrizes para a Iodoterapia do Carcinoma Diferenciado da Tireóide, dentre outras providências; d) Portaria SAS/MS 649, de 11/11/2008, divulga diretrizes para o tratamento da Leucemia Mielóide Crônica do adulto; e) Portaria SAS/MS 421, de 25/8/2010, que atualiza os critérios para a autorização dos procedimentos de quimioterapia e hormonioterapia do adenocarcinoma de próstata, dentre outras providências. 162. Além disso, em 19/8/2010, a SAS submeteu as seguintes diretrizes diagnósticas e terapêuticas à consulta pública e estabeleceu que, até a publicação da versão final, as Secretarias de Saúde deveriam considerá-las na regulação dos procedimentos nela previstos: a) Consulta Pública nº 26: Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Carcinoma Colorretal; b) Consulta Pública nº 27: Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Carcinoma de Fígado; c) Consulta Pública nº 28: Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Carcinoma de Pulmão; d) Consulta Pública nº 29: Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Linfoma Difuso de Grandes Células B no adulto; e) Consulta Pública nº 30: Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Tumor Cerebral no Adulto. 163. Mais recentemente, em 18/2/2011, o Ministério da Saúde também submeteu à consulta pública minuta de Portaria instituindo as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento de Câncer do Colo do Útero. 164. Ao se confrontar as diretrizes aprovadas por portaria e, mesmo, as colocadas em consulta pública com os sete tipos de câncer mais prevalentes no Brasil (pele não melanoma, próstata, mama, cólon e reto, pulmão, estômago e colo do útero), observa-se que as diretrizes cobrem apenas cerca de 40% dos casos de câncer que incidem sobre esse grupo. Há que se considerar, ainda, que, para o câncer de próstata, apenas foram apresentados parâmetros que regulamentam os tratamentos de quimioterapia e hormonioterapia e que, para o câncer do colo do útero, as diretrizes dizem respeito apenas à etapa de rastreamento da doença. Além disso, não foram criadas diretrizes para os tumores de mama. 165. Durante o desenvolvimento dos trabalhos de campo foram localizadas iniciativas no sentido de se estabelecer condutas para os casos de câncer mais frequentes, como a adotada pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), que publicou o Manual de Condutas em Oncologia (ESTADO DE SÃO PAULO, 2010) e pelo Hospital Sírio-Libanês, com a publicação do Manual Prático de Oncologia Clínica do Hospital Sírio-Libanês (HOFF; BUZAID, 2006). 166. Pode-se mencionar, também, prática adotada no Reino Unido, por meio do National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE) (2011), que oferece orientações e recomendações para condutas terapêuticas, direcionadas para medicamentos novos e já existentes, tipos de tratamentos e procedimentos. As orientações têm como objetivo não somente o alcance de melhorias nos serviços prestados, mas também a redução dos gastos despendidos com a assistência à saúde. Em sua página eletrônica, o instituto apresenta tópico específico para recomendações para diversos tipos de câncer, com orientações para condutas em oncologia, desde o diagnóstico até a realização de procedimentos e a avaliação do uso de novos medicamentos. 167. A necessidade de estabelecimento de diretrizes para os casos de câncer mais prevalentes também foi mencionada nas reuniões do Consinca. Na ata de 17/6/2009 constou manifestação no sentido de que cabe aos gestores estabelecerem protocolos para todos os tipos de câncer. Também existe defesa de que os procedimentos sejam mantidos atualizados e é lembrado o que preconiza o art. 19 da Portaria SAS/MS 741/2005, a necessidade de estabelecimento de diretrizes para a área de oncologia (CONSELHO CONSULTIVO DO INCA, 2009). 168. A importância da publicação de novas diretrizes também transparece quando se observam as metas definidas para a área de oncologia no Plano Mais Saúde - Direito de Todos 2008 2011, que previu ação 2.17.1- Formular e Revisar Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas em Oncologia, com meta de publicação de catorze diretrizes. O relatório de acompanhamento informa que, até 2010, haviam sido cumpridos 50% da meta. (BRASIL, 2010). Vide Apêndice G - Metas e indicadores definidos para a atenção oncológica. 169. A falta de atualização das condutas terapêuticas adotadas pelo SUS é um dos fatores que pode reduzir as chances de cura e do tempo de sobrevida dos pacientes que, eventualmente, não puderam ser tratados com técnicas modernas e atualizadas. O Quadro 2 apresenta os resultados de alguns estudos que divulgaram taxas de sobrevida de câncer no Brasil. 170. Outro efeito da carência de normatização de protocolos de condutas terapêuticas em oncologia é o enfrentamento pelos gestores de saúde locais de grande quantidade de ordens judiciais determinando o fornecimento de medicações não contempladas nos tratamentos custeados pelo SUS. Em função dessas constantes ações do judiciário, os gestores locais acabam sendo obrigados a realizar a aquisição de medicamentos de alto custo de forma emergencial, com inevitável perda de eficiência. 