REVISTA LATINO-AMERICANA DE EDUCAÇÃO

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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
ARTIGO DE REVISÃO
UMA ABORDAGEM PSICOPEDAGÓGICA DO CURRÍCULO DO
CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS
A PSYCHOPEDAGOGICAL APPROACH TO THE CURRICULUM
OF THE SOLDIERS TRAINING COURSE
Paulo Fernando da Silva
Diplomado em Segurança Pública (APMCB), especialista em Gestão Ambiental (Cândido Mendes),
Mestrando em Sistemas Agroindustriais (UFCG)
José Rivamar de Andrade
Graduado em Letras (FIP), Especialista em Língua, Linguística e Literatura (FIP), em Gestão do
Trabalho Pedagógico (UNINTER), em Linguística Aplicada na Educação (Cândido Mendes), em
Metodologia do Ensino de Língua Estrangeira e Portuguesa (UNINTER), e mestre em Sistemas
Agroindustriais (UFCG)
E-mail: [email protected]
Flávia Regina Pinheiro Leite
Graduada em Fonoaudiologia (UNICAP-PE). Especialista em Fonoaudiologia com Ênfase em
Motricidade Orofacial (IMIP)
Resumo: O trabalho focaliza o currículo prescrito para o Curso de Formação de
Soldados da Polícia Militar do Estado da Paraíba, a partir da necessidade da
formulação de um currículo que tenha uma aproximação psicopedagógica da
prática da Caserna, das situações e comportamentos observáveis e observados
nas práticas estabelecidas por instrutores e monitores. Através de uma
abordagem de cunho bibliográfico, busca-se apontar caminhos para uma
formação mais humanizada, democrática, participativa e dinâmica aos novos
policias militares, formando um profissional que saiba atuar como negociador de
conflitos. Privilegiou-se a abordagem metodológica qualitativa e a linha teórica
foi fundamentada pelos estudos de Freire (1996), Stenhouse (1984), Torres
(2001), Wolkmer (2007), dentre outros que discutem as temáticas de ensino
militar, currículo, a prática pedagógica e psicopedagógica. O caminho trilhado
por esta pesquisa aponta para a necessidade de se assumir como prioritário às
polícias uma formação mais apurada e constantes treinamentos. Um decálogo, ao
final, indica os pontos que afloraram como conexões entre o currículo, o
comportamento, os processos mentais e as novas demandas.
Palavras-chave: Currículo.
Processos Mentais.
Prática
Psicopedagógica.
Comportamento.
Abstract: The paper focuses on the curriculum prescribed for the Training
Course for Soldiers of the Military Police of the State of Paraíba, based on the
need to formulate a curriculum that has a psychopedagogical approach to
Barracks practice, observable situations and behaviors observed in established
practices By instructors and monitors. Through a bibliographic approach it seeks
to point out ways for a more humanized, democratic, participatory and dynamic
formation to the new military police, forming a professional who knows how to
act as a conflict negotiator. The qualitative methodological approach was favored
and the theoretical line was based on the studies of Freire (1996), Stenhouse
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
(1984), Torres (2001), Wolkmer (2007), among others that discuss the themes of
military education, curriculum, practice Pedagogical and psychopedagogical. The
path taken by this research points to the need to take priority training of the
police to a more accurate training and constant training. A decalogue, in the end,
points out the points that have emerged as connections between curriculum,
behavior, mental processes, and new demands.
Keywords: Curriculum. Psychopedagogical Practice. Behavior. Mental Proce.
1 INTRODUÇÃO
Para construir esta obra abandonaram-se
as especulações em cima das corporações
militares, entregando-nos as observações
precisas e substituir as ideias pelos fatos,
procurando as razões que levam os membros a
agirem. Donde é importante, é importante uma
pequena remontagem histórica das primeiras
épocas da história da instituição pertinentes
experiências sobre a origem e a geração de
ideias, formação e o progresso da linguagem
própria da caserna. E durante todo este tempo,
é fato que, em cada época, produzem um
discurso dominante considerado autorizado e
aceito.
Ao realizar estas observações metódicas e
escolher os fatos que recaem sobre “o soldado”
podemos compreender como o miliciano se
constrói pouco a pouco pela educação e pela
cultura.
Convencido que os signos estão,
intimamente ligados na transformação de
sensações em símbolos de linguagem.
Ao estudar a etnografia e a etnologia dos
grupos militares verificamos uma estreita
ligação entre o Exército e a Polícia Militar como
força auxiliar e reserva do exército. Sendo esta
utilizada para atender as demandas do Estado,
e no contexto das lutas políticas uma barreira
ideológica dos movimentos de emancipação
popular.
