COMÉRCIO EXTERIOR Indicadores macroeconômicos e de negócios na América Latina Lia Baker Valls Pereira Pesquisadora da Área de Economia Aplicada da FGV/IBRE e professora adjunta da Faculdade de Ciências Econômicas da Uerj 6 2 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | M a i o 2 015 Brasileiro de Economia (Sondagem Econômica da América Latina Ifo/ FGV). De forma geral, os países da Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru) apresentam resultados mais favoráveis do ICE que os do Mercosul. Sob esse prisma, a política macroeconômica desses países tem fundamentos que sugerem um cenário favorável ao crescimento econômico. Em seguida analisamos os principais fatores apontados na pesquisa da Sondagem da América Latina em relação aos principais problemas que os países enfrentam para crescerem. O resultado nos levou a examinar a avaliação do Doing business publicado pelo Banco Mundial. Há um elevado grau de coincidência na classificação dos países nessa pesquisa e na sondagem sobre o ICE. Os resultados do ICE A Sondagem da América Latina procura captar o sentimento de especialistas econômicos sobre a economia em seus respectivos países no momento atual e as perspectivas para seis meses seguintes. Na pes- Gráfico 1— Indicador do Clima Econômico (ICE) Ifo/FGV 140 130 Favorável 120 110 100 90 80 70 60 50 Desfavorável Mundo América Latina Jan. 90 Jan. 91 Jan. 92 Jan. 93 Jan. 94 Jan. 95 Jan. 96 Jan. 97 Jan. 98 Jan. 99 Jan. 00 Jan. 01 Jan. 02 Jan. 03 Jan. 04 Jan. 05 Jan. 06 Jan. 07 Jan. 08 Jan. 09 Jan. 10 Jan. 11 Jan. 12 Jan. 13 Jan. 14 Jan. 15 A publicação Regional economic outlook — Western Hemisphere de abril de 2015 do Fundo Monetário Internacional (FMI) analisa a situação atual e as perspectivas dos países do continente das Américas e identifica dois grupos. O primeiro com laços comerciais mais intensos com os Estados Unidos irá se beneficiar com o aumento esperado na taxa de crescimento econômico dos Estados Unidos de 2,4% para 3,1% entre 2014 e 2015. Estão nesse grupo, Canadá, México e países da América Central. O segundo grupo se refere aos países da América do Sul que sofrem o impacto da queda nos preços das commodities. No entanto, o Fundo chama atenção que a piora no desempenho econômico não é uniforme na região. Argentina, Brasil e Venezuela deverão registrar queda no produto. Os outros países terão crescimento positivo, sendo que Chile e Peru irão elevar a sua taxa em relação a 2014. A projeção do FMI coincide com os indicadores do clima econômico (ICE) produzidos pelo Instituto Ifo e divulgados para a América Latina juntamente com a Fundação Getulio Vargas através do Instituto Elaboração: IBRE/FGV. Fonte: Sondagem Econômica da América Latina Ifo/FGV. CONJUNTURA COMÉRCIO EXTERIOR quisa são incluídas questões sobre despesas de consumo; despesas de investimentos; taxas de juros; taxas de inflação; balança comercial; e taxa de câmbio. O Indicador Ifo/ FGV de Clima Econômico é a média aritmética dos indicadores da Situação Atual (ISA) e de Expectativas (IE). Os indicadores são ponderados pela participação da corrente de comércio dos países e, logo na América Latina, refletem em grande medida o desempenho das maiores economias da região. Resultados acima de 100 são considerados favoráveis e abaixo desfavoráveis. A observação da série do ICE desde janeiro de 1990 (gráfico 1) mostra que o ICE da América Latina e do mundo tendem a caminhar juntos com algumas exceções. Episódios como a curta recessão dos anos de 1990/1991 nos Estados Unidos, explicam o ICE desfavorável do mundo e favorável na América Latina (crescimento elevado no México e Argentina). Já a crise mexicana de 1994 explica o ICE desfavorável na América Latina, mas favorável no mundo após a retomada O FMI chama atenção que a piora no desempenho econômico não é uniforme na região. Argentina, Brasil e Venezuela deverão registrar queda no produto do crescimento econômico nos Estados Unidos e o fim das turbulências cambiais entre as moedas da União Europeia. No entanto, a partir do início dos anos 2000, os dois indicadores apresentam comportamento similar. A trajetória comum, no entanto, será interrompida a partir do final de 2013. O ICE do mundo melhora e fica na zona