171. É importante mencionar que o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), ao organizar o Manual de Condutas em Oncologia, citado anteriormente, após revisão da literatura médica existente, incorporou novos medicamentos ao rol de alternativas terapêuticas oferecidas por estabelecimentos que atendem a pacientes do SUS. Dessa forma, a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo autorizou e passou a custear a utilização dos seguintes medicamentos de terapia molecular, não cobertos pelo SUS: Bevacizumbe, Cetuximabe, Temozolomida, Transtuzumabe, Sorofenibe, Sunitinibe. Além dos efeitos proporcionados diretamente sobre a eficácia dos tratamentos, a medida tende a proporcionar ganhos de eficiência na aquisição e distribuição desses medicamentos, em relação ao que seria possível caso fossem adquiridos, exclusivamente, a partir de sentenças judiciais. O prefácio do manual apresenta os benefícios trazidos por essa prática (ESTADO DE SÃO PAULO, 2010): "Justamente pela intenção de dar aos nossos pacientes do SUS um atendimento de qualidade, baseado na melhor evidência disponível, decidimos pelo uso de protocolos de conduta específicos para cada doença. Pode-se, em um primeiro momento, criticar o desenvolvimento destes protocolos por padronizarem as condutas e diminuírem as opções de escolha do médicos envolvidos. No entanto, os benefícios advindos desta padronização claramente são mais importantes do que os potenciais malefícios. Isso permite ganhos de escala, com economia na hora da compra de insumos, e propicia a avaliação crítica dos resultados do serviço, facilitando a análise do real valor de uma determinada terapia para os nossos pacientes. O desenho destes protocolos foi amplamente discutido por todos os membros da disciplina de Oncologia da Faculdade de Medicina da USP e membros do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, após ampla revisão da literatura disponível. (...) Consideramos que estes protocolos trazem avanços importantes no tratamento do câncer no SUS, mas certamente existem outras condutas aceitáveis e até recomendáveis em diversas situações clínicas. Continuaremos dialogando com o Governo e com outras instituições públicas para ampliar a oferta de novas medicações contra o câncer, sempre embasados em estudos clínicos que comprovem sua eficácia de maneira incontestável. Não basta termos apenas benefício estatístico, mas também tratamentos que resultem em cura ou vidas mais longas e com boa qualidade, justificando plenamente os gastos, que são sempre elevados (destaques inseridos)." 172. A falta de incorporação de novos tratamentos aos procedimentos autorizados pelo SUS também acaba repercutindo negativamente na equidade de acesso aos tratamentos. Pacientes do SUS tratados no Estado de São Paulo, por exemplo, podem ter acesso a tratamentos diferenciados em relação aos acessíveis aos pacientes do resto do país. O mesmo pode-se dizer em relação aos pacientes cujos tratamentos são custeados por planos de saúde privados. Nesse sentido, é importante acrescentar que a maior parte dos médicos oncologistas entrevistados durante os trabalhos de campo opinaram que os tratamentos prescritos para tratamento pelo SUS e por meio de planos privados não costumam ser os mesmos. 173. Assim, diante dessas constatações, entende-se pertinente recomendar à SAS que implemente metodologia que possibilite avaliar as condutas terapêuticas para oncologia adotadas no âmbito do SUS e identificar a necessidade de incorporação de novos exames para diagnóstico e de tratamentos, de forma a estabelecer diretrizes terapêuticas que cubram os casos de câncer mais prevalentes e viabilizar a sua atualização periódica. É importante que, para a realização dessas atividades, os gestores procurem assegurar a participação de especialistas com reconhecida capacidade nos temas envolvidos. 174. Entende-se que a divulgação de diretrizes terapêuticas para a realização dos diagnósticos e dos tratamentos de câncer respaldadas na literatura científica e que contemplem os avanços observados na medicina deverá contribuir para que haja maior equidade no acesso à assistência oncológica e possibilitar que os pacientes do SUS possam se beneficiar das melhores alternativas de tratamento, permitindo que obtenham de melhores índices de cura e sobrevida. 5. Análise dos comentários dos gestores 175. Com vistas a proporcionar a manifestação dos gestores acerca das constatações apuradas durante a realização da auditoria, assim como sobre as medidas propostas, versão preliminar do presente relatório foi encaminhada ao Secretário Nacional da Saúde. Em resposta, a Secretaria de Atenção à Saúde encaminhou o ofício GAB/SAS/Nº 1336 capeando compact disc contendo um conjunto de documentos relacionados ao tema e os comentários apresentados pelo Departamento de Atenção Especializada (DAE), inseridos ao longo do texto da versão preliminar. 176. Os esclarecimentos prestados pelos gestores julgados úteis para a melhor compreensão dos temas abordados foram incorporados ao texto do relatório. A presente análise registra apenas os pontos dos comentários considerados mais relevantes. 177. Os gestores argumentaram que a abrangência das ações de controle do câncer evidencia o quanto é importante a participação de todo o sistema de saúde, e não apenas da atenção especializada. Adicionalmente, a propósito da transcrição de problemas relatados por administradores públicos e hospitalares entrevistados, que relataram os problemas existentes para a realização de cirurgias oncológicas, os gestores salientaram que essas mesmas dificuldades são extensivas à ortopedia, à cirurgia cardiovascular, à urologia, à neurocirurgia e a outras áreas da medicina. Isso demonstraria que a questão envolve todo o sistema de saúde e não apenas a oncologia e a alta complexidade. Não obstante, entendese que a existência de problemas em diversos segmentos da assistência à saúde prestada à população não diminui a importância dos problemas que afligem os pacientes oncológicos, identificados durante esta auditoria, criada especialmente para avaliá-los. 178. Em outro ponto do texto, os gestores sugeriram alteração que atribui aos gestores locais a responsabilidade pela estruturação de suas redes de atenção à saúde. Entretanto, a Portaria 2.439/2005 define que a Política Nacional de Atenção Oncológica deve ser organizada de forma articulada entre o MS e as Secretarias de Saúde dos estados e municípios (art. 2º, inciso III). Além disso, a Lei 8.080/1990 estabelece que compete à direção nacional do SUS definir e coordenar os sistemas de redes integradas de assistência de alta complexidade. Como decorrência disso, entendeu-se mais adequado manter o texto original, que informa que existe responsabilidade solidária com o Ministério da Saúde pela prestação dos serviços. 