Estabelecer limites ao aparelho policial é
questão-chave para que se pense em uma
sociedade democrática com cidadãos plenos,
pois, conforme (COMPARATO, 1987, p. 16):
“Ninguém, nem na mais alucinada divagação,
imagina suprimir as forças policiais numa
sociedade complexa, como a nossa. Mas todos
nós sabemos e o governo é o primeiro a saber
que o exercício da ação policial conduz
necessariamente ao abuso.”
Para a construção da cidadania, parte-se
do principio que os seus membros devem ser
também cidadãos. E dentro da estrutura da
policial militar tomamos a liberdade de afirmar
que para se construir a cidadania devemos fazer
do cotidiano das atividades laborais uma ação
pedagógica.
Aqui, sob a ótica pedagógica passamos a
aliar a prática educativa com o fortalecimento
da cidadania, apoiando e vigiando uma
educação mais policial do que militar voltada
para a singularização, consequentemente
indivíduos livres, isto é criativos e autônomos,
que de fato tomem nas mãos de suas vidas e de
outrem.
Sobre isto, Paulo Freire insiste por
diversas vezes em todas em suas obras que a
integração1 faz parte da natureza humana como
resultado da realidade captada e modificada,
aparelhada com a crítica. E ao perde está
capacidade de julgar e submetido às ordens de
outras pessoas, já não se integra, ou seja tornarse incapaz de alterar sua realidade. Acomodase, ajusta-se e adapta-se (FREIRE, 1996).
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 ORIGEM DA CORPORAÇÃO
A primeira concepção da ideia de Polícia
com funções mais próximas, aos dias atuais,
pode ser encontrada através dos relatos dos
livros
de
história,
principalmente
no
desenvolvimento de atividades de proteção as
legislações abarcadas por cada povo. Neste
contexto, os Hebreus e os Egípcios foram os
primeiros povos a registrarem suas leis e
adotarem ações de caráter policial. Mas é na
organização política Greco-Romana, nos
tempos dos Imperadores, surgiram as primeiras
organizações responsáveis pela Manutenção da
Ordem Pública (WOLKMER, 2007).
Na Grécia antiga, existia um grupo de
homens de propriedade dos magistrados,
compostos por 300 escravos conhecidos
1
A integração de saberes é um processo em que um novo
saber liga-se a saberes anteriores na aplicação de
conteúdos específicos em situações concretas (Brasil,
2005).
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
[pabloucoi] (portadores de varas) que eram
empregados em distúrbios, bem como na
guarda dos presos. Contudo, os cidadãos gregos
desempenhavam o papel da investigação dos
crimes. Já, em Roma, a segurança pública era
realizada pelos soldados e a investigação era a
cargo dos magistrados.
As primeiras ideias de organização militar
originaram-se em Roma durante o Reinado de
Caio Júlio César Otaviano, o primeiro
Imperador e herdeiro de Júlio Cesar, chegando
ao poder através do segundo triunvirato, tendo
o Império mais de um milhão de habitantes.
Por este motivo, a capital foi dividida em
regiões administrativas, tendo a proteção de
sete cohortes vigilum (coortes de vigilância),
compotas cada uma por mil vigias. Elas
funcionavam como forças de intervenção
antidistúrbios, combate a incêndios e defesa
civil (DEGAN, 2013).
E nesta linha pretérita, o termo “polícia”
assentou-se da palavra grega politéia e do latim
politia, e em sentido mais amplo é um conjunto
de leis e regras impostas aos cidadãos, arte de
assegurar o cidadão, segurança de um grupo
social, segurança do grupo social e a arte de
governar os cidadãos. Com o passar dos anos,
este tipo de organização foi adotada por outros
povos e difundida para todo o mundo (ROCHA,
2012).
Nota-se que a instituição, ao longo da
história, esteve ligada aos magistrados como
consequência a concentração do poder. Seja
ele, Chefe Tribal, Sacerdote, Senhor Feudal,
Líder político local, qualquer que exercesse o
poder de julgar, a fim de fazer cumprir as
decisões tomadas. Em direção diametralmente
oposta, a concentração do poder, no século
XVII, vários cientistas procuraram uma
maneira mais justa de administrar sempre
preocupados em combater as tiranias. John
Locke, 100 anos antes da publicação do livro da
obra “O Espírito das Leis”, (1748), já apontava
para a divisão dos entre os tipos de poderes e as
novas reformulações que implicaram nas
formas de atuação das forças responsáveis pela
manutenção da ordem pública.
