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36460
Prioridades em Saúde
Comissão de consultoria aos editores
J. R. Aluoch
Jacques Baudouy
Fred Binka
Mayra Buvinic
David Challoner
Guy de Thé
Timothy Evans
Richard Horton
Sharon Hrynkow
Gerald Keusch
Kiyoshi Kurokawa
Peter Lachmann
Mary Ann Lansang
Christopher Lovelace
Anthony Mbewu
Rajiv Misra
Perla Santos Ocampo
G. B. A. Okelo
Sevket Ruacan
Pramilla Senanayake
Jaime Sepúlveda
Chitr Sitthi-amorn
Sally Stansfield
Misael Uribe
Zhengguo Wang
Witold Zatonski
Escritores colaboradores
William D. Savedoff e Anne-Marie Smith, Social Insight
Prioridades em Saúde
Editores
Dean T. Jamison
Joel G. Breman
Anthony R. Measham
George Alleyne
Mariam Claeson
David B. Evans
Prabhat Jha
Anne Mills
Philip Musgrove
BANCO MUNDIAL
Washington, D.C.
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1818 H Street NW
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1 2 3 4 09 08 07 06
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pelo pessoal do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento / Banco Mundial, Organização
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interpretações e conclusões expressas neste volume não refletem necessariamente a opinião dos Diretores
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O Banco Mundial, a Organização Mundial de Saúde e o Fogarty International Center dos Institutos
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ISBN-10: 0-8213-6448-0
ISBN-13: 978-0-8213-6448-2
eISBN: 0-8213-6449-9
DOI: 10.1596/978-0-8213-6448-2
Foram aplicados os dados do Catálogo de Publicações da Biblioteca do Congresso.
Sumário
Prefácio
vii
Agradecimentos
xi
Abreviaturas e Acrônimos
xiii
1. Realizações, desafios e prioridades
Realizações históricas na saúde em âmbito mundial
Responsabilidade por ganhos em saúde
Saúde e crescimento econômico
Eqüidade
Uma agenda para a ação
Colocando o DCP2 em prática
Este volume
1
2
5
7
8
13
16
20
2. Êxito no tratamento das prioridades
Êxitos apesar de sistemas de saúde precários
Êxitos que fortaleceram sistemas de saúde precários
Intervenções custo-efetivas destinadas à criação de serviços de saúde
Intervenções custo-efetivas que desenvolveram os sistemas
de saúde existentes
Intervenções custo-efetivas que ultrapassam os limites
dos sistemas de saúde
Conclusão
23
27
28
31
33
3. Por que utilizar análise de custo-eficácia?
Por que usar análise de custo-eficácia?
O que é análise de custo-eficácia?
Qual é o grau de confiabilidade da análise de custo-eficácia?
Quais são as tarefas adequadas para a análise do custo-eficácia?
Como os formuladores de políticas podem usar a análise
de custo-eficácia?
Resumo para o uso apropriado da análise de
custo-eficácia
39
39
42
48
50
34
37
52
56
v
4. Estratégias custo-eficientes para a carga de doenças excessiva
dos países em desenvolvimento
Doenças transmissíveis e infecciosas
HIV/AIDS
59
5. Estratégias custo-eficientes para doenças não-transmissíveis,
fatores de risco e comportamentos
Doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão arterial,
colesterol e obesidade
Câncer
Distúrbios congênitos e do desenvolvimento
Lesões não-intencionais
Consumo de tabaco
Consumo excessivo de álcool
Saúde mental
Conclusão
97
98
104
106
110
114
120
124
126
6. Fornecimento de intervenções
Níveis de atendimento
Insumos e Serviços inter-relacionados
Integração de serviços em todo o ciclo de vida
129
130
139
152
7. Informação, vigilância e pesquisa
Informações, vigilância e pesquisa
Gerenciamento de serviços de saúde
Recursos Humanos
Financiamento
157
157
166
171
175
8. O caminho à frente: um plano de ação
Referências
Sobre os Editores
Comissão de consultoria aos editores
Escritores colaboradores
181
185
189
197
198
60
61
Sumário, prioridades no controle de doenças nos países
em desenvolvimento, 2ª edição
vi | Sumário
199
Sumário: Carga global de doenças e fatores de risco
207
Crédito de fotos
209
Prefácio
Prioridades em Saúde é um volume que acompanha a 2ª edição (DCP2) de Disease Control
Priorities in Developing Countries (Prioridades no controle de doenças nos países em desenvolvimento), que sucedeu Disease Control Priorities for Developing Countries (DCP1) publicado
em 1993, porém com um mandato muito mais ampliado. O DCP1 demonstrou ser um documento altamente influente na formação global de políticas de saúde. A publicação inovadora do
Banco Mundial Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial (WDR 93), ao incorporar seus
principais conceitos e mensagens, tornou-se uma referência padrão para os formuladores de
políticas de saúde do mundo inteiro e mantém esse status até hoje.
Na Índia, o impacto foi dramático e eu tive o privilégio de gerenciar e supervisionar a transição para uma implementação bastante aprimorada das intervenções em saúde pública, tanto
em termos de cobertura quanto de eficácia. Uma série de circunstâncias facilitou essa transição:
uma crise sem precedentes nos balancos fiscais e de pagamentos externos, o que levou a Índia a
pedir ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial um empréstimo para ajuste estrutural que resultou em uma severa redução fiscal; mudança nas políticas de empréstimo
no Banco Mundial para enfatizar os setores sociais para recursos da AID; escassez de projetos
nos portfólios dos setores da saúde e da educação para utilizar a distribuição altamente concessional da AID em um período de séria crise de divisas; e, finalmente, uma equipe extraordinariamente solidária e compreensiva na administração do Banco Mundial na Índia.
Conhecemos os principais conceitos bem antes da publicação de DCP1, em um seminário no
All India Institute of Medical Sciences em Nova Deli no início de 1992, onde Dean Jamison e seus
colegas apresentaram as principais descobertas do DCP1 e WDR93, incluindo os conceitos de
anos de vida ajustados à deficiência (AVAD), carga de doenças, transição epidemiológica e análise de custo-eficácia como ferramenta de definição de prioridades. Esses conceitos forneceram
um novo modo de determinar prioridades objetivamente com base em evidências e análise econômica; embora tenha havido um certo ceticismo inicial e natural em relação às metodologias e
estimativas, a resposta geral foi altamente favorável.
Ao mesmo tempo, o Banco Mundial estava procurando critérios objetivos para identificar
projetos no setor de saúde. Uma estratégia conjunta foi desenvolvida entre o Banco e o
Ministério de Saúde para usar as técnicas do DCP1, que resultou em reforma e ampliação de
todos os principais projetos de controle de doenças em tempo recorde –especialmente aqueles
contra lepra, cegueira, tuberculose e malária – além de novas iniciativas para lidar com a ameaça emergente do HIV/AIDS. Simultaneamente, foram realizados projetos para o fortalecimento
do sistema em vários estados para aumentar a capacidade. Como resultado, os desembolsos de
desenvolvimento para o Departamento de Saúde (diferente da Assistência Familiar) aumentaram mais de cinco vezes e o componente externo mais de 25 vezes em pouco mais de uma década, entre 1990-91 e 2001-2002 (Relatório sobre a Saúde na Índia, 2003), o que não apenas aumentou os recursos financeiros além das expectativas, mas também mudou completamente a maneivii
ra de formular e implementar os projetos. Essa é uma história de sucesso da qual se podem
orgulhar o Governo da Índia e o Banco Mundial – a contribuição do DCP1 na canalização de
recursos adicionais para intervenções custo-efetivas para lidar com as condições responsáveis
pela principal cota de carga de doenças.
Abrangendo um novo campo
O DCP2 é uma iniciativa muito mais abrangente e na realidade muito ambiciosa. Vai muito além
da atualização do conteúdo técnico, estimativas da carga de doenças e da relação custo-eficácia
realizadas no DCP1. Abrange um campo totalmente novo ao examinar áreas importantes, mas
também muito complexas, tais como o fornecimento, a gestão e o financiamento de serviços de
saúde e pesquisa sobre saúde. Reconhece claramente que a definição da prioridade objetiva é
somente o primeiro passo: as intervenções identificadas precisam ser fornecidas de modo eficiente para que a população alvo possa beneficiar-se totalmente dos exercícios de custo-eficácia;
as intervenções individuais na saúde raramente são eficazes em isolamento; e geralmente o que
é necessário não é que apenas o sistema de saúde inteiro funcione bem, mas também que os
setores relacionados como nutrição, água potável, saneamento, educação etc. contribuam para
melhores resultados. Aumentar as capacidades de todo o sistema e criar vínculos estreitos com
outros participantes é a chave para o sucesso.
Apresentando os principais peritos
O DCP2 reuniu uma equipe impressionante com os principais peritos mundiais em disciplinas
relacionadas à saúde para contribuir a esse exercício e, portanto, é um tesouro incalculável das
últimas informações técnicas e experiência internacional, juntamente com análises de alta qualidade sobre praticamente todos os assuntos relacionados à saúde. Deve ser assim um documento legitimamente influente e uma referência padrão para profissionais de saúde e formuladores de políticas.
Promovendo tomadas de decisão eficazes
Além disso, o DCP2 tem potencial para contribuir significativamente para a saúde global ao promover tomadas de decisões bem informadas e baseadas em evidências em todos os níveis. Chega
em hora especialmente oportuna para meu próprio país, a Índia, onde pela primeira vez desde
a Independência o governo compromete-se a atribuir alta prioridade à saúde e aumentar a despesa pública em saúde do nível atual de menos de 1% até 2% ou 3% do PIB. Portanto, o DCP2
pode ter um impacto muito maior do que seu antecessor, não apenas na alocação racional de
recursos adicionais, mas também por revitalizar e atualizar o sistema de prestação de saúde
pública , que se tem desempenhado de forma muito precária em muitas partes do país.
Explicando a medição de mortalidade e morbidade
O Projeto de Prioridades no Controle de Doenças também resultou em um livro separado,
Global Burden of Disease and Risk Factors (Carga global de doenças e fatores de risco), que resuviii | Prefácio
me os conceitos e estimativas da carga de doenças e a atribuição dessa carga a vários fatores de
risco importantes. Essa é uma explicação definitiva de como a mortalidade e a morbidade são
avaliadas, incluindo um dano à saúde como o parto de feto morto, que não foi previamente
incluído nessas estimativas, e como essas perdas são combinadas em todas as avaliações globais
das condições de saúde. O livro também oferece estimativas de como a mortalidade mudou no
decorrer do tempo.
Destacando questões críticas
O DCP2 destaca algumas questões críticas, amplamente reconhecidas, mas quase sempre abordadas de forma inadequada nas publicações internacionais sobre a área da saúde.
Primeiramente, reconhece a eqüidade como um importante objetivo da política de saúde. A
preocupação com eqüidade não se deve meramente a uma questão moral ou do bem-estar
humano, mas também ao reconhecimento do importante papel da saúde no alívio da pobreza.
Além disso, afirma claramente o seguinte: “a menos que considerações sobre eqüidade se tornem
parte da tomada de decisões e dos resultados de monitoramento, as intervenções podem aumentar em vez de reduzir as lacunas de eqüidade”. O livro atribui corretamente boa parte do progresso em saúde global ao progresso técnico no sentido mais amplo e as evidentes disparidades
atuais nas condições de saúde entre os países e dentro dos países à aplicação desigual desse
conhecimento técnico. Portanto, o maior desafio enfrentado pela comunidade internacional é
“assegurar que os benefícios do progresso técnico sejam compartilhados de forma rápida e eficaz em escala global...” Não se poderia esperar uma apresentação mais convincente sobre a
questão da eqüidade.
Combinando visões equilibradas com abordagens práticas
A segunda qualidade evidente nesse trabalho é uma total isenção de tendências ideológicas,
além de uma abordagem altamente pragmática. Isso resulta em imparcialidade e completa
ausência de discursos de caráter prescritivo. Ele reconhece claramente que as diversidades
socioeconômicas, culturais e governamentais tornam impossível sugerir uma solução generalizada para as complexas questões globais de saúde. Por essa razão, tenta reunir todo o
conhecimento relevante e análises de experiências internacionais para capacitar os formuladores de políticas a tomarem decisões bem informadas apropriadas a cada situação
específica. Outra característica deste documento: ao contrário de outros relatórios, apresenta uma visão muito equilibrada entre a importância relativa da mobilização de recursos
e sua utilização eficaz e eficiente. Da mesma forma, encontramos uma revigorante imparcialidade para lidar com as responsabilidades da comunidade de doadores e dos próprios
países em desenvolvimento. A mensagem é clara: enquanto os ricos devem intensificar a
assistência, os países de baixa renda devem colocar a casa em ordem, a fim de fazer melhor
uso do dinheiro. Embora o próprio interesse deva ser necessariamente a principal motivação do apoio dos doadores, uma melhoria notável na qualidade da utilização da ajuda assistencial contribuiria inegavelmente para a melhoria do clima assistencial.
Prefácio | ix
Oferecendo uma ampla gama de informações
O DCP2 é um documento bem-pesquisado, volumoso, com 73 capítulos, cuja leitura pode não
ser fácil para leigos. É possível que até mesmo acadêmicos e profissionais da saúde não se interessem por todos os assuntos abordados e prefiram ler seletivamente. O público-leitor deste
documento é bastante amplo: desde acadêmicos e profissionais de saúde até formuladores de
política e gerentes de programa. Na verdade, para obter o benefício máximo, a rede teria de ser
mais ampla para incluir a mídia, os partidos políticos, legisladores e o público leigo informado.
Com que freqüência lamentamos a falta de vontade política, responsável pela negligência e falha
de muitas iniciativas de saúde nos países em desenvolvimento? Do mesmo modo, a ausência de
resposta dos países doadores para causas reconhecidamente merecedoras é quase sempre atribuída à apatia e indiferença da população geral dos países ricos aos problemas dos pobres.
Apresentando o conteúdo do DCP2 de forma resumida
Obviamente, nas sociedades democráticas, tanto nos países industrializados como nos países em
desenvolvimento, a opinião pública tem um papel importante e precisa ser sistematicamente
mobilizada. As principais mensagens, no entanto, precisam atingir a mídia e os leitores leigos em
larga escala para gerar uma conscientização geral e um debate informado sobre os principais
problemas mundiais de saúde. Precisávamos de um volume complementar que destilasse a
essência do DCP2 em um documento sucinto, lúcido e de fácil leitura. Prioridades em Saúde
atende a essa necessidade de forma admirável. Se o trabalho do DCP1 se tornou conhecido principalmente por meio do WDR93, o volume complementar é o instrumento para uma maior
divulgação do DCP2. Em apenas 200 páginas, ele apresenta com clareza, em prosa legível, livre
do jargão técnico e do peso das estatísticas, a essência de todo o documento. Abre também uma
janela para o principal documento para os interessados em determinados aspectos a fim de
incentivá-los a ler os capítulos relevantes. Pode ser lido e apreciado por formuladores de políticas ocupados até mesmo durante um longo vôo. Espero sinceramente que Prioridades em Saúde
seja lido em países desenvolvidos e países em desenvolvimento e que suas mensagens sejam ativamente debatidas para obter todas as vantagens dessa magnífica iniciativa. Considero
Prioridades em Saúde uma leitura obrigatória para todos os interessados na área da saúde e nos
setores correlatos.
Rajiv Misra
Ex-Secretário da Saúde, Índia
x | Prefácio
Agradecimentos
No início de 2001, convencidos de que os avanços na saúde global necessitavam de uma 2ª edição do Disease Control Priorities in Developing Countries (DCP2), Dean T. Jamison e Prabhat Jha
conseguiram a colaboração de Anthony R. Measham nesse empreendimento e nasceu o Projeto
de Prioridades no Controle de Doenças (DCPP). Logo depois, seis outro editores passaram a
fazer parte do DCPP: George Alleyne, Joel G. Breman, Mariam Claeson, David Evans, Anne Mills
e Philip Musgrove.
O DCP1 sediou-se no Banco Mundial. Christopher Lovelace era o Diretor da Unidade de
Saúde, Nutrição e População no Banco em 2001 quando se tornou o primeiro dos três principais parceiros a participar do DCPP. A Organização Mundial de Saúde (OMS) entrou em seguida, liderada por Gro Harlem Bruntland, então Diretor-Geral, e Christopher Murray, Chefe do
Departamento de Evidências e Informações sobre Políticas. Gerald Keusch, então Diretor do
Fogarty International Center (FIC) nos National Institutes of Health (NIH), generosamente ofereceu-se para patrocinar o DCPP. O projeto foi lançado no início de 2002 com o importante
apoio da Fundação Bill & Melinda Gates. J.W. Lee da OMS, Jacques Baudouy do Banco Mundial,
e Sharon Hrynkow da FIC/NIH, todos eles deram continuidade ao forte apoio do DCPP iniciado por seus antecessores.
O DCPP é uma empresa conjunta do Fogarty International Center (FIC) dos National
Institutes of Health (NIH), Organização Mundial da Saúde (OMS), Banco Mundial e Population
Reference Bureau. O Fogarty International Center (FIC) é o componente internacional do NIH.
Trata de desafios globais de saúde por meio de programas de treinamento e pesquisa inovadores
e colaborativos e apóia e investe na missão do NIH por meio de parcerias internacionais.
A OMS é o órgão especializado da ONU responsável pela saúde dos povos. Seu objetivo,
conforme definido em sua Constituição, é promover o nível mais alto possível de saúde para
todos os povos. A Constituição da OMS define saúde como uma condição de completo bemestar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença ou enfermidade.
O Grupo do Banco Mundial é uma das maiores fontes mundiais de assistência para o desenvolvimento. O Banco, que concede US$18-22 bilhões por ano em empréstimos para seus países
clientes, forneceu US$1,27 bilhão para saúde, nutrição e população, em 2004. O Banco Mundial
trabalha hoje em mais de 100 economias em desenvolvimento, nas quais realiza um misto de trabalho analítico, diálogo político e empréstimos para melhorar os padrões de vida – incluindo
saúde e educação – e reduzir a pobreza.
O Population Reference Bureau (PRB) mantém pessoas de todo o mundo informadas sobre
saúde, população e ambiente e as capacita a usar essa informação para melhorar o bem-estar das
gerações atuais e futuras. Durante 75 anos, o PRB analisou dados complexos e resultados de pesquisa para fornecer informações objetivas e oportunas em um formato facilmente compreendido por advogados, jornalistas e formuladores de decisões; realizou workshops no mundo intei| xi
ro para oferecer aos públicos-chave as ferramentas necessárias para garantir que os formuladores de políticas dos países em desenvolvimento fundamentem suas decisões políticas em evidências seguras, em vez de se basearem em informações aleatórias e obsoletas.
A idéia de publicar um volume complementar para formuladores de políticas e para outras
pessoas influentes surgiu no primeiro encontro da Comissão Consultiva aos Editores (ACE) do
DCPP, realizado em Cuernavaca, México, em junho de 2003. Foi imediatamente endossado pela
Comissão Executiva do ACE, constituído por Jaime Sepulveda, Chefe, Guy de Thé e David
Challenor.
Prioridades em Saúde foi escrito por William Savedoff e Amy Smith, com base no conteúdo
de Disease Control Priorities in Developing Countries, 2ª edição. Os editores, autores e o pessoal
do DCPP têm uma profunda dívida de gratidão com Bill e Amy pela maneira formidável como
captaram, em poucas páginas, a essência das 1.400 páginas do segundo volume. Philip
Musgrove, Sonbol Shahid-Salles e Anthony Measham revisaram e editaram o volume complementar, e são responsáveis por quaisquer falhas na captação dessa essência.
Carlos Rossel, Mary Fisk, Randi Park, Nancy Lammers, Alice Faintich, Andres Meneses e seus
colegas da Editora do Banco Mundial fizeram um notável trabalho de produção dos livros
do DCPP, inclusive o atual. Sem o profissionalismo, perfeccionismo, dedicação, suporte e
assessoramento dessas pessoas não teria sido possível publicar esse livro juntamente com a
segunda edição.
Esta tradução ao português foi possível graças à Unidade de Serviços de Tradução e
Interpretação do Banco Mundial, Washington, D.C.
Por fim, os editores do DCPP gostariam de prestar homenagem aos mais de 350 autores de
capítulos da segunda edição pela extraordinária contribuição ao Prioridades em Saúde.
Esperamos que esse volume complementar some esforços à segunda edição em sua meta de
reduzir substancialmente o índice de mortes, doenças e deficiências no mundo inteiro, especialmente entre a população pobre dos países em desenvolvimento.
xii | Agradecimentos
Abreviaturas e Acrônimos
AID
ART
BCG
DCV
DCP2
AVAD
DOTS
PIB
Hib
AIEPI
ITN
MDM
TRO
ONG
SARS
DST
TB
OMS
Associação Internacional para o Desenvolvimento
Terapia antiretroviral
Bacilo de Calmette e Guérin
Doença cardiovascular
Disease Control Priorities in Developing Countries,
(Prioridades no controle de doenças em países em desenvolvimento) 2ª edição
Ano de vida ajustado à deficiência
Estratégia disseminada internacionalmente que combateu com eficácia a
disseminação da tuberculose
Produto interno bruto
Haemophilus influenzae tipo B
Atenção Integrada às Enfermidades Prevalentes da Infância
Rede tratada com inseticida
Metas de Desenvolvimento do Milênio
Terapia de reidratação oral
Organização não-governamental
Síndrome respiratória aguda grave
Doença sexualmente transmissível
Tuberculose
Organização Mundial de Saúde
Todas as quantias em dólares referem-se a dólares dos Estados Unidos, salvo especificação
em contrário.
xiii
Capítulo 1
Realizações, desafios e prioridades
É o momento de fazer um exame minucioso da saúde humana no mundo
inteiro. Muitas pessoas estão vivendo mais e com mais saúde do que antes,
mas muitas outras ainda carecem de acesso aos cuidados de saúde mais
básicos e o hiato entre os que recebem e os que não recebem cuidados de
saúde na verdade ampliou-se em alguns serviços básicos. Quanto às
doenças infecciosas, embora a comunidade médica esteja controlando
com êxito algumas delas – e tenha até erradicado uma – novas doenças
estão surgindo, algumas das quais provocadas por vírus misteriosos que
cruzam espécies ou sofrem mutações rápidas. Outros componentes
importantes da carga global de doenças são derivados do comportamento humano e das escolhas prejudiciais que as pessoas fazem, tanto individual quanto coletivamente.
O livro Disease Control Priorities in Developing Countries (Prioridades
no controle de doenças nos países em desenvolvimento), 2ª edição
(DCP2) (Jamison e outros, 2006) tem por objetivo fazer um exame minucioso, tanto da saúde quanto dos cuidados de saúde. Qual foi o progresso da comunidade médica na identificação e redução da carga global de
doenças? Quais foram os avanços dos países no desenvolvimento e fornecimento de cuidados de saúde eficientes, eficazes e eqüitativos? Como os
países devem definir e alcançar as prioridades em saúde?
Em 1993, a primeira edição de Disease Control Priorities in Developing
Countries (Jamison e outros, 1993) apresentou o grau de conhecimento
sobre a distribuição da carga de doenças nos países em desenvolvimento,
informações atualizadas sobre várias dessas doenças e dados sobre a
relação custo-efetividade das intervenções disponíveis para abordá-las. O
livro ajudou a informar e a estimular as políticas do setor de saúde em
países de todo o mundo, demonstrando os benefícios de redirecionar
esforços para doenças com grande prevalência e de fazê-lo com intervenções custo-efetivas. Forneceu uma base conceitual para a discussão
1
sobre a alocação de recursos no setor de saúde, ao mesmo tempo em que
demonstrou os vínculos entre prevenção e tratamento, entre cuidados de
saúde pública e serviços de saúde individual e entre o setor de saúde e outros setores. As informações e a análise fornecidas na publicação de 1993
ajudaram muitos países em desenvolvimento a definir pacotes básicos de
cuidados de saúde; orientaram suas decisões gerenciais sobre treinamento,
suprimentos e equipamentos; e ajudaram na elaboração de programas de
seguro social. O livro também contribuiu para diversas outras publicações
durante a década de 1990, inclusive o World Development Report 1993:
Investing in Health (Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 1993:
Investindo em Saúde) (Banco Mundial 1993).
Agora, 13 anos mais tarde, o DCP2 avalia as realizações subseqüentes,
os desafios que permaneceram e os que estão surgindo, bem como as
novas oportunidades de melhoria da saúde do mundo em desenvolvimento. Essa nova publicação é mais abrangente do que sua antecessora
em vários aspectos, a saber:
• Aborda um número maior de doenças e condições, incluindo a gama
completa de doenças infecciosas, questões reprodutivas, de saúde
infantil, doenças não transmissíveis e lesões, bem como fatores de risco
e conseqüências de doenças.
• Proporciona uma análise da relação custo-efetividade mais completa e
permite maior comparação entre as condições e regiões do que foi possível na edição anterior.
• Dispensa considerável atenção à implementação, examinando a
prestação, gestão e financiamento da saúde.
• Aborda questões abrangentes, tais como diferenças de gênero em
condições de saúde e ética na alocação de recursos.
“Até o século XIX, as
mortes de recém-nascidos
e crianças eram comuns
em todo o mundo.”
Portanto, esta nova publicação é uma avaliação ampla e atualizada do
conhecimento médico, econômico e gerencial que pode agora ser utilizado para aliviar a carga global de doenças e melhorar a saúde humana.
REALIZAÇÕES HISTÓRICAS NA SAÚDE EM ÂMBITO MUNDIAL
Qualquer exame minucioso deve incluir o relato de um caso.1 Uma
revisão dos avanços sem precedentes da saúde humana no último século
oferece perspectivas importantes sobre a situação atual.
1
Para conhecer as perspectivas históricas sobre saúde e cuidados de saúde, consulte o DCP2,
capítulos 1 e 33.
2 Prioridades em Saúde|
Figura 1.1 Limites e Convergência da Expectativa Média Nacional de Vida ao
Nascer para Mulheres
média de expectativa de vida em anos
90
90
85
85
Japão
80
80
75
75
Países nórdicos
75%
70
70
50%
65
25% 65
60
60
Nova Zelândia
55
55
Intervalo
entre o
50
50
Noruega
primeiro
45
45
e o último
estimativas para Inglaterra
40
40
quartil da
populaÁão
35
35
mundial
30
30
Serra
Leoa
limite inferior de viabilidade
25
25
20
20
1550 1600 1650 1700 1750 1800 1850 1900 1950 2000 2050
Fonte: Oeppen 1999.
Até o século XIX, as mortes de recém-nascidos e crianças eram comuns
em todo o mundo. A má nutrição deixava a maioria das pessoas atrofiadas se considerados os padrões atuais. Doenças infecciosas tais como
varíola, sarampo e tuberculose dizimavam comunidades inteiras e deixavam muitas pessoas com cicatrizes e aleijadas. A expectativa de vida era
baixa em todo o mundo. Mesmo entre as mulheres na Inglaterra que, de
1600 a 1840 tinham a média de vida mais elevada do mundo, a expectativa de vida flutuava entre 35 e 45 anos, a metade da atual (Figura 1.1).
Esse quadro geral vem mudando rápida e drasticamente desde meados
do século XIX. A comunidade médica conseguiu controlar muitas
doenças infecciosas e até erradicou a varíola; a melhor nutrição e
condições gerais de saúde reduziram as taxas de mortalidade para todos,
especialmente crianças; e os períodos de vida aumentaram extraordinariamente. Depois de 1840, a tendência de aumento da longevidade continuou a uma taxa de crescimento surpreendentemente uniforme de
2,5 anos por década, durante os 160 anos subseqüentes. Em 1900, a média
mais elevada de expectativa de vida já havia superado os 60 anos; até 2000,
ela ultrapassou os 80 anos.
Contudo, embora os ganhos em saúde e expectativa de vida não tenham sido uniformes em todo o mundo nem tenham ocorrido ao mesmo
tempo ou na mesma proporção, eles foram largamente distribuídos:
Realizações, desafios e prioridades | 3
Tabela 1.1 Níveis e alterações na Expectativa de Vida, 1960-2002 , por Região do Banco Mundial
Expectativa de vida (anos)
Taxa de alteração por década (anos)
Região
1960
1990
2002
1960–90
Baixa e media renda
45,2
63
65
6,3
Leste Asiático e Pacífico
(China)
1990–2002
1,7
39
67
70
9,3
2,5
(36)
(69)
(71)
(11)
(1,7)
Europa e Ásia Central
n/a
69
69
n/a
0,0
América Latina e Caribe
56
68
71
4,0
2,5
Oriente Médio e Norte da África
47
64
69
5,7
4,2
Sul da Ásia
44
58
63
4,7
4,2
(44)
(59)
(64)
(5)
(4,6)
40
50
46
3,3
–3,3
(Índia)
África Subsaariana
Alta renda
69
76
78
2,3
1,7
â : âmbito mundial
57
70
72
4,3
1,7
Fonte: Banco Mundial 2004
Nota: Os registros representam a média de expectativas de vida para homens e mulheres.
• Em 1977, a varíola já estava erradicada em todo o mundo.
• A pólio perdura apenas em poucos países.
• Difteria, coqueluche, sarampo e tétano são raros ou inexistentes em
muitas partes do mundo.
• A mortalidade infantil, embora ainda seja elevada em muitos lugares,
caiu em quase todas as partes do mundo.
• A média de expectativa de vida aumentou – embora com reveses – em
todo o mundo. De 1960 a 2002, a expectativa média de vida subiu de
36 para 71 anos na China, de 56 para 71 anos na América Latina e no
Caribe, de 47 para 69 anos no Oriente Médio e Norte da África e de 44
para 63 anos no Sul da Ásia. Mesmo na África Subsaariana, a expectativa média de vida aumentou de 40 para 50 anos em 1990, caindo
novamente para 46 anos em 2002, devido, em grande parte, à disseminação da epidemia de HIV/AIDS (Tabela 1.1).
Embora a expectativa de vida nos países de renda elevada ultrapasse a
das regiões em desenvolvimento, a convergência é perceptível. Em 1910,
por exemplo, um homem nascido nos Estados Unidos poderia esperar
viver 49 anos, mas se tivesse nascido no Chile, sua expectativa de vida teria
sido de apenas 29 anos. Em contraste, no final da década de 1990, a expectativa de vida nos EUA já havia alcançado 73 anos e a do Chile 72.
4 Prioridades em Saúde|
RESPONSABILIDADE POR GANHOS EM SAÚDE
Inúmeros fatores são responsáveis pelas conquistas notáveis e generalizadas
em saúde humana no século XX, inclusive pela mudança demográfica,
aumento da produtividade, urbanização, aumento da oferta de alimentos,
ciência médica, saneamento e mudanças institucionais. Algumas análises
históricas focalizam um único fator crítico quando buscam aquele que
serve de base para os outros, enquanto outras abordagens enfatizam a interrelação entre vários fatores. Esforços para entender as extraordinárias
mudanças em saúde humana no século XX envolveram a exploração de
teorias da história e da natureza das causas e como elas contribuíram para
o estudo da epidemiologia. Há muitas explicações possíveis, mas para nossa
finalidade – obter lições dessa trajetória histórica sem precedentes – duas
mensagens claras sobressaem:
• O crescimento da renda, por si só, não pode responder pelas impressionantes melhorias em saúde no século passado, nem pode ser
considerado a única estratégia para o progresso da saúde no futuro.
• O progresso técnico, no sentido amplo, funciona. Ele tem sido, e pode
ser, a base para ganhos substanciais em saúde, mesmo se o crescimento da renda for pequeno ou estagnado.
“O progresso técnico
tem sido a base para ga-
Embora o desenvolvimento econômico e o crescimento da renda estejam certamente entre os fatores que ajudam a explicar os notáveis avanços
da saúde no século XX, a redução da mortalidade na Europa teve tímida
correlação com períodos de crescimento econômico no século XIX e início do século XX. Experiências mais recentes em muitos lugares como
Cuba, Sri Lanka e o Estado de Kerala na Índia demonstram que extraordinárias melhorias na saúde podem ocorrer sem que as rendas sejam
elevadas ou estejam em rápido crescimento. O ritmo das melhorias em
saúde em tantos países diferentes, com diferentes níveis de desenvolvimento econômico e com taxas distintas de crescimento da renda demonstra que outros fatores podem desempenhar e realmente desempenham
um papel importante.
Um número cada vez maior de estudos atribui os incríveis avanços em
saúde no século passado não tanto ao aumento da riqueza quanto ao progresso técnico. Neste contexto, progresso técnico significa qualquer avanço
no conhecimento que proporcione melhorias de ordem prática. Inclui o
desenvolvimento e aplicação de tratamentos sofisticados, tais como transplantes de órgãos e angioplastia e também tratamentos simples, como a
reidratação oral, por meio da qual uma criança com diarréia recebe líqui-
nhos substanciais em
saúde, mesmo se o
crescimento da renda
for pequeno ou estagnado.”
Realizações, desafios e prioridades | 5
“A criação de sistemas de
previdência social
e serviços nacionais
de saúde é um outro
aspecto desse tipo
de progresso técnico”
6 Prioridades em Saúde|
dos contendo alguns ingredientes simples para beber, evitando a morte por
desidratação. Inclui progresso em cuidados preventivos, tais como vacinas
novas, mais eficazes e de mais fácil administração, além de simples modificações de comportamento, por exemplo, como manter os recém-nascidos
aquecidos e garantir que seu cordão umbilical esteja limpo e livre de
infecção. Inclui também métodos inovadores de prestação de tratamento
padrão – tais como o tratamento de curta duração supervisionado
(DOTS), uma estratégia divulgada internacionalmente que tem combatido
com eficácia a disseminação da tuberculose (TB) em muitos países.
O progresso técnico inclui também inovações institucionais e gerenciais. Essas inovações podem significar a organização e administração de
funções de saúde pública pela primeira vez em um país ou desempenhálas de maneiras novas e mais eficazes. Podem abranger também a identificação e treinamento de novos quadros de profissionais de saúde, o
desenvolvimento de novos meios para acompanhar uma doença e depois
direcionar campanhas de vacinação, ou medidas para melhorar o acesso e
a qualidade do tratamento.
Na esfera da economia e política pública, o progresso técnico inclui
melhorias na alocação de recursos em decorrência de estudos sobre a
eficácia das intervenções e estratégias, bem como a avaliação de sua
relação custo-efetividade. Engloba o desenvolvimento de novos métodos
de financiamento de sistemas de saúde, tais como mobilizar recursos
públicos ou juntar recursos financeiros, além de novas estratégias para o
pagamento de fornecedores e compra de serviços de saúde. A criação de
sistemas de previdência social e serviços nacionais de saúde é um outro
aspecto desse tipo de progresso técnico que ajuda a proteger milhões de
famílias contra os elevados custos das doenças e lesões graves. O DCP2
apresenta de que maneiras a ação coletiva, por meio de financiamento
público, proporcionou ganhos de saúde substanciais para a sociedade.
O progresso técnico ocorrido fora do setor saúde também contribuiu
para a melhoria da saúde. Particularmente, o aumento da produtividade
agrícola melhorou a nutrição de uma grande parte da crescente população
mundial. Além disso, melhorias na infra-estrutura, tais como habitação,
saneamento, água potável e estradas seguras, prestaram contribuições significativas para a saúde. Investimentos em educação, que ajudam a
aumentar o nível de alfabetização e, portanto, facilitam a difusão de mensagens sobre vida saudável, também tiveram impacto importante.
Quando países adotaram mudanças técnicas como essas, a saúde das
pessoas melhorou, mesmo na ausência de riqueza social ou crescimento
econômico. De 1950 a 1980, países de renda baixa e média, tais como o
Chile, Costa Rica, Cuba e Sri Lanka, adotaram métodos básicos para a me-
lhoria da saúde pública, tais como saneamento, imunização de rotina e
melhor assistência ao nascimento, com notável redução da mortalidade
materna, de recém-nascidos e de crianças. Países com perfis econômicos
semelhantes que não adotaram tais medidas ficaram para trás. Uma análise
econométrica entre países demonstra que os que fizeram rápido progresso
técnico reduziram a mortalidade de bebês em 5% ao ano em comparação
com países que tiveram pouco ou nenhum progresso técnico.2 Mesmo
países pobres com instituições públicas deficientes, bem como países mergulhados em conflitos violentos, fizeram importantes avanços em saúde
por meio de campanhas de vacinação que erradicaram a varíola em todo o
mundo, eliminaram a pólio na maior parte do mundo ou controlaram
outras doenças infecciosas endêmicas. Com a adoção do progresso técnico
em suas inúmeras formas, o avanço em saúde é possível.
Os ganhos em saúde do século passado não foram apenas inéditos, mas
a sua relação direta com as tendências de crescimento econômico e com a
capacidade institucional local é surpreendente. Na realidade, “o aumento
da renda não é necessário nem suficiente para os avanços sustentados em
saúde. As ferramentas atuais para a melhoria da saúde são tão poderosas
e seu custo é tão baixo que as condições de saúde podem ser razoavelmente boas, mesmo em países onde as rendas são baixas.” (DCP2,
Capítulo 1, pág. 8)
“...os países que fizeram
rápido progresso técnico
reduziram a mortalidade
de bebês em 5% ao ano
em comparação com países
que tiveram pouco ou ne-
SAÚDE E CRESCIMENTO ECONÔMICO
nhum progresso técnico.”
Os pesquisadores freqüentemente não levam em consideração a
importância dos extraordinários ganhos em saúde do século XX para o
bem-estar humano por serem difíceis de quantificar e também porque
outra medida de bem-estar – o aumento da renda nacional – é o indicador-padrão do progresso de um país. Vários estudos têm procurado
corrigir esse problema calculando o valor, em termos monetários, do
aumento da longevidade.
Quando o valor desses anos de vida adicionais é somado à renda
nacional, o resultado – conhecido como renda total – aproxima-se melhor
da medida do bem-estar humano. Cálculos desse tipo feitos para os
Estados Unidos demonstraram que a taxa em que o aumento da longevidade elevou o bem-estar dos americanos foi igual ou superior ao aumento de 600% da renda real durante a primeira metade do século XX. A
atenção dispensada ao valor do aumento da longevidade também atenua
2
Especialmente com relação ao diferente ritmo de progresso técnico demonstrou também que o
efeito da saúde sobre a renda é significativamente mais forte do que o efeito da renda sobre a
saúde. Para saber mais sobre os benefícios econômicos da saúde, ver DCP2, Capítulo 1
Realizações, desafios e prioridades | 7
“...a taxa em que o
aumento da longevidade
elevou o bem-estar dos
americanos foi igual ou
superior ao aumento de
600% da renda real
durante a primeira metade
do século XX.”
as avaliações da desigualdade global porque, desde a década de 1950, a
expectativa de vida dos países mais pobres se vem aproximando da expectativa de vida desfrutada pelos países de renda mais elevada.
Os pesquisadores também subestimam a importância dos avanços em
saúde para o bem-estar humano: uma saúde melhor por si só contribui
para o crescimento econômico. Na verdade, embora o crescimento
econômico não seja essencial para a saúde, a saúde pode ser crucial para
o crescimento econômico. Inúmeros estudos têm demonstrado que,
quanto mais saudáveis, mais produtivas são as pessoas. Esses estudos
incluem experimentos focados, tais como demonstrações de que os trabalhadores agrícolas são mais produtivos após serem tratados de anemia.
Incluem também uma ampla pesquisa histórica. A qual indica, por exemplo, que a metade do crescimento britânico durante a Revolução
Industrial pode ser atribuída à melhor nutrição e, portanto, a trabalhadores mais saudáveis e mais produtivos. Estudos entre países demonstraram que as reduções na mortalidade de adultos foram responsáveis
por 10 a 15% do crescimento econômico de 1960 a 1990 e que um ano a
mais de expectativa de vida contribui para um incremento sustentado de
4% na renda nacional.
EQUIDADE
“...a metade do crescimento britânico durante a
Revolução Industrial
pode ser atribuída
à melhor nutrição”
8 Prioridades em Saúde|
A perspectiva histórica ampla sobre saúde humana é animadora de várias
formas. As tendências principais são positivas, com ganhos sem precedentes, amplos avanços e condições de saúde convergentes. Entretanto,
essas tendências positivas escondem o progresso desigual que tem deixado muitas pessoas para trás e em desvantagem. Nenhum processo de
definição de prioridades e elaboração de estratégias para a melhoria da
saúde pode ignorar as grandes desigualdades generalizadas. Como observa o DCP2 (Capítulo 1, pag. 5), “em um número demasiadamente elevado de países as condições de saúde permanecem inaceitáveis e desnecessariamente precárias. Esse fator é fonte de tristeza e sofrimento e constitui
um freio notável no crescimento econômico e na redução da pobreza.”
Graças às atuais ferramentas e recursos, as condições de saúde podem
ser razoáveis em todos os lugares, mas para inúmeras pessoas condições
de saúde “razoáveis” não são a regra. As crianças nascidas em países de
baixa renda têm muito menos possibilidade de levar uma vida longa e
com boa saúde do que as nascidas nos países de renda mais elevada. As
mulheres geralmente vivem mais que os homens, mas sua vida tende a ser
marcada por uma saúde mais frágil (DCP2, Capítulo 10). Nas sociedades
que negam às mulheres direitos de herança, expressão política, direitos
legais ou educação, essas mulheres são acometidas por mais doenças e
lesões e têm menos acesso a tratamento e serviços. Outros grupos socialmente marginalizados, sejam eles grandes grupos como populações indígenas, moradores das áreas rurais e trabalhadores migrantes ou grupos
menores, tais como profissionais do sexo e crianças de rua, sofrem de cargas de doenças excessivas semelhantes.
A eqüidade é um importante subtexto em todo o DCP2.3 Cada capítulo dedicado a uma doença específica ressalta a distribuição da carga da
doença e identifica onde essa carga está concentrada, se em determinadas
regiões ou populações. Os debates sobre as intervenções avaliam sua eficácia com relação aos diferentes agrupamentos por idade, gênero, cultura e
nível social e as análises dos mecanismos de prestação de serviços abordam as barreiras ao acesso a cuidados de saúde apropriados e oportunos
quando essas barreiras variam entre os grupos populacionais. Como
observam os autores do capítulo sobre gestão integrada de enfermidades
predominantes na infância (IMCI): “O desafio de aumentar a eqüidade
não é exclusividade da IMCI ou da sobrevivência infantil; ele afeta praticamente todas as intervenções e estratégias de prestação de serviços. Salvo
se as considerações sobre eqüidade passarem a fazer parte da formulação de
políticas e dos resultados do monitoramento, as intervenções podem ampliar,
em vez de reduzir, os hiatos de desigualdade.” (DCP2, Capítulo 63, pág.
1189, grifo acrescentado).
As desigualdades em saúde, muitas das quais são perfeitamente
visíveis, podem ser documentadas quando os pesquisadores separam as
análises por divisões relevantes da sociedade, como por exemplo, idade,
gênero, renda, etnia ou região. Os padrões de desigualdade resultantes
podem ser observados em três níveis diferentes: grandes disparidades de
condições de saúde, diferença no acesso e utilização dos serviços de saúde
e exposição desproporcional aos riscos à saúde.
Padrões de desigualdade de condições de saúde
O quadro animador pintado pelo aumento das médias globais esconde as
substanciais disparidades de saúde entre diferentes regiões do mundo e
diferentes categorias de renda, gêneros e grupos etários. Uma criança nascida na Etiópia hoje, por exemplo, tem 20% de chance de morrer antes dos
cinco anos de idade, em comparação com menos de 1% de possibilidade
para uma criança nascida na América do Norte ou na Europa Ocidental. No
período de 1990 a 2002, a taxa de mortalidade de crianças com menos de
cinco anos permaneceu inalterada ou aumentou em 27 países. O risco de
uma mulher morrer de parto é de menos de 20 em cada 100.000 nascimen-
“As mulheres geralmente
vivem mais que os homens,
mas sua vida tende a ser
marcada por uma saúde
mais frágil”
“No período de 1990 a
2002, a taxa de mortalidade de crianças com
menos de cinco anos
permaneceu inalterada ou
aumentou.”
3
A questão de equidade é abordada em praticamente todos os capítulos do DCP2. A discussão
mais explícita encontra-se no Capítulo 3. Veja também os Capítulos 9, 10, 59 e 63.
Realizações, desafios e prioridades | 9
“A excessiva carga de
doenças entre as mulheres
não é exclusivamente resultado de doenças relacionadas com as condições
maternas.”
“Os níveis de cobertura
de intervenções eficazes
para melhorar a sobrevivência infantil são
notavelmente baixos na
maioria dos países em
desenvolvimento.”
10 Prioridades em Saúde|
tos em países de renda alta, contudo essa média ultrapassa 900 para cada
100.000 nascimentos nos países com renda mais baixa do mundo. O progresso na redução da mortalidade materna tornou-se mais lento e até reverteu em alguns países; portanto, o hiato está se ampliando.
A excessiva carga de doenças entre as mulheres não é exclusivamente
resultado de doenças relacionadas com as condições maternas, mas inclui
uma maior incidência de doenças que resultam da desigualdade de papéis
desempenhados pelos gêneros; por exemplo: na África Subsaariana, as
adolescentes do sexo feminino têm de 5 a 16 vezes mais possibilidade de
serem infectadas pelo HIV do que os adolescentes do sexo masculino. Na
China, Índia e outras partes do Sul da Ásia, a negligência sofrida por crianças do sexo feminino, abortos seletivos, violência e outras causas de
mortalidade excessiva arruínam a vida da mulher, levando às estimativas
assustadoras de milhões de mulheres que, portanto, não fazem parte das
contagens de população.
Em muitas das antigas repúblicas soviéticas, a expectativa de vida entre
os homens sofreu redução na década de 1990 devido a um aumento no
alcoolismo e à deterioração da infra-estrutura de saúde básica. Aquela
que é de longe a pior calamidade dos últimos anos atingiu a África
Subsaariana, onde o HIV/AIDS está reduzindo a expectativa média de
vida e aumentando a mortalidade causada por infecções oportunistas, TB,
malária e desnutrição.
Grandes disparidades em saúde também podem ser encontradas dentro de um mesmo país. A China Ocidental, por exemplo, está aquém das
regiões costeiras mais ricas da China em perfil de saúde e as populações
indígenas dos países da América Latina têm vida mais curta e menos
saudável do que outros segmentos da população. Com efeito, os
pesquisadores regularmente concluem que na maioria dos países as pessoas de baixa renda vivem menos e com menos saúde do que os ricos.
Padrões de desigualdade em provisão de serviços de saúde
A desigualdade também é evidente nas diferenças em serviços de saúde, a
saber:
• Os níveis de cobertura de intervenções eficazes para melhorar a sobrevivência infantil são notavelmente baixos na maioria dos países em
desenvolvimento. Uma análise dos 42 países responsáveis por 90% das
mortes infantis do mundo demonstrou que somente duas das nove
intervenções-chave atingiram mais da metade de todas as crianças.
• Em 1999, parteiras qualificadas assistiram a menos de metade das
mulheres que deram à luz na África Subsaariana.
• Um terço da população do mundo não tem acesso efetivo a medicamentos modernos essenciais ou a vacinas. Cerca de 65% das pessoas na
Índia e 47% na África Subsaariana simplesmente não conseguem obter
remédios essenciais quando necessitam deles.
“65% das pessoas na Índia
Várias barreiras diferentes excluem as pessoas de receber o cuidado de
saúde apropriado. Conforme está ressaltado no capítulo do DCP2 relativo
a diferenças de gênero (Capítulo 10), essas barreiras podem ser divididas
em barreiras relacionadas a serviços, a clientes ou a instituições e tendem
a afetar as mulheres de forma desproporcional da seguinte maneira:
não conseguem obter remé-
e 47% na África
Subsaariana simplesmente
dios essenciais”
• Fatores de serviços incluem os altos custos de cuidados e transporte, distâncias dos serviços e o tempo necessário para chegar até eles, cuidados
de má qualidade ou inadequados, atitudes negativas do pessoal e diferenças culturais e lingüísticas.
• Fatores de clientes incluem restrições sociais e culturais à mobilidade
das mulheres e a inferioridade de suas rendas e riqueza; as cargas de
tempo maiores para as mulheres devido aos papéis familiares que lhes
são socialmente atribuídos; e as informações limitadas que recebem
sobre suas necessidades e direitos de saúde e sobre a disponibilidade de
serviços.
• Fatores institucionais incluem o controle masculino sobre a formulação
de decisões, os orçamentos e recursos da saúde; percepções locais de
doença; normas locais de tratamento; e estigma e discriminação em
ambientes de saúde.
Embora os detalhes variem, outros capítulos do DCP2 apresentam
uma grande variedade de barreiras que limitam o acesso ao tratamento de
recém-nascidos, profissionais do sexo e várias outras populações desfavorecidas.
Padrões de desigualdade em exposição aos riscos à saúde
As diferenças das condições de saúde também são o resultado de diferentes exposições aos riscos à saúde. Muitas dessas diferenças estão associadas com a pobreza e são apresentadas em diversos capítulos do DCP2,
inclusive os que tratam da água e saneamento (Capítulo 41), tratamento
neonatal (Capítulo 27), desnutrição (Capítulo 28) e poluição do ar em
ambientes internos provocada por fogões (Capítulo 42). Muitos riscos
estão associados a ocupações de risco e fisicamente desgastantes (Capítulo
60). Outros ainda estão associados a condições climáticas e geográficas
particularmente importantes para a malária (Capítulo 21), cegueira do rio
“Muitos riscos estão
associados a condições
climáticas e geográficas
particularmente importantes para a malária,
cegueira do rio, infestações por vermes... e
doenças tropicais.”
Realizações, desafios e prioridades | 11
(Capítulo 50), infestações por vermes (Capítulo 24) e uma grande variedade de doenças tropicais (Capítulos 22 e 23).
Equidade e progresso técnico
“desigualdades em saúde
surgiram, em grande
parte, da adoção e implementação desigual de
intervenções em saúde
associadas com o progresso técnico.”
Como surgem essas desigualdades de condições de saúde, de serviços de
saúde e de exposição ao risco? Muitos fatores desempenham um papel que
varia desde acidentes climáticos ou geográficos até repressão política e
descaso. Apesar do amplo debate sobre alguns aspectos da natureza e origens das desigualdades em saúde, a maioria dos peritos tende a concordar
que essas desigualdades surgiram, em grande parte, da adoção e implementação desigual de intervenções em saúde associadas com o progresso
técnico; ou seja, elas surgiram, basicamente, porque intervenções custoefetivas foram empregadas em alguns lugares e não em outros, ou para
grupos privilegiados e não para outros grupos.
Nos locais onde os frutos do progresso técnico não foram disponibilizados, as pessoas foram deixadas para trás e alguns hiatos se tornaram
ainda maiores. Por exemplo: entre os 12 milhões de mortes infantis analisadas em 1998, quase 4 milhões foram causados por doenças para as
quais existem vacinas eficazes disponíveis. Intervenções custo-efetivas e
relativamente baratas para muitas doenças que podem ser prevenidas com
vacinas, diarréia, pneumonia, TB e malária resultaram em uma redução
da carga dessas doenças para apenas 0,3% do total onde essas intervenções
foram empregadas. Onde essas intervenções não foram implantadas, essas
doenças evitáveis respondem por 11,7% da carga da doença (Tabela 1.2,
Figura 1.2).
Tabela 1.2 Gastos com saúde por nível de renda do país, pública
e privada, 2001
Grupo de países
Despesas com
saúde per capita
(2001 em US$)
Despesas
Despesas públicas
com saúde,
com saúde
% total do PIB percentual do total
Baixa renda
23
4,4
26,3
Renda média
118
6,0
51,1
Alta renda
(países da União
Monetária Européia)
â : âmbito mundial
2.841
10,8
62,1
1.856
9,3
73,5
500
9,8
59,2
Fonte: Banco Mundial 2004, Tabela 2.14
12 Prioridades em Saúde|
Figura 1.2 Principais causas de morte de pessoas de todas as idades, Banco
Mundial, por região
Percentual do total de mortes
70
60
50
40
30
20
10
doenças cardiovasculares
neoplasmas malignos
lesões
Á
aa fric
ria a
na
bs
su
E
sia uro
Ce pa
nt e
ra
l
La
tin A
m
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Ca ca
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Á io e
fri
ca
Su
ld
a
Á
sia
Á
e
Le
st
e
d
Pa a Á
cí sia
fic
o
0
infecções respiratórias
doenças crônicas do pulmão
HIV/AIDS
Fonte: DCP2 2006, capítulo 33, figura 33.1.
UMA AGENDA PARA A AÇÃO
A melhoria geral das condições de saúde no mundo ainda está deteriorada por um excessivo número de casos de negligência ou não-aplicação de
ações de políticas públicas para salvar vidas. O que pode ser feito para corrigir as desigualdades e, ao mesmo tempo, sustentar e aumentar os ganhos
históricos em saúde? O DCP2 aborda esse desafio com as evidências mais
recentes e análise da relação custo-efetividade. Identifica as intervenções e
mudanças políticas específicas com o maior potencial de progresso em
saúde. Essas medidas incluem a aplicação de conhecimento sobre intervenções custo-efetivas em saúde em um maior número de ambientes,
melhorando as políticas e as plataformas que apóiam a prestação de
cuidados de saúde de qualidade e reduzem as barreiras ao acesso, gerando
conhecimento em áreas prioritárias e mobilizando recursos financeiros e
recursos humanos adicionais.
Realizações, desafios e prioridades | 13
“Uma grande carga de
Aplicação do conhecimento para selecionar bem as intervenções
doenças nos países de
O DCP2 apresenta os conhecimentos de que dispomos sobre as intervenções em matéria de saúde que funcionam para uma ampla gama de
doenças, lesões e deficiências em vários contextos diferentes. Uma grande
parcela da carga de doenças nos países de baixa e média rendas é atribuída a doenças para as quais já são conhecidas e já estão disponíveis tratamentos custo-efetivos. É importante selecionar o tratamento correto para
uma determinada doença e um determinado contexto. O DCP2 demonstra de que forma os formuladores de decisão podem usar informações
sobre a relação custo-efetividade juntamente com informações sobre a
prevalência de doenças e enfermidades evitáveis para determinar quais
intervenções devem ser ampliadas e quais devem ser questionadas. Se os
países intensificarem as intervenções e ampliarem os serviços de saúde
custo-efetivos, o impacto sobre a carga de doenças pode ser grande.
baixa e média rendas é
atribuída a doenças para as
quais já são conhecidas e
já estão disponíveis.”
Melhoria dos sistemas de saúde
A melhoria dos sistemas de saúde e a redução de barreiras aos cuidados de
saúde representarão uma melhor implementação de intervenções em
saúde. O DCP2 dispensa grande atenção ao fortalecimento dos sistemas
de saúde porque as intervenções – independentemente do cuidado com
que sejam escolhidas – são quase impossíveis de serem feitas sem esses sistemas. Como ressalta o DCP2 (Capítulo 3, p.85): “Os dados sobre custoefetividade refletem em grande parte o que pode ser obtido com um sistema de saúde que funcione razoavelmente bem. Nesse sentido, pode-se
considerar que eles representam um custo-efetividade potencial e precisam ser complementados com provas e orientação sobre como os sistemas de saúde podem ser reforçados para proporcionar intervenções
com eficácia, eficiência e eqüidade” (grifo acrescentado).
Os sistemas podem ser reforçados, a cobertura pode ser ampliada e a
distribuição igualitária pode ser alcançada de várias formas, tais como o
aumento da infra-estrutura dos serviços, a redução dos custos, a melhoria
da qualidade e o estabelecimento da transparência na alocação de recursos. O aumento da contribuição de populações carentes também é imperativo, pois, como argumenta o DCP2 (Capítulo 3, p.89): “O fortalecimento das estruturas de responsabilização dos sistemas frente às comunidades
e a introdução de mecanismos para garantir que os usuários tenham voz
ativa nos sistemas de saúde locais e possam influenciar as prioridades,
provavelmente são importantes para estimular um bom desempenho.”
14 Prioridades em Saúde|
Definição das prioridades para a pesquisa
Os benefícios das pesquisas em saúde são extremamente elevados, como
demonstram os potenciais ganhos em saúde que podem ser obtidos
empregando-se o conhecimento disponível atualmente.
A alocação de recursos em pesquisa hoje permitirá maiores ganhos em
saúde amanhã, mas esses recursos precisam ser bem direcionados. Uma
área prioritária para a pesquisa é encontrar tratamentos custo-efetivos
para doenças negligenciadas que respondem por uma elevada carga, especialmente entre as populações mal atendidas. Outra área essencial de
pesquisa são todos os aspectos da prestação de cuidados de saúde, ou seja,
o planejamento da maneira mais eficaz e melhor de obter tratamentos
para pessoas que até o momento estiveram excluídas de seus benefícios.
Os atuais desequilíbrios de atenção a doenças e prestação de serviços
incluem as seguintes áreas:
• Desenvolvimento de medicamentos. Das 1.233 novas drogas comercializadas entre 1975 e 1999, somente 13 foram aprovadas especificamente
para doenças tropicais.
• Financiamento de pesquisas. Embora 85% da carga global de deficiência e mortalidade prematura ocorram no mundo em desenvolvimento,
menos de 4% do financiamento global para pesquisa é dedicado aos
distúrbios transmissíveis, maternos, neonatais e nutricionais, que constituem a principal carga de doenças nos países em desenvolvimento.
• Subutilização dos serviços de saúde pelas mulheres. Esse aspecto foi bem
documentado em linhas gerais e para doenças específicas. Por exemplo: embora as mulheres na Índia relatem mais doenças do que homens, os registros dos hospitais demonstram que os homens recebem
mais tratamento. Da mesma forma, na Tailândia os homens têm seis
vezes mais probabilidade de buscar tratamento clínico para a malária,
uma doença que afeta homens e mulheres na mesma proporção
(DCP2, Capítulo 10).
O DCP2 identifica áreas prioritárias para pesquisa em epidemiologia,
intervenções e prestação de serviços de saúde.
Mobilização de recursos adicionais
A preocupação do DCP2 com a relação custo-efetividade é motivada pelo
objetivo de alcançar o maior valor para cada dólar gasto, mas isso não significa que não sejam necessários mais dólares. Um esforço amplo de melhoria da saúde em todo o mundo envolverá custos substanciais.
“Uma área prioritária para
a pesquisa é encontrar
intervenções custo-eficazes para doenças negligenciadas que respondem
por uma elevada carga”
“Na maioria dos países de
baixa renda, os recursos
totais disponíveis para
intervenções em saúde
são nitidamente insuficientes”
Realizações, desafios e prioridades | 15
Na maioria dos países de baixa renda, os recursos totais disponíveis
para intervenções em saúde são nitidamente insuficientes com relação ao
tamanho da carga de doenças e da necessidade de intervenções em saúde.
Os países precisam financiar o mais possível suas próprias intervenções
em saúde, mas para os países de baixa renda, a ajuda externa é, e continuará a ser, uma importante fonte de financiamento. Embora a ajuda para
o desenvolvimento tenha aumentado na última década, inclusive com a
participação de novas fundações privadas e a formação de novas iniciativas globais, as promessas têm sido maiores do que a ação e ainda são
necessários mais compromissos.
Nos países de renda média, os recursos financeiros podem ser menos
restritivos em termos absolutos, mas as intervenções em saúde ainda precisam competir com outros usos dos recursos. Se os recursos existentes
forem mal gastos ou ineficazes, torna-se mais difícil interceder para obter
mais recursos para a saúde quando as decisões sobre a alocação de recursos públicos estiverem sendo formuladas. O DCP2 pode auxiliar nesse
processo ajudando o setor de saúde a tornar-se mais eficaz e eficiente.
COLOCANDO O DCP2 EM PRÁ TICA
A pesquisa, percepção e análise tratadas no DCP2 estabelecem as tendências das principais causas de doença e lesões durante a última década e
têm grande importância para os debates das políticas sobre como responder à carga de doença em todo o mundo e reduzi-la. Os atores da política
de saúde e formuladores de decisão do sistema de saúde, quer no âmbito
de ministérios de saúde nacionais, grandes programas regionais ou programas menores, encontrarão no DCP2 informações atualizadas sobre a
carga de doença, sobre intervenções custo-efetivas e sobre a inter-relação
entre prevenção e tratamento. Juntamente com o próprio conhecimento
de cargas, recursos e capacidades institucionais locais, eles poderão definir
melhor as prioridades e selecionar as intervenções mais adequadas para
implementar em seu contexto. Outros mais preocupados com a gestão e
administração dos sistemas de saúde encontrarão as melhores práticas da
atualidade em prestação de serviços de saúde, recomendações para inovação, formas de melhorar a qualidade e estratégias para superar as limitações do sistema. Aqueles cuja principal preocupação é o financiamento
dos cuidados de saúde, quer estejam no âmbito de ministérios da fazenda
ou envolvidos com assistência internacional, obterão uma valorização do
papel da saúde no crescimento econômico e encontrarão provas do
grande efeito possível para a saúde quando os recursos forem bem aplicados. Os pesquisadores conhecerão as prioridades-chave para seus campos,
16 Prioridades em Saúde|
Box 1.1 Sumário do DCP2 (ver apêndice para obter a lista completa dos
autores)
Parte 1: Resumo e temas transetoriais
A. Resumo
1.
2.
3.
4.
Investimento em Saúde
Custo-efetividade das intervenções: Visão geral das mensagens gerais
Fortalecimento dos sistemas de saúde
Prioridades da pesquisa global e desenvolvimento de intervenções
B. Temas transetoriais
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
Ciência e tecnologia para controle de doenças: Passado, presente e futuro
Prioridades no desenvolvimento de produtos
Abordagens econômicas para a valorização da pesquisa global em saúde
Melhoria da saúde das populações: Lições adquiridas com experiências em todo o mundo
Metas de Desenvolvimento do Milênio para a Saúde: O que será necessário para acelerar o progresso?
Diferenças de gênero em saúde
Políticas fiscais para a promoção da saúde e prevenção de doenças
Financiamento de sistemas de saúde no Século XXI
Tendências recentes e inovações na assistência ao desenvolvimento para a saúde
Questões éticas na alocação de recursos, pesquisa e desenvolvimento de novos produtos
Análise econômica e definição de prioridades
Parte 2: Seleção de intervenções
A. Doenças infecciosas, saúde reprodutiva e desnutrição
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
Tuberculose
Infecções sexualmente transmissíveis
Prevenção e tratamento do HIV/AIDS
Doenças diarrêicas
Doenças que podem ser prevenidas com vacinas
Vencendo a malária
Doenças tropicais 1: Doença de Chagas, lepra, filariose e oncocercose
Doenças tropicais 2: Tripanosomíase africana, dengue e leishmaniose
Infestações por vermes
Infecções respiratórias em crianças
Condições maternas e perinatais
Sobrevivência de recém-nascidos
Baixa estatura, baixo peso e deficiências de micronutrientes
B. Doenças não-transmissíveis e lesões
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
Intervenções em serviços de saúde para câncer nos países em desenvolvimento
Diabete: a pandemia e as possíveis soluções
Distúrbios mentais
Distúrbios neurológicos
Doenças cardiovascular
Doenças hereditárias da hemoglobina
Doenças respiratórias em adultos
(continua na próxima página)
Realizações, desafios e prioridades | 17
Box 1.1 (continuação)
36. Doenças do rim e do aparelho urinário
37. Doenças da pele
38. Doenças e distúrbios orais e craniofaciais
39. Lesões não intencionais
40. Violência interpessoal
C. Fatores de risco
41. Fornecimento de água, saneamento e promoção da higiene
42. Poluição do ar em ambientes internos
43. Poluição do ar e da água: Carga e estratégias de controle
44. Prevenção de doença crônica por meio de dieta e alterações no estilo de vida
45. A crescente carga de risco pela hipertensão arterial, colesterol e obesidade
46. Tabagismo
47. Álcool
48. Abuso ilícito do ópio e derivados
D. Conseqüências das doenças e lesões
49. Deficiências de aprendizado e desenvolvimento
50. Perda da visão e da audição
51. Custo-efetividade de intervenções para condições muscoloesqueléticas
52. Controle da dor para pessoas com câncer e AIDS
Parte 3: Fortalecimento dos sistemas de saúde
A. Fortalecimento dos serviços de saúde pública
53. Vigilância e resposta
54. Informações para a melhoria da formulação de decisões em saúde
55. Resistência a medicamentos
56. Programas de saúde e nutrição comunitária
57. Contracepção
58. Programas de saúde escolar e nutrição
59. Saúde do adolescente
60. Saúde ocupacional
61. Atenuação e alívio de catástrofes
62. Controle e erradicação
63. Gestão integrada da criança doente
B. Fortalecimento dos serviços de saúde privada
64. Cuidados básicos em geral
65. O hospital municipal ou distrital
66. Hospitais de referência
67. Cirurgias
68. Serviços médicos de emergência
69. Medicina complementar e alternativa
C. Fortalecimento da capacidade e reforma da gestão
70. Melhoria da qualidade de cuidados nos países em desenvolvimento
71. Trabalhadores: criação e motivação da força de trabalho
72. Garantia de suprimento de medicamentos e vacinas apropriadas
73. Gestão estratégica dos serviços clínicos
18 Prioridades em Saúde|
enquanto os educadores em saúde pública encontrarão uma ferramenta
de ensino de grande utilidade.
A riqueza de informações e a análise abordada no DCP2 está estruturada em três partes (Box 1.1). A Parte 1 oferece perspectiva, contexto e visão
geral. Expõe as principais mensagens do livro e implicações políticas. O
Capítulo 1, “Investimento em Saúde” oferece as perspectivas históricas,
apresenta argumentos a favor do investimento em saúde e destaca algumas
das novas conclusões do DCP2, tais como a surpreendentemente alta carga
de doenças cardiovasculares nos países em desenvolvimento e a importância dos cuidados durante os primeiros 28 dias de vida para a redução da
mortalidade infantil. O Capítulo 2, “Custo-efetividade das intervenções”
analisa o conjunto de intervenções custo-efetivas para todas as doenças
discutidas no DCP2 e depois identifica as “melhores compras” entre elas.
Juntamente com informações sobre prevalência local de doenças e
capacidade do sistema de saúde, os leitores poderão usar essa análise para
decidir quais são as intervenções mais apropriadas para os próprios contextos. Embora a seleção de intervenções seja fundamental, nenhuma
intervenção alcançará seu objetivo sem bons mecanismos de fornecimento. O Capítulo 3, “Fortalecimento dos Sistemas de Saúde”, portanto, analisa as evidências sobre os sistemas de saúde, identificando aspectos de
melhores práticas e definindo áreas-chave para ampliação da pesquisa e
melhoria da prestação e gestão dos cuidados de saúde. O Capítulo 4,
“Prioridades para a pesquisa global e desenvolvimento de intervenções”,
examina alguns dos atuais hiatos em conhecimento e prioridades urgentes
para mais estudo e progresso.
Esses quatro primeiros capítulos resumidos são seguidos de 11 capítulos que tratam de temas transetoriais, inclusive as Metas de
Desenvolvimento do Milênio (MDMs), saúde das mulheres, êxitos
recentes em saúde pública, ética na alocação de recursos e metodologia
sobre custo-efetividade, bem como uma série de questões financeiras e
econômicas. Esses capítulos oferecem mais contexto demográfico e
econômico e uma discussão geral que informam todos os capítulos subseqüentes sobre doenças específicas, tratamentos e modos de fornecimento,
A Segunda Parte do DCP2 volta-se para doenças específicas, fatores de
risco e seqüelas e a escolha de tratamentos Está subdividida em quatro categorias, sendo a primeira das quais “Doenças infecciosas, saúde reprodutiva e subnutrição”. Seus 13 capítulos contêm discussões sobre HIV/AIDS
(SIDA), TB, malária, diarréia, doenças tropicais e condições maternas e
neonatais. A segunda categoria é “Doenças não-transmissíveis e lesões”,
com 12 capítulos sobre cânceres, diabete, distúrbios psiquiátricos, doenças
cardiovasculares, hemoglobinopatias, lesões intencionais e não-inten-
“Embora a seleção de
intervenções seja fundamental, nenhuma intervenção alcançará seu
objetivo sem bons mecanismos de fornecimento.”