179. Adicionalmente, os gestores procuraram relativizar os déficits estruturais na rede de atenção oncológica de alta complexidade apontados pelo Inca, alegando que se poderia fazer com que os hospitais habilitados produzissem mais e, no caso da radioterapia, utilizassem mais turnos, o que já estaria ocorrendo na prática. Salientaram que os levantamentos do Inca baseiam-se na capacidade instalada, que difere da produção apresentada, por considerar apenas dois turnos para atendimento de radioterapia. É importante considerar, entretanto, que o relatório não se apoia exclusivamente no levantamento dos déficits por parte do Inca para sustentar a existência de carências estruturais da rede de atenção oncológica. O que se procura fazer é evidenciar que o próprio Inca, por meio do Departamento criado para acompanhar a estruturação da rede oncológica, reconhece e mensura as carências existentes. Entretanto, outras análises são desenvolvidas ao longo texto que corroboram a existência dos problemas estruturais apontados. Parte dessas análises, inclusive, apoiou-se em dados de produção efetivamente realizada. Para o caso da radioterapia, essas análises somente confirmam o déficit existente na oferta dos serviços, contestado pelos gestores em função da limitação do número de turnos. 180. Em seus comentários, os gestores também reconheceram que o sistema SIA/SUS deveria realizar críticas na entrada de dados para campos importantes para a análise da tempestividade da atenção oncológica, como a data do diagnóstico e a data do início do tratamento. Esclareceram que havia ficado estabelecido que a data do primeiro tratamento nunca poderia vir antes da data de diagnóstico. Entretanto, a relação de críticas automatizadas existentes no Sistema SIA/SUS para o processamento dos arquivos de Apacs de oncologia, fornecida pelo DRAC, demonstrou que não existem críticas para garantir a correção da digitação dessas datas, o que, também, pôde ser confirmado pela natureza das inconsistências observadas na análise dos dados. 181. A propósito das respostas fornecidas pelos médicos que participaram da pesquisa por correio eletrônico, os gestores argumentaram não ter havido a oportunidade de se realizar a necessária contestação técnico-científica do que foi levantado. Todavia, é importante considerar que o relatório apenas registrou os resultados da pesquisa de opinião realizada com os profissionais que atuam na área. Não obstante a grande concentração de manifestações no sentido da existência de procedimentos de diagnóstico e tratamento importantes não custeados pelo SUS, o relatório não preconiza a adoção de qualquer das condutas terapêuticas defendidas na pesquisa. Desde o planejamento do trabalho, tinha-se presente a existência de limitações para que a equipe de auditoria opinasse diretamente sobre a adequação das práticas terapêuticas instituídas. O que foi possível concluir a partir das análises desenvolvidas (vide Conclusão) é que as condutas terapêuticas disponibilizadas aos pacientes do SUS não têm sido atualizadas com a periodicidade adequada. Observe-se que sequer houve a divulgação das Diretrizes Nacionais para a Atenção Oncológica, determinada na Portaria SAS/MS 741/2005, art. 19. Nesse sentido, entendeu-se oportuno recomendar ao Ministério da Saúde que desenvolva, a partir de sua iniciativa e com o auxílio dos especialistas no assunto, os estudos técnico-científicos necessários à definição das condutas terapêuticas a serem ofertadas à população. 182. Por fim, os gestores sustentaram que existem pontos essenciais para o entendimento da assistência oncológica no Brasil que não foram contemplados nos questionários das pesquisas realizadas e, consequentemente, no relatório. Nesse sentido, mencionaram as seguintes questões: o que impacta mais os resultados terapêuticos do câncer, o diagnóstico precoce ou a disponibilidade de medicamentos para tratamentos paliativos?; haveria observância estrita de diretrizes ou protocolos por parte dos oncologistas, caso as condutas definidas não coincidissem com o seu pensamento?; qual a influência do mercado de medicamentos na prescrição da quimioterapia?; qual a relação que as associações de doentes e os profissionais de saúde têm com empresas produtoras e fornecedoras de antineoplásicos e equipamentos (qual o grau de conflito de interesses que permeiam essa relação no Brasil e em todo o mundo?)?. Contudo, ao se definir os objetivos e o escopo de um trabalho de auditoria, é importante frisar, não existe a exigência de se contemplar todos os aspectos relevantes de um determinado tema. O importante é que a definição do objetivo contemple os fatores que denotem exposições significativas a riscos que possam comprometer os resultados almejados por determinada política pública. Nesse sentido, o objetivo e o escopo da presente auditoria, delimitados pelo problema e pelas questões de auditoria, foram definidos a partir de riscos identificados em levantamento realizado previamente e no diagnóstico desenvolvido durante a fase de planejamento do trabalho. Por sua vez, as pesquisas realizadas foram formuladas com o estrito propósito de obter respostas às questões de auditoria definidas. O fato do relatório não tratar de aspectos específicos levantados pelos gestores não traz prejuízos às conclusões da auditoria, que estão fundamentadas em evidências válidas e suficientes. 