2.2 SÍMBOLOS, SIGNOS, RITOS E
REPRESENTAÇÕES
É comum nas salas de aula os policiaisestudantes, nos primeiros dias, logo são
ensinados a falarem, apenas ao levantar a mão e
manter-se organizados para serem controlados.
E para não serem punidos procuram controlar
sua capacidade criativa e a conter-se em seu
silêncio (FREIRE, 1996).
Ações que remetem os alunos policiais a
uma série de representações sociais a defensiva
de mudança que os leva para adaptação de sua
conduta ao sistema da vida militar. Caso
contrário, os inadaptados são considerados
“folgados2”. Por isso, as primeiras orientações
da Corporação Policial Militar sempre surgem
nas salas de aula e nos períodos de formação
dos recém-ingressos. Para que possam adquirir
os saberes necessários a pratica profissional e
“arrefecer” o caráter original de cada um,
transformar o conjunto diversificado em uma
massa homogênea (LUDWIG, 1998, p. 36),
sintoma de sua desumanização (FREIRE, 1996).
Ou seja, durante a educação profissional a
identidade policial é construída, paralelamente
a incorporação de uma série de pequenos
hábitos comuns a caserna. É neste sentido,
raramente não há espaços para debates na sala
de aula. “(...) o soldado é algo que não existe a
priori, mas que é fabricado, transformando de
uma massa disforme, um corpo inapto, em um
corpo com todas as insígnias de poder que um
soldado deve ter” (COSTA, 2002, p.28).
Mesmo com a incidência e o foco da
educação emancipadora há ainda insistência em
acordos e significados pedagógicos que levem o
novo policial ao êxito em suas ações frente a
criminalidade e o bom atendimento ao cidadão.
Lembra Torres (2001) que para entendermos
como os dispositivos do poder funcionam, há a
necessidade de compreender as diversas
relações entre a política, educação e economia e
suas respectivas dimensões, se quisermos
realmente
compreender
os
dilemas
educacionais do nosso tempo e agir sobre eles.
Em relação a isto, (MONET, 2002) põe-se
a questionar sobre a estrutura organizada das
polícias militares seriam, suficientemente capaz
de atender o anseios dos cidadãos. É válida a
pergunta, pois nos remete a outra sob um outro
enfoque ao qual o controle e a manutenção do
poder obriga a educação militarizada a fim de
assegurar o controle de um instrumento dócil
não desviante dos corpos policiais na
expectativa de servir ao poder hegemônico, em
detrimento dos interesses da democracia, a
favor dos interesses partidários.
2
Jargão militar ao qual faz referência aos profissionais
que resistem em obedecer às regras do militarismo, ou
seja, subversivos.
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
Michaud (1989, p. 98) destaca que: “(...) a
profissão policial – centrada na observação do
anormal e a aplicação das regras – atrai
personalidades
rígidas,
punitivas,
com
tendência a pensar através de estereótipos, e
reforça as personalidades nessa direção. Um
policial não convencional viveria conflitos
demais”.
É também necessário entender que um
dos pontos fortes da corporação é a resiliência
fora do comum de um policial ao sofrer
pressões internas e externas de si e do público
exigente. E suas formas de organizar-se limitam
a fronteira do desespero e outras emoções que
possam atrapalha sua função social. Tudo isto,
perpassa pelo sua formação profissional
instrumentalizada
pelo
currículo.
Uma
educação desta natureza não é, essencialmente
libertária e não pode ser de forma alguma estar
reduzida ao discurso formal do poder.
É nesta perspectiva, ao organizar um
vasto material empírico sobre as experiências
da história das Forças de Segurança Pública,
tais como: guerras, revoluções e modos de vida
ficam evidentes que a polícia sempre esteve
envolvida com atos de violência.
A Polícia Militar é Responsável de
executar com exclusividade, ressalvadas as
missões peculiares às Forças Armadas, o
policiamento ostensivo, fardado, planejado
pelas autoridades policiais competentes, a fim
de assegurar o cumprimento da Lei, a
manutenção da ordem pública e o exercício dos
poderes
constituídos.
Diante
disto,
a
Constituição Federal de (BRASIL, 1988)
destaca:
Art. 144. A segurança pública, dever do
Estado, direito e responsabilidade de todos, é
exercida para a preservação da ordem pública
e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(...) V - polícias militares e corpos de
bombeiros militares.
(...) § 5º - às polícias militares cabem a polícia
ostensiva e a preservação da ordem pública;
aos corpos de bombeiros militares, além das
atribuições definidas em lei, incumbe a
execução de atividades de defesa civil.