Realizações, desafios e prioridades | 19
cionais. A terceira categoria, “Fatores de risco”, oferece oito capítulos sobre
tópicos como: poluição do ar e da água, saneamento, obesidade e consumo
de tabaco e de álcool. A categoria final, “Conseqüências das doenças e
lesões”, oferece quatro capítulos que tratam de distúrbios do desenvolvimento e sensoriais, deficiências e reabilitação, bem como controle da dor.
Finalmente, a Parte 3 do DCP2 é dedicada aos sistemas de saúde.
“Fortalecimento dos serviços de saúde” é sua primeira categoria, com 11
capítulos que abordam tópicos tais como planejamento familiar, programas de saúde escolar, saúde do adolescente e saúde ocupacional. A segunda categoria, “Fortalecimento dos serviços de saúde individual”, apresenta
seis capítulos sobre cuidados primários em geral, hospitais distritais e de
referência, cirurgia, cuidados de emergência e medicina alternativa. A categoria final chama-se “Fortalecimento da capacidade e reforma da
gestão”, com quatro capítulos dedicados à qualidade dos cuidados, recursos humanos, medicamentos essenciais e gestão de serviços clínicos.
Além de seu volume principal, o Projeto de Prioridades no Controle de
Doenças deu origem a diversas publicações afins. Entre elas figura o
Global Burden of Disease and Risk Factors (Carga global de doenças e
fatores de risco) (Lopez e outros, 2006), que atualiza o estudo sobre carga
global de doenças de 1990. Ao longo dos anos que se passaram desde
aquele primeiro estudo, os métodos para medir a carga de doenças foram
aprimorados, novos conjuntos de dados foram disponibilizados e meios
para analisar os conjuntos de dados existentes foram modificados e
reforçados. O Global Burden of Disease and Risk Factors apresenta esses
novos métodos, conjuntos de dados e análises; compila dados epidemiológicos de mortes e deficiências de 2001, por idade, gênero, causa e
região; e inclui informações sobre exposição a fatores de risco.
O Projeto de Prioridades no Controle de Doenças deu origem também
a uma análise dos êxitos em saúde pública que foi publicada com o título:
Milions Saved: Proven Successes in Global Health (Milhões salvos: êxitos
comprovados em saúde global) (Levine e outros, 2004); a uma edição
especial do American Journal of Tropical Medicine and Hygiene intitulada
The Intolerable Burden of Malaria What's New What's Needed (A carga
intolerável da malária O que é novo o que é necessário) (Breman, Alilio e
Mills, 2004); à série de documentos e série de reedições do Projeto de
Prioridades no Controle de Doenças (para obter a lista completa, visite o
website do Projeto de Prioridades no Controle de Doenças:
http://www.fic.nih.gov/dcpp e consulte este volume).
ESTE VOLUME
Prioridades em Saúde é um volume que acompanha o DCP2. Foi escrito
para facilitar o acesso ao conteúdo substancial do DCP2, para sintetizar
20 Prioridades em Saúde|
alguns dos principais temas e conclusões do DCP2 e para ajudar os
leitores a identificar os capítulos que terão mais importância e relevância
para eles. Por intermédio deste volume complementar, os formuladores
de políticas, profissionais de saúde, acadêmicos e o público interessado
podem conhecer as principais mensagens do DCP2, entender seus principais métodos de análise, avaliar a abrangência das doenças e questões
abordadas e ser avisados sobre os capítulos de interesse imediato. O volume de acompanhamento permitirá acesso a um grande volume de
informações e de análise constantes do DCP2 e facilitará a discussão sobre
o controle de doenças entre colegas de trabalho, com eleitores e com a
comunidade em geral.
O capítulo seguinte demonstra que o sucesso não é apenas possível, mas
tem sido alcançado em todo o mundo em desenvolvimento. Descreve uma
série de êxitos em saúde pública que foram documentados como parte do
Projeto de Prioridades no Controle de Doenças. O Capítulo 2 demonstra
que, apesar da elevada carga de doenças nos países em desenvolvimento, o
êxito é possível e tem sido alcançado, mesmo contra todos os prognósticos,
e também que não existe uma única receita para o sucesso.
O Capítulo 3 descreve a metodologia de custo-efetividade empregada
no DCP2 e explica seus usos, sua interpretação e limitações.
Os Capítulos 4 e 5 fornecem uma atualização sobre certas doenças,
destacando algumas descobertas importantes e estratégias sólidas que
resultaram da análise abrangente do DCP2 sobre a carga global de doenças
e a gama de tratamentos de saúde atualmente disponíveis. O Capítulo 4
analisa doenças como diarréia, precariedade da saúde materna, HIV/AIDS
(SIDA) e malária, responsáveis por grande parte da diferença entre as
condições de saúde das pessoas que vivem no mundo em desenvolvimento e daquelas que vivem no mundo industrializado. Em contrapartida, o
Capítulo 5 trata de doenças para as quais a carga é equilibrada e os desafios
para a melhoria da saúde podem ser semelhantes, como nos casos de
doença cardiovascular, diabete, tabagismo e distúrbios neurológicos.
Os Capítulos 6 e 7 tratam de questões relacionadas com a implementação de tratamentos e prestação de cuidados. O Capítulo 6 aborda especificamente as conclusões do DCP2 com relação aos diferentes níveis de
serviços de saúde e como estes se relacionam entre si; funções específicas
dos serviços de saúde, tais como cirurgias e fornecimento de medicamentos, importantes em todo o sistema de cuidados de saúde; e maneiras pelas
quais os serviços de saúde podem ser integrados para atender às necessidades específicas de determinados subgrupos, tais como crianças em
idade escolar e adolescentes. O Capítulo 7 examina mais profundamente
as quatro dimensões do sistema de cuidados de saúde que são fundamen-
“apesar da elevada carga
de doenças nos países em
desenvolvimento, o êxito
é possível e tem sido
alcançado, mesmo contra
todos os prognósticos”
“os desafios para a melhoria da saúde podem ser
semelhantes, como nos
casos de doença cardiovascular, diabetes, tabagismo, e distúrbios neurológicos.”
Realizações, desafios e prioridades | 21
tais para torná-lo eficaz: a geração e uso das informações; gerenciamento
de serviços para garantir a boa qualidade; treinamento e distribuição de
pessoal de cuidados de saúde qualificado; e mobilização e alocação de
recursos financeiros.
O Capítulo 8 insta a comunidade global a adotar as estratégias e prioridades identificadas no DCP2 para que o progresso da saúde para todos
possa continuar.
22 Prioridades em Saúde|
Capítulo 2
Êxito no tratamento das prioridades
Numa visão mais abrangente, as prioridades em saúde são claras: identificar as intervenções custo-efetivas para as doenças que impõem as
maiores cargas – em todo o mundo ou em certas regiões, ou em populações que apresentam grave necessidade ou desigualdade – e determinar
de que modo efetuar essas intervenções de forma eficaz, eficiente e igualitária. A ciência e a medicina têm demonstrado que há muitas intervenções que podem ser eficazes. A associação desse conhecimento com as
análises econômicas de custo-efetividade identifica as intervenções
capazes de alcançar os maiores ganhos em saúde com um determinado
nível de recursos. Para transformar esses ganhos em saúde em realidade é
necessária a implementação de determinadas intervenções – um desafio
que os países com sistemas de saúde eficazes têm mais capacidade para
administrar. Já os países que não dispõem de sistemas eficazes precisam
melhorar seus próprios sistemas ou criá-los onde eles não existirem.
Portanto, embora seja relativamente fácil definir as prioridades em
saúde, é muito mais difícil tratá-las, mas não impossível. Na realidade, os
investigadores têm documentado cuidadosamente diversos êxitos recentes
em saúde pública na busca de ensinamentos que possibilitem outros
sucessos.
O What Works? Working Group (Grupo de trabalho “O que funciona?”)
reunido pela Center for Global Development’s Global Health Policy Research
Network (Rede de pesquisa em política de saúde global do Centro de
Desenvolvimento Global), colheu indicações dos autores do DCP2 sobre
intervenções em saúde pública que obtiveram êxito (Levine e outros,
2004). O grupo de trabalho examinou as indicações e identificou 17 casos
que atendiam a 5 critérios explícitos:
• Foram implementados em escala significativa: nacional, regional ou
local.
23
• Tratavam de um problema de grande importância para a saúde pública medido por anos de vida ajustados à deficiência (AVAD).
• Tinham pelo menos cinco anos de duração
• Ficou provado que eles eram custo-efetivos, com custo inferior a cerca
de US$100 por AVAD evitado.
• Documentavam provas de um efeito claro e mensurável sobre os resultados em saúde, não apenas taxas de cobertura ou indicadores de
processos.
As histórias que estavam por trás desses 17 casos foram então
pesquisadas e publicadas em Millions Saved: Proven Successes in Global
Health (Milhões salvos: êxitos comprovados em saúde global) (Levine e
outros, 2004). O Capítulo 8 do DCP2 apresenta um resumo desses casos e
oferece percepções adicionais sobre esses êxitos em saúde pública, inclusive alguns dos fatores que ajudaram a tornar o êxito possível (Box 2.1).
Os 17 casos que resultaram do processo de seleção não são os únicos
sucessos em saúde pública, nem são necessariamente representativos de
êxitos em saúde pública nas últimas décadas1, mas a coleção é um verdadeiro tesouro para os interessados em saúde pública. Todos os casos
foram cuidadosamente analisados com relação aos ensinamentos sobre
liderança, financiamento, colaboração, estratégias, função do setor público, restrições e muito mais.
Uma mensagem importante para a formulação de políticas que emerge
desse conjunto de casos é que o êxito pode surgir de várias formas. Os
países obtiveram êxitos nos mais desanimadores contextos institucionais
e ambientes de políticas; contra doenças dos mais variados tipos, tanto
infecciosas quanto não-transmissíveis; e com diversos métodos de intervenção diferentes, inclusive baseados no fornecimento de produtos (como
vacinas, por exemplo), prestação de serviços (tais como cuidados prénatais ou cirurgias simples), promovendo a mudança de comportamento
(como o uso de preservativos, filtragem da água, ou prática de boa
higiene), ou por meio da redução dos riscos ambientais (por exemplo,
pulverizando larvicidas ou construindo latrinas). Alguns elementos-chave
aparecem com freqüência, como liderança política, inovação tecnológica,
consenso de especialistas com relação à abordagem, uso eficaz da informação e recursos financeiros públicos suficientes. Além disso, alguns tipos
de desafios podem ser mais fáceis de vencer do que outros, mas nenhum
1
Na verdade, os autores do DCP2 indicaram outras 26 intervenções como exemplos claros de
êxito em saúde pública, mas elas tiveram que ser descartadas devido à falta de evidências formais com relação a seus efeitos sobre a saúde. Assim, a ausência de outros casos em Levine e
outros (2004) pode estar mais relacionada às deficiências inerentes às atuais práticas de avaliação do que à ausência de realizações em saúde pública.
24 | Prioridades em Saúde|
Box 2.1 Programas bem-sucedidos em todo o mundo
Além dos seis casos selecionados para serem apresentados no texto, outros êxitos em
saúde pública apresentados no DCP2 (Capítulo 8) incluem o seguinte:
• Melhoria da saúde entre crianças e adultos. Em 1997, o governo mexicano lançou um
projeto de novo programa de bem-estar social para ajudar a tirar as famílias de baixa
renda da pobreza por meio de pagamentos em dinheiro em troca por sua participação em
programas nutricionais e de complementação, uso de serviços de cuidados de saúde preventiva e básica e freqüência escolar das crianças. Ao término de cinco anos, as crianças
das famílias que participaram do programa tinham 12% menos de probabilidade de contrair doenças do que aquelas das famílias que não participaram e suas condições nutricionais haviam melhorado. A saúde dos adultos também havia melhorado.
• Controle da doença de Chagas. Em 1991, sete países – Argentina, Bolívia, Brasil,
Paraguai, Uruguai e, mais tarde, o Peru – somaram forças como parte da Iniciativa da
Organização Panamericana de Saúde para os países do Cone Sul com o objetivo de combater a doença de Chagas por intermédio de uma associação de atividades de vigilância,
pulverização de casa em casa e outros métodos de controle de vetores. Em 2000, a
incidência da doença havia caído em 94% e em 2001, sua transmissão havia sido interrompida no Chile, Uruguai e em grandes áreas do Brasil e do Paraguai.
• Tratamento anti-diarreico. No Egito, o governo lançou um programa nacional no início
da década de 1980 para promover o uso de sais de reidratação oral pelas mães, fabricados localmente por meio de uma estratégia em quatro partes que incluiu: adaptar o projeto e a marca do produto para acomodar preferências e costumes locais; fortalecer
canais de produção e distribuição, públicos e privados; treinar profissionais de saúde; e
engajar-se em marketing social e em campanhas de comunicação de massa. Entre 1982 e
1987, a mortalidade de recém-nascidos e crianças caiu em 36% e 43%, respectivamente.
A mortalidade atribuída à diarréia caiu em 82% entre recém-nascidos e 62% entre
crianças.
• Controle do verme da guiné. Vinte países na Ásia e África subsaariana iniciaram
uma campanha global para erradicar o verme da guiné em meados da década de 1980.
Liderada pelo Carter Center, Fundo das Nações Unidas para a Infância, os Centros de
Controle e Prevenção de Doenças dos EUA e a Organização Mundial de Saúde, a
campanha promoveu maior segurança da água por meio da construção de poços
profundos, controle ambiental e o uso de filtros de pano para a água potável, programas
de educação em saúde e gestão, contenção e vigilância de casos. Antes de 1998, foram
prevenidos entre 9 e 13 milhões de casos de verme da guiné e a prevalência global caiu
em 99%.
• Planejamento familiar. Desde a década de 1970, Bangladesh promove o planejamento
familiar por meio de um programa de extensão porta-a-porta conduzido por mulheres
jovens casadas que fornecem informações sobre limitação do tamanho da família ou
maiores intervalos entre as gravidezes e produtos pertinentes. O programa é acompanhado por uma ampla campanha na mídia. O uso de contraceptivos entre mulheres
casadas em Bangladesh é hoje de aproximadamente 50%, em comparação com apenas
8% em meados da década de 1970 e o número médio de crianças por família é de 3,3,
abaixo dos 7,0 durante o mesmo período.
• Prevenção de HIV/AIDS. A Tailândia lançou o Programa 100% de Uso de Preservativos
em 1991 para enfrentar a crescente incidência de HIV/AIDS. O programa forneceu
caixas de preservativos para bordéis gratuitamente, exigiu o uso de preservativos entre
“Entre 1982 e 1987, a
mortalidade de recémnascidos e crianças caiu
em 36% e 43%, respectivamente. A mortalidade
atribuída à diarréia caiu
82% entre os recémnascidos e 62% entre as
crianças.”
“Em 1998, entre
9 milhões e 13 milhões de
casos de verme da guiné
já haviam sido evitados e
a prevalência global havia
caído em 99,%.”
(continua na próxima página)
Êxito no tratamento das prioridades | 25
“Os casos de sarampo
Box 2.1 (continuação)
relatados anualmente
caíram de 60.000 em
1996 para 117 em 2000.”
•
•
•
•
“Entre 1990 e 1998,
a Polônia obteve uma
redução de 30% no
câncer de pulmão em
homens com idade entre
20 e 44 anos, queda de
quase 7% em DCV e uma
redução no número de
bebês nascidos abaixo do
peso.”
26 | Prioridades em Saúde|
•
os profissionais do sexo e ameaçou os bordéis com penalidades e fechamento pelo nãocumprimento. O uso de preservativos em bordéis aumentou de 14% em 1989 para mais
de 90% antes de 1992. O número de novas infecções sexualmente transmissíveis caiu
de 200.000 em 1989 para 15.000 em 2001 e a taxa de novas infecções por HIV passou a
ser cinco vezes menor entre 1991 e 1993-1995.
Eliminação do sarampo. Em 1996, os sete países do sul da África fizeram um acordo
sobre uma estratégia de imunização coordenada, apoiada pela melhoria da vigilância e
da capacidade laboratorial, para eliminar o sarampo incluindo-o na rotina de imunização
de todos os bebês de nove meses de idade e organizando campanhas nacionais de
recuperação e de continuidade para crianças entre nove meses e 14 anos. O número de
casos de sarampo relatados anualmente na região caiu de 60.000 em 1998 para 117 em
2000. O número de mortes atribuídas ao sarampo caiu de 166 para nenhuma durante o
mesmo período.
Fluoretação do sal. Na Jamaica, um acordo formal entre o Ministério da Saúde e o único
produtor de sal do país lançou a fluoretação do sal em 1987 para prevenir cáries. Em
1995, a prevalência de cáries em crianças entre as idades de 6 e 12 anos já havia caído
mais que 80%.
Iodação do sal. Em 1993, a China lançou o Programa Nacional de Eliminação de
Distúrbios por Deficiência de Iodo. O governo exigiu que os produtores acrescentassem
iodo ao sal e aumentou sua capacidade de monitoramento e de fazer cumprir essa
exigência para garantir o cumprimento. As taxas totais de bócio em crianças entre 8 e
10 anos caíram de 20,4% em 1995 para 8,8% em 1999.
Controle do tabagismo. A Polônia aprovou uma legislação revolucionária em 1995,
impondo rótulos agressivos de avisos nos pacotes de cigarros, banindo o fumo dos
locais de trabalho fechados e proibindo a venda de tabaco a menores. A África do Sul
aprovou uma legislação semelhante em 1999 para fortalecer o imposto anteriormente
aplicado de 50% sobre o valor do preço do cigarro no varejo. Entre 1990 e 1998, a
Polônia desfrutou de uma queda de 30% no câncer de pulmão entre homens com idade
de 20 a 44 anos, uma queda de quase 7% em DCV e um declínio do número de bebês
com baixo peso ao nascer. Na década de 1990, a África do Sul testemunhou uma
redução de 30% no consumo de cigarro, especialmente entre os jovens e os pobres.
Controle da tuberculose. Em 1991, a China lançou um programa de 10 anos em 13 das
suas 31 províncias no continente para aplicar a estratégia do DOTS para o controle da
tuberculose. O Peru, anteriormente um dos 23 países com alta carga que juntos
respondem por 80% dos novos casos de tuberculose (TB) a cada ano, lançou um esforço
semelhante no mesmo ano. Dois anos após o início do programa, a China havia alcançado uma taxa de cura de 95% para os casos novos e taxa de cura de 90% para aqueles
pacientes cujo tratamento não havia produzido êxito anteriormente Entre 1999 e 2000,
o número de pessoas nessas províncias com TB caiu em mais de 37%. No Peru, o programa DOTS alcançou uma taxa de detecção de casos de 70% e uma taxa percentual
de cura de 85%. Consequentemente, a incidência da doença caiu 6% ao ano.
Fonte: Adaptado do DCP-2 Capítulo 8.
ingrediente por si só é suficiente, nem existe uma única combinação que
assegure o êxito. Não obstante, essas histórias transmitem a mensagem de
que o êxito é possível, está demonstrado e é diversificado.
A grande diversidade de abordagens adotadas para a melhoria da saúde
apresentadas no DCP2, reforçam esse ponto. O DCP2 não oferece uma
única receita para a melhoria da saúde, mas avalia as várias estratégias de
intervenção e implementação que funcionaram em diferentes lugares.
Este capítulo apresenta apenas algumas dessas histórias de sucesso em
saúde pública, escolhidas para ilustrar as mensagens importantes do
DCP2 sobre a relação entre escolher intervenções custo-efetivas e fornecêlas com eficácia. Especificamente, esses casos:
• obtiveram êxito apesar da precariedade, ou mesmo ausência, de sistemas de saúde (erradicação da varíola)
• foram conduzidos de tal modo que fortaleceram sistemas de saúde
frágeis (controle da oncocercose [cegueira do rio] e pólio)
• foram direcionados especificamente para a criação de um sistema de
saúde (melhoria da saúde materna)
• ampliaram sistemas de saúde existentes (vacinação contra o
Haemophilus influenzae tipo B [Hib])
• Ultrapassaram os limites dos sistemas de saúde (controle do tracoma).
“Países obtiveram importantes êxitos em saúde
pública, mesmo em
condições de extrema
pobreza, infra-estrutura de
cuidados de saúde frágil
ou inexistente e agitação
política ou guerra.”
ÊXITOS APESAR DE SISTEMAS DE SAÚDE PRECÁRIOS
Os países implementaram intervenções custo-efetivas e obtiveram importantes êxitos em saúde pública, mesmo em condições de extrema pobreza,
infra-estrutura de cuidados de saúde frágil ou inexistente e agitação
política ou guerra. Consideremos a erradicação da varíola em todo o
mundo. Em 1980, a Assembléia Mundial da Saúde declarou que a varíola,
que é conhecida pelo menos desde 1160 a. C., foi a primeira doença na
história a ser erradicada. Essa erradicação foi obtida por meio de uma
campanha mundial que alcançou até as áreas rurais mais distantes dos
países mais pobres do mundo, países devastados pela guerra e países cujos
sistemas de saúde eram precários.
Certas características peculiares da varíola moldaram a estratégia e
influenciaram o êxito da erradicação. A doença era transmitida diretamente de uma pessoa a outra, sem outros hospedeiros ou vetores, e era
relativamente fácil de identificar. Após contrair a varíola, um indivíduo
levava de 10 a 14 dias para tornar-se contagiante, mas antes disso, já ficava acamado, reduzindo assim o contato com outras pessoas. Aqueles que
“a varíola, que é conhecida pelo menos desde
1160 a. C., foi a primeira
doença na história a ser
erradicada.”
Êxito no tratamento das prioridades | 27
sobreviviam à doença, ou eram adequadamente vacinados, ficavam imunizados pelo resto de suas vidas. Portanto, as próprias características da
doença tornaram possível sua erradicação.
Os avanços tecnológicos que foram essenciais para combater a doença
incluíram não apenas a vacina contra a varíola propriamente dita, mas
também a agulha bifurcada, que reduziu os custos e facilitou a vacinação
das pessoas. A liderança sustentada e os recursos financeiros também
foram cruciais para a campanha de erradicação, mas não foram disponibilizados imediatamente. Inicialmente proposta em 1958, a campanha
para erradicar a varíola só teve início realmente em 1967, devido a alterações imprevistas na liderança e no quadro de pessoal da Organização
Mundial de Saúde (OMS) e decisões dos Estados Unidos de comprometer
recursos substanciais para a campanha.
Outro ponto decisivo foi a mudança da estratégia de vacinação generalizada de populações inteiras para uma estratégia de vigilância e bloqueio. Essa chamada estratégia “de anel” envolveu vigilância epidemiológica muito apurada, bloqueio seletivo e vacinação de pacientes e comunidades em resposta a surtos específicos. Essa estratégia foi crucial para a
eliminação dos últimos reservatórios de varíola que restaram em cinco
países – Bangladesh, Etiópia, Índia, Nepal e Paquistão – mesmo quando
um ou mais desses países estavam em crise, em guerra ou agitação civil,
ou estavam enfrentando grandes fluxos de refugiados ou extrema pobreza.
A campanha contra a varíola desenvolveu uma estratégia de intervenção independente da existência ou não de sistemas de saúde e infraestrutura em alguns dos países e alcançou seu objetivo. Uma doença que,
no início da campanha, havia sido responsável por milhões de casos e
entre 1,5 e 2 milhões de mortes por ano, e que deixou muitos sobreviventes com profundas cicatrizes ou cegos, três décadas mais tarde havia
deixado de existir.
ÊXITOS QUE FORTALECERAM SISTEMAS DE SAÚDE PRECÁRIOS
Os países alcançaram outras intervenções bem-sucedidas em saúde pública em contextos de sistemas de saúde precários e implementaram-nas de
tal forma que também fortaleceram seus próprios sistemas de saúde. O
controle da oncocercose na África subsaariana e a eliminação da pólio na
América Latina e Caribe são dois exemplos desse processo.
Aproximadamente 18 milhões de pessoas vivem em áreas onde a oncocercose é endêmica, 99% delas na África subsaariana (DCP2, Capítulo 22).
A doença é causada por um verme microscópico que infecta os humanos
28 | Prioridades em Saúde|
por meio da picada da mosca negra que se reproduz nos rios caudalosos.
A vítima acaba por ficar infestada de vermes, o que ocasiona uma série de
sintomas debilitantes, inclusive a cegueira. Em áreas endêmicas, mais de
um terço da população adulta pode ficar cega e a infecção frequentemente
atinge 90% da população. Por causa do medo da doença, as pessoas abandonaram extensas áreas de terras férteis nas margens dos rios.
Esforços de controle, que foram lançados em 1974, incluíram pulverização aérea semanal dos locais de reprodução para matar a mosca negra,
que dissemina a doença, e a distribuição de um novo medicamento ivermectin, que destrói os vermes nos seres humanos. O impacto foi imenso.
As principais características do esforço incluíram a colaboração de muitas
organizações e órgãos governamentais, parcerias público-privadas com o
fabricante do ivermectin e financiamento de longo prazo. Os êxitos iniciais deram origem a compromissos subseqüentes e maiores, de tal modo
que de 1974 a 2002, os esforços de controle impediram a transmissão em
11 países da África Ocidental, evitaram 600.000 casos de cegueira, permitiram que 18 milhões de crianças nascessem livres do risco da cegueira do
rio e restituíram cerca de 25 milhões de hectares de terras aráveis e seguras
para reassentamento e cultivo. Os esforços de controle alcançaram esse
êxito apesar da extrema pobreza desses países, a dispersão das populações
em aldeias distantes, os inadequados sistemas de saúde dos países, escassez
de profissionais de saúde e o imperativo de manter as atividades (inclusive
a pulverização aérea semanal ininterrupta do larvicida) a despeito dos
conflitos civis e regionais e golpes de estado.
Os programas de seguimento enfatizaram a sustentabilidade de longo
prazo, porque para destruir todos os vermes é necessário tratamento anual
com o medicamento durante 15 a 20 anos e, para esse fim, lançaram um
sistema de tratamento conduzido pela comunidade. Por meio dessa estrutura, milhares de comunidades organizam e administram o tratamento de
ivermectin localmente. Em algumas áreas os coordenadores do programa
de distribuição do ivermectin são os únicos profissionais de saúde que vão
a todas as aldeias. Na verdade, algumas pessoas sugerem que embora a
estrutura de tratamento conduzido pela comunidade tenha sido originariamente criado para controle da oncocercose, ela poderia ser a espinha
dorsal dos sistemas de saúde e ser utilizada para a distribuição de vitamina A, azitromicina (para tratar o tracoma), albendazol (para o tratamento
da filariose linfática) e mesmo vacinas e medicamentos contra HIV/AIDS.
Assim, “o impacto do bem-sucedido sistema ComDT [tratamento conduzido pela comunidade] transcende o tratamento e prevenção da
cegueira do rio. O sistema oferece uma valiosa porta de entrada para outras intervenções em saúde conduzidas pela comunidade em comunidades
De 1974 a 2002, os
esforços de controle... evitaram 600.000 casos de
cegueira, permitiram que
18 milhões de crianças
nascessem livres do risco
da cegueira do rio e restituíram cerca de 25 milhões de hectares...
seguras para reassentamento e cultivo.
“ Recentemente, em 1988,
125 países eram endêmicos para a pólio. Até o
final de 2003, apenas seis
países relataram casos de
pólio”
Êxito no tratamento das prioridades | 29
“A campanha da pólio
deixou uma herança
duradoura para os sistemas de saúde da
América Latina e Caribe.”
30 | Prioridades em Saúde|
negligenciadas, com pouco ou nenhum acesso aos serviços de saúde tradicionais, e um veículo para o fortalecimento do sistema de saúde como um
todo nos países em desenvolvimento.” (Levine e outros, 2004, p.62).
A eliminação da pólio na América Latina e Caribe oferece alguns exemplos semelhantes. Recentemente, em 1988, 125 países eram endêmicos para
a pólio (DCP2 Capítulos 20 e 62). No final de 2003, graças à intensa e bem
direcionada campanha de vacinação e vigilância, apenas seis países
relataram casos de pólio e nenhum deles estava situado na América Latina
e Caribe.
A eliminação da pólio enfrenta desafios específicos devido à natureza
da doença. O vírus causador é extremamente contagioso e, embora seja
geralmente transmitido por contato fecal-oral, pode sobreviver por dois
meses fora do corpo, residindo em reservatórios de água, água potável, alimentos e vestuário. A transmissão pode não ser detectada porque 90% ou
mais dos portadores não desenvolvem sintomas. Quando se desenvolvem,
os sintomas nem sempre podem ser reconhecidos como pólio. Com efeito,
um caso evidente e confirmado de paralisia por pólio significa que existem na comunidade outros 2.000 a 3.000 portadores comunicantes cujo
único sinal de infecção pode ser uma febre (Levine e outros, 2004, p. 40).
A eliminação de tal doença é desafiadora, mesmo onde os sistemas de
saúde são sólidos.
Com a inclusão da vacina oral anti-pólio no Programa Ampliado de
Imunização de 1977, o êxito dos primeiros esforços na América Latina
foram impressionantes. Em 1981, a incidência de pólio na região havia
caído à metade e o número de países que relataram casos de pólio tinha
diminuído de 19 para 11. Em 1984, a cobertura com a vacina havia
alcançado 80%. Essa melhoria incentivou a Organização Pan-americana
de Saúde a montar uma campanha geral para eliminar a pólio da região.
Lançada em 1985, a campanha tinha uma característica notável – a
coordenação entre organizações públicas e privadas internacionais,
nacionais e regionais. Essa coalizão sem precedentes buscava uma estratégia para fortalecer a vigilância de modo que os profissionais de saúde
pudessem identificar, rapidamente responder e bloquear quaisquer surtos. Reforçava também a cobertura da imunização da pólio de modo que,
mesmo países com infra-estruturas de saúde menos sólidas e programas
de imunização de rotina frágeis, puderam obter resultados impressionantes. Essa intervenção foi feita utilizando-se métodos como dias
nacionais de vacinação, que ocorriam duas vezes por ano, em que as crianças com menos de cinco anos eram inoculadas, independentemente de
terem sido vacinadas anteriormente ou não.
A campanha da pólio deixou uma herança duradoura para os sistemas
de saúde da América Latina e Caribe ao enfrentar a doença de tal forma
que a campanha tornou-se “o ponto de partida para o fortalecimento de
todo o Programa Ampliado de Imunização: para a melhoria da infraestrutura de saúde em toda a região e para a criação de um sistema de vigilância, tão necessário para o monitoramento do impacto das intervenções sobre a redução da pólio e outras doenças” (Levine e outros, 2004,
p. 41). Além de melhorar a infra-estrutura e aumentar a capacidade de
controle da doença, a campanha da pólio também formulou a capacidade
de planejamento nacional de saúde, de modo que os países estão agora
adaptando o processo de desenvolvimento de planos de ação anuais da
campanha da pólio para outras iniciativas, inclusive a melhoria e ampliação dos serviços de saúde materno-infantil.
INTERVENÇÕES CUSTO-EFETIVAS DESTINADAS À CRIAÇÃO
DE SERVIÇOS DE SAÚDE
As vacinas impedirão algumas doenças e os larvicidas eliminarão alguns
vetores, mas essas abordagens não têm nenhuma ligação com os cuidados
pré-natais e partos. Para a obtenção de bons resultados nessas questões, é
crucial um sistema de saúde que funcione, com acesso igualitário. A experiência do Sri Lanka demonstra de que modo isso pode ser alcançado.
A gravidez e o parto são eventos naturais e geralmente exigem pouca
ou nenhuma intervenção médica para a mãe ou para o bebê (DCP2,
Capítulo 26). Contudo, se uma mulher tiver saúde precária por causa de,
digamos, má nutrição, malária, imuno-deficiência, TB, ou doença cardíaca, ela pode enfrentar sérios riscos durante a gravidez e o parto. A redução
da mortalidade materna e de recém-nascidos requer medidas preventivas,
tais como nutrição adequada e investigação de possíveis riscos. Requer
também um ambiente higiênico para o parto e puerpério, cuidado eficaz
em caso de emergências, tais como obstruções durante o parto ou hemorragias. Os abortos feitos sem segurança são outro importante fator de
risco para a saúde das mulheres. Nos locais onde os sistemas de saúde são
precários e, conseqüentemente, as populações não contam com o cuidado
apropriado, uma proporção muito maior de gestações pode resultar em
complicações, doenças, deficiências permanentes, ou morte da mãe ou do
bebê. Millions Saved ressalta que “as intervenções destinadas a detectar
problemas de saúde relacionados com a gravidez antes que eles se tornem
uma ameaça para a saúde; e a administrar importantes complicações,
quando ocorrem, são bem conhecidas e exigem relativamente pouco na
“...se uma mulher tiver
saúde precária por causa
de, digamos, má nutrição,
malária, imuno-deficiência,
TB, ou doença cardíaca,
ela pode enfrentar sérios
riscos durante a gravidez e
o parto.”
Êxito no tratamento das prioridades | 31
“Na década de 1950, as
estimativas indicavam que
a taxa de mortalidade
maternal do Sri Lanka era
500 a 600 para cada
100.000 nascidos vivos.
Em 2003 essa taxa já
havia despencado para 60.”
“O êxito do Sri Lanka está
relacionado especificamente à saúde materna,
mas ele não teria sido
alcançado sem a construção de um sistema de
saúde geral robusto e
eqüitativo.”
32 | Prioridades em Saúde|
utilização de tecnologia avançada, O que é necessário, contudo, é um sistema de saúde organizado e acessível – física, financeira e culturalmente –
para que as mulheres dêem à luz em ambiente de higiene; aquelas que corram um risco particularmente alto de apresentar complicações sejam
identificadas precocemente, e que a ajuda esteja disponível para responder às emergências quando elas ocorrerem (Levine e outros, 2004, p. 48).
Não obstante sua pobreza, é isso que o Sri Lanka tem oferecido. Na
década de 1950, as estimativas indicavam que a taxa de mortalidade
maternal do Sri Lanka era 500 a 600 para cada 100.000 nascidos vivos. Em
2003 essa taxa já havia despencado para 60 e profissionais de saúde qualificados estavam assistindo 97% dos nascimentos. Esse foi o resultado de
esforços contínuos e dedicados por parte do governo para ampliar os
serviços de saúde, inclusive cuidados essenciais de saúde materna, com
equidade. O Sri Lanka vem buscando alcançar seu objetivo de criar um
sistema acessível para todos de várias formas diferentes: colocou intencionalmente recursos nas áreas rurais, tornou os cuidados universalmente
gratuitos, forneceu redes de transporte e fortaleceu os sistemas de referência. No desenvolvimento de recursos humanos, tem dedicado atenção
especial ao trabalho de parteiras. Outros atributos básicos do sistema do
Sri Lanka foram: o bom uso das informações para o monitoramento e
planejamento, a melhoria da qualidade dos cuidados e a priorização das
populações desassistidas.
A estratégia passo a passo do país para fornecer acesso amplo a serviços
clínicos específicos, estimular o uso desses serviços e melhorar sistematicamente a qualidade foi facilitada por seu excelente sistema de registro
civil e reforçada por um bom sistema educacional, notório por sua
equidade de gênero (89% das mulheres do Sri Lanka são alfabetizadas, em
comparação com a média do Sul da Ásia de 43%). Ademais, sua dedicação
ao fornecimento de serviços sociais para todos tem sido sustentada e é
anterior a sua independência, em 1948.
O Sri Lanka sempre foi, e continua a ser, um país pobre. Alcançou seu
desempenho exemplar em saúde materna não apenas sem importantes
inovações tecnológicas, mas também sem gastos elevados. Na verdade,
realizou tudo isso com um orçamento espartano. Em números absolutos,
os gastos nacionais em saúde materna na década de 1990 foram quase
iguais aos da década de 1950, mas o crescimento da receita entre esses dois
períodos significou que a sua participação no produto interno bruto
(PIB) caiu de 0,28 para 0,16%. Além disso, o financiamento foi em sua
maior parte interno, vindo de receitas do governo. Millions Saved sugere
que “outros podem inspirar-se no desempenho do país: No final da década de 1950, quando foram feitos os primeiros esforços para tratar do
problema de mortes maternas, o PNB [produto nacional bruto] do Sri
Lanka era equivalente, em dólares atuais, ao atual produto interno bruto
de Bangladesh, Uganda, ou Mali e muito inferior ao do Paquistão, Egito
ou Filipinas. Em termos relativos, o Sri Lanka gasta muito menos em
saúde – e obtém resultados muito melhores – do que qualquer um desses
países” (Levine e outros 2004, p. 54).
O êxito do Sri Lanka está relacionado especificamente à saúde materna, mas ele não teria sido alcançado sem a construção de um sistema de
saúde geral robusto e eqüitativo.
INTERVENÇÕES CUSTO-EFETIVAS QUE DESENVOLVERAM OS
SISTEMAS DE SAÚDE EXISTENTES
Mesmo nos países que possuem sistemas de saúde fortes e que funcionam,
surgem necessidades específicas de novas iniciativas, talvez por causa de
uma nova doença, uma grande desigualdade, um problema persistente, ou
uma necessidade de melhoria em geral. As soluções podem vir do próprio
sistema de saúde, especialmente se esse sistema estiver aberto a idéias,
realiza pesquisa e busca formas de melhorar seu desempenho e a saúde da
população. A vacinação contra o Haemophilus influenzae tipo B (Hib) no
Chile tem uma história como essas (DCP2, Capítulo 20).
As doenças causadas por Haemophilus B, incluem a meningite por Hib,
que é particularmente letal, matando de 20 a 40% das crianças que contraem a doença e um número menor de adultos, deixando metade dos
sobreviventes com deficiências permanentes, tais como surdez ou retardo
mental. Em todo o mundo, as doenças causadas por Hib são a principal
causa da meningite por bactéria em crianças com menos de cinco anos e
a segunda causa mais comum de mortes por pneumonia bacteriana nesse
grupo etário. Estima-se que 450.000 crianças morram de doenças causadas por Hib a cada ano. Uma vacina conjugada contra Hib altamente
eficaz e de preço relativamente alto está disponível no mercado desde o
final da década de 1980.
O Chile é um país de renda média com infra-estrutura de saúde moderna e serviços de imunização eficientes, onde 95% dos bebês recebem
vacinas de rotina. No final da década de 1980, pesquisadores do Ministério
da Saúde assumiram a responsabilidade de fazer as primeiras estimativas
sobre a incidência de Hib na área de Santiago. Até aquele momento, não
havia informações disponíveis sobre a extensão da doença no Chile. Os
pesquisadores analisaram os registros clínicos e de laboratório; estabeleceram a correspondência entre os dados e os registros do censo; e avaliaram
a qualidade dos dados, inclusive a probabilidade de eles subestimarem a
Êxito no tratamento das prioridades | 33
“..a combinação das vacinas contra difteriacoqueluche-tétano e contra Hib e sua distribuição
no sistema estabelecido
no Chile era viável”
“A incidência de menin-
verdadeira extensão da doença. Concluíram que o Hib era um problema
muito difundido, com elevada taxa de mortalidade no Chile.
Embora houvesse vacinas Hib disponíveis, seu preço era elevado e,
apesar de sua comprovada eficácia (seu efeito biológico protetor), havia
menos evidência de sua efetividade (impacto sobre uma grande população de bebês que recebia a vacina em condições normais de um serviço
de imunização de rotina). Portanto, o Ministério da Saúde planejou e
conduziu um estudo de cobertura vacinal, testando uma combinação da
vacina contra Hib com a usual vacina contra difteria-coqueluche-tétano,
administrada em 36 centros de saúde na área de Santiago, e comparou o
resultado com o de 35 centros que não ofereciam a vacina contra Hib.
Os resultados desse programa piloto foram extraordinários. O estudo
demonstrou não só que a vacina contra Hib era eficaz, mas também que a
combinação das vacinas contra difteria-coqueluche-tétano e contra Hib e
sua distribuição no sistema estabelecido no Chile era viável para os centros
de saúde. Em conseqüência disso, em julho de 1996, o Ministério da Saúde
introduziu a vacina no programa de imunização de rotina para bebês de
todo o país. A incidência de meningite causada por Hib no Chile caiu em
91% e a da pneumonia e outras doenças causadas por Hib caiu em 80%.
Embora o custo da vacina fosse inicialmente elevado, o governo
chileno financiou-a inteiramente com recursos públicos de impostos em
geral. Desde então o preço caiu de cerca de US$15 por dose em 1996 para
cerca de US$3 em 2003. Em 1998, os pesquisadores concluíram que a
nação economiza US$78 com cada caso de Hib que é evitado, fornecendo
mais provas a favor dos gastos públicos, que continuam.
Entre as razões do êxito do Chile estão a força da pesquisa existente e a
capacidade de agir sobre os resultados. O fato de já existir um sistema de
prestação de serviços, com um programa de vacinação de rotina que atendia 95% dos bebês, também foi fundamental. Em outras palavras, o programa de vacinação contra Hib no Chile foi uma intervenção que obteve
êxito porque aproveitou integralmente os benefícios de seu sistema de
saúde que já era bom.
gite causada por Hib no
Chile caiu em 91% e a da
pneumonia e outras
doenças causadas por Hib
caiu em 80%.”
34 | Prioridades em Saúde|
INTERVENÇÕES CUSTO-EFETIVAS QUE ULTRAPASSAM
OS LIMITES DOS SISTEMAS DE SAÚDE
Os exemplos anteriores demonstram que as intervenções em saúde
podem ser bem sucedidas em situações de extrema pobreza e até mesmo
durante conflitos violentos. Além disso, um exame da história dos ganhos
inigualados em saúde humana no Século XX revela que as melhorias em
saúde não dependem do desenvolvimento econômico. Como foi ressaltado no Capítulo 1, o progresso técnico – representado pelo conhecimento
científico, análise de custo-efetividade e perícia gerencial – pode definir e
oferecer intervenções custo-efetivas em quase todos os ambientes.
Contudo, como demonstra a batalha contra o tracoma no Marrocos, as
possíveis sinergias entre as intervenções em saúde e as melhorias nas
condições sociais em geral são significativas (DCP2, Capítulos 50 e 67).
O tracoma é uma doença da pobreza. É uma infecção por bactéria contagiosa e infecções repetidas acarretam cicatrizes na córnea e finalmente a
cegueira, geralmente entre 40 e 50 anos. A doença é disseminada pelo contato direto com as secreções dos olhos e do nariz das pessoas infectadas,
pelo contato com toalhas e vestimentas contaminadas, bem como por
moscas. A transmissão da doença é rápida e intensa em situações de
superlotação, higiene precária e pobreza.
Com o desenvolvimento econômico e a melhora da higiene, o tracoma
desapareceu da Europa e América do Norte, mas continua a afligir o
mundo em desenvolvimento, particularmente os milhões de pessoas que
vivem em regiões quentes e secas, onde o acesso à água tratada, saneamento e cuidados de saúde são limitados. As crianças são suas principais
vítimas. Em áreas endêmicas, a taxa de prevalência em crianças entre os
dois e os cinco anos chega a 90%. A doença também afeta de forma
desproporcional as mulheres que, devido a seu estreito contato com as crianças são infectadas duas a três vezes mais do que os homens. A carga
mais pesada de cegueira causada por tracoma afeta as populações da
África subsaariana. O tracoma está ligado à pobreza tanto como sintoma
e como causa, porque a cegueira decorrente do tracoma atinge as pessoas
em sua faixa etária mais produtiva.
Inicialmente, o Marrocos lidou com o tracoma como se fosse principalmente um problema médico. Nas décadas de 1970 e 1980, as crianças
em idade escolar das províncias mais afetadas eram tratadas com pomada
de tetraciclina para os olhos duas vezes por ano, mas esse procedimento
não contribuía em nada para melhorar o padrão de vida entre as pessoas
de baixa renda das áreas rurais. Assim, embora tenha praticamente desaparecido das áreas urbanas em desenvolvimento, o tracoma disseminouse das áreas rurais mais pobres. No início da década de 1990, uma
pesquisa nacional concluiu que mais de 5% da população do Marrocos
apresentava sinais de tracoma e que praticamente todos os casos estavam
concentrados nas cinco províncias rurais pobres.
Em 1991, o Marrocos criou o Programa Nacional de Controle da
Cegueira. Essa abrangente parceria incluiu as cinco divisões governamentais responsáveis pela saúde, educação, emprego, equipamentos e água;
“....o tracoma desapareceu da Europa e América
do Norte, mas continua a
afligir o mundo em desenvolvimento”
“No início da década de
1990... mais de 5% da
população do Marrocos
apresentava sinais de
tracoma.”
Êxito no tratamento das prioridades | 35
organizações internacionais; órgãos bilaterais e multilaterais; e organizações não governamentais locais (ONGs). Entre 1997 e 1999, o governo
incorporou a chamada estratégia SAFE (cirurgia, antibióticos, lavagem do
rosto, mudança ambiental), uma estratégia comunitária, ao Programa
Nacional de Controle da Cegueira. Essa estratégia funcionava da seguinte
maneira:
“…a melhoria das
condições de vida e a
higiene da comunidade
são essenciais para
reduzir a disseminação do
tracoma.”
“... O Marrocos conseguiu
uma queda de 75% na
prevalência do tracoma
desde 1999 e sua completa eliminação de algumas
províncias.”
36 | Prioridades em Saúde|
• Cirurgia: um procedimento simples, rápido e barato para salvar a visão
dos pacientes, com uma taxa de êxito de 80%. No Marrocos, unidades
cirúrgicas móveis, equipadas com médicos e enfermeiros especializados realizavam a cirurgia.
• Antibióticos: uma dose de azitromicina para tratar de infecções ativas e
reduzir o conjunto de infecções da comunidade. O governo desenvolveu várias estratégias para a distribuição e baseou a doação de
medicamentos no reconhecimento de que o tracoma é uma doença
comunitária e que se forem tratados somente casos isolados, a infecção
pode voltar a ocorrer.
• Lavagem do rosto: a lavagem regular do rosto pode quebrar o ciclo de
reinfecção e evitar a disseminação da bactéria. Informação, educação e
campanhas de comunicação comprovaram sua eficácia na mudança de
comportamento das pessoas.
• Mudança ambiental: a melhoria das condições de vida e a higiene da
comunidade são essenciais para reduzir a disseminação do tracoma. O
governo supervisionou a construção de latrinas em 32 aldeias e o
fornecimento de água potável em 74. Cerca de 350 associações locais
das aldeias também assumiram a responsabilidade de construir latrinas, furar poços artesianos e armazenar esterco animal de forma segura, de modo que ele pudesse ser usado como fertilizante sem disseminar as moscas. O acesso à água potável cresceu de 13% do total de
comunidades rurais em 1992 para 60% em 2002. Com o reconhecimento de que a redução da pobreza e a melhoria do nível de alfabetização entre mulheres são fundamentais para a luta contra o tracoma, o
governo executou intervenções para aumentar o nível de alfabetização
das mulheres e implementou programas econômicos para aumentar
sua renda.
A adoção do SAFE foi conseqüência do reconhecimento do Marrocos de
que, como observou o chefe do Programa de Controle da Cegueira, “o tracoma no âmbito dessas regiões não é estritamente um problema médico, é
essencialmente o reflexo de um problema socioeconômico... Os verdadeiros
inimigos são as comunidades rurais desfavorecidas, analfabetismo, famílias
numerosas, falta d’água, acumulo de dejetos de animais e a proliferação de
moscas domésticas. Em suma, o inimigo a combater não é a clamídia, mas
a pobreza” (reproduzido de Levine e outros, 2004, p. 86).
Com um programa de saúde que intencionalmente vá além do sistema
de saúde para incluir e estimular aspectos mais amplos de desenvolvimento econômico, o Marrocos conseguiu uma queda de 75% na
prevalência do tracoma desde 1999 e sua completa eliminação de algumas
províncias – o mais rápido progresso contra o tracoma jamais registrado
em um único país.
“. . . quando as intervenções em saúde pública
antecipam-se às epidemias e evitam doenças,
elas são êxitos invisíveis”
CONCLUSÃO
A breve discussão deste capítulo apenas abordou superficialmente determinados aspectos de algumas das intervenções bem sucedidas em saúde
pública apresentadas no DCP2. É possível aprender muito mais com essas
histórias, mas talvez o mais importante seja dissipar o ceticismo em face
do que algumas vezes parece ser um desafio avassalador.
Ironicamente, quando as intervenções em saúde pública antecipam-se
às epidemias e evitam doenças, elas são êxitos invisíveis: apenas os fracassos são notícia. Ao documentar de que modo milhões de pessoas foram
salvas por meio de uma ação integrada, o DCP2 e o Millions Saved oferecem uma oportunidade para reconhecermos, comemorarmos e aprendermos com os sucessos; valorizar sua diversidade e assumir um grau de
otimismo informado que pode ser outro ingrediente essencial para o
sucesso.
Êxito no tratamento das prioridades | 37
Capítulo 3
Análise de custo-eficácia
A saúde humana apresentou uma extraordinária melhoria no último
século, embora ainda persistam graves desigualdades. Para se obter um
progresso mais amplo em saúde, vencer novos desafios e corrigir desigualdades, os recursos devem ser aplicados com eficácia. Para tanto, é
necessário conhecimento sobre quais intervenções realmente funcionam,
informações sobre quanto elas custam e experiência em sua implementação e execução (DCP2, Capítulos 14 e 15).
POR QUE UTILIZAR ANÁLISE DE CUSTO-EFICÁCIA?
A edição de 1993 do Disease Control Priorities in Developing Countries
(Jamison e outros, 1993) foi uma das primeiras iniciativas para orientar as
escolhas sobre políticas de saúde pública nos países em desenvolvimento
por meio da combinação sistemática de informações sobre intervenções
eficazes com informações sobre seus custos. Foi motivada, em parte, por
uma idéia de que os países em desenvolvimento estavam negligenciando
inúmeras oportunidades de melhoria da saúde e que uma melhor alocação dos parcos recursos poderia alcançar melhores resultados em saúde.
A publicação apresentou a análise de custo-eficácia como uma importante
ferramenta para a identificação dessas oportunidades negligenciadas e
para o redirecionamento de recursos para usos melhores.
A análise de custo-eficácia ajuda a identificar as oportunidades negligenciadas dando destaque a intervenções de custo relativamente baixo,
mas que têm potencial para reduzir substancialmente a carga de doenças.
Por exemplo: todos os anos, mais de um milhão de crianças pequenas
morre de desidratação em conseqüência de diarréia. A terapia de reidratação oral (TRO) não reduz a incidência de diarréia, mas diminui
extraordinariamente sua gravidade e a taxa de mortalidade associada a ela.
A comprovação científica de que a TRO pode salvar vidas foi um passo
importante para identificá-la como uma oportunidade negligenciada para
a melhoria da saúde. A demonstração de que cada ano de vida salvo pode39
“…nos Estados Unidos...
o número de anos de vida
economizados poderia ser
duplicado se os recursos
fossem redirecionados
para intervenções mais
custo-efetivas”
“intervenções que são dispendiosos em relação ao
ganho em saúde que proporcionam incluem cirurgia para acidente vascular
cerebral recorrente e intervenções baseadas na
comunidade para
esquizofrenia e transtorno
bipolar.”
40 | Prioridades em Saúde
ria custar apenas de US$2 a US$4 ajudou a destacar que a TRO era algo que
a política pública deveria promover e muitos países responderam com sua
adoção, salvando milhares de vidas (DCP2, Capítulos 8 e 19).
A análise de custo-eficácia ajuda a identificar formas de redirecionar
recursos para alcançar ganhos maiores. Demonstra não apenas a utilidade de deslocar recursos de intervenções ineficazes para intervenções eficazes, mas também a utilidade de deslocar recursos de intervenções
menos custo-efetivas para outras mais custo-efetivas. Por exemplo: um
estudo realizado pelo Centro Nacional de Análise de Políticas da
Universidade de Harvard enfocou 185 tratamentos para salvar vidas que
ocorrem nos Estados Unidos todos os anos, ao custo de US$21,4 bilhões,
e salvam 592.000 anos de vida. O estudo investigou diferentes formas de
alocação desses recursos e concluiu que o número de anos de vida economizados poderia ser duplicado se os recursos fossem redirecionados para
intervenções mais custo-efetivas (DCP2, Capítulo 2, Box 3).
O DCP2 conta uma história semelhante. Identifica dezenas de intervenções para uma ampla gama de doenças e fatores de risco que são dispendiosos em relação ao ganho em saúde que proporcionam. Entre elas
estão tratamentos baseados em hospitais, tais como cirurgia para acidente
vascular cerebral recorrente e intervenções baseadas na comunidade para
esquizofrenia e transtorno bipolar. Outras intervenções que não são particularmente custo-efetivas incluem o tratamento de infecções de TB
latente com isoniazida e normas destinadas a reduzir o uso excessivo de
álcool. Se um país retirasse recursos financeiros e esforços desses tipos de
intervenção e, em seu lugar, aplicasse-nos em tratamentos relativamente
mais custo-efetivos, um número consideravelmente maior de pessoas
poderia viver mais e com mais saúde. Se a realocação de recursos financeiros de tratamentos menos custo-efetivos não for viável, ou apropriada,
talvez os futuros aumentos de despesas possam ser direcionados para
atividades que proporcionarão mais ganhos em saúde.
Estudos de custo-eficácia vêm se multiplicando desde 1993 e as técnicas estão se tornando cada vez mais amplamente disseminadas. O DCP2
beneficiou-se da expansão dessa literatura e dedicou-se a comparações
consistentes entre doenças e tratamentos. Por exemplo: sempre que foi
possível, as análises de custo-eficácia do DCP2 utilizaram as mesmas
unidades de preço, indicadores de saúde e definições dos custos incluídos
(Box 3.1). Este capítulo apresenta os conceitos e métodos básicos da
análise de custo-eficácia, leva em conta algumas de suas limitações e explica de que modo essa análise pode ser e tem sido posta em prática. O capítulo analisa também alguns dos outros fatores contextuais que devem
complementar a análise de custo-eficácia no processo de tomada de
decisões se os formuladores de políticas utilizarem da melhor forma possível as conclusões apresentadas no DCP2.
Box 3.1 Uma Base Coerente para o Cálculo de Custo-Eficácia do
DCP2
Unidades para Coeficientes de Custo-Eficácia
Os editores do DCP2 solicitaram aos autores de cada capítulo para adotar um método
comum de análise de custo-eficácia e usar parâmetros uniformes. Os autores receberam
instruções para calcular o custo-eficácia em termos de dólares dos Estados Unidos por
AVAD, onde os AVADs eram calculados usando-se os pesos para deficiências fornecidos
pela OMS e uma taxa de desconto de 3%.
Sem diferenciação por idade
Diferentemente de alguns estudos, os editores do DCP2 decidiram não empregar diferentes pesos por idade. Assim, o efeito de salvar a vida de um recém nascido, por
exemplo, conta mais do que o de salvar a vida de uma pessoa mais velha, por causa da
diferença de expectativa de número de anos de vida, mas não como conseqüência de
valorizar mais ou valorizar menos um ano de vida salvo em uma determinada idade do
que um ano de vida salvo em outra idade.
Base para o cálculo de anos de vida
Os cálculos de anos de vida esperados tomaram por base as expectativas médias
regionais para cada idade. Esse procedimento tem o efeito de reduzir o custo-eficácia
de intervenções em regiões com menor expectativa de vida, mas, dentro de uma região,
ele permite uma comparação mais realista entre as intervenções que afetam crianças e
aquelas que afetam adultos.
Unidades monetárias
As principais alternativas para medir custos são: a conversão de todas as moedas para
uma moeda amplamente aceita, como dólares dos Estados Unidos usando as taxas de
câmbio de mercado; ou convertê-las em dólares internacionais usando um fator de conversão baseado na paridade de poder de compra. A principal vantagem da utilização de
dólares internacionais é que eles se ajustam pela diferença real no poder de compra
entre uma moeda e outra. Entretanto, o DCP2 decidiu usar dólares calculados por taxas
de câmbio do mercado por eles estarem mais de acordo com outras estimativas de custos com as quais os formuladores de políticas estão familiarizados e porque os índices de
poder de compra disponíveis baseiam-se na agregação de um espectro completo de
preços que pode, portanto, induzir ao erro se for utilizado para analisar um determinado
setor com sua própria composição de bens comercializáveis e não comercializáveis. Os
dólares internacionais são de mais difícil compreensão e não correspondem à viabilidade
financeira refletida nos orçamentos.
Custos
O DCP2 conta os custos de produção de uma intervenção, mas não, os custos de seu
consumo pelos pacientes e suas famílias. Os custos indiretos geralmente não são monetários, especialmente os custos do tempo das pessoas, e são difíceis de estimar com
coerência. Quando esses custos são elevados, eles fazem com que as intervenções
aparentem não ser custo-efetivas, mas o problema pode estar na localização das
unidades de saúde, no quadro dos profissionais e da forma de operar e não nas intervenções que elas oferecem.
Fonte: Adaptado do Capítulo 15 do DCP2
Análise de custo-eficácia | 41
“o uso de profissionais de
O QUE É ANÁLISE DE CUSTO-EFICÁCIA?
saúde não-médicos volun-
A análise de custo-eficácia é um método para avaliar os ganhos em saúde
com relação aos custos das diferentes intervenções em saúde. Não é o
único critério para decidir como alocar recursos, mas é um critério
importante, porque estabelece a relação direta entre as implicações financeiras e científicas das diferentes intervenções. O cálculo básico consiste
em dividir o custo de uma intervenção em unidades monetárias pelo
ganho esperado em saúde medido em unidades naturais, tais como
número de vidas salvas. Por exemplo: o uso de profissionais de saúde nãomédicos voluntários e pessoal leigo treinado como primeiros socorristas a
acidentes custa aproximadamente de US$128 por vida salva no Sul da Ásia
e US$238 no Oriente Médio e Norte da África, enquanto o uso de uma
ambulância da comunidade custa cerca de US$1.100 e US$3.500 por vida
salva nas mesmas regiões, respectivamente. Quando se mede o custoeficácia em termos de vidas salvas, todas as vidas são tratadas de forma
igual, independentemente de ser a pessoa um recém-nascido que viveria
mais 80 anos ou uma pessoa de meia idade, que só pode esperar viver por
mais 40 anos.
Alguns estudos calculam o custo-eficácia utilizando anos de vida perdidos como a unidade natural para medir o efeito das intervenções (Box
3.2). Essa medida trata todos os anos adicionais de vida ganhos com uma
intervenção, como iguais. Soma os números de anos de vida que seriam
salvos com uma intervenção. Assim, um tratamento que salvou a vida de
um bebê (evitando a desidratação por diarréia, por exemplo) contaria
mais do que um tratamento intervenção destinada a salvar a vida de uma
pessoa mais velha (por exemplo, evitando a recorrência de um acidente
vascular cerebral).
Como o futuro é incerto, é prática comum (mas não, universal)
descontar ganhos em saúde e custos em anos distantes. O DCP2 usa uma
taxa de desconto de 3% ao ano, que tem o efeito de fazer com que uma
expectativa de vida de 80 anos ao nascer valer cerca de 30 anos descontados. Com o desconto, salvar a vida de um recém-nascido ainda representa mais anos ganhos do que salvar a vida de uma pessoa de meia idade,
mas a diferença diminui consideravelmente. Os tratamentos que incorrem
em custos hoje e só proporcionam ganhos anos mais tarde aparentam ser
menos custo-efetivas com o desconto do que quando são percebidos imediatamente, mas aqueles tratamentos cujos custos e benefícios para a
saúde seguem o mesmo padrão de tempo são afetadas de forma igual e seu
custo-eficácia relativo permanece inalterado.
Não obstante, a prevenção da morte ou o prolongamento da vida não
é o único objetivo das intervenções em saúde. Os investigadores propuseram outras medidas para estabelecer a diferença entre um ano de
tários e pessoal leigo
treinado como primeiros
socorristas a acidentes
custa aproximadamente
de US$128 por vida salva
no Sul da Ásia e US$238
no Oriente Médio e Norte
da África, enquanto o uso
de uma ambulância da
comunidade custa cerca
de US$1.100 e US$3.500
por vida salva.”
42 | Prioridades em Saúde
Box 3.2 Alguns termos técnicos usados pelo DCP2
Coeficiente de custo-eficácia: o custo de uma intervenção dividido pela mudança nas
condições de saúde que ela proporciona. A escolha de unidades monetárias para medir
os custos e as unidades de saúde para medir o impacto podem variar. Sempre que possível, o DCP2 utiliza dólares dos Estados Unidos por AVAD.
Custo-eficácia médio: o custo total do tratamento de um determinado problema de
saúde por meio da utilização de uma intervenção específica dividido pelo ganho total
em saúde.
Custo-eficácia incremental: uma unidade para medir a quantidade de saúde perdida por
causa de uma determinada doença ou lesão. É calculada como o valor presente dos
anos futuros de vida livre de deficiência que são perdidos em conseqüência das mortes
prematuras ou dos casos de deficiência ocorridos em um determinado ano.
AVAD: uma unidade para medir a quantidade de saúde perdida por causa de uma
determinada doença ou lesão. É calculada como o valor presente dos anos futuros de
vida livre de deficiência que são perdidos em conseqüência das mortes prematuras ou
dos casos de deficiência ocorridos em um determinado ano.
Taxa de desconto: taxa usada para converter custos e benefícios futuros em valores
presentes equivalentes. Por exemplo: com uma taxa de desconto de 3%, um custo de
US$1 no próximo ano equivaleria hoje a US$0,97 e um custo de US$1 daqui a 10 anos
equivaleria a US$0,74 hoje.
Intervenção: uma atividade que utiliza recursos humanos, físicos e financeiros numa
tentativa deliberada de melhorar a saúde por meio da redução do risco, da duração, ou
da gravidade de um problema de saúde (Jamison 2002, Tabela 2).
Ano de vida ajustado à qualidade: unidade que mede o ganho em saúde de uma intervenção calculado como o número de anos de vida salvos e ajustados para a qualidade.
Anos de vida perdidos: uma medida do impacto de um evento adverso de saúde,
geralmente calculado subtraindo-se a idade em que a morte ocorre da expectativa de
vida naquela idade.
vida em perfeitas condições de saúde e um ano de vida com algum prejuízo para a saúde. Uma das medidas mais comumente utilizadas que
tratam dessa questão é o ano de vida ajustado à deficiência (AVAD).
Um AVAD mede, não apenas os anos adicionais de vida ganhos com uma
intervenção, mas também a melhoria da saúde de que as pessoas conseqüentemente desfrutam. Atribui o valor 1 para um único ano vivido em
perfeitas condições de saúde. Qualquer prejuízo à saúde ou deficiência
recebe um peso de deficiência que descreve a magnitude do prejuízo, com
um peso maior se o prejuízo for grave e um peso menor se a deficiência
for leve. O valor de um ano vivido com uma deficiência recebe então um
valor de 1 menos o peso da deficiência, que mede o grau de saúde restante.
Os pesquisadores atribuíram pesos para a deficiência de várias condições
crônicas, dor, deficiência e perda das funções orgânicas utilizando diversos métodos, inclusive pesquisas internacionais que pedem que os indivíAnálise de custo-eficácia | 43
“Uma análise de custoefetividade que medisse,
por exemplo, o ganho em
saúde pelo número de
mortes evitadas encontraria pouco valor na prevenção da oncocercose,
mas a medição do ganho
em saúde em AVADs
atribui um elevado valor à
preservação da visão das
pessoas”
44 | Prioridades em Saúde
duos comparem a qualidade de vida em diferentes condições de saúde. O
DCP2 baseou-se nos pesos das deficiências calculados pelos estudos sobre
carga de doenças da OMS utilizando algumas vezes esses pesos para calcular a deficiência de condições que a OMS ainda não havia considerado
explicitamente.
Os AVADs são úteis para os formuladores de políticas porque são uma
medida mais ampla da saúde da população do que a simples contagem de
mortes e porque permitem comparações entre uma ampla gama de intervenções em saúde. Algumas intervenções em saúde destinam-se diretamente à diminuição da mortalidade, mas muitas estão voltadas para a
redução da gravidade das doenças e melhoria da qualidade de vida. Com
os AVADs, essas diferentes intervenções podem ser comparadas a um
padrão comum. Uma análise de custo-eficácia que medisse, por exemplo,
o ganho em saúde pelo número de mortes evitadas encontraria pouco
valor na prevenção da oncocercose, mas a medição do ganho em saúde em
AVAD atribui um elevado valor à preservação da visão das pessoas, já que
o peso da deficiência da cegueira é grande.
Uma das vantagens de usar proporções de custo-eficácia é que elas evitam alguns dilemas éticos e dificuldades analíticas que surgem quando se
empreendem análises de custo-benefício. O emprego dessa técnica analítica como alternativa à análise de custo-eficácia requer que se atribua um
valor monetário a cada ano de vida. Desprezando-se essa etapa, a análise
de custo-eficácia chama atenção exclusivamente para os benefícios em
saúde que não são monetizados. Quando uma intervenção proporcionar
economia em saúde, os custos devem ser subtraídos dos custos da intervenção quando forem comparados com os resultados em saúde. Muitas
intervenções em saúde produzem benefícios que ultrapassam a melhoria
imediata das condições de saúde. Por exemplo: pais mais saudáveis
poderão cuidar melhor de seus filhos, trabalhadores mais saudáveis serão
mais produtivos no local de trabalho e famílias mais saudáveis podem evitar cair na pobreza. Algumas intervenções em saúde podem proporcionar
ciclos virtuosos. Por exemplo: a prevenção da morte de um dos pais pode
significar que a família tenha mais renda para nutrir as crianças em crescimento. Outras intervenções em saúde oferecem importantes benefícios
subsidiários que são avaliados separadamente. O custo-eficácia de serviços
de saneamento e tratamento da água na redução de doenças gastrintestinais é baixo, mas a água encanada e os serviços de saneamento são valorizados por si mesmos como um conforto e avanço ambiental.
O grau de importância que as pessoas atribuem a benefícios não relacionados à saúde é bastante alto, como demonstra sua disposição de pagar
por esses serviços, mas o custo-eficácia não medirá os benefícios adicionais que não estão relacionados à saúde. Portanto, a comparação de
intervenções segundo critérios de custo-eficácia deve ser feita com um
entendimento claro de que essa comparação é feita entre intervenções
apenas em termos de sua eficiência na melhoria da saúde. Se benefícios
não relacionados à saúde vierem a ser introduzidos no debate, eles deverão ser considerados para todas as intervenções que estiverem sendo
discutidas e não apenas para algumas.
A análise de custo-eficácia também requer unidades comparáveis para
medir os custos. Nos estudos nacionais, as unidades de custo em moeda
local terão significado claro. Na ausência de preços unitários das contribuições para as intervenções para comparações entre países, os autores
do DCP2 receberam os custos para cada região do Banco Mundial em uma
moeda amplamente utilizada, geralmente dólares dos Estados Unidos. A
principal questão envolve saber se se deve utilizar taxas de câmbio de mercado para converter os custos em moeda local e compará-los com o valor
de contribuições importadas e importáveis expressas em dólares, ou usar
um fator de conversão diferente, baseado em estudos do poder de compra
relativo da moeda local. Como as taxas de câmbio de mercado são mais
fáceis de compreender e correspondem melhor às verdadeiras restrições
financeiras, o DCP2 utilizou essas taxas para essas conversões.
As estimativas de custo são afetadas pelos preços e os preços podem
variar consideravelmente entre países e mesmo no interior desses países.