6. Conclusão 183. A rede de atenção oncológica não está suficientemente estruturada para assegurar atenção oncológica adequada para toda a população que dela necessita. As principais carências identificadas dizem respeito à estrutura para a realização dos tratamentos de radioterapia, razão pela qual esse foi o aspecto mais focalizado nas análises desenvolvidas. Mas também foram identificadas carências importantes para o atendimento tempestivo das necessidades de cirurgia oncológica e, mesmo, de quimioterapia, quando se consideram os problemas estruturais específicos de determinadas unidades da Federação. 184. Além disso, a pesquisa realizada com os especialistas, as entrevistas desenvolvidas durante os trabalhos de campo e a análise da documentação existente sobre o assunto demonstraram que as condutas diagnósticas e terapêuticas ofertadas aos pacientes do SUS não têm sido periodicamente atualizadas. O processo de discussão e revisão dessas condutas da forma como vem sendo promovido pelo Ministério da Saúde não é respaldado pelos profissionais médicos que atuam na área de oncologia entrevistados e que participaram da pesquisa. A partir da sua manifestação, concluiu-se que a atual sistemática não tem sido adequada para incorporar os avanços mais recentes que vêm sendo observados na medicina. 185. Os mecanismos existentes para o controle e adequação da rede de atenção oncológica não têm sido suficientes para adequá-la às reais necessidades de atendimento. Essa situação de insuficiência permanente da rede de atendimento acaba inviabilizando a possibilidade de tratamento a consideráveis contingentes da população brasileira que dele necessita. É importante ressaltar que os órgãos responsáveis do Ministério da Saúde têm registrado e discutido os déficits na oferta de serviços. No caso da radioterapia, as carências vêm sendo acompanhadas há muitos anos, conforme se pode observar pelos registros das atas do Consinca e mesmo pela verificação das metas definidas no Plano Plurianual e no Programa Mais Saúde. Entretanto, as ações empreendidas não têm conseguido solucionar de maneira adequada as carências observadas e não se vislumbra, a continuar as mesmas práticas, a reversão do quadro que perdura há anos. Sendo assim, a medida que se apresenta como mais adequada é recomendar ao Ministério da Saúde que implemente um plano para a solução das iniquidades decorrentes desse quadro, que seja organizado de forma a contemplar a efetiva solução dos problemas estruturais existentes, relatadas no presente relatório. 186. Outra carência que se depreende das análises realizadas diz respeito à insuficiência de determinados tipos de especialistas, fundamentais para a prestação de assistência oncológica de qualidade. Somam-se a isso as limitações e as deficiências da atenção básica em saúde para a identificação precoce de casos suspeitos de câncer, que se depreende da grande quantidade de diagnósticos tardios da doença. Esses problemas demonstram a necessidade de medidas com o objetivo de fomentar a formação e a capacitação dos profissionais que atuem na atenção primária e diretamente na assistência oncológica. 187. Um aspecto muito relevante que também ficou demonstrado a partir das análises desenvolvidas é a carência de indicadores confiáveis de tempestividade dos atendimentos e de sobrevida dos pacientes tratados. Não obstante toda a estruturação de sistemas de coleta de dados via faturamento das Apacs e por intermédio do RHC organizado pelo Inca, esses indicadores, fundamentais para o aperfeiçoamento das decisões gerenciais e para o estímulo à melhoria contínua da prestação dos serviços oncológicos, não são calculados. Fatores levantados pela auditoria que inviabilizam a apuração desses indicadores e que merecem providências reparadoras por parte do Ministério da Saúde são a baixa qualidade dos dados provenientes das Apacs e do RHC, assim como a atualização tardia e baixa adesão dos estabelecimentos habilitados ao RHC. 188. Quanto ao exame da suficiência de atualização das condutas terapêuticas custeadas pelo SUS, constatou-se que os gestores não cumpriram os normativos que determinavam a divulgação de diretrizes para os casos de câncer mais prevalentes e sua atualização periódica. Mas a auditoria não se limitou a examinar o assunto somente sob esse enfoque. Dada a natureza eminentemente técnica da questão, procurou utilizar estratégias metodológicas que permitissem conhecer a opinião dos profissionais de saúde especializados no tema e que atuam diretamente na área. As pesquisas realizadas por correio eletrônico, não obstante não permitirem a generalização dos resultados para todo o universo pesquisado em decorrência das reduzidas taxas de resposta obtidas, associadas às entrevistas realizadas nos trabalhos de campo, demonstram de forma clara a inadequação dos mecanismos existentes de atualização. A grande maioria dos profissionais que participaram da pesquisa e dos consultados por entrevista informou que visualiza exames e tratamentos importantes para os seus pacientes que não estão acessíveis por intermédio do SUS. A pesquisa demonstrou, também, que a maior parte dos respondentes não considera adequada a forma como o Ministério da Saúde tem realizado as atualizações das condutas terapêuticas. Por isso, concluiu-se pela necessidade de que o Ministério se estruture para promover uma análise periódica da adequação das condutas autorizadas, de forma a promover os ajustes e incorporações de novas técnicas sempre que isso se mostrar adequado segundo os princípios que norteiam a assistência à saúde pelo SUS. 189. O detalhamento dessas e das demais medidas sugeridas pela equipe de auditoria é realizado no Capítulo seguinte, que registra a proposta de encaminhamento. É importante observar que as proposições guardam consonância e subsidiam a implementação de diretrizes manifestas na Portaria GM/MS 2.439/2005 que instituiu a Política Nacional de Atenção Oncológica, mas que acabaram não tendo o efetivo encaminhamento desde então. 