A segurança e a defesa social constituem
dever do Estado, direito e responsabilidade de
todos, devendo ser exercidas para preservar a
ordem pública, a incolumidade das pessoas, do
patrimônio e, também, com o propósito de
garantir a defesa civil da coletividade, por meio
de um sistema organizacional submetido ao
comando do Governador do Estado (CE, 2007).
Podemos
começar
este
parágrafo,
afirmando que a polícia é uma instituição
responsável pela manutenção do equilíbrio
social. Visto que é responsável pela ordem
pública através do policiamento ostensivo
fardado. E em seus membros é construída uma
espécie de ethos3 e hexis4 aos quais os deveres
policiais militares emanam de vínculos
reacionais que ligam o policial militar à
comunidade estadual e a sua segurança, e
compreendem essencialmente na dedicação
integral ao serviço policial militar e a fidelidade
à instituição a que pertence.
Este vínculo entre o policial e a
comunidade Estadual é também materializado
através do ensinamento aos seus membros
através do culto aos Símbolos Nacionais, a
probidade,
a
lealdade
em
todas
as
circunstâncias, na disciplina e o respeito à
hierarquia, o rigoroso cumprimento das
obrigações e ordens, a obrigação de tratar a
subordinado dignamente e com a urbanidade.
Lévi-Strauss denomina isto de Antropologia
estrutural considerada como sistema lógico ao
qual o homem obedece inconscientemente em
suas instituições e em seus comportamentos.
Outro exemplo prático é o compromisso
que todo cidadão, após ingressar na Policia
Militar, mediante inclusão, matrícula ou
nomeação, prestará um no qual afirmará a sua
aceitação consciente das obrigações e dos
deveres policiais e manifestará sua firme
disposição de bem cumpri-los. Neste eixo, o
compêndio das leis da Polícia Militar do Estado
da Paraíba (PARAÍBA, 2004) destaca:
O INGRESSAR NA POLÍCIA MILITAR (...),
PROMETO REGULAR MINHA CONDUTA
PELOS PRECEITOS DA MORAL, CUMPRIR
RIGOROSAMENTE AS ORDENS DAS
AUTORIDADES
A
QUE
ESTIVER
SUBORDINADO
E
DEDICAR
ME
INTEIRAMENTE AO SERVIÇO POLICIAL
MILITAR, E A MANUTENÇÃO DA ORDEM
PÚBLICA
E
A
SEGURANÇA
DA
COMUNIDADE, MESMO COM O RISCO DA
PRÓPRIA VIDA.
3
Ethos significa o modo de ser, o caráter. Isso indica o
comportamento do ser.
4
São movimentos corpóreos que os sujeitos que exerce
uma determinada prática laborativa realiza quando
exercem, movimentos harmônicos.
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
Esta ideia de manter um sistema com a
própria vida é interpretado pelo sujeito,
máquina simbólica, como um conjunto de
sinais inconscientes estruturados através da
língua para produzir sentido (LACAN, 1966).
Por isso, não se pode desconsiderar a
importância do uso de símbolos ou de imagens
como elementos no ambiente sociocultural
(BURKE, 1994). A partir disso, percebe-se que
as representações, entendidas desta forma,
alteram, influenciam e limitam os meios de
ação sociais.
2.3 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: Um guia
para formulação de um currículo
Ao realizarmos esta pequena distinção
teórica, para este momento passamos a
entender que muito se aplica a caserna e seu
sistema educativo os conceitos formulados
sobre o mundo das representações, privilegiado
a racionalização. Aqui vamos tomar alguns
conceitos de Durkeim ao qual consagrou o
método de reduzir os fatos sociais a coisas,
sabendo que a ciência por natureza é inacabada.
E imbuindo do papel esclarecedor da
temática, a obra segue, dialogando sobre real
papel da polícia militar, utilizando seus saberes
especializados como alto-falante a fim de
aclarar os discursos administrativos que
comandam o trabalho social. E para dar vazão a
essa gama de representações a corporação
policial militar cria uma série de formas de
conhecimento que se manifestam como
elementos cognitivos, tais como: imagens,
conceitos,
teorias
e
material
ideativo
(JODELET,
1985),
sendo
socialmente
elaborados e compartilhados entre os membros
de uma instituição a fim de construir uma
realidade perceptível capaz de possibilitar a
comunicação entre seus membros e a
comunidade. Tal observação, facilita em muitas
ocasiões os discursos que carregam palavras,
mensagens e imagens e ao mesmo tempo
cristaliza as condutas.
Nesta investigação, observa-se que nas
seções que seguem sustentam uma série de
representações sociais em torno da cultura
miliciana ao qual gira o principal problema.