Os autores do DCP2 não puderam coletar os preços unitários dos
insumos para os tratamentos em todos os países, portanto, em vez disso,
foram-lhes fornecidos preços unitários médios em cada uma das seis
regiões em desenvolvimento: Leste da Ásia e Pacífico, Europa e Ásia
Central, América Latina e Caribe, Oriente Médio e Norte da África, Sul da
Ásia e África subsaariana (contudo, algumas análises publicadas anteriormente utilizaram os grupos regionais da OMS). Nas análises mais completas, os autores multiplicaram esses preços unitários regionais pelas
quantidades estimadas de insumos necessárias para cada tratamento e
depois dividiram esse produto pelo efeito estimado na saúde para encontrar as taxas de custo-eficácia. Nos casos em que os autores não puderam
encontrar informações desagregadas sobre os insumos, mas tomaram
conhecimento de relatos de algumas medidas de custo-eficácia, eles fizeram extrapolações. Em alguns casos, havia coeficientes por insumo
disponíveis para uma região e os autores os extrapolaram para outras
regiões (ver, por exemplo, DCP2, Capítulo 30).
Para realizar uma análise de custo-eficácia, os pesquisadores também
precisam especificar a intervenção na saúde com certo nível de detalhes.
Uma intervenção em saúde é uma atividade deliberada que tem por objetivo melhorar a saúde de uma pessoa reduzindo o risco, a duração, ou a
gravidade de um problema de saúde. Essas intervenções podem ser
Análise de custo-eficácia | 45
definidas de acordo com os eventos de saúde adversos, tais como ser
envolvido em um acidente, contrair uma infecção ou sofrer de um tumor
maligno. A prevenção primária procura evitar um evento de saúde adverso, enquanto a prevenção secundária tem por objetivo impedir que o
evento adverso se repita ou que, uma vez ocorrido, provoque uma com-
Box 3.3 Categorias de intervenções com exemplos
A figura ilustra de que modo as intervenções estão relacionadas com o evento de
saúde. As definições dessas categorias são apresentadas abaixo.
Antes
Prevenção primária
da ocorrência de um fator
de risco
de um fator de risco existente
que evolui para
um evento adverso de saúde
Evento
Depois
Prevenção secundária
de outro evento do mesmo
tipo (exemplo: um segundo
acidente vascular cerebral)
de um evento relaciona
do tipo diferente (exemplo:
infarto após acidente
vascular cerebral)
Gestão do caso
Cura
Cuidado imediato
Cuidado crônico
ReabilitaÁão
Cuidados paliativos
Todas as intervenções baseadas na população têm por objetivo a prevenção primária
(conforme definição abaixo), são direcionadas para populações inteiras ou grandes subgrupos, e estão divididas em três categorias:
• Promoção de mudança de comportamento individual (dieta, exercício, tabagismo,
atividade sexual)
• Controle de perigos ambientais (poluição do ar e da água, vetores de doenças)
• Intervenções médicas (imunização, quimioprofilaxia em massa, rastreamento em
larga escala e encaminhamento)
As intervenções individuais são voltadas para cada pessoa e podem ter os seguintes
objetivos:
• Prevenção primária – reduzir o nível de um ou mais fatores de risco, reduzir a probabilidade da primeira ocorrência da doença (medicamentos para hipertensão para prevenir o acidente vascular cerebral ou o infarto) ou para reduzir a probabilidade de
doença quando o fator de risco já estiver presente (profilaxia da anemia falciforme).
• Prevenção secundária após a ocorrência da doença – para evitar outro evento do
mesmo tipo (medicação para reduzir a probabilidade de um segundo evento coronariano) ou para reduzir o risco de um evento diferente, porém relacionado (medicação
para reduzir a probabilidade de um primeiro infarto após um acidente vascular cerebral)
• Cura – remover a causa de uma condição e restituir a função à situação anterior
(cirurgia de apendicite).
46 | Prioridades em Saúde
• Gestão imediata –atividade de curto prazo para reduzir a gravidade de eventos agudos,
ou o nível de fatores de risco estabelecidos para minimizar seus impactos de longo
prazo (medicação trombolítica após um infarto do miocárdio, angioplastia para reduzir a
estenose de artérias coronarianas).
• Gestão crônica –atividade contínua para reduzir a gravidade de condições crônicas ou
prevenir o agravamento (medicação para depressão unipolar, insulina para o diabetes). A
gestão crônica pode incluir algumas prevenções secundárias.
• Reabilitação –recuperação total ou parcial de função física, psicológica ou social que
tenha sido prejudicada por uma doença ou condição anterior (terapia após lesão musculoesquelética, orientação para problemas psicológicos).
• Cuidados paliativos – reduzir a dor e o sofrimento causados por uma condição para a
qual não exista atualmente cura nem reabilitação (analgésicos para a dor de cabeça,
opiáceos para câncer terminal).
Fonte: DCP2, Capítulo 15, box 15.1.
plicação. Em conseqüência de um evento adverso de saúde, os tratamentos também podem ser classificadas em várias categorias de gestão de
casos, tais como curas, cuidado imediato, cuidado crônico, reabilitação e
cuidados paliativos (Box 3.3).
A completa caracterização de um tratamento também requer a
definição do nível de cuidado em que esse tratamento é prestado; os
suprimentos e processos específicos envolvidos; e os tipos de profissionais
de saúde e os serviços afins que são necessários, tais como exames laboratoriais. Quanto mais detalhada e precisa for a análise, mais facilmente os
investigadores podem avaliar se ela é semelhante ou se diverge da forma
como aquele tratamento é caracterizada em outros contextos. Por exemplo: as intervenções em saúde podem ser realizadas por uma unidade
menos especializada ou envolver um número maior de visitas em um país
do que em outro.
A abrangência dos custos envolvidos também afetará a análise de
custo-eficácia. Os pesquisadores podem escolher uma definição limitada
de custos e focalizar exclusivamente os custos variáveis diretos da
prestação de um serviço; ou seja, podem incluir apenas os custos de materiais e pessoal adicionais que são necessários e excluir os custos relacionados ao uso da infra-estrutura existente ou da capacidade instalada. Em
outros casos, os pesquisadores podem usar definições de custos mais
amplas, incluindo nos custos do serviço uma parcela dos custos fixos das
unidades de saúde e da administração. Os autores do DCP2 foram solicitados a seguir esta última abordagem.
Em alguns estudos, os pesquisadores incluem outros custos, tais como
o valor do tempo que os pacientes e seus familiares gastam para obter um
serviço, ou o custo do transporte para chegar às unidades de saúde.
Quando mais custos são incluídos, o custo unitário do ganho em saúde
Análise de custo-eficácia | 47
“Existe também um problema ético quando o tempo
das pessoas de baixa
renda é avaliado apenas
com base em seus baixos
salários ou rendas.”
será maior e a intervenção aparentará ter uma menor relação custo-eficácia. Se as intervenções que estão sendo comparadas tiverem características
semelhantes, tais como todas as intervenções serem oferecidas em
unidades de saúde semelhantes, então a inclusão desses outros custos não
alterará a classificação das intervenções mas, comparações entre intervenções diferentes podem produzir resultados diferentes se os coeficientes
forem além disso parecidos.
Para fins de coerência, os capítulos do DCP2 utilizam apenas custos
diretos, porque os cálculos desses outros custos são difíceis de obter e
raramente são uniformes entre os estudos. Existe também um problema
ético quando o tempo das pessoas de baixa renda é avaliado apenas com
base em seus baixos salários ou rendas.
QUAL É O GRAU DE CONFIABILIDADE DA ANÁLISE
DE CUSTO-EFICÁCIA?
Embora o cálculo básico de custo-eficácia pareça ser simples, as escolhas de
unidades de medida, definições das intervenções, abrangência dos custos e
preços a serem incluídos, não apenas alterarão os resultados numéricos,
como também afetarão a interpretação do coeficiente de custo-eficácia.
Em muitos casos, as diferenças são tão expressivas que o refinamento das
análises subjacentes é desnecessário. Por exemplo: nenhum grau de refinamento tornará a revascularização miocárdica (> US$25.000 por AVAD
evitado) mais custo-efetiva do que o uso de novos medicamentos antimaláricos mesmo que a resistência às drogas mais antigas tenha aumentado (US$8 a US$20 por AVAD evitado) nem do que a taxação de produtos
do tabaco (US$3 a US$50 por AVAD evitado) (Tabela 3.1). Por essa razão,
os leitores do DCP2 são incentivados a prestar atenção às diferentes ordens
demagnitude, fazendo distinção entre tratamentos que são extrema ou
moderadamente custo-efetivos e aqueles que não são custo-efetivos.
Quando os coeficientes de custo-eficácia encontram-se numa faixa de
semelhança, as decisões sobre políticas tornam-se mais difíceis. Nessas
situações, pode-se recomendar a realização de um exame mais minucioso
dos coeficientes de custo-eficácia para aumentar a confiança em que as
medidas são realmente próximas entre si. Isso implicaria verificar se as
unidades de medida, a definição das intervenções e a abrangência dos custos que foram incluídos eram semelhantes.
Deve-se observar também, que a qualidade das evidências disponíveis
para avaliar o custo-eficácia varia, especialmente por causa da ampla
gama de intervenções que estão sendo examinadas. O DCP2 ressalta que
a melhor evidência vem de estudos com controles aleatórios ou revisões
sistemáticas e que a segunda melhor evidência disponível vem de estudos
48 | Prioridades em Saúde
Tabela 3.1 A Quantidade de saúde que se pode comprar com US$1 milhão
Serviço ou intervenção
Redução da mortalidade de crianças com idade inferior a cinco anos
1. Melhoria do cuidado de crianças com menos de 28 dias de idade
(inclusive ressuscitação de recém-nascidos)
2.1 Ampliação da cobertura de imunização
infantil com vacinas de rotina
2.2 Acréscimo de vacinas contra outras doenças
ao programa-padrão de imunização infantil
(especialmente contra o Haemophilus influenzae e hepatite B)
3. Alteração para o uso de medicamentos associados
(ACTs) contra a malária onde há resistência da malária aos
atuais medicamentos de baixo custo e que antes eram
altamente eficazes (África subsaariana)
Prevenção e tratamento do HIV/AIDS
4. Prevenção da transmissão de mãe para filho (ARV – nevirapina –
profilaxia da mãe, substitutos do leite materno)
5. Tratamento de doenças sexualmente transmissíveis
(DST) para interromper a transmissão de HIV
6.1 Tratamento anti-retroviral (ARV) que alcança alta adesão para
um grande percentual de pacientes
6.2 Tratamento anti-retroviral (ARV) que alcança alta adesão para um
pequeno percentual de pacientes
Prevenção e tratamento de doenças não-transmissíveis
7. Taxação de produtos do tabaco
8.1 Tratamento do infarto agudo do miocárdio (IAM) ou ataques
do coração com um conjunto de medicamentos de baixo custo
8.2 Tratamento de IAM com medicamentos de baixo custo mais
a estreptoquinase (os custos e AVADs para esse tratamento são
adicionais aos que existiriam apenas com medicamentos de baixo custo)
9. Tratamento por toda a vida de sobreviventes de ataques cardíacos
e acidente vascular cerebral com uma dose diária de "polypill" que
associa 4-5 medicamentos preventivos genéricos.
10.1 Revascularização miocárdica (CABG), ou cirurgia de ponte safena,
em casos de alto risco identificáveis, tais como doença da artéria
(coronária esquerda principal (adicional ao item 9)
10.2 Cirurgia de ponte safena para doença da artéria coronária de
menor gravidade (adicional ao item 9)
custos por AVAD
AVADs evitados
por US$1 milhão
10–400
2.500–100.000
2–20
50.000–500.000
40–250
4.000–24.000
8–20
50.000–125.000
50–200
5.000–20.000
10–100
10.000–100.000
350–500
2.000–3.000
Devido ao número muito
limitado de ganhos por
paciente individual e à
possibilidade de alterações
adversas no comportamento
da população, existe a
possibilidade de que mais
anos de vida sejam perdidos
do que salvos
3–50
20.000–330.000
10–25
40.000–100.000
600–750
1.300–1.600
700–1.000
1.000–1.400
>25.000
<40
Muito elevado
Muito pequeno
(Continua na página seguinte.)
Análise de custo-eficácia | 49
Tabela 3.1 (Continuação)
custos por AVAD
AVADs evitados
por US$1 milhão
11. Diagnóstico e tratamento do câncer
cérvico-uterino
15–50
20.000–60.000
12. Operação de um setor de cirurgias básicas no nível de hospital distrital
enfocando o trauma, a gravidez de alto risco e outras condições
comuns tratadas cirurgicamente
70–250
4.000–15.000
Serviço ou intervenção
Outros
Fontes: DCP2, Capítulo 1, tabela 1.30.
Nota: Os AVAD evitados por US$1 milhão gasto em uma intervenção variam imensamente de um país para outro, dependendo de vários fatores. Esta tabela tem por objetivo
fornecer uma idéia superficial de quanta saúde é possível comprar com as diferentes intervenções e também demonstrar que existe grande variação na quantidade de saúde
que diferentes intervenções (ou que a mesma intervenção aplicada de diferentes maneiras) pode ser fornecida pela mesma quantidade de dinheiro.
ACT –terapia combinada do artemisinin
IAM – infarto agudo do miocárdio
ARV – anti-retroviral
CABG - revascularização miocárdica
DST – doenças sexualmente transmissíveis
“Análise de custo-efetividade... fornece informações sobre os custos
não aleatórios que, mesmo assim, conseguiram utilizar métodos estatísticos rigorosos. A evidência mais frágil vem de estudos de caso limitados ou
pesquisas de opinião de peritos. Entretanto, a falta de evidência não significa que uma intervenção não seja custo-efetiva. Significa apenas que os
pesquisadores não sabem o grau de custo-eficácia da intervenção.
Também não quer dizer que os leitores devam ignorar os números do
custo-eficácia. Em vez disso, devem ser cautelosos, não devem confiar plenamente em amostragens e devem prestar atenção às ordens de magnitude e qualidade da evidência.
de melhoria da saúde por
meio de uma determinada
intervenção.”
50 | Prioridades em Saúde
QUAIS SÃO AS TAREFAS ADEQUADAS PARA A ANÁLISE
DO CUSTO-EFICÁCIA?
A análise do custo-eficácia não tem como ajudar muitas tarefas importantes de formulação de políticas. Basicamente, fornece informações
sobre os custos de melhoria da saúde por meio de uma determinada intervenção. Como em qualquer decisão de investimento, o preço é importante, mas não é o único fator a ser considerado. Por exemplo: o custo de
construção de uma escola – como o custo de construção de uma clínica –
variará de acordo com seu tamanho, localização e materiais utilizados.
Essas escolhas afetarão o custo do ensino por estudante, o que pode influenciar o número de crianças que possam freqüentar a escola e talvez a
qualidade do seu aprendizado. Contudo, sem informações sobre preço, os
formuladores de decisões não podem perceber as compensações envolvidas no tratamento de outras questões.
Assim, a questão passa a ser de que modo os formuladores de políticas,
administradores de programas de saúde, pesquisadores e outros podem utilizar da melhor forma a análise de custo-eficácia. Três tipos de comparação
tornam-se extremamente mais fáceis com a análise de custo-eficácia:
• comparações entre diferentes tratamentos para uma mesma doença
• comparações entre diferentes tratamentos destinadas a alcançar segmentos específicos de uma população
• comparações entre diferentes tratamentos para diferentes doenças.
O uso do coeficiente de custo-eficácia é mais direto quando são comparados tratamentos voltados para a mesma doença ou fator de risco e
diferem somente na forma de prestação de serviço. Nesse caso, tratamentos de menor custo geralmente resultam em maiores ganhos em saúde. Por
exemplo: o tratamento da avitaminose A por meio da distribuição de cápsulas tem um impacto sobre a saúde semelhante àquele obtido com o açúcar fortificado; entretanto, a distribuição de cápsulas custa cerca de US$6 a
US$12 por AVAD evitado, enquanto a fortificação do açúcar custa cerca de
US$33 a US$35 por AVAD evitado. Um outro ângulo de visão é observar
que, pelo mesmo custo, a distribuição de cápsulas pode alcançar um
número de pessoas três a cinco vezes maior do que o açúcar fortificado.
(DCP2, Capítulo 28). Essa é uma indicação clara de que é possível obter
mais ganho em saúde empregando recursos na distribuição de cápsulas.
Porém, mesmo neste exemplo simples, os formuladores de decisão
podem precisar levar em conta outros fatores, especialmente, que tratamentos diferentes podem alcançar pessoas diferentes. A análise de custoeficácia trata igualmente todos os ganhos em saúde, enquanto que em
política pública, as questões de distribuição também são importantes. A
distribuição de cápsulas, por exemplo, só poderia contemplar pessoas que
freqüentam centros de saúde, enquanto a fortificação do açúcar somente
alcançaria pessoas que compram açúcar. Dependendo das características
e comportamentos da população com avitaminose A, a fortificação deveria, na prática, ser mais eficaz e mais igualitária. Mesmo assim, a fortificação seria mais dispendiosa por AVAD, portanto, os formuladores de
decisão teriam que decidir se o custo adicional de alcançar o resultado
mais igualitário é economicamente viável quando comparado com outros
usos dos mesmos recursos financeiros.
A análise de custo-eficácia também é útil na comparação entre tratamentos direcionados para diferentes doenças ou fatores de risco.
Recursos escassos produzirão mais melhorias em saúde quando forem
aplicados em tratamentos de maior custo-eficácia. Se a análise de custoeficácia utilizar número de mortes evitadas como medida de ganho em
saúde, a alocação de recursos em tratamentos mais custo-efetivos evitará
“...o tratamento da avitaminose A por meio da distribuição de cápsulas tem
um impacto sobre a saúde
semelhante àquele obtido
com o açúcar fortificante;
entretanto, a distribuição
de cápsulas custa cerca
de US$6 a US$12 por
AVAD evitado, enquanto a
fortificação com açúcar
custa cerca de US$33 a
US$35 por AVAD evitado.”
….despender US$1 milhão . . . para incluir uma
segunda oportunidade de
imunização contra o
sarampo evitaria entre
800 e 66.000 óbitos, . . .”
Análise de custo-eficácia | 51
o maior número de óbitos. Por exemplo: despender US$1 milhão na
expansão do programa tradicional de vacinação de crianças para incluir
uma segunda oportunidade de imunização contra o sarampo evitaria
entre 800 e 66.000 óbitos, dependendo, em grande parte, da prevalência
do sarampo. Em contrapartida, despender o mesmo montante para
ampliar o programa de modo a incluir a vacina contra Hib evitaria entre
10 e 800 óbitos e a inclusão da vacina contra a febre amarela evitaria entre
300 e 900 óbitos.
Se em vez disso a análise usar AVADs como a medida do ganho em
saúde, então a alocação de recursos nos tratamentos mais custo-efetivos
elevará ao máximo os anos de vida saudável. Por exemplo: US$1 milhão
gasto em nevirapina e substitutos do leite materno para evitar que mães
infectadas pelo HIV transmitissem HIV para seus filhos produziria um
ganho de 5.000 a 20.000 AVADs enquanto que o mesmo montante gasto
para expandir a cobertura de imunização com vacinas-padrão para crianças produziria um ganho entre 50.000 e 500.000 AVADs.
Desse modo, o custo-eficácia não deve ser o único critério para a formulação de decisões de políticas públicas relacionadas à saúde e deve ser
complementada com informações sobre as conseqüências da distribuição.
Para os formuladores de políticas públicas, esses dois tipos de informação
definem os balanços inerentes à alocação de recursos financeiros em diferentes intervenções.
COMO OS FORMULADORES DE POLÍTICAS PODEM USAR
A ANÁLISE DE CUSTO-EFICÁCIA?
Para fornecer boa orientação às políticas, o custo-eficácia deve ser complementado com informações essenciais sobre o contexto mais amplo,
Figura 3.1 Eficácia das intervenções
alto
Oportunidades
negligenciadas
Intervenções
custoefetivaseficientes
amplamente
empregadas
baixo
custo-eficácia
Intervenções
para as quais
a expansão
é ineficiente
intervenções
para redução
baixo
alto
cobertura atual
Fonte: DCP2, Capítulo 2, p. 34.
52 | Prioridades em Saúde
especialmente a carga prevalente de doenças, a cobertura existente de
intervenções em saúde e a capacidade total do sistema de saúde.
Um fator essencial do contexto do uso de informações sobre o custoeficácia de qualquer intervenção é a carga provocada por uma doença.
Alguns tratamentos podem ser altamente custo-efetivos mas afetar
somente um pequeno número de pessoas ou fornecer uma pequena melhoria em saúde (Figura 3.1). Exemplo: o tratamento da leishmaniose é
relativamente custo-efetivo, mas só se aplica a um número relativamente
pequeno de casos. Por outro lado, antimaláricos e mosquiteiros tratados
com inseticidas são medidas custo-efetivas que, em certos países evitariam uma grande carga de doença. Se fosse possível, os países financiariam
todas as medidas de melhoria da saúde, entretanto, como todos os países
enfrentam orçamentos restritos ou capacidade limitada de prestação de
serviços, a carga evitável de doença é uma informação essencial de que os
formuladores de políticas necessitam ao escolherem entre intervenções
que, em outras condições, teriam custo-eficácia semelhante.
As intervenções em saúde que são preventivas geralmente serão mais
custo-efetivas em lugares onde a carga da doença ou fator de risco focalizado for alto e, conseqüentemente, onde a intervenção evitará um
número maior de casos. Contudo, a prevalência atual nem sempre é um
bom indicador do custo-eficácia de uma intervenção, especialmente em
locais onde programas de saúde pública eficazes são responsáveis pela
baixa taxa de prevalência. Por exemplo: a prevalência de difteria, tétano,
coqueluche e sarampo é geralmente baixa em países com programas de
vacinação eficazes, embora o custo-eficácia do programa de vacinação, que
é necessário para evitar uma recrudescência dessas doenças, ainda seja
muito elevado.
A prevalência também tem um grande efeito sobre o custo-eficácia do
rastreamento de doenças e, indiretamente, sobre o custo-eficácia de um
pacote para tratar de uma determinada doença. Por exemplo: o rastreamento e tratamento do Helicobacter pylori, um fator bacteriano de risco
do câncer gástrico, não é custo-efetivo nos Estados Unidos, mas o é na
Colômbia, onde a prevalência de câncer gástrico é mais elevada e muitos
dos custos do tratamento são mais baixos (DCP2 , Capítulo 29).
O custo-eficácia do rastreamento de cânceres e muitas outras doenças
depende dos custos de identificação de casos, do número de pessoas que
não dão continuidade ao tratamento e dos custos diretos do tratamento.
Obviamente, se não houver tratamento disponível, o rastreamento não
tem sentido. O exame de anemia em pessoas com AIDS é custo-efetivo
entre as pessoas tratadas com zidovudina, não apenas porque o rastreamento seja relativamente barato (menos de US$0,02 por hemograma),
mas também porque a anemia ocorre em 10% desses pacientes. Quando
os custos são mais elevados, ou a probabilidade de detectar condições é
pequena, o rastreamento pode não ser custo-efetivo.
“. . . a carga evitável de
doença é uma informação
essencial de que os formuladores de políticas
necessitam ao escolherem
entre intervenções que,
em outras condições, teriam custo-efetividade
semelhante.”
“ . . . o rastreamento universal de sangue para HIV
é dispendioso, embora
também seja custo-efetivo, mesmo em países com
baixa prevalência de
HIV/AIDS . . .”
Análise de custo-eficácia | 53
O custo-eficácia depende também das probabilidades de transmissão da
doença. Por exemplo: o rastreamento universal de sangue para HIV é dispendioso, embora também seja custo-efetivo, mesmo em países com baixa
prevalência de HIV/AIDS, uma vez que a transfusão de sangue contaminado tem probabilidade muito elevada de transmitir infecção – quase 100%.
Uma perspectiva temporal adequada também é imperativa para a
avaliação do peso da carga de uma doença e do valor de um tratamento
por vários motivos. Um deles é que os ganhos com o tratamento podem
surgir somente no longo prazo, portanto, o tratamento parece ser eficaz
numa perspectiva de longo prazo, mas não no curto prazo. A taxa de
desconto tem grande importância para essa comparação, pois ela faz com
que o futuro distante seja menos importante. Outra razão é que a intervenção pode precisar ser repetida durante vários anos para garantir os
potenciais ganhos em saúde. Este é o caso da TRO, que pode precisar ser
administrada diversas vezes durante vários anos para evitar mortes por
doenças diarréicas entre crianças pequenas, e o caso da profilaxia da penicilina para evitar mortes por infecção em crianças com anemia falciforme
(DCP2 , Capítulos 19 e 34). Finalmente, uma intervenção pode ter custos
iniciais significativos que precisem ser amortizados durante um determinado período. O DCP2 utiliza 10 anos como padrão para esses casos.
A cobertura das intervenções existentes é outro fator crucial de contexto na utilização da análise de custo-eficácia. Quando os formuladores
de políticas decidem como alocar os recursos, eles podem comparar intervenções que sejam relativamente mais ou menos custo-efetivas à luz da
atual prestação de serviços. Algumas intervenções, por exemplo, podem
ser extremamente custo-efetivas mas ter pouca cobertura. Constituem
oportunidades negligenciadas que os formuladores de políticas devem
examinar com mais atenção. Salvo outros fatores contraditórios, são
provavelmente intervenções que teriam um grande efeito sobre a saúde
por um custo relativamente baixo.
O DCP2 relata, principalmente, os coeficientes de custo-eficácia como
se eles fossem independentes do nível e da escala de intervenções, embora o custo-eficácia incremental da maioria das intervenções também irá
variar com o nível de cobertura do serviço. O custo de atingir o primeiro
1% de uma população pode ser bastante alto quando os custos fixos da
compra de equipamentos, treinamento de pessoal e estabelecimento de
sistemas de gestão são levados em conta e podem produzir relativamente
poucos ganhos em saúde. À medida que a cobertura aumenta, entretanto, o custo médio pode diminuir e as melhorias em saúde podem aumentar, resultando em um aumento substancial do custo-eficácia de alcançar
um grupo adicional, como por exemplo, aumentando a cobertura de 50
para 51%. Uma vez que a cobertura é alta, alcançar os segmentos da população restantes e freqüentemente marginalizados pode ser muito dis54 | Prioridades em Saúde
pendioso sem o grande ganho em saúde correspondente e, conseqüentemente, o custo-eficácia piorará. Consideremos a experiência da erradicação da varíola. Em um determinado momento da campanha, grandes
áreas do mundo estavam livres da varíola e sua erradicação passou a
depender da identificação dos últimos redutos do vírus e de uma resposta intensa e rápida colocando em quarentena as pessoas infectadas e vacinando todas as outras pessoas daquelas áreas. Atualmente, a campanha da
pólio enfrenta um desafio semelhante: chegar até algumas crianças em
áreas rurais da Índia e Sudão e vaciná-las é muito mais dispendioso do
que tratar um número muito maior em áreas urbanas, mas a eliminação
da doença justifica esses altos custos. Um processo semelhante ocorre com
o fornecimento de cuidados básicos de saúde, pois o fornecimento é geralmente menos dispendioso por pessoa em áreas densamente povoadas do
que naquelas com população esparsa.
Além da prevalência da doença e da cobertura existente, os formuladores de políticas precisam levar em conta outros fatores locais. O DCP2
oferece estimativas baseadas em médias regionais de preços unitários1,
mas os preços locais e a disponibilidade de insumos podem ser substancialmente diferentes das médias regionais. Portanto, o primeiro ponto a
ser considerado é se os preços de um determinado país estão próximos ou
são muito diferentes da média regional. Um segundo ponto a considerar
é se os preços dos principais insumos sofreram alterações desde a análise
original. Uma das alterações mais significativas desde a edição anterior do
Disease Control Priorities in Developing Countries (Jamison e outros 1993)
foi a queda dos preços de medicamentos anti-retrovirais.
Conseqüentemente, o tratamento anti-retroviral é substancialmente mais
custo-efetivo hoje do que há uma década. Outras reduções nos custos dos
exames diagnósticos e formas alternativas de dispensação dos medicamentos podem aumentar ainda mais o custo-eficácia do tratamento antiretroviral no futuro próximo.
Finalmente, o custo-eficácia da maioria das intervenções em saúde
depende também da qualidade do funcionamento do sistema de saúde
(DCP2, Capítulo 3). A maior parte dos autores dos capítulos do DCP2
baseia o cálculo dos coeficientes de custo-eficácia na premissa de que
exista um sistema de saúde em funcionamento para prestar a intervenção;
contudo, a validade dessa premissa varia imensamente de um país para
outro. Se um país possui um sistema de saúde particularmente frágil, as
intervenções que dependem muito de profissionais médicos, de tratamentos complexos, ou de sistemas de informação sofisticados, não serão
1
Quando só havia dados relativos a preços disponíveis para alguns países de uma região, os
autores do DCP2 tentavam selecionar um preço que tivesse maior probabilidade de ser
representativo daquela região, mesmo que não representasse o cálculo da média.
Análise de custo-eficácia | 55
tão custo-efetivas na prática quanto seriam em países com sistemas de
saúde mais sólidos.
A experiência do lançamento da AIDPI (DCP2, Capítulo 63) demonstra até que ponto o funcionamento dos sistemas de saúde pode influenciar o custo-eficácia das intervenções em saúde. Experiências em vários
municípios do Brasil e da Tanzânia demonstram que o pacote de intervenções da AIDPI não apenas melhora os resultados de saúde das crianças, como também pode ser realmente econômico (poupando custos)
por meio da redução de cuidados inadequados e do uso excessivo de
medicamentos. Entretanto, na maioria dos países de renda baixa e média
o pacote da AIDPI encontrou dificuldades de implementação e não
cumpriu sua promessa de custo-eficácia por causa da elevada rotatividade
e desgaste do pessoal treinado, provimentos inadequados e insuficiência
de recursos financeiros.
RESUMO PARA O USO APROPRIADO DA ANÁLISE
DE CUSTO-EFICÁCIA
Aplicação eficaz de recursos significa gastar dinheiro com coisas que influenciam a saúde e para tanto é necessário conhecimento científico sobre
fatores de risco, doenças, bioquímica, comportamento social etc. mas, esse
conhecimento científico por si só, não é capaz de determinar quais intervenções terão maior impacto. Para determinar a melhor alocação de
recursos públicos, os formuladores de políticas precisam de informações
sobre custos relativos para definir que combinação de intervenções pode
produzir as maiores melhorias em saúde. A análise de custo-eficácia é a
ferramenta para ponderar os diferentes custos e resultados em saúde
quando os formuladores de políticas precisam tomar decisões sobre a alocação de recursos. Para tanto, essa análise fornece aos formuladores de
políticas o “preço” do alcance de melhorias em saúde por meio de diferentes tipos de intervenção, ajudando-os assim a tomar decisões que
aproveitem da melhor forma seus recursos financeiros.
Em última análise, conhecer quais são as intervenções que funcionam
e a que custo tem que ser adaptado ao conhecimento sobre as instituições
e a implementação. Somente por meio da combinação dos conhecimentos científico e prático os formuladores de políticas podem identificar as
intervenções que terão o maior impacto na prática. Portanto, as análises
de custo-eficácia apresentadas no DCP2 e neste livro fornecem uma
importante contribuição para debates mais amplos sobre decisões de
políticas públicas relativas à saúde.
O DCP2 reúne as melhores evidências disponíveis sobre o custo-eficácia de diferentes intervenções. Para usar esses números adequadamente,
os leitores devem:
56 | Prioridades em Saúde
• levar em consideração os coeficientes de custo-eficácia relatados para
suas regiões como uma primeira aproximação e classificar as intervenções em grandes categorias
• avaliar se os coeficientes calculados poderiam ser substancialmente
diferentes em seus países porque os preços, a demografia, a epidemiologia, ou a cobertura dos serviços diferem significativamente da
média regional
• considerar se as intervenções custo-efetivas tratariam importantes
fontes de carga de doença em seus países
• determinar se as intervenções custo-efetivas seriam viáveis em face das
instituições existentes e das experiências com a implementação em
seus países
• avaliar as intervenções custo-efetivas em termos da forma como distribuiriam as melhorias em saúde e se essa distribuição seria igualitária
em seus países.
Ao final dessa análise de evidências internacionais, os países poderão
alcançar melhores níveis de saúde para suas populações porque podem
avaliar claramente os custos e conseqüências dos diferentes cursos de
ação.
Análise de custo-eficácia | 57
Capítulo 4
Estratégias de maior custo-eficácia
para a carga excessiva de doenças
em países em desenvolvimento
Muitas das doenças e das condições de saúde que respondem por uma
grande parte da carga de doenças nos países de baixa renda e de renda
média são bem menos comuns em países de renda alta. Essas cargas estão
associadas principalmente a doenças infecciosas, saúde reprodutiva e
doenças infantis. Apenas oito doenças e condições são responsáveis por
29% de todas as mortes em países de baixa renda e de renda média: tuberculose, HIV/AIDS, doenças da diarréia, doenças infantis evitáveis por
vacinação, malária, infecções respiratórias, condições maternas e mortes
neonatais.
Cerca de 17,6 milhões de pessoas nos países de baixa renda e de renda
média morrem a cada ano de doenças transmissíveis e de condições
neonatais e maternas. A ocorrência e as taxas de mortalidade dessas
doenças e condições são bem menores do que em todos os países de renda
alta. Isso ocorre, em parte, devido à existência de mais riqueza, de melhores condições de vida em geral e de fatores ambientais e climáticos
diferentes, mas também devido ao uso de intervenções de saúde custoefetivas. Muitas das doenças responsáveis pelas maiores diferenças nas
condições de saúde entre países de baixa renda e de renda média e países
de renda alta são também doenças para as quais as estratégias custo-efetivas são conhecidas, disponibilizadas e viáveis.
Se os países de baixa renda e de renda média atingissem as mesmas
taxas de mortalidade dessas doenças que os países de renda alta, o número
de mortes cairia de 17,6 milhões para 3,0 milhões por ano. A diferença,
cerca de 14 milhões de mortes, representa uma medição da carga excessiva das más condições da saúde nos países de baixa renda e de renda
média. A aplicação de medidas conhecidas e custo-efetivas a essas doenças
poderia reduzir consideravelmente muitas mortes desnecessárias.
Várias medidas custo-efetivas de tratamento de doenças transmissíveis
e de doenças maternas e neonatais já eram conhecidas quando a primeira
edição de Disease Control Priorities in Developing Countries (Prioridades
59
no controle de doenças em países em desenvolvimento) (Jamison e outros,
1993) foi publicada. A terapia de reidratação oral tinha demonstrado ser
custo-efetiva na redução de fatalidades associadas à diarréia infantil. O
acompanhamento pré-natal e o atendimento especializado durante o
parto, a imunização contra o tétano e os cuidados de higiene do cordão
umbilical de um recém-nascido, a imunização contra doenças infantis e a
estratégia de tratamento de curta duração supervisionado (DOTS) para
controle da tuberculose também já eram conhecidos; todas são medidas
custo-efetivas para o tratamento dessa carga excessiva de doenças. O
DCP2 apresenta informações que confirmam muitas dessas conclusões
prévias, mas também apresenta uma preocupação com as novas evidências, por exemplo, a emergência de cepas de malária, tuberculose e HIV
resistentes a medicamentos, além da grande concentração de mortes
infantis que ocorrem nos primeiros 28 dias de vida.
Este capítulo pode abordar somente uma seleção das doenças tratadas
em DCP2 que constitui a carga excessiva de doenças em países de baixa
renda e de renda média. (Para obter uma lista completa das doenças transmissíveis e das condições maternas e neonatais abordadas em DCP2, consulte o capítulo 1, box 1.1 e o apêndice.) Além disso, as descrições a seguir
podem destacar apenas algumas das conclusões para cada uma das doenças
incluídas. Para obter uma descrição mais detalhada e completa, consulte os
capítulos DCP2 associados, conforme mencionado neste capítulo.
DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS E INFECCIOSAS
“As doenças infecciosas
respondem por menos de
2% das mortes em países
de renda alta, mas ... por
21% das mortes em países de baixa renda e de
renda média.”
60 Prioridades em Saúde|
As doenças infecciosas respondem por menos de 2% das mortes em países de renda alta, mas são responsáveis por 21% das mortes em países de
baixa renda e de renda média. As doenças infecciosas revelam uma diferença evidente nas condições de saúde entre os países ricos e pobres precisamente porque as intervenções custo-efetivas estão disponíveis para
evitar e tratar muitas delas.
As doenças infecciosas representam uma série de desafios. Algumas são
transmitidas diretamente de uma pessoa para outra, outras por contato
com insetos ou outros animais. O sistema imunológico do corpo humano
resiste bem a algumas doenças, enquanto a outras, inclusive as doenças
auto-imunes, atacam e enfraquecem o próprio sistema imunológico.
Algumas apresentam sintomas óbvios e visíveis em pouco tempo, enquanto outras ficam ocultas por anos antes de se tornarem ativas. As doenças
infecciosas também variam em termos de virulência, infecciosidade e
duração, e os agentes infecciosos de algumas desenvolvem resistência a
medicamentos mais rapidamente que outros.
Três doenças transmissíveis, HIV/AIDS tuberculose e malária, respondem por cerca de 10% das mortes nos países de baixa renda e de renda
média. Uma análise apenas dessas três doenças sugere a imensa variedade
de doenças infecciosas e demonstra por que as estratégias de tratamento
correspondentes devem ser tão diferentes. O HIV/AIDS é transmitido
principalmente por meio de contato sexual, a tuberculose via inalação de
gotículas infecciosas no ar e a malária exclusivamente por picadas de mosquito. O HIV/AIDS ataca o sistema imunológico do corpo, a tuberculose
ataca principalmente os pulmões e a malária debilita a corrente sanguínea, além de poder atacar o cérebro, o fígado e outros órgãos. O
HIV/AIDS não tratado é quase que invariavelmente letal, sendo que a
tuberculose e a malária também podem ser fatais.
Outros 10% das mortes nos países de baixa renda e de renda média são
atribuídos a outras doenças causadas por agentes infecciosos ou transmissíveis. Para muitas dessas doenças, como a coqueluche, o tétano e a
difteria, existem vacinas disponíveis e a cobertura universal é viável.
Contudo, milhões de crianças permanecem sem vacina e, conseqüentemente, correm o risco de contrair doenças ou ainda de morrer. As
infecções também causam doenças da diarréia que levam a mortes
desnecessárias quando as crianças não recebem o devido tratamento e
morrem de desidratação.
“. . . HIV/AIDS, tuberculose e malária, respondem
por cerca de 10% das
mortes nos países de
baixa renda e de renda
média.”
HIV/AIDS
O HIV se espalhou pelo mundo em pouco tempo, mas encontra-se
desproporcionalmente concentrado em países de baixa renda1. Em 2004,
ocorreram cerca de 2,9 milhões de mortes atribuídas a AIDS nos países de
baixa renda e de renda média, comparadas a cerca de 22.000 mortes nos
países de renda alta. A África Subsaariana é a região mais afetada pela epidemia. Com apenas 10% da população mundial, essa região representa
66% de todos os casos de HIV e mais de 75% das mortes relacionadas com
a AIDS. Os países da Ásia e do Pacífico não possuem taxas de incidência
tão altas quanto às da África Subsaariana, mas as populações são
numerosas e a incidência está aumentando. Em 2004, ocorreram cerca de
505.000 mortes relacionadas a AIDS nessa região, representando cerca de
17% de todas as mortes decorrentes de AIDS.
Quando a doença foi identificada pela primeira vez no início da década de 1980, a maioria das pessoas com HIV/AIDS eram homens. A proporção de mulheres afetadas pela epidemia vem aumentando constantemente: até 2004, as mulheres e meninas respondiam por cerca de 50% de
todas as pessoas que vivem com HIV/AIDS, e na África Subsaariana, as
mulheres e meninas representam 57% de todas as pessoas infectadas.
O HIV é transmitido principalmente por meio de relação sexual, que
representa aproximadamente 80% de todas as infecções. O HIV é também
transmitido via exposição a sangue infectado e passa de mãe para filho
1
“Em 2004, ocorreram
cerca de 2,9 milhões de
mortes atribuídas a AIDS
nos países de baixa renda
e de renda média, comparadas a cerca de 22.000
mortes nos países de
renda alta.”
Esta seção é baseada em DCP2, capítulos 17 e 18.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 61
. . . os tratamentos existentes poderão evitar a
ocorrência de 63% de
todas as infecções projetadas entre 2002 e 2010.”
62 Prioridades em Saúde|
durante o parto ou a amamentação. As iniciativas de reversão da epidemia
baseiam-se em estratégias preventivas. Em termos de transmissão sexual e
exposição a sangue infectado, essas medidas incluem: educar as pessoas
sobre a infecção e sobre como é transmitida, incentivar o uso de preservativos e a redução de contato sexual com parceiros concomitantes, examinar o sangue a ser usado em transfusões, estabelecer a necessidade de
descarte das seringas aplicadas em usuários de drogas, e incentivar o acesso universal a seringas descartáveis nos ambientes de cuidados de saúde.
Os medicamentos anti-retrovirais podem ser usados para impedir a
Transmissão de Mãe para Filho (MTCT) durante o parto; a transmissão
perinatal também pode ser reduzida, limitando-se a duração da amamentação e evitando-se a alimentação mista. As estratégias de controle da epidemia também devem incluir regimes de tratamento que utilizam a terapia anti-retroviral (ART), que pode aumentar o tempo de vida e melhorar a qualidade de vida das pessoas aidéticas.
Apesar dessas iniciativas, as tentativas globais não têm sido suficientes
para controlar a disseminação da pandemia ou prolongar as vidas da
maioria das pessoas infectadas. O nível desejado de sucesso ainda não foi
atingido por diversas razões. A maioria das pessoas que poderiam se beneficiar das estratégias de controle disponíveis (incluindo tratamento)
não têm acesso a elas. A modelagem da epidemia tem determinado que os
tratamentos existentes poderão evitar a ocorrência de 63% de todas as
infecções projetadas entre 2002 e 2010. Contudo, até agora, menos de uma
dentre cinco pessoas com alto risco de infecção teve acesso aos mais básicos serviços de prevenção, como preservativos, educação sobre a AIDS,
prevenção de MTCT, orientação e testes voluntários, além de programas
de redução de danos. Além disso, os cuidados com as pessoas infectadas
com HIV têm sido historicamente limitados nos ambientes dos países em
desenvolvimento, e a cobertura da terapia anti-retroviral não tem sido
disponibilizada para a maioria das pessoas que vivem em países com
recursos escassos (grandes exceções: Argentina, Brasil e México). Em
resumo, os programas nacionais carecem dos meios para realização de
uma abordagem abrangente com relação ao HIV/AIDS.
Outra grande barreira para o desenvolvimento de estratégias adequadas de controle é a falta de dados sobre a melhor forma de implementar pacotes de intervenções existentes em nível adequado para maximizar
o efeito de intervenções e proteger os direitos humanos das pessoas afetadas pela epidemia. Durante a última década, os governos e as ONGs têm
acumulado experiências limitadas mas valiosas com estratégias de prevenção e de tratamento em uma grande variedade de ambientes, possibilitando a identificação e o empenho dos princípios gerais de sucesso.
Todavia, a epidemia continua a se disseminar, mas de modo bem menos
acelerado em países, como Brasil, México, Senegal, Tailândia e Uganda,
onde as políticas nacionais têm tratado a epidemia de AIDS com seriedade
e implementado programas nacionais de controle da doença (consulte
box 4.1 e box 4.2). Esses programas bem-sucedidos tiveram diversos
aspectos em comum, incluindo liderança política de alto nível,
participação ativa da sociedade civil e de líderes religiosos, programas
baseados em populações destinados a alterar normas sociais, incentivo no
uso de preservativos, fiscalização e controle de infecções sexualmente
transmissíveis (STIs), programas de combate ao estigma e discriminação,
e intervenções direcionadas às populações “ponte”.
Talvez o maior desafio para um controle global efetivo do HIV/AIDS,
contudo, seja a falta de evidências confiáveis no sentido de orientar a
seleção de intervenções de cuidados e de prevenção em populações ou
áreas específicas. Do mesmo modo que os formuladores globais de política reconhecem cada vez mais a necessidade de uma avaliação rigorosa de
programas de desenvolvimento para garantir o sucesso e eliminar fracassos, a necessidade de avaliações científicas confiáveis de programas de
controle da AIDS é também um ponto crucial pelas mesmas razões. A
falta de dados sobre a eficácia e o custo de intervenções como meio de orientação para a tomada de decisões políticas fundamentadas significa que
a alocação atual de recursos para a prevenção de HIV/AIDS é raramente
baseada em evidências.
“. . . a epidemia continua
a se disseminar, mas de
modo bem menos acelerado em países onde as
políticas nacionais têm
tratado a epidemia de
AIDS com seriedade. . .”
foram desenvolvidas no sentido de selecionar estratégias apropriadas
Box 4.1 Epidemia de HIV/AIDS em Uganda
Como muitos países na África Subsaariana, Uganda sofreu um rápido aumento da incidência
de HIV e uma generalização da epidemia no final da década de 1980 e no início dos anos 90.
Até 1991, a incidência global de HIV era de 21% (Low-Beer e Stoneburner, 2003); contudo, a
trajetória da epidemia em Uganda foi bem diferente da epidemia dos países vizinhos. Até
2001, a incidência global de HIV caiu até 5%, com reduções drásticas na incidência entre as
principais populações, como soldados, mulheres grávidas e mulheres jovens (USAID, 2002).
Os principais componentes do programa de prevenção de HIV de Uganda incluem:
• grande apoio político, principalmente, do Presidente Yoweri Museveni
• intervenções de empoderamento de mulheres e meninas
• grande ênfase na juventude
• iniciativas atuantes no combate ao estigma e discriminação
• ênfase na comunicação aberta sobre HIV/AIDS
• participação da liderança religiosa e de organizações baseadas na fé/credos
• criação das primeiras intervenções de orientação e testes voluntários confidenciais da
África
• ênfase no controle e na prevenção de infecções sexualmente transmissíveis.
Fonte: DCP2, capítulo 18, box 18.5.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 63
Box 4.2 Programa de uso obrigatório de preservativos na Tailândia
A incidência de HIV na Tailândia, incentivada principalmente pelas altas taxas de exploração
sexual e pelos baixos níveis de uso de preservativos, começou a aumentar rapidamente no
final da década de 1980. No início de 1989, o governo tailandês começou uma campanha
nacional de educação e de distribuição de camisinhas, focalizando os profissionais do sexo e
seus clientes, para garantir 100% de uso da camisinha em todos os encontros sexuais.
Alguns elementos contribuíram bastante para o sucesso do programa como, por exemplo:
•
•
•
•
•
•
•
•
ordens do governo obrigando o uso de camisinhas em estabelecimentos de exploração
sexual
campanha de publicidade para incentivo em massa do uso de preservativos
educação em estabelecimentos de exploração sexual
distribuição de camisinhas pelo governo
teste e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis
fiscalização e acompanhamento de infecções nos pontos de origem
grande comprometimento político e financeiro
envolvimento ativo de governos locais e municipais.
Apesar desse sucesso sem precedentes, as evidências indicam que o cumprimento do
Programa de uso obrigatório de preservativos não está tão acirrado hoje em dia quanto
no início da implementação do programa. Um estudo recente em Bangcoc concluiu que
89% dos profissionais do sexo usavam camisinhas, ou seja, houve uma redução dos
96% em 2000 (UNDP, 2004).
Fonte: DCP2, capítulo 18, box 18.4.
“. . . onde a incidência
de infecção por HIV é
pequena, providências
imediatas e eficazes
devem ser tomadas o
mais rápido possível.
64 Prioridades em Saúde|
de prevenção e de tratamento, com base no perfil epidemiológico de cada
país (a caracterização da epidemia individual, com base na incidência de
infecção em determinadas populações, como profissionais do sexo, homens que têm relações sexuais com outros homens, ou usuários de droga
intravenosa, e na população em geral) e no contexto político, cultural e
econômico de cada lugar.
Essas categorias são listadas na Tabela 4.1, “Perfis da epidemia” (com a
categoria da epidemia generalizada também subdividida em categorias
inferiores e superiores). Essas categorias podem ser usadas para o desenvolvimento de diretrizes de prevenção.
Nos países onde a incidência de infecção por HIV é pequena, providências imediatas e eficazes devem ser tomadas o mais rápido possível. A coleta de dados é muito importante para avaliar o avanço da epidemia e direcionar a política pública. O mapeamento das principais populações para o
aprendizado sobre os comportamentos associados à infecção e o acompanhamento da taxa de infecção podem fornecer informações valiosas na
tomada de providências apropriadas e oportunas. O conhecimento básico
sobre como o HIV é transmitido e como obter e usar preservativos deve ser
transmitido por meio de campanhas dos meios de comunicação de massa
e de programas nas escolas. Essas atividades de informação, educação e
comunicação (IEC) devem responder às atitudes predominantes referentes
Tabela 4.1 Perfis da epidemia
Maior incidência em uma
determinada população
profissionais do sexo,
usuários de droga, MSMs)
Incidência na
população
em geral
Nível baixo
⬍ 5%
⬍ 1%
Oriente Médio e Norte da África
Concentrado
⬎ 5%
⬍ 1%
Leste Asiático e Pacífico,
Europa e Ásia Central,
América Latina e Caribe,
Sul da Ásia
Generalizado baixo
ⱖ 5%
1–10%
África Subsaariana
Generalizado alto
ⱖ 5%
ⱖ 10%
África Subsaariana
Regiões da OMS
Fonte: UNAIDS 1997.
à atividade sexual, uma vez que irão definir como as pessoas entendem os
materiais educacionais. As políticas públicas também devem garantir que
as camisinhas sejam disponibilizadas de imediato por meio dos canais
existentes, como farmácias, clínicas e lojas de alimentos. Além disso, as
instalações de saúde devem examinar todos os produtos do sangue a
serem usados em transfusões e utilizar agulhas esterilizadas em todas as
injeções, uma vez que a taxa de transmissão do vírus através desses meios
é alta. Além disso, uma vez que a infecção se dissemina com rapidez entre
os usuários de droga intravenosa, são necessários programas de prevenção
para esta população em especial, mesmo onde a infecção for relativamente
desconhecida.
Nos países com uma epidemia concentrada, medidas adicionais são
necessárias. Os programas cuja finalidade é evitar a transmissão entre
populações com alto risco de contração ou transmissão de infecção são de
grande importância, inclusive o programa VCT (orientação e teste voluntários) para determinados indivíduos e programas com pessoas do
mesmo grupo que educam indivíduos pertencentes a grupos de risco,
incentivam comportamentos seguros e distribuem camisinhas. O exame e
o tratamento das infecções sexualmente transmissíveis devem ser incentivados e as mulheres grávidas que se encaixem em um perfil de alto risco
devem ter a oportunidade de participar de uma série de exames e de um
tratamento de HIV, em proveito próprio, e para reduzir a probabilidade
de transmissão de mãe para filho.
Em um nível generalizado baixo da epidemia, como na Tanzânia, a
ênfase em tratamentos direcionados deve ser mantida ou mesmo fortalecida, mas tratamentos para populações mais abrangentes também devem
ser implementados de forma agressiva. Essas prioridades de prevenção
devem incluir a fiscalização de infecções sexualmente transmissíveis, comportamentos de risco e infecções por HIV em toda a população, com espeEstratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 65
“. . . uma epidemia generalizada de nível alto. . . é
uma emergência nacional
que requer a mais enérgica
providência pública
possível.”
“As vidas das pessoas
infectadas com o vírus do
HIV/AIDS também podem
ser bastante melhoradas e
prolongadas por meio de
apoio psicológico, tratamento de infecções oportunistas, terapia antiretroviral e cuidados
paliativos. . .”
cial ênfase nos jovens; extensão das atividades IEC dos meios de comunicação de massa além de educação básica; testes confidenciais e voluntários
de rotina de HIV, além de exames e tratamento de doenças sexualmente
transmissíveis promovidos para outras populações; marketing social e
subsidiado de camisinhas e distribuição intensificada para garantir acesso
universal; oferta de exames de HIV a todas as mulheres grávidas, e a
ampliação de abordagens afins e atividades IEC direcionadas para
inclusão de todas as populações com taxas mais elevadas de infecções sexualmente transmissíveis e comportamento de risco.
Em uma epidemia generalizada de nível alto, como em Botsuana e
Zimbábue, a epidemia é uma emergência nacional que requer a mais
enérgica providência pública possível. Os testes de rotina de HIV, junto
com o tratamento e os exames de infecções sexualmente transmissíveis
devem ser incentivados de forma universal. Devem ser desenvolvidas
estratégias inovadoras de massa que atinjam grandes contingentes de pessoas com informações, exames e camisinhas, por exemplo, em locais de
trabalho, canais de trânsito, comícios de partidos políticos, escolas e universidades e bases militares, e via associações de jovens, uniões de trabalhadores e movimentos de fazendeiros. É muito importante a distribuição
gratuita de camisinhas em todos os canais possíveis. O programa de orientação e testes voluntários deve ser promovido para todos os casais que
estejam iniciando uma vida sexual. A pobreza, a educação e o status social
das mulheres, fatores importantes em todas as epidemias, devem ser as
principais preocupações. A prioridade principal deve ser a alteração das
normas de gênero e a redução das restrições legais, sociais e econômicas
com relação às meninas e mulheres em geral.
Além dessas estratégias preventivas, são necessárias estratégias apropriadas em termos de cuidados e tratamento. Os pesquisadores têm
desenvolvido novas terapias para o tratamento do HIV/AIDS, algumas
mais fáceis de administrar e menos tóxicas do que seus predecessores. O
tratamento está também se tornando uma realidade para muitas pessoas
que vivem em países com poucos recursos, uma vez que os preços dos
medicamentos anti-retrovirais têm diminuído consideravelmente por
causa de negociações internacionais e de pressão política nas empresas de
medicamentos, da fabricação de medicamentos genéricos, e das mudanças
na política de comércio internacional para permitir o licenciamento compulsório de produtos farmacêuticos em casos de emergência e para facilitar a importação de genéricos. É preciso ressaltar que à medida que a terapia anti-retroviral se torna cada vez mais disponível, ocorre um aumento da resistência do HIV a um grande número de regimes de medicamentos anti-retrovirais, sendo freqüentemente necessária a mudança dos
2
3
66 Prioridades em Saúde|
Consulte DCP2, capítulo 52.
Consulte DCP2, capítulo 37.
pacientes da primeira linha para a segunda linha de medicamentos, que
são mais caros e que produzem efeitos colaterais mais complicados.
As vidas das pessoas infectadas com o vírus do HIV/AIDS também
podem ser bastante melhoradas e prolongadas por meio de apoio psicológico, tratamento de infecções oportunistas, terapia anti-retroviral e
cuidados paliativos, que incluem não apenas o controle do fim da vida e
das dores, mas também os problemas psicológicos, sociais e espirituais dos
pacientes e familiares. Os cuidados no estágio terminal podem ser fornecidos em inúmeros ambientes, desde hospitais e hospícios até nas casas dos
próprios pacientes. Muitas medidas de baixo custo no tratamento das
condições3 de dor,2 diarréia, náusea e pele nos indivíduos infectados
encontram-se disponibilizadas e podem melhorar a qualidade de vida dos
pacientes. A suplementação de micronutrientes, que custa apenas US$ 15
por ano, pode aumentar o peso do corpo, reduzir a carga virótica do HIV,
melhorar as contagens de CD4 e reduzir infecções oportunistas nas pessoas infectadas. Apesar da grande variedade de intervenções para o tratamento dos sintomas nas pessoas que vivem com o HIV/AIDS e o seu
baixo custo, a necessidade de cuidados paliativos para essas pessoas está
longe de ser atendida.
As campanhas de educação de massa podem reduzir o estigma da
infecção de HIV e permitir que as pessoas infectadas permaneçam
envolvidas em suas comunidades. Um apoio psicossocial direto também
pode fazer uma grande diferença. Estudos na África do Sul e na Tailândia
têm demonstrado que o acesso a serviços de saúde mental e à orientação
correspondente contribui bastante para a qualidade de vida dos pacientes
e, em alguns casos, esteve até mesmo associado à redução da mortalidade.
O diagnóstico, o tratamento e a gestão das infecções oportunistas que
ameaçam a vida continuam sendo um dos aspectos mais importantes
referentes aos cuidados com pacientes com HIV. Quando o HIV começa a
enfraquecer o sistema imunológico dos pacientes, o que tende a ocorrer
dentro de cinco a sete anos após a infecção, bactérias, fungos, vírus e até
mesmo cânceres que poderiam ser mantidos sob controle tornam-se
ativos e prejudiciais. Algumas infecções como pneumonia, tuberculose4,
além da candidíase oral e esofageana são relativamente fáceis de diagnosticar e possuem um tratamento custo-efetivo, enquanto outras, como a
doença citomegalovirótica e o complexo avio micobacteriano, são difíceis
de diagnosticar e possuem um tratamento bastante caro. Nesse último
caso, a terapia anti-retroviral, que reduz a carga virótica de HIV, melhorando portanto o sistema imunológico, pode ser mais custo-efetiva do que
o tratamento da própria infecção. Algumas infecções oportunistas
caracterizam-se por umo custo-eficácia em termos de prevenção, e uma
4
Consulte DCP2, capítulo 16.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 67
“É preciso haver muito
mais pesquisa no custoeficácia de tratamentos de
combate ao HIV/AIDS . . .”
68 Prioridades em Saúde|
simples profilaxia, com o cotrimoxazol que evita a pneumonia
Pneumocystis jiroveci, influencia a sobrevivência de forma positiva.
Entretanto, a profilaxia das infecções oportunistas não é utilizada do
modo apropriado nos países de baixa renda e de renda média e,
infelizmente, o benefício possui curta duração, uma vez que não impede
a erosão implacável do sistema imunológico nos indivíduos infectados. O
único modo de se deter o avanço da doença nessas pessoas é a interrupção
da réplica virótica por meio de uma terapia anti-retroviral.
Houve um aumento nas perspectivas de tratamento das pessoas infectadas com HIV com medicamentos anti-retrovirais nos países de baixa
renda e de renda média, mas a terapia anti-retroviral continua a ser um
desafio dispendioso e complexo. O custo da terapia anti-retroviral em
alguns países em desenvolvimento caiu de US$ 15.000 por ano por
paciente para menos de US$ 150 por ano. Esse preço mais baixo está ao
alcance de muitos países de renda média, mas ainda é uma carga substancial para os países de baixa renda, onde as despesas anuais com saúde
pública são geralmente menores que US$ 20 por pessoa a cada ano. A OMS
e o Programa Conjunto das Nações Unidas para HIV/AIDS calculam que
somente cerca de 7% de um total de quase 6 milhões de pessoas que necessitam de tratamento consigam recebê-lo e que o número de pessoas que
necessitam de terapia anti-retroviral aumente cerca de 8.000 por dia.
O DCP2 (capítulo 18) descreve os diversos regimes disponíveis para o
tratamento de primeira linha de HIV/AIDS quando não ocorre resistência
aos medicamentos e para as terapias de segunda e terceira linha quando há
resistência. Os medicamentos preferidos de primeira linha nos países em
desenvolvimento são definidos pela eficácia diferencial de diversas combinações, além de preocupações com preços e patentes. Quase todas as terapias anti-retrovirais altamente ativas possuem alguns efeitos colaterais,
desde o mais simples a ser tratado (por exemplo, anemia, com suplementação de ferro) até o mais complexo (lipodistrofia e doença cardiovascular).
Para obter o máximo de benefício da terapia anti-retroviral, a adesão
deve ser quase perfeita (além de 90%); nos casos de adesão subótima, a
resistência pode se desenvolver em menos de duas semanas. Experiências
com a terapia anti-retroviral no Haiti e em Uganda mostraram que programas que implementam tratamento com observação direta podem
atingir altas taxas de adesão aos medicamentos em países de baixa renda,
sendo às vezes mais altas do que em países de renda alta. Todavia, a alta
taxa de adesão não pode ser considerada como garantida, uma vez que
estudos na Índia, no México e no Senegal têm mostrado baixas taxas de
adesão, demonstrando a necessidade de mais pesquisa em intervenções
eficazes para aumentar a adesão.
O confronto da epidemia de HIV requer apreciação das inúmeras interconexões entre tecnologia, economia, política e comportamento. Quando
as celebridades e os líderes políticos endossam campanhas públicas para
aumentar a conscientização e normalizar a discussão pública do HIV, as
abordagens técnicas e comportamentais ganham um maior nível de
aceitação. Quando os desenvolvimentos técnicos tornam o exame mais preciso, mais barato e mais fácil, a orientação e os testes voluntários podem ser
melhor direcionados e se tornarem mais eficazes. Quando a concorrência
genérica reduz o custo dos medicamentos, quando a ajuda internacional
torna-se disponível para a compra desses medicamentos, e quando os programas sociais incentivam a adesão aos regimes de medicamentos, a terapia
anti-retroviral torna-se mais custo-efetiva e financeiramente possível.
É preciso haver muito mais pesquisa no custo-eficácia de tratamentos
de combate ao HIV/AIDS, e os números em DCP2, capítulo 18, devem ser
interpretados com o reconhecimento de que os tratamentos e os respectivos custos estão mudando rapidamente. O DCP2, capítulo 2, relata que
o diagnóstico e o tratamento das infecções sexualmente transmissíveis
custam cerca de US$ 57 por AVAD evitado, enquanto os programas de
segurança em termos de sangue e agulhas custam cerca de US$ 84 por
AVAD evitado. O tratamento das infecções oportunistas custa cerca de
US$ 150 por AVAD evitado, enquanto que a prevenção e o tratamento da
co-infecção com tuberculose custam cerca de US$ 120 por AVAD evitado.
É difícil calcular o custo-eficácia da terapia anti-retroviral, uma vez que
isso depende do preço dos medicamentos, da incidência de cepas
resistentes a medicamentos, dos custos de diagnóstico, e da eficácia do sistema de saúde no fornecimento de medicamentos de forma apropriada.
Enquanto a terapia anti-retroviral tem menos probabilidade de ser tão
custo-efetiva quanto essas outras intervenções, o tratamento é um importante componente de toda uma estratégia global em nível nacional de
combate e de controle do HIV que não pode ser ignorado. O fato de poder
ser estendido de forma eficiente aos países de baixa renda é um teste
importante para os próprios países afetados e para a comunidade
internacional.
Os maiores desafios da pesquisa no cuidado e no tratamento para os
países em desenvolvimento não giram em torno do desenvolvimento de
novos medicamentos, mas sim em torno da adaptação das estratégias de
cuidados e de tratamento para os ambientes com baixa renda, baixa tecnologia, baixa capacidade de recursos humanos de forma a maximizar a
adesão; minimizar a toxicidade, monitoramento e custo; e maximizar o
prolongamento da alta qualidade de vida com a terapia anti-retroviral, ou
seja, tudo isso sem prejudicar as infra-estruturas existentes de cuidados de
saúde já fragilizadas.
A sinergia entre prevenção e tratamento deve ser considerada no
esforço de alocação dos recursos limitados. Embora a prevenção do
HIV/AIDS seja normalmente mais custo-efetiva do que o tratamento cor-
“Embora a prevenção do
HIV/AIDS seja normalmente mais custo-efetiva
do que o tratamento correspondente, as decisões
para alocação de fundos
públicos são complicadas
pelas interações entre
prevenção e tratamento.”
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 69
respondente, as decisões para alocação de fundos públicos são complicadas pelas interações entre prevenção e tratamento. A disponibilização
do tratamento pode remover alguns dos estigmas e dos medos associados
a AIDS e facilitar o contato com as pessoas infectadas, além de ajudar na
orientação de modo a evitar futuras transmissões. O tratamento também
pode reduzir a infecciosidade. Contudo, existem preocupações quanto ao
fato de a disponibilidade do tratamento poder reduzir inibições e levar a
um comportamento mais arriscado (conforme documentado nos Estados
Unidos, Canadá e Europa). Uma baixa adesão ao tratamento também
pode incentivar a resistência aos medicamentos, enquanto o aumento da
longevidade como resultado do tratamento pode expor mais parceiros.
O efeito real da interação de prevenção e tratamento é provavelmente
diferente entre um país e outro, de modo que um estudo e um monitoramento mais abrangentes das inter-relações são essenciais.
O controle do HIV/AIDS requer estratégias e políticas que tratem da
prevenção e do tratamento com recursos limitados. Já existem muitas
informações sobre a doença, o tratamento e estratégias específicas, a interação entre prevenção e tratamento, e as interconexões contextuais mais
amplas. O DCP2 apresenta a experiência acumulada e as avaliações realizadas até o momento que permitem aos formuladores de políticas selecionar estratégias apropriadas.
Tuberculose
A tuberculose continua sendo a segunda maior causa de morte por agente
infeccioso no mundo, apesar da disponibilização de medicamentos para
cura da doença há 50 anos.5 A tuberculose tem prioridade alta na agenda
internacional de saúde pública devido a essa enorme carga, devido ao
aumento nos casos de tuberculose associada à infecção do HIV e à
resistência aos medicamentos, e devido à estratégia de controle da tuberculose internacionalmente recomendada conhecida como DOTS (tratamento de curta duração supervisionado) ser reconhecida como uma das
mais custo-efetivas de todas as intervenções de saúde.
O ressurgimento da tuberculose em países de renda alta na década de
1980 surpreendeu as autoridades de saúde pública, mas as respostas públicas eficazes detiveram sua disseminação e reduziram a incidência na
Europa Ocidental e Central, na América Latina e no Caribe, e também no
Oriente Médio e na África do Norte. A tuberculose continuou a se espalhar e a matar, porém, em todos os lugares onde houve deterioração das
condições sociais, as medidas de saúde pública não surtiram efeito e o
HIV/AIDS continua predominante. Portanto, a incidência da tuberculose
aumentou no Leste Europeu, principalmente nas antigas Repúblicas
5
70 Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada em DCP2, capítulo 16.
Soviéticas, desde os distúrbios políticos no final da década de 1980, e na
África Subsaariana desde a metade da década de 80. Até 2003, foram calculados 8,8 milhões novos casos de tuberculose em todo o mundo anualmente. A mais alta taxa de incidência de população, 345 em 100.000 por
ano, encontra-se na África Subsaariana, mas os países mais populosos da
Ásia, como Bangladesh, China, Índia, Indonésia e Paquistão, respondem
por metade dos casos de tuberculose do mundo. Os epidemiologistas estimam que o aumento dessas tendências pode ser invertido se 70% dos
casos forem detectados e 85% desses curados. É preciso alcançar essa meta
se a MDM sancionada internacionalmente para redução pela metade das
taxas de incidência e de morte até 2015 precisar ser atingida.6
As intervenções de controle da tuberculose incluem a prevenção da
infecção por meio de vacinação, o tratamento de infecções latentes e o
tratamento de doenças ativas. Cerca de 80% dos recém-nascidos em todo
o mundo recebem atualmente uma vacina com cepa viva atenuada, Bacilo
de Calmette e Guérin (BCG). Ao mesmo tempo que protege as crianças
contra a meningite e a tuberculose miliar, a vacina possui pouca eficácia
contra a tuberculose pulmonar nos adultos. A vacinação ainda é custoefetiva em locais com altas taxas de incidência, mas é normalmente suspensa em países com baixa incidência, já que o risco de infecção é baixo e
a resposta do sistema imunológico à vacina torna os testes de pele com
tuberculina menos eficazes em termos de fiscalização da doença.
A identificação e o tratamento dos casos ativos é atualmente a principal e a mais eficaz medida de controle da tuberculose. A parte principal
desta abordagem é a estratégia DOTS (tratamento de curta duração
supervisionado). A estratégia DOTS significa um diagnóstico com uma
amostra positiva de escarro, tratamento a curto prazo com gestão eficaz
de caso, suprimentos regulares de medicamentos e monitoramento sistemático para avaliar os resultados de cada paciente. A gestão eficaz de
caso inclui uma supervisão freqüente por um agente de saúde ou voluntário da comunidade para garantir que o paciente esteja tomando o
medicamento. O custo adicional do monitoramento de pacientes e a
garantia da adesão desses pacientes ao regime de medicamentos, mesmo
após a parada dos sintomas, já demonstrou o custo-efiácia por causa do
impacto nas taxas de cura e, conseqüentemente, na redução da epidemia
e na limitação do desenvolvimento da resistência aos medicamentos.