190. Espera-se que a adoção dessas medidas possa, em última instância, contribuir para a garantia do acesso universal da população à assistência oncológica, viabilizando a melhoria das condições de tratamento dos pacientes e o aumento de pacientes curados, constituindo-se em um elemento importante para o adequado enfrentamento dos desafios que a progressão da incidência de câncer representa para a saúde pública brasileira. 7. Proposta de encaminhamento 191. Ante o exposto, submete-se o presente relatório à consideração superior, para posterior encaminhamento ao gabinete do Exmo. Sr. Ministro-Relator José Jorge, com as propostas que se seguem: I) com base no art. 250, inciso III do Regimento Interno do TCU, recomendar à SAS do Ministério da Saúde que: a) desenvolva plano com objetivo de sanar as carências existentes na rede de atenção oncológica, que deverá contemplar (§91): a.1) a articulação junto aos gestores locais do SUS com vistas a considerar as reais necessidades em termos de estrutura da rede de assistência oncológica de cada unidade da Federação; a.2) a ampliação da oferta de serviços, seja por meio de investimentos próprios ou pela contratação de serviços suplementares, até a completa solução das carências existentes, especialmente, em relação à oferta de cirurgias oncológicas, serviços de radioterapia e dos principais exames para diagnóstico de câncer; a.3) a definição de prazos e metas progressivos, até a solução definitiva das carências existentes; a.4) a mensuração do impacto financeiro das medidas planejadas; a.5) rotina de acompanhamento constante e divulgação periódica da evolução do plano, que deverá levar em conta a situação real da oferta de serviços, contemplando eventuais interrupções nos atendimentos; b) elabore mecanismo que possibilite a atualização dos valores dos procedimentos custeados pelo SUS com base na avaliação periódica dos seus custos efetivos, com o objetivo de não desestimular a oferta de serviços de saúde (§91); c) desenvolva estudos com o objetivo de revisar os parâmetros para o planejamento e avaliação da rede de alta complexidade em oncologia constantes do Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005, em especial, para os tratamentos de radioterapia, quimioterapia e para os procedimentos cirúrgicos, de modo a assegurar que o acompanhamento dos resultados seja realizado com base em parâmetros adequados (§94); d) estabeleça rotina para o levantamento periódico dos casos de produção de procedimentos oncológicos em quantidades incompatíveis com os parâmetros estabelecidos, por unidade da Federação e estabelecimento, que preveja o encaminhamento de informações sobre os casos que se constituírem em indícios de fraude aos órgãos componentes locais do Sistema Nacional de Auditoria (SNA) e ao Denasus, devendo o levantamento inciar-se a partir dos registros referentes ao ano de 2010 (§ 94); e) adote medidas no sentido de assegurar a efetividade do sistema RHC, que contemplem (§ 133): e.1) a revisão da abrangência, forma de coleta e de consolidação dos dados a serem computados, de forma a favorecer a ampla adesão e consolidação tempestiva dos registros; e.2) a obrigatoriedade de participação de todos os estabelecimentos habilitados; e.3) o acompanhamento e a divulgação periódica do grau de adesão dos estabelecimentos; e.4) a criação de incentivos aos estabelecimentos com bons resultados na atualização dos dados, bem como de sanções para os inadimplentes; e.5) o cálculo e a divulgação de indicadores de desempenho acerca da tempestividade dos atendimentos e de sobrevida dos pacientes; e e.6) a definição de metas para esses indicadores; f) institua crítica na entrada de dados para o sistema SIA/SUS das Apacs de quimioterapia e radioterapia, de forma a não permitir o registro de dados inconsistentes e incompatíveis entre si para os seguintes campos: data do diagnóstico; data de início do tratamento anterior; data de início do tratamento; data do diagnóstico; datas de início de tratamentos anteriores; data de início do tratamento; tratamento anterior; continuidade de tratamento; tipo de Apac; e número de Apac anterior (§136); g) estabeleça sistemática para a promoção da formação e da capacitação de profissionais e equipes que atuam na assistência aos pacientes de câncer, desde a atenção primária até os níveis de alta complexidade, que inclua (§§ 138 e 139): g.1) o mapeamento e o acompanhamento periódico das principais carências profissionais existentes; g.2) a articulação com o Ministério da Educação, com os estabelecimentos habilitados, assim como com os gestores locais, visando à adoção de medidas para a ampliação da oferta de treinamentos, especializações ou residências médicas nas áreas que apresentam as maiores carências; g.3) a disseminação de informações sobre a prevenção e diagnóstico precoce de câncer para todos os profissionais de saúde que atuam na atenção primária; h) estabeleça mecanismos para o desenvolvimento de estudos e discussões sobre as condutas terapêuticas mais adequadas para os pacientes oncológicos, que deverá prever a participação de especialistas com reconhecida capacidade nos temas objeto de discussão e que deverá possibilitar (§ 169): h.1) a divulgação de diretrizes terapêuticas para os casos de câncer mais prevalentes no Brasil, em consonância com o estabelecido no art. 19, da Portaria SAS/MS 741/2005; h.2) a atualização periódica das diretrizes e dos procedimentos custeados pelo SUS, em conformidade