Sendo assim, é de suma importância esclarecer
e limitar o que é representação. E para esta
construção utilizamos como referências os
autores: Kaes, Herzlich, Chartier e Jodelet.
Um bom exemplo de representação social,
disse (KAES, 1968) ocorre quando a imagem da
polícia militar sempre é associada à violência
para o público civil, provocando medo e
desconforto. E sob ponto de vista de seus
membros o cidadão é visto como um inimigo
subversivo, indisciplinado e desobediente. Em
ambas, a imagem o lado figurativo da
representação dá inicio ao um processo de
elaboração
cognitiva
e
simbólica
que
desencadeia comportamentos. “As lutas de
representações têm tanta importância como às
lutas econômicas para compreender os
mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou
tenta impor, a sua concepção do mundo social,
os valores que são os seus, e o seu domínio”
(CHARTIER, 2002, p.17).
Neste ínterim, a identidade dos
componentes impõe-se por um conjunto de
comportamentos convenientes e particulares
com os quais se podem distinguir as pessoas de
uma sociedade dos outros grupos sociais. Não
resta dúvida, que este individualismo constitui
um dos valores especiais da instituição. Na
verdade, conferem um inegável fator de
vínculos, sem os quais não seria possível um
verdadeiro espírito de corpo5. Em favor disto, o
Estatuto dos Policiais Militares do Estado da
Paraíba, lei 3.909/77 revela (PARAÍBA, 2016):
Art. 26 - São manifestações essenciais do valor
policial militar:
I - O sentimento de servir à comunidade
estadual, traduzido pela vontade inabalável de
cumprir o dever policial militar e pelo integral
devotamento à manutenção da ordem pública,
mesmo com o risco da própria vida;
II - A fé na elevada missão da Policia Militar;
III - O civismo e o culto das tradições
históricas;
IV - O espírito de corpo, orgulho do policial
militar pela organização policial militar onde
serve;
V - O amor à profissão policial militar e o
entusiasmo com que é exercida; e
VI - O aprimoramento técnico profissional.
Este contato íntimo de um grupo restrito
estabelece entre seus membros fortes relações
solidárias comparadas a membros de uma
família, laços de associação íntimos e face a
face,
permanência
relativa,
contatos
duradouros. Este espírito de cooperação entre
seus membros é comum e o pundonor policial e
5
O espírito de corpo é o envolvimento de orgulho,
unidade em um propósito comum e de inclinação a um
ideal representado por um grupo primário.
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
impõem a cada um dos integrantes da Polícia
Militar uma conduta moral e profissional
irrepreensíveis. Com a observância dos vários
preceitos da moral familiar, tais como: amar a
verdade e a responsabilidade como fundamento
da dignidade pessoal e zelar pelo bom nome da
instituição e de cada um dos seus integrantes,
obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos da
ética policial militar.
E nesta organização são comuns em salas
de aulas o desenvolvimento do espírito de
cooperação nas formações militares. Sempre
pautadas pelo um número pequeno de pessoas
envolvidas, entre 15 a 20 pessoas com relativa
intimidade ou proximidade física entre os
participantes. Isto é, incrivelmente útil, pois a
filosofia da caserna repousa numa filosofia de
ação, onde um individualismo é aos poucos
colocado de lado, à medida que os integram-se
na corporação, visando extirpar os interesses
egoísticos impostos pela sociedade civil,
contrariando, paradoxalmente a sociedade
individualista.
Ao laissez-faire e ao igualitarismo, a
liberdade do sujeito de viver segundo suas
próprias convicções, sem ter que respeitar as
decisões tomadas por instâncias superiores
(Japiassu, 2012). E ao colocar freio nas paixões
perigosas da sociedade a Polícia Militar é eleita
como guardiã da ordem. E para tal cada sujeito
é construído uma representação capaz de criar
um elã vital que leva os seus membros a agir,
dominar e combater os males de uma sociedade
com excessos de liberdade.
Na investigação de Herzlich (1969)
encontramos que as representações podem ser
entendidas como uma imagem clara construída
através da experiência pessoal onde se integram
os valores de uma comunidade ao qual o
individuo pertence. Um exemplo para esta
formulação é a representação de um líder
político local ao representa a comunidade que
lhes deu um mandato representativo, mas nem
por isso alguém confundirá o político com
qualquer pessoa do local.
O conceito de representação social, diz
Jodelet (1986) e Chartier (2002) destacam:
- Designa uma forma de conhecimento
especifico, o saber de sentido comum, cujos
conteúdos manifestam a operação de
processos gerativos e funcionais socialmente
caracterizados. Em sentido mais amplo,
designa uma forma de pensamento social.