Em todas as regiões, exceto na Europa e na Ásia Central, a estratégia
DOTS custa entre US$ 5 e US$ 50 por AVAD evitado. Sob determinadas
circunstâncias, essa estratégia pode economizar dinheiro e evitar novos
6
Em 2000, o G8 (Grupo de oito nações) reuniu-se em Okinawa, Japão, e informalmente
definiu metas para a redução das mortes e dos casos de tuberculose até 2010. As MDMs das
Nações Unidas definiram metas para redução pela metade dos casos e das mortes até 2015
referentes aos níveis de 1990, e a OMS está monitorando o progresso dessas metas.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 71
casos e mortes. O tratamento de pessoas com cepas resistentes a muitos
medicamentos ou também infectadas com HIV/AIDS é menos custo-efetivo, uma vez que os custos do tratamento são maiores e a eficácia e os
benefícios esperados são menores. Todavia, o custo do tratamento de
pacientes com tuberculose resistente a muitos medicamentos é relativamente pequeno quando comparado aos prováveis ganhos em termos de
vida saudável, normalmente menos de US$ 400 por AVAD evitado. O
tratamento de pessoas com infecções latentes, ou seja, pessoas infectadas
com tuberculose mas não sintomáticas, é o menos custo-efetivo, ou seja
US$ 5.500 a US$ 26.000 por AVAD evitado, quando a tuberculose é
endêmica (relativamente estável) e a incidência do HIV é baixa. Porém,
durante uma epidemia de tuberculose entre pessoas infectadas com HIV,
o fornecimento de um tratamento de infecção latente entre aqueles que
ainda não desenvolveram a doença ativa pode custar menos de US$ 100
por AVAD evitado nos países de baixa renda. A vacinação BCG também é
custo-efetiva entre US$ 40 a US$ 170 por AVAD evitado.
A pesquisa pode fornecer uma melhor variedade de intervenções no
futuro, melhorando a abordagem DOTS; estreitando a ligação entre
fornecedores privados, que em muitos ambientes são os primeiros a ver os
pacientes de tuberculose, e no setor público; melhorando o entendimento de fatores de risco; aprimorando diagnósticos; ou procurando casos de
forma ativa. O desenvolvimento de uma vacina de baixo custo e mais eficaz que a vacina BCG na proteção de adultos contra a tuberculose pulmonar revolucionaria o controle da tuberculose, desviando a ênfase do
tratamento para a prevenção. Nesse momento, a abordagem DOTS ou
outros regimes de tratamento desempenharão o papel principal.
O sucesso no controle da tuberculose está bastante ligado à capacidade
dos sistemas locais de saúde em manter um sistema eficaz na identificação
de casos, no início do tratamento e na garantia de adesão. O custo é
suportável em nível global. Em 2005, os países com altas taxas da doença
que respondem por cerca de 80% dos casos globais gastaram somente US$
1,2 bilhão, dos quais cerca de US$ 200 milhões foram provenientes de
doadores internacionais. A assistência financeira contínua internacional é
essencial para a garantia de que o controle da tuberculose possa ser mantido nos países mais pobres do mundo, onde o desafio do controle da
tuberculose está alinhado com o desafio da criação e da implementação de
programas públicos de saúde eficazes.
Malária
A malária é diretamente responsável por cerca de 2% de todas as mortes
no mundo a cada ano (estima-se 1,2 milhão de mortes) e quase 3% de
AVADs7 globais. Na África Subsaariana, a malária responde por uma
72 Prioridades em Saúde|
Figura 4.1 Ecologia e carga de malária: Manifestações clínicas
Doença de
febre aguda
Doença aguda
Hipoglicemia/
anemia/
dificuldades
respiratórias/
malária
cerebral
Seqüelas de
longo prazo
Morte
Mosquito
infectado
Ser humano
infectado
Efeitos
crônicos
Anêmicos/
neurológicos/
cognitivos/de
desenvolvimento
Crescimento e
desenvolvimento
debilitados
Peso baixo
ao nascer
Feto
Aborto, parto
de natimorto
Desnutrição
Mortalidade
fetal e de recémnascidos
Gravidez
DoenÁa aguda
Seqüelas de
longo prazo
Maternal
Anemia
Fonte: DCP2, capítulo 21, p. 00. Brener, Alilio e Mills 2004.
grande parcela da carga da doença, causando cerca de 9% de todas as
mortes e de 10% de todas as AVADs. A parcela nas outras regiões é bem
menor, cerca de 1%, mas ainda assim responde por um número significativo de mortes e deficiências.
Mais de 3 bilhões de pessoas moram em áreas onde a malária está presente. Muitos países fora da África têm controlado a doença com sucesso
por meio de uma combinação de medidas preventivas e estratégias de
tratamento. Para os países mais castigados pela malária, a implementação
de tais programas tem sido dificultada pela emergência e pela dissemi7
Esta seção é baseada em DCP2, capítulo 21.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 73
nação de cepas do parasito e dos vetores resistentes aos medicamentos e
impedida pela fragilidade da infra-estrutura da saúde pública.
Quatro espécies de parasitos da malária infectam os seres humanos.
Plasmodium vivax e P. falciparum são os mais comuns, sendo o último o
mais perigoso. Praticamente todas as mortes são causadas pelo P. falciparum,
que predomina no Haiti, Papua Nova Guiné e Africa Subsaariana. O P.
vivax é mais comum na América Central e no Sul da Ásia. O parasito é
transportado pelos mosquitos, cuja capacidade de reprodução e de disseminação do parasito é bastante influenciada pelo clima. As infestações
ocorrem quando as pessoas são mordidas pelos mosquitos que transportam o parasito. A taxa de incidência, portanto, depende do número de
mordidas por pessoa que transmite o parasito, ou da taxa de inoculação
entomológica. Isso varia de menos de 1 mordida por pessoa por ano na
América Latina e Sudeste Asiático para mais de 300 em partes da África
tropical (Figura 4.1).
Corretamente tratada, a malária sem complicações possui uma taxa de
mortalidade de apenas 0,1%. Quando a doença não é tratada e afeta
órgãos vitais, a mortalidade aumenta assustadoramente. Pode ocorrer
coma e, nesse caso, a probabilidade de morte é de cerca de 20% em adultos e 15% em crianças. A malária cerebral pode provocar convulsões,
problemas neurológicos e morte. As infecções da malária também podem
provocar anemia branda, moderada ou aguda.
Além disso, a malária possui um grande impacto nas outras condições
de saúde. As mulheres que contraem malária durante a gravidez têm mais
chances de desenvolver anemia e dar à luz crianças abaixo do peso, correndo mais riscos de doenças, deficiências ou até mesmo de morrer. Cerca
de 3,7% das mortes maternas, ou 5.300 mortes por ano, são resultantes
das condições relacionadas a malária. As estimativas mostram que entre
190.000 e 934.000 crianças morrem a cada ano quando a malária contribui para o desenvolvimento da anemia. Quando uma pessoa fica doente
de malária, isso significa uma variedade de outras conseqüências. Um
estudo na África calculou que 13 a 15% do absenteísmo das escolas ocorria devido ao fato de as crianças estarem com malária (Holding e KitsaoWekulo, 2004). Estudos na Gâmbia e no Quênia mostraram que as crianças protegidas por mosquiteiros tratados com inseticidas cresciam mais
rápido do que as crianças sem proteção.
O uso de medicamentos e os controles de vetores são as principais
estratégias e as intervenções contra a malária buscam a eliminação dos
mosquitos, a prevenção contra mordidas, o bloqueio do desenvolvimento
da doença ou o tratamento da doença. Os métodos ambientais de
matança dos mosquitos que espalham a malária incluem a eliminação dos
locais de criação e a aplicação de inseticidas. Outras iniciativas em matar
mosquitos ou evitar mordidas incluem a aplicação de inseticidas via spray
74 Prioridades em Saúde|
em lugares fechados ou o uso de mosquiteiros tratados com inseticidas.
Muitos medicamentos funcionam de forma profilática e são levados pelos
viajantes para os locais infestados com malária e também pelas mulheres
grávidas. Está cada vez mais difícil encontrar medicamentos para o tratamento da doença por causa da apariência das cepas de malária resistentes
aos medicamentos em todo o mundo.
A eficácia e a viabilidade de alguns tratamentos dependem bastante do
fato de a transmissão da malária ser instável (baixa, errática ou focal) ou
estável (freqüente, intensa e durante todo o ano). Nos lugares em que a
transmissão da malária é instável, a imunidade protetora não é adquirida.
Já nos lugares onde a transmissão da malária é estável, os sobreviventes
desenvolvem uma certa imunidade, e na fase adulta, as infecções da
malária são geralmente assintomáticas.
Nas áreas com transmissão instável, os programas focados que eliminam os locais de criação por meio do uso sensato de inseticidas ou de
mudanças nas práticas de construção podem ser viáveis e eficazes,
enquanto nas áreas com transmissão estável, a identificação e o controle
de todos os locais de criação em potencial são geralmente inviáveis. Nas
áreas com transmissão instável, a profilaxia para mulheres grávidas ou a
terapia preventiva intermitente será mais eficaz somente durante a epidemia temporária localizada. Nas áreas com transmissão estável, contudo,
o uso mais genérico da terapia preventiva intermitente pode ser extremamente eficaz.
Muitos lugares têm usado redes tratadas com inseticida (ITNs) com
sucesso na redução da transmissão. As ITNs têm sido associadas a
reduções na mortalidade infantil em 18% e a reduções nos episódios de
malária até 50% em diferentes partes da África. O impacto das ITNs refere-se não apenas à efetividade técnica das redes e à duração e eficácia do
inseticida usado, mas à aceitação social e cultural do uso e da acessibilidade financeira desses recursos. A China, a Tanzânia e o Vietnã promoveram com sucesso o uso de ITNs e atingiram um controle substancial
da malária em muitos lugares. As estratégias de incentivo ao uso de redes
tratadas com inseticidas incluem marketing social no Quênia e em
Malauí; desenvolvimento assistido do setor comercial em Mali, Senegal e
Tanzânia; distribuição gratuita generalizada em Togo; e cupões para ITNs
altamente subsidiadas distribuídos às mulheres grávidas na Tanzânia.
Os programas de tratamento têm dependido tradicionalmente de
medicamentos de custo relativamente baixo, principalmente cloroquina.
O sucesso depende da detecção e do tratamento oportunos, ou seja, na
hora certa. Na África do Sul, onde 83% da população vive a menos de
10 quilômetros de distância de uma clínica médica, os profissionais de
saúde desempenham um papel muito importante. Em países como
Burkina Faso, Etiópia e Uganda, onde as clínicas médicas são bem menos
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 75
acessíveis, a redução da mortalidade e da morbidade por meio de tratamento tem exigido o treinamento das mães e dos agentes comunitários de
saúde na utilização de tratamentos baseados em diagnósticos presumíveis.
Em muitas áreas, cepas do parasito resistentes à cloroquina e à sulfadoxinepiremetamina são agora comuns. Felizmente, os pesquisadores
desenvolveram uma nova variedade de medicamentos, inclusive a terapia
ACT (artemisinin combination therapy – Terapia de Combinação de
Armesinin), que custa mais do que os tradicionais medicamentos de
primeira linha, mas resulta custo-efetiva em áreas onde as cepas
resistentes aos medicamentos são altamente dominantes.
A educação em saúde junto com orientações específicas são também
bastante importantes para o controle da malária. Elas melhoram a oportunidade de tratamento, ajudando as pessoas a identificar a doença e a
procurar os cuidados apropriados. Também promovem o uso melhor e
mais regular das ITNs e incentivam um novo tratamento das redes com
inseticida quando necessário. Além disso, ainda melhoram a adesão aos
tratamentos, reduzindo assim a transmissão do parasito e o desenvolvimento da resistência aos medicamentos.
A maioria das intervenções disponíveis da malária são bastante custoefetivas. Quase todas custam menos de US$ 150 por AVAD evitado e
muitas podem ser implementadas a um custo de menos de US$ 10 por
AVAD. O DCP2 calcula que as ITNs custam entre US$ 11 e US$ 17 por
AVAD evitado, dependendo do tipo de inseticida e da freqüência dos
novos tratamentos necessários; a aplicação residual de spray em locais
fechados custa entre US$ 5 e US$ 18 por AVAD evitado; e o tratamento
preventivo intermitente de mulheres grávidas custa entre US$ 13 e US$ 35
por AVAD evitado.
Entre os tratamentos com medicamentos, a cloroquina continua sendo
o tratamento mais custo-efetivo, uma vez que a resistência à cloroquina é
menor de cerca de 35%. Quando a incidência da resistência aumenta além
deste nível, a terapia ACT começa a se tornar mais custo-efetiva. A sulfadoxinepiremetamina pode ser mais custo-efetiva do que a cloroquina e a
terapia ACT, mas a resistência da primeira parece emergir bem mais rápido, enquanto a terapia ACT é mais custo-efetiva do que a sulfadoxinepiremetamina quando a resistência a esta ultrapassa aproximadamente
12%.
Enquanto as intervenções de malária são custo-efetivas, a viabilidade
delas depende da disponibilidade dos recursos financeiros e da infraestrutura de saúde, além das condições epidemiológicas locais. O custo
total de um programa na promoção do uso de redes tratadas com inseticida para crianças é de cerca de US$ 2,80 por cabeça por ano, e um programa para aplicação residual de spray em locais fechados pode custar
cerca de US$ 4 por cabeça por ano. Apesar desses custos poderem parecer
76 Prioridades em Saúde|
baixos por muitos padrões, eles são proibitivos nos países onde a malária
é endêmica, uma vez que todos os orçamentos públicos para todas as
despesas com saúde nesses países giram entre US$ 2 e US$ 10 por cabeça
por ano. A ruptura das limitações financeiras para esses programas custoefetivos requer assistência externa substancial.
A pesquisa para obtenção de uma vacina contra a malária está em
andamento há muito tempo e deve ser ainda mais incentivada, mas o
desenvolvimento de tal vacina ainda necessita de muitos mais anos.
Enquanto isso, a pesquisa também é necessária para melhorar os cuidados
com os pacientes, incluindo cuidado mais barato do paciente em
domicílio e avaliação dos sistemas alternativos de prestação de serviços;
prevenção, como tratamento intermitente e aumento do uso de redes
tratadas com inseticida; tecnologias, como inseticidas e moléculas determinantes antiparasitárias que utilizam o genoma; e avaliações de campo
de métodos transgênicos de interrupção da transmissão da malária.
Essa pesquisa sobre novas formas de intervenção, junto com a implementação de estratégias conhecidas e custo-efetivas de prevenção e tratamento, permitirá o controle bem-sucedido dessa doença. Uma vez que a
maior incidência de malária concentra-se em países onde as altas taxas de
transmissão são combinadas com recursos limitados e sistemas de saúde
deficientes, o controle da malária certamente também requer uma maior
assistência internacional.
Doenças que podem ser evitadas com vacinação
As doenças para as quais vacinas de custo relativamente baixo e altamente
eficazes encontram-se disponíveis respondem por uma parte importante
da carga de doenças nos países em desenvolvimento.8 O DCP2 (capítulo
20) aborda a tuberculose, difteria, tétano, coqueluche, pólio, sarampo,
rubéola, Hib, hepatite B, febre amarela, doença meningocócica e encefalite
japonesa. Também existem vacinas disponíveis ou que estão sendo desenvolvidas para duas causas das doenças de diarréia: rotavírus e cólera
(DCP2, capítulo 19).
As doenças que podem ser evitadas com vacinação são bastante variadas. Algumas dessas doenças são causadas por bactérias, enquanto outras são causadas por vírus; algumas são encontradas principalmente em
seres humanos, enquanto outras também desenvolvem-se facilmente em
outras espécies; algumas têm altas taxas de fatalidade, enquanto outras são
debilitadoras; algumas concentram-se em determinadas regiões, enquanto outras se espalham de forma generalizada; e algumas são transmitidas
via contato respiratório, enquanto outras são transmitidas através de
mordidas de insetos ou pelo contato com sangue ou substância fecal
8
Esta seção está baseada em DCP2, capítulos 16, 19, 20, 25 e 27.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 77
infectados. Apesar dessa variabilidade, as doenças que podem ser evitadas
com vacinação geralmente possuem duas características importantes: as
pessoas podem ser infectadas sem mostrar sinais dos sintomas (com
exceção do tétano) e a imunidade induzida pela vacina dura normalmente
por toda a vida (exceto a coqueluche).
Os países que imunizam uma grande parte de suas populações contra
essas doenças têm eliminado a maior parte da mortalidade e da morbidade associadas a elas. As regiões com baixa cobertura de vacinação
continuam a ter milhares de mortes que seriam relativamente fáceis de
serem evitadas. Em 2001, sete doenças que podem ser evitadas com vacinação, ou seja, sarampo, hepatite B, Hib, coqueluche, tétano, febre amarela
e difteria, causaram mais de 2,3 milhões de mortes, principalmente, na
África e na Ásia. Cerca de 80% de todas as mortes de febre amarela ocorrem na África, assim como 59% de sarampo, 58% de coqueluche e 41% de
tétano. O Leste Asiático e o Pacífico enfrentam a maior carga de mortes de
hepatite B e condições associadas e respondem por 62% de todas as
mortes dessa doença. O Sul da Ásia também possui uma alta taxa de mortalidade dessas doenças, principalmente, tétano e sarampo.
Nas últimas décadas, muitas iniciativas globais têm procurado
expandir a cobertura das vacinas. Desde 1974, o Programa Ampliado de
Imunizações (PAI, ou EPI em inglês) da OMS tem fornecido orientações
e apoio na expansão da cobertura, padronizando as agendas de imunização, promovendo tecnologias seguras de injeção, melhorando o
armazenamento e a disponibilidade das vacinas, e protegendo a potência
das vacinas por meio de gestão do isolamento térmico ou cadeia de frio.
A estratégia Alcance de Todas as Localidades desse programa tem por
finalidade fazer com que 80% das crianças de cada país receba as três
doses da vacina difteria-coqueluche-tétano. Em 2000, entidades internacionais, doadores bilaterais, fundações privadas, ONGs e empresas farmacêuticas colaboraram no lançamento da Aliança Global para Vacinas e
Imunização (GAVI). Desde então, a GAVI tem levantado mais de US$ 1,3
bilhão para fortalecer os sistemas de imunização; introduzir novas vacinas
ou vacinas subutilizadas, como as vacinas contra Hib, hepatite B e febre
amarela; e apoiar as práticas de injeção segura. Além disso, as principais
iniciativas de pesquisa destinam-se ao desenvolvimento de novas vacinas
e métodos de prestação de cuidados de saúde.
Uma vez disponibilizada uma vacina, o aspecto mais importante da
definição dos programas de imunização é a organização da logística das
pessoas a serem vacinadas. Nos países mais desenvolvidos, as crianças são
levadas até as unidades de saúde para receber injeções ou tomar vacinas
via oral. Um número considerável de vacinas também são ministradas de
forma extensiva; isto é, estratégias móveis em que os profissionais de
saúde viajam até as casas e aldeias. As campanhas de imunização que enfa78 Prioridades em Saúde|
tizam antígenos específicos são outro tipo de abordagem. As campanhas
de imunização mais famosas enfatizaram a varíola, que foi declarada
como totalmente erradicada em 1980, e a pólio, que é atualmente encontrada somente em alguns poucos países (DCP2, capítulo 8).
A vacinação é normalmente bastante custo-efetiva. Na maioria dos
casos, as vacinas têm custo relativamente baixo e uma única dose proporciona imunidade para toda a vida. Sempre que um tratamento for
disponibilizado para uma infecção disseminada e potencialmente fatal, ele
provavelmente será custo-efetivo.
A mistura das estratégias de fornecimento do material, o preço dos
itens principais (a própria vacina, mais mão-de-obra, transporte e
armazenamento refrigerado), junto com a escala global do programa afetam os custos. Os custos recorrentes representam cerca de 80% dos custos
associados ao fornecimento das vacinas por meio das unidades fixas de
saúde e 92% dos custos das campanhas de imunização. O custo por criança totalmente imunizada para as seis vacinas originais do programa
EPI, ou seja, tuberculose, difteria, coqueluche, tétano, pólio e sarampo, é
de aproximadamente US$ 20. Os pesquisadores calculam que o custo adicional de substituição de uma vacina contra pólio via oral por uma vacina injetável e a adição de novos antígenos para a hepatite B, febre amarela,
Hib, sarampo, rubéola, encefalite japonesa e doença meningocócica aos
programas existentes fique entre US$ 1 e US$ 16 por pessoa.
O custo-eficácia é influenciada não só pelas diferenças em preços e
estratégias, mas também pelos níveis existentes de cobertura de imunização. O custo por morte evitada decorrente da vacinação bem-sucedida em
crianças contra as seis doenças originais do programa EPI é de US$ 205
por morte evitada no Sul da Ásia e na África Subsaariana, e de US$ 3.540
por morte evitada na Europa e Ásia Central, com as taxas relativamente
altas de cobertura na última região sendo responsáveis em grande parte
pela diferença. Todavia, mesmo a um custo de US$3.540 por morte evitada, a vacinação ainda é altamente custo-efetiva na Europa e na Ásia
Central, se comparando favoravelmente a muitos outros usos do dinheiro
público.
O progresso futuro no controle de doenças que podem ser evitadas
com vacinação depende do tratamento das restrições financeiras e logísticas nos países de baixa renda. Mesmo que os programas de imunização
tenham custo relativamente baixo, os recursos financeiros de muitos países de baixa renda são tão limitados que até os programas baratos respondem por porções substanciais de financiamentos disponíveis. Em média,
os programas de imunização respondem por 6% dos gastos do governo
com saúde nos países em desenvolvimento. Contudo, entre os países com
mais baixa renda do mundo, procedimentos como a expansão da cobertura dos antígenos tradicionais, a introdução de novas vacinas e a melho-
“. . . mesmo quando as
crianças nos países em
desenvolvimento têm uma
média de 3,2 episódios de
diarréia a cada ano, o
número de mortes parece
ter caido de forma significativa, considerando-se
uma previsão calculada
entre 4 e 6 milhões de
mortes em 1979 para uma
média de 2,6 milhões por
ano na década de 1990. . .”
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 79
ria da qualidade e da segurança da vacina podem consumir até 20% do
orçamento do governo destinado à área de saúde na ausência de uma
assistência estrangeira substancial.
O volume de despesas pode ser reduzido por meio de pesquisa e desenvolvimento de vacinas que necessitem de menos doses e que sejam mais
baratas em termos de produção, mais fáceis de transportar e armazenar, e
mais seguras de administrar. O desenvolvimento de novas estratégias de
aplicação de vacinas também pode fazer uma considerável diferença na
universalização da cobertura de imunização nos países de baixa renda.
Doenças da diarréia
“Cerca de 800.000 vidas
por ano podem ser salvas
com a preparação e o
armazenamento dos alimentos de forma mais
higiênica e com a promoção da educação,
fornecendo uma boa
nutrição e garantindo
ganho de peso adequado.”
A doença da diarréia é uma das cinco principais causas de morte de crianças abaixo dos cinco anos de idade nos países em desenvolvimento que
pode ser evitada.9 É mais perigosa para os mais jovens, com cerca de 90%
da ocorrência das mortes decorrentes de diarréia em crianças pequenas.
Contudo, mesmo quando as crianças nos países em desenvolvimento têm
uma média de 3,2 episódios de diarréia a cada ano, o número de mortes
parece ter caido de forma significativa, considerando-se uma previsão calculada entre 4 e 6 milhões de mortes em 1979 para uma média de 2,6 milhões por ano na década de 1990, e sendo o motivo principal dessa melhoria atribuído às intervenções eficazes de saúde pública (consulte, por
exemplo, a discussão sobre a utlização da terapia de reidratação oral na
República Árabe do Egito em DCP2, capítulo 8).
Dezenas de vírus, bactérias, protozoários e helmintos causam doenças
da diarréia. Alguns desses agentes dependem quase exclusivamente de
hospedeiros humanos, enquanto outros também infectam animais. São
normalmente adquiridos por meio de transmissão fecal-oral, geralmente
pela ingestão de água contaminada ou alimentos não lavados. A infecção
por esses agentes causa graves ataques de diarréia, compromete o sistema
imunológico do corpo, enfraquece a capacidade do corpo de retirar nutrientes dos alimentos e pode levar a uma séria e rápida desidratação. Uma
forte diarréia aguda aquosa, causada principalmente por rotavírus,
Escherichia coli enterotoxigênico, e vibrio cholerae, causa uma rápida
desidratação e pode levar à morte. A diarréia persistente está associada a
desnutrição, e apesar de responder por uma porção relativamente pequena de casos de diarréia, tem três vezes mais probabilidade de ser fatal do
que a diarréia aquosa. A diarréia sanguinolenta é freqüentemente associada a danos intestinais e deterioração nutricional, um pouco de
desidratação e febres.
As estratégias para redução da carga da doença da diarréia não
mudaram substancialmente desde a primeira edição de Disease Control
9
80 Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada em DCP2, capítulos 19 e 41.
Priorities in Developing Countries (Jamison e outros, 1993) com exceção
de alguns avanços em tecnologias de vacinas. Práticas de uma melhor alimentação com mais higiene, imunização, melhores condições da água e
saneamento, e melhor gestão dos casos são as principais intervenções
disponíveis para se evitar e tratar doenças da diarréia.
Uma alimentação melhor e com mais higiene começa com programas
que promovem amamentação exclusiva durante os primeiros seis meses
de vida de uma criança. Isso reduz a probabilidade de uma criança ingerir
comida ou água contaminada durante a infância e fortalece o sistema
imunológico da criança através da ingestão de elementos benéficos no
leite materno. Esses programas incluem políticas hospitalares que incentivam a amamentação, orientação e educação por amigos e profissionais
de saúde, campanhas de educação da comunidade e dos meios de comunicação de massa, e grupos de apoio das mães.10
Práticas de uma melhor alimentação quando uma criança já estiver
com seis meses também podem ser incentivadas e serem eficazes. Cerca de
800.000 vidas por ano podem ser salvas com a preparação e o armazenamento dos alimentos de forma mais higiênica e com a promoção da educação, fornecendo uma boa nutrição e garantindo ganho de peso adequado. Os pesquisadores também mostraram que a vitamina A e a suplementação de zinco possuem efeitos benéficos sobre a diarréia: os dois
itens estão associados à redução da freqüência da diarréia grave e a suplementação de zinco também reduz a incidência de diarréia.
A imunização contra rotavírus pode evitar até 440.000 mortes por ano
dessa infecção comum. O desenvolvimento de uma vacina segura e eficaz
contra o cólera também tem sido difícil, e a doença pode normalmente ser
controlada por meio de programas eficazes de saúde pública. Somente o
Vietnã normalmente utiliza a vacina contra o cólera. Outros países decidiram que a terapia de reidratação oral (ORT) é tão barata e tão eficaz na
prevenção de mortes decorrentes do cólera que os custos e os riscos de
imunização não valem a pena. O sarampo compromete o sistema
imunológico e pode portanto levar a uma diarréia aguda. Ao reduzir a
ocorrência do sarampo, as vacinas podem reduzir de 6 a 26% das mortes
por diarréia entre crianças abaixo de cinco anos de idade.
Outra forma de reduzir a doença da diarréia é fornecendo água limpa
e saneamento, já que as estimativas indicam que a água contaminada
causa 90% dos casos de diarréia entre as crianças. Todavia, DCP2 (capítulo 41, p. 778), ressalta que “a higiene doméstica, principalmente com ali-
as mulheres e as crianças... gastam em média
mais de uma hora por dia
na área rural do Leste
Africano e mais de duas
horas por dia em diversos
países da Ásia para obter
e transportar água.”
10
A única qualificação importante desta abordagem é a preocupação com a transmissão do
HIV de mãe para filho. A melhor prática nesses casos seria a substituição da alimentação
segura para a criança de uma mãe HIV-positiva. Contudo, quando o status de HIV de uma
mãe é desconhecido em países com alta incidência de HIV, uma decisão deve ser tomada para
equilibrar os riscos de transmissão de HIV contra os prováveis benefícios da amamentação
exclusiva (DCP2, capítulo 19).
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 81
“. . . onde água e saneamento básicos não se
encontram disponíveis, a
higiene é deficiente e a
terapia de reidratação oral
não é amplamente usada,
e as intervenções na saúde
pública direcionadas à
prevenção das doenças da
diarréia são extremamente
custo-efetivas.”
“. . . o progresso contra as
doenças da diarréia pode
ser obtido apesar da
pobreza.”
82 Prioridades em Saúde|
mentos e com as mãos, é o principal determinante das taxas endêmicas
das doenças da diarréia e não a qualidade da água potável.” Em vez da
qualidade, a quantidade, a continuidade e a conveniência dos serviços de
água são os fatores que reduzem a incidência da diarréia, incentivando um
comportamento com mais higiene com relação aos cuidados pessoais e
preparação dos alimentos.
Os investimentos em infra-estrutura de água e saneamento podem
custar caro quando comparados a outras medidas preventivas e tratamento de casos. Contudo, o serviço de água possui muitos benefícios para
a saúde, além da redução da doença da diarréia. Quando o serviço de água
é associado a uma melhor higiene pessoal, não ocorre a transmissão das
infecções da pele e dos olhos como o tracoma de uma pessoa para outra;
há uma redução da incidência de doenças decorrentes da água como a
esquistossomose e o verme da Guiné; e a redução da exposição aos vetores
de insetos da água responsáveis pela dengue, malária e tripanossomíase.
O mais importante benefício que as pessoas popularmente associam
aos serviços de água e saneamento é a maior conveniência e não os efeitos
na saúde. A economia de tempo e de mão-de-obra pode ser substancial,
considerando-se que as mulheres e as crianças gastam em média mais de
uma hora por dia na área rural do Leste Africano e mais de duas horas por
dia em diversos países da Ásia para obter e transportar água. As pesquisas
também mostram que as pessoas nos países em desenvolvimento
atribuem valor à melhoria do saneamento menos por razões de saúde do
que por razões de conforto, prestígio e segurança.
Nos debates de políticas públicas, os benefícios para a saúde em termos
de água e saneamento podem ser melhor visualizados como um benefício
adicional conferido pelos investimentos em água e saneamento justificados por outras razões. A política de saúde pública ainda precisa desempenhar o seu papel na regulamentação da qualidade da água, mas as
autoridades públicas sanitárias podem ser justificadas com a expansão da
sua autoridade normativa ao considerar a quantidade e a continuidade
dos serviços de água oferecidos como uma importante influência sobre os
comportamentos de higiene que reduzem a incidência da doença.
Quando ocorrer uma falha na prevenção da diarréia, técnicas simples
e de baixo custo estão disponíveis para o controle da maioria dos casos. A
ORT, que consiste na administração oral de fluidos contendo sais e açúcares simples, é de baixo custo e pode ser administrada pelos membros da
família com pouco treinamento, e é altamente eficaz na redução da gravidade de muitas doenças da diarréia e na não-ocorrência de mortes. Após
sua introdução na década de 1980, muitos países expandiram rapidamente o uso da ORT para atingir 33% das crianças com diarréia nas
Filipinas, 35% no Brasil, 50% no Egito e 81% no México. A suplementação de zinco para as crianças com doença da diarréia também ajuda a
reduzir a gravidade da doença. Nos casos de diarréia sanguinolenta, o
tratamento com medicamentos antimicrobianos é indicado, mas como
ocorre com muitas outras doenças, a resistência aos antimicrobianos de
primeira linha está se alastrando e tornando esses medicamentos menos
eficazes.
Nos lugares onde a água e o saneamento básicos não se encontram
disponíveis, a higiene é deficiente e a terapia de reidratação oral não é
amplamente usada, e as intervenções na saúde pública direcionadas à prevenção das doenças da diarréia são extremamente custo-efetivas. A promoção da amamentação exclusiva, da imunização do sarampo, da terapia
de reidratação oral e da higiene custa menos de US$ 5 por AVAD evitado;
a promoção de um melhor saneamento através de uma política pública
custa cerca de US$ 11 por AVAD evitado; o investimento e a manutenção
de bombas manuais de água custam cerca de US$ 94 por AVAD evitado;
conexões de casa para água potável custam cerca de US$ 223 por AVAD
evitado; e a construção e a promoção dos recursos de saneamento básico
custam mais de US$ 270 por AVAD evitado (DCP2, capítulo 41).
Os fatores que incentivam a transmissão e o desenvolvimento das
doenças da diarréia são dominantes entre as pessoas que vivem na
pobreza. As pessoas empobrecidas têm mais probabilidade de ficarem
subnutridas, de carecerem de água potável e meios sanitários de descarte
do lixo humano, de coabitarem com animais que abrigam e transmitem
patógenos humanos, de carecerem de acesso aos meios adequados de
armazenamento de alimentos como refrigeração. Todavia, o progresso
contra as doenças da diarréia pode ser obtido apesar da pobreza.
Programas eficazes podem incentivar esses comportamentos saudáveis
como amamentação exclusiva e higiene pessoal; melhorar as condições
ambientais através da provisão de água potável e saneamento; e treinar os
dispensadores de cuidados para reconhecer sintomas, principalmente, das
formas mais perigosas de diarréia, e aplicar tratamentos relativamente
simples.
“. . . mais de 99% de
mortes maternas ocorrem
no mundo em desenvolvimento. Esse diferencial
representa a maior disparidade existente nas
estatísticas de saúde
pública entre os países de
baixa renda e os de renda
alta.”
SAÚDE MATERNA E NEONATAL
Junto com as doenças infecciosas, as condições maternas e neonatais
respondem por uma parte considerável da lacuna existente na área de
saúde entre os países ricos e pobres; por exemplo, mais de 99% das mortes
maternas ocorrem no mundo em desenvolvimento. Esse diferencial representa a maior disparidade existente nas estatísticas de saúde pública
entre os países de baixa renda e os de renda alta. No geral, o risco médio
de vida das mortes maternas é de l em 4.000 nos países de renda alta, de 1
em 61 nos países de renda média, e de 1 em 17 nos países de baixa renda.
“.. . . as mortes neonatais
respondem por 40% de
todas as mortes infantis
abaixo de cinco anos, . . . “
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 83
“. . . 210 milhões de
gestações ocorrem a
cada ano, sendo que
60 milhões acabam em
aborto ou com a morte
da mãe ou do bebê.”
“. . . os programas de
planejamento familiar
podem evitar entre 20 e
40% de todas as mortes
infantis. . .”
84 Prioridades em Saúde|
As taxas de mortalidade durante o período neonatal (desde o nascimento até 28 dias de idade) também revelam grandes diferenças entre os
países ricos e pobres. Somente 1% de todas as mortes neonatais ocorrem
nos países de renda alta, onde a taxa média de mortalidade neonatal gira
em torno de 4 em cada 1.000 nascimentos vivos. Nos países de baixa
renda, a média gira em torno de 33 em cada 1.000 nascimentos vivos. A
maioria das mortes neonatais ocorre no Sul da Ásia por causa do tamanho da população; contudo, 20 dos países com as maiores taxas de
mortalidade neonatal encontram-se na África Subsaariana. As taxas mais
elevadas são encontradas nos países onde as guerras civis e a instabilidade
política exacerbaram a pobreza como a Etiópia, a Libéria e Serra Leoa.
Nesses países, as taxas de mortalidade neonatal ultrapassam 50 em cada
1.000 nascimentos vivos.
Os acordos internacionais têm reconhecido a importância da redução
da mortalidade materna e infantil nos países de baixa renda e de renda
média. Na verdade, duas das oito MDMs tratam dessas questões: a quarta
meta requer a redução da mortalidade entre crianças abaixo de cinco anos
em dois-terços, enquanto a quinta meta requer a redução da taxa da mortalidade materna em três-quartos, as duas até 2015. O DCP2 enfatiza que
as mortes neonatais respondem por 40% de todas as mortes infantis
abaixo de cinco anos, que a primeira semana de vida é quando ocorrem
75% dessas mortes neonatais, e que 50% das mortes maternas ocorrem na
primeira semana após o parto.
As taxas de mortalidade materna e infantil em um determinado país
podem revelar mais sobre o estado do sistema de saúde correspondente do
que quaisquer outros números. A obtenção de baixas taxas de mortalidade
maternas e infantis requer um sistema de prestação de serviços de saúde
integrado e em bom-funcionamento que alcance comunidades com educação e orientação, ajude as pessoas a evitar uma gravidez indesejada, promova uma boa nutrição, examine a existência de riscos, ajude na obtenção
de nascimentos saudáveis e responda às emergências obstétricas de forma
eficaz.
O setor de saúde sozinho, contudo, dificilmente conseguirá atingir ou
sustentar avanços em saúde materna em muitos países sem mudanças
sociais concomitantes para aumentar a educação das meninas; reduzir
viés de gênero em termos de emprego e renda; e confrontar desequilíbrios
na negociação de força dentro do lar que afetam o acesso das mulheres à
nutrição, ao volume de trabalho doméstico e à segurança física. Contudo,
o enfoque principal do DCP2 são as intervenções no setor de saúde, ao
mostrar que muitas intervenções são custo-efetivas para evitar uma
gravidez indesejada, para tornar a gravidez e o parto mais seguros, e para
melhorar a saúde neonatal encontram-se disponíveis.
Planejamento familiar
“A cada ano, os abortos
No mundo inteiro, calcula-se que 210 milhões de gestações ocorrem a
cada ano, sendo que 60 milhões acabam em aborto ou com a morte da
mãe ou do bebê.11 Vinte e cinco por cento de todas as gestações, cerca de
52,5 milhões, terminam com um aborto. Mais de 500.000 mortes maternas e 4 milhões de mortes neonatais ocorrem anualmente, mas a mortalidade é somente um dos resultados negativos possíveis. Todo ano, mais de
54 milhões de mulheres também sofrem de doenças ou de complicações
durante a gravidez e o parto. Na verdade, as condições associadas à maternidade representam entre 12 e 30% da carga das doenças entre mulheres
com 15 a 44 anos de idade nos países em desenvolvimento. As condições
de saúde reprodutiva são a principal fonte da diferença na carga da doença
entre homens e mulheres, com as mulheres geralmente vivendo bem mais,
mas com condições menos saudáveis.
Apesar de a gravidez e o parto serem partes naturais de uma vida
saudável, eles acarretam riscos. As mulheres com pressão alta, doença do
coração, malária, anemia, tuberculose, hepatite, infecções sexualmente
transmissíveis ou HIV/AIDS enfrentam riscos substanciais durante a
gravidez. O fornecimento dos serviços adequados de exames, orientação e
contracepção é de grande importância para essas mulheres. Uma gravidez
indesejada também provoca conseqüências negativas. Os dados são diversificados e as variações regionais são imensas, mas as estimativas indicam
que os programas de planejamento familiar podem evitar entre 20 e 40%
de todas as mortes infantis, prevenindo nascimentos entre adolescentes e
mulheres com mais idade e permitindo intervalos de três a cinco anos
entre as gestações.
O planejamento familiar pode reduzir gestações indesejadas e ajudar
os casais a atingirem o tamanho desejado da família. O acesso a métodos
contraceptivos eficazes é o ponto principal. A demanda não-atendida de
contracepção é definida como o número de mulheres que desejam evitar
engravidar, mas que não estejam usando a contracepção. Essa demanda é
mais alta na África Subsaariana, onde cerca de 19,4% das mulheres
gostariam de evitar engravidar, mas não utilizam métodos de contracepção. Os maiores obstáculos em atender a necessidade de contracepção
incluem a falta de conhecimento, preocupações com a saúde e
desaprovação social. Com algumas variações em cada país e no contexto
correspondente, esses fatores são mais importantes do que os suprimentos, a disponibilidade ou os custos dos contraceptivos. Nos países onde
existe um maior atendimento da demanda de contracepção, como Brasil,
Colômbia e Vietnã, existem taxas menores de fertilidade e uma menor
mortalidade materna. Ao contrário, na África Subsaariana, a porcentagem
11
praticados sem condições
de segurança causam
cerca de 80.000 mortes,
respondendo por cerca de
13% da carga das
doenças entre mulheres
em idade reprodutiva.”
Esta seção é baseada em DCP2, capítulo 57.
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 85
“O custo dos programas
de planejamento familiar
varia entre US$ 5.000 e
US$ 35.000 por morte
materna evitada, entre
US$ 1.300 e US$ 5.000
por morte infantil evitada,
e . . entre US$ 30 e
US$60 por AVAD evitado.”
86 Prioridades em Saúde|
de mulheres com necessidades não-atendidas às vezes ultrapassa a porcentagem de mulheres que estão usando métodos contraceptivos.
Quando as mulheres passam por gestações indesejadas, muitas optam
pelo aborto, mesmo quando ilegal ou não aceito pela sociedade. Em 1995,
foi feita uma estimativa de 35,5 milhões de abortos realizados nos países
em desenvolvimento. A maioria dos abortos legais ocorrem na China e em
outros lugares da Ásia, mas devido ao tamanho da população e às altas
taxas de fertilidade, há também uma grande quantidade de abortos ilegais
na Ásia. Nos países onde o aborto é ilegal, existem muitos mais riscos de
complicações. A cada ano, os abortos praticados sem condições de segurança causam cerca de 80.000 mortes, respondendo por cerca de 13% da
carga das doenças entre mulheres em idade reprodutiva. A taxa de mortalidade para abortos nessas condições varia de 100 a 600 em cada 100.000
procedimentos, quando comparada à taxa de mortalidade para abortos
em condições de segurança de apenas 0,6 morte em cada 100.000 procedimentos. Muitas das mulheres que sobrevivem a um aborto sem
condições de segurança sofrem de deficiências.
A contracepção para as mulheres que desejam evitar uma gravidez
pode ser permanente, a longo prazo ou temporária. Os métodos permanentes abrangem a esterilização de homens ou mulheres. Esse é o método
mais popular e eficaz de contracepção: as 187 milhões de mulheres esterilizadas em todo o mundo representam 34% de todas as práticas contraceptivas. A esterilização masculina através da vasectomia é um procedimento mais simples e mais seguro do que a esterilização feminina, mas
é menos comum. Contudo, o cálculo estimado de 40 a 50 milhões de
homens esterilizadas em todo o mundo representa 8% dos métodos
contraceptivos. Os dispositivos intrauterinos são o segundo método
mais comum de contracepção, usado por 150 milhões de mulheres em
todo o mundo. Esses dispositivos são métodos de contracepção a longo
prazo, uma vez que são inseridos no útero e previnem a gravidez até serem
removidos.
Os métodos temporários incluem pílulas, implantes de pele e produtos
injetáveis que alteram o ciclo hormonal de uma mulher para ela não
engravidar. Embora esses métodos sejam seguros e eficazes, também
podem causar um sangramento anormal, um problema para as mulheres
em sociedades que proíbem ou restringem as mulheres de praticar determinadas atividades durante a menstruação. A OMS estima que 10 a 30%
das mulheres abandonam esses métodos contraceptivos por essa razão.
Outros métodos temporários incluem barreiras como os preservativos
que são as mais comuns. Diferente das outras formas de contracepção, os
preservativos são muito importantes na proteção contra infecções sexualmente transmissíveis. Os preservativos masculinos respondem por cerca
de 4% do uso contraceptivo entre casais em idade reprodutiva. As estraté-
Box 4.3 A história de sucesso de Bangladesh
Na metade da década de 1970, uma mulher de classe média de Bangladesh tinha mais de
seis filhos, o que, junto com uma alimentação deficiente e a falta de acesso aos serviços de
saúde de qualidade, punham em perigo a saúde dessa mulher e de suas crianças. Além do
impacto em termos de saúde dessa situação, a fertilidade alta e o crescimento rápido da
população representavam importantes restrições ao desenvolvimento econômico e ao progresso social do país.
O programa de planejamento familiar de Bangladesh, iniciado para atender metas
demográficas, tinha quatro elementos. O primeiro elemento foi a utilização das mulheres
jovens e casadas que eram contratadas como agentes voluntárias e treinadas para visitar as
casas de outras mulheres, oferecendo serviços e informações sobre contracepção. O número
dessas agentes, conhecidas como assistentes do bem-estar da família, eventualmente
chegou a cerca de 25.000 no setor público e a 12.000 nas ONGs. O programa também
recrutou 4.500 agentes do sexo masculino.
Cada assistente tinha de visitar de três a cinco aldeias, ou 850 mulheres das áreas
rurais, visitando cada local de moradia uma vez a cada dois meses (Hossain e Phillips, 1996).
O alcance do programa foi surpreendente: os assistentes contactavam virtualmente todas as
mulheres de Bangladesh pelo menos uma vez e atingiam mais de um-terço a cada seis
meses. Esses assistentes eram considerados visitantes ilustres das aldeias e constituíam a
principal ligação entre o programa do governo e as mulheres das áreas rurais.
O segundo elemento do programa foi o fornecimento de uma variedade de métodos possíveis para o atendimento da diversidade de necessidades de reprodução. Esse procedimento denominado abordagem de cafeteria (cafeteria approach) oferecia métodos temporários,
além de serviços de esterilização para pessoas com dois filhos vivos, desde que o filho mais
novo tivesse pelo menos dois anos de idade (Rob e Cernada, 1992). Um sistema de distribuição bem-administrado forneceu os produtos básicos de planejamento familiar aos
agentes voluntários para poderem efetuar o trabalho de forma adequada.
O terceiro elemento do programa foram as clínicas de planejamento familiar estabelecidas em áreas rurais para as quais os agentes podiam enviar os clientes que desejassem usar
os métodos permanentes ou a longo prazo como a esterilização. Eventualmente, cerca de
4.000 unidades básicas de saúde do governo e 200 clínicas de ONGs foram criadas. Um
quarto elemento foram as atividades de informação, educação e comunicação orientadas a
mudar as normas de tamanho familiar e oferecer informação sobre opções de contracepção.
Ficou demonstrado que o bom uso dos meios de comunicação de massa é bastante eficaz.
Como resultado do programa, virtualmente todas as mulheres de Bangladesh estão
cientes dos métodos modernos de planejamento familiar. O uso de contraceptivos por mulheres casadas aumentou de 8% na metade da década de 1970 para cerca de 50% em 2000,
e a fertilidade diminuiu de mais de 6.0 crianças por mulher em 1975 para cerca de 3.3 em
2000. Apesar de as melhorias sociais e econômicas terem desempenhado um papel importante no aumento da demanda de contracepção, os pesquisadores mostraram que o fornecimento de serviços e informações teve um efeito independente nas atitudes e no comportamento.
Estima-se que o programa custe entre US$ 100 milhões e US$ 150 milhões por ano, com
cerca de um-meio a dois-terços do financiamento sendo proveniente de doadores externos. E
o custo-eficácia foi calculada em cerca de US$ 13 a US$ 18 por nascimento evitado, uma
medida padrão em termos de programas de planejamento familiar.
Apesar dessas realizações, o programa de planejamento familiar de Bangladesh está
longe de ser perfeito. Desde 1995, quase não houve diminuição da fertilidade. Muitos observadores notaram oportunidades de aumentar a eficácia do programa, de responder de forma
mais eficaz às necessidades das mulheres e de melhor vincular o planejamento familiar com
(Continuação na próxima página.)
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 87
Box 4.3 (continuação)
a saúde. Todavia, Bangladesh fez algo que muitos poucos países com o mesmo nível de
desenvolvimento social e econômico conseguiram realizar: complementou as iniciativas de
mudança de atitudes com relação ao tamanho da família com o fornecimento de serviços de
planejamento familiar para obter uma redução importante e sustentada em termos de fertilidade. Embora a motivação original do programa fosse atingir as metas demográficas, o governo conseguiu criar um programa que respondesse às necessidades dos casais, em vez de
utilizar medidas coercitivas.
Fonte: Autores.
“a média regional de
atendimento especializado na hora do parto na
África Subsaariana
aumentou apenas 0,2% por
ano na década passada “
88 Prioridades em Saúde|
gias de atendimento da demanda de serviços contraceptivos incluem educação e extensão, subsídios, distribuição gratuita e medidas para facilitar
ou incentivar a esterilização (box 4.3). O marketing social refere-se a uma
variedade de estratégias que adotam técnicas tradicionais de marketing
comercial para a promoção de comportamentos, produtos e serviços
socialmente benéficos. Normalmente, esses programas promovem produtos como preservativos nos meios de comunicação de massa. Eles também
modificam a embalagem dos produtos e os comercializam de forma eficaz
dentro de uma determinada cultura e contexto. Às vezes, os governos
fazem parceria com produtores comerciais para divulgarem marcas
existentes. Os programas de marketing social têm expandido o uso e a
venda de métodos de contracepção em muitos países.
O custo dos programas de planejamento familiar varia entre US$ 5.000
e US$ 35.000 por morte materna evitada, entre US$ 1.300 e US$ 5.000 por
morte infantil evitada, e após incluir outros impactos na área da saúde
junto com mortes evitadas, entre US$ 30 e US$ 60 por AVAD evitado. As
intervenções parecem ser mais custo-efetivas no Sul da Ásia e na África
Subsaariana do que no Leste Asiático e no Pacífico. O custo-eficácia
dentro das regiões também varia em duas ordens de magnitude por causa
das diferenças nas taxas de fertilidade, riscos de mortalidade e taxas
existentes de incidência contraceptiva.
No geral, a evidência é forte o suficiente para mostrar que o planejamento familiar é custo-efetivo, mas não o suficiente para mostrar quais
programas são os mais custo-efetivos. O custo da contracepção não é
geralmente uma barreira importante para a aceitação. Ao contrário, os
costumes sociais e as preocupações com a saúde são obstáculos bem
maiores. A proximidade dos serviços e a disponibilidade de suprimentos
também são relevantes. Para serem eficazes, os programas precisam
reconhecer obstruções locais no planejamento familiar e definir uma
resposta adequada.
Figura 4.2 Níveis de cobertura pré-natal, 1990 e 2000
Percentual de nascimentos vivos que recebem cuidados pré-natais
100
1990
88
2000
77
80
68
59
60
71
57
52
45
40
20
0
Á sia
(exceto China)
América Latina Oriente Médio
e Á frica do Norte
e Caribe
Á frica
Subsaariana
Fonte: Adaptado de WHO 2003.
Condições maternas
O planejamento familiar reduz a carga das doenças associadas à gravidez,
evitando gestações indesejadas.12 Para as mulheres grávidas, diversas
condições maternas (que ocorrem no período desde a concepção até 42
dias após o parto) podem levar à morte ou a deficiências, mesmo quando
a gravidez e o parto não são inerentemente patológicos. Os cuidados proporcionados durante uma gestação e um parto normais e saudáveis, junto
com a garantia de um estado de prontidão em lidar com possíveis problemas de saúde são os objetivos dos programas de uma maternidade segura.
Dentre os 210 milhões de gestações em todo o mundo a cada ano, cerca
de 500.000 terminam em morte materna e a cada ano cerca de 54 milhões
de mulheres sofrem de doenças ou de complicações referentes à gravidez
e parto. Treze países, Afeganistão, Angola, Bangladesh, China, República
Democrática do Congo, Etiópia, Índia, Indonésia, Quênia, Nigéria,
Paquistão, Tanzânia e Uganda, respondem por 70% de todas as mortes
maternas por causa dos diversos efeitos do tamanho da população, baixas
rendas e cuidados deficientes com a saúde. Além disso, o Sul da Ásia e a
África Subsaariana respondem por 74% da carga global das condições
maternas. As complicações vividas pelas mães também levam a muitos
12
Esta seção é baseada em DCP2, capítulo 26
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 89
“. . . quatro visitas prénatais a um prestador de
serviços de saúde podem
ser custo-efetivas. O
treinamento desses
prestadores deve incluir
como reconhecer sinais de
perigo e como providenciar uma transferência
rápida para uma unidade
básica apropriada no caso
de uma emergência. . .”
“Cerca de 1 milhão de
recém-nascidos morrem
durante o primeiro dia de
vida, outros 2 milhões
durante a semana
seguinte, e mais 1 milhão
antes de completar um
mês de vida.”
90 Prioridades em Saúde|
partos de natimortos e mortes neonatais a cada ano, e diversos estudos
têm mostrado que as perspectivas de sobrevivência de um bebê cuja mãe
morre são pequenas.
Apenas cinco condições respondem por três-quartos de mortes maternas: hemorragia, sepsia, problemas de hipertensão, trabalho de parto
obstruído e aborto clandestino. Muitas dessas condições podem ser eficazmente mitigadas por meio de exames pré-natais e atendimento especializado, e as diferenças no acesso a esses cuidados explicam uma grande
parte das disparidades regionais. Por exemplo, menos de 30% das mulheres nos países mais pobres têm acesso a atendimento especializado em
trabalho de parto, quando comparado a mais de 98% das mulheres nos
países mais ricos do mundo. Ainda assim, o progresso lento nessa frente é
bastante frustrante: a média regional de atendimento especializado na
hora do parto na África Subsaariana aumentou apenas 0,2% por ano na
década passada (Figura 4.2).
Considerando-se a natureza da gravidez e do parto, nenhuma intervenção ou abordagem por si só pode tratar por completo a carga das
doenças associadas. A única análise relevante é a comparação dos pacotes
alternativos que se diferenciam por conteúdo e meio de distribuição. Por
exemplo, uma estratégia abrangente de maternidade segura pode incluir
as seguintes intervenções:
• educação e serviços de saúde reprodutiva para adolescentes
• educação da comunidade sobre maternidade segura e cuidados com o
recém-nascido
• atendimento e orientação na fase pré-natal, incluindo suplementos
nutricionais, exame da pressão sanguínea, exame de infecções sexualmente transmissíveis, tratamento de sífilis, sugestões sobre amamentação, imunização contra tétano e tratamento de infecções do trato
urinário
• assistência especializada nos cuidados na hora do parto
• cuidado no caso de emergências e complicações obstétricas
• cuidados pós-parto.
Além de evitar gestações indesejadas, a prevenção de problemas na
maternidade envolve a garantia de uma boa saúde em geral, principalmente, de uma nutrição adequada. As complicações devem ser evitadas ou
tratadas quando ocorrerem. As intervenções podem ser pessoais ou para
toda a população; podem ocorrer durante a gravidez, o trabalho de parto
e o parto, ou pós-parto; e podem variar por nível de cuidados, tanto em
casa, em uma unidade do sistema básico de saúde ou em um hospital.
As intervenções baseadas na população tratam de dois fatores de risco
principais: falta de contracepção e subnutrição materna. A subnutrição
Box 4.4 Estudo de caso de implementação: Indonésia
Um grande esforço do governo da Indonésia de aumentar o número de nascimentos com a
participação de profissionais de saúde especializados começou em 1993 com a introdução
do treinamento de três anos de enfermagem, seguido de um ano de treinamento de trabalho
de parto. Desde 1996, esse procedimento foi complementado com um outro pacote de intervenções de treinamento, incluindo um curso de treinamento prático; um sistema de supervisão com revisão de iguais e educação contínua; um sistema de auditoria materna e perinatal; e uma estratégia de informações, educação e comunicação direcionada à comunidade.
Os dados foram coletados em três distritos de South Kalimantan em 1996, antes e
depois do pacote adicional de treinamento, que permitiu a medição do valor agregado correspondente. Antes do treinamento adicional, 90% dos nascimentos ocorriam em casa e
somente 37% tinham a participação de um profissional especializado. Até 1998-1999, 510
parteiras foram enviadas aos distritos e o atendimento especializado na hora do parto,
aumentou em 59%. O pacote de treinamento permitiu às parteiras ganharem confiança e
habilidades no gerenciamento de complicações obstétricas, mas apesar disso, a proporção de
mulheres admitidas em um hospital para uma cesariana diminuiu de 1,7% para 1,4%. A proporção de admissões em hospitais com uma complicação que requer um tratamento para
salvar a vida também diminuiu de 1,1% para 0,7% (Ronsmans e outros, 2001). É importante
ressaltar que a maioria das parteiras que participaram dos programas de treinamento eram
competentes em cinco habilidades principais, diferente das parteiras que não participaram
do treinamento.
Walker e outros (2002) efetuaram uma análise econômica do programa de treinamento,
fazendo uma distinção entre os programas realizados para parteiras das unidades de saúde e
os programas realizados para parteiras de aldeias, que incluiu um estágio de residência
médica nos hospitais municipais. Eles avaliaram o custo-eficácia adicional desses programas
do ponto de vista do prestador de serviços de saúde. Walker e outros calcularam que o
primeiro esquema podia ser expandido para aumentar o número de parteiras competentes
das unidades básicas e das aldeias em South Kalimantan em 1% com custos adicionais de
US$ 765 e US$ 1.176, respectivamente. O custo da reprodução em outras regiões ficaria
entre 50 e 60% a mais.
“A MDM de redução da
mortalidade entre crianças com menos de
cinco anos em dois-terços
até 2015 não pode ser
atingida sem o tratamento
da mortalidade nos
primeiros 28 dias de
vida.”
Fonte: Autores.
manifesta-se de duas formas: quando a mãe está abaixo do peso e/ou com
problemas de crescimento e quando encontra-se com deficiência de
micronutrientes, principalmente, ferro e vitamina A. Uma vez que a subnutrição é geralmente crônica, dura um longo tempo, e é intergeracional,
não está claro quando e como as intervenções serão mais eficazes. As iniciativas podem concentrar-se nas mulheres quando jovens, durante a
gravidez ou durante a idade reprodutiva. As intervenções pessoais
abrangem um grande número de serviços que compartilham uma importante característica: elas precisam ser integradas de forma contínua. Essa
continuidade segue ao longo do tempo, ou seja, desde a concepção até o
período pós-parto; ao longo do espaço, incluindo o lar, serviços básicos de
saúde, e o hospital de referência para cuidados sofisticados quando
necessário; e entre os dispensadores de cuidados, potencialmente incluin-
“Até 40% das mortes
neonatais podem ser evitadas com soluções
caseiras e comunitárias.”
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 91
Figura 4.3 Tendências do tempo na mortalidade infantil
Taxa de mortalidade neonatal em cada 1.000 nascimentos vivos
100
Período pós-neonatal
Final do período neonatal
Início do período neonatal
80
44
60
35
29
40
16
12
8
24
25
20
28
5
2
9
0
1980
1995
2000
Países de baixa renda
e de renda média
6
1980
1995
1
1
4
1
1
2000
Países de renda alta
Fonte: Cálculos dos autores baseados em UNICEF, WHO varios anos; DCP2, capitulo 27,
figura 27.2.
do os agentes voluntários, agentes de saúde pública, parteiras, auxiliares
de enfermagem, médicos e cirurgiões.
Estudos têm mostrado que quatro visitas pré-natais a um prestador de
serviços de saúde podem ser custo-efetivas. O treinamento desses prestadores deve incluir como reconhecer sinais de perigo e como providenciar
uma transferência rápida para uma unidade apropriada no caso de uma
emergência, além de enfatizar o uso de atendimento especializado durante
o parto. Outros elementos essenciais de cuidados pré-natais incluem a
prevenção e o tratamento da malária e anemia, exames e tratamento da
sífilis, e a imunização contra o tétano. A suplementação nutricional também é normalmente incluída, mas a eficácia e o custo-eficácia não são
definidas de forma conclusiva.
As mulheres e os recém-nascidos correm os maiores riscos de deficiência e morte durante e imediatamente após o parto. Nesse período, o
Box 4.5 Estratégias bem-sucedidas de sobrevivência neonatal
No Sul da Ásia e na África Subsaariana, a redução nas mortes neonatais tardias foi
influenciada pelo corte pela metade das mortes neonatais por tétano que ocorreram
durante a década de 1990 como resultado do aumento da proteção contra o toxóide do
tétano e de práticas de assepsia e higiene na hora do parto. Até 2000, dois-terços dos
países de baixa renda e de renda média eliminaram o tétano neonatal e outros 22 países
estavam se aproximando dessa meta.
Fonte: Adaptado do DCP2, capítulo 27.
92 Prioridades em Saúde|
Box 4.6 Institucionalização de um programa de ressuscitação
neonatal em uma província chinesa
O estudo de um hospital da China relata a vigilância da linha de base de 1.722 recém-nascidos, seguida de uma avaliação prospectiva por dois anos de 4.751 recém-nascidos, ao
mesmo tempo em que instituía diretrizes de ressuscitação padronizada. A ressuscitação tradicional anterior incluía a infusão de estimulantes centrais, mais vitamina C e 50% de glicose;
um esfregaço de álcool no bebê; e o pressionamento do filtro. Os profissionais de saúde reconheceram que a asfixia era a principal causa de morte neonatal e a segunda principal causa
de morte de recém-nascido em nível nacional. Também reconheceram que as metas de sobrevivência dos bebês não poderiam ser atendidas se o problema da asfixia não fosse tratado.
Eles desenvolveram e implementaram um programa de ressuscitação neonatal baseado em
evidências e treinaram a equipe na utilização das novas diretrizes. A taxa de mortalidade
neonatal ceda caiu de forma significativa, ou seja, de 66% para 3,4 em cada 1.000.
Fonte: Adaptado do DCP2, capítulo 27.
Box 4.7 A redução de mortes de recém-nascidos é possível nos
países de baixa renda
O Sri Lanka atingiu uma taxa de mortalidade neonatal de 11 em cada 1.000 nascimentos
vivos no ano de 2000 apesar de um Produto Nacional Bruto (PNB) baixo por cabeça de US$
800 e de menos de US$ 1,50 por cabeça por ano de gastos com saúde materna e neonatal.
Em 1959, as mortalidades materna e neonatal eram altas, com uma taxa de mortalidade
neonatal de 50 em cada 1.000 nascimentos vivos, sendo o PNB por cabeça de US$ 290. Essas
mortalidades foram reduzidas pela metade até 1980 por causa do aumento dos cuidados de
profissionais na hora do parto e porque os serviços de cuidados pré-natais, na hora do parto e
pós-natais, e dos recém-nascidos eram prestados junto às comunidades e sem encargos para
os usuários. O período entre 1980 e 2000 obteve mais 50% de redução na taxa de mortalidade neonatal sem o uso de cuidados intensivos, exceto uma unidade na capital.
A Malásia também seguiu uma política de rápida ampliação da cobertura de cuidados
especializados no nascimento. Ela treinou inúmeras parteiras e incentivou a colaboração das
ajudantes de parto tradicional a promoverem uma transição gradual para os cuidados especializados por diversas décadas. A taxa de mortalidade neonatal é agora de 6 em cada 1.000
nascimentos vivos, e 95% das mulheres dão a luz com a ajuda de uma pessoa especializada.
“. . . diversos pacotes de
serviços que prestam
cuidados dos recém-nasci-
Fonte: Adaptado do DCP2, capítulo 27.
dos nos primeiros 28 dias
atendimento especializado com a possibilidade de encaminhamento para
um nível de cuidado mais sofisticado pode ser crucial. A definição exata
de atendimento especializado é por si só um assunto de debate, mas as
MDMs propõem a proporção de partos controlados por um profissional
de saúde (médico, enfermeiro ou parteira treinada) como um indicador
aproximado. A taxa de atendimento especializado no nascimento varia
substancialmente nas regiões em desenvolvimento e nos grupos sócioeconômicos de cada país, variando de 48% na África Subsaariana a 59%
no Sul da Ásia e 82% na América Latina e Caribe.
de vida. ... são universalmente aplicáveis e
viáveis, mesmo sem
profissionais de saúde
especializados.”
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 93
“. . . a melhor forma de
melhorar os cuidados do
recém-nascido é
preencher a lacuna com o
que deve ser uma série
continua de cuidados que
incluem serviços prénatais, atendimento especializado na hora do parto
e suporte de acompanhamento durante o
primeiro mês de vida.”
. . . serviços básicos de
saúde materna e infantil
que reduziriam a mortalidade neonatal de 6% a
41%. . . , custaria entre
US$ 2 e US$ 10 por
cabeça.”
94 Prioridades em Saúde|
O DCP2 avalia diversos pacotes diferentes de cuidados propostos que
melhorariam a cobertura e/ou a qualidade dos cuidados maternos de rotina. Os três pacotes mais custo-efetivos, todos incluindo suplementação
nutricional, variam em termos de custo de US$ 77 a US$ 104 por AVAD
evitado na África Subsaariana para US$ 150 por AVAD evitado no Sul da
Ásia. Os custos diretos são maiores na África Subsaariana, mas são compensados por uma maior eficácia devido à maior incidência de problemas
maternos (box 4.4).
Condições neonatais
O risco de morte é maior durante os primeiros 28 dias de vida (mortalidade neonatal).13 Cerca de 1 milhão de recém-nascidos morrem durante
o primeiro dia de vida, outros 2 milhões durante a semana seguinte, e
mais 1 milhão antes de completar um mês de vida. Esses números
mostram uma melhoria pouco significativa. Em 1980, a taxa de mortalidade infantil (mortes desde o nascimento até um ano de idade, incluindo
o período pós-neonatal) nos países de baixa renda e de renda média foi de
aproximadamente 88 em cada 1.000 nascimentos vivos (Figura 4.3).
Desses, 28 mortes ocorriam logo no início do período neonatal, na
primeira semana de vida. Até 2000, a taxa de mortalidade infantil caiu até
62 em cada 1.000 nascimentos vivos; contudo, quase todo o progresso
ocorreu no final do período neonatal ou no período pós-neonatal. A taxa
de mortalidade no início do período neonatal quase não diminuiu, caindo somente para 25 em cada 1.000 nascimentos vivos em 2000. A MDM
de redução da mortalidade entre crianças com menos de cinco anos em
dois-terços até 2015 não pode ser atingida sem o tratamento da mortalidade nos primeiros 28 dias de vida.
Os tratamentos apropriados não são altamente complexos. Até 40%
das mortes neonatais podem ser evitadas com soluções caseiras e comunitárias. Às vezes, basta apenas manter um recém-nascido aquecido, sendo
amamentado regularmente, e protegido contra infecções por meio de
uma higiene adequada e/ou um tratamento oportuno com antibióticos
(box 4.5). Em muitos casos, os cuidados apropriados estão disponíveis,
mas também ocorrem problemas em termos de qualidade ou de continuidade desses cuidados. A diferença entre a obtenção de cuidados e a
obtenção de cuidados adequados pode significar a diferença entre a vida
e a morte (boxes 4.6 e 4.7). Atrasos no acesso aos cuidados adequados
também são fatores importantes que contribuem para as mortes maternas
e neonatais. Esses atrasos ocorrem por inúmeras razões diferentes, por
exemplo, falha em reconhecer a necessidade de atendimento clínico, normas culturais que impedem o uso de serviços médicos, acesso físico ou
13
Esta seção é baseada em DCP2, capítulo 27.
financeiro limitado às unidades de saúde, e atrasos no recebimento de
cuidados em uma unidade.
As estratégias de melhoria da sobrevivência neonatal que enfatizam
somente o suprimento de cuidados de saúde nas unidades somente
obterão êxito quando integradas às iniciativas de melhoria das práticas
familiares e de incentivo das pessoas a fazerem uso dos serviços de saúde.
Em muitos casos, esse procedimento requer atenção especial no tratamento das barreiras culturais existentes em termos de cuidados, como o
treinamento de auxiliares de parto do sexo feminino quando existem preconceitos culturais contra auxiliares do sexo masculino, ou permitindo às
novas mamães e seus bebês sairem de casa nas primeiras semanas de vida
no caso de uma emergência, além das barreiras financeiras, incluindo
taxas de serviços e custos de transporte.
O DCP2 examina diversos pacotes de serviços que tratam dos cuidados
dos recém-nascidos nos primeiros 28 dias de vida. Algumas dessas intervenções são universalmente aplicáveis e viáveis, mesmo sem profissionais
de saúde especializados. Outras exigem atenção especializada, são mais
complexas ou dependem de suprimentos médicos essenciais. Os pacotes
de intervenções que possuem um grande impacto e que são viáveis na
maioria dos contextos podem ser divididos em cinco grupos: cuidados da
família com os recém-nascidos, cuidados essenciais dos recém-nascidos,
ressuscitação dos recém-nascidos, cuidados com bebês abaixo do peso e
cuidados emergenciais. Os dois primeiros enfatizam a manutenção do
calor, da amamentação e da utilização da higiene (incluindo cuidados
apropriados do cordão umbilical e de lavagem das mãos). Os três últimos
requerem um pouco de treinamento, embora a ressuscitação possa ser
realizada com um equipamento simples que custa menos de US$ 5.