com o parágrafo único do artigo mencionado na alínea anterior, de forma a possibilitar a incorporação os avanços observados na medicina validados pela comunidade científica. II) com base no art. 43, inciso I da Lei 8.443/1992 e no art. 250, inciso II do Regimento Interno do TCU, determinar à SAS que remeta ao Tribunal, no prazo de 90 dias, plano de ação contendo o cronograma para a adoção das medidas necessárias à solução dos problemas apontados nesse relatório de auditoria. III) encaminhar cópia do Acórdão que vier a ser adotado pelo Tribunal, bem como do Relatório e do Voto que o fundamentarem, e do inteiro teor do presente relatório para os seguintes destinatários: a) Ministro de Estado da Saúde; b) Secretário de Atenção à Saúde; c) Diretor Geral do Inca; d) Presidente da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados; e) Presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal; IV) restituir os autos à Seprog para a programação do monitoramento da implementação das deliberações do Acórdão que vier ser proferido nestes autos; V) arquivar os autos." É o relatório Voto Aprecia-se, nesta oportunidade, auditoria de natureza operacional realizada junto ao Ministério da Saúde (MS), à Secretaria Nacional da Saúde (SAS) e ao Instituto Nacional do Câncer (Inca), com vistas a verificar a implementação da Política Nacional de Atenção Oncológica. 2. Sobredita Política, instituída pela Portaria GM/MS 2.439/2005, visa proporcionar àqueles que necessitem o acesso ao diagnóstico e tratamento do câncer (termo utilizado para representar um conjunto de mais de cem enfermidades, que abrangem neoplasias malignas em tecidos e órgãos), de sorte a modificar o perfil de morbidade pela doença que perdura por décadas em nosso país. Para tanto, requer que sua operacionalização se dê de forma articulada entre o MS e as Secretarias de Saúde dos estados e municípios, com vistas a possibilitar uma maior capilaridade do atendimento. 3. Nessa perspectiva, a equipe encarregada dos trabalhos procurou averiguar se a estrutura da rede de atenção oncológica tem possibilitado aos doentes de câncer acesso tempestivo e equitativo ao diagnóstico e ao tratamento da doença, bem como se as condutas terapêuticas disponibilizadas aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) estão condizentes com as modernas práticas da medicina. 4. Para a persecução desses objetivos, a metodologia utilizada pelos auditores do Tribunal consistiu em exame documental, consulta a banco de dados oficiais e estudos de caso em seis capitais (Belém/PA, Campo Grande/MS, Florianópolis/SC, Salvador/BA, São Luís/MA e São Paulo/SP), além do Distrito Federal, os quais incluíram entrevistas e pesquisas com gestores, especialistas na área e associações que prestam assistência aos pacientes oncológicos. 5. Passando aos achados de auditoria evidenciados pela fiscalização, observaram-se carências estruturais na rede de atenção oncológica, acarretando dificuldades de acesso aos seus serviços de diagnóstico e tratamento da doença por parte dos pacientes com câncer. 5.1. Com efeito, a Portaria GM/MS 2.439/2005 estabelece que a referida rede deve ser estruturada de maneira a garantir atenção integral à população e o acesso a consultas e exames para o diagnóstico de câncer, mediante a organização de linhas de cuidados que perpassem todos os níveis de atenção (atenção básica e especializada de média e alta complexidades) e de atendimento (promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos). 5.2. No âmbito da atenção de alta complexidade, mencionado normativo define que a assistência aos pacientes com diagnóstico clínico ou definitivo de câncer se dará por meio de Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) e de Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia (Cracon). A quantidade de cada um desses estabelecimentos, por unidade da Federação, é definida com base na estimativa, realizada pelo Inca, de novos casos anuais de câncer na população do respectivo território, nos termos da Portaria SAS/MS 741/2005. 5.3. Consoante consignado no Relatório precedente, levantamento realizado pelo Instituto em 3/6/2011 demonstrou a necessidade, em todo o território nacional, de 375 Unacons e Cracons. No entanto, na mesma época, havia apenas 264 estabelecimentos habilitados para atuarem na atenção oncológica. Em termos de capacidade instalada, a rede demonstrava um déficit de 135 unidades de atendimento de radioterapia, 44 de cirurgia e 39 de quimioterapia. 5.4. Especificamente no que toca aos equipamentos de radioterapia, mesmo que fossem considerados como integrantes da rede aqueles existentes em instituições privadas que não prestam serviços para o SUS, o déficit ainda permaneceria na ordem de 57 unidades. Essa defasagem acarreta insuficiência na prestação de serviços radioterápicos, conforme restou evidenciado dos depoimentos colhidos nos trabalhos de campo e da constatação de que a quantidade de procedimentos desse tipo realizada em 2010 correspondeu a apenas 65,9% da necessidade estimada para o período. 5.5. Ainda no que toca a esse particular, cumpre registrar que o Plano Plurianual 2008-2011 não quedou insensível a essa realidade. O instrumento de planejamento orçamentário trouxe como meta física do "Plano Mais Saúde: Direito de Todos" a aquisição de 24 equipamentos de megavoltagem de radioterapia, ao custo de R$ 2 milhões cada. No entanto, essa meta foi posteriormente revista para apenas 8 equipamentos, sendo que, desses, somente 5 foram adquiridos. 