- Constitui uma modalidade de pensamento
prático orientado para a comunicação, a
compreensão e o domínio do
material e ideal. Enquanto
características especificas
organização dos conteúdos,
mentais e da lógica.
entorno social,
tal, apresenta
a nível de
das operações
Seguimos, até aqui, tentando explicar um
conceito, historicamente difícil de se entender.
Porém, um marco conceitual já pode ser
traçado sobre o currículo ao revela um conjunto
de representações que se ordenam, se justificam
e tomam unidade na situação histórica em que
são ou foram construídos (PEDRA, 1997).
A Partir deste ponto, o estudo sobre o
currículo toma forma, independente de como
vamos desenvolvê-lo, ocupa, um ponto
controverso no meio das escolas de formação
policial militar. Assunto que deixa de ser
confinado nos corredores dos Batalhões para
ser tema de domínio Público na sociedade civil.
O interesse da formação dos indivíduos da
corporação associadas a uma série de
representações únicas permite simplificar
algumas escolhas subjetivas em racionais e
maximizar seus resultados. E na defesa dos
interesses legítimos escolhem racionalmente
suas opiniões e crenças. Na medida em que não
obedecem
outros
signos
distintos
do
militarismo, a partir destes constructos os
indivíduos podem ficar seguros de agir em
conformidade.
O currículo como objeto de estudo,
rapidamente encontrou campo fértil no meio
acadêmico, não tendo limites claros, permitiu e
ainda continua permitindo, que sobre o termo,
se organize uma variedade de representações,
ajustando-se sob as mais variadas visões de
mundo (PEDRA, 1997). Não é diferente, e por,
infinitas razões o termo curriculum é uma das
maiores preocupações das instituições policiais
militares em todo Brasil, pois seus pressupostos
esbarram nas filosofia positivista da caserna.
2.4 CURRÍCULO: Uma aproximação
psicopedagógica da prática da caserna
Uma direção mais curta para chegarmos a
um delineamento objetivo sobre currículo
consiste em focalizarmos suas funções e para
isto, convém recordar e remontar situações
problemas e aplicá-las, em conjunto com a
teoria. Esta modalidade de educação se
materializa pela simples observação e
participação nas atividades habituais dos
instrutores, bem como sua observação e
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
imitação. Neste ínterim, o aluno deve primeiro
observar e depois exprimir corretamente o
resultado do que observa, partindo do caso
particular ao geral, do concreto para o abstrato.
Não raro, estas técnicas não são suficientes para
assegurar aos novos membros um aprendizado
adequado.
Para exaltar certa cultura de um grupo as
atividades educativas escolares correspondem à
ideia de que existem certos aspectos
importantes que não poderão ser realizados
satisfatoriamente ou que não ocorrerão de
forma alguma, a menos que seja fornecida uma
ajuda especifica com atividades planejadas para
este fim. São atividades que exigem um
excelente desenvolvimento intuitivo e ao
mesmo tempo equilíbrio emocional na
realização de tarefas complexas, isto delimita
uma educação especial aos quais correspondem
a uma natureza e finalidade social da instituição
executadas de acordo com um plano de ação.
No geral, o passo a passo no processo de
ensino e de aprendizagem perpassa por uma
série de construções planejadas ao qual na
escola militarizada segue em linhas gerais um
rito de fracionamento e compartimentação do
saber. De forma que as atividades rotineiras
levam a todos os discentes das escolas de
formação a um processo de abstração por
imagem simbólica aos quais sempre reza a
disciplina, precavendo-se de decisões criativas,
sempre preservando os princípios basilares da
instituição (MILL, apud AEBLI, 1978).
Neste sentido, a primeira função do
currículo é a de explicar o projeto as intenções e
o plano de ação que preside as atividades
educativas escolares. Imbuída de ser um guia
para os autores de seu desenvolvimento, um
instrumento útil para nortear a prática
pedagógica. Por esta função, não pode limitarse a enunciar uma série de intenções, princípios
e orientações gerais que, por excessivamente
distantes da realidade das salas de aula, sejam
de escassa ou nula ajuda para os professores. O
currículo deve levar em conta as condições reais
nas quais o projeto vai ser realizado, situandose justamente entre as intenções, princípios e
orientações gerais e a prática pedagógica.
É função do currículo evitar o hiato entre
os dois extremos: disso depende, em grande
parte, sua utilidade e eficácia como instrumento
para orientar a ação dos professores.