A criação de um programa separado para cuidados do recém-nascido
não faz sentido. Ao contrário, a melhor forma de melhorar os cuidados
com o recém-nascido é preencher a lacuna com o que deve ser uma série
contínua de cuidados que incluem serviços pré-natais, atendimento especializado na hora do parto e suporte de acompanhamento durante o
primeiro mês de vida. A inclusão das intervenções de cuidados com os
recém-nascidos aos serviços existentes (DCP2, capítulo 63) ou a introdução dessas intervenções junto aos serviços básicos onde existem deficiências seria mais custo-efetiva do que a introdução de intervenções
neonatais de forma isolada.
As intervenções para melhoria da saúde neonatal e das taxas de mortalidade são geralmente simples, mas exigem uma rede de funcionamento
de serviços de saúde capaz de fornecer continuidade durante os períodos
pré-natais, de parto e pós-parto. A extensão desses serviços às áreas rurais
e urbanas marginalizadas é o maior desafio. Como primeiro passo, abor-
“As despesas na Índia
teriam de ser duplicadas e
na África triplicadas para
o fornecimento do pacote
de cuidados básicos de
saúde materna e infantil,
junto com as intervenções
especiais referentes à
sobrevivência neonatal.”
Estratégias de maior custo-eficácia para a carga excessiva de doenças em países em desenvolvimento | 95
dagens simples podem ser implementadas até mesmo nos ambientes mais
pobres para melhorar as práticas familiares, principalmente, com relação
à limpeza, ao calor e à amamentação. Nos locais em que os serviços básicos de saúde encontram-se disponíveis, é possível a introdução de treinamento e de equipamentos para tratamentos bem-testados como ressuscitação neonatal e gerenciamento de caso de infecções, mas o tratamento
completo do problema de sobrevivência neonatal requer o preenchimento das lacunas na continuidade dos cuidados e no fortalecimento da rede
de serviços e da extensão dos cuidados de saúde. Isso significa a garantia
de que as parteiras profissionais possam participar de partos e fornecer o
acompanhamento necessário, que as famílias aprendam quando procurar
cuidados de saúde, e que esses cuidados sejam prontamente acessíveis.
O DCP2 conclui que as despesas mais modestas podem ter um efeito
importante na sobrevivência neonatal. Por exemplo, na África
Subsaariana, o fornecimento de serviços básicos de saúde materna e
infantil que reduziriam a mortalidade neonatal de 6% a 41%, dependendo da cobertura preexistente de serviços primários e da taxa da linha de
base de mortalidade neonatal, custaria entre US$ 2 e US$ 10 por cabeça.
Um custo adicional entre US$ 0,21 e US$ 0,95 nas despesas por cabeça
poderia reduzir as mortes neonatais em até 71%. As estimativas posicionam os custos específicos de adição do treinamento de ressuscitação
neonatal, equipamentos, cursos de atualização, e supervisão em menos de
US$ 0,02 por cabeça para uma redução antecipada na mortalidade neonatal de cerca de 5% na África e no Sul da Ásia.
Apesar de alguns países de poucos recursos terem demonstrado êxito,
o processo de criação de um sistema funcional, principalmente de cuidados clínicos, requer tempo. Mesmo que parecendo pequenos com relação
às despesas nos países de rendas média e alta, os custos são bem maiores
com relação às despesas atuais com cuidados de saúde nos países de baixa
renda. As despesas na Índia teriam de ser duplicadas e na África triplicadas para o fornecimento do pacote de cuidados básicos de saúde materna e infantil, junto com as intervenções especiais referentes à sobrevivência neonatal. O financiamento internacional é portanto necessário para a
redução da carga da doença associada às condições neonatais nos países
de baixa renda.
96 Prioridades em Saúde|
Capítulo 5
Estratégias custo-efetivas
para doenças não transmissíveis,
fatores de risco e comportamentos
Por algum tempo, especialistas em saúde pública interessados em países
de renda média e baixa dedicaram uma atenção considerável às doenças
transmissíveis e à saúde materno-infantil. Recentemente, entretanto, sua
atenção se voltou mais para as doenças não transmissíveis, como doenças
cardiovasculares, diabetes e diversos tipos de câncer e lesões intencionais
e não-intencionais. Essa mudança deve-se ao reconhecimento de que a
carga das doenças não transmissíveis nos países de renda média e baixa
não só está crescendo rapidamente, mas já está extremamente alta. Na verdade, até 2001, as doenças cardiovasculares se tornaram a principal causa
de morte em todo o mundo, tanto nos países em desenvolvimento como
nos desenvolvidos. As doenças não transmissíveis agora são as principais
fontes de morbidade e mortalidade em todo o mundo.
O perfil de algumas doenças não transmissíveis nos países de renda
média e baixa é semelhante ao dos países de alta renda. Em todas as
regiões do mundo, por exemplo, pelo menos 80% da carga de doenças
cardiovasculares é proveniente de cardiopatia isquêmica, insuficiência
cardíaca congestiva e acidente vascular cerebral. Essas condições compartilham vários fatores de risco, como obesidade, hipertensão arterial,
sedentarismo e consumo de sal e, conseqüentemente, estão sujeitas às
mesmas intervenções.
Outras doenças não transmissíveis possuem perfis diferentes em países em desenvolvimento e desenvolvidos. O câncer, por exemplo, mostra
uma variação geográfica considerável. Os tipos de câncer que predominam nos países de alta renda, como o de pulmão, o cólon-retal, o de
mama e o de próstata, podem ser ligados a fatores como o início mais precoce da epidemia de tabagismo, exposição mais cedo a carcinógenos, dieta
e estilo de vida. Por outro lado, os tipos de câncer que predominam em
países de renda média e baixa, como o cervical, de fígado e de estômago,
estão associados com infecções crônicas como Papilomavírus Humano,
hepatite B e Helicobacter pylorii. O câncer causa uma grande e crescente
carga de doenças em todo o mundo, mas sua epidemiologia e, conse-
97
“É preciso evitar que a
redução da perda de vida
devido a doenças
transmissíveis seja
substituída por uma perda
de vida equivalente devi-
qüentemente, as intervenções relevantes diferem bastante entre os países
de renda média e baixa e os países de alta renda.
A carga de doenças não transmissíveis está crescendo, mas muitos países de renda média e baixa ainda não experimentaram todas as exigências
que essas condições imporão aos seus sistemas de saúde. Ironicamente,
parte dessa carga resultará de sucessos na prevenção ou no tratamento de
doenças transmissíveis e na redução da mortalidade infantil: com a melhoria da saúde pública, as pessoas que teriam morrido na infância agora
sobreviverão e se tornarão suscetíveis às doenças não transmissíveis.
Uma parte da carga das lesões e doenças não transmissíveis pode ser
evitada. Por exemplo, com a adoção de políticas que promovam uma alimentação saudável e desencorajem o fumo, os países de renda média e
baixa podem se livrar de perfis de risco que os países mais ricos adquiriram durante o seu desenvolvimento. A implementação de medidas de
segurança no trânsito também poderia evitar aos países de renda média e
baixa uma carga substancial de lesões de acidentes de trânsito, que
aumentam com o crescimento do tráfego motorizado. É preciso evitar que
a redução da perda de vida devido a doenças transmissíveis seja substituída por uma perda de vida equivalente devido a doenças não transmissíveis.
do a doenças não transmissíveis.”
DOENÇAS CARDIOVASCULARES, DIABETES, HIPERTENSÃO
ARTERIAL, COLESTEROL E OBESIDADE
As cargas de doenças cardiovasculares, diabetes e condições relacionadas de hipertensão arterial, colesterol elevado e obesidade estão
crescendo em todo o mundo.1 Anteriormente consideradas como doenças
de países industrializados ou da população rica nos países em desenvolvimento, elas agora são reconhecidas como problemas globais.
Em 2001, as doenças cardiovasculares se tornaram a principal causa de
morte do mundo e agora são responsáveis por 28% de todas as mortes,
com 80% da carga em países de renda média e baixa. A maior parte dessa
carga ocorre na Ásia e na Europa Oriental devido às grandes populações
dessas regiões e à alta incidência de doenças das artérias coronárias na
Europa Oriental e Ásia Central. O diabetes também está em crescimento
em todo o mundo, atingindo uma predominância de 5,1% em 2003. A
prevalência do diabetes é maior nos países de alta renda, com 7,8%, e nas
regiões em desenvolvimento varia entre um mínimo de 2,4% na África
Subsaariana até um máximo de 7,6% na Europa Oriental e Ásia Central.
Apesar da maior predominância do diabetes em países de alta renda, a
1
98 | Prioridades em Saúde|
Esta seção se baseia no DCP2, capítulos 30, 33, 44 e 45. 98 | Prioridades em saúde
maior parte da carga de doenças por diabetes, mais de 70%, encontra-se
nas regiões em desenvolvimento devido às suas grandes populações.2
Outra maneira de examinar a carga de doenças cardiovasculares, diabetes e condições relacionadas é classificá-las por fator de risco. O
Relatório Mundial da Saúde de 2002 (OMS 2002) estimou que globalmente 7,1 milhões de mortes poderiam ser atribuídas à hipertensão arterial, 4,4 milhões a colesterol alto e 2,6 milhões de mortes à obesidade. A
obesidade é um problema crescente em quase todos os países, mesmo os
mais pobres. Está crescendo tão rapidamente que nos países de renda
média a carga de doenças associadas a um índice de massa corporal superior a 25 agora é igual ou maior que a carga de doenças resultante da subnutrição.
Essas doenças não são conseqüências inevitáveis da vida moderna. É
possível conseguir taxas baixas com pequenas mudanças no estilo de vida
que são totalmente compatíveis com a vida no século XXI. Entretanto, as
mudanças necessárias em relação ao fumo, à atividade física e à dieta
podem não ser fáceis e exigem apoio e incentivo por meio de investimentos na educação, mudanças nas políticas alimentícias e às vezes até
mudanças na infra-estrutura urbana. Embora as mudanças comportamentais necessárias sejam as mesmas em qualquer lugar, os modos de
alcançá-las certamente vai variar entre países e regiões, com diferentes
abordagens de acordo com os aspectos culturais, sociais e econômicos.
“Apesar da maior predominância do diabetes em
países de alta renda, a
maior parte da carga de
doenças por diabetes,
mais de 70%, encontra-se
nas regiões em desenvolvimento devido às suas
grandes populações.”
Intervenções no estilo de vida
Os fatores de risco das doenças cardiovasculares e do diabetes — obesidade, inatividade física e dietas pouco saudáveis — exigem intervenções
para mudar os estilos de vida pouco saudáveis. Essas mudanças ocorrem
com maior facilidade com a implementação de algumas intervenções
coordenadas para estimular as pessoas a manterem um peso saudável,
participarem de atividades físicas diárias e consumirem uma dieta saudável. Uma dieta saudável substitui a gordura saturada e trans por gordura
não saturada; aumenta o consumo de frutas, vegetais e cereais integrais e
limita o consumo de sódio e o excesso de calorias de qualquer fonte, principalmente de bebidas que contenham açúcar.
A educação é a chave para a implementação dessas mudanças. Ela
parece ser mais eficaz quando fornecida por meio de vários métodos e
2
Os dados do diabetes incluem o tipo 1 (uma doença auto-imune resultante da destruição das
células do pâncreas e que leva a uma deficiência total de insulina) e o tipo 2 (que se caracteriza
por uma resistência à insulina, na qual os tecidos não usam a insulina de modo apropriado, e a
secreção inadequada de insulina pelo pâncreas), além do diabetes gestacional. O diabetes do tipo
2, que tem alguns dos fatores de risco das doenças cardiovasculares, atualmente é responsável por
cerca de 85 a 95% de todos os casos de diabetes.
“. . . nos países de renda
média, a carga de doenças
associadas com ... um
índice de massa corporal
superior a 25 agora é
igual ou maior que a
carga de doenças . . de
subnutrição.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 99
“Como o uso do automóvel é duas vezes mais
caro na Europa do que nos
Estados Unidos, os
europeus andam a pé ou
de bicicleta mais e usam
seus carros cerca de
50% a menos que os
americanos.”
“. . . a Holanda reduziu o
conteúdo de gordura trans
dos produtos alimentícios
de cerca de 6% do conteúdo energético para
aproximadamente 1% em
uma única década.”
100 | Prioridades em Saúde|
locais, como escolas, locais de trabalho, meios de comunicação e centros
de saúde. As mensagens educacionais também são mais eficazes quando
são reforçadas pela ação. As escolas, por exemplo, deveriam fornecer não
somente currículos sobre boa nutrição, mas também refeições saudáveis;
os locais de trabalho, além de informar os trabalhadores sobre o papel da
atividade física, deveriam facilitar o uso de transportes não motorizados.
Um projeto urbano e uma política de transporte são outros elementos
de intervenções no estilo de vida. As pessoas podem ser encorajadas a
aumentarem sua atividade física com o uso de transportes públicos e não
motorizados, especialmente andar a pé e de bicicleta. Embora normalmente não sejam consideradas um instrumento de melhoria da saúde, as
políticas nacionais de transporte podem influenciar fortemente o uso e a
dependência do automóvel. Baixos impostos para a gasolina, estacionamento gratuito e projetos de ruas largas estimulam o uso de automóveis
(como nos Estados Unidos), enquanto ruas estreitas, estacionamento
restrito e altos custos de gasolina desencorajam o seu uso (como na
Europa Ocidental). Como o uso do automóvel é duas vezes mais caro na
Europa do que nos Estados Unidos, os europeus andam a pé ou de bicicleta mais e usam seus carros cerca de 50% a menos que os americanos.
As mesmas tendências nas políticas públicas ocorrem nos países de renda
média e baixa. Cingapura sempre desencorajou o uso de automóveis privados e incentivou o uso de transportes públicos, andar a pé ou de bicicleta. Por outro lado, a China incentivou explicitamente as famílias a comprarem automóveis diminuindo os impostos, simplificando os procedimentos de registro e permitindo o financiamento estrangeiro.
A política alimentícia é outra área importante de incentivo à mudança
do estilo de vida. Os instrumentos de política incluem o modo como o alimento é processado, pelo enriquecimento dos alimentos com micronutrientes, e a limitação de propaganda de alimentos não saudáveis. Uma das
formas mais eficazes de melhorar a dieta é regulamentar ou fornecer
incentivos aos produtores de alimentos para substituir os ingredientes ou
produtos não saudáveis por outros saudáveis. As mudanças nos tipos de
gordura, por exemplo, podem ser quase imperceptíveis para os consumidores e relativamente baratas. Muitos produtores europeus reduziram em
muito o conteúdo de ácidos graxos trans com a alteração dos métodos de
produção. Desse modo, a Holanda reduziu o conteúdo de gordura trans
dos produtos alimentícios de cerca de 6% do conteúdo energético para
aproximadamente 1% em uma única década. Nas Ilhas Maurício, as
políticas governamentais substituíram o óleo de palma normalmente
usado para cozinha por óleo de soja, o que reduziu o consumo de ácidos
graxos e diminuiu os níveis de colesterol sérico. Outras mudanças facilmente conduzidas no processamento de alimentos incluem a redução de
sal e o enriquecimento dos alimentos com micronutrientes como vitamina A, vitamina B 12, iodo, ferro e ácido fólico.
A experiência propiciou algumas lições sobre como ter sucesso na
implementação de intervenções no estilo de vida nas populações:
• As intervenções devem ser a longo prazo e com cronogramas de vários
anos.
• A responsabilidade dessas intervenções deve ficar a cargo de órgãos
confiáveis.
• A colaboração entre o setor de saúde, outros órgãos governamentais,
escolas, locais de trabalho e o setor voluntário é muito importante.
• A cooperação com o setor de alimentação é essencial para garantir a
disponibilidade de opções de alimentos mais saudáveis com preços
razoáveis e com rotulagem que apresente as informações importantes
de modo claro, confiável e padronizado.
Diversas evidências indicam que a maior parte das doenças das artérias
coronárias, acidentes vasculares cerebrais e diabetes, bem como alguns
tipos de câncer, pode ser evitada ou postergada com mudanças realistas na
dieta e no estilo de vida. Uma linha de evidência se baseia na redução das
doenças das artérias coronárias em países que implementaram programas
preventivos. Um exemplo extraordinário é o da Finlândia, que tinha uma
das taxas mais altas de doenças cardiovasculares do mundo e onde um
programa abrangente com ênfase na modificação da dieta e do estilo de
Box 5.1 Resposta da comunidade às DCVs na Finlândia
In 1972, a Finlândia tinha a taxa de mortalidade mais alta do mundo em relação às doenças
cardiovasculares (DCV). Os planejadores examinaram as políticas e os fatores ambientais
que contribuíam para as DCVs e procuraram as mudanças apropriadas, como uma maior
disponibilidade de laticínios com baixo conteúdo de gordura, legislação antitabagista e melhores refeições escolares. Eles usaram os meios de comunicação, as escolas, os locais de
trabalho e oradores das áreas de esportes, educação e agricultura para educar os residentes.
Depois de cinco anos, havia melhorias significativas documentadas em relação ao fumo,
colesterol e pressão arterial. Em 1992, as taxas de mortalidade por DCVs para homens com
idades entre 35 e 64 anos tinham caído em 57%. O programa teve tanto sucesso que foi
expandido para incluir outras doenças relacionadas ao estilo de vida e foi usado como um
modelo para planejadores de saúde pública em todo o país e em outros lugares. Vinte anos
depois, as grandes reduções nos níveis dos fatores de risco de DCVs, na morbidade e na
mortalidade foram atribuídas ao projeto. Os dados recentes mostram uma diminuição de
75% na mortalidade por DCVs (Puska e outros, 1998).
Fonte: DCP2, capítulo 44, p. 837..
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 101
“A legislação que
determina a redução do
conteúdo de sal nos
alimentos manufaturados,
seguida de uma
campanha educativa,
pode reduzir a pressão
arterial e custaria US$ 6
por pessoa por ano.”
vida reduziu a taxa de mortalidade em cerca de 75% entre 1972 e 1992
(box 5.1).
O DCP2 estima o custo-eficácia de várias dessas intervenções. A substituição da gordura saturada nos produtos manufaturados, acompanhada
por uma campanha nos meios de comunicação, pode reduzir os eventos
de doença das artérias coronárias em 4%. O custo total dessas mudanças
variam de US$ 1,80 a US$ 4,50 por pessoa por ano, dependendo da região.
A relação custo-eficácia incremental varia de US$ 1.865 por AVAD
evitado no Sul da Ásia até to US$ 4.012 por AVAD evitado no Oriente
Médio e no Norte da África.
A substituição dos 2% de energia resultantes da gordura trans por gordura poliinsaturada poderia reduzir as doenças cardiovasculares de 7% a
40% e também reduziria o diabetes tipo 2. O resultado varia de acordo
com a região. O consumo de gorduras trans já é baixo na China, portanto a sua substituição por gorduras poliinsaturadas não evitará tanto as
doenças como no Sul da Ásia, onde as gorduras usadas normalmente na
cozinha têm um conteúdo de gordura trans extremamente alto. Como a
gordura parcialmente hidrogenada pode ser eliminada ou significativamente reduzida por uma ação do setor voluntário como na Holanda ou
por regulamentação como na Dinamarca, essa intervenção não exige a
educação do consumidor, e os custos ficariam abaixo de US$ 0,50 por pessoa por ano. A relação custo-eficácia dessa intervenção varia de US$ 25 a
US$ 73 por AVAD evitado, dependendo da região. A intervenção gera
economia de custos em todas as regiões.
A legislação que determina a redução do conteúdo de sal nos alimentos manufaturados, seguida de uma campanha educativa, pode reduzir a
pressão arterial e custaria US$ 6 por pessoa por ano. Essa intervenção custaria US$ 1.325 por AVAD evitado no Sul da Ásia e US$ 3.056 por AVAD
evitado no Oriente Médio e no Norte da África.
Intervenções médicas
Quando as mudanças no estilo de vida não são suficientes para evitar as
doenças cardiovasculares ou o diabetes, estão disponíveis diversos tratamentos médicos. Muitos deles são sofisticados e caros, como o enxerto de
novas artérias em torno do coração ou a abertura de um bloqueio com
angioplastia, mas também existem tratamentos relativamente baratos
para doenças cardiovasculares crônicas. Para as pessoas que sofreram
ataques cardíacos, medicamentos como betabloqueadores e aspirina
podem reduzir a chance de uma recorrência. O principal tratamento para
evitar a morte do diabetes tipo 1 são injeções de insulina para manter os
níveis apropriados de glicose sanguínea. Para o diabetes tipo 2, o tratamento exige mudanças na dieta e atividade física, que também são
102 | Prioridades em Saúde|
necessários para o tipo 1 da doença, e agentes orais de redução da glicose,
sendo a insulina necessária somente em casos graves. A pressão sanguínea
e os lipídios também podem ser controlados com produtos farmacêuticos.
Outras intervenções eficazes para o diabetes são a detecção e a identificação precoces, seguidas de um tratamento de retinopatia, microalbuminuria e pé diabético.
Os níveis de glicose das pessoas com diabetes do tipo 1 e 2 são atualmente menos controlados nos países de renda média e baixa. Uma
pesquisa de 1997 feita pela Federação Internacional do Diabetes
(International Diabetes Federation) demonstrou que nenhum país da
África tinha acesso universal à insulina para os que dela necessitavam. Na
República Democrática do Congo, as pessoas com diabetes do tipo 1 tinham acesso à insulina menos de 25% das vezes, implicando em uma alta
taxa de mortalidade. Mesmo nos países de renda média, como El Salvador
e Peru, os diabéticos que precisam de controle glicêmico tinham acesso à
insulina apenas de 26% a 49% das vezes.
A maior parte das evidências em relação ao custo-eficácia dos tratamentos médicos para doenças cardiovasculares e diabetes é proveniente dos
países de alta renda. Os tratamentos médicos para doenças cardiovasculares
que provavelmente são custo-efetivas em países de renda média são:
• agentes anticoagulantes como a aspirina e a heparina para evitar o
tromboembolismo venoso
• injeções de penicilina benzatina como prevenção secundária, normalmente por cinco anos, para os que apresentaram febre reumática
• inibidores da enzima conversora de angiotensina para insuficiência
cardíaca congestiva
• anticoagulantes para estenose mitral e fibrilação atrial
• diversas drogas, como betabloqueadores e estatinas genéricas, para
tratamento a longo prazo após enfarte do miocárdio.
A disponibilidade de desfibriladores em veículos de emergência tem
um alto índice de custo-eficácia em países de alta renda, mas provavelmente não será custo-efetiva na maioria dos países de baixa renda. No
entanto, a sua disponibilidade em hospitais pode ser custo-efetiva.
Pesquisadores médicos estão colocando grandes esperanças no desenvolvimento da chamada polipílula para prevenir doenças cardiovasculares. A hipotética polipílula combinaria diversos medicamentos, incluindo a aspirina comum, um betabloqueador, um diurético tiazídico, um
inibidor da enzima conversora de angiotensinas e uma estatina. Quando
utilizada por uma população com 35% de risco de doenças cardiovasculares, a relação custo-eficácia incremental dessa polipílula varia de US$
721 por AVAD evitado no Oriente Médio e no Norte da África até US$
“Mesmos nos países de
renda média . . . os
diabéticos que precisam
de controle glicêmico
tinham acesso à insulina
apenas de 26% a 49%
das vezes.”
"Pesquisadores médicos
estão colocando grandes
esperanças no
desenvolvimento da
chamada polipílula para
prevenir doenças
cardiovasculares. . ."
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 103
“ . . . para o diabetes: . .
o controle glicêmico, o
controle da pressão sanguínea e o cuidado com
os pés são todos custoefetivos e viáveis.”
“Em 2020, a menos que a
prevenção contra o câncer
1.065 por AVAD evitado no Leste Asiático e no Pacífico. O custo-eficácia
é compreensivelmente mais baixo nas populações em que a predominância de doenças cardiovasculares é mais baixa.
O custo-eficácia das intervenções médicas para o diabetes varia muito.
Algumas poupam custos, outras podem custar mais de US$ 73.000 por
ano de vida ajustado à qualidade ganho. A estimativa do custo-eficácia
dessas intervenções feita pelo DCP2 incorpora explicitamente as diferenças na implementação, incluindo a facilidade de atingir a população
focalizada e a complexidade técnica das intervenções, a intensidade do
capital e a aceitabilidade cultural. Usando esse quadro, o controle glicêmico, o controle da pressão sanguínea e o cuidado com os pés são todos
custo-efetivos e viáveis.
O controle glicêmico custa menos do que o tratamento das complicações resultantes da sua ausência. A garantia de acesso adequado à insulina é uma abordagem importante e custo-efetiva para as pessoas com diabetes tipo 1, para as quais a insulina é essencial. O controle da pressão sanguínea para os que apresentam hipertensão também é custo-efetivo e
economiza custos. Como muitos dos medicamentos que controlam a
pressão sanguínea são drogas genéricas, o custo é bastante baixo nos
países de renda média e baixa. Além disso, muitas pessoas com diabetes
nesses países também têm um controle precário da pressão arterial. Essa
combinação torna os medicamentos altamente custo-efetivos.
Com isso, o custo-eficácia das intervenções médicas variam consideravelmente nos diversos contextos, dependendo da disponibilidade de
pessoal qualificado, dos peços das drogas e da predominância dos riscos.
Por outro lado, as intervenções no estilo de vida geralmente poupam
custos porque evitam as condições que podem ter um tratamento caro.
e as intervenções exploradoras reduzam efetiva-
CÂNCER
mente . . a incidência . . .
O câncer é outra doença não transmissível há muito considerada uma
ameaça à saúde principalmente em países de alta renda, mas que agora representa uma carga consideravelmente alta da doença em todo o mundo.3
Em 2001, o câncer causou mais de 7 milhões de mortes, das quais 5 milhões
ocorreram em países de renda média e baixa. Nesse ano, o câncer resultou
na perda de mais de 100 milhões de AVAD, com quase 75 milhões perdidas
em países de renda média e baixa. Em 2020, a menos que as intervenções de
exploração e prevenção do câncer realmente reduzam a incidência da
doença, o número de novos casos de câncer aumentarão de uma estimativa
de 10 milhões de casos em 2000 para uma estimativa de 15 milhões por ano,
e 9 milhões deles ocorrerão em países em desenvolvimento.
o número de novos casos
de câncer aumentarão de .
. .10 milhões de casos em
2000 para uma estimativa
de 15 milhões.”
3
104 | Prioridades em Saúde|
Esta seção se baseia no DCP2, capítulo 29.
Embora o câncer seja um problema em todas as partes, ele não se manifesta da mesma maneira em todo o mundo. Uma grande parte dos casos
de câncer nos países em desenvolvimento, até 25%, são associados com
infecções crônicas. O câncer de fígado normalmente está associado com
infecção por hepatite B, o câncer cervical com infecções por certos tipos
de papilomavírus humano (HPV), e o câncer no estômago com infecção
por Helicobacter pylorii. A incidência desses tipos de câncer também está
relacionada com a ausência de uma infra-estrutura de saúde pública bemdesenvolvida para o controle de agentes infecciosos causadores de câncer.
Em 2000, sete tipos de câncer foram responsáveis por cerca de 60% de
todos os casos de câncer recém-diagnosticados e de mortes por câncer nos
países em desenvolvimento: cervical, fígado, estômago, esôfago, pulmão,
cólon-retal e mama. Os quatro primeiros exibem taxas elevadas de
incidência e mortalidade em países em desenvolvimento. Os três últimos
têm uma incidência mais baixa, porém em crescimento, devido às transições demográficas e industriais. As regiões em desenvolvimento também
exibem uma variação considerável nas cargas de câncer. As mortes por
câncer do fígado são relativamente altas no Leste da Ásia e na África por
causa da alta predominância de infecções crônicas por hepatite B e da
armazenagem e preservação inadequadas dos alimentos. As mortes por
câncer cólon-retal e de mama são relativamente altas na Europa Oriental
porque as pessoas nessas regiões adotaram dietas menos saudáveis e com
alto nível de gorduras e estilos de vida sedentários. As mortes por câncer
bucal são especialmente altas no Sul da Ásia, onde é comum mascar folhas de bétel. Esses diferentes tipos de câncer exigem diferentes estratégias
de intervenção.
As intervenções se encaixam em diversas categorias. A prevenção
primária elimina a exposição aos agentes causadores de câncer; a prevenção secundária engloba a detecção e o tratamento de lesões pré-cancerosas; o tratamento inclui cirurgia, quimioterapia e radioterapia; e os
cuidados paliativos são indicados para o conforto físico e psicológico
desde o diagnóstico até a morte.
A prevenção primária dos tipos de câncer mais freqüentes nos países
em desenvolvimento incluem a imunização e o tratamento dos agentes
infecciosos, a implementação de intervenções alimentares, a introdução
de programas de controle do fumo, a redução do consumo excessivo de
álcool e o uso de quimioprofilaxia. Os estudos do custo-eficácia dessas
intervenções são relativamente raros e se concentram nos países de alta
renda. Por exemplo, estudos feitos no Reino Unido e nos Estados Unidos
verificaram que os custos do exame e do tratamento das pessoas com
infecção por helicobacter para reduzir o risco de câncer no estômago
ficam entre US$ 25.000 e US$ 50.000 por ano de vida salvo, mas outro
estudo verificou que essa intervenção seria muito mais custo-efetiva na
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 105
“O custo-eficácia do
tratamento do câncer cervical, de mama, bucal e
cólon-retal varia de
US$ 1.300 até US$ 6.200
por ano de vida salvo.
Para cânceres... do fígado,
pulmão, estômago e
esófago, o custo-eficácia
é ainda pior.”
Colômbia, onde os custos dos cuidados de saúde são mais baixos e a predominância de câncer do estômago é maior.
A prevenção secundária consiste em programas de avaliação para
detectar e tratar os precursores do câncer, o que pode prevenir ou reduzir
a incidência de tipos de câncer muito invasivos, como o cervical ou o
cólon-retal. Uma avaliação eficaz também pode detectar cânceres invasivos, como o de mama ou de pulmão, em um estágio anterior ao que normalmente é possível e, desse modo, aumentar a probabilidade de sucesso
dos tratamentos. O custo-eficácia da prevenção secundária depende de
muitos fatores, como os custos de testes de diagnóstico, a predominância
da doença e a disponibilidade de tratamentos eficazes.
O tratamento do câncer inclui a remoção cirúrgica de tumores,
quimioterapia e radioterapia. O custo-eficácia do tratamento do câncer
cervical, de mama, bucal e cólon-retal varia de US$ 1.300 até US$ 6.200
por ano de vida salvo. Para os tipos de câncer que são mais difíceis de
tratar, como o de fígado, pulmão, estômago e esôfago, o custo-eficácia é
ainda pior, variando de US$ 53.000 até US$ 163.000 por ano de vida salvo.
A disponibilidade de métodos custo-efetivas de prevenção e tratamento do câncer em países de renda média e baixa varia significativamente,
dependendo do tipo de câncer, com um efeito substancial conseqüente
sobre a equidade dos resultados. No caso de cânceres para os quais não
existe detecção e tratamento adequados, ou seja, de esôfago, fígado, pulmão e pâncreas, as taxas de sobrevivência são semelhantes em países ricos
e pobres. Para cânceres com métodos comprovados de tratamento, como
o câncer do intestino grosso, de mama, dos ovários e cervical, existe uma
lacuna substancial entre as melhores taxas de sobrevivência nos países de
alta renda e as piores taxas de sobrevivência nos países de renda média e
baixa. Um terceiro grupo de câncer exige tratamentos complexos e multimodais, como o câncer de testículos, a leucemia e o linfoma. Os desafios
para o fornecimento de cuidados adequados para esses tipos de câncer são
especialmente grandes em ambientes sem equipe médica especializada e
uma boa infra-estrutura de saúde.
DISTÚRBIOS CONGÊNITOS E DO DESENVOLVIMENTO
Outro componente da carga de doenças não transmissíveis é proveniente de
distúrbios congênitos e do desenvolvimento4. À medida que os países de
renda média e baixa progridem no controle das principais doenças da infância, os distúrbios congênitos e do desenvolvimento tendem a se revelar.
Na África, 2% das crianças têm anemia falciforme, uma das condições
hereditárias, ou hemoglobinopatias, que afeta o funcionamento normal
4
106 | Prioridades em Saúde|
Esta seção se baseia no DCP2, capítulo 34.
Figura 5.1 Distribuição Global da hemoglobinopatia
Hb E
Hb S
Fonte: DCP2, capítulo 34, p. 655.
Nota: variantes estruturais da hemoglobina Hb E (inócua a menos que interaja com talassemina α ou β) e Hb S (ocasionando
anemia falciforme no status homozigótico)
Hb ⫽ hemoglobina
da hemoglobina nos glóbulos vermelhos do sangue (figura 5.1). Essa
condição geralmente é ausente entre adolescentes e adultos devido às altas
taxas de mortalidade nas crianças. À medida que os países controlam a
malária e melhoram o diagnóstico e o tratamento de infecções com
antibióticos, um número maior de crianças com essa condição sobreviverá até a idade adulta.
A predominância de deficiências de aprendizado e desenvolvimento
(limitações funcionais resultantes dos danos ao sistema nervoso) se
encontra pelo menos 10% a 20% em países de alta renda. Recém-nascidos
“Na África, 2% das
crianças têm anemia
falciforme . . .”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 107
“. . . Cerca de 7% da
da população do mundo
carrega genes que podem
causar distúrbios de
hemoglobina e, a cada
ano, entre 300.000 e
500.000 bebês nascem
com formas graves dessas
doenças. O retardo mental
moderado causado pela
ingestão de chumbo é
responsável por 1% da
carga global da doença . . .”
108 | Prioridades em Saúde|
e crianças com essas deficiências têm menos condições de sobreviver e
obter a atenção do sistema de saúde até que os países sejam mais capazes
de controlar as doenças infecciosas comuns e que a cobertura do seu sistema de saúde se torne mais completa.
Os distúrbios congênitos e de desenvolvimento são provenientes de
diversas condições. Muitos desses distúrbios são estritamente genéticos: a
anemia falciforme ocorre em uma em cada quatro crianças cujos pais
apresentem o gene recessivo dessa condição e a síndrome de Down é causada pela presença de um terceiro cromossoma. Outros distúrbios ocorrem quando o desenvolvimento do feto é prejudicado, como nos casos de
síndrome alcoólica fetal, deficiência de iodo e rubéola congênita. Uma terceira classe de distúrbios ocorre devido a exposição ambiental adversa
como, por exemplo, danos neurológicos causados por malária cerebral,
meningite bacteriana ou envenenamento por chumbo.
Esses distúrbios são responsáveis por uma parcela significativa da carga
mundial de doenças. Cerca de 7% da população do mundo carrega genes
que podem causar distúrbios de hemoglobina e, a cada ano, entre 300.000
e 500.000 bebês nascem com formas graves dessas doenças. O retardo
mental moderado causado pela ingestão de chumbo é responsável por 1%
da carga global da doença, cerca de 9,8 milhões de AVAD, e a ingestão de
chumbo é apenas uma das causas de retardo mental.
As conseqüências desses distúrbios variam amplamente e dependem
tanto da gravidade da condição como do contexto. Quando o sistema de
saúde pode garantir o diagnóstico apropriado e a profilaxia com penicilina, muitas crianças podem ter uma vida normal mesmo apresentando
anemia falciforme. Os distúrbios de hiperatividade e dislexia são problemáticos em ambientes escolares que não possuem recursos para tratar
deles. A estigmatização pode impedir que as pessoas participem de atividades sociais mesmo quando as limitações funcionais não constituem
uma restrição. Nos lugares em que a política de saúde pública promove a
construção de rampas para cadeiras de rodas ou o uso de código Braille,
as limitações funcionais são menos restritivas.
Algumas intervenções na área da saúde abordam os distúrbios congênitos e de desenvolvimento por meio da prevenção. É o caso de medidas
como a oferta de avaliações genéticas e aconselhamento para casais quando são detectados distúrbios congênitos graves, a vacinação contra Hib e
meningite meningocócica para evitar danos neurológicos, a implementação de intervenções comportamentais para interromper o uso de álcool
durante a gravidez para evitar a síndrome alcoólica fetal, a eliminação da
exposição ambiental a toxinas como o chumbo, que causam retardo mental, e a correção de deficiências nutricionais entre mulheres grávidas.
Outras intervenções disponíveis para evitar que os distúrbios gerem
deficiências são:
• O exame de distúrbios metabólicos identifica as pessoas que irão
desenvolver problemas neurológicos após a ingestão de determinados
alimentos. As crianças com risco de tais distúrbios e seus pais podem
ser aconselhados para que possam restringir a dieta das crianças identificadas de modo adequado.
• O exame de anemia falciforme pode ser acompanhado de profilaxia
com penicilina para reduzir o risco de morte e morbidade em conseqüência das infecções.
• O exame e o tratamento de hipotiroidismo congênito pode evitar os
danos de desenvolvimento que resultam em deficiências cognitivas
graves.
• O tratamento imediato da malária cerebral pode evitar os danos
neurológicos no longo prazo.
Quando os distúrbios não podem ser evitados, em alguns casos existem tratamentos disponíveis para reduzir o impacto na saúde do indivíduo. Pessoas com problemas causados por talassemias graves, distúrbios
genéticos que englobam a produção defeituosa de hemoglobina no
sangue, podem precisar de transfusões de sangue com hemácias lavadas
selecionadas especificamente para evitar doenças transmitidas pelo
sangue; os indivíduos com anemia falciforme podem ser hospitalizados e
tratados com analgésicos quando sofrem de dores severas nos ossos; e o
reforço nutricional, a cirurgia, a reabilitação ou a educação especial
podem reduzir a gravidade das deficiências.
Finalmente, caso os distúrbios não possam ser evitados ou tratados,
deve ser possível atenuar o impacto da deficiência na qualidade de vida da
pessoa. Muitas intervenções são direcionadas para as condições de saúde
associadas; por exemplo, as pessoas nascidas com síndrome de Down
geralmente precisam de tratamento ou terapia para deficiências de visão
ou audição, problemas cardíacos congênitos e baixa capacidade mental.
Outras intervenções enfocam as restrições ambientais na participação do
indivíduo na vida social e familiar, seja com a melhoria da mobilidade física através de investimentos adequados em infra-estrutura pública, como
o acesso para cadeira de rodas em transportes, edifícios e banheiros públicos; com a construção de redes de apoio social; ou com a abordagem do
estigma social e a educação do público para uma maior inclusão das pessoas com deficiências.
O DCP2 concluiu que muitas intervenções para o tratamento de distúrbios congênitos e de desenvolvimento são custo-efetivas. O capítulo 34
destaca a profilaxia com penicilina para recém-nascidos com anemia falciforme, que custa entre US$ 7.000 e US$ 12.000 por morte evitada e de
US$ 250 a US$ 600 por AVAD evitado. Também observa que o exame de
anemia falciforme entre pessoas de descendência africana custa cerca de
“ . . . muitas intervençõe
para o tratamento de
distúrbios congênitos e
de desenvolvimentos são
custo-efetivas.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 109
“Uma melhor nutrição das
mulheres grávidas. . . não
somente seria benéfica
para a saúde das próprias
mulheres e para reduzir o
risco de mortalidade
materna, como também
reduziria as chances de
seus filhos nascerem com
um distúrbio congênito.”
US$ 6.700 por morte evitada, mas que o exame universal em outras populações com baixa predominância da doença não é custo-eficiente. O
capítulo 49 conclui que o suplemento de ácido fólico nos cereais para prevenir defeitos congênitos é custo-efetivo, custando uma média de US$ 36
por AVAD evitado na América Latina e no Caribe, US$ 40 por AVAD evitado na África Subsaariana, US$ 58 por AVAD evitado no Sul da Ásia e
US$ 160 por AVAD evitado no Leste da Ásia e no Pacífico. O exame prénatal e a interrupção seletiva da gravidez para prevenir a síndrome de
Down, a espinha bífida e outros distúrbios congênitos muitas vezes fatais
podem ter um alto índice de custo-eficácia, mas levantam questões éticas,
sociais e culturais que precisam ser tratadas de modo a respeitar a gravidade de tais decisões e a assegurar a proteção dos direitos humanos.
No tratamento dos distúrbios congênitos e de desenvolvimento, as
evidências no DCP2 demonstram as fortes relações entre as doenças. Os
programas de imunização tinham em vista que a prevenção da rubéola
reduziria a probabilidade de deformidades congênitas nos recém-nascidos
e que um melhor controle da malária reduziria a ocorrência de distúrbios
neurológicos resultantes da malária cerebral. Uma melhor nutrição das
mulheres grávidas, com ênfase especial em micronutrientes como vitamina
A, ácido fólico e iodo, não somente seria benéfica para a saúde das próprias
mulheres e para reduzir o risco de mortalidade materna, como também
reduziria as chances de seus filhos nascerem com um distúrbio congênito.
LESÕES NÃO-INTENCIONAIS
“...as lesões não-intencionais foram responsáveis por 3,5 milhões de
mortes em 2001, das
quais mais de 90% ocorreram em países de renda
média e baixa. . .”
As lesões não-intencionais, especialmente os acidentes de trânsito, são
outro componente da carga de doenças não transmissíveis.5 Em todo o
mundo, as lesões não-intencionais foram responsáveis por 3,5 milhões de
mortes em 2001, das quais mais de 90% ocorreram em países de renda
média e baixa e foram responsáveis por cerca de 7% de todas as mortes
nesses países. Entre elas, os acidentes de trânsito foram responsáveis por
cerca de 34% das mortes resultantes de lesões não-intencionais. Embora
os homens sejam responsáveis por 66% de todas as mortes por lesões nãointencionais, eles respondem por 73% dos acidentes de trânsito.
Os acidentes de trânsito crescem quando o volume de viagens e o uso
de veículos motorizados, especialmente veículos de duas rodas, aumentam. Eles também ocorrem com mais freqüência com velocidades mais
altas e em lugares onde as estradas não suportam o aumento de volume e
de velocidade do tráfego. Também ocorrem acidentes quando os pedestres
precisam compartilhar as rodovias com os veículos motorizados e nãomotorizados.
5
110 | Prioridades em Saúde|
Esta seção se baseia no DCP2, capítulo 39.
Os acidentes de trânsito tendem a aumentar à medida que os países se
industrializam e crescem economicamente. Mais tarde, com o aumento da
riqueza e o fortalecimento das instituições públicas, os países investem em
medidas de segurança, mas a espera por crescimento da renda para a
implementação de medidas preventivas resulta na perda desnecessária de
milhões de vidas. A consciência desse padrão histórico de crescimento de
acidentes de trânsito ajuda os países de renda média e baixa a reconhecer
a necessidade de incorporar projetos mais seguros na construção de
estradas e rodovias, bem como a promover hábitos de dirigir mais
seguros.
Existem muitas intervenções eficazes disponíveis para reduzir o risco
de lesões por acidente de trânsito. O primeiro conjunto de intervenções
aborda a exposição ao risco. Exemplos disso incluem a substituição de
modos perigosos de transporte por outros mais seguros e a diminuição de
cenários de alto risco, como o aumento da idade legal mínima para dirigir motocicletas. O segundo conjunto de intervenções engloba a construção de estradas mais seguras. Essas intervenções podem incluir a colocação de lombadas para reduzir a velocidade do tráfego, a separação das
faixas para veículos do caminho usado para pedestres e bicicletas, a construção de barreiras centrais, o fornecimento de faixas de ultrapassagem e
a melhoria da iluminação das ruas. O terceiro conjunto de intervenções
enfoca o incentivo para que as pessoas adotem atitudes mais seguras. Essas
medidas incluem a criação e o cumprimento de leis relativas a limites de
velocidade, níveis de álcool no sangue, horários para motoristas comerciais, fornecimento e uso de cintos de segurança e a utilização de capacetes
para bicicletas e motocicletas, além da educação dos pedestres.
O DCP2 avalia o custo-eficácia de diversas intervenções direcionadas
para a redução de acidentes de trânsito, incluindo multas mais altas para
a violação das regras de segurança no trânsito, juntamente com rigor na
execução das leis, redutores de velocidade e obrigatoriedade de uso de
capacetes para bicicletas e motocicletas.
A prova da eficácia de leis de segurança no trânsito mais severas pode
ser vista no Brasil, onde um pacote com três intervenções que incluíam
alterações legislativas para aumentar as multas, a difusão de mensagens na
mídia para informar o público sobre as mudanças e um maior cumprimento das leis obteve uma redução de 25% nas fatalidades no trânsito
entre 1997 e 1998. Embora a educação sobre segurança no trânsito por si
só possa ter um certo impacto, estudos na Malásia e na Tailândia demonstraram que a educação tem um impacto muito maior quando faz parte
de um pacote que inclua uma legislação severa e maior rigor na execução,
pois as intervenções reforçam umas às outras.
“ O Brasil . . . obteve uma
redução de 25% nas fatalidades no trânsito entre
1997 e 1998 : . .”
“. . . a educação tem um
impacto muito maior
quando faz parte de um
pacote que inclua uma
legislação severa e maior
rigor na execução, pois as
interações reforçam umas
às outras.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 111
“A colocação de redutores
de velocidade em 10% de
cruzamentos mais letais
em uma cidade de
1 milhão de habitantes
custaria somente US$ 2
por AVAD evitado na
América Latina e no
Caribe, até US$ 9 por
AVAD evitado no Leste da
Ásia e no Pacífico.”
112 | Prioridades em Saúde|
Redutores de velocidade instalados em cruzamentos perigosos ou
próximo a faixas de travessia de pedestres constituem uma maneira simples de reduzir a velocidade e o risco de acidentes. É preciso haver uma
vigilância e uma coleta de dados prévia, pois, para ser eficaz, o redutor de
velocidade deve ser instalado nos pontos mais perigosos. Gana introduziu redutores de velocidade em lugares perigosos e reduziu as fatalidades
no trânsito nesses locais em mais de 50%.
Os capacetes para ciclistas são extremamente eficazes na prevenção de
lesões na cabeça; no caso de motocicletas, os capacetes têm uma eficácia
ligeiramente menor. Na China, os acidentes relacionados a bicicletas
matam 22 pessoas por milhão de habitantes a cada ano, enquanto os acidentes de motocicleta matam 16 pessoas por milhão de habitantes.
Estudos de casos indicam que os capacetes para ciclistas podem reduzir as
lesões em 85%.
Na modelagem do custo-eficácia dessas intervenções, o DCP2 concluiu
que todas elas custam menos de US$ 1.000 por AVAD evitado. Para legislação e execução de segurança no tráfego, o custo-eficácia variou de US$
14 por AVAD evitado no Sul da Ásia a US$ 584 por AVAD evitado na
Europa Oriental e na Ásia Central. A colocação de redutores de velocidade
em 10% de cruzamentos mais letais em uma cidade de 1 milhão de habitantes custaria somente US$ 2 por AVAD evitado na América Latina e no
Caribe, até US$ 9 por AVAD evitado no Leste da Ásia e no Pacífico. O
aumento do uso do capacete para ciclista na China custaria US$ 107 por
AVAD evitado, enquanto o aumento do capacete para motos custaria US$
467 por AVAD evitado (tabela 5.1).
Portanto, as intervenções para reduzir o risco de acidentes de trânsito
são razoavelmente simples e custo-efetivas. Contudo, os investimentos
nessas intervenções são baixos. Em 1998, Uganda gastou apenas US$ 0,09
per capita e o Paquistão US$ 0,07 per capita em segurança no trânsito, ou
menos de 1% dos gastos públicos em saúde em cada um dos países.
Análises de iniciativas de segurança no trânsito encontraram um subinvestimento similar em segurança no trânsito em Benin, Costa do Marfim,
Quênia, Tanzânia e Zimbábue.
A implementação de medidas de segurança no trânsito não exige novos
conhecimentos: os fatores de risco são bem conhecidos. Entretanto, a
implementação muitas vezes falha devido a conflitos entre os ministérios
do governo, serviços públicos ineficientes e corrupção. Embora os custos
não sejam insignificantes, as intervenções são custo-efetivas.
Tabela 5.1 Principais conclusões: Intervenções custo-efetivas na prevenção de lesões não-intencionais nos
países de renda média e baixa
Lesão
Intervenções promissoras
Acidentes de
trânsito
Redução do tráfego de veículos motorizados: impostos eficientes para
combustíveis, mudanças na política de uso da terra; avaliação do
impacto de segurança dos planos de transportes e uso da terra, provisão
de rotas mais curtas e mais seguras, medidas de redução de viagens
Maior utilização de formas mais seguras de transportes
Intervenções que demonstraram ser
eficazes em países de renda média e
baixa (referências)
Aumento do limite mínimo de idade para
motociclistas de 16 para 18 anos. Norghani e
outros, 1998)
Redução da exposição a cenários de alto risco: restrição do acesso a
diferentes partes da rede de estradas, com prioridade para veículos com
maior ocupação ou para usuários de estradas vulneráveis, restrição da
velocidade e do desempenho do motor dos veículos de duas rodas,
aumento da idade legal para operar uma motocicleta, uso de sistemas
de licenciamento diferenciado de motoristas
Estradas mais seguras
Conscientização de segurança no planejamento das redes rodoviárias,
recursos de segurança no projeto de rodovias e ações corretivas em
locais de alto risco de acidentes : fazer provisões para tráfego lento e
usuários de rodovias vulneráveis; fornecimento de faixas de ultrapassagem, barreiras centrais e iluminação das ruas
Medidas para acalmar o tráfego, como redutores de velocidade
Câmeras para medir a velocidade
Veículos mais seguros
Redutores de velocidade para diminuir os
ferimentos de pedestres (Afukaar, Antwi e
Ofusu-Amah, 2003)
Motocicletas trafegando com faróis acesos
durante o dia (Radin Umar, Mackay e Hills,
1996; Yuan, 2000)
Melhorar a visibilidade dos veículos, incluindo a requisição de faróis
automáticos para uso diurno
Incorporação de projetos de proteção contra acidentes nos veículos,
incluindo a instalação de cintos de segurança
Licenciamento e inspeção obrigatória dos veículos
Pessoas mais seguras
Envenenamentos
Aumento das multas e suspensão das
licenças de condutores (Poli de Figueiredo e
outros, 2001)
Estratégias de legislação e aumento do cumprimento de, por exemplo,
limites de velocidade, limites relativos ao consumo de álcool, horários
de circulação para motoristas comerciais, uso do cinto de segurança,
uso de capacete para bicicletas e motos
Legislação e cumprimento do uso de
capacetes para motociclistas (Ichikawa,
Chadbunchachai e Marui, 2003;
Supramaniam, Belle e Sung, 1984)
Melhor armazenamento, incluindo posicionamento e natureza dos
recipientes
Distribuição gratuita de recipientes que não
podem ser abertos por crianças (Krug e outros, 1994)
Uso de recipientes com tampas de segurança para crianças
Rótulos de aviso
Treinamento de primeiros socorros
Lesões relativas
a quedas
Centros de controle de venenos
Pessoas mais velhas
Fortalecimento dos músculos e reeducação postural (prescrição
individual)
Exercício de tai chi em grupo
(Continua na página seguinte.)
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 113
Tabela 5.1 (Continuação)
Lesão
Intervenções que demonstraram ser
eficazes em países de renda média e
baixa (referências)
Intervenções promissoras
Avaliação de riscos residenciais e modificações em casos de alto risco
Exame multidisciplinar e multifatorial de fatores de risco
Lesões relativas
a incêndios
Introdução de programas para instalação de alarmes de fumaça
Separação das áreas de cozinha das áreas de estar
Colocação de superfícies para cozinha em lugares altos
Redução do armazenamento de substâncias inflamáveis em residências
Maior supervisão das crianças
Introdução, monitoramento e cumprimento de padrões e códigos para
roupas resistentes ao fogo
Lesões relativas a escaldaduras
Separação das áreas de cozinha das áreas de lazer
Melhoria do desenho dos recipientes de cozinha
Lesões relativas a incêndios e escaldaduras
Afogamentos
Limitar a exposição a fluxos de água perto de moradias, como, por
exemplo, por meio de cercas
Proporcionar programas de aulas de natação
Proporcionar educação sobre riscos de afogamento
Aumentar a supervisão e fornecer salva-vidas nos centros de recreação
Equipar barcos com dispositivos de flutuação e assegurar o seu uso
Elaborar leis e forçar o cumprimento de regras sobre o número de pessoas
permitido nos barcos
Ter serviços de guarda costeira treinada e de prontidão
Fonte: DCP2, capítulo 39, p. 39.3.
“Em todo o mundo, o fumo
é responsável por 1 em
cada 5 mortes entre os
homens e 1 em cada 20
mortes entre as mulheres
com mais de 30 anos.”
CONSUMO DE TABACO
Enquanto algumas doenças—HIV/AIDS, TB, câncer—parecem procurar
as pessoas, alguns comportamentos parecem procurar doenças.6 Os comportamentos ligados ao vício colocam as pessoas na última categoria.
Em todo o mundo, o fumo é responsável por 1 em cada 5 mortes entre
os homens e 1 em cada 20 mortes entre as mulheres com mais de 30 anos.
Em 2000, 4,8 milhões de mortes prematuras foram atribuídas a doenças
causadas pelo fumo, como doenças cardiovasculares, câncer do pulmão e
doença pulmonar obstrutiva crônica. Nos países de renda média e baixa,
o fumo também está associado com doenças respiratórias como asma e
6
114 | Prioridades em Saúde|
Esta seção se baseia no DCP2, capítulos 44 e 46.
tuberculose. Entre os homens na China, o fumo foi responsável por uma
estimativa de 12% de mortes por TB. Na Índia, a TB apresentou uma
probabilidade quatro vezes maior em fumantes do que em não-fumantes,
sugerindo que o fumo é um fator contributivo em cerca de metade de
todas as mortes por TB entre os homens. O risco final de morte por fumo
é alto: cerca de metade a dois terços dos fumantes de longo prazo morrerão de doenças causadas pelo tabagismo. Os fumantes também impõem
riscos à saúde de outras pessoas, sendo o fumo passivo um fator de risco
significativo para crianças no desenvolvimento de asma, inflamações na
garganta e doenças respiratórias.
Atualmente, cerca de 1,1 bilhões de pessoas fumam e quatro quintos
desses fumantes residem em países de renda média e baixa. A predominância do fumo é maior na Europa Oriental e na Ásia Central, onde
35% de todos os adultos fumam. Entretanto, o Leste da Ásia e o Pacífico
atualmente respondem pela maioria das mortes relacionadas ao fumo,
cerca de 40%. Os homens fumam mais do que as mulheres, embora a
diferença seja menor nos países de alta renda.
As tendências globais do fumo são preocupantes. Se a proporção de
jovens que começam a fumar continuar no padrão atual — cerca de
metade dos homens e 1 em cada 10 mulheres — a cada ano haverá cerca
de 30 milhões de novos fumantes de longo prazo. Como resultado, em
2030 o número de mortes prematuras relacionadas com o tabaco aumentará para 10 milhões por ano (figura 5.2).
“. . . metade a dois terços
dos fumantes de longo
prazo morrerão de
doenças causadas pelo
tabagismo.”
Figura 5.2 Crescimento projetado de mortes relacionadas ao tabaco se os
fumantes não conseguem parar de fumar
Mortalidade por câncer no pulmão (porcentagem
Continuou a fumar
15
10
Parou aos 50 anos
5
Parou aos 30 anos
Nunca fumou
0
45
55
65
75
Age (years)
Fonte: DCP2, capítulo 48, página 5.
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 115
Figura 5.3 Mortes atribuídas ao fumo
a. Reino Unido
b. França
Taxa de mortalidade/100.000 homens, por idadea
Taxa de mortalidade/100.000 homens, por idadea
18
18
16
16
Homens
14
14
12
12
10
10
8
8
6
6
4
Homens
4
Mulheres
2
Mulheres
2
0
1950
1960
1970
1980
1990
2000
0
1950
1960
1970
1980
1990
2000
Fonte: DCP2, capítulo 46, p. 4.
a. Média de taxas anuais em grupos de cinco anos.
“No Reino Unido. . . , a
incidência de câncer do
pulmão entre os homens
com idade de 35 a
44 anos caiu de 18 casos
em 100.000 pessoas em
1950 para 4 casos em
100.000 em 2000.”
116 | Prioridades em Saúde|
Porém essas mortes podem ser evitadas, como foi demonstrado por
experiências em países em que deixar de fumar tornou-se comum. As iniciativas sérias de controle do fumo começaram a aparecer no Reino Unido
e nos Estados Unidos na década de 1960. O impacto constante dessas iniciativas desencorajou os jovens em relação ao fumo e ajudou milhões de
fumantes a deixar de fumar. Como um resultado direto, as taxas de câncer
do pulmão no Reino Unido e nos Estados Unidos caíram rapidamente.
No Reino Unido, onde o principal aumento do hábito de fumar começou
antes da II Guerra Mundial, a incidência de câncer do pulmão entre os
homens com idade de 35 a 44 anos caiu de 18 casos em 100.000 pessoas
em 1950 para 4 casos em 100.000 em 2000 (figura 5.3a). Por outro lado, o
fumo tornou-se comum na França muito depois, as iniciativas para desencorajar o fumo não tiveram impacto até a década de 1990 e a incidência de câncer do pulmão entre os homens franceses continuou a subir
(figura 5.3b).
A substância do tabaco que causa dependência é a nicotina, um psicotrópico. A inalação é a forma mais eficaz de fazer com que a nicotina
chegue aos receptores no cérebro. A nicotina cria sensações positivas
quando é administrada e causa sensações desagradáveis quando é retira-
da. Nesse aspecto, ela é equivalente a qualquer outra droga altamente causadora de dependência como a heroína e a cocaína.
As influências comportamentais aumentam a natureza bioquímica
causadora de dependência do fumo. Ao contrário das drogas ilícitas que
acarretam riscos de prisão e desaprovação social, os costumes sociais e
interesses comerciais lícitos favoreceram o uso do tabaco. As empresas
produtoras de fumo e os governos incentivaram o fumo por meio de propagandas e outras formas de promoção. O marketing de massa também
apresenta aos fumantes muitas oportunidades e dicas freqüentes para
adquirir os produtos e fumar, dificultando muito o abandono do fumo.
A prevenção é a melhor maneira de tratar as doenças causadas pelo
fumo. Qualquer coisa que reduza o fumo, seja diminuindo o número de
pessoas que começam a fumar, aumentando o número das que param,
reduzindo o número das que têm recaídas ou diminuindo o fumo entre
os que continuam a fumar, vai, em última análise, reduzir a carga das
doenças relacionadas com o fumo, como doenças cardiovasculares, câncer
e tuberculose. A natureza causadora de dependência do fumo tem implicações para desencorajar o seu uso. Ensinar aos consumidores que o fumo
causa dependência e problemas de saúde não é suficiente, pois as pessoas
normalmente subestimam os futuros riscos à saúde e porque os jovens
têm uma maior propensão a adotar comportamentos de risco. Depois que
as pessoas estão dependentes, é difícil parar. As intervenções que se
mostraram eficazes na redução do fumo são o aumento dos impostos
sobre o fumo, a disseminação de informações sobre os riscos do fumo à
saúde, a restrição do fumo em lugares públicos e no local de trabalho,
proibição de propaganda e aumento do acesso às terapias para parar de
fumar.
Quase todos os governos tributam o fumo para gerar receita, mas à
medida que a conscientização dos perigos do fumo cresceu, os governos
estão cada vez mais usando as políticas fiscais do fumo para aumentar o
custo do hábito e desincentivar o fumo. Em alguns casos, os países até já
destinaram os impostos do tabaco para financiar programas de saúde
dedicados à redução da exposição ao fumo.
Os impostos sobre o fumo têm um efeito maior na redução do consumo entre os grupos de renda mais baixa, jovens e pessoas com menores
níveis de instrução. Os impostos também são mais eficazes no longo prazo
do que no curto prazo, pois os consumidores dependentes mudam seus
hábitos lentamente. Os preços mais altos do fumo parecem ser mais eficazes para evitar que os fumantes jovens passem da fase de experimentação e se tornem fumantes habituais. Estudos estimaram que o efeito do
aumento dos preços dos cigarros pode ser duas vezes maior nos países de
renda média e baixa do que nos países de alta renda, indicando que
“ . . .cada vez mais os
governos utilizam uma
política de taxa sobre o
fumo para aumentar o
custo do vício e
desencorajar o uso do
fumo.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 117
“. . . o abandano do vício
aumenta as possibilidades de sobrevivência
apesar do tempo em que
o indivíduo fumou.”
118 | Prioridades em Saúde|
aumentos significativos nos impostos dos cigarros no primeiro grupo
seriam mais eficazes na redução do hábito de fumar. Os impostos são
responsáveis por mais de dois terços do preço no varejo na maioria dos
países de alta renda, mas por menos da metade nos países de renda média
e baixa.
Além de aumentar o preço dos cigarros, muitos países efetivamente
desincentivaram o fumo com a sua restrição em áreas públicas. A justificativa para essas medidas é proteger os não-fumantes dos danos causados pela inalação da fumaça, mas essas medidas também criam um
obstáculo para os fumantes, forçando-os a mudarem seus hábitos e
procurar áreas especiais para fumantes. Isso pode ajudar a criar empecilhos para o fumo e também a estigmatizar a prática, conduzindo a
mudanças nas normas sociais. Para terem impacto, essas regulamentações
precisam ser cumpridas, principalmente ao serem introduzidas.
As intervenções que afetam as atitudes das pessoas e o conhecimento
sobre os perigos do fumo também podem ajudar bastante. Os cigarros
estão entre os produtos mais fortemente anunciados e promovidos do
mundo. Campanhas informativas e educacionais podem refrear o
impacto desse marketing com a publicação de relatórios sobre os perigos
do fumo, a colocação de rótulos de aviso nas embalagens e a difusão de
mensagens antifumo na mídia. Restrições abrangentes à propaganda e à
promoção dos cigarros podem reduzir o fumo e tornar as campanhas de
conscientização pública mais eficazes.
Embora os perigos do fumo tenham se tornado amplamente conhecidos na maioria dos países de alta renda, a conscientização dos riscos de
mortalidade e de doenças causados pelo fumo ainda não está amplamente
difundida nos países de renda média e baixa. As principais mensagens que
precisam ser transmitidas são que a dependência pode vir a matar metade
ou dois terços dos fumantes; que, em média, os fumantes perderão de 20
a 25 anos de vida e vão morrer entre 35 e 69 anos de idade; e que parar de
fumar aumenta as chances de sobrevivência, independentemente de
quanto tempo a pessoa tenha fumado.
O recente desenvolvimento de drogas que anulam os efeitos da nicotina aumentam as chances de sucesso para os fumantes que gostariam de
parar de fumar. Ironicamente, os produtos derivados do tabaco que contêm nicotina geralmente são mais baratos e mais fáceis de comprar do que
as terapias de substituição da nicotina. Políticas que corrijam esse desequilíbrio com a diminuição dos custos das terapias de substituição da
nicotina e o aumento da sua disponibilidade podem ajudar os fumantes a
parar de fumar. Essas terapias são mais eficazes quando aliadas à orientação e ao apoio de colegas. É especialmente importante promover a idéia
de parar de fumar, pois a maior parte das mortes relacionadas ao fumo de
agora até 2050 será entre os fumantes atuais. Por outro lado, as políticas
destinadas a prevenir que os jovens comecem a fumar terão o principal
impacto depois de 2050.
As intervenções que enfocam a redução do fornecimento de cigarros
não parecem particularmente eficazes. Alguns desses programas, como a
proibição da venda de produtos derivados do tabaco para jovens, são difíceis e dispendiosa para executar. As restrições à importação de produtos
derivados do tabaco podem aumentar os preços internos, mas também
violam os acordos comerciais internacionais. Programas que incentivam
os agricultores a parar de plantar tabaco não são eficazes porque outros
agricultores podem expandir sua produção para preencher a lacuna.
Portanto, os países de renda média e baixa devem ser bem orientados a
concentrar seus esforços na redução da demanda.
Felizmente, a maior parte das intervenções voltadas para a demanda
são custo-efetivas e até mesmo economizam custos. A tributação dos produtos derivados do tabaco para aumentar o custo dos cigarros é a maneira
de maior custo-eficácia para reduzir o fumo. Um aumento de 70% no
preço dos cigarros pode evitar de 10% a 26% das mortes relacionadas ao
fumo em todo o mundo. O efeito seria especialmente forte em países de
renda média e baixa, entre os jovens e para homens. O uso de um cenário
de caso básico de um aumento de 33% nos preços gera uma relação custoeficácia de US$ 3 a US$ 42 por AVAD evitado em países de renda média e
baixa, e de US$ 85 a US$ 1.773 por AVAD evitado em países de alta renda.
Intervenções bem-sucedidas na Polônia e na África do Sul foram muito
além desse aumento modesto de preços, quase dobrando os preços dos
cigarros em pouco tempo (DCP2, capítulo 8; Levine e outros 2004).
Embora os aumentos de preços sejam a abordagem de maior custo-eficácia para controlar o fumo, essa medida de saúde pública é nitidamente
subutilizada. Na verdade, quando ajustado para o poder de compra, o
preço dos produtos derivados do tabaco caiu na maioria dos países em
desenvolvimento entre 1990 e 2000.
O aumento do acesso às terapias de substituição de nicotina para ajudar os fumantes que querem parar de fumar é mais cara, custando entre
US$ 75 e US$ 1.250 por AVAD evitado, mas ainda é relativamente custoeficiente, principalmente quando o custo direto das terapias é baixo.
Outras intervenções não relacionadas ao preço poderiam ser implementadas a um custo entre US$ 233 e US$ 2.916 por AVAD evitado. O custoeficácia das medidas não relacionadas ao preço é extremamente sensível
ao contexto. Nos países em que o público absorve facilmente as mensagens da saúde pública, os custos podem ser baixos.
As mortes relacionadas ao fumo são a causa de morte com crescimento
mais rápido nos países de renda média e baixa, igual ao da epidemia de
“Um aumento de 70% no
preço dos cigarros pode
evitar de 10% a 26% das
mortes relacionadas ao
fumo em todo o mundo.”
“. . . quando ajustado para
o poder de compra, o
preço dos produtos
derivados do tabaco caiu
na maioria dos países em
desenvolvimento entre
1990 e 2000.”
“As mortes relacionadas
ao fumo são a causa de
morte com crescimento
mais rápido nos países de
renda média e baixa, igual
ao da epidemia de
HIV/AIDS.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 119
“As doenças relacionadas
ao álcool são responsáveis
por cerca de 4% dos
AVAD globais a cada ano .
. . desde um percentual
baixo de 0,5% no Oriente
Médio e no Norte da
África . . . até . . .
10,7% na Europa Oriental
e na Ásia Central.”
HIV/AIDS. A disponibilidade de medidas de controle custo-efetivas elimina qualquer desculpa para a falta de ação. Os obstáculos à prevenção de um
rápido aumento das mortes relacionados ao fumo, que exige respostas
fortes e hábeis àqueles que comercializam produtos derivados do tabaco e
intercedem contra a reforma, encontram-se claramente no âmbito político.
CONSUMO EXCESSIVO DE ÁLCOOL
O consumo de álcool de alto risco7 é um problema sério de saúde pública.8 Ele prejudica diretamente a saúde daqueles que bebem em excesso e
contribui para comportamentos de risco que causam lesões e deficiências
neles mesmos e em outros. O consumo de álcool está vinculado à saúde
de longo prazo e às conseqüências sociais por meio de três mecanismos
intermediários: intoxicação, dependência e efeitos biológicos diretos
(figura 5.4).