favorável e o da América Latina piora e fica na zona desfavorável. Gráfico 2— Indicador do Clima Econômico Ifo/FGV China e América Latina 140 130 120 110 100 90 80 70 60 40 China América Latina jan. 05 abr. jul. out. jan. 06 abr. jul. out. jan. 07 abr. jul. out. jan. 08 abr. jul. out. jan. 09 abr. jul. out. jan. 10 abr. jul. out. jan. 11 abr. jul. out. jan. 12 abr. jul. out. jan. 13 abr. jul. out. jan. abr. jul. out. jan. 15 50 Elaboração: IBRE/FGV. Fonte: Sondagem Econômica da América Latina Ifo/FGV. A primeira década do século XXI assistiu a uma mudança na configuração do comércio mundial, em especial na América do Sul associada ao elevado crescimento da demanda chinesa por commodities. A reversão no ciclo de preços elevados de petróleo, minerais e em menor escala dos produtos agrícolas com a desaceleração da economia chinesa atinge os países sul-americanos exportadores desses produtos. Enquanto isso, a economia dos Estados Unidos começa a se recuperar e os países europeus projetam um desempenho positivo com as políticas monetárias expansionistas anunciadas no início de 2015. A comparação entre o ICE da América Latina e o da China (gráfico 2) mostra que ambas as regiões/país entram na zona desfavorável com ICE em queda no final de 2013, embora a China registre um clima econômico melhor que a América Latina. A análise das Sondagens Econômicas da América Latina disponíveis no Portal do IBRE (www.portalibre.fgv.br) mostra, no entanto, que a piora acentuada no clima econômico da América Latina foi liderada pelo Brasil, Argentina e Venezuela, com uma ressalva. Até abril de 2013, o ICE do Brasil era favorável desde a recuperação da crise de 2008, enquanto nos outros dois países, a piora no clima econômico começa em 2012 (Argentina) e antes ainda na Venezuela. Alguns países registram ICEs favoráveis ao longo de 2014, como a Bolívia, Colômbia, Paraguai, Chile e Peru. No entanto, a queda acentuada no preço do petróleo piora as expectativas na Colômbia, Bolívia e Equador. M a i o 2 015 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 6 3 CONJUNTURA COMÉRCIO EXTERIOR O que nos interessa ressaltar, porém, são os fatores que ajudam a explicar os resultados do clima econômico. Duas vezes ao ano é perguntado aos especialistas que respondem a Sondagem quais são os principais problemas que seus países enfrentam para crescer. No gráfico 3 listamos as questões consideradas mais relevantes nas pesquisas divulgadas em outubro desde 2004. Respostas acima de 5 indicam que o problema é importante numa escala que vai até 9 (extremamente importante) e abaixo é pouco relevante numa escala que vai até 1 (pouquíssimo relevante). Ao longo do período e em todos os países, falta de competitividade internacional e falta de mão de obra qualificada aparecem como questões quase sempre relevantes e em todos os países da amostra (os dez maiores países da América do Sul mais o México). Inflação e falta de confiança na política econômica ganharam peso a partir de 2013 em função dos resultados para o Brasil que passaram a acompanhar o que já ocorria na Venezuela e na Argentina. Os outros problemas perguntados na pesquisa (demanda insuficiente, desemprego, barreiras comerciais às exportações e falta de capital) são registrados como menos relevantes entre outubro de 2010 e outubro de 2014. A eleição da competitividade internacional como um dos principais problemas nos levou a examinar outra pesquisa qualitativa: Doing business do Banco Mundial, ano 2015. Os países melhores classificados na agenda microeconômica do Doing business tendem a ser os mais bem posicionados na agenda de clima econômico tal dos fatores. Essa é influenciada por diversas questões. Um ambiente macroeconômico estável, gestão da política econômica, instituições, infraestrutura e o ambiente de negócios onde as empresas operam. A pesquisa do Banco Mundial visa avaliar o ambiente de negócios considerando procedimentos administrativos para abertura de Gráfico 3 — Principais problemas para o crescimento econômico 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Doing business de 2015 Competitividade internacional é identificada com produtividade to6 4 C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a | M a i o 2 015 empresas, direitos de propriedade, regulações jurídicas, tributações, entre outros. Nas pesquisas, Cingapura tem se mantido como o primeiro classificado na lista do melhor ambiente de negócios, desde 2010 até 2015, o período selecionado para essa amostra. Os Estados Unidos estavam em 4o lugar em 2010 e passaram para 7o lugar em 2015. Escolhemos os Estados Unidos como o parâmetro de comparação com os países da nossa amostra. Assim como Cingapura, os outros países que antecedem os Estados Unidos são economias pequenas como Hong Kong e Nova Zelândia, por exemplo. Além disso, tivemos outra motivação. Todos os países da Aliança do Pacífico possuem acordos de livre-comércio com os Estados Unidos e a União Europeia. Esses são acordos que tratam da liberalização comercial, mas tratam exaustivamente (em especial os acordos com os Estados Unidos) de negociações sobre marcos regulatórios que facilitam os negócios. Out.-04 Out.-05 Out.-06 Out.-07 Out.-08 Out.-09 Out.-10 Out.-11 Out.-12 Out.-13 Out.-14 Falta de confiança na política econômica Inflação Falta de competitividade internacional Falta de mão de obra qualificada Elaboração: IBRE/FGV. Fonte: Sondagem Econômica da América Latina Ifo/FGV. Déficit público CONJUNTURA COMÉRCIO EXTERIOR O gráfico 4 mostra os resultados. Os Estados Unidos ficam na fronteira e quanto mais distante o país do ambiente de negócios desse país, mais longe fica da fronteira. Chama atenção que os países da Aliança do Pacífico estão próximos na classificação. Colômbia, em 34o lugar é seguida do Peru (35o), México (39o) e Chile (41o). O próximo país é o Uruguai (82o) e o último, a Venezuela (182o). A classificação se refere à posição entre todos os 189 países pesquisados. Os países melhores classificados na agenda microeconômica do Doing business tendem a ser os melhores posicionados na agenda macroeconômica do clima econômico. Há exceções, como a Bolívia e o Paraguai, bem classificados nas Sondagens recentes do ICE e com posições muito distantes da fronteira dos Estados Unidos. Não se espera a assinatura no curto prazo de um acordo de livre-comércio Brasil-EUA, mas seria importante manter o caminho aberto São os acordos de livre-comércio que levaram à melhora das duas agendas nesses países? No caso do México, a literatura é consensual ao ressaltar o papel do acordo com os Gráfico 4 — Classificação no Doing business 2015 Venezuela 182º Bolívia 157º Argentina 124º Estados Unidos 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Colômbia 34º Peru 35º México 39º Chile 41º Brasil 120º Equador 115º Uruguai 82º Paraguai 92º Elaboração: IBRE/FGV. Fonte: Doing business 2015, Banco Mundial. Estados Unidos na importação de credibilidade e consolidação das reformas que melhoraram o ambiente de negócios. No caso dos outros países da Aliança do Pacífico, que realizaram seus acordos na segunda metade da primeira década dos anos 2000, a sugestão é a mesma. O acordo com os Estados Unidos e a União Europeia contribuiria para a melhora das agendas macro e micro do Brasil? A estabilidade macroeconômica é um desafio de curto prazo e a experiência passada mostra que o arcabouço institucional para a boa governança macro está presente. O desafio é a agenda de competitividade internacional. Diferente das economias da Aliança do Pacífico, as diretrizes da política econômica brasileira ainda não apontam para estratégias que contemplem acordos amplos de livre-comércio. No entanto, a perda de participação das manufaturas na pauta de exportações, a estagnação ao redor de 0,7% das manufaturas brasileiras nas exportações mundiais desses produtos, desde os anos de 1990, a perda de mercados para a China, os mega acordos dos Estados Unidos na região do Pacífico e com a União Europeia têm levado a que o setor industrial brasileiro e mesmo representantes do governo tenham passado a expressar a importância da agenda de acordos comerciais do Brasil com as grandes economias mundiais. Não se espera a assinatura no curto prazo de um acordo de livrecomércio Brasil-Estados Unidos, mas seria importante manter o caminho aberto para negociações na próxima visita em junho da presidente para esse país. M a i o 2 015 | C o n j u n t u r a E c o n ô m i c a 6 5