O currículo, entretanto, não deve
suplantar a iniciativa e a responsabilidade dos
professores,
convertendo-os
em
meros
instrutores de execução de um plano prévia e
minuciosamente estabelecido. Por ser um
projeto, o currículo não pode contemplar os
múltiplos fatores presentes em cada uma das
situações particulares na qual será executado.
Os componentes do currículo, os elementos que
ele contempla para cumprir com êxito suas
funções, podem agrupar-se em quatro partes
distintas:
(1) Proporcionar informações sobre o que
ensinar, “a experiência social culturalmente
aceita”: conceitos, sistemas explicativos,
habilidade, normas, valores e objetivos (os
processos de crescimento pessoal que se
deseja provocar, favorecer ou facilitar
mediante o ensino). (2) Proporcionar
informações sobre quando ensinar, sobre a
maneira de ordenar e dar sequencia aos
conteúdos e objetivos. A educação formal
abrange, com efeito, conteúdos complexos e
inter-relacionados e pretende incidir sobre
diversos aspectos de crescimento pessoal do
aluno, sendo necessário, portanto, optar por
uma determinada sequencia de ação. (3)
Proporcionar informações sobre como
ensinar, isto é, sobre a maneira de estruturar
as atividades de ensino-aprendizagem das
quais participarão os alunos, a fim de atingir
os objetivos propostos em relação com os
conteúdos selecionados (4) Proporcionar
informações sobre que, como e quando avaliar
(CHARTIER, 2002, p. 23).
Na medida em que o projeto corresponde
a certas intenções, a avaliação é um elemento
indispensável que assegura se a ação
pedagógica responde adequadamente às
mesmas e introduz as correções oportunas em
caso contrário. As quatro partes estão
relacionadas
entre
si
condicionam-se
mutuamente, pois tratam de diferentes aspectos
de um mesmo projeto: Um dos problemas
intrínsecos na elaboração do currículo reside
em decidir como concretizar esses diferentes
elementos – mais tarde veremos que são várias
as alternativas possíveis em assegurar a
coerência de todos eles. Em resumo,
entendemos o currículo como o projeto que
preside as atividades educativas escolares,
define suas intenções e proporciona guias de
ação adequadas e úteis para os professores, que
são diretamente responsáveis pela a sua
execução. Para isso, o currículo proporciona
informações concretas sobre que ensinar,
quando ensinar, como ensinar e que, como e
quando avaliar.
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
Em princípio, esta colocação está próxima
da defendida por autores como Stenhouse
(1984) para que um currículo é uma tentativa
de comunicar os princípios e características
essenciais de um propósito educativo, de tal
forma que permaneça aberto à discussão crítica
e possa ser efetivamente transladado à prática.
No que tange a extensão, Stenhouse engloba
duas dimensões as quais compreende a
descrição do projeto educativo quanto à análise
empírica das experiências na sala de aula. Ou
seja, O currículo existe sob dois aspectos: o
desenho do projeto e sua aplicação um
interligado com o outro.
Numa tentativa de aproximar a linguagem
do mundo da caserna com a linguagem dos
profissionais da área de educação. O item ou
termo instrução, habitualmente usado nas
escolas quartéis é utilizado, nesta obra em
sentido amplo, como sinônimo de educação
formal e de escolarização. E em sentido estrito,
para referir-se a transmissão de conhecimento
de determinada habilidade, ensino ou
treinamento (BRASIL, 2005).
Diante da complexidade, e na tentativa
desta obra de apontar um meio equilibrado e
eficiente no processo e de quantificação e
qualificação da elaboração de um projeto
curricular mais adequado para as demandas
sociais. Declinamos nossos olhares para fontes
intencionais que definem tradicionalmente os
objetivos e as respostas formais, seguindo
modas, apontando o ensino reducionista,
natureza e fatores que obrigam a ser como o
currículo é.
Sobre o tema R. Tyler escreveu várias
obras ao qual nos leva a selecionar,
criteriosamente, os objetivos. Sob este olhar, a
escolha do ponto de vista mais adequado podese basear em várias perspectivas, seja social,
existencial ou social, etc. De tantas, laçamos
mão de três bases: a primazia psicológica, a
epistemologia das disciplinas e a análise
sociológica, como fontes dos objetivos, mas
nenhuma delas sozinha é suficiente (COLL,
1987).
Sob a análise sociológica, o aluno soldado
após o curso de formação torna-se um membro
ativo da corporação e ao mesmo tempo um
sujeito da produção da cultural da instituição
militar, não permitindo, ao longo de sua
carreira o declínio das tradições, ritos,
representações, signos, linguagem típicas da
profissão.