As doenças relacionadas ao álcool são responsáveis por cerca de 4% dos
AVAD globais a cada ano e variam de um percentual baixo de 0,5% no
Figura 5.4 Modelo de consumo de álcool, resultados intermediários e
conseqüências no longo prazo
padrões de
ingestão de bebidas
alcoólicas
Efeitos
bioquímicos
tóxicos e
benéficos
Chronic
disease
Volume
médio
intoxicaÁão
Dependência
Accidents and
injuries
(acute disease)
Acute social
and
psychological
problems
Chronic social
and
psychological
problems
Fonte: DCP2, capítulo 47 figura 47.1.
7
O consumo de álcool de alto risco é definido de forma diferente para homens e mulheres.
Para os homens é definido como o consumo de uma média de mais de 40 gramas por dia de
álcool puro e para as mulheres o número é de mais de 20 gramas por dia. Essa diferença
específica do sexo reflete as diferenças biológicas na metabolização do álcool.
8
Esta seção se baseia no DCP2, capítulo 47.
120 | Prioridades em Saúde|
Oriente Médio e no Norte da África, onde o consumo de álcool é baixo,
até entre 1,5% e 2,0% no Sul da Ásia e na África Subsaariana, 4,3% no
Leste da Ásia e no Pacífico, 8,8% na América Latina e no Caribe, e 10,7%
na Europa Oriental e na Ásia Central. Cerca de 75% da carga dessa doença
se manifestam em doenças crônicas como dependência do álcool, doença
vascular, cirrose hepática e câncer, com lesões intencionais e não intencionais (principalmente acidentes de trânsito) responsáveis pelos 25%
restantes.
O consumo de bebidas de alto risco é particularmente problemático na
Europa e na Ásia Central, onde até 1 em cada 5 homens, e 1 em cada 10
mulheres com idades entre 15 e 29 envolvem-se em consumo de álcool de
alto risco. Embora o consumo de álcool de alto risco na Europa e na Ásia
Central seja apenas uma pouco maior do que em países de alta renda, ele
é responsável pelo dobro da carga de doenças porque a maior parte desse
consumo está na parte perigosa e de maior volume do intervalo de alto
risco.
As intervenções podem ser projetadas para prevenir o consumo de
bebidas de alto risco ou para atenuar seus efeitos. Algumas dessas intervenções operam no nível da população, como medidas legislativas e
impostos, maior rigor no cumprimento das leis e campanhas nos meios
de comunicação de massas. Outras medidas são dirigidas especificamente
para os consumidores de alto risco para incentivar modificações de comportamento.
Assim como no caso do fumo, as políticas públicas podem ter um
efeito substancial no consumo excessivo de álcool. A tributação do álcool
aumenta o preço e conseqüentemente reduz o consumo. As estimativas
indicam que um aumento de 10% no preço do álcool reduz o consumo de
cerveja em cerca de 3%, de vinho em 10% e das bebidas destiladas em até
15%. A restrição de vendas a um número limitado de pontos de venda
licenciados ou a restrição do horário para venda de bebidas alcoólicas
pode dificultar a obtenção de álcool. Leis severas contra dirigir alcoolizado também desencorajam o consumo excessivo, previnem acidentes de
trânsito e podem reduzir as fatalidades no trânsito em 7%. Quando a execução do teste do bafômetro ao acaso está incluída, as fatalidades e as
lesões não-fatais em acidentes podem cair em até 15%. Para tornar esses
tipos de medidas públicas eficazes, é necessário fazer cumprir as leis e os
regulamentos, seja por meio de policiamento adicional para reduzir o
contrabando e a evasão de impostos ou montando um teste de bafômetros aleatório nos motoristas para desencorajar a direção em estado
alcoolizado (box 5.2).
Quando essas medidas são eficazes, suspensões ou restrições na propaganda de produtos alcoólicos removem as dicas que incentivam o con-
As estimativas indicam
que um aumento de 10%
no preço do álcool reduz o
consumo de cerveja em
cerca de 3%, de vinho
em 10% e das bebidas
destiladas em até 15%.
Leis severas contra dirigir
alcoolizado . . . podem
reduzir as fatalidades no
trânsito em 7%."
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 121
Box 5.2 Redução da taxa tributária e a carga de doenças resultantes
em Maurício
Maurício, uma ilha-nação no Oceano Indico, tem uma população de cerca de 1 milhão. O turismo é o terceiro setor em termos de receita em moeda forte. Em junho de 1994, o governo
abaixou drasticamente os impostos alfandegários sobre bebidas alcoólicas importadas para
80% das taxas que variavam de 200% para vinho até 600% para whisky e outras bebidas
(Abdool, 1998). O governo fez a mudança sob pressão da indústria hoteleira, que reclamava
que os turistas não estavam comprando bebidas alcoólicas suficientes devido aos altos
preços (Lee, 2001 ). Outros motivos dados para a mudança foram para reduzir as importações
extra-oficiais do exterior e para disponibilizar bebidas alcoólicas melhores e mais refinadas
para a população local. Apesar de poucas evidências para apoiar o ponto de vista, havia
reclamações na discussão pública de que bebidas alcoólicas de melhor qualidade trariam
menos problemas à saúde.
Os efeitos da mudança foram sentidos principalmente pelos habitantes e não pelos turistas,
conforme descrito a seguir:
• As prisões por dirigir com níveis de álcool no sangue acima do limite feitas principalmente em conexão com acidentes de trânsito, aumentaram em 23% entre 1993 e1997.
• As internações de casos de alcoolismo no hospital psiquiátrico da ilha cresceram muito
em 1994. A taxa de 1995 foi mais do que o dobro da taxa de 1993, e a taxa subiu novamente um pouco em 1996 e 1997. Os médicos especialistas em Maurício concordam que
os pacientes com problemas de alcoolismo respondem por uma parcela crescente de
internações em alas de medicina geral e agora representam entre 40% e 50% da ocupação dos leitos (Abdool ,1998).
• As taxas de mortalidade ajustadas por idade em 100.000 habitantes por doença crônica
do fígado e cirrose aumentaram de 32,8 para homens e 4,0 para mulheres em 1993 para
42,7 para homens e 5,3 para mulheres em 1996 (WHO 1999, 2000).
Embora as estatísticas disponíveis sejam limitadas, a redução das taxas de importação de
bebidas alcoólicas teve claramente um efeito negativo substancial na saúde dos habitantes
da ilha. Portanto, a requisição de medidas de controle de bebidas alcoólicas feita pelo governo em 1997—especificamente, novos alvarás para instalações licenciadas, aumento dos
impostos de consumo sobre bebidas alcoólicas e limitações do horário de abertura dos bares
— não foi uma surpresa. Os impostos das bebidas alcoólicas foram ligeiramente aumentados no orçamento de 1999/2000 (Departamento de Estado Norte-Americano, 1999). Contudo,
uma análise da equipe do Banco Mundial que não levou em consideração os efeitos na
saúde solicitou nova redução das taxas máximas das tarifas, identificando Maurício como
tendo um preconceito anticomercial com base na estrutura dos impostos de cigarros e
bebidas alcoólicas (Hinkle e Herrou-Aragon, 2001 ).
Fonte:Adaptado do DCP2, capítulo 47, p. 900.
sumo de álcool; entretanto, os fabricantes muitas vezes substituem outros
métodos de marketing, como o patrocínio de eventos esportivos.
Conseqüentemente, a restrição da propaganda pode só reduzir o consumo de alto risco de bebidas alcoólicas em 1% a 3%.
122 | Prioridades em Saúde|
Muitos países participam de campanhas dos meios de comunicação de
massa e de educação com base em escolas sobre os riscos da bebida. Os
estudos mostram que esses esforços realmente aumentam o conhecimento e as atitudes em relação ao álcool e aos seus riscos à saúde, mas não
mostraram reduções constantes na taxa de consumo de álcool ou
reduções nos danos relacionados ao álcool. Pequenas intervenções para
reduzir o consumo de alto risco de bebidas alcoólicas no nível pessoal por
meio de sessões educacionais e orientação psicossocial em ambientes de
cuidados básicos de saúde reduzem o uso de bebidas alcoólicas entre consumidores de alto-risco em 13% a 34%, mas a adesão fraca e a baixa
cobertura podem compensar substancialmente esses ganhos.
Nas três regiões em que o consumo de álcool de alto risco é encontrado em mais de 5% da população — Europa e Ásia Central, América Latina
e Caribe e África Subsaariana — as intervenções mais eficazes são a tributação e breves intervenções, que evitam mais de 500 AVAD por 1 milhão
da população total. As estratégias de controle restantes, teste aleatório do
bafômetro, redução do horário de venda nos fins de semana e uma ampla
suspensão da propaganda, produziram efeitos na faixa de 200 a 400 AVAD
evitados por população de 1 milhão ao ano. Nas outras duas regiões com
taxas mais baixas de consumo de bebidas alcoólicas de alto risco, especialmente entre a população feminina, a carga que é evitável por meio de tributação é bastante reduzida: de 10 a 100 AVAD evitados por população de
1 milhão ao ano. No Sul da Ásia, a intervenção mais efetiva parece ser o
cumprimento de leis para dirigir alcoolizado, devido à combinação de
uma maior predominância de lesões relacionadas a acidentes de trânsito e
níveis mais baixos de consumo de bebidas alcoólicas de alto risco.
O custo-eficácia das intervenções também varia bastante entre as
regiões. Considerando que a tributação, as limitações das vendas no varejo e a suspensão de propaganda sejam as intervenções mais custo-efetivas
nas três regiões com maior predominância de consumo de alto risco de
bebidas alcoólicas, essas mesmas intervenções estão entre as de menor
custo-eficácia nas outras duas regiões em desenvolvimento.
Na Europa e na Ásia Central, na América Latina e no Caribe, e na
África Subsaariana, o aumento de impostos em 25% custa entre US$ 100
e US$ 200 por AVAD evitado, a redução do acesso a pontos de venda no
varejo custa entre US$ 152 e US$ 340 por AVAD evitado, e a suspensão da
propaganda custa entre US$ 134 e US$ 380 por AVAD evitado. O teste
aleatório do bafômetro em motoristas é muito mais dispendioso, variando de US$ 973 por AVAD evitado na África Subsaariana até US$ 1.856 por
AVAD evitado na Europa e na Ásia Central. Por outro lado, no Sul da Ásia,
a classificação do custo-eficácia dessas intervenções é invertido: a
imposição de um aumento de 25% nos impostos sobre bebidas alcoólicas
“. . . onde o consumo de
alto risco de bebidas
alcoólicas ocorre em
menos de 5% da
população . . . as
intervenções mais
efetivas são a tributação e
pequenas intervenções. . .”
“O consumo de alto risco
de álcool, juntamente com
o fumo, . . . demonstra
que . . . as medidas de
políticas públicas podem
ter um custo-eficácia
substancialmente maior
do que o tratamento
médico individualizado.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 123
“Cerca de 13% de todos
os AVAD são devidos a
distúrbios neurológicos e
psiquiátricos.”
custa US$ 3.654 por AVAD evitado, enquanto o teste aleatório do
bafômetro nos motoristas custa US$ 531 por AVAD evitado.
Em geral, os países com maior predominância de consumo de alto
risco de álcool devem começar pela tributação porque nesses contextos é
o que parece ter o maior efeito com os menores recursos. Em lugares onde
o consumo de alto risco de bebidas alcoólicas constitui uma carga menor
para a saúde pública, outras estratégias de intervenções que restrinjam o
fornecimento ou a promoção de bebidas alcoólicas parecem ser promissoras e relativamente custo-efetivas.
O consumo de alto risco de álcool, juntamente com o fumo, é responsável por uma parte relativamente grande e crescente da carga de doenças
em países de renda média e baixa. Ambos demostram que para alguns
fatores e condições de risco as medidas de políticas públicas podem ter
um custo-eficácia substancialmente maior do que o tratamento médico
individualizado. Mostram também que boas políticas de saúde também
podem ser boas políticas fiscais. O valor dessas intervenções multissetoriais é um tema comum nos capítulos do DCP2 que tratam de dependências e se repete na análise de intervenções para redução de doenças cardiovasculares, diabetes e lesões por acidentes de trânsito.
DOENÇA MENTAL
“A depressão é o distúrbio
psiquiátrico mais comum, .
. . classificada em quarto
lugar entre todas as
causas de AVAD, . . . a
principal condição nãofatal em todo o mundo.”
124 | Prioridades em Saúde|
Ao olhar além dos números relativos à mortalidade para considerar a
carga de deficiências nos países em desenvolvimento, a primeira edição de
Disease Control Priorities in Developing Countries (Jamison e outros,
1993) revelou que a doença mental é responsável por uma parte substancial da carga de doenças nesses países.9 Depressão, esquizofrenia, distúrbio bipolar, distúrbios de ansiedade, demências e epilepsia são condições
que não aparecem como causas significativas de mortalidade, mas
reduzem seriamente a qualidade de vida das pessoas e de seus familiares.
A carga de doenças estimada no DCP2 confirma que a doença mental
contribui bastante para a carga global de doenças. O DCP2 também
mostra o que é conhecido sobre intervenções custo-efetivas, enfatizando
ao mesmo tempo a necessidade de outras pesquisas para desenvolver formas melhores de tratamento da carga da doença mental.
Cerca de 13% de todos os AVAD são devidos a distúrbios neurológicos
e psiquiátricos. O mal de Alzheimer e outras demências são responsáveis
por 17,1 milhões de AVAD e são duas vezes mais comuns entre mulheres
do que entre homens, enquanto a epilepsia é responsável por outros
6,2 milhões de AVAD e o mal de Parkinson por 2,3 milhões de AVAD. A
depressão é o distúrbio psiquiátrico mais comum, respondendo por
9
Esta seção se baseia no DCP2, capítulos 31 e 32.
51,9 milhões de AVAD ou 3,4% da carga global de doenças. Está classificada em quarto lugar entre todas as causas de AVAD, sendo a principal
condição não-fatal em todo o mundo. E também é mais comum entre
mulheres do que entre homens. A esquizofrenia, o distúrbio bipolar e o
distúrbio do pânico são responsáveis por outros 11,6 milhões de AVAD,
9,7 milhões de AVAD e 4,5 milhões de AVAD, respectivamente. As
condições de saúde mental são comuns nos países em desenvolvimento,
mas são menos freqüentemente reconhecidas, diagnosticadas e tratadas
do que nos países desenvolvidos.
As intervenções disponíveis para a prevenção e o tratamento de problemas mentais nos países em desenvolvimento são relativamente limitadas. Muitas condições neurológicas, como o mal de Alzheimer e a
doença de Parkinson, não têm cura e faltam também medidas preventivas. A principal exceção é o derrame cerebral, cujas medidas preventivas
já foram analisadas. Para outros problemas mentais, foram feitos diversos
avanços tanto em tratamentos farmacológicos como em terapias psicossociais, mas muitas intervenções ainda são dirigidas para atenuar os sintomas ou a reduzir a carga das famílias que cuidam de membros com
problemas mentais.
Existem alguns tratamentos farmacológicos disponíveis para o mal de
Alzheimer e outras demências, mas a maior parte das intervenções para
essa doença visa a redução do estresse e da depressão entre os dispensadores de cuidados aos pacientes. Por exemplo, o treinamento dos dispensadores de cuidados sobre a dieta apropriada ou o estabelecimento de
rotinas para o funcionamento dos intestinos e da bexiga pode tornar o
cuidado de pessoas com Alzheimer menos estressante. Para a doença de
Parkinson, os tratamentos são voltados para o alívio sintomático por meio
de produtos farmacêuticos, terapia física e medicamentos tradicionais.
Para esquizofrenia, depressão e distúrbios bipolar e do pânico, existem
vários tratamentos farmacológicos disponíveis, incluindo os antigos estabilizadores de humor como, por exemplo, o lítio; os antipsicóticos como,
por exemplo, o haloperidol; e os antidepressivos como os medicamentos
tricíclicos, que também são usados para tratamento da ansiedade. Os
tratamentos psicossociais, que consistem principalmente em abordagens
cognitivas comportamentais, também demonstraram ser eficazes.
Embora seja necessário gerar um maior número de intervenções para
o tratamento de problemas da saúde mental, a qualidade de vida de um
grande número de pessoas nos países de renda média e baixa poderia ser
substancialmente melhorada com a aplicação das intervenções que já
demonstraram ser custo-efetivas. Para as pessoas de sofrem de epilepsia, a
administração de fenobarbital ajuda a evitar crises a um custo de US$ 89
por AVAD evitado. Para a doença de Parkinson, existem duas intervenções
razoavelmente custo-efetivas: l-dopa e carbidopa a US$ 1.500 por AVAD
“Para esquizofrenia,
depressão e distúrbios
bipolar e do pânico,
existem vários tratamentos farmacológicos
disponíveis . . .”
“O tratamento do acidente
vascular cerebral agudo
devido a oclusão vascular
usando a aspirina custa
apenas US$ 150 por AVAD
evitado.”
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 125
“Para distúrbios psiquiátricos, a combinação de
medicamentos com
tratamentos psicossociais
geralmente é a intervenção
de maior custo-eficácia.”
“O tratamento
de lesões e doenças não
transmissíveis não é algo
que os países de renda
média e baixa possam
deixar para o futuro.”
126 | Prioridades em Saúde|
evitado e tratamentos ayurvédicos a US$ 750 por AVAD evitado. O tratamento do acidente vascular cerebral agudo devido a oclusão vascular
usando a aspirina custa apenas US$ 150 por AVAD evitado. As intervenções para prevenir a recorrência do derrame são custo-efetivas em
parte porque são facilmente dirigidas para uma população conhecida por
enfrentar riscos mais altos e custam US$ 70 por AVAD evitado para
tratamento com aspirina, US$ 932 por AVAD evitado para dipiridamol
e aspirina, e US$ 1.458 por AVAD evitado para endarterectomia da
carótida.
As variações nos custos de mão-de-obra, transporte e prestação de
serviços entre as regiões geram diferenças significativas no custo-eficácia
desses tratamentos. Por exemplo, a aspirina é a intervenção com maior
custo-eficácia para o AVC agudo no Sul da Ásia e na África Subsaariana,
enquanto o tratamento com aspirina e dipiridamol é mais custo-eficiente
nas outras regiões em desenvolvimento.
Para distúrbios psiquiátricos, a combinação de medicamentos com
tratamentos psicossociais geralmente é a intervenção de maior custoeficácia. Por exemplo o tratamento da esquizofrenia com os antigos
medicamentos antipsicóticos como o haloperidol, junto com a psicoeducação da família é a intervenção com maior custo-eficácia disponível,
variando entre US$ 5.000 e US$ 8.000 por AVAD evitado no Oriente
Médio e no Norte da África, no Sul da Ásia e na África Subsaariana, e
entre US$ 10.000 e US$ 17.000 por AVAD evitado nas outras regiões. O
tratamento da depressão com os novos antidepressivos como a Fluoxetina
e psicoterapia em grupo custa entre US$ 2.000 e US$ 3.000 por AVAD
evitado em todas as regiões. O tratamento dos distúrbios do pânico com
os novos medicamentos antidepressivos como a Fluoxetina custa entre
US$ 1.000 e US$ 1.500 por AVAD evitado (tabela 5.2).
Para abordar a carga de doenças mentais nos países em desenvolvimento, é necessário fechar a lacuna existente entre o que pode ser feito
pelas pessoas com distúrbios neurológicos e psiquiátricos e o que está
atualmente sendo feito. O DCP2 identifica as medidas custo-efetivas
disponíveis, mas o fechamento dessa lacuna depende principalmente de
melhorias gerais nos sistemas de saúde. O tratamento custo-efetivo
envolve em grande parte o atendimento ambulatorial, mas depende principalmente da habilidade dos profissionais de saúde do nível básico em
reconhecer os sintomas e direcionar os pacientes para o atendimento
apropriado. Também é necessária uma melhor administração dos suprimentos de medicamentos para garantir a disponibilidade e a potência das
drogas, bem como a orientação dos pacientes e de suas famílias para
incentivar a adesão. É preciso haver pesquisas para ampliar a gama de
intervenções disponíveis, reduzir o custo das intervenções atuais, desco-
Tabela 5.2 Custos e Efeitos de um Pacote Específico de Cuidados da Saúde Mental
Região do Banco Mundial
África
Subsaariana
América Latina
e
Caribe
Oriente
Médio e
Norte África
Europa e
Ásia
Central
Sul da
Ásia
Leste da
Ásia e
Pacífico
Efeito total (AVAD evitados por ano por população de 1 milhão)
Esquizofrenia: antipsicóticos antigos
mais tratamento psicossocial
254
373
364
353
300
392
Distúrbio bipolar: estabilizadores de
mais tratamento psicossocial
312
365
322
413
346
422
Depressão: cuidados proativos com
antidepressivos (SSRI; genérico)
1,174
1,953
1,806
1,789
1,937
1,747
245
307
287
307
284
330
1,985
2,998
2,779
2,862
2,867
2,891
Distúrbio do pânico: novo antidepressivo
(SSRI; genérico)
Efeito total das intervenções
Custo total (US$ milhões por ano por população de 1 milhão)
Esquizofrenia: antipsicóticos antigos
mais tratamento psicossocial
0.47
1.81
1.61
1.32
0.52
0.75
Distúrbio bipolar: estabilizadores de
mais tratamento psicossocial
0.48
1.80
1.23
1.39
0.62
0.95
Depressão: cuidados proativos com
antidepressivos (SSRI; genérico)
1.80
4.80
3.99
3.56
2.81
2.59
Distúrbio do pânico: novo antidepressivo
(SSRI; genérico)
0.15
0.27
0.21
0.23
0.16
0.20
Custo total das intervenções
2.9
8.7
7.0
6.5
4.1
4.5
gasto de US$1 milhão
mais tratamento psicossocial
544
206
226
267
574
522
Distúrbio bipolar: estabilizadores de
mais tratamento psicossocial
647
203
262
298
560
446
Depressão: cuidados proativos com
antidepressivos (SSRI; genérico)
652
407
452
502
690
675
1,588
1,155
1,339
1,350
1,765
1,649
Custo-eficácia (AVAD evitados por
Distúrbio do pânico: novo antidepressivo
(SSRI; genérico)
Fonte: DCP2, capítulo 31, p. 622..
Nota: SSRI ~ inibidor seletivo de reabsorção de serotonina.
brir tratamentos mais custo-efetivas e, se possível, encontrar maneiras de
prevenir ou curar essas condições debilitantes.
Estratégias custo-efetivas para doenças não transmissíveis, fatores de risco e comportamentos | 127
CONCLUSÃO
O tratamento de lesões e doenças não transmissíveis não é algo que os
países de renda média e baixa possam deixar para o futuro. Essas
condições já são responsáveis por uma parcela substancial da carga de
doenças na maioria dos países e provavelmente ainda vão aumentar à
medida que esses países façam progressos no controle das doenças infecciosas e na redução das altas taxas de mortalidade e morbidade associadas
com o parto e a infância.
A prevenção, geralmente por meio de políticas públicas multissetoriais,
é primordial, quer envolva iniciativas educacionais para promover estilos
de vida mais saudáveis, regulamentações de produtos alimentícios que
desencorajem o uso de gorduras e óleos não-saudáveis pelos produtores
de alimentos, políticas que incentivem o uso de bicicletas e dos capacetes,
políticas fiscais para tributação do fumo e de produtos alcoólicos ou atividades culturais para redução do estigma social ligado às deficiências de
desenvolvimento. Para a carga restante, existem muitas intervenções
custo-efetivas disponíveis que deveriam ser promovidas. Caso não existam tratamentos disponíveis, ou se não forem custo-efetivos, é necessário
haver pesquisas.
A prevenção, os cuidados e o tratamento, e a pesquisa são todos atividades que são facilitadas pela presença de um sistema de saúde forte e que
funcione. Se os países puderem melhorar seus sistemas de saúde para
aumentar a cobertura de intervenções que reduzam as doenças infecciosas
e as condições maternas e neonatais, a construção de recursos adicionais
voltados para as demandas que as doenças não transmissíveis vão impor
será possível. Os dois capítulos a seguir abordam a gama de políticas
disponíveis para a construção e o fortalecimento de sistemas de saúde de
modo que eles possam enfrentar esses desafios.
128 | Prioridades em Saúde|
Capítulo 6
Fornecimento de intervenções
Não importa o quanto sejam pesquisadas e elaboradas, as intervenções são
inúteis sem mecanismos de fornecimento. Os mecanismos de fornecimento são fundamentais para a eficácia e o custo de qualquer intervenção. Elas
variam consideravelmente de um país para outro dependendo de amplos
fatores como a economia, a política e a cultura de um país, mas também
dependem de um sistema de saúde que funcione apropriadamente.
Embora às vezes seja possível realizar intervenções isoladas na saúde
pública, de modo geral, as intervenções na área da saúde formam uma
rede de serviços que funciona melhor quando elas são coordenadas. Uma
triagem não oferece benefícios se não houver um tratamento posterior,
referências são inúteis se não houver acesso à assistência de saúde básica,
e os centros de tratamento serão sobrecarregados se o atendimento preventivo essencial for negligenciado.
Em um mundo estático, quaisquer decisões sobre a estrutura do sistema de saúde envolveria uma análise dos prós e contras entre especialização e integração, entre atendimento em um nível versus atendimento
em outro nível. Contudo, o mundo é dinâmico e a chave para o progresso é pensar no desenvolvimento do sistema de saúde como um processo
gradual, começando pelo uso de instituições, recursos e pessoal atualmente disponível para estabelecer uma plataforma de prestação de
serviços de saúde que com o tempo complete, expanda e amplie a rede de
serviços e intervenções oferecidas.
Este capítulo aborda o desafio da implementação e o fornecimento de
intervenções na área da saúde. Descreve e avalia abordagens para a
prestação de serviços de saúde em diferentes níveis e, em seguida, destaca
alguns elementos do sistema de saúde que precisam funcionar em todos
esses níveis. Também discute formas de integrar serviço de saúde para
pessoas em diferentes partes do ciclo de vida.
129
“Os programas comunitários podem reduzir os
custos e as barreiras que
impedem o acesso das
pessoas aos serviços.”
NÍVEIS DE ATENDIMENTO
As intervenções na saúde precisam alcançar pessoas em suas casas, escolas
e locais de trabalho ou encorajando-as a visitar as unidades de saúde. Os
programas comunitários podem reduzir os custos e as barreiras que impedem o acesso das pessoas aos serviços, enquanto o cuidado básico geral
pode atuar como uma interface entre os programas de saúde comunitários e o atendimento clínico individual, seja ambulatorial ou internamento. É importante que existam hospitais municipais e de referência
para fornecer um atendimento mais especializado ou mais caro visando
reforçar os serviços de cuidados básicos e comunitários com intervenções
que são necessárias quando esses níveis não podem dispor de equipamento ou pessoal especializado.
Nível comunitário.
Muitos países tentaram criar vínculos entre os recursos para serviços de
saúde comunitários e as famílias para uma série de programas de saúde.1
Esses programas não substituem um sistema de saúde, mas fornecem um
canal que proporciona informações e recursos às famílias. Eles também
mobilizam recursos adicionais, como o tempo de voluntários, o conhecimento local e a confiança da comunidade.
Os programas comunitários podem incluir uma série de intervenções,
mas geralmente focam serviços relacionados à maternidade segura,
nutrição e prevenção e tratamentos simples. Normalmente incluem os
seguintes serviços:
“Os programas comunitários . . . geralmente
focam . . . a maternidade
segura, nutrição e
prevenção e tratamentos
simples.”
130 | Prioridades em Saúde|
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
cuidado pré-natal
saúde reprodutiva e nutrição maternal
amamentação
alimentação complementar
monitoramento e promoção do crescimento
suplementação de micronutrientes
alimentação complementar com suprimentos externos ou locais
terapia de reidratação oral (TRO)
imunização
desparatização
Essas intervenções reduzem coletivamente fatores de risco como a
desnutrição que respondem por até 40% da carga de doenças dos países
de renda baixa e média.
1
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 56
Os programas comunitários são organizados de várias formas, especialmente com respeito ao status e ao número de trabalhadores comunitários. Em uma extremidade do espectro estão os programas comunitários que dependem muito dos recursos locais e do tempo de voluntários. Por exemplo, a Tailândia recrutou e treinou 60.000 voluntários que
eram responsáveis pela mobilização e supervisão de 600.000 comunicadores de saúde da vila, que, por sua vez, visitaram uma média de 20 crianças cada um (box 6.1). Na outra extremidade do espectro, alguns países recrutam trabalhadores de comunidades direcionadas, mas depois
contratam e supervisionam esses trabalhadores como parte da força de
trabalho da saúde pública. Na Costa Rica, por exemplo, os trabalhadores
da saúde eram funcionários em tempo integral, recrutados e gerenciados
pelo programa de saúde rural do governo. A Costa Rica contratou dois
trabalhadores da saúde em tempo integral para cada 350 crianças. O
DCP2 avalia a evidência e conclui que a relação efetiva de trabalhadores
da saúde para crianças fica na faixa de 1 para 500 para trabalhadores da
comunidade remunerados em tempo integral, e 1 para 10 ou 20 para
voluntários locais em tempo parcial.
Além de desenvolver estratégias de pessoal, os programas comunitários
devem decidir se incluem suplementação alimentar voltada à desnutrição.
A suplementação alimentar pode ajudar um programa de saúde comunitário a atingir suas metas quando integrada com outros serviços ou
pode se tornar o principal foco do programa para a exclusão de outros
serviços de saúde. Em algumas comunidades, a suplementação alimentar
é parte de um programa mais amplo que também direciona suplementos
de micronutrientes, educação pré-escolar, monitoramento do crescimento e, às vezes, melhorias nos suprimentos alimentares locais. Na outra
extremidade, o componente de distribuição alimentar tem dominado os
programas comunitários, como ocorreu com o Programa de Serviços
Integrados para o Desenvolvimento Infantil na Índia (Integrated Child
Development Services Program).
Os programas comunitários também precisam encontrar um equilíbrio entre as atividades de promoção de saúde e o atendimento curativo. Quando as instalações básicas forem distantes ou precariamente supridas, os trabalhadores comunitários podem ser pressionados a fornecer
atendimento curativo direto, desviando-os de outras atividades de promoção da saúde. Quando isso acontece, os sistemas comunitários podem
ser cooptados e “medicalizados” com o acréscimo de módulos de diagnósticos e de tratamento. Embora esses acréscimos possam conseguir dar
às pessoas acesso aos serviços que de outro modo não seriam fornecidos,
eles também desviam os programas comunitários do objetivo inicial da
promoção geral da saúde. Os agentes comunitários de saúde não apenas
. . . a relação efetiva de
trabalhadores da saúde
para crianças fica na faixa
de 1 para 500 para trabalhadores da comunidade
remunerados em tempo
integral, e 1 para 10 ou 20
para voluntários locais em
tempo parcial.”
“Os agentes comunitários
de saúde não apenas
promovem comportamentos saudáveis e ações
preventivas, mas podem
mobilizar uma demanda
de serviços apropriados
em outros níveis.”
Fornecimento de intervenções: | 131
Box 6.1 Programas de saúde comunitária em três países
O efeito potencial dos programas comunitários pode ser observado na predominância de crianças de 2 anos que estão abaixo do peso normal na Indonésia, Filipinas e Tailândia. Dos
três países, a Tailândia tem sido o mais bem-sucedido na implementação de um programa de
saúde comunitária. O Ministro da Saúde da Tailândia gastou aproximadamente US$11 por
beneficiário por ano mobilizando uma rede de supervisores voluntários e agentes comunitários voluntários que incluía cerca de 1% da população. Embora a proporção de crianças
abaixo do peso ideal seja influenciada por uma variedade de fatores sociais e individuais, a
rápida redução na parcela de crianças abaixo do peso ideal na Tailândia que coincidiu com a
introdução desse programa comunitário mostra que ele contribuiu para esse resultado. Em
contrapartida, o National Village Program (programa aldeia nacional) da Indonésia gastou um
pouco menos (cerca de US$2 a US$11 por criança por ano) e dependia enormemente de
suplementos alimentares. Teve certo impacto, mas foi mais lento e menos consistente.
Finalmente, as Filipinas iniciaram um programa nacional que não foi completamente implementado, gastando somente US$0.40 por criança por ano em áreas direcionadas. A predominância de crianças abaixo do peso ideal teve pouca redução durante esse período.
Unidade ambulatoria
Verificar sinais de risco
• Convulsões
• Letargia ou inconsciência
• Inabilidade para beber ou
Avaliar principais sintoma
• Tosse ou dificuldade para re
• Diarréia
• Febre
• Problemas auditivos
Avaliar condições de nutr
e imunidade e problema
potenciais de alimentaç
Verificar se há outros
Classificar condições e iden
ações de tratamentos de ac
promovem comportamentos saudáveis e ações preventivas, mas podem
mobilizar uma demanda de serviços apropriados em outros níveis.
Finalmente, os programas comunitários devem buscar manter um
equilíbrio entre cobertura extensiva e supervisão adequada. Um programa que supervisiona milhares de voluntários necessita de centenas de
supervisores. A DCP2 acredita que a relação de supervisão em programas
132 | Prioridades em Saúde|
efetivos é de aproximadamente 1 supervisor para cada 20 agentes comunitários de saúde. Se essa responsabilidade de supervisão for empregada
nas principais unidades de tratamento, isso pode vir a se tornar uma carga
excessiva. Se isso for bem gerenciado, contudo, pode ser a diferença entre
programas eficazes e ineficazes.
Programas de saúde efetivos baseiam-se em práticas comunitárias estabelecidas. Por essa razão, na Tailândia, os serviços de saúde são combinados com organizações religiosas no âmbito das aldeias. Na Indonésia, as
organizações sociais tiveram um importante papel. Em Bangladesh, as
ONGs que foram bem-sucedidas em outras áreas, como segurança alimentar e educação, tornaram-se ativas em saúde. Em Costa Rica,
Honduras e Jamaica, os serviços nacionais de saúde já tiveram uma presença local suficiente para iniciar programas de saúde comunitários.
A organização no âmbito local pode realizar um bom negócio, mas
somente com a orientação e os recursos adequados de outros âmbitos
centrais. Treinamento, supervisão e suprimentos devem ser sustentados
para que tenham um efeito duradouro. Geralmente, isso significa vincular agentes comunitários de saúde às unidades básicas de tratamento.
Assim, o sucesso das atividades de saúde comunitária depende fundamentalmente do contexto, incluindo o nível de desenvolvimento da infraestrutura, dos serviços e dos recursos socioeconômicos. Por exemplo, na
Indonésia, o ponto fraco do sistema básico de saúde incentivou os programas comunitários a mudar no sentido de fornecer serviços clínicos
individuais. Na Costa Rica, em contrapartida, os programas de saúde
comunitários podiam focar a prevenção e a promoção da saúde como um
complemento para um sistema básico de saúde mais sólido.
Atendimento Básico Geral
O termo atendimento básico denota vários aspectos diferentes, embora
relacionados, dos sistemas de saúde.2 Em alguns contextos, está relacionado a determinadas atividades, como imunização e cuidado pré-natal. Em
outros, denota um nível de atendimento com relativamente poucas
exigências técnicas e de mão-de-obra qualificada. Em alguns países, é
uma estratégia de estruturação e gerenciamento do serviço de saúde. Em
outros, é uma perspectiva ou uma filosofia. O conceito amplo de atendimento básico inclui uma série de iniciativas que estão associadas à
Declaração de Alma-Ata sobre Cuidados Básicos de Saúde aprovada pela
OMS em 1978. Mais recentemente, a Comissão da OMS sobre
Macroeconomia e Saúde descreveu a necessidade de desenvolver serviços
que sejam prestados próximos ao cliente. Apesar das variações no uso
2
“Programas de saúde
efetivos baseiam-se em
práticas comunitárias
estabelecidas.”
. . o atendimento básico .
. .deve atuar como uma
interface entre famílias e
programas comunitários
em uma extremidade, e
hospitais e políticas
nacionais de saúde na
outra.”
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 64.
Fornecimento de intervenções: | 133
específico do termo atendimento básico, a noção geral é uma só: o reconhecimento de que determinados serviços de saúde devem atuar como
uma interface entre famílias e programas comunitários em uma extremidade, e hospitais e políticas nacionais de saúde na outra.
Desde 1978, a Declaração de Alma-Ata, a OMS, o Banco Mundial e
países específicos aprimoraram e criaram pacotes alternativos de serviços
sob o conceito abrangente de atendimento básico geral. O DCP2 observa
uma convergência substancial no conteúdo do atendimento básico geral
Tabela 6.1 Pacote de intervenções custo-efetivas
(US$ )
Custo por AVAD
Intervenções
Saúde pública
Programa ampliado de imunização
mais (ou seja, incluindo vacina contra
hepatite B e suplementação de vitamina A)
Programa de saúde escolar
Programa de controle do tabagismo
e do consumo abusivo de álcool
Programa de prevenção da AIDS
Outras intervenções em saúde pública
(inclui informação, comunicação,
e educação sobre fatores de risco
selecionados e comportamentos saudáveis,
mais controle de vetor e vigilância de doenças)
Total
Países de baixa
renda
Países de
renda média
15–22
32–38
25–32
44–70
4–6a
—
48–54
57–70
16–23a
—
18
Serviços clínicos
Quimioterapia contra tuberculose
4–6
Gestão integrada da criança doente
38–63
Planejamento familiar
25–38
Tratamento da doença sexualmente transmissível
1–4
Pré-natal e atendimento médico
38–63
Atendimento limitado (inclui tratamento
253–380
de infecção) Trauma menor; para condição
mais complicada; inclui diagnóstico,
aconselhamento e alívio da dor, além
de tratamento conforme recursos)
b
Total
—
6–9
63–127
127–190
13–19
76–139
507–760
168
Fonte: DCP2, capítulo 64, tabela 64.2.
a. Não reflete o custo-eficácia porque a análise examinou a probabilidade de transmissão da doença somente no
primeiro ano.
134 | Prioridades em Saúde|
no decorrer do tempo: cuidado relacionado à maternidade (por exemplo, cuidado pré-natal, atendimento qualificado durante o parto e planejamento familiar), intervenções para tratar doenças infantis (como doenças
evitáveis por vacinação, infecções respiratórias agudas, diarréia e desnutrição), e prevenção e tratamento das principais doenças infecciosas. A
lista é conhecida de vários estudos de pacotes custo-efetivos e prioridades
para a carga global de doenças (tabela 6.1).
Contudo, as unidades locais de saúde equipadas exclusivamente para
executar esses tipos de funções podem não atender à demanda local de
outros tipos de tratamento curativo ou deixar de lado, de um modo geral,
importantes ameaças à saúde local. Conseqüentemente, os peritos em
saúde pública destacam a importância de se ter uma equipe local de
gerenciamento para planejar os serviços de atendimento e suporte local
para uma população definida, de 10.000 a 50.000 pessoas. Com uma
equipe de gerenciamento local responsável por uma população específica,
essa equipe pode estabelecer prioridades e monitorar os progressos, assim
como garantir um bom ajuste entre prioridades nacionais e demandas
locais para promoção e tratamento da saúde.
Na prática, é difícil realizar esse tipo de atividade local planejada nos
países de renda média e baixa por diversos motivos:
“. . . o atendimento básico
geral pode atender
potencialmente até 90%
da demanda de assistência de saúde nos países
em desenvolvimento.”
• As unidades de atendimento básico geralmente não dispõem de recursos necessários para funcionar.
• Não há pessoal para ocupar determinados cargos ou há um índice alto
de ausência ao trabalho.
• Os suprimentos costumam estar em falta ou vencidos.
• As unidades de saúde costumam ser mal conservadas.
• As pessoas costumam buscar atendimento básico em farmácias, curandeiros e médicos particulares e não apenas na rede pública. Essa fragmentação dificulta o gerenciamento de uma vigilância e planejamento
adequados.
Com o uso efetivo de recursos humanos, financeiros e institucionais
adequados, o atendimento básico geral pode atender potencialmente até
90% da demanda de assistência de saúde nos países em desenvolvimento.
O efeito direto do atendimento básico geral está bem documentado. Por
exemplo, as reduções locais de 5 a 32% na mortalidade entre crianças na
Libéria, Nigéria e República Democrática do Congo são atribuídas ao
fornecimento de atendimento básico geral nesses locais. Um sistema de
atendimento básico geral também se integra ao sucesso de um sistema de
saúde global, porque atua como uma ponte entre o atendimento local e o
atendimento em outros âmbitos, como o de hospitais municipais e de
referência.
Fornecimento de intervenções: | 135
Hospitais municipais
“Com muita freqüência, os
hospitais municipais . . .
não são acessíveis aos
pobres ou aqueles dispersados em áreas rurais.”
Na maioria dos países, os hospitais municipais ou distritais são responsáveis pela maior parcela de serviços de internação.3 Eles são geralmente
designados para servir de 100.000 até cerca de 1 milhão de pessoas com
serviços mais sofisticados, tecnicamente mais exigentes e especializados
do que aqueles disponíveis em uma unidade de atendimento básico, mas
não tão especializados quanto aqueles fornecidos por hospitais de
referência.
A série de serviços que os hospitais municipais oferecem inclui diagnóstico, tratamento, atendimento, aconselhamento e reabilitação. As
exigências técnicas desses serviços requerem profissionais com treinamento e experiência abrangendo os campos de medicina familiar e
assistência de saúde básica, obstetrícia, doença mental, saúde ocular,
serviços de reabilitação, cirurgia, pediatria e geriatria. Eles requerem um
investimento substancial de capital em unidades, equipamento e gerenciamento. Os hospitais municipais também podem fornecer informações
sobre saúde, treinamento e suporte administrativo e logístico para programas de assistência de saúde básica e comunitária. Quando uma área do
setor de serviços de um hospital municipal coincide com uma unidade
administrativa governamental, ela pode ser responsável por outras
funções de saúde pública em todo o município ou distrito.
O ponto forte de um hospital municipal é que ele concentra habilidades e recursos em um só local para condições que são incomuns ou difíceis de tratar. É também um repositório de conhecimento e ferramentas
de diagnóstico para avaliar se um caso deve ser referido para uma unidade
ainda mais especializada. Um hospital municipal só pode colocar em
prática esses pontos fortes se estiver apropriadamente integrado a outros
níveis de assistência que também estejam funcionando bem. Se as
unidades de atendimento básico não estiverem atendendo às necessidades
locais, por exemplo, as pessoas irão desconsiderá-las e passarão a lotar os
hospitais a procura de serviços que poderiam ter sido prestados de forma
mais eficaz em outros lugares. As unidades de atendimento básico também devem selecionar pacientes para identificar aqueles que realmente
necessitam de cuidado hospitalar. Oportunidade e transporte adequados
são essenciais, uma vez que nenhuma seleção ou referência fará diferença
para um paciente que mora em uma aldeia distante.
Ao mesmo tempo, a concentração de recursos de hospitais municipais
dão origem ao seu ponto fraco potencial. Com muita freqüência, os hospitais municipais beneficiam aqueles que moram nas proximidades e não
são acessíveis aos pobres ou aqueles dispersados em áreas rurais. Os hos3
136 | Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 65.
pitais municipais podem atender populações de forma mais igualitária
quando a concentração de recursos é acessível a todos, ou seja, quando as
barreiras criadas pela pobreza, qualidade de serviço baixa, transporte caro
ou geografia remota são eliminadas.
Os custos do atendimento em hospitais municipais são suscetíveis aos
salários pagos ao pessoal, às taxas de utilização, e à inclusão de funções
adicionais da saúde. Os salários do pessoal em geral correspondem a
maior parte dos custos recorrentes dos hospitais, mesmo quando os
salários são baixos. Quando as taxas de utilização são altas, o custo fixo
médio por paciente-dia será menor. Em alguns lugares, as taxas de utilização do hospital são inferiores a 50% e a capacidade não utilizada representa uma perda econômica substancial para o sistema de saúde. Em
outros casos, os hospitais são excessivamente usados, e embora isso reduza
os custos médios, leva a uma desvalorização mais rápida das unidades.
Funções adicionais também dão origem a custos hospitalares. Essas
funções incluem o treinamento de novos profissionais da saúde e o
fornecimento de educação contínua para eles; supervisão, suporte ou
gestão de serviços primários; e planejamento e implementação de campanhas de saúde pública em todo o município.
Os estudos de custo indicam a faixa potencial de custos hospitalares
nos países de renda média e baixa. Um hospital da Tanzânia gastou aproximadamente US$4 por paciente-dia, mas o estudo argumentou que estava subfinanciado e que seria necessário um pouco mais de US$12 por
paciente-dia para fornecer atendimento de acordo com os próprios
padrões do fornecedor. Os pesquisadores estimaram que o atendimento
de paciente internado no Quênia custa cerca de US$9 por paciente-dia e
em Bangladesh custou cerca de US$16 por paciente-dia. Os custos dos
hospitais sul-africanos em cinco municípios variaram de US$40 a US$97
por paciente-dia.
O DCP2 inclui um exercício para estimar o custo-eficácia do atendimento hospitalar municipal. Apesar da reconhecida imprecisão do exercício, ele dá um sentido da possível ordem de magnitude. Usando os
dados de um estudo sobre um hospital municipal de uma comunidade
rural do Quênia, cujo acesso ao atendimento médico é razoavelmente
bom, verificou-se que o hospital atendeu 2.223 crianças, gastou cerca de
US$10 por paciente, e salvou cerca de 215 vidas a um custo médio por
vida salva de US$104, significando um custo por AVAD evitado de
somente cerca de US$4 a US$5.
As estratégias para melhorar o atendimento hospitalar variam. Em
muitos países, os hospitais municipais foram transferidos para governos
locais como parte de uma descentralização dos serviços públicos. Em outros países, os hospitais têm mais controle da tomada de decisões, ou
“. . . um hospital municipal de uma comunidade
rural do Quênia . . .
atendeu 2.223 crianças,
gastou cerca de US$10
por paciente, e salvou
cerca de 215 vidas a um
custo médio por vida
salva de US$104 . . .”
. . . nas antigas repúblicas
soviéticas e na China, os
hospitais públicos se
tornaram tão dependentes
de taxas pagas pelos
pacientes que passaram
a funcionar efetivamente
como instituições
privadas.”
Fornecimento de intervenções: | 137
“Para realizar todos os
benefícios dos vínculos
entre os níveis de atendimento, os hospitais de
referência precisam
fornecer muitas formas de
suporte...”
mesmo autonomia financeira. Em partes da Ásia Central e Leste Asiático,
especialmente nas antigas repúblicas soviéticas e na China, os hospitais
públicos se tornaram tão dependentes de taxas pagas pelos pacientes que
passaram a funcionar efetivamente como instituições privadas. A maioria
dos hospitais públicos recebe orçamentos de acordo com a quantidade de
funcionários e o tamanho da unidade, mas as reformas realizadas em
alguns locais instituíram o reembolso baseado no número e na complexidade dos serviços prestados, com resultados mistos. Em outros lugares,
os esforços foram concentrados na melhoria da qualidade do atendimento hospitalar. Uma meta é reduzir as doenças adquiridas no hospital, um
problema grave nos países de poucos recursos da África Subsaariana, onde
transfusões de sangue e reutilização de agulhas pode transmitir HIV,
hepatite e outras infecções. Aumentar a segurança do sangue custaria
menos de US$8 por AVAD evitado.
Os hospitais municipais estão sujeitos a várias pressões que afetam o
bom desempenho de seu papel. Algumas dessas pressões forçam os hospitais municipais a intervir como se fossem centros básicos, enquanto outras forçam os hospitais a funcionar como centros administrativos da
saúde pública. A mistura apropriada resultará no equilíbrio dos investimentos em hospitais municipais com investimentos em outros níveis de
atendimento.
Hospitais de referência
O próximo nível de atendimento é o hospital de referência, que fornece
atendimento clínico complexo a pacientes encaminhados de níveis comunitários, básicos ou municipais.4 Os hospitais de referência ligam explicitamente os diferentes níveis de atendimento médico em ambas as
direções. As unidades comunitárias, básicas ou municipais encaminham
os pacientes para serem atendidos em um hospital especializado. O hospital de referência, por sua vez, fornece suporte e informações para ajudar
os outros níveis e encaminha pacientes para esses outros níveis quando
apropriado. Para realizar todos os benefícios dos vínculos entre os níveis
de atendimento, os hospitais de referência precisam fornecer muitas formas de suporte, incluindo aconselhamento sobre quais pacientes encaminhar, atendimento pós-alta adequado, e gerenciamento de longo-prazo
de condições crônicas. Também é necessário haver um treinamento coordenado no uso de protocolos compartilhados, visto que o suporte tecnológico é dado por técnicos e cientistas qualificados.
Os hospitais de referência também podem fornecer um importante
suporte gerencial e administrativo para outras unidades, funcionando
4
138 | Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 66.
como portas de entrada para suprimentos farmacêuticos e medicinais,
serviços de análise laboratorial, abastecimento geral, coleta de dados dos
sistemas de informações de saúde, e vigilância epidemiológica. Às vezes,
eles assumem o papel de gerenciar o transporte de suprimentos médicos
e de pessoal, ou até mesmo o gerenciamento financeiro, da folha de pagamento e de recursos humanos das unidades de nível inferior.
Outras funções importante dos hospitais de referência são a pesquisa e
o treinamento. Nos países industriais, os hospitais de referência costumam
desenvolver novas tecnologias, mas nos países em desenvolvimento o mais
provável é que estejam envolvidos em pesquisa para testar e introduzir tecnologias que foram desenvolvidas em outros lugares, ou seja, para avaliar
se essas tecnologias são eficazes e adaptáveis em um novo contexto. Os hospitais de referência se tornam o veículo de divulgação dessas tecnologias ao
treinar novos profissionais e fornecer educação profissional contínua para
o pessoal já existente em diferentes unidades. As pesquisas sensíveis às cargas locais de doenças e às restrições tecnológicas locais preenchem uma
importante lacuna, uma vez os países industriais e as empresas farmacêuticas geralmente não realizam pesquisas quando não está previsto um bom
retorno de seus investimentos. As atividades envolvendo pesquisas também ajudam a atrair e manter os especialistas necessários para tratar de
casos complexos e a treinar novos especialistas.
Como nos hospitais municipais, os hospitais de referência nos países
de renda baixa e média freqüentemente acabam por oferecer um conjunto completo de serviços, dos mais especializados ao tratamento ambulatorial básico. A demanda das pessoas por resultados no atendimento básico ocorre porque as unidades de nível inferior são mal equipadas ou não
dispõem de pessoal qualificado.
Os custos e benefícios dos hospitais de referência correspondem ao
conjunto de serviços fornecidos, aos salários do pessoal e às taxas de utilização. De modo geral, eles tendem a ser mais caros do que os hospitais
municipais porque tratam de casos mais complexos, têm mais insumos
caros, e também estão envolvidos com treinamento e pesquisa. Os estudos
indicam que os hospitais de referência podem ser de duas a cinco vezes
mais caros por leito-dia do que os hospitais municipais.
Os hospitais de referência tendem a ser localizados em grandes áreas
urbanas, exacerbando o acesso desigual ao atendimento especializado
para cidadãos geralmente mais pobres da área rural. Como os hospitais de
referência são, por definição, especializados, não é viável corrigir essas
desigualdades construindo outras unidades. Em vez disso, o acesso igualitário aos serviços dos hospitais de referência requer a melhoria de
outros níveis de atendimento e a redução dos custos com transporte e de
outras barreiras financeiras aos pobres.
Fornecimento de intervenções: | 139
“. . . 12% da carga mundial
de doenças estão
associados às condições
de saúde que poderiam se
beneficiar com a cirurgia.”
As funções e os investimentos atribuídos aos hospitais de referência
precisam ser mais equilibrados e coordenados com as funções e os investimentos atribuídos aos hospitais municipais, unidades básicas de saúde e
agentes comunitários de saúde. Assim como os hospitais de referência não
podem funcionar eficazmente se não puderem contar com outras
unidades de saúde, as unidades básicas, hospitalares, comunitárias e
municipais não podem funcionar com eficácia se essas unidades não
estiverem aptas a encaminhar os casos complexos para os hospitais especializados. O atendimento de nível básico obviamente requer reforços,
mas é provável que isso se deva antes ao financiamento inadequado de
todo o sistema de saúde pública do que a uma excessiva atribuição aos
hospitais de referência.
INSUMOS E SERVIÇOS INTER-RELACIONADOS
Mesmo que os diferentes níveis de sistema de saúde estejam associados a
diferentes tipos de serviços, todos os níveis precisam estar aptos a prestar
serviços comuns. O DCP2 analisa sobre vários serviços inter-relacionados
e os problemas relativos, três dos quais são discutidos aqui.
Cirurgia
“. . . cirurgias realizadas
em uma clínica comunitária hipotética que
atende a uma população
de 20 mil pessoas. . . .
custariam cerca de
US$150 a US$350 por
AVAD evitado.”
140 | Prioridades em Saúde|
A cirurgia tem sido freqüentemente associada à intervenções de tecnologia intensiva que podem ser extremamente caras.5 Além disso, a cirurgia
não é específica de uma determinada doença ou fator de risco, nem é
exclusiva de um determinado nível de atendimento médico.
Conseqüentemente, seu potencial de saúde pública costuma ser negligenciado pelos formuladores de política de saúde. O DCP2 dá atenção renovada à cirurgia como um serviço de cuidado de saúde custo-efetivo para
várias condições comuns.
O DCP2 estima que cerca de 12% da carga mundial de doenças estão
associados às condições de saúde que poderiam se beneficiar com a cirurgia. Essas condições causam perdas de 21 AVAD por cada 1.000 pessoas
nas Américas e 38 AVAD por cada 1.000 pessoas na África. As lesões
respondem por cerca de 38% dessas condições cirúrgicas, seguidas pelas
anomalias malignas e congênitas.
Condições cirurgicamente tratáveis caem em quatro categorias gerais:
• cuidado cirúrgico para evitar morte ou disfunção entre sobreviventes
de lesões
5
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 67.
Box 6.2 Tratamento de catarata na Índia
O tratamento de catarata é um dos casos mais bem documentados de intervenções
cirúrgicas fornecidas para a população. A Índia tem usado campos móveis para fornecer
cirurgia de catarata mais barata e mais efetiva em áreas rurais. O número de cirurgias
mais do que dobrou, de 1,2 milhões em 1991–92 para 2,7 milhões em 1996–97. O custo
foi de cerca de US$97 por paciente em campos, comparados aos US$176 em hospitais
universitários e US$54 em hospitais não-governamentais. Por menos de US$25 por
AVAD, a cirurgia de catarata na Índia é altamente custo-efetiva.
Source: Adaptado do DCP2, capítulo 67.
• complicações obstetrícias
• tratamento de condições abdominais emergentes e com ameaça à
saúde
• cuidado eletivo de condições simples, incluindo hérnias, pés tortos e
cataratas.
O DCP2 define cirurgia como serviços envolvendo suturas, incisões,
excisões, manipulação e outros procedimentos invasivos que requerem
anestesia local, regional ou geral. A definição foca explicitamente os procedimentos e não as pessoas que realizam a cirurgia ou a unidade na qual
ela é realizada. Desse modo, é possível reconhecer que vários tipos diferentes de profissionais da saúde podem realizar cirurgias se forem corretamente treinados e que essas cirurgias podem ser feitas em diversos locais
se forem apropriadamente equipados. Para condições como cataratas ou
tracoma, a cirurgia pode ser conduzida via campanhas nas quais um
quadro de funcionários é treinado para selecionar, identificar e executar
simples procedimentos usando unidades móveis (box 6.2). A cirurgia
simples também pode ser fornecida no nível básico para lesões, complicações obstetrícias ou anomalias congênitas. Os hospitais municipais e os
hospitais de referência podem ser configurados para realizar procedimentos cirúrgicos mais complexos.
O DCP2 avalia o custo-eficácia de cirurgias realizadas em uma clínica
comunitária hipotética que atende a uma população de 20 mil pessoas.
Essa unidade de saúde trataria de aproximadamente 4.000 casos cirúrgicos ao ano e teria em sua equipe uma enfermeira, uma parteira qualificada e um assistente hospitalar.
Os procedimentos incluiriam o tratamento de cortes e contusões simples, remoção de materiais estranhos do corpo, drenagem de abscessos,
tratamento de queimaduras simples, auxílio de partos normais, e tratamento de traumas simples. Esses serviços custariam cerca de US$150 a
US$350 por AVAD evitado. Cirurgias mais complicadas, incluindo cirurgia abdominal e torácica, lesões na cabeça, complicações obstetrícias e
tratamento de queimadura, seriam tratados por hospitais municipais a
“…a cirurgia pode ser um
elemento importante e
custo-eficiente de um sistema de saúde funcional e
de uma política de saúde
pública.”
Fornecimento de intervenções: | 141
“. . . a carga de doenças
que é relevante para os
serviços médicos de
emergência . . . é responsábel por 36% dos
AVADs.”
um custo estimado de US$40 por AVAD evitado na Ásia do Sul e na África
Subsaariana, de US$70 por AVAD evitado no Leste Asiático e aproximadamente US$100 por AVAD evitado nas demais regiões. O custo por
AVAD evitado de serviços cirúrgicos nos hospitais municipais é inferior
ao custo nas unidades básicas de saúde devido às economias de escala. Os
custos fixos das cirurgias praticadas em hospitais municipais são mais
altos, mas o hospital pode ser configurado para lidar com um número
desproporcionalmente maior de cirurgias. Para que essas economias possam ser postas em prática será necessário estabelecer taxas de utilização
apropriadas.
A cirurgia pode ser claramente um componente significante de qualquer estratégia de saúde pública. A cirurgia pode evitar a morte e a deficiência crônica em pacientes com lesões, se for realizada a tempo e de
forma correta; pode reduzir o risco de mortalidade e deficiência em partos complicados, hemorragia pré-parto e pós-parto, e outras complicações obstetrícias; pode resolver uma ampla gama de condições de
emergência; e pode ter um impacto substancial na qualidade de vida por
meio de cirurgia eletiva para condições como cataratas, infecções no ouvido, pés tortos, hérnias e hidrocefalia. Se a unidade correta estiver apropriadamente equipada e munida de pessoal qualificado, a cirurgia pode ser
um elemento importante e custo-efetivo de um sistema de saúde funcional e de uma política de saúde pública.
Serviços médicos de emergência
“. . . o atendimento de
emergência requer que
sejam feitos investimentos em unidades que
possam tratar pacientes
após eles terem sido
estabilizados.”
142 | Prioridades em Saúde|
Como a cirurgia, os serviços médicos de emergência representam um conjunto de intervenções que não são exclusivos de qualquer condição médica específica ou nível de atendimento médico.6 A característica definitiva
é que os resultados dependem extremamente do tempo. Os serviços médicos de emergência destinam-se a condições médicas súbitas que requerem
intervenção imediata para evitar morte ou deficiência. Embora os serviços
de emergência geralmente correspondam a ambulâncias, pronto-socorros, tecnologia avançada e altos custos, na prática, os serviços médicos de
emergência não são focados exclusivamente em transporte rápido e procedimentos invasivos. Em vez disso, um bom atendimento de emergência
quase sempre pode ser realizado por meio de planejamento aprimorado,
treinamento apropriado dos primeiros socorristas, comunicação efetiva, e
métodos inovadores de transporte.
As emergências resultam normalmente de lesões súbitas, complicações
obstétricas, e infecções, assim como da negligência de condições brandas
6
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 68.
e crônicas. Assim, a carga de doenças que é relevante para os serviços
médicos de emergência se sobrepõem consideravelmente às condições que
já foram discutidas nos capítulos anteriores, como as condições maternas
e as lesões de acidentes de carro. No total, essas condições respondem por
36% da carga de doenças quando medidas em AVAD. Cerca de um terço
desses AVAD se deve a lesões; um outro terço está relacionado à doenças
crônicas como diabetes, DCV e asma; e o último terço está associado a
doenças contagiosas e condições maternas.
Os serviços médicos de emergência compreendem um atendimento
contínuo desde o primeiro contacto com os pacientes até que suas
condições estejam estabilizadas. Isso inclui fazer uma avaliação rápida
para determinar quais intervenções são mais apropriadas, providenciar
transporte imediato para a unidade mais apropriada ao tratamento do
problema, e fornecer rápido atendimento de emergência. Após a chegada
do paciente a uma unidade, os serviços de atendimento de emergência
continuam até que a condição do paciente tenha se estabilizado.
O caráter dos serviços médicos de emergência varia consideravelmente
entre países e regiões. Em muitos países rurais de baixa renda, curandeiros
tradicionais como os quiropatas podem fornecer primeiros socorros, e o
transporte pode ser feito por canoa ou carroça puxada por animais. Em
cidades de renda alta, em contrapartida, geralmente o serviço é caracterizado pela chegada de paramédicos em uma ambulância. O importante é
não tentar equiparar tecnologias ideiais, mas melhorar a organização e o
planejamento do atendimento de emergência, que pode ser feito a um
custo razoável e melhoraria a utilização de recursos, o atendimento recebido e os resultados.
O DCP2 destaca uma série de problemas que impedem que países de
renda média e baixa forneçam atendimento de emergência adequado
junto com alguns métodos inovadores para lidar com esses obstáculos.
Primeiro, o atendimento de emergência requer que sejam feitos investimentos em unidades que possam tratar pacientes após eles terem sido
estabilizados. Providenciar transporte rápido para uma unidade hospitalar mal equipada ou sobrecarregada é praticamente inútil. Por esse motivo, tal como em muitas outras áreas, a existência de um sistema de saúde
eficaz é importante.
Em segundo lugar, métodos de comunicação rápidos podem fazer uma
enorme diferença quando se trata de sobrevivência. Em lugares onde não
há telefones tradicionais, podem ser usados fones de rádio simples ou
celulares. A comunicação é importante para a coordenação entre o local
do atendimento inicial e a unidade onde o paciente receberá tratamento,
e é útil também para dar suporte aos primeiros socorristas permitindo-os
“. . . em Kuala Lumpur . .
. as equipes de atendimento de emergência não
encontravam o paciente
em 20% das chamadas
de emergência.”
“. . . o uso de socorristas
leigos treinados em conjunto com voluntários
treinados . . . pode ser
altamente custo-efetivo,
custando entre US$73 e
US$706 por morte evitada
ou entre US$3 e US$27
por vida salva.”
Fornecimento de intervenções: | 143
Box 6.3 Melhoria do atendimento ao trauma na ausência de um
sistema formal de ambulância
Histórico: Foi avaliada a eficácia de um programa que aproveita o sistema existente, embora
informal, de transporte pré-hospital em Gana. Em Gana, a maioria das pessoas feridas é
transportada para o hospital por meio de algum tipo de veículo comercial, como táxi ou
ônibus.
Métodos: Um total de 335 motoristas comerciais foi treinado em um curso básico de
primeiros-socorros com duração de 6 horas. A eficácia desse curso foi avaliada ao se
comparar o processo de trauma pré-hospital fornecido antes e depois do curso, conforme
relataram os próprios motoristas.
Resultados: Foram realizadas entrevistas de acompanhamento com 71 motoristas, 10,6
meses, em média, após o curso. Sessenta e um por cento afirmaram ter prestado primeiros
socorros desde que começaram a fazer o curso. Houve uma melhoria considerável na
provisão dos componentes de primeiros socorros em comparação ao que foi relatado antes
do curso (consulte a tabela 1).
Tabela 1 Prestação de atendimento médico de emergência
antes e depois do curso de primeiros socorros
Tipo de atendimento
Controle da cena do acidente
Controle das vias aéreas
Controle da hemorragia
Aplicação de tala
Triagem
Prestado antes
course (%)
Prestado depois
de curso (%)
7
2
4
1
7
35
35
42
16
21
Fonte: Mock e outros, 2002.
O curso foi realizado com quantias moderadas de trabalho voluntário e doações em espécie,
como transporte para o curso. O custo real do curso somou US$3 por participante.
Conclusões: Mesmo na ausência de serviços médicos formais de emergência, as melhorias
no processo do atendimento pré-hospital ao trauma são possíveis quando se aproveita o
transporte pré-hospital existente, ainda que informal.
Fonte: DCP2, capítulo 68, box 68.1.
consultar outras equipes médicas e receber aconselhamento qualificado
no local da emergência.
Em terceiro lugar, um planejamento apropriado pode reduzir os tempos de resposta e melhorar o atendimento. Às vezes, isso é tão simples
quanto assegurar que existam mapas precisos e que as casas sejam numeradas e as ruas tenham placas. Um estudo realizado em Kuala Lumpur
144 | Prioridades em Saúde|
comprovou que as equipes de atendimento de emergência não encontravam o paciente em 20% das chamadas de emergência.
Em quarto lugar, o transporte precisa ser rapidamente acessível. Os
veículos com macas são ideais, mas há outros meios funcionais. Em Malawi,
uma bicicleta-ambulância, que originalmente ajudou a melhorar o atendimento de emergência obstetrícia, passou a ser usada regularmente no transporte de pacientes com todos os tipos de emergência, incluindo lesões.
Os estudos concluíram que o principal fator na questão da sobrevivência está menos relacionado à velocidade do transporte do que com a eficácia do atendimento salva-vida fornecido pela equipe socorrista. Os sistemas de atendimento de emergência requerem pessoal qualificado e
motivado com suprimentos, remédios, equipamento e pessoal de apoio
apropriados para coordenação e gerenciamento. Onde há recursos
disponíveis, esses sistemas podem depender de pessoal em tempo integral
com transporte motorizado. Onde os recursos são limitados, grande parte
ainda pode ser feita com métodos simples e sustentáveis. Por exemplo,
recrutar e treinar cidadãos motivados que costumam enfrentar situações
de emergência, como motoristas de transporte público, pode agilizar
enormemente o atendimento às emergências (box 6.3).
O DCP2 revisa as informações sobre o uso de socorristas leigos treinados em conjunto com voluntários treinados. Esse tipo de programa
necessitaria de 7.500 primeiro socorristas leigos e 150 paramédicos voluntários para atender a uma população de 1 milhão de pessoas. Os
primeiro socorristas leigos poderiam ser treinados em 12 horas ao passo
que os paramédicos voluntários se submeteriam a um treinamento de 25
dias. Nesse caso, seriam necessários cursos de atualização a cada três anos
para manter o nível técnico e a motivação em alta. Esse tipo de programa
pode ser altamente custo-efetivo, custando entre US$73 e US$706 por
morte evitada ou entre US$3 e US$27 por vida salva.
Quando uma ambulância é adicionada, os custos são substancialmente
mais altos. O nível de custo-eficácia entretanto ainda é razoável. Nas áreas
urbanas, os custos crescentes são compensados por um aumento da utilização. O DCP2 estima que nas áreas urbanas, depender de ambulâncias
custaria cerca de US$60 por ano de vida salvo no Sul da Ásia, até cerca de
US$111 por ano de vida salvo na América Latina e no Caribe, e US$176
por ano de vida salvo no Oriente Médio e no Norte da África. Nas áreas
rurais, os serviços de ambulância custariam cerca de duas a três vezes mais
por ano de vida salvo devido às taxas de utilização mais baixas.
Os países não devem negligenciar os serviços médicos de emergência.
No mínimo, planejamento e comunicações aperfeiçoados e treinamento
adicional de voluntários pode fazer muita diferença quando se trata de
sobrevivência em situações de emergência. Os serviços médicos de
“Nos últimos 50 anos, o
número de medicamentos
eficazes para a prevenção
e o tratamento de doenças
cresceu enormemente.”
“Cerca de 30% da
população mundial não
dispõem de acesso
regular a medicamentos
regulares...”
Fornecimento de intervenções: | 145
emergência são outro elemento que requer coordenação no sistema de
serviço de saúde, ligando cenas de trauma e outros locais de emergência
para intervenções apropriadas em vários níveis de atendimento. Para que
sejam custo-efetivas, as estratégias devem ser apropriadas às condições
locais, quer isso envolva o treinamento de motoristas de ônibus como
primeiro socorristas, o emprego de bicicletas-táxi ou o fornecimento de
equipamento aos paramédicos profissionais.