5.6. Mais preocupante, a meu ver, mostrou-se a produção de cirurgias oncológicas, que, em 2010, respondeu por apenas 46,8% da demanda estimada para o SUS. A dificuldade no acesso a esse procedimento também foi confirmada em entrevista pelos gestores hospitalares e das secretarias de saúde. Nesse ponto, contudo, há que se considerar possíveis inconsistências nas premissas utilizadas pelo Inca para estimar a procura por tais serviços, conforme consignado pela equipe de auditoria, as quais podem implicar em distorções nos cálculos realizados. 5.7. No que tange aos tratamentos de quimioterapia, preliminarmente à exposição dos resultados obtidos no presente trabalho, gostaria de registrar, em complemento ao disposto no parágrafo 78 do relatório de auditoria, que o número de pacientes atendidos nesse tipo de procedimento foi calculado com base na quantidade, expedida em 2010, de Autorizações de Procedimentos de Alta Complexidade - Apacs atinentes à quimioterapia (documento emitido a cada mês que um determinado paciente se submete ao tratamento) dividida pelo período médio de tratamento desses pacientes (7,5 meses). Nesse sentido, não obstante o déficit identificado nas unidades de atendimento, verificou-se que o número de pacientes atendidos superou a estimativa inicialmente prevista para 2010. Todavia, ainda existem unidades da Federação em que a quantidade de pacientes atendidos fica muito aquém da demanda estimada, a exemplo do Pará (40,4%) e do Amapá (42,7%). 6. Essa carência de instalações aptas a atender a crescente demanda por serviços relacionados à atenção oncológica contribui, juntamente com outros fatores elencados no Relatório, com a intempestividade no diagnóstico da doença e no tratamento provido pelo SUS aos pacientes com câncer, impactando negativamente nas chances de cura e no tempo de sobrevida dessas pessoas. 6.1. Levantamento realizado junto ao Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS) e aos Registros Hospitalares de Câncer (RHC) organizados pelo Inca e pela Fundação Oncocentro de São Paulo (Fosp) revelou que, na maioria dos casos, o tempo decorrido entre o diagnóstico da doença e o início do tratamento de quimioterapia ou radioterapia ultrapassa 30 dias. Dos dados analisados, o melhor resultado foi verificado no RHC da Fosp, em que 52,4% dos pacientes tiveram o tratamento iniciado dentro do referido prazo. O pior índice, por outro lado, ficou por conta dos pacientes de radioterapia registrados no SIA/SUS, no qual somente 15,9% tiveram seu tratamento iniciado em menos de 30 dias do diagnóstico. A título de comparação, no que toca exclusivamente aos casos de tratamento de radioterapia, tem-se que esses índices são da ordem de 92% no Reino Unido e de 88% no Canadá. 7. Por fim, no que diz respeito às condutas terapêuticas de oncologia oferecidas à população pelo SUS, as opiniões obtidas junto a médicos oncologistas, seja durante os trabalhos de campo, seja por meio eletrônico, e a estabelecimentos de saúde habilitados para atuar na atenção oncológica foram unânimes em mencionar a existência de procedimentos para diagnóstico e condutas terapêuticas com eficácia comprovada cientificamente que não são custeadas pelo SUS. É importante salientar, nesse ponto, que não se buscou elencar quais seriam esses procedimentos, haja vista o caráter eminentemente técnico da questão bem como as próprias divergências existentes dentro da comunidade médica acerca do assunto. Quis-se, exclusivamente, aferir se a periodicidade com que tais condutas são revistas permite a incorporação, aos tratamentos patrocinados pelo SUS, dos avanços verificados na medicina, de acordo com a opinião daqueles que atuam na área. 7.1. Segundo restou evidenciado, um fator que tem contribuído para essa demora na atualização é a omissão por parte da Secretaria Nacional da Saúde na divulgação de diretrizes nacionais para a assistência oncológica referentes às neoplasias malignas mais frequentes, em desacordo com o estabelecido no art. 3º, inciso XI, da Portaria GM/MS 2.439/2005 c/c art. 19 da Portaria SAS/MS 741/2005. Dentre os sete tipos de câncer com maior incidência no país (pele não melanoma, próstata, mama, cólon e reto, pulmão, estômago e colo do útero), somente cerca de 40% possuem protocolos clínicos e diretrizes diagnósticas e terapêuticas. 8. Diante desse quadro e tendo em conta a natureza dos achados de auditoria aqui presentes, reputo de todo adequado o encaminhamento sugerido pela equipe de auditoria como forma de contribuir para o aperfeiçoamento da política pública em questão, sem prejuízo de promover os ajustes de forma que se fizerem necessários. Isso posto, manifestando-me de acordo com a abordagem realizada pela equipe de auditores, a quem elevo meus louvores pelo profícuo trabalho produzido, sem olvidar os gestores e os especialistas envolvidos que, com sua participação, tiveram papel decisivo para os resultados que ora se apresentam, VOTO por que seja adotada a deliberação que ora submeto à apreciação deste Colegiado. TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 25 de outubro de 2011. JOSÉ JORGE Relator Acórdão VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Auditoria Operacional realizada na Política Nacional de Assistência Oncológica. Acordam os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, diante das razões expostas pelo Relator, em: 9.1. com base no art. 250, inciso III do Regimento Interno do TCU, recomendar à Secretaria de Assistência à Saúde (SAS/MS) que: 9.1.1. desenvolva plano com objetivo de sanar as carências existentes na rede de atenção oncológica, que deverá contemplar: 9.1.1.1. a articulação junto aos gestores locais do SUS com vistas a considerar as reais necessidades em termos de estrutura da rede de assistência oncológica de cada unidade da Federação; 9.1.1.2. a ampliação da oferta de serviços, seja por meio de investimentos próprios ou pela contratação de serviços suplementares, até a completa solução das carências existentes, especialmente, em relação à oferta de cirurgias oncológicas, serviços de radioterapia e dos principais exames para diagnóstico de câncer; 9.1.1.3. a definição de prazos e metas progressivos, até a solução definitiva das carências existentes; 9.1.1.4. a mensuração do impacto financeiro das medidas planejadas; e 9.1.1.5. rotina de acompanhamento constante e divulgação periódica da evolução do plano, que deverá levar em conta a situação real da oferta de serviços, contemplando eventuais interrupções nos atendimentos. 