Medicamentos
Nos últimos 50 anos, o número de medicamentos eficazes para a
prevenção e o tratamento de doenças cresceu enormemente.7 Alguns
evitaram que milhões de pessoas contraíssem difteria, tétano, pólio e
sarampo. Outros trataram infecções bacterianas e virais, como pneumonia,
TB e HIV/AIDS. Uma grande variedade de medicamentos encontra-se
hoje disponível para lidar com doenças crônicas como o diabetes, a DCV
(doença cardiovascular) e a depressão. Outros são essenciais para tratamento paliativo.
O suprimento de medicamentos é importante para intervenções eficazes na saúde. As políticas criadas para garantir que medicamentos apropriados estejam disponíveis para aqueles que precisam terão que resolver
uma série de problemas:
“A lista de medicamentos
essenciais . . . foca a
atenção nas alternativas
menos caras para o tratamento de categorias de
doenças prioritárias.”
• problemas financeiros incluem financiamento para a realização de
pesquisa básica e desenvolvimento comercial, definição e proteção dos
direitos de propriedade intelectual, e garantia de acessibilidade financeira
• problemas logísticos relacionadas a compras, armazenamento e distribuição
• problemas clínicos referentes à garantia de práticas corretas de prescrição e adesão aos regimes de medicamentos prescritos
• problemas de incentivos afetam o envolvimento de empresas farmacêuticas, prestadores privados de serviços de saúde, farmácias e
serviços de saúde publicamente financiados ou gerenciados em
pesquisa, desenvolvimento e marketing de medicamentos.
A disponibilidade de medicamentos é altamente desigual e exacerba a
distribuição desigual dos serviços de saúde no mundo inteiro. Cerca de
30% da população mundial não dispõem de acesso regular a medicamentos regulares, variando de 26% da população do Sudeste Asiático (excluindo Índia), 29% daqueles que vivem na Região do Leste Mediterrâneo da
OMS, e 47% dos Africanos, até 65% dos Indianos. Enquanto isso, os 15%
que vivem em países de renda alta consomem aproximadamente 90% de
todos os medicamentos (medido por valor monetário).
7
146 | Prioridades em Saúde|
Esta seção baseia-se no DCP2, capítulos 4, 6, 55 e 72.
As indústrias farmacêuticas privadas e os governos dos países de renda
alta focalizaram o desenvolvimento de medicamentos que solucionem a
carga de doenças em seus próprios países. Dos 1.325 novos medicamentos que se tornaram disponíveis entre 1975 e 1997, somente 11 foram
aprovados especificamente para doenças tropicais. Na década passada,
algumas iniciativas internacionais buscaram corrigir essa distribuição
desigual de benefícios de medicamentos. Algumas visam aumentar o acesso a medicamentos essenciais que já estejam disponíveis, como é o caso da
GAVI e Fundo Global para Combate a AIDS, Tuberculose e Malária. A
meta de outras é promover pesquisa e desenvolvimento de novas vacinas,
tratamentos ou regimes de medicamentos mais fáceis de administrar.
Entre essas, a iniciativa dos Medicamentos para Doenças Negligenciadas
dos Médicos sem Fronteiras, uma pesquisa pública para o desenvolvimento de vacinas para malária, e novas terapias para TB resistentes a drogas.
Os principais objetivos das políticas de medicamentos são aumentar o
acesso aos medicamentos eficazes, melhorar e garantir sua qualidade, e
promover as práticas de prescrição racional por parte dos fornecedores e
o uso racional por parte dos pacientes. A OMS ajudou inúmeros países de
renda média e baixa a adotar as políticas nacionais de medicamentos que
incluem a seleção de uma lista de medicamentos essenciais, garantia de
acessibilidade financeira, controle da qualidade, incentivo aos suprimentos regulares, e promoção do uso racional.
A lista de medicamentos essenciais é um elemento importante da
política de medicamentos porque foca a atenção nas alternativas menos
caras para o tratamento de categorias de doenças prioritárias. Dessa
forma, isso simplifica o processo de abastecimento, compra, treinamento
e uso. As diretrizes da OMS incluem uma lista de 320 medicamentos em
559 formulações. A maioria dos países que usaram essas diretrizes listam
menos de 300 medicamentos, variando de 180 medicamentos na Libéria
a 389 no estado de Karnataka, Índia. Como a lista de medicamentos, a lista
de vacinas recomendadas também aumentou com o tempo à medida que
novas vacinas se tornaram disponíveis. A maioria dos países ainda adere
às vacinas originais que foram promovidas com o PAI (contra
Tuberculose, difteria, tétano, coqueluche, pólio e sarampo), mas desde que
essas foram promovidas pela primeira vez, a OMS recomendou o acréscimo de novas vacinas, como as da hepatite B, Hib e para febre amarela em
países onde essa doença é endêmica.
Os processos de abastecimento devem prestar atenção não somente à
obtenção do melhor preço, mas também para garantir a qualidade dos
medicamentos e a confiabilidade do suprimento. Por esse motivo, os países têm mudado de métodos de licitação aberta, que usam o preço como
Fornecimento de intervenções: | 147
“. . . cerca de metade das
falhas nas terapias com
medicamentos ocorra
porque os pacientes não
cumprem o regime
prescrito.”
“Erros cometidos pela
equipe médica ou farmacêuticos respondem pela
outra metade das
falhas . . .”
“O uso abusivo de remédios para doenças infecciosas e a adesão inadequada . . .aceleram a
emergência de cepas
resistentes às drogas.”
148 | Prioridades em Saúde|
principal critério de seleção e consideram secundárias a qualidade e a confiabilidade, para métodos de licitação restrita, que exige que os licitantes
apresentem informações sobre a confiabilidade, estabilidade financeira,
qualidade de produção e desempenho anterior de suas empresas. Somente
fabricantes com pré-qualificação podem passar para o próximo estágio no
qual as licitações são buscadas e a licitação mais baixa é selecionada.
De modo geral, os preços dos medicamentos têm caído. Isso se deve, em
parte, ao ciclo natural de desenvolvimento de medicamentos. Um novo
medicamento é geralmente protegido por uma patente, que restringe o
suprimento e mantém os preços altos até que a proteção da patente expire
ou o licenciamento compulsório seja editado e os fabricantes genéricos
possam entrar e competir. Alguns preços caíram dramaticamente em conseqüência das negociações coletivas, advocacia internacional e pressão
pública, principalmente os de medicamentos para Tuberculose e
HIV/AIDS, alguns do quais caíram mais de 90% nos últimos anos.
A compra de medicamentos genéricos em lote é de longe a forma mais
fácil de um país obter o máximo com um orçamento limitado. Quando
disponível nas formas e qualidades apropriadas, os genéricos são substancialmente mais baratos do que os medicamentos de marca. Um estudo
realizado na Malásia descobriu que 13 medicamentos de marca custaram
4 a 45 vezes mais caros do que os equivalentes genéricos que foram incluídos nessa lista de medicamentos essenciais do país. Para facilitar uma melhor negociação e determinação de preços, as informações sobre os preços
encontram-se hoje disponíveis internacionalmente via websites. Uma variedade de programas internacionais ajudou a melhorar a acessibilidade
financeira de medicamentos essenciais de países de renda média e baixa:
o Fundo das Nações Unidas para a Infância tem um programa de suprimento de vacinas que atende 40% da demanda global, a Organização PanAmericana de Saúde gerencia um fundo rotativo para a América Latina e
a região do Caribe, e o Programa de Compras de Grupo do Conselho de
Cooperação do Golfo ajuda seis estados do Golfo Pérsico oferecendo licitações e logística.
A compra é apenas um elemento do custo do suprimento de medicamentos, e o componente local dos preços dos medicamentos pode representar uma margem de lucro relativamente grande. No Sri Lanka, os custos locais acrescentam 64% ao preço de medicamentos importados. No
Quênia, o componente local é mais do que 100% do preço de importação.
As pesquisas sugerem que esses níveis de margem de lucro entre o comércio de importação e o varejista são comuns. A política pública voltada
para a redução deste acréscimo de preço inclui a mudança de políticas fiscais, como a concessão de isenções das taxas de importação ou taxa de
Box 6.4 Melhoria do uso de antimicrobióticos por meio da Gestão
de Casos da AIDPI
Os medicamentos antimicrobióticos, incluindo os antibióticos e antimalariais, são uma intervenção essencial voltada para a sobrevivência infantil. O fornecimento rápido e correto de
medicamentos para crianças com menos de cinco anos pode salvar vidas. Garantir que esses
medicamentos não sejam receitados desnecessariamente e que aqueles que os recebem
completem o período pode reduzir o desenvolvimento da resistência antimicrobiótica. A
análise de dados reunidos por meio de pesquisas baseadas em observação em unidades de
saúde de primeiro nível selecionadas aleatoriamente no Brasil, Tanzânia e Uganda mostra
que as crianças que recebem cuidados de profissionais da saúde treinados na AIDPI são significativamente mais propensas do que aqueles que recebem cuidados de profissionais da
saúde ainda não treinados na AIDPI a receber receitas corretas para medicamentos antimicrobióticos, a receber a primeira dose do medicamento antes de deixar a unidade de saúde,
a ter familiares cuidadores corretamente orientados sobre como administrar o medicamento
e familiares cuidadores capazes de descrever corretamente como administrar o medicamento
em casa quando deixam a unidade de saúde. O treinamento da AIDPI é uma intervenção eficaz destinada à melhoria do uso racional de medicamentos antimicrobióticos para crianças
doentes que visitam unidades de saúde de primeiro nível em países de renda média e baixa.
Fonte: DCP2, capítulo 63, box 63.2.
valor agregado, implementação de políticas que reduzam os custos com
transporte; e a introdução de regulamentos de marketing.
Após os medicamentos terem sido selecionados e comprados, eles
devem ser adequadamente armazenados e distribuídos. Quando os
medicamentos são distribuídos para os fornecedores públicos, o governo
deve gerenciar a logística da demanda prevista, mudando os medicamentos efetivamente para onde eles são necessários, certificando-se de que eles
sejam armazenados em embalagem apropriada em local com umidade e
temperatura adequadas, e garantindo o descarte dos medicamentos vencidos. Para esse fim, os países empregaram vários métodos, incluindo a
distribuição de kits de medicamentos pré-definidos em um cronograma
até sistemas mais flexíveis e complexos por meio dos quais as unidades de
saúde fazem pedidos. As vacinas apresentam seus próprios desafios, especialmente a gestão de uma “cadeia fria” para garantir que as vacinas sejam
mantidas em temperaturas apropriadas até que sejam usadas. Quando os
medicamentos são distribuídos por meio de farmácias particulares, o
papel do governo focaliza o monitoramento dos canais de distribuição
para garantir que as informações das embalagens sejam precisas, que o
armazenamento correto esteja sendo usado para manter a qualidade e que
os medicamentos vencidos sejam descartados.
Fornecimento de intervenções: | 149
“A integração da atenção
às doenças na infância
envolve. . .melhoria do
desempenho dos profissionais da saúde,... dos
sistemas de saúde... e das
práticas familiares e
comunitárias.”
“. . . na Tanzânia, . . .
municípios que implementaram a AIDPI gastaram o
mesmo ou menos por criança que os municípios
com programas de
assistência de saúde
tradicional, mas
realizaram um melhor
atendimento e conseguiram 13% de redução
na taxa de mortalidade”
150 | Prioridades em Saúde|
As próximas etapas são a prescrição e o uso adequados. Para ser eficaz,
o medicamento correto precisa ser prescrito para a condição do paciente
com adesão apropriada à dosagem e duração corretas do tratamento. O
DCP2 estima que cerca de metade das falhas nas terapias com medicamentos ocorra porque os pacientes não cumprem o regime prescrito.
Garantir a adesão do paciente ao tratamento é um elemento da qualidade
dos serviços de saúde. É mais fácil atingir essa meta onde o sistema de
saúde é sensível e responde às atitudes locais, à educação e cultura; onde
profissionais da saúde comunicam-se de maneira clara e respeitosa com
os pacientes; e onde o apoio e a informação comunitária estão
disponíveis.
Erros cometidos pela equipe médica ou farmacêuticos respondem pela
outra metade das falhas em terapias com medicamentos. Ironicamente, a
prescrição excessiva de medicamentos é tão comum em países de renda
média e baixa, que não pode dar-se o luxo de desperdiçar medicamentos,
quanto nos países de renda alta. Os estudos dos programas da AIDPI em
vários países concluíram que o aprimoramento do treinamento dos
profissionais da saúde gerou resultados de saúde semelhantes ou melhores
do que a média e esses custos foram quase sempre inferiores porque o
treinamento resultou na utilização mais racional dos medicamentos, além
de ter reduzido prescrições desnecessárias (box 6.4). Os médicos que também dispensam medicamentos regularmente parecem prescrever mais
medicamentos do que os médicos que não dispensam, confirmando a
recomendação geral que afirma que prescrever e dispensar devem ser,
sempre que possível, atividades separadas.
O uso abusivo de remédios para doenças infecciosas e a adesão inadequada podem ser devastador para a eficácia do cuidado médico, porque
aceleram a emergência de cepas resistentes às drogas. Medicamentos mais
baratos para malária já estão se tornando ineficazes, exigindo recurso para
uma terapia combinada de artemisinina (ACT) mais caro. Surgiram cepas
resistentes às drogas da Tuberculose exigindo um recurso mais freqüente
para terapias multidrogas e regimes com drogas de segunda linha. A
maioria das infecções cada vez mais resistentes ocorre em países de renda
média e baixa, mas não em países de renda alta, o que reduz a demanda
efetiva de pesquisa sobre novos tratamentos em substituição aos antigos.
Para retardar a emergência de cepas de doenças resistentes às drogas
são necessárias ações que, concomitantemente, melhorem a qualidade da
assistência de saúde. Prescrições e adesões apropriados melhoram os
índices de cura e inibem futuras disseminações da infecção. Isso pode ser
obtido por meio de uma série de programas educacionais para dispensários e prestadores públicos e privados. Também requer a garantia de um
suprimento confiável de drogas, reduzindo as barreiras financeiras para
Figura 6.1 Descrição esquemática da Gestão de Casos da AIDPI
Unidade ambulatorial
Verificar sinais de risco
• Convulsões
• Letargia ou inconsciência
• Inabilidade para beber ou sugar
Avaliar principais sintomas
• Tosse ou dificuldade para respirar
• Diarréia
• Febre
• Problemas auditivos
Avaliar condições de nutrição
e imunidade e problemas
potenciais de alimentação
Verificar se há outros
Classificar condições e identificar
ações de tratamentos de acordo
com os gráficos de tratamento
codificados por cores
Amarelo
Tratamento em unida
de ambulatorial
Rosa
Referência urgente
Unidade ambulatorial
• Administrar medicamentos orais
• Aconselhar e ensinar o familiar
cuidador
• Acompanhamento
Unidade ambulatorial
• Tratar infecção local
• Administrar medicamentos orais
• Aconselhar e ensinar
o familiar cuidador
• Acompanhamento
Verde
Gerenciamento domiciliar
Domiciliar
O familiar cuidador recebe
orientações sobre como
• Administrar medicamentos orais
• Tratar infecções locais em casa
• Continuar com a alimentação
• Determinar quando retornar
imediatamente
• Acompanhamento
Rosa
Referência urgente
Unidade de referência
• Fornecer triagem e tratamento
de emergência
• Diagnóstico
• Tratamento
• Monitorar e fazer o
acompanhamento
Fonte: OMS, UNICEF 2001. DCP2, capítulo 63, figura 63.1.
Fornecimento de intervenções: | 151
pessoas em domicílios de baixa renda, e melhorando a comunicação com
pacientes para apoiar uma melhor adesão. Eliminar a adição rotineira de
suplementos antimicrobióticos para ração animal, como recomendado
pela OMS, é outro componente importante dessa estratégia.
INTEGRAÇÃO DE SERVIÇOS EM TODO O CICLO DE VIDA
Além de analisar a assistência de saúde por nível e função, o DCP2
apresenta informações sobre atividades visando integrar a assistência
por estágios no ciclo de vida. Recém-nascidos, crianças, adolescentes
e mulheres em idade reprodutiva, todos apresentam uma série de
riscos e condições que podem ser tratados mais efetivamente com o
acesso a uma série apropriada de medidas preventivas e tratamentos.
O capítulo 4 tratou de condições maternais e neonatais. O presente
capítulo destaca alguns capítulos do DCP2 que trata da atenção
integrada para grupos etários específicos.
Atenção integrada às doenças prevalentes da infância
“Enquanto a prática médica tradicional enfatiza o
tratamento após o diagnóstico,... a prestação de
serviços em massa, como
a desparatização e a
suplementação de
micronutrientes, é geralmente preferível por
razões técnicas, econômicas e igualitária. . .”
Após o período neonatal, as mortes entre crianças até a idade de cinco
anos estão concentradas entre aqueles que sofreram de diarréia, pneumonia, malária e outras doenças infecciosas e de desnutrição8. Como a
comorbidade é altamente prevalente e tratamentos eficazes estão
disponíveis, foram feitos esforços para integrar atenção às crianças. A
principal iniciativa foi o programa da AIDPI, lançado pela OMS e pelo
Fundo das Nações Unidas para a Infância na metade dos anos 90 e implementado em vários países desde essa época.
A integração da atenção às doenças na infância envolve três componentes: melhoria do desempenho dos profissionais da saúde, melhoria dos
sistemas de saúde e melhoria das práticas familiares e comunitárias. O
primeiro componente inclui o treinamento no uso de um guia de tratamento que instrui o pessoal a procurar sinais de perigo, fazer avaliações
mais minuciosas, e depois implementar as intervenções apropriadas na
gestão de casos. O treinamento também instrui os profissionais da saúde
a integrar cuidado preventivo e curativo ao verificar, por exemplo, se as
crianças trazidas para a unidade com doença respiratória estão em dia
com as vacinas e se estão adequadamente alimentadas. Em segundo lugar,
a atenção integrada da criança requer melhorias no sistema de saúde para
garantir que os medicamentos estejam disponíveis, a supervisão e o
treinamento sejam eficazes, os serviços de referência estejam funcionando
e os sistemas de informação de saúde sejam adequados. Em terceiro lugar,
8
152 | Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 58.
a melhoria das práticas familiares e comunitárias requer o suporte de boas
práticas de amamentação, melhor nutrição, atenção à higiene, uso de
mosquiteiros, administração de fluidos durante a doença, e esforços oportunos na busca pela assistência de saúde (figura 6.1)
Avaliações do programa AIDPI demonstram, acima de tudo, as dificuldades de implementação de uma estratégia integrada de treinamento, do
fortalecimento de um sistema de saúde e do envolvimento da comunidade
nos países com recursos limitados e instituições públicas deficientes. A
maioria dos países que adotaram formalmente a AIDPI não a implementaram integralmente. Desses três componentes, a implementação mais
bem-sucedida foi o treinamento dos profissionais da saúde. Uma das melhores implementações foi realizada na Tanzânia, onde os municípios que
implementaram a AIDPI gastaram o mesmo ou menos por criança que os
municípios com programas de assistência de saúde tradicional, mas
realizaram um melhor atendimento e conseguiram 13% de redução na
taxa de mortalidade (consulte box 6.4). Contudo, a promessa de atendimento integrado ainda não foi cumprida na maioria dos lugares porque
foram aplicados recursos insuficientes na implementação da estratégia; os
sistemas de saúde foram incapazes de fornecer o pessoal e o suporte
gerencial necessários; e nenhum país obteve total êxito ao vincular a
AIDPI às mudanças no comportamento das famílias com relação aos
cuidados das doenças em casa, a busca por atendimento quando apropriado, e a melhoria das práticas nutricionais.
Programas de nutrição e saúde escolar
As crianças em idade escolar são outro subgrupo bem-definido cujas
condições de saúde reúnem várias doenças e fatores de risco administráveis.9 A freqüência escolar cria uma oportunidade simples para
atrair as crianças por meio de uma infra-estrutura pré-existente. Além
disso, a maioria dos países de renda baixa têm mais professores do que
enfermeiras. Deste modo, o custo incremental por criança de intervenções
na saúde em escolas é excepcionalmente baixo, totalizando menos de
US$1 ao ano para o pacote mais simples. Cuidar de crianças em idade
escolar pode ser uma forma custo-efetiva de fornecer intervenções na
saúde.
As intervenções na saúde escolar também complementam a missão
educacional, uma vez que saúde e nutrição boas são pré-requisitos para
uma aprendizagem eficaz. Por exemplo, programas de desparatização
foram implementados com sucesso em várias escolas e posteriormente
melhoraram a freqüência escolar e o resultados educacionais.
9
“Os fatores de risco que
geralmente surgem na
adolescência incluem o
fumo, o uso excessivo de
álcool, maus hábitos alimentares, sujeição ao
abuso sexual e sexo sem
proteção.”
“Intervenções para adolescentes são geralmente
difíceis porque . . .
envolvem a mudança de
comportamentos de risco
que muitas vezes são
incentivados tanto pelos
costumes tradicionais
quanto pelos modernos”
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 59.
Fornecimento de intervenções: | 153
Concomitantemente, a educação é um componente importante de muitos
programas de saúde preventiva, como ensinar as crianças a importância da
higiene adequada, segurança na estrada, uso de mosquiteiros, e nutrição
junto com mensagens sobre sexualidade e riscos associados à saúde.
Um elemento importante dessa abordagem é o foco na minimização
da necessidade de diagnóstico clínico. Enquanto a prática médica tradicional enfatiza o tratamento após o diagnóstico, a nova abordagem sugere
que a prestação de serviços em massa, como a desparatização e a suplementação de micronutrientes, é geralmente preferível por razões técnicas,
econômicas e igualitárias a abordagens que requerem de identificação de
pacientes por diagnósticos.
Adolescentes e adultos jovens
As taxas de mortalidade entre adolescentes tendem a ser baixas em comparação a de outros grupos etários.10 Boa parte da carga de doenças está
associada à depressão, acidentes de carro e quedas. Contudo, a adolescência é um período crítico para a adoção ou prevenção de comportamentos
que aumentem o risco de doenças nos anos posteriores. Os fatores de risco
que geralmente surgem na adolescência incluem o fumo, o uso excessivo
de álcool, maus hábitos alimentares, sujeição ao abuso sexual e sexo sem
proteção.
Na África Subsaariana, a epidemia de HIV/AIDS torna a intervenção
nesse grupo etário especialmente importante. Nessa região, 63% dos
AVAD para mulheres jovens com idades de 15 a 29 anos estão relacionados a doenças sexuais e reprodutivas. Padrões de casamento prematuros
com homens mais velhos e sexo sem proteção aumentam enormemente as
chances de uma garota contrair HIV/AIDS e outras infecções sexualmente
transmitidas.
Intervenções para adolescentes são geralmente difíceis porque a maioria dos riscos nessa idade não devem ser tratados simplesmente com
atendimento preventivo ou curativo. Envolvem a mudança de comportamentos de risco que muitas vezes são incentivados tanto pelos costumes
tradicionais quanto pelos modernos. Geralmente, as intervenções precisam fornecer aos jovens as informações e as habilidades para tomar boas
decisões; fornecê-los uma série de serviços de saúde que os ajudem a ter
influência nessas decisões, como contraceptivos; e construir um ambiente
social, jurídico e normativo que apóie comportamentos saudáveis e proteja os jovens dos perigos, como a proibição de propagandas de cigarro.
Relativamente poucos programas focalizados em adolescentes e adultos jovens foram implementados em larga escala. Os programas mais
10
154 | Prioridades em Saúde|
Esta seção é baseada no DCP2, capítulo 59.
divulgados focalizam a saúde sexual e reprodutiva, incluindo a prevenção
de HIV/AIDS. Desses, os programas orientados para as escolas são os mais
comuns. Programas de nutrição, saúde mental e prevenção ao cigarro destinados aos adolescentes são mais comuns em países de renda alta. Os
serviços são geralmente divididos entre vários programas. Por exemplo, a
gravidez em adolescentes pode ser tratada como parte de um programa de
planejamento familiar da ONG, enquanto o ministério dos transportes
promove segurança nas estradas e uma intervenção na saúde materna
promove a boa nutrição.
Até agora, pouco tem sido documentado com relação aos custos ou
eficácia das iniciativas nacionais na saúde destinadas a adolescentes e
adultos jovens. Em Bangladesh, o Programa Newlyweds incentivou a
baixa fecundidade entre jovens recém-casados. A Nova Zelândia estabeleceu um programa de prevenção ao suicídio entre adolescentes. A
Mongólia introduziu a educação sexual após a terceira série em resposta
ao aumento das taxas de DST atribuídas à iniciação sexual precoce, à violência sexual e às mensagens aproveitadoras da mídia. A iniciativa Love
Life da África do Sul promoveu a saúde sexual e os estilos de vida
saudáveis entre adolescentes de 12 a 17 anos. As avaliações do programa
da África do Sul identificaram um aumento da conscientização com
relação aos riscos à saúde, iniciação sexual adiada, comportamento mais
positivo com relação ao uso de preservativo, e uma melhora na comunicação com os pais a respeito de sexo.
A implementação desses programas requer a coordenação de uma série
de complexas intervenções. Além disso, as respostas aos comportamentos
de risco que são direcionados podem entrar em conflito com as metas do
governo e as visões de líderes religiosos, pais ou professores. Alguns dos
princípios chave no desenvolvimento de uma abordagem integrada a esse
grupo etário são: envolvê-los no processo de criação do programa, encarregá-los como educadores voluntários, tornar os serviços de saúde
atraentes e convidativos, e confrontar as desigualdades de gêneros.
Em suma, as intervenções são mais custo-efetivas se forem implementadas por um sistema de saúde funcional e nenhuma intervenção é útil se
não puder ser cumprida. Esta seção discutiu sobre alguns dos problemas que
surgem durante a organização de serviços de assistência de saúde por nível,
função, ou em torno das necessidades de determinados grupos etários. Em
geral, o DCP2 mostra que esses aspectos do sistema de assistência de saúde
funcionam melhor quando estão ligados e podem fornecer assistência contínua com pessoal apropriado e em locais apropriados. Isso, por sua vez,
requer sistemas para a geração e troca de informações, gerenciamento de
qualidade e de pessoal, e mobilização e alocação de financiamentos.
Fornecimento de intervenções: | 155
Capítulo 7
Pilares do Sistema de Saúde
Um sistema de saúde é mais do que um mescla de unidades e consultas
médicas. É uma estrutura na qual pessoas, instituições e organizações
interagem para mobilizar e alocar recursos para prevenir e tratar doenças
e lesões. Essa estrutura deve apoiar-se em determinados pilares fundamentais. Esses pilares são elementos essenciais ao funcionamento do sistema de cuidados de saúde. Eles incluem tudo desde um serviço administrativo bem gerenciado até um sistema de comunicação extensivo. Essa
seção destaca quatro desses pilares: informação, gerência, recursos
humanos e financiamento.
INFORMAÇÃO, VIGILÂNCIA E PESQUISA
A importância de se reunir, processar e usar dados na campanha de melhoria à saúde nunca será suficientemente ressaltada.1 Conforme observado no capítulo 1, boa parte do progresso no aumento e na melhoria da
qualidade da vida humana deve-se ao progresso tecnológico, incluindo
avanços no conhecimento das doenças e das respostas apropriadas e
custo-efetivas. Na medida em que a geração e a aplicação de informações
e conhecimentos possam ser facilitadas e se tornar mais sistemáticas, deve
ser possível acelerar o desenvolvimento da saúde humana e eliminar as
desigualdades nas condições de saúde.
Informação e Vigilância
Os formuladores de decisões do setor de saúde — sejam profissionais da
saúde em pequenas clínicas, diretores de grandes hospitais, diretores de
segurança em medicamento, funcionários públicos locais ou ministros da
1
Esta seção é baseada no DCP2, capítulos 4, 6, 5 e 53 e 54.
157
“. .. menos da metade de
todos os nascimentos e
apenas um terço de todas
as mortes são registradas
nos sistemas de registro
nacionais.”
“As estatísticas dos
serviços de saúde são
fundamentais para gerenciar serviços de saúde
pública, identificando
tendências de saúde e
alocando recursos de
modo eficiente.”
158 | Prioridades em Saúde|
saúde—fazem várias perguntas que devem servir como ponto de partida
para qualquer discussão. Por exemplo, o recente aumento de casos de
gripe é o começo de uma nova epidemia? Estamos atingindo 90% das crianças abaixo de cinco anos com as vacinas recomendadas? Quais as principais causas prováveis de morte nos próximos 20 anos? Quais os comportamentos sociais que mais contribuem para a disseminação das DSTs?
Para onde vão as despesas com saúde do setor público? Quais são os tratamentos eficazes contra uma determinada doença? Existem outros métodos custo-efetivos disponíveis?
As informações para responder a essas perguntas geralmente são obtidas das seis principais fontes a seguir:
• O registro de eventos vitais fornece dados sobre nascimentos e mortes,
assim como casamentos, divórcios e migrações. Os dados sobre nascimentos, mortes e migração são especialmente importantes para a
análise política da saúde, pois sem esses dados torna-se impossível
realizar o acompanhamento da população e o cálculo de indicadores
básicos como taxas de incidência de doenças. Contudo, esses dados
básicos são mal registrados na maior parte do mundo: menos da
metade de todos os nascimento e apenas um terço de todas as mortes
são registradas nos sistemas de registro nacionais.
• As estatísticas dos serviços de saúde abrangem informações sobre consultas feitas por pacientes, serviços fornecidos e diagnósticos. As
unidades de saúde reúnem diariamente boa parte dessas informações
para uso local, mas raramente são reunidas em formatos padronizados
ou registradas em um banco de dados nacional de saúde. As estatísticas dos serviços de saúde são fundamentais para gerenciar serviços de
saúde pública, identificando tendências de saúde e alocando recursos
de modo eficiente.
• A vigilância da saúde pública abrange uma enorme variedade de iniciativas para rastrear e responder às tendências de doenças. Uma abordagem comum é identificar uma lista de doenças notificáveis que os
prestadores de serviços de saúde são obrigados a reportar às autoridades nacionais, geralmente doenças infecciosas que podem ser raras,
mas que requerem uma resposta imediata. Em outro tipo de vigilância
conhecida como vigilância sentinela, amostras de prestadores ou
unidades de serviços de saúde reportam todos os casos de determinadas
condições. Esse tipo de acordo é bom para os grandes programas de
saúde pública, mas não é eficaz para detectar ameaças à saúde raras ou
novas. A vigilância pode ser baseada no relato de prestadores de serviços
de saúde sobre casos com sintomas especiais ou testes laboratoriais com
determinado diagnóstico. De modo geral, a vigilância funciona melhor
quando um amplo conjunto de fontes estão integradas em um sistema
que inclui detecção, monitoramento, análise e resposta.
• Os dados do Censo que são exatos e reunidos regularmente fornecem a
base para calcular índices importantes e desenvolver amostras confiáveis.
• As pesquisas por amostra de domicílios são um modo eficaz de obter
informações sobre demografia populacional, características sociais e a
sua dinâmica com freqüência regular entre censos. Elas também
podem ser expandidas para reunir informações importantes sobre
comportamentos ou determinadas condições de saúde.
• O rastreamento de recursos envolve a avaliação e a gestão de recursos
humanos, unidades de saúde, produtos básicos e finanças. Ele tem por
base uma variedade de métodos de relatório e iniciativas de coleta de
dados. A coleta de informações sobre profissionais de serviços de saúde
geralmente requer mais do que o rastreamento do emprego no setor de
saúde pública para incluir atividades realizadas por profissionais de
saúde com práticas particulares. De modo semelhante, os fluxos financeiros no sistema de saúde não podem ser totalmente entendidos sem
associar as informações orçamentárias públicas aos dados sobre despesas privadas na saúde, incluindo as consultas e medicamentos pagos
pelo próprio paciente, prêmios de seguro de saúde, despesas com
pesquisa e desenvolvimento farmacêutico.
Os devidos e oportunos intervalos entre os informes são importantes
para todos os sistemas de coleta de dados. A vigilância de surtos de epidemias infecciosas precisa ser rápida e constante para oferecer advertência imediata. Em contrapartida, a vigilância de mudanças nos fatores de
risco comportamentais necessita de intervalos mais longos.
Com o desenvolvimento de sistemas de informações de saúde, tornouse tentador buscar informações altamente detalhadas sobre o status da
saúde e os serviços de saúde em todos os sítios possíveis, mas isso não significa necessariamente que esses dados sejam confiáveis e acessíveis para
análise. Uma amostra de sítios pré-selecionados que sejam confiáveis em
relação à exatidão e integralidade das informações reunidas pode geralmente fornecer dados melhores do que as tentativas casuais de obter um
relatório universal. Se um método de amostragem apropriado foi usado
para selecionar esses sítios, as informações fornecidas permitirão extrapolações exatas à população como um todo. Muitos países começaram a
melhorar seus sistemas de registros vitais focalizando uma amostra de
municípios pré-selecionados para fornecer dados de boa qualidade para
análise nacional e tomada de decisões, ao mesmo tempo que trabalham
para expandir e melhorar o registro de eventos vitais em outros municípios de modo que o sistema venha a ser universal.
“A vigilância de surtos
de epidemias infecciosas
precisa ser rápida e constante ...a vigilância de
mudanças nos fatores
de risco comportamentais
necessita de intervalos
mais longos.”
Pilares do Sistema de Saúde | 159
“A retenção bem-sucedida
da SARS, para a qual
ainda não existe cura ou
vacina, é atribuída ao
trabalho organizado de
profissionais da saúde
dedicados e competentes
com acesso a bons meios
de comunicação.”
160 | Prioridades em Saúde|
A padronização também aumentará o valor das iniciativas de coleta de
dados. Estabelecer padrões comuns para a coleta de dados facilita o registro, a comunicação e a análise das informações. Também permite um
treinamento mais eficiente e o desenvolvimento de hardware e software.
Por exemplo, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados
Unidos desenvolveram padrões para informes automáticos de resultados
de diagnósticos laboratoriais de doenças notificáveis e difundiram um
software relacionado que é usado em muitos países. O principal nesse tipo
de iniciativa é desenvolver padrões em um processo aberto, envolvendo
outros países e órgãos internacionais tanto para melhorar os padrões
quanto para incentivar a adoção generalizada.
A tecnologia está reformando e expandindo métodos para coleta,
armazenamento e processamento de informações. Por exemplo, técnicas
mais baratas, mais rápidas e mais simples para a obtenção e análise de
amostras de tecido permitem diagnosticar doenças e coletar informações
epidemiológicas em uma maior gama de lugares e circunstâncias do que
era possível anteriormente, e as novas tecnologias de comunicação permitem a transmissão rápida dos dados recentemente coletados, se o hardware necessário e o pessoal qualificado estiverem disponíveis para usá-los
apropriadamente.
De fato, o DCP2 argumenta que as principais barreiras para a melhoria de sistemas de informações nos países de renda média e baixa estão
menos relacionadas às tecnologias e mais aos investimentos necessários
para treinamento e coordenação de pessoas. A perícia necessária para
operar e usar um sistema eficaz de informações de saúde ultrapassa o conhecimento de pesquisa, amostragem, hardware e software para incluir as
habilidades necessárias para gerenciamento, pesquisa médica e epidemiologia de campo e o conhecimento de campos como economia e sociologia. As iniciativas internacionais podem ter uma função valiosa no desenvolvimento dessa perícia. Por exemplo, os Centros de Controle e
Prevenção de Doenças dos Estados Unidos e a OMS coordenam um programa para treinar epidemiologias de campo em mais de 30 países.
No controle de doenças, os exemplos de casos específicos ressaltam a
importância de ter pessoas qualificadas apoiadas pela boa comunicação.
O grave surto de síndrome respiratória aguda grave (SARS) irrompeu na
China em novembro de 2002 e disseminou-se no Canadá, Hong Kong
(China), Vietnã, Cingapura e outros países no intervalo de cinco meses. O
sucesso no controle dessa primeira nova doença pandêmica do século 21
dependeu de uma combinação de colaboração aberta entre cientistas e
políticos de muitos países e a comunicação rápida e exata de dados de vigilância nos países e entre os países. A pandemia global terminou em
julho de 2003 depois que mais de 8.000 pacientes em 26 países e 5 continentes foram afetados e 774 mortes foram confirmadas. O bloqueio bemsucedido da SARS, para a qual ainda não existe cura ou vacina, é atribuído ao trabalho organizado de profissionais da saúde dedicados e competentes com acesso a boa comunicação (consulte o DCP2, capítulo 53, para
obter mais detalhes).
Para ser efetivas, as informações de saúde precisam ser integradas de
uma maneira que facilite a análise e que estejam ligadas a respostas e
ações. Por exemplo, o Escritório Regional da OMS na África está trabalhando com vários países para ligar dados epidemiológicos e laboratoriais
para tomada de decisões em uma estratégia integrada de vigilância de
doenças que respondeu com êxito à ameaça à saúde do Ebola em Uganda
(Box 7.1). A vigilância nas Filipinas detecta surtos regularmente incluindo o cólera e a tifóide (Box 7.2). Mais recentemente, a ameaça de gripe
aviária do tipo A H5N1 no Sudoeste Asiático está sendo cuidadosamente
examinada por vários países e pela OMS e estão em preparação planos
para que ela reprima uma nova pandemia caso se inicie uma disseminação
entre humanos.
Finalmente, os sistemas de informações de saúde não podem ser estabelecidos e operados sem financiamentos. Um sistema de informações
bom e abrangente pode custar cerca de US$3 por pessoa em determinados países, mas mesmo essa necessidade limitada de recursos financeiros
“Um sistema de
informações bom e
abrangente pode custar
tão pouco como US$3
por pessoa. . . “
Box 7.1 Controle do Ebola em Uganda
Em outubro de 2000, um surto de febre hemorrágica do tipo Ebola foi identificado no
município de Gulu no norte de Uganda. O rápido informe, o pronto reconhecimento do
problema e uma subseqüente resposta resultaram em uma bem-sucedida contenção da
epidemia. A vigilância da saúde pública foi difícil porque Gulu era uma área politicamente instável e porque as pessoas reagiam à infecção buscando curandeiros ou fugindo, o que propagava a epidemia. Os hospitais também careciam desesperadamente de
suprimentos para o controle da infecção de tantos pacientes simultaneamente infectados. O governo de Uganda mobilizou o exército para ajudar a localizar os casos e pediu a
ajuda da OMS, dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, e
de outras equipes internacionais. Os profissionais de saúde de Uganda correram grande
risco ao cuidar dos doentes. Com 425 casos identificados, foi o maior surto de Ebola já
registrado. Somente 53% dos pacientes morreram, uma proporção bem inferior aos 88%
relatados em epidemias anteriores.
A contenção bem-sucedida da epidemia comprova o investimento do Ministério da
Saúde no desenvolvimento de profissionais de saúde competentes e motivados pelo
Public Health School Without Walls (Escola de Saúde Pública sem Muros), uma parceria
ativa com a Universidade de Makerere, a Fundação Rockefeller, os Centros de Controle e
Prevenção de Doenças dos Estados Unidos e a OMS, junto com a implementação bemsucedida de uma estratégia integrada para a vigilância de doenças.
Fonte: Adaptado do DCP2, capítulo 53.
Pilares do Sistema de Saúde | 161
Box 7.2 Sistema nacional de vigilância epidêmica das Filipinas
Nos finais dos anos 80, o Departamento de Saúde das Filipinas (PDOH), com base em seu sistema integrado de informações administrativas, detectou menos de um surto ao ano em uma
população de mais de 60 milhões de habitantes. Em 1989, o PDOH criou o Sistema Nacional
de Vigilância Epidêmica, um sistema de vigilância sentinela hospitalar que engloba o fluxo de
dados e os requisitos de pessoal necessários para que o sistema de vigilância funcione de
modo eficaz. Após o estudo piloto ter demonstrado resultados promissores, o PDOH criou cargos e uma estrutura de supervisão para médicos, enfermeiras e auxiliares de escritório sentinelas nas unidades regionais de epidemiologia e vigilância (RESUs) integradas ao sistema
de saúde pública. Somente em 1995, o sistema detectou e investigou formalmente cerca de
80 surtos, incluindo 25 surtos bacteriologicamente confirmados de tifo e 5 de cólera. Quando
as Filipinas desenvolveram a vigilância de HIV serológica e risco comportamental, os membros da equipe do RESU conduziram estudos nas suas comunidades. Ao integrar as funções
de vigilância com base nas habilidades da força de trabalho, o PDOH foi capaz de evitar os
problemas de duplicações, ineficiências e sustentabilidade de múltiplos sistemas verticais
(White e McDonnell 2000).
Fonte: DCP2, capítulo 53, p. 1004.
Tabela 7.1 Custo dos subsistemas do sistema de informações essenciais de saúde
Custo total
(US$ milhões)
Subsistema do sistema
informações de saúde
Países de
renda baixa
Estatística de serviços de saúde
Vigilância da saúde pública
(incluído na estatística do
serviço de saúde)
Censo
Custo per capita
(US$)
Países
renda alta
Países
renda baixa
Países
renda alta
4,8
25,9
0,16
1,66
0
0
0
0
7,5
30,0
0,25
1,0
Pesquisas nacionais em domicílio
0,6
1,0
0,02
0,03
Vigilância de eventos vitais
1,5
6,0
0,05
0,20
1,5
3,0
0,05
0,10
15,9
65,9
0,53
2,99
Rastreamento de recursos
Total
Fonte: DCP2, capítulo 54, p. 1024.
Nota: A tabela baseia-se em uma população de 30 milhões de habitantes. Os custos da pesquisa em domicílio são
baseados na experiência das pesquisas demográficas e de saúde durante o período de 2001-2003 (Macro International,
comunicações pessoais). Os custos variam por tamanho de amostragem e por extensão do instrumento de pesquisa, a
Macro International estima um custo médio de US$100 por cada participante da pesquisa. Admite-se uma amostragem
de 6.000 para o cenário de renda baixa e um tamanho de amostragem de 10.000 para o ambiente de renda alta. As
estimativas de custo para o monitoramento de eventos vitais são baseadas em locais sob vigilância demográfica. Em
ambiente de renda alta, os custos anuais são supostamente quatro vezes maiores. Os custos do rastreamento de
recursos são baseados na experiência de contas nacionais de saúde (Abt Associates, comunicações pessoais) e o sistema Egípcio de Rastreamento Orçamentário. Custos semelhantes são estimados para recursos humanos e produtos
básicos.
162 | Prioridades em Saúde|
Box 7.3 Programa de Intervenções Essenciais na Saúde da Tanzânia
(TEHIP)
O TEHIP é uma parceria entre o Ministério da Saúde da Tanzânia e o Centro de Pesquisa
para o Desenvolvimento Internacional do Canadá. O projeto foi criado para determinar a
viabilidade de uma abordagem baseada em evidências para planejamento de saúde em
nível municipal. De acordo com a premissa do World Development Report 1993: Investing
in Health (Relatório de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial: Investindo em
Saúde), o TEHIP capacitou planejadores de saúde municipais em dois dos 117 municípios
da Tanzânia a coletar e usar dados sobre carga de doenças e custo-eficácia para obter o
maior rendimento dos investimentos nacionais em saúde. As intervenções incluíram coleta de dados de porta em porta e treinamento ou suporte técnico para gerentes na análise
e uso dos dados para tomada de decisões. Os municípios do TEHIP alocaram serviços
para doenças que apresentaram cargas elevadas, resultando na triplicação das taxas de
utilização clínica e no aumento da eficácia do tratamento. Com um aumento per capita
nas despesas de somente US$0,80, os gerentes municipais de saúde obtiveram uma
redução de 47% nas taxas de mortalidade infantil.
Fonte: DCP2, capítulo 54.
pode ser proibitiva em países de baixa renda onde o orçamento total da
saúde pública é de uma ordem de magnitude semelhante (tabela 7.1).
Felizmente, muitos programas internacionais têm reconhecido esse problema e estão financiando atividades de informações de saúde com componentes de empréstimos e subsídios.
As informações sobre saúde também são valiosas para a melhoria da
eficiência dos serviços de saúde. Por exemplo: um estudo na área rural de
Mali concluiu que o custo de programas de imunização infantil em áreas
cobertas por sistemas comunitários de informação era de apenas US$1,47
por criança, comparados aos US$2,79 por criança em áreas que não
tinham esse tipo de sistema. Da mesma forma, na Província sul-africana
de Eastern Cape, a melhoria no acompanhamento e gestão de produtos
farmacêuticos reduziu em 39% o número de situações em que as
instalações ficavam sem medicamentos essenciais, melhorando o
tratamento de milhares de pacientes por meio do aprimoramento do
acesso aos medicamentos necessários.
O Programa de Intervenções Essenciais em Saúde da Tanzânia
(TEHIP) oferece evidências sobre o custo-efetividade dos sistemas
de informações de saúde. Esse programa forneceu treinamento para
profissionais e gerentes de saúde sobre o uso de informações para determinar as prioridades e melhorar a gestão das intervenções existentes (Box
7.3). O TEHIP custou aproximadamente US$0,80 por pessoa nos distritos
onde foi implementado. Se analisarmos apenas a conseqüente redução da
mortalidade entre crianças com menos de cinco anos, o programa custou
“. . . na Mali rural ... . . o
custo de programas de
imunização infantil em
áreas cobertas por
sistemas de informações
comunitários era de
apenas US$1,47 por
criança, comparados aos
US$2,79 por criança, em
áreas que não tinham
esse tipo de sistema.”
Pilares do Sistema de Saúde | 163
US$68,50 por AVAD evitado. Como a saúde dos adultos também
melhorou e a morbidade caiu, uma contabilidade mais completa teria
demonstrado que a iniciativa de sistemas de informações de saúde é ainda
mais custo-efetivas.
Pesquisa e Desenvolvimento
“Desde 1970, foram
relatadas 32 novas
doenças infecciosas. . .”
164 | Prioridades em Saúde|
Os sistemas de informações de saúde devem ser úteis para os formuladores de decisão se for para influenciar opções clínicas, gerenciamento
do sistema de saúde e política pública. Contudo, eles também precisam
fornecer informações e gerar perguntas para a pesquisa fundamental que
gera nova compreensão da doença; técnicas melhores para a prevenção,
diagnóstico e tratamento; e melhores métodos de prestação e organização
de serviços de saúde.
A pesquisa de saúde é um empreendimento global. Os países estão
reconhecendo cada vez mais que suas próprias iniciativas de pesquisa de
saúde aumentam quando há maior interação com pesquisadores de outros países, estudos com locais variados, e trabalho em equipe e treinamento conjunto. Existem cinco capítulos no DCP2 dedicados ao fato de
que a ciência, desenvolvimento de novos produtos e capacidade analítica
são essenciais para o progresso econômico e social. O DCP2 argumenta
que pensar a pesquisa como uma função nacional ou local não faz muito
sentido, e que, em vez disso, deve ser concebido um sistema de pesquisas
globais com uma agenda global.
O DCP2 identifica áreas para pesquisa futura que requerem uma
ampla gama de ferramentas, desde a epidemiologia de campo à genomia
e da ciência comportamental à bioquímica. As agendas de pesquisa discutidas ao longo do DCP2 e resumidas no capítulo 5 incluem prioridades
que já fazem parte da agenda de saúde global e tópicos promissores que
devem ser acrescentados a ela.
As doenças infecciosas predominam entre as prioridades que já constam da agenda de saúde global. Muitas das metas de pesquisa referem-se
ao HIV/AIDS, à malária e à tuberculose. Isso envolve uma pesquisa sobre
a epidemiologia e os fatores de risco associados a essas doenças, com o
desenvolvimento de novos e melhores diagnósticos, vacinas e tratamentos. Também acarreta uma pesquisa sobre mudança comportamental e
programas de aconselhamento e qual a melhor forma de estender as intervenções eficazes em contextos de renda baixa e institucionalmente fracos.
A ausência de uma partida marcada de prioridades de pesquisa prévias
para essas condições atesta a complexidade dessas doenças e sua
importância nos países mais pobres.
Também é necessário realizar uma pesquisa minuciosa da ciência básica de doenças infecciosas existentes e como elas evoluem para nos
preparar para responder às doenças infecciosas emergentes. Desde 1970,
foram relatadas 32 novas doenças infecciosas, incluindo hepatite C, a
doença dos Legionários, Ebola, vírus Nipah, SARS, e cepas especiais de
gripe aviária e o cólera. Também surgiram preocupações com relação ao
possível uso de doenças infecciosas para terrorismo e guerra.
Além das doenças infecciosas, outra parte significativa da agenda de
pesquisa global focaliza condições maternais e neonatais, uma área que
inclui necessariamente uma atenção significativa à ampliação dos serviços
básicos de saúde. A pesquisa sobre o financiamento, a provisão, o gerenciamento e a prestação de serviços de saúde é fundamental para a ampliação
das intervenções custo-efetivas. Sem progresso nessa área, atingir as metas
internacionais de saúde, como as Metas de Desenvolvimento do Milênio
relativas à redução da mortalidade maternal e infantil, será impossível.
No que se referem às prioridades dos países em desenvolvimento que
ainda não constam proeminentemente da agenda de pesquisa de saúde
global, o DCP2 enfatiza condições como CVD, desordens neuropsiquiátricas, obesidade, diabetes e cânceres, que já causam uma enorme e
crescente parcela da carga de doenças em regiões em desenvolvimento. O
DCP2 identifica as prioridades de pesquisa para essas condições que
ressaltam a aquisição de uma melhor compreensão das causas de doenças
não transmissíveis, especialmente o efeito de dieta, estilo de vida, obesidade e consumo de tabaco e álcool; a transmissão de conhecimento sobre
intervenções efetivas de um contexto onde elas obtiveram êxito para outros lugares; e o desenvolvimento de novas abordagens para gerenciar
condições crônicas como o diabetes e a depressão de modo a melhorar a
qualidade de vida dos pacientes, além de prevenir e aliviar uma nova deterioração da saúde.
Com o aumento do conhecimento básico sobre tratamentos de
doenças e saúde, aumentam também as oportunidades para estudar como
adaptar programas e políticas de sucesso para novos contextos. Por exemplo, muitos dos tratamentos de sucesso contra doenças não-transmissíveis
que foram desenvolvidos em países de renda alta parecem ser viáveis nos
países de renda média e baixa, no entanto, as diferenças culturais, de
recursos e instituições dificultam a transmissão desse conhecimento. A
pesquisa pode ligar essa lacuna e trazer os benefícios desses tratamentos
para novos lugares.
Finalmente, os próprios sistemas de cuidados de saúde são um objeto
importante de pesquisa. A identificação de programas institucionais que
sejam mais eficientes na canalização de recursos para intervenções de
“A pesquisa sobre o
financiamento, a provisão,
o gerenciamento e a
prestação de serviços
de saúde é fundamental
para a ampliação das
intervenções custoefetivas.”
“. . . muitas das
intervenções de sucesso
contra doenças nãotransmissíveis que foram
desenvolvidas em países
de renda alta parecem ser
viáveis nos países de
renda média e baixa, no
entanto, as diferenças
culturais, de recursos e
instituições dificultam a
transmissão desse
conhecimento.”
Pilares do Sistema de Saúde | 165
Box 7.4 Uma mudança de paradigma da colaboração de pesquisa
global
As respostas globais recentes para o SARS e a gripe aviária representam uma importante mudança de paradigma na colaboração para pesquisas globais, uma vez que se fez
necessária uma vigilância nacional em níveis epidemiológicos e laboratoriais; compartilhamento sem precedentes de informações em todos os níveis do sistema de saúde; e
colaboração de clínicos, epidemiologistas, cientistas de laboratório, e aqueles responsáveis pela vigilância veterinária para o desenvolvimento rápido de estratégias de intervenções efetivas. Esses casos demonstraram que informações confiáveis e exatas são
essenciais para fornecer advertência imediata e para desenhar uma política de saúde eficaz. Elas também ressaltam a alta prioridade que deve ser dada à criação de sistemas de
vigilância de saúde nacional e redes laboratoriais competentes que são parte de um sistema global de vigilância epidemiológica.
“. . . a qualidade dos
cuidados de saúde não é
um luxo com o qual
somente os países de
renda alta possam arcar,
mas outro pilar do
sistema de cuidados
de saúde que tem um
profundo impacto no
custo-eficácia e eqüidade
das intervenções.”
166 | Prioridades em Saúde|
saúde eficazes pode reduzir o desperdício e melhorar a saúde. A pesquisa
pode indicar melhores formas de treinar e motivar profissionais da saúde
e criar políticas para manter um pessoal altamente qualificado. Também
pode avaliar formas diferentes de mobilizar e alocar recursos financeiros
públicos para a saúde e intensificar a compreensão de como os incentivos
encorajam ou desencorajam a inovação médica.
A ampla revisão dos problemas de saúde globais realizada pelo DCP2
indica uma crescente convergência dos mesmos problemas de saúde entre
países ricos e pobres. Algumas dessas convergências devem-se à maior
interdependência do mundo atual, onde a velocidade de trajeto e comércio significa que o surto de uma epidemia infecciosa em um lugar representa uma preocupação para todos, mas também são devidas à carga compartilhada de lesões e doenças não-transmissíveis. Os benefícios de
pesquisa nessas condições não podem ser confinados por fronteiras artificiais, e a descobertas feitas nos países pobres são tão valiosas quanto as
descobertas nos países ricos.
A adoção dessa perspectiva global sobre pesquisa de saúde requer a
promoção e o suporte da capacidade científica em todos os países, fazendo uso inovador da tecnologia e de instituições para compartilhar e
desenvolver um novo conhecimento, estabelecendo prioridades globais
para conduzir investimentos em pesquisa e desenvolvimento, e apoiando
a liberdade da investigação científica (Box 7.4).
GERENCIAMENTO DE SERVIÇOS DE SAÚDE
Embora os países focalizem geralmente o aumento da quantidade de
serviços de saúde —por exemplo, o número de imunizações ou consultas
ou as taxas de cobertura—isso pode ser inútil, um desperdício ou mesmo
prejudicial se não for apropriado para uma determinada condição ou
consistente com o melhor conhecimento médico2. Assim, prestar atenção
à qualidade do serviço de saúde não é um luxo com o qual somente os
países de renda alta possam arcar, mas outro pilar do sistema de cuidados
de saúde que tem um profundo impacto no custo-eficácia e eqüidade das
intervenções. De fato, a qualidade do serviço é um elemento chave do
progresso técnico intangível que explica muitos dos avanços em saúde dos
últimos 50 anos. Embora muitos recursos apóiem melhorias na qualidade, essas melhorias são possíveis mesmo com poucos recursos.
Serviço de qualidade deficiente é endêmico em muitos sistemas de
saúde, seja em países de renda baixa, média ou alta. Em um estudo sobre
atendimento pediátrico em Papua Nova Guiné, somente 24% dos profissionais da saúde foram capazes de indicar o tratamento correto para
malária, e os encontros clínicos observados por investigadores atenderam
a critérios mínimos de exame em somente 1% dos casos. No Paquistão,
somente 56% dos prestadores de serviços demonstraram estar aptos a
diagnosticar diarréia viral e somente 35% aderiram aos padrões de tratamento. Na Indonésia, um estudo atribuiu 60% das mortes infantis às
práticas precárias dos serviços de saúde, comparados ao 37% atribuídos às
restrições econômicas. Nos Estados Unidos, o Instituto de Medicina documentou graves falhas no atendimento médico que correspondem a
mais de 40.000 mortes ao ano, incluindo vários erros de diagnóstico, casos
de mau atendimento, e erros nocivos na prestação de cuidados de saúde.
O problema da má qualidade do atendimento médico não é culpa
exclusiva dos profissionais de saúde, tampouco deve ser atribuído exclusivamente aos recursos limitados. Na verdade, os problemas de qualidade
são sistemáticos e são conseqüências de lacunas no conhecimento e na
comunicação, treinamento, supervisão e incentivos inadequados. Esses
problemas persistem quando as organizações que fornecem o atendimento de saúde são incapazes de monitorar a qualidade do atendimento e de
tomar medidas corretivas. Às vezes, essas falhas estão relacionadas a
incentivos que encorajam o atendimento inadequado, como é o caso de
determinados prestadores de serviços de saúde que têm como importante
fonte de renda a administração de medicamentos. Outras vezes, a má
qualidade pode não estar relacionada a incentivos, mas ser meramente o
reflexo de práticas que não se baseiam em provas atuais. Para corrigir esse
problema é necessário avaliar os resultados de saúde e relacioná-los à
prática clínica de modo que os problemas possam ser identificados e as
estratégias para correção possam ser implementadas. Nos países de renda
média e baixa esta é, de certa forma, uma descoberta otimista. De modo
“No Paquistão, somente
56% dos prestadores de
serviços demonstraram
estar aptos a diagnosticar
diarréia viral e somente
35% aderiram aos
padrões de tratamento.”
. . .problemas de qualidade são sistêmicos . . .
conseqüências de lacunas
no conhecimento e na
comunicação, treinamento,
supervisão e incentivos
inadequados.”
. . . a qualidade pode
ser melhorada mais rapidamente do que outro
fatores que promovem uma
boa saúde como renda,
educação, nova tecnologia
ou infra-estrutura.”
2
Esta seção é baseada no DCP2, capítulos 70 e 73.
Pilares do Sistema de Saúde | 167
“Embora a avaliação dos
processos freqüentemente
seja mais difícil e
dispendiosa do que a
avaliação dos aspectos
estruturais, os processos
de modo geral estão mais
intimamente relacionados
aos resultados de saúde.”
“A remuneração baseada
em desempenho é uma
forma de induzir os
prestadores a fornecer um
atendimento de melhor
qualidade. Incentivos relativamente pequenos ... .
parecem ter efeitos
significantes no
comportamento de
prestadores de serviços
no Camboja, Haiti e
Nicarágua, assim como
nos Estados Unidos”
168 | Prioridades em Saúde|
geral, a qualidade pode ser melhorada mais rapidamente do que outro
fatores que promovem uma boa saúde como renda, educação, nova tecnologia ou infra-estrutura.
Para avaliar a qualidade dos serviços de saúde, costuma-se coletar
dados sobre os aspectos estruturais dos serviços de saúde, os processos de
prestação e dos resultados na saúde. Os aspectos estruturais que devem
melhorar a qualidade incluem a quantidade e os tipos de infra-estrutura,
equipamento, suprimentos e pessoal da área da saúde. Esses indicadores
estruturais podem ser relativamente fáceis de coletar, mas já provaram ser
prognósticos ineficazes da qualidade e dos resultados na saúde. Embora
sejam necessários bons aspectos estruturais, eles não são suficientes para
um atendimento de boa qualidade.
Os processos, em contrapartida, são os meios pelos quais o pessoal
aplica o conhecimento moderno para o diagnóstico, a prevenção e o tratamento de doenças e deficiências. A qualidade dos processos envolvidos
nos cuidados de saúde podem ser avaliados observando-se os profissionais da área para verificar se eles respondem de acordo com os protocolos
cientificamente validados durante o diagnóstico e o tratamento de
pacientes. O processo de interação entre dispensadores de cuidados e
pacientes também pode influenciar a decisão dos pacientes seguirem o
aconselhamento e os medicamentos prescritos e, assim, influenciar os
resultados de saúde. Embora a avaliação dos processos freqüentemente
seja mais difícil e dispendiosa do que a avaliação dos aspectos estruturais,
os processos de modo geral estão mais intimamente relacionados aos
resultados de saúde.
A definição do conceito de qualidade do Instituto de Medicina dos
Estados Unidos engloba os seis elementos a seguir:
•
•
•
•
•
segurança do paciente
eficácia (atendimento apropriado cientificamente comprovado)
centralização no paciente (respeito e receptividade)
conveniência (barreiras e atrasos mínimos no acesso ao atendimento)
eficiência (desperdício mínimo de equipamento, suprimentos, idéias e
energia)
• eqüidade (atendimento amplamente prestado a todos os gêneros, grupos étnicos, locais e classes socioeconômicas).
Uma série de intervenções pode afetar essas seis dimensões de atendimento de boa qualidade. Essas intervenções incluem iniciativas diretas
para identificar um atendimento apropriado e verificar se os prestadores
individuais ou grupos de prestadores estão seguindo os padrões de práticas baseados em evidências. Intervenções diretas incluíram treinamento
com feedback de colegas que observaram consultas e processos em um
ambiente de cuidados de saúde.
As políticas com o objetivo de melhorar a qualidade de serviço de
saúde também incluíram intervenções indiretas para mudar o comportamento dos prestadores alterando as condições estruturais ou incentivos
financeiros no sistema de cuidados de saúde ou em sua organização. A
remuneração baseada em desempenho é uma forma de induzir os prestadores a fornecer um atendimento de melhor qualidade. Incentivos relativamente pequenos (3 a 10% da remuneração total do prestador) parecem
ter efeitos significativos no comportamento de prestadores de serviços do
Camboja, Haiti e Nicarágua, assim como nos Estados Unidos. México e
Uganda usaram com sucesso o reconhecimento profissional com base em
desempenho sem remuneração para promover processos melhores.
Outras medidas indiretas incluem a definição de padrões legais para o
atendimento. Acreditação, recertificação periódica de conhecimento e
competência, e regulamentos administrativos podem estabelecer padrões
mínimos ao controlar o acesso à prática profissional e estabelecer
condições para a renovação da licença. Contudo, apesar de impedir que
pessoas não-qualificadas exerçam a prática, essas medidas não tiveram, de
modo geral, um impacto significativo na melhoria da qualidade do
atendimento entre aqueles autorizados a clinicar. O litígio por má prática pode induzir a um atendimento de melhor qualidade, mas incertezas e
incentivos perversos no processo judicial resultam em um mecanismo
obtuso e dispendioso para a política pública. A supervisão profissional, a
revisão de iguais e as inspeções são as melhores maneiras de obter informações sobre a qualidade de atendimento, mas são mais eficazes no
fornecimento de informações sobre processos do que na melhoria do
comportamento e da prática de fornecedores. O treinamento no uso de
diretrizes e protocolos baseados em evidências demonstra ser uma
promessa nos países de renda alta. Por exemplo, na Holanda, a implementação de diretrizes para a gestão de pacientes melhorou os resultados
de saúde de pessoas com asma e doença pulmonar obstrutiva crônica.
A educação direcionada e o treinamento profissional é a forma mais
direta de afetar a prática da medicina. Foram depositadas grandes esperanças na continuação da formação médica, mas parece que isso teve
pouco impacto nos resultados de saúde, a menos que fosse vinculada à
estratégias que incentivassem mudanças na prática com base no conhecimento recebido.
Um dos maiores desafios da política pública é melhorar a qualidade de
atendimento fornecido pelos profissionais do setor privado. Essa é uma
questão crítica em muitos países nos quais os profissionais do setor priva-
“ . . . a continuação da
formação médica . .
parece que teve pouco
impacto nos resultados de
saúde, a menos que fosse
vinculada à estratégias
que incentivassem
mudanças na prática com
base no conhecimento
recebido.”
“ . . . o custo-eficácia para
o aumento da adesão
aos bons protocolos de
tratamento da pneumonia
fica entre US$132 e
US$800 por vida salva.
Para melhorias no
tratamento correto da
diarréia com terapia de
reidratação oral, o
custo-eficácia varia entre
US$14 a US$500 por vida
salva.”
Pilares do Sistema de Saúde | 169
Box 7.5 Melhoria na qualidade reduz mortalidade maternal e
infantil no Peru
Ao reconhecer os fracassos de tentativas de treinamento anteriores para melhorar a qualidade dos serviços de saúde, o Ministério de Saúde, com o apoio da Agência de
Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos e com a participação de instituições
locais, desenvolveu um programa inovador no Peru. O programa foi implementado por
equipes multidisciplinares em aproximadamente 2.500 unidades de saúde, incluindo 88 hospitais. O programa concentrou-se em (a) padronização do atendimento, (b) garantia da
disponibilidade de suprimentos, (c) fazer melhor uso dos sistemas de informação, (d) promover ampla participação do pessoal na implementação de planos de ação locais, e (e)
avaliar a satisfação dos pacientes e solucionar queixas. A principal atividade de treinamento
mostrou como usar uma técnica participatória para solucionar problemas.
No final do programa de três anos (1996-99), a demanda de serviços de saúde havia
aumentado consideravelmente, a motivação e a satisfação dos pacientes e dos profissionais
de saúde havia melhorado e a receita coletada nas unidades havia subido. As áreas com o
programa de melhoria de qualidade experimentou uma redução de 25% nas taxas de mortalidade maternal entre 1997 e 1999, mas não houve mudança em outras áreas e a desigualdade na distribuição regional de mortalidade maternal não havia diminuído.
Fonte: Adaptado do DCP2, capítulo 65.
“. . . os investimentos em
pessoas que fornecem
serviços de saúde são
fundamentais para
alcançar o progresso
contrata doença e o
ferimento.”
170 | Prioridades em Saúde|
do respondem pela maior parte do sistema de cuidados básicos de saúde.
Por exemplo, na Índia, os profissionais de saúde do setor privado são os
primeiros a receber a maioria dos pacientes com sintomas de tuberculose,
e a menos que o setor público encontre formas de melhorar a identificação, seleção e referência de casos entre os profissionais do setor privado,
o controle da tuberculose permanecerá distante.
Os setores de saúde têm usado mudanças organizacionais para melhorar a qualidade da prestação de serviço de saúde, incluindo a adoção
dessas técnicas modernas de gerenciamento como gestão de qualidade
total, modelos de melhoria cooperativa, e ciclos de PDSA plan-do-studyact (planejar-fazer-estudar-agir) de outros setores. Quando eficazes, essas
políticas resultam em maiores taxas de coberturas, melhores padrões de
prescrição, e maior adesão às diretrizes clínicas (Box 7.5).
Medidas que melhoram a qualidade do atendimento têm custos: os
custos diretos dos recursos humanos e físicos e os custos da implementação de mudanças organizacionais. O DCP2 avalia o custo-eficácia para
melhorar a qualidade de atendimento no tratamento da pneumonia e da
diarréia. Ele conclui que o custo-eficácia para a melhoria da qualidade
depende substancialmente da distância entre a prática atual e a prática
ideal e da prevalência da doença. Quando as práticas atuais são deficientes
e a prevalência é alta, o custo-eficácia para o aumento da adesão aos bons
protocolos de tratamento da pneumonia fica entre US$132 e US$800 por
vida salva. Para melhorias no tratamento correto da diarréia com ORT, o
custo-eficácia varia entre US$14 a US$500 por vida salva. Nos outros
casos, as intervenções reduzem o custo (poupam recursos), por exemplo,
com a redução do excesso de prescrições ou com a restrição de tratamentos desnecessários (consulte, por exemplo, Box 6.4).
RECURSOS HUMANOS
O progresso técnico é quase sempre associado a novo e sofisticado equipamento, como os aparelhos de MRI (imagem de ressonância) e os scanners
CT, ou a novos medicamentos, como vacinas e anti-coagulantes, mas o
progresso técnico também é atribuído às habilidades aprimoradas para
prevenir, diagnosticar e tratar doenças e lesões.3 Desse modo, investir em
pessoas que prestam serviços de saúde é fundamental para o obter o
avanço contra doenças e lesões. Países de renda média e baixa enfrentam
determinados desafios em suas iniciativas de mobilizar e manter uma
força de trabalho qualificada no setor de saúde em todas as áreas, desde
recrutamento e treinamento até as políticas de pagamento, retenção, gratificações, motivação e implantação. A menos que os países possam
aumentar substancialmente o número de profissionais de saúde, assim
como suas habilidades, será difícil atingir as Metas de Desenvolvimento
do Milênio (MDMs) de saúde e nutrição. A redução da mortalidade
maternal e neonatal, em especial, requer melhorias substanciais na
assistência ao nascimento; o aumento da cobertura de programas de imunização requer mais pessoal; e a prevenção e tratamento da tuberculose,
HIV/AIDS, e malária também demanda quadros qualificados.
Parte do problema enfrentada pelos países de renda média e baixa é o
suprimento insuficiente de profissionais de saúde. Por exemplo, enquanto nos países de renda alta há uma média de 283 médicos por 100.000
habitantes e a média global é de 146 médicos por 100.000 habitantes, o
Peru tem 10, Papua Nova Guiné tem 7, e o Nepal tem 4, e 10 países na
África Subsaariana têm menos de 3 médicos por cada 100.000 habitantes.
Enfermeiras também são escassas. Enquanto nos países de renda alta há
uma média de 750 enfermeiras por 100.000 habitantes e a média global é
de 334, Papua Nova Guiné tem 67, Peru tem 6 e o Nepal tem 5, e 11 países na África Subsaariana têm menos de 20 enfermeiras por cada 100.000
habitantes.
Os relativamente poucos profissionais de saúde dos países de renda
média e baixa não são distribuídos uniformemente entre a população. De
3
Esta seção é baseada no DCP2, capítulos 3, 71, e 53 e 73.
Pilares do Sistema de Saúde | 171
“. . . enfermeiras podem
realizar muitas funções
nos ambientes de
atendimento básico de
forma tão segura e eficaz
quanto os médicos.”
172 | Prioridades em Saúde|
modo geral, é difícil alocar médicos, e até enfermeiras, em áreas rurais
remotas e os profissionais de saúde tendem a se concentrar nas principais
áreas urbanas. Os sistemas de saúde pública lutam para manter pessoal
qualificado diante da pressão do setor privado e para contratar profissionais por meio de agências internacionais e programas assistenciais.
Muitos profissionais da saúde emigram para países de renda alta com
remuneração e condições de trabalho melhores.
Os profissionais da saúde que permanecem em seus países usam uma
série de estratégias para enfrentar trabalhos mal remunerados e condições
de trabalho desfavoráveis. Em muitos países, o absenteísmo é um grave
problema, que ocorre de modo geral porque os profissionais de saúde
buscam outras atividades remuneradas dentro ou fora do setor de saúde.
A maioria dos médicos costumam ter dois empregos: eles recebem um
salário do setor público, mas também ganham honorários pelo trabalho
realizado no setor privado. Aqueles que têm apenas o emprego público
por vezes fazem cobranças informais e ilegais para complementar a renda
baixa. Além disso, a baixa produtividade é derivada da falta de qualificação, má supervisão, pouca educação contínua, instalações deterioradas
e falta de suprimentos médicos básicos.
Os países enfrentam esses problemas de recursos humanos de várias
maneiras, incluindo uma forma inovadora de preencher vagas, mudanças
nos incentivos financeiros e não-financeiros, e reformas organizacionais.
O DCP2 examina a grande variedade dessas reformas e avalia as próprias
intervenções e também seu grau de implementação e adaptabilidade ao
contexto.
Os países que buscam solucionar a falta de profissionais de saúde qualificados oferecendo treinamento para mais médicos e enfermeiras, algumas vezes, acham que o problema persiste devido às altas taxas de atrição.
Para desestimular os profissionais de saúde a partir para o setor privado
ou emigrar para países com melhor remuneração, alguns países alteraram
a mescla de habilidades nos programas de treinamento para reduzir a
portabilidade de títulos profissionalizantes. O treinamento pode ser adequado para determinadas necessidades de cuidados de saúde nacionais
sem necessariamente ser reconhecido internacionalmente como um programa médico aceito. Dessa forma, os países podem reduzir o risco de
perder pessoal treinado para a emigração.
Muitas inovações na gestão de recursos humanos em países de renda
baixa envolvem a criação de novas profissões de saúde, ou seja, categorias
de profissionais de saúde que realizam uma variedade de funções que
tradicionalmente foram reservadas para médicos ou enfermeiras. As associações de profissionais geralmente resistem a esse processo para proteger
seus padrões e posições, no entanto, estudos realizados em países em
desenvolvimento demonstraram que em alguns casos as enfermeiras
podem realizar muitas funções nos ambientes de atendimento básico de
forma tão segura e eficaz quanto os médicos. Como resposta direta à
migração interna e externa, o Zimbábue introduziu um novo quadro conhecido como enfermeiras para atendimento básico com menos qualificações do que enfermeiras comuns. Malawi criou a profissão de dirigentes
clínicos, que não recebem uma formação médica completa, mas ainda
assim obtêm treinamento extensivo que os capacita a realizar uma série de
procedimentos médicos, incluindo cirurgia e anestesia. Cirurgias cesarianas de emergência conduzidas por dirigentes clínicos são um pouco mais
arriscadas do que as realizadas pelos médicos, mas os riscos são substancialmente menores do que não oferecer tratamento algum. É obviamente
preferível adotar médicos qualificados onde eles possam ser contratados e
mantidos e onde possam realizar procedimentos, mas onde não existe
nenhum serviço médico, treinar e empregar profissionais de saúde menos
qualificados pode fazer uma substancial diferença.
A criação de novos tipos de profissionais de saúde é um tema comum
no DCP2. Capítulo 68 discute como serviços de emergência podem ser
estendidos para mais pessoas, solucionando uma carga substancial de
“A China teve algum
sucesso com a melhoria
do tratamento de
pacientes com tuberculose ao pagar médicos
de aldeias por cada caso
identificado e tratado . .”
Box 7.6 Pagamentos de incentivo na China
Na China, os médicos de aldeia têm um papel essencial no diagnóstico, tratamento e vigilância do paciente. Nos anos 80, a maioria trabalhava em clínicas particulares porque os planos
de seguro das comunas haviam falido e os governos locais não estavam pagando os salários.
A dependência de cobrança aos pacientes para medicamentos e serviços dificultou o fornecimento gratuito de tratamento de tuberculose, mesmo se recebessem medicamentos gratuitos.
Foi criado um plano de incentivo pelo qual os médicos de aldeia recebiam US$1 por cada
paciente inscrito no programa de tratamento, um adicional de US$2 por cada exame de esfregaço realizado no dispensário municipal para tuberculose em 2 meses após a inscrição, e
mais US$4 por cada paciente que completasse o tratamento. Um sistema de relatórios monitorou o desempenho, e a qualidade do tratamento e informações relatadas foram verificadas
por meio de visitas imprevistas e exames. O programa foi muito bem-sucedido, obtendo em 2
anos uma taxa de cura de 95% para novos casos.
Os pagamentos de incentivo também foram largamente usados na China, em hospitais e
mesmo em programas de saúde pública, e as pesquisas sugerem seus efeitos nocivos quando a capacidade para mudar o comportamento dos prestadores não é controlada. Na província de Shandong, mudanças nos sistemas de bônus para médicos hospitalares, de um sistema vinculado à quantidade de serviços prestados para um vinculado à receita gerada, revelara, que a mudança para bônus com base em receitas eram associados a um aumento
significativo na receita hospitalar, mas um estudo separado concluiu que cerca de 20% da
receita hospitalar era gerada pelo fornecimento de cuidados desnecessários.
Fonte: DCP2, capítulo 3, box 3.4.
Pilares do Sistema de Saúde | 173
“Para tratar da gestão de
recursos humanos é
necessário compreender
como ela opera em um
mercado competitivo.”
174 | Prioridades em Saúde|
trauma, ao recrutar, treinar e apoiar motoristas de ônibus e táxi. O capítulo 56 discute o papel que os profissionais de saúde comunitários podem
exercer no monitoramento do crescimento de crianças e fornecimento de
educação nutricional e na seleção e referência de muitas condições
comuns. O capítulo 26 discute a necessidade de parteiras qualificadas sem
diploma de medicina. Em alguns lugares, dispensar atenção para as habilidades e métodos técnicos que são mais necessários do que o título de
profissional de saúde pode significar a diferença entre prestar ou não um
serviço.
Os países também fizeram mudanças nos incentivos financeiros e nãofinanceiros. Salários mais altos costumam ser onerosos, uma vez que o
gasto com folha de pagamento é responsável por 50 a 80% dos custos
recorrentes, mas quando os incentivos financeiros visam metas específicas, eles podem ser eficazes. Por exemplo, a Tailândia melhorou a
prestação de serviços nas áreas rurais quando passou a pagar bônus para
médicos dispostos a trabalhar em locais mais remotos e oferecendo incentivos não-financeiros, incluindo relações contratuais diferentes, habitação,
revisão de iguais e reconhecimento profissional.
Outras iniciativas incluíram o aumento de salários com base no
desempenho. Algumas delas envolvem reformas na administração pública nas quais revisões periódicas do desempenho dão início a aumentos
salariais ou bônus. Em outros casos, pagamentos diretos estão ligados aos
números de serviços fornecidos ou à realização de metas de desempenho.
A China teve algum sucesso com a melhoria do tratamento de pacientes
com tuberculose ao pagar médicos de aldeias por cada caso identificado e
tratado (Box 7.6). Em outros casos, o pagamento vinculado ao desempenho pode na verdade ser prejudicial. Por exemplo, os incentivos geram
receita adicional em hospitais na província de Shandong obtidos, em
parte, pelo fornecimento de cuidados desnecessários.
Incentivos não-financeiros podem ser tão eficazes quanto incentivos
financeiros na alteração do comportamento do pessoal. Esses incentivos
incluem proporcionar aos profissionais produtivos acesso a treinamento
especial e oportunidades de promoção, reconhecer publicamente um bom
desempenho, conceder bônus para com o objetivo de melhorar as
condições locais de trabalho, delegar responsabilidades, e fornecer educação e habitação para dependentes.
Muitos países usaram reformas organizacionais para alterar toda a
estrutura na qual recrutam e empregam recursos humanos. Descentralizar
funções de saúde para governos locais é uma importante tendência mundial. É quase sempre introduzida como uma reforma política geral na qual o
setor de saúde, como outros setores de serviço público, precisa encontrar
uma acomodação. A descentralização pode exacerbar problemas de remu-
neração e retenção de profissionais de saúde, a menos que uma atribuição
adequada de receitas acompanhe a atribuição de responsabilidades para
governos locais. Os países também iniciaram amplas reformas administrativas para melhorar os salários, a supervisão e a retenção de profissionais
do setor público. Infelizmente, pesquisas têm mostrado que poucas reformas de serviço administrativo dessa natureza resultaram em melhorias
decisivas. Iniciativas em Uganda e Zâmbia para separar profissionais de
saúde do serviço administrativo geral encontraram resistência política
substancial e não foram implementadas.
Finalmente, muitos governos estão contratando serviços de saúde de
ONGs ou de prestadoras privadas. Algumas dessas iniciativas tiveram bastante sucesso, resultando em melhor cobertura e qualidade de serviços. A
África do Sul teve uma experiência bem-sucedida ao contratar a gestão de
vários hospitais para uma empresa privada, e o Camboja usou com sucesso contratos de desempenho com ONGs para prestar serviços de saúde
básicos. Em outros casos, contudo, os mesmos pontos fracos da administração pública na supervisão dos profissionais de saúde pública foram
simplesmente transferidos para os pontos francos na supervisão de contratos, deixando para as ONGs ou prestadoras privadas a função de
absorver recursos sem cumprir suas responsabilidades.
Os modelos tradicionais de planejamento de recursos humanos tendiam a ser mecânicas, supondo que pessoas treinadas como médicos e
enfermeiras poderiam ser facilmente empregadas em qualquer lugar onde
fossem necessárias. Esses modelos ignoraram uma grande variedade de
oportunidades disponíveis para profissionais de saúde em seus próprios
países assim como no exterior. Para tratar da gestão de recursos humanos
é necessário compreender como ela opera em um mercado competitivo.
Os profissionais de saúde continuam a ser motivados por sua vocação,
mas também são influenciados por iniciativas financeiras e não-financeiras, condições de trabalho, e acesso a oportunidades de desenvolvimento profissional. Os acordos inavodores com pessoal prometem atender algumas das necessidades de profissionais de saúde treinados.
Experimentos em gestão de pessoal e reforma organizacional pode resultar em formas mais eficazes de recrutar, conservar e empregar profissionais de saúde no futuro.
“ . . . mobilizar fundos
para financiar intervenções
na saúde pública é difícil
porque alguns cuidados de
saúde são caros e porque
não é fácil aumentar
receitas em países de
renda média e baixa.”
“. . . considerando que o
seguro de saúde financia
uma parcela substancial
das despesas com saúde
privada em países de renda
alta, essas despesas são
predominantemente gastos
FINANCIAMENTO
do bolso do paciente em
O financiamento é mais um importante desafio enfrentado por países de
renda média e baixa .4 Trata-se de um duplo desafio: mobilizar fundos
países de renda baixa”
4
Esta seção é baseada no DCP2, capítulos 11, 12 e 13.
Pilares do Sistema de Saúde | 175
“As receitas fiscais
respondem por 14,5% do
PIB nos países de renda
baixa, comparados aos
26,5% dos países de
renda alta.”
“. . . o financiamento
público é um recurso
essencial para o sucesso
de boa parte, se não de
toda, saúde pública do
mundo inteiro.”
176 | Prioridades em Saúde|
suficientes para operar o sistema de saúde e aplicar bem esses fundos.
Contudo, mobilizar fundos para financiar intervenções na saúde pública
é difícil porque alguns cuidados de saúde são caros e porque não é fácil
aumentar receitas em países de renda média e baixa.
Financiar despesas de saúde é caro. Em 2001, o mundo gastou cerca de
US$3 trilhões em saúde, mas essa quantia não foi distribuída igualmente.
Somente 12% do total foi gasto com a população dos países de renda
média e baixa, apesar de responderem por 84% da população mundial e
por 92% da carga de doenças. Os países de renda baixa gastaram aproximadamente US$25 per capita em 2001, enquanto os países de renda
média gastaram uma média de US$176 per capita e os países de renda alta
uma média de US$1.527 per capita, mas esses valores são apenas médias.
Os países mais pobres do mundo, como Etiópia e Nepal, gastaram a
menor quantia em saúde, cerca de US$2 ou US$3 per capita, na melhor
das hipóteses, enquanto o Canadá, Japão, Estados Unidos e Europa
Ocidental gastam entre US$2.000 e US$5.000 per capita.
O gasto em saúde está fortemente correlacionado à renda nacional. Os
países mais ricos não somente gastam mais em saúde, mas também
investem uma proporção maior da renda nacional em saúde. Portanto, em
média, os países da África Subsaariana gastam cerca de 4,5% da renda
nacional em saúde comparados aos gastos médios de 7,7% investidos pelos
países de renda alta. Além disso, os países mais ricos financiam uma parcela
maior da despesa em saúde por meio de mecanismos públicos. As receitas
fiscais e os prêmios de seguro de saúde respondem por 70% das despesas
com saúde nos países de renda alta, mas são responsáveis por uma média de
50% das despesas com saúde dos países de renda baixa. Além disso, considerando que o seguro de saúde financia uma parcela substancial das
despesas com saúde privada em países de renda alta, essas despesas são predominantemente gastos do bolso do paciente em países de renda baixa.
É difícil levantar receitas para aumentar o gasto público em saúde nos
países de renda média e baixa. As receitas fiscais respondem por 14,5% do
PIB nos países de renda baixa, comparados aos 26,5% dos países de renda
alta. Os impostos sobre folha de pagamento do setor de saúde e os benefícios de aposentadoria, ou seja, as contribuições para previdência social
são ainda mais restritas nos países de renda baixa porque a parcela de
empregos formais tende a ser pequena. As contribuições para previdência
social representam menos de 1% do PIB nos países de renda baixa, mas
somam 7,2% nos países de renda alta.
Os impostos sobre a venda de determinados produtos básicos, como
álcool e tabaco, podem ser vistos tanto como intervenções na saúde quanto como fontes de receitas. O DCP2 mostra que subir o preço do álcool e
do tabaco é uma medida altamente custo-efetiva para desistimular o consumo excessivo e, conseqüentemente, reduzir a carga de doenças associada a esse tipo de comportamento. Além disso, os impostos sobre álcool e
tabaco podem gerar receitas para o governo. Alguns países destinam esses
impostos para campanhas de saúde com o objetivo de encorajar as pessoas a pararem de fumar ou a consumir ácool com moderação.
O financiamento público tem um papel importante em serviços de
saúde, especialmente nos países de renda alta, e mesmo nos Estados
Unidos, onde o seguro de saúde pública para os idosos (Medicare), para
os mais pobre (Medicaid), e para os militares (Veterans Administration)
responde por mais da metade de todas as despesas com saúde. Há uma
forte razão para o financiamento público da saúde. Os economistas comprovaram que o mercado de serviços de saúde não funciona bem se deixado por conta própria. Por exemplo, os consumidores não podem
pesquisar os melhores e mais baratos serviços de saúde como o fazem
quando procurar outros tipos de serviços. Além disso, é pouco provável
que os mercados privados aloquem recursos suficientes para medidas preventivas que tenham um grande efeito no status de saúde coletiva de uma
população, como vacinação de crianças ou controle de riscos ambientais.
O financiamento público também proporciona à sociedade uma ferramenta política que pode ser usada para criar incentivos para melhorar a
qualidade dos serviços de saúde, conter custos, corrigir desigualdades ou
ampliar o acesso. Notavelmente, o financiamento público é um recurso
essencial para o sucesso de boa parte, se não de toda, saúde pública do
mundo inteiro (consulte o capítulo 2 neste volume e o capítulo 8 do DCP2).
O envolvimento público em cuidados de saúde não é uma panacéia,
mas é a principal forma escolhida por muitos países para lidar com cuidados de saúde, e o DCP2 argumenta que o recurso público deve financiar
pelo menos alguns serviços de saúde em todos os países.
Nos países de renda média e baixa, onde a despesa pública é baixa, o
acesso à saúde geralmente depende da condição financeira das famílias.
Isso ocorre quando se busca tratamento não apenas em prestadoras de
serviços privados, mas também, em muitos casos, em prestadoras de
serviços públicos. Os serviços de saúde pública costumam cobrar taxas
para recuperar uma parte de seus custos, mas mesmo nos sistemas onde
os serviços públicos são ostensivamente gratuitos, os pacientes e suas
famílias podem ser coagidos a pagar informalmente para obter acesso a
serviços ou podem ser solicitados a fornecer a própria alimentação, roupa
de cama e até mesmo medicamentos.
O DCP2 não pode concluir o debate sobre a cobrança de serviços de
saúde nos países de renda média e baixa. Alguns capítulos argumentam
“. . . onde os serviços
públicos são ostensivamente gratuitos, os
pacientes e suas famílias
podem ser coagidos a
pagar informalmente para
obter acesso a serviços, ou
podem ser solicitados a
fornecer a própria alimentação, roupa de cama e até
mesmo medicamentos.”
“... o fornecimento de
uma cesta de serviços de
saúde que fizesse uma
diferença substancial para
a saúde da população,
custa entre US$12 e
US$50 per capita ao ano.”
Pilares do Sistema de Saúde | 177
“Nos países de baixa
renda, a assistência para
o desenvolvimento do
setor saúde foi responsável por uma média de
20% de todas as despesas
com saúde comparadas
aos cerca de 3% dos
países de renda média.”
178 | Prioridades em Saúde|
que as conseqüências negativas de se desencorajar as pessoas a obter tratamento compensam os benefícios de aumentar as receitas por meio de
impostos. Alguns capítulos até mesmo justificam os preços negativos, ou
seja, pagar as pessoas para incentivá-las a obter tratamento ou cuidado
preventivo e indicam vários casos de sucesso. Por exemplo, no Tajikistão,
os pacientes pobres com tuberculose recebem suplementos alimentares se
seguirem o tratamento completo, resultando em uma maior adesão. Em
outro programa de sucesso no México, o governo paga um subsídio para
as famílias pobres desde que levem os filhos para vacinação e exames regulares nas clínicas, e garantam a freqüência das crianças à escola.
Contudo, esses pagamentos também têm um impacto na produtividade
dos serviços de saúde nesses lugares onde eles funcionam para garantir a
disponibilidade de medicamentos ou para reduzir o absenteísmo, e nesses casos pode ajudar a sustentar serviços usados pelos pobres. Além de
tudo, o DCP2 assume uma postura pragmática, encorajando os países a
eliminar as barreiras financeiras ao atendimento médico onde for possível e a garantir que quando forem cobradas taxas, elas melhorem
comprovadamente a produtividade e a qualidade dos cuidados de saúde
disponível para a população de baixa renda.
As receitas do DCP2 para o financiamento do setor de saúde variam
consideravelmente entre países de renda média e baixa. Nos países de
renda baixa, os níveis absolutos de renda e receitas fiscais restringem severamente as possibilidades de um financiamento adequado e cuidados
de saúde universal. Na década passada, vários estudos estimaram os
custos do fornecimento de saúde básica. Esses exercícios estimaram que o
fornecimento de uma cesta de serviços de saúde que fizesse uma diferença
substancial para a saúde da população custa entre US$12 e US$50 per
capita ao ano. Embora essas somas estejam ao alcance da maior parte dos
países de renda média, elas não são viáveis nos países de renda baixa sem
uma boa dose de assistência externa.
Portanto, o problema enfrentado pelos países de renda baixa é multifacetado. Por um lado, eles precisam aumentar as receitas domésticas,
uma abordagem que pode no máximo gerar um adicional de 1 ou 2% do
PIB. Por outro lado, os países de renda baixa precisam usar os recursos
que têm de fontes nacionais e estrangeiras da forma mais eficiente possível. É essa última estratégia—derivando o maior ganho em saúde da
novas e atuais despesas com saúde— que motivou o Projeto “Prioridades
do Controle de Doenças”.
Nos países de renda média, os problemas de financiamento são diferentes e os recursos econômicos e institucionais para solucioná-los são
mais sólidos. Os países de renda média podem financiar boa parte das
despesas do setor de saúde com fontes nacionais, mas eles enfrentam uma
série de opções para moldar a estrutura do financiamento em saúde, com
importantes implicações na eqüidade e produtividade. As opções de diferentes mecanismos de financiamento também têm importantes implicações para aqueles que arcam com os custos da saúde: a população toda
pode dividir os custos, fornecendo assim um seguro eficaz para aqueles
que tiverem a falta de sorte de adoecer, ou isso pode recair severamene
sobre aqueles que estão doentes.
Alguns países estão escolhendo financiar serviços de saúde com
receitas fiscais gerais, enquanto outros estão dependendo dos impostos
sobre folha de pagamento e de esquemas de seguro social. Os países de
renda média usam, em geral, as duas abordagens para diferentes grupos
da população. As iniciativas para promover a cobertura do seguro de
saúde por meio de esquemas voluntários também estão em andamento.
Há fortes argumentos em favor da fusão do risco financeiro associado ao
pagamento pelo serviço de saúde entre o maior número de habitantes
possível, pagando efetivamente pelo serviço de saúde da população de
baixa renda e de doentes com impostos e prêmios pagos por aquelas pessoas mais saudáveis e mais ricas. O capítulo 12 do DCP2 avalia essas diferentes abordagens.
A assistência externa para o desenvolvimento tem uma função muito
mais importante na política de saúde dos países de renda baixa do que nos
países de renda média. Nos países de renda baixa, a assistência para o
desenvolvimento do setor de saúde foi responsável por uma média de
20% de todas as despesas gastas em saúde, comparados aos cerca de 3%
dos países de renda média. Em 13 países da África Subsaariana, o financiamento externo representou mais de 30% de toda as despesas gastas em
saúde. Em termos gerais, a assistência para o desenvolvimento declinou
nos anos 90 e representou somente 0,25% da renda nacional bruta dos
países mais ricos do mundo, apesar de seus compromissos públicos de
contribuír com 0,70% da renda total para a assistência internacional para
o desenvolvimento.
Apesar da tendência mundial, a assistência para o desenvolvimento do
setor de saúde aumentou durante a última década, embora ainda seja
muito baixa para atingir as metas internacionais de saúde. A ajuda internacional para saúde cresceu de US$6,7 bilhões em 1997-99 para US$9,3
bilhões em 2002. Isso inclui fundos de organismos bilaterais de desenvolvimento e bancos multilaterais de desenvolvimento, mas também cada
vez mais de fundações privadas, como a Fundação Bill & Melinda Gates, e
de novas iniciativas globais, como o Fundo Global de Combate à AIDS,
Tuberculose e Malária e a GAVI. Contudo, é necessário destinar anualmente de US$60 bilhões a US$70 bilhões à assistência para o desenvolvimento da saúde a fim de atender as metas de saúde das MDM, significatiPilares do Sistema de Saúde | 179
vamente mais do que os níveis atuais. Como ocorre com os recursos
nacionais, boa parte do debate sobre assistência internacional para o
desenvolvimento diz respeito a como torná-la eficaz. O DCP2 analisa uma
série de iniciativas com o objetivo de tornar a assistência para o desenvolvimento mais eficaz ao redirecioná-la para medidas custo-eficientes,
mas também pela redução dos custos de transação, melhoria da coordenação e aumento da adesão dos países. Algumas das inovações mais
promissoras envolvem programas baseados em desempenho que desembolsam fundos mediante resultados, como o de atingir metas de cobertura
de imunização. Outras iniciativas envolveram governos de países anfitriões
com organismos internacionais e acionistas internos no desenvolvimento
e realização de planos setoriais coordenados vinculados à redução de
pobreza e metas de melhores condições de saúde. Os novos fundos criados pelas iniciativas globais deram especial atenção a determinadas
doenças e desafios dos países de renda baixa. A ação global também está
sendo assumida para incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de vacinas
e medicamentos não apenas por meio de financiamento direto, mas também pelo estabelecimento de compromissos de compra antecipada.
As decisões sobre como financiar os cuidados de saúde exercem forte
influência na forma como o sistema de saúde funcionará em qualquer país,
mas os países de renda média e baixa podem aproveitar mais os fundos
com a alocação de recursos para intervenções custo-eficientes e com a
mobilização de fundos adicionais para apoiar melhorias no setor de saúde.
Para que os países de renda baixa superem os desafios atuais da saúde será
necessário que os países mais ricos cumpram seus compromissos de
aumentar a assistência internacional para o desenvolvimento da saúde,
exatamente como se exige dos países de renda baixa que enfrentem o
desafio de absorver esses fundos de modo a empregá-los para melhorar
efetivamente a saúde de suas populações.
180 | Prioridades em Saúde|
Capítulo 8
O caminho à frente:
um plano de ação
É necessário um grande progresso na área de saúde, e esse grande progresso é possível. O DCP2 relata grandes sucessos que foram obtidos em
saúde humana no decorrer do século passado. As intervenções na saúde
pública reduziram a mortalidade infantil, preveniram epidemias e
trataram doenças crônicas. Com estudos que examinam as tendências
históricas até aqueles que analisam casos específicos, o DCP2 deixa claro
que essas conquistas são principalmente uma conseqüência do progresso
técnico, compreendido de modo amplo para incluir não somente as intervenções médicas inovadoras, mas também as iniciativas em saúde pública, as melhorias na organização e no financiamento da prestação de
serviços, além de mudanças benéficas em outros setores. Esperar pelo
crescimento econômico para melhorar a saúde seria um erro, tendo em
vista tudo o que pode ser obtido com o desenvolvimento e a aplicação do
conhecimento.
A valorização dos sucessos passados, contudo, não deve impedir o
reconhecimento da extensão e da gravidade dos desafios que ainda estão
por vir. Muitos desses desafios envolvem doenças infecciosas que estão
concentradas de modo desproporcional entre os pobres. O HIV/AIDS é
proeminente devido à ruptura social que causou em países com maior
prevalência e à necessidade urgente de diversos tipos de ações para prevenção e tratamento da doença. A carga de doença da malária continua
alta, apesar das décadas de trabalho para reduzi-la, e a emergência dos
parasitas resistentes às drogas torna o controle de doenças infecciosas
como a malária e a tuberculose uma meta sempre em movimento.
Alguns desafios chamam a atenção diretamente para a fragilidade dos
sistemas de saúde. O DCP2 indica que a lacuna entre os países de alta e
baixa renda em relação ao risco de morte durante o parto é de 500 para 1
— o maior contraste entre todos os indicadores de saúde — e a redução
181
“Os países de renda
média e baixa também
podem prever o . . .
aumento da mortalidade
por acidentes de trânsito
ou contaminantes
ambientais, e precisam
adotar ações custoefetivas hoje para evitar
mortes desnecessárias
amanhã.”
da mortalidade materna exige a disponibilidade de uma série de serviços
conexos para abordar os fatores de risco e as complicações. O desafio de
reduzir a mortalidade infantil, principalmente durante o período neonatal, também depende muito da ação pública para garantir que uma gama
de serviços básicos de saúde de qualidade estejam disponíveis para todos.
Os países desenvolvidos e em desenvolvimento compartilham grande
parte da carga de doenças não transmissíveis, como a alta carga de
doenças cardiovasculares e diabetes. A resposta para os desafios exige
esforços de colaboração para conhecer as melhores formas de prevenir e
tratar essas doenças. Os países de renda média e baixa também podem
prever as tendências que os países de alta renda já experimentaram, como
o aumento da mortalidade por acidente de trânsito ou contaminantes
ambientais, e precisam adotar ações custo-efetivas hoje para evitar mortes
desnecessárias amanhã.
Finalmente, a aplicação desigual de conhecimentos e recursos resulta
em hiatos de saúde injustificáveis entre ricos e pobres, seja dentro ou entre
países. Garantir que os benefícios do progresso técnico e científico sejam
compartilhados com rapidez e eficácia em uma escala global talvez seja o
maior desafio de todos.
Embora a seleção e o desenho das intervenções não seja algo que possa
ser caracterizado em um único plano universal, algumas características
comuns surgem do DCP2:
•
“. . . são necessários
mais recursos para
•
intervenções em saúde
•
em países de baixa
•
renda a fim de reduzir
•
as desigualdades
notórias.”
182 | Prioridades em Saúde|
•
Garantir que as intervenções custo-efetivas para tratamento das principais cargas de doenças sejam fornecidas e estejam disponíveis para
todos é a única forma de preencher a lacuna de saúde entre os que têm
e os que não têm.
Ter o financiamento público adequado é um ingrediente crítico para
intervenções de saúde pública bem-sucedidas.
A redução das grandes lacunas existentes na área de saúde exige
assistência técnica e financeira internacional maior e mais efetiva.
A melhoria da saúde geralmente exige colaboração com outros setores,
como transporte, educação, agricultura, execução das leis e financeiro.
O fortalecimento dos sistemas de saúde multiplica o efeito dos gastos,
aumentando o custo-eficácia das intervenções na saúde e permitindo
uma maior integração dos serviços.
É necessário ampliar o conhecimento em ciências básicas, ciências aplicadas e gerencial para o descobrimento e desenvolvimento de produtos
que alimentarão o progresso no futuro.
Portanto, a pesquisa e a análise do DCP2 gera duas mensagens principais. Em primeiro lugar, são necessários mais recursos para intervenções
de saúde mais eficazes nos países de baixa renda afim de reduzir as
desigualdades notórias. Com mais recursos, as intervenções com alto
custo-eficácia que melhoram a saúde, como vacinas básicas, medicamentos para desparatização e terapia de reidratação oral (ORT), podem ser
levadas aos lugares que ainda são carentes delas. Com mais recursos, a
cobertura dos serviços básicos de saúde pode ser ampliada e se tornar
mais eqüitativa. Também podem ser canalizados mais recursos para a
pesquisa, com prioridade para doenças para as quais ainda não existem
intervenções custo-efetivas disponíveis e obstáculos para a prestação efetiva de serviços de saúde onde as instituições existentes estão falhando.
A segunda mensagem é que poderia ser feito muito mais para melhorar a saúde com os recursos existentes se houvesse uma maior aplicação
do conhecimento de intervenções custo-efetivas. O DCP2 mostra que os
recursos atuais podem gerar ganhos substanciais na saúde quando o conhecimento de intervenções custo-efetivas é posto em prática. Os recursos
são desperdiçados quando são selecionadas as intervenções incorretas ou
quando o atendimento de má qualidade é aceito como norma. Com a
documentação da escala da carga de doenças, do custo-eficácia das diversas intervenções e das soluções práticas disponíveis para garantir a implementação, o DCP2 fornece planos para uma melhor atuação, mesmo em
circunstâncias adversas.
A aplicação das informações, análises e estratégias mostradas no DCP2
exige uma avaliação cuidadosa da situação local, incluindo padrões de
doença, capacidade institucional e recursos. Com a combinação das percepções do DCP2 com o conhecimento da situação local, os atores de
vários níveis — desde parlamentares e ministros da saúde até administradores de hospitais, agentes de saúde e cidadãos envolvidos —
poderão definir prioridades, selecionar as intervenções adequadas,
identificar melhores meios de fornecimento, melhorar a gestão e
mobilizar os recursos de modo mais eficaz. Desse modo, os benefícios
do progresso técnico na melhoria da saúde podem ser ampliados e
compartilhados por todos.
“muito mais para melhorar
a saúde com os recursos
existentes se houvesse
uma maior aplicação do
conhecimento de
intervenções custoefetivas.”
O caminho à frente: um plano de ação | 183
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Sobre os Editores
Dean T. Jamison é Catedrático de Economia da Saúde da Faculdade de
Medicina da Universidade da Califórnia, São Francisco (UCSF) e filiado
ao Global Health Sciences da UCSF. É também Acadêmico Sênior do
Ellison Institute. Dr. Jamison trabalha também como Professor Adjunto
da Guanghua School of Management da Universidade de Peking e na
School of Population Health da Universidade de Queensland.
Antes de entrar para a UCSF, Dr. Jamison fez parte do corpo docente
da Universidade da Califórnia, Los Angeles, também trabalhou vários
anos no Banco Mundial, onde foi economista sênior do Departamento de
Pesquisas, chefe da Divisão de Política de Educação e Chefe da Divisão de
População, Saúde e Nutrição. Em 1992-93 ele retornou temporariamente
ao Banco Mundial para exercer o cargo de Diretor do Escritório do
Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial e de principal autor do
Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial de 1993: Investimento em
Saúde. Tem trabalhos publicados nas áreas de teoria econômica, saúde
pública e educação. Dr. Jamison estudou em Stanford (Bacharéu em
Filosofia; Mestre em Ciências da Engenharia) e em Harvard (PhD em
Economia, sob a orientação de K.J. Arrow). Em 1994, foi eleito membro
do Instituto de Medicina da Academia Nacional de Ciências dos EUA.
Joel G. Breman, M.D., D.T.P.H., é Consultor Científico Sênior dos
Institutos Nacionais de Saúde do Fogarty International Center (FIC) e
Co-Editor Gestor do Projeto de Prioridades no Controle de Doenças
[Same question as for Dean—it’s all over this book that Joel is one of
the editors]. Estudou na Universidade da Califórnia, Los Angeles
(USCLA), na Keck School of Medicine, da University of Southern
California e na London School of Hygiene and Tropical Medicine. O
Dr. Breman foi residente de medicina no County Medical Center da
189
UCLA de doenças infecciosas no Boston City Hospital da Harvard
Medical School; e de epidemiologia nos Centros de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC). Trabalhou na erradicação da varíola
na Guiné (1967-69); em Burkina-Fasso, na Organização para
Coordenação e Cooperação no Controle de Importantes Doenças
Endêmicas (1972-76); e na Organização Mundial de Saúde, em
Genebra (1977-80), onde foi responsável pela pesquisa e certificação
da erradicação do orthopoxvirus.
Em 1976, na República Democrática do Congo (antigo Zaire), o Dr.
Breman investigou o primeiro surto da febre hemorrágica Ebola. Após a
confirmação da erradicação da varíola em 1980, retornou ao CDC, onde
começou a trabalhar com epidemiologia e controle da malária. Em 1995,
entrou para o FIC onde é Diretor do Programa Internacional de
Treinamento e Pesquisa em Doenças Infecciosas Emergentes e Consultor
Científico Sênior. É membro de vários grupos de consultoria, exercendo,
inclusive, os cargos de Presidente do Grupo de Consultoria Técnica sobre
a Manifestação Humana do Vírus da Varíola do Macaco e membro da
Comissão Internacional da OMS para a Certificação da Erradicação da
Dracunculiasis (verme da guiné). O Dr. Breman tem mais de 100 trabalhos publicados sobre doenças infecciosas e fortalecimento da capacidade
de pesquisa nos países em desenvolvimento. Foi editor convidado de dois
suplementos do American Journal of Tropical Medicine and Hygiene: The
Intolerable Burden of Malaria: A New Look at the Numbers (A intolerável
carga da malária: uma nova avaliação dos números) (2001) e The
Intolerable Burden of Malaria: What ’s New, What ’s Needed (A intolerável
carga da malária: o que há de novo e o que é necessário) (2004).
Dr. Anthony Measham é Co-Editor-Chefe do Projeto de Prioridades no
Controle de Doenças do Fogarty International Center dos Institutos
Nacionais de Saúde dos EUA[Same question as for Dean and Joel]; ViceDiretor do Projeto de Comunicação das Prioridades em Saúde do
Population Reference Bureau, Washington, D.C.; e membro do grupo de
trabalho da Global Alliance on Vaccines and Immunization (GAVI) como
representante do Banco Mundial.
Natural do Reino Unido, o Dr. Measham foi médico de família em
Dartmouth, Nova Escócia, Canadá, antes de dedicar sua carreira até hoje
à saúde mundial. Morou 15 anos em países em desenvolvimento como
representante do Population Council (na Colômbia), da Ford Foundation
(em Bangladesh) e do Banco Mundial (Índia). No início de sua carreira
internacional em saúde, foi Vice-Diretor do Center for Population and
190 | Sobre os Editores
Family Health na Universidade de Columbia, Nova Iorque, de 1975 a
1977. Trabalhou depois por 17 anos na equipe do Banco Mundial como
Consultor em Saúde, de 1984-1988 e como Chefe de Política e Pesquisa da
Divisão de Nutrição e População do Banco Mundial de 1988-1993.
O Dr. Measham passou a maior parte de sua carreira prestando
assistência técnica, desenvolvendo pesquisa e análise e ajudando a desenvolver projetos em mais de 20 países em desenvolvimento, principalmente
nas áreas de saúde materno-infantil e planejamento familiar e nutrição.
Foi um dos editores da 1a edição do Disease Control Priorities in
Developing Countries (1993) e é autor de cerca de 60 monografias, capítulos de livros e artigos de jornal.
Dr. Measham graduou-se em Medicina pela Dalhousie University, em
Halifax, Nova Escócia, Canadá. Obteve os títulos de Mestre e Doutor em
Saúde Pública pela University of North Carolina, em Chapel Hill e é
diplomata do American Board of Preventive Medicine and Public Health.
Seus títulos incluem a eleição para o Alpha Omega Alpha Honor Medical
Society; indicação para Professor Especial de Saúde Internacional da
Faculdade de Medicina da University of Nottingham, Nottingham, Reino
Unido; e escolha como Ex-Aluno de Medicina do Ano da Dalhousie
University no período 2000-01.
Sir George Alleyne, M.D., F.R.C.P., F.A.C.P. membro do Royal College of
Physicians] F.A.C.P. (Hon) [membro honorário do American College of
Physicians], DSc (Hon) [Doutor em Ciências honoris causa], é Diretor
Emérito da Organização Pan-americana de Saúde (PAHO) onde foi
Diretor de 1995 a 2003. Dr. Alleyne nasceu em Barbados e formou-se em
Medicina pela University of the West Indies (UWI) em 1957. Fez curso de
pós-graduação em medicina interna no Reino Unido e realizou outros
trabalhos de pós-graduação naquele país e nos Estados Unidos. Ingressou
na medicina acadêmica na UWI em 1962 e sua carreira incluiu pesquisa
no Tropical Metabolism Research Unit para seu Doutorado em Medicina.
Em 1972 foi nomeado Professor de Medicina da UWI e quatro anos mais
tarde tornou-se Chefe do Departamento de Medicina. É Professor
Emérito da UWI. Ingressou na Organização Pan-Americana da Saúde
(OPAS) em 1981; em 1983 foi indicado Diretor da Área de Programas de
Saúde; em 1990 foi Diretor Assistente.
As publicações científicas do Dr. Alleyne estão relacionadas a sua
pesquisa em fisiologia renal e bioquímica e a vários aspectos da medicina
clínica. Durante seu período como Diretor ele vem trabalhando e publicando trabalhos sobre questões como equidade em saúde, saúde e desenSobre os Editores | 191
volvimento e a base da cooperação internacional em saúde. Tem tratado
também de diversos aspectos da saúde no Caribe e dos problemas
enfrentados. É membro do Instituto de Medicina e Chanceler da
University of the West Indies.
O Dr Alleyne já recebeu inúmeros prêmios em reconhecimento por seu
trabalho, inclusive condecorações e honras nacionais de muitos países das
Américas. Em 1990, recebeu o título de Cavaleiro de Sua Majestade a
Rainha Elizabeth II por seus serviços prestados à Medicina. Em 2001, foi
condecorado com a Ordem da Comunidade do Caribe, o maior tributo
que se pode conferir a uma pessoa nascida no Caribe.
Mariam Claeson, M.D., M.P.H., é Cordenadora do Programa de AIDS
para a Região do Sul da Ásia do Banco Mundial desde janeiro de 2005. Foi
Especialista-Chefe em Saúde Pública da Divisão de Saúde, Nutrição e
População (SNP) da Rede de Desenvolvimento Humano do Banco
Mundial (1998-2004), gerenciando o programa de trabalho das Metas de
Desenvolvimento do Milênio em SNP para apoiar a agilização do progresso nos países, inclusive a secretaria conjunta Banco Mundial/OMS
para o Fórum de Alto Nível sobre as MDMs relacionadas à Saúde. Foi coautora do apelo à ação do grupo de estudo de Bellagio sobre sobrevivência infantil em 2003: Knowledge into Action for Child Survival
(Conhecimento em ação para a sobrevivência infantil) e do relatório do
Banco Mundial sobre as Metas de Desenvolvimento do Milênio na Saúde:
Fazendo Frente aos Desafios (2005). Foi membro do What Works?
Working Group (Grupo de trabalho “O que funciona?”) patrocinado pelo
Center for Global Development que deu origem ao relatório Millions Saved:
Proven Successes in Global Health (Milhões salvos: êxitos comprovados em
saúde global) (2005).
A Dra. Cleason é co-autora do capítulo sobre saúde do livro de referência da Estratégia de Redução da Pobreza, promovendo uma abordagem
de ciclo de vida para a saúde materno-infantil e nutrição. Como coordenadora do grupo temático sobre Saúde Pública (1998-2002) liderou o
desenvolvimento da nota sobre estratégia: Saúde Pública e Operações do
Banco Mundial e promoveu abordagens multissetoriais de saúde infantil
no Banco Mundial e em operações apoiadas pelo Banco Mundial em países, trabalho analítico e operações de concessão de empréstimos.
Antes de entrar para o Banco Mundial, Mariam Claeson trabalhou na
OMS de 1987 a 1995. Nos últimos anos foi gerente de programa do
Programa Mundial da OMS para o Controle de Doenças Diarréicas
192 | Sobre os Editores
(CDD). Possui vários anos de experiência de campo, trabalhando na
prática clínica em municípios das áreas rurais de países em desenvolvimento (na Tanzânia, Bangladesh e Butão); na gerência do programa
nacional de imunização e controle de doenças diarréicas (Etiópia 198486); e em projetos de desenvolvimento do setor de saúde em países de
renda média e baixa.
David B. Evans é especializado em economia. Entre 1980 e 1990 foi
acadêmico, primeiro em departamentos de economia e depois numa faculdade de medicina, período em que prestou consultoria para o Banco
Mundial, OMS e para o governo. De 1990-98 patrocinou e realizou
pesquisa nos aspectos sociais e econômicos das doenças tropicais e seu
controle no Programa Especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças
Tropicais do UNICEF/PNUD/Banco Mundial/OMS. Posteriormente foi
Diretor do Global Programme on Evidence for Health Policy e depois do
Departamento de Financiamento de Sistemas de Saúde da OMS, onde é
atualmente responsável por uma série de atividades relacionadas ao
desenvolvimento de estratégias e políticas de financiamento adequado
para a saúde. Entre elas figura o projeto WHO-CHOICE que avaliou e
relatou os custos e a eficácia de mais de 700 intervenções em saúde, os custos de ampliação das intervenções, gastos e contas da saúde, a extensão da
catástrofe financeira e do empobrecimento devido aos pagamentos diretos de saúde e avaliação do impacto dos diferentes tipos ou maneiras de
levantar recursos para a saúde, de reuni-los e utilizá-los para prestar ou
comprar serviços e intervenções. Tem muitas publicações nessas áreas.
Prabhat Jha é Chefe do Departamento de Pesquisa de Saúde e
Desenvolvimento da Universidade de Toronto, Canadá. É Diretor
Fundador do Centre for Global Health Research do St. Michael’s Hospital,
Professor Associado do Departamento de Ciências de Saúde Pública da
Universidade de Toronto e Pesquisador Sênior do McLaughlin Centre for
Molecular Medicine. O Dr Jha é também Professeur extraordinaire da
Université de Lausanne, Suíça.
O Dr. Jha é principal autor de Curbing the Epidemic: Governments and
the Economics of Tobacco Control (Contenção da Epidemia: Governos e a
Economia do controle do tabaco) e Co-Editor of Tobacco Control in
Developing Countries (Controle do tabaco nos países em desenvolvimento). Ambos estão entre os livros mais influentes sobre o controle do tabaco. Dr. Jha é o principal investigador de um estudo prospectivo de 1 mi-
Sobre os Editores | 193
lhão de óbitos na Índia, pesquisando a mortalidade causada pelo fumo,
uso de álcool, padrões de fertilidade, poluição do ar em ambientes internos e outros fatores de risco entre 2,3 milhões de lares e 15 milhões de
pessoas. Esse é o maior estudo prospectivo de saúde do mundo
(www.cghr.org/project.htm).
Realiza também estudos sobre a transmissão do HIV em vários países,
focando especificamente a documentação dos fatores de risco para a disseminação do HIV e intervenções para prevenir o crescimento da epidemia do HIV. Seus estudos receberam mais de US$5 milhões em subsídios após revisão de iguais.
Dr.Jha tem várias publicações sobre tabaco, HIV/AIDS e saúde dos
pobres de todo o mundo. Seus prêmios incluem uma medalha de ouro da
Fundação de Promoção da Saúde da Polônia (2000), os 40 Principais
Canadenses com menos de 40 anos (2004) e o Ontario Premier’s Research
Excellence Award (2004). Dr. Jha foi Pesquisador Sênior da Universidade
de Toronto e da McMaster University do Canadá. Graduou-se em
Medicina pela University of Manitoba, Canadá e é D. Phil em
Epidemiologia e Saúde Pública da Universidade de Oxford, Inglaterra,
onde estudou como Rhodes Scholar no Magdalen College.
Anne Mills é Professora de Economia da Saúde e Política na London
School of Hygiene and Tropical Medicine. Tem mais de 20 anos de experiência em pesquisa relacionada à economia da saúde em países em desenvolvimento e tem muitos trabalhos publicados nos campos de economia
da saúde e planejamento da saúde, inclusive livros sobre o papel do governo na saúde em países em desenvolvimento, planejamento da saúde no
Reino Unido, descentralização, pesquisa em economia da saúde em países em desenvolvimento e da parceria público-privada. Seus mais
recentes interesses na área de pesquisa têm sido na organização e financiamento de sistemas de saúde, inclusive avaliação das relações contratuais entre os setores público e privado e na aplicação de técnicas de avaliação econômica para a melhoria da eficiência dos programas de controle
de doenças.
Vem-se envolvendo amplamente no apoio às atividades de pesquisa em
economia da saúde do Programa de Pesquisa em Doenças Tropicais da
OMS. Fundou e é Chefe do Programa de Economia e Financiamento da
Saúde que se tornou um dos principais grupos do mundo no desenvolvimento e aplicação de teorias e técnicas da economia da saúde para ampliar o conhecimento sobre a melhor forma de aumentar a equidade e a efi-
194 | Sobre os Editores
ciência dos sistemas de saúde dos países em desenvolvimento. Atua como
consultora em inúmeros organismos multilaterais e bilaterais, notadamente no Departamento para o Desenvolvimento Internacional do Reino
Unido e na Organização Mundial de Saúde. Orientou a criação da
Alliance for Health Policy and Systems Research e preside sua Diretoria.
Recentemente se tornou membro da Comissão de Macroeconomia e
Saúde e co-presidente de seu grupo de trabalho: “Melhoria dos resultados
de saúde para os pobres”.
Philip Musgrove é Vice-Editor da Health Affairs (Assuntos de Saúde), que
é publicada pelo Projeto HOPE em Bethesda, Maryland. Trabalhou no
Banco Mundial (1990-2002), inclusive dois anos cedido à Organização
Mundial de Saúde (1999-2001), aposentando-se como Principal
Economista. Foi anteriormente Consultor em Economia da Saúde, da
Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) (1982-1990) e Pesquisador
Associado do Brookings Institution e do Resources for the Future (1964-81).
O Dr. Musgrove é Professor Adjunto da School of Advanced
International Studies, Johns Hopkins University, e lecionou na George
Washington University, na American University e na University of Florida.
Tem diplomas do Haverford College (bacharel, 1962, summa cum laude),
Princeton University (M.P.A., 1964) e Massachusetts Institute of Technology
(Ph.D., 1974).
O Dr. Musgrove trabalhou em projetos de reforma da saúde na
Argentina, Brasil, Chile e Colômbia, bem como tratando de diversas
questões de economia da saúde, financiamento, equidade e nutrição. Já
publicou mais de 50 artigos em revistas de economia e saúde e capítulos
em mais de 20 livros.
Sobre os Editores | 195
Comissão de consultoria aos editores
Aluoch, J. R.
Professor, Hospital de Mulheres de Nairobi,
Quênia.
Baudouy, Jacques
Diretor de Saúde, Nutrição e População do Banco
Mundial,Washington, D.C., Estados Unidos
Binka, Fred
Executive Director, Rede INDEPTH, Accra, Gana
Buvinic, Mayra
Diretora de Gênero e Desenvolvimento
Banco Mundial,Washington, D.C., Estados Unidos
Challoner, David, Co-chair
Secretário de Relações Exteriores, Instituto de
Medicina
Academias Nacionais dos EUA, Gainesville, Flórida,
Estados Unidos
Horton, Richard
Editor do The Lancet, Londres, Reino Unido
Hrynkow, Sharon
Diretor Interino do Fogarty International Center
dos Institutos Nacionais de Saúde
Bethesda,Maryland, EUA.
Keusch, Gerald
Reitor de Saúde Mundial
Boston University School of Public Health, Boston,
Massachusetts, Estados Unidos
Kurokawa, Kiyoshi
Presidente do Conselho de Ciência do Japão
(SCJ),Kanawaga, Japão
Lachmann, Peter
Ex-Presidente da UK Academy of Medical Sciences,
Cambridge, Reino Unido
de Thé, Guy, Co-chair
Diretor de Pesquisa e Professor Emérito do Institut
Pasteur, Paris, França
Lansang, Mary Ann
Diretor Executivo do INCLEN Trust International,
Inc, Manila, Filipinas
Evans, Timothy
Diretor Geral Assistente, Evidências e Informações
para a Política
Organização Mundial de Saúde, Genebra, Suíça
Lovelace, Christopher
Diretor do Escritório Nacional da República do
Quirguistão e Desenvolvimento Humano da
Ásia Central, Banco Mundial,
197
Mbewu, Anthony
Diretor Executivo do Conselho de Pesquisa Médica
da África do Sul, Tygerberg, África do Sul
Misra, Rajiv
Ex-Secretário de Saúde do Governo da Índia,
Haryana, Índia
Ocampo, Perla Santos
Presidente da Academia Nacional de Ciência e
Tecnologia, San Juan, Filipinas
Okelo, G. B. A.
Secretário Geral e Diretor Executivo Interino,
Academia de Ciências da África, Nairobi, Quênia
Ruacan, Sevket
Diretor Geral, MESA Hospital, Ankara, Turquia
Senanayake, Pramilla
Presidente da Foundation Council do Global Forum
for Health Research, Colombo, Sri Lanka
Sitthi-amorn, Chitr
Diretor do Instituto de Pesquisa em Saúde/Decano
do The College of Public Health da Chulalongkorn
University Bangkok, Tailândia.
Stansfield, Sally
Subdiretor de Estratégias de Saúde Mundial, Bill &
Melinda Gates Foundation, Seattle,Washington,
Estados Unidos
Uribe, Misael
Presidente da Academia Nacional de Medicina do
México, Cidade do México, México.
Wang, Zhengguo
Professor da Academia Chinesa de Engenharia,
Daping, China
Zatonski, Witold
Professor da Health Promotion Foundation,
Varsóvia, Polônia.
Sepúlveda, Jaime
Diretor dos Instituto Nacional de Saúde Pública do
México, Cuernavaca, México
Escritores colaboradores
William D. Savedoff e Anne-Marie Smith, Social Insight
198 | Comissão de consultoria aos editores
Sumário, Prioridades no Controle
de Doenças nos Países em
Desenvolvimento, 2ª edição
1. Investimento em Saúde Dean. Dean T. Jamison
2. Custo-eficácia das intervenções: Visão geral das principais mensagens.
Ramanan Laxminarayan, Jeffrey Chow, e Sonbol A. Shahid-Salles
3. Fortalecimento dos sistemas de saúde. Anne Mills, Fawzia Rasheed, e
Stephen Tollman
4. Prioridades da pesquisa global e desenvolvimento de intervenções.
Barry R. Bloom, Catherine M. Michaud, John R. La Montagne e Lone
Simonsen
5. Ciência e tecnologia para controle de doenças: Passado, presente e
futuro. David Weatherall, Brian Greenwood, Heng Leng Chee e Prawase
Wasi
6. Prioridades no desenvolvimento de produtos Adel Mahmoud, Adel
Mahmoud, Patricia M. Danzon, John H. Barton e Roy D. Mugerwa
7. Abordagens econômicas para a valorização da pesquisa global em
saúde, David Meltzer
8. Melhoria da saúde das populações: Lições da experiência Carol.
Ann Medlin, Mushtaque Chowdhury, Dean T. Jamison e Anthony R.
Measham
9. Metas de Desenvolvimento do Milênio para a Saúde: O que será
necessário para acelerar o progresso?
Adam Wagstaff, Mariam Claeson, Robert M. Hecht, Pablo Gottret e Qiu
Fang.
199
10. Diferenças de gênero em saúde Mayra Buvinic, André Médici,
Elisa Fernández e Ana Cristina Torres
11. Políticas fiscais para a promoção da saúde e prevenção de
doenças Rachel Nugent e Felicia Knaul
12. Financiamento de sistemas de saúde no Século XXI.
George Schieber, Cristian Baeza, Daniel Kress e Margaret Maier
13. Tendências recentes e inovações na assistência ao desenvolvimento
para a saúde. Robert Hecht e Raj Shah
14. Questões éticas na alocação de recursos, pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. Dan W. Brock e Daniel Wikler
15. Análise de custo-eficácia e definição de prioridades.
Philip Musgrove e Julia Fox-Rushby
16. Tuberculose. Christopher Dye e Katherine Floyd
17. Infecções sexualmente transmissíveis. Sevgi O. Aral e Mead
Over, com Lisa Manhart e King K. Holmes
18. Prevenção e tratamento do HIV/AIDS. Stefano Bertozzi,
Nancy S. Padian, Jeny Wegbreit, Lisa M. DeMaria, Becca Feldman,
Helene Gayle, Julian Gold, Robert Grant e Michael T. Isbell
19. Doenças diarréicas. Gerald T. Keusch, Olivier Fontaine, Alok
Bhargava, Cynthia Boschi-Pinto, Zulfiqar A. Bhutta, Eduardo
Gotuzzo, Juan Rivera, Jeffrey Chow, Sonbol A. Shahid-Salles, e
Ramanan Laxminarayan
20. Doenças que podem ser prevenidas com vacinas. Logan Brenzel,
Lara J. Wolfson, Julia Fox-Rushby, Mark Miller e Neal A. Halsey
21. Vencendo a malária. Joel G. Breman, Anne Mills, Robert W.
Snow, Jo-Ann Mulligan, Christian Lengeler, Kamini Mendis, Brian
Sharp, Chantal Morel, Paola Marchesini, Nicholas J. White, Richard
W. Steketee e Ogobara K. Doumbo
22. Doenças tropicais sob meta de eliminação: Doença de Chagas,
lepra, filariose e oncocercose. J. H. F. Remme, P. Feenstra, P. R. Lever,
André C. Médici, C. M. Morel, M. Noma, K. D. Ramaiah, F. Richards,
A. Seketeli, G. Schmunis, W. H. van Brakel e A. Vassall
200 | Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição
23. Doenças tropicais que não dispõem de medidas adequadas de
controle: Dengue, leishmaniose e tripanosomíase africana.
P. Cattand, P. Desjeux, M. G. Guzmán, J. Jannin, A. Kroeger, A.
Médici, P. Musgrove, M. B. Nathan, A. Shaw e C. J. Schofield
24. Infestações por vermes: Infestações por vermes transmitidas
pelo solo e esquistossomose. Peter J. Hotez, Donald A. P. Bundy,
Kathleen Beegle, Simon Brooker, Lesley Drake, Nilanthi de Silva,
Antonio Montresor, Dirk Engels, Matthew Jukes, Lester Chitsulo,
Jeffrey Chow, Ramanan Laxminarayan, Catherine Michaud, Jeff
Bethony, Rodrigo Correa-Oliveira, Xiao Shuhua, Alan Fenwick e
Lorenzo Savioli
25. Infecções respiratórias agudas em crianças. Eric A. F. Simoes,
Thomas Cherian, Jeffrey Chow, Sonbol A. Shahid-Salles, Ramanan
Laxminarayan e T. Jacob John
26. Condições maternas e perinatais. Wendy J. Graham, John
Cairns, Sohinee Bhattacharya, Colin H. W. Bullough, Zahidul
Quayyum e Khama Rogo
27. Sobrevivência de recém-nascidos. Joy E. Lawn, Jelka Zupan,
Geneviève Begkoyian e Rudolf Knippenberg
28. Baixa estatura, baixo peso e deficiências de micronutrientes.
Laura E. Caulfield, Stephanie A. Richard, Juan A. Rivera, Philip
Musgrove e Robert E. Black
29. Intervenções em serviços de saúde para controle do câncer nos
países em desenvolvimento. Martin L. Brown, Sue J. Goldie, Gerrit
Draisma, Joe Harford e Joseph Lipscomb
30. Diabetes: a pandemia e as possíveis soluções. K. M. Venkat
Narayan, Ping Zhang, Alka M. Kanaya, Desmond E. Williams,
Michael M. Engelgau, Giuseppina Imperatore e Ambady
Ramachandran
31. Distúrbios mentais. Steven Hyman, Dan Chisholm, Ronald
Kessler, Vikram Patel, Harvey Whiteford
32. Distúrbios neurológicos. Vijay Chandra, Rajesh Pandav,
Ramanan Laxminarayan, Caroline Tanner, Bala Manyam, Sadanand
Rajkumar, Donald Silberberg, Carol Brayne, Jeffrey Chow, Susan,
Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição | 201
Susan Horton, and Vivek Chaturvedi Herman, Fleur Hourihan, Scott
Kasner, Luis Morillo, Adesola Ogunniyi, William Theodore e ZhenXin Zhang
33. Doença cardiovascular. Thomas Gaziano, K. Srinath Reddy, Fred
Paccaud
34. Distúrbios hereditários da hemoglobina. David Weatherall, Olu
Akinyanju, Suthat Fucharoen, Nancy Olivieri e Philip Musgrove
35. Doenças respiratórias em adultos. Frank E. Speizer, Susan
Horton, Jane Batt e Arthur S. Slutsky
36. Doenças do rim e do aparelho urinário. John Dirks, Giuseppe
Remuzzi, Susan Horton, Arrigo Schieppati e S. Adibul Hasan Rizvi
37. Doenças da pele. Roderick Hay, Sandra E. Bendeck, Suephy Chen,
Roberto Estrada, Anne Haddix, Tonya McLeod e Antone Mahé
38. Doenças e distúrbios orais e craniofaciais. Douglas Bratthall,
Poul Erik Petersen, Jayanthi Ramanathan Stjernswärd e L. Jackson Brown
39. Lesões não-intencionais. Robyn Norton, Adnan A. Hyder, David
Bishai e Margie Peden
40. Violência interpessoal. Mark L. Rosenberg, Alexander Butchart,
James Mercy, Vasant Narasimhan, Hugh Waters e Maureen S. Marshall
41. Fornecimento de água, saneamento e promoção da higiene.
Sandy Cairncross e Vivian Valdmanis
42. Poluição do ar em ambientes internos. Nigel Bruce, Eva
Rehfuess, Sumi Mehta, Guy Hutton e Kirk Smith
43. Poluição do ar e da água: carga e estratégias de controle.
Tord Kjellström, Madhumita Lodh, Tony McMichael, Geetha
Ranmuthugala, Rupendra Shrestha e Sally Kingsland
44. Prevenção de doença crônica por meio de dieta e alterações no
estilo de vida. Walter C. Willett, Jeffrey P. Koplan, Rachel Nugent,
Courtenay Dusenbury, Pekka Puska e Thomas A. Gaziano
45. A crescente carga de risco pela hipertensão arterial, colesterol e
obesidade. Anthony Rodgers, Carlene M. M. Lawes, Thomas Gaziano
e Theo Vos
202 | Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição
46. Tabagismo. Prabhat Jha, Frank J. Chaloupka, James Moore,
Vendhan Gajalakshmi, Prakash C. Gupta, Richard Peck, Samira Asma
e Witold Zatonski
47. Álcool. Jürgen Rehm, Dan Chisholm, Robin Room e
Alan D. Lopez
48. Abuso ilícito do ópio e derivados. Wayne Hall, Chris Doran,
Louisa Degenhardt e Donald Shepard
49. Deficiências do aprendizado e do desenvolvimento.
Maureen S. Durkin, Helen Schneider, Vikram S. Pathania, Karin B.
Nelson, Geoffrey Clive Solarsh, Nicole Bellows, Richard M. Scheffler e
Karen J. Hofman
50. Perda da visão e da audição. Joseph Cook, Kevin D. Frick, Rob
Baltussen, Serge Resnikoff, Andrew Smith, Jeffrey Mecaskey e Peter
Kilima
51. Custo-eficácia de intervenções para condições
muscoloesqueléticas. Luke B. Connelly, Anthony Woolf e Peter
Brooks
52. Controle da dor para pessoas com câncer e AIDS.
Kathleen M. Foley, Judith L. Wagner, David E. Joranson e Hellen
Gelband
53. Vigilância da população: Uma ferramenta para o direcionamento e monitoramento de intervenções. Peter Nsubuga, Mark E. White,
Stephen B. Thacker, Mark Anderson, Steve B. Blount, Claire Broome,
Tom Chiller, Victoria Espitia, Rubina Imtiaz, Dan Sosin, Donna F.
Stroup, Robert V. Tauxe, Maya Vijayaraghavan e Murray Trostle
54. Informações para a melhoria da formulação de decisões na
saúde. Sally K. Stansfield, Julia Walsh, Ndola Prata e Timothy Evans
55. Resistência a medicamentos. Ramanan Laxminarayan, Zulfiqar
Bhutta, Adrian Duse, Philip Jenkins, Thomas O’Brien, Iruka N.
Okeke, Ariel Pablo-Mendez e Keith P. Klugman
56. Programas de saúde comunitária e nutrição.
J.B. Mason, D. Sanders, P. Musgrove, Soekirman e R. Galloway
57. Contracepção. Ruth Levine, Ana Langer, Nancy Birdsall, Gaverick
Matheny, Merrick Wright e Angela Bayer
Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição | 203
58. Programas de saúde e nutrição escolar. Donald Bundy,
Sheldon Shaeffer, Matthew Jukes, Kathleen Beegle, Amaya Gillespie,
Lesley Drake, Seung-hee Frances Lee, Anna-Maria Hoffman,
Jack Jones, Arlene Mitchell, Cream Wright, Delia Barcelona,
Balla Camara, Chuck Golmar, Lorenzo Savioli e Malick Sembene
59. Programas de saúde do adolescente. Elizabeth Lule,
James E. Rosen, Susheela Singh, James C. Knowles e Jere R. Behrman
60. Saúde ocupacional. Linda Rosenstock, Mark Cullen e Marilyn
Fingerhut
61. Atenuação e alívio de catástrofes naturais. Claude de Ville de
Goyet, Ricardo Zapata Marti e Claudio Osorio
62. Controle e erradicação. Mark Miller, Scott Barrett e D. A.
Henderson
63. Gestão integrada da criança doente. Cesar G. Victora, Taghreed
Adam, Jennifer Bryce e David B. Evans
64. Cuidados básicos em geral. Stephen Tollman, Jane Doherty e
Jo-Ann Mulligan
65. O hospital municipal. Mike English, Claudio F. Lanata,
Isaac Ngugi e Peter C. Smith
66. Hospitais de referência. Martin Hensher, Max Price, e Sarah
Adomakoh
67. Cirurgias. Haile T. Debas, Richard Gosselin, Colin McCord e
Amardeep Thind
68. Serviços médicos de emergência. Olive C. Kobusingye,
Adnan A. Hyder, David Bishai, Manjul Joshipura, Eduardo Romero
Hicks, e Charles Mock
69. Medicina complementar e alternativa. Haile T. Debas,
Ramanan Laxminarayan e Stephen E. Straus, MD
70. Melhoria da qualidade de cuidados nos países em desenvolvimento. John W. Peabody, Mario M. Taguiwalo, David A. Robalino e
Julio Frenk
204 | Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição
71. Profissionais de saúde: criação e motivação da força de trabalho.
Charles Hongoro e Charles Normand
72. Garantia de suprimento de medicamentos e vacinas apropriadas. Susan Foster, Richard Laing, Bjorn Melgaard e Michel Zaffran
73. Gestão estratégica dos serviços clínicos. Alexander S. Preker,
Martin McKee, Andrew Mitchell e Suwit Wilbulpolprasert
Sumário, Prioridades no Controle de Doenças nos Países em Desenvolvimento, 2ª edição | 205
Sumário: Carga global de doenças
e fatores de risco
1. Medição da carga global de doenças e fatores de risco, 1990-2001
Alan D. Lopez, Colin D. Mathers, Majid Ezzati, Dean Jamison e
Christopher J. L. Murray
2. Características demográficas e epidemiológicas das principais
regiões, 1990–2001.
Alan D. Lopez, Stephen Begg e Ed Bos
3. A carga de doenças e mortalidade por condição: dados, métodos e
resultados para 2001.
Colin D. Mathers, Alan D. Lopez e Christopher J. L. Murray
4. Quantificação comparativa da mortalidade e carga de doenças
atribuíveis a importantes fatores de risco selecionados
Majid Ezzati, Stephen Vander Hoorn, Alan D. Lopez, Goodarz Danaei,
Anthony Rodgers, Colin Mathers e Christopher J. L. Murray
5. Análises de sensibilidade e incerteza das estimativas da carga de
doenças e fatores de risco
Colin D. Mathers, Joshua A. Salomon, Majid Ezzati, Stephen Begg,
Stephen Vander Hoorn e Alan D. Lopez
6. Incorporação de óbitos próximos à data do nascimento às estimativas da carga global de doenças
Dean T. Jamison, Sonbol A. Shahid-Salles, Julian Jamison, Joy E. Lawn e
Jelka Zupan
207
Crédito de Fotos
Desenho da capa: Naylor Design
Foto da capa: Dominic Sansoni/ Banco Mundial
Capítulo 1, página 1: Dominic Sansoni/ Banco Mundial
Capítulo 2, página 23: Curt Carnemark/ Banco Mundial
Capítulo 3, página 39: Dominic Sansoni/ Banco Mundial
Capítulo 4, página 59: Tran Thi Hoa/ Banco Mundial
Capítulo 5, página 97: Ray Witlin/ Banco Mundial
Capítulo 6, página 129: Alan Gignoux/ Banco Mundial
Capítulo 7, página 157: Anatoliy Rakhimbayev/ Banco Mundial
Capítulo 8, página 181: Curt Carnemark/ Banco Mundial
Referências | 209
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