9.1.2. elabore mecanismo para aferir a adequabilidade dos valores adotados como referência nos procedimentos custeados pelo SUS, tendo por base avaliação periódica dos seus custos efetivos, de sorte a identificar discrepâncias que possam atuar como inibidoras da oferta de serviços de saúde; 9.1.3. desenvolva estudos com o objetivo de revisar os parâmetros para o planejamento e avaliação da rede de alta complexidade em oncologia constantes do Anexo III da Portaria SAS/MS 741/2005, em especial para os tratamentos de radioterapia, quimioterapia e para os procedimentos cirúrgicos, de modo a assegurar que o acompanhamento dos resultados seja realizado com base em parâmetros adequados; 9.1.4. estabeleça rotina para o levantamento periódico dos casos de produção de procedimentos oncológicos em quantidades incompatíveis com os parâmetros estabelecidos, por unidade da Federação e estabelecimento, que preveja o encaminhamento de informações sobre os casos que se constituírem em indícios de fraude aos órgãos componentes locais do Sistema Nacional de Auditoria (SNA) e ao Denasus, devendo o levantamento iniciar-se a partir dos registros referentes ao ano de 2010; 9.1.5. adote medidas no sentido de assegurar a efetividade do sistema RHC que contemplem: 9.1.5.1. a revisão da abrangência, forma de coleta e de consolidação dos dados a serem computados, de forma a favorecer a ampla adesão e consolidação tempestiva dos registros; 9.1.5.2. a obrigatoriedade de participação de todos os estabelecimentos habilitados; 9.1.5.3. o acompanhamento e a divulgação periódica do grau de adesão dos estabelecimentos; 9.1.5.4. a criação de incentivos aos estabelecimentos com bons resultados na atualização dos dados, bem como de sanções para os inadimplentes; 9.1.5.5. o cálculo e a divulgação de indicadores de desempenho acerca da tempestividade dos atendimentos e de sobrevida dos pacientes; e 9.1.5.6. a definição de metas para esses indicadores. 9.1.6. institua crítica na entrada de dados para o sistema SIA/SUS das Apacs de quimioterapia e radioterapia, de forma a não permitir o registro de dados inconsistentes e incompatíveis entre si para os seguintes campos: data do diagnóstico; data de início do tratamento anterior; data de início do tratamento; tratamento anterior; continuidade de tratamento; tipo de Apac; e número de Apac anterior; 9.1.7. estabeleça sistemática para a promoção da formação e da capacitação de profissionais e equipes que atuam na assistência aos pacientes de câncer, desde a atenção primária até os níveis de alta complexidade, que inclua: 9.1.7.1. o mapeamento e o acompanhamento periódico das principais carências profissionais existentes; 9.1.7.2. a articulação com o Ministério da Educação, com os estabelecimentos habilitados, assim como com os gestores locais, visando à adoção de medidas para a ampliação da oferta de treinamentos, especializações ou residências médicas nas áreas em que forem identificadas carências significativas; e 9.1.7.3. a disseminação de informações sobre a prevenção e diagnóstico precoce de câncer para todos os profissionais de saúde que atuam na atenção primária. 9.1.8. estabeleça mecanismos para o desenvolvimento de estudos e discussões sobre as condutas terapêuticas mais adequadas para os pacientes oncológicos, que deverá prever a participação de especialistas com reconhecida capacidade nos temas objeto de discussão e que deverá possibilitar: 9.1.8.1. a divulgação de diretrizes terapêuticas para os casos de câncer mais prevalentes no Brasil, em consonância com o estabelecido no art. 19 da Portaria SAS/MS 741/2005; e 9.1.8.2. a atualização periódica das diretrizes e dos procedimentos custeados pelo SUS, em conformidade com o parágrafo único do art. 19 da Portaria SAS/MS 741/2005, de forma a possibilitar a incorporação dos avanços observados na medicina validados pela comunidade científica. 9.2. com base no art. 43, inciso I da Lei 8.443/1992 e no art. 250, inciso II do Regimento Interno do TCU, determinar à SAS/MS que remeta ao Tribunal, no prazo de 90 dias, plano de ação contendo o cronograma para a adoção das medidas necessárias à solução dos problemas apontados nesse relatório de auditoria; 9.3. encaminhar cópia do presente Acórdão, acompanhado do Relatório e do Voto que o fundamentam, assim como do inteiro teor do relatório de auditoria constante da peça 67, para os seguintes destinatários: 9.3.1. Ministro de Estado da Saúde; 9.3.2. Secretário de Atenção à Saúde; 9.3.3. Diretor Geral do Inca; 9.3.4. Presidente da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados; e 9.3.5. Presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal. 9.4. restituir os autos à Seprog para a programação do monitoramento da implementação das deliberações contidas neste Acórdão; e 9.5. arquivar os presentes autos Quorum 13.1. Ministros presentes: Benjamin Zymler (Presidente), Valmir Campelo, Walton Alencar Rodrigues, Augusto Nardes, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro, José Jorge (Relator) e José Múcio Monteiro. 13.2. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti, Marcos Bemquerer Costa, André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira Publicação Ata 44/2011 - Plenário Sessão 25/10/2011 Dou vide data do DOU na ATA 44 - Plenário, de 25/10/2011