A análise epistemológica das disciplinas
contribui para separar e priorizar os
conhecimentos em principais e secundários a
fim de tecer uma relação entre elas, e suas
sugestões são importantes para estabelecer uma
sequencia de atividades de aprendizagem que
promovam o aprendizado e o máximo de
assimilação significativa (BRASIL, 2005).
Já, a análise psicológica oferece e
desmonta os mecanismos disparadores mentais
no processo de evolução cognitiva na obtenção
de habilidades, ajudando a planejar ações
pedagógicas nas pratica educativa. Diante de
tudo isto, não podemos esquecer a própria
prática pedagógica do docente.
2.5 COMPORTAMENTO, PROCESSOS
MENTAIS E CURRÍCULO
A questão das contribuições da psicologia
em relação ao currículo e, em geral, à educação
escolar é muito complexa e não pode ser
abordada aqui com o detalhamento que exigiria
um tratamento correto. Nosso objetivo, muito
menos ambicioso, consiste em ressaltar alguns
aportes para melhor definir a importância de
um currículo bem desenhado para surtir efeitos
desejados na formação dos soldados da Polícia
Militar. Assim, esclarecemos que o que vem a
seguir não passa de uma seleção do autor e dos
orientadores e, como tal, existe o consenso de
que sempre será incompleta.
No momento atual, ainda não arranjamos
de uma teoria abrangente da cultura
educacional militar como alicerce empírico e
teórico satisfatório para ser utilizada como
fonte de informação. E nem a psicologia da
educação ainda não dispõe de demarcações
doutrinárias padronizadas e coerentes que
permita envolver as diversas e complexas
interfaces implicadas nos processos de
crescimento sócio cultural e a total influencia
exercida no sujeito pelas atividades educativas
escolares.
Temos, porém, neste trabalho um capítulo
dedicado as várias quantificações e a análise de
múltiplos dados e algumas teorias que
acomodam informações parciais pertinentes. A
dificuldade reside em que comumente nesses
aportes não são fáceis de integrar, pois
obedecem a concepções distintas sobre
cognitivismo do individuo. E nesta diversidade
de construções, a opção escolhida para as
próximas linhas foi fugir do ecletismo e do
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
É
importante
ressaltar
que
essas
competências possuem uma relação estreita
com os eixos ético, legal e técnico que, de
acordo com Balestreri (1998), estão presentes
na formação do profissional da Área de
Segurança Pública; com os Quatro Pilares da
Educação propostos pela UNESCO: aprender
a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e
aprender a conviver; e com as dimensões do
conhecimento: saber, saber fazer e saber ser
(BRASIL, 2005).
O marco de referência está delineado
sobre enfoques cognitivos em sentido amplo. Os
Vygotsky, Luria,
Leontiev e
Davydov
M. Cole, Bruner e
Gottlieb
D. P. Ausubel
Anderson,
Norman,
Rumelhart,
Minskkv etc.
SABER (conhecimentos)– expressam os
conteúdos conceituais que o profissional de
Segurança Pública deve saber em relação ao
campo disciplinar: leis, princípios e saberes
sistematizados.
SABER FAZER (habilidades e conteúdos
procedimentais) – indicam as habilidades
operativas e de pensamento que o profissional
de Segurança Pública precisa demonstrar em
relação ao campo disciplinar: métodos,
técnicas, procedimentos; bem como as
habilidades de pensamento: observação,
análise, síntese.
SABER SER (atitudes) – expressam os
conteúdos atitudinais – os valores, as crenças,
as atitudes que serão fortalecidas pelas
situações vivenciadas dentro do campo
disciplinar em questão (BRASIL, 2003).
Segue na Tabela abaixo a ilustração dos
trabalhos e teorias da psicologia envolvida na
construção do currículo escolar adotadas no
Curso de Formação de Soldados:
TEORIA
PSICOLÓGICA
A teoria da atividade
Psicologia cultural
A teoria da
aprendizagem verbal
significativa
As teorias dos esquemas
CONHECIMENTO
PILARES DA EDUCAÇÃO
AUTORES
objetivos deverão ser descritos obedecendo-se
às dimensões do conhecimento:
aprender a
aprender
aprender a fazer
aprender a ser
aprender a
conviver
83
Saber
DIMENSÕES DO
CONHECIMENTO
excesso teórico de uma escola ou teoria
psicológica.
Nossa bússola para navegação é um
aglomerado de teorias e explicações que,
embora dispersas em numerosos pontos,
consagram uma recorrência de princípios
comuns. Estes princípios são os que devem ser
mantidos no projeto curricular do curso de
formação de soldados conforme a Matriz
Curricular dos Profissionais de Segurança
Pública destaca:
Saber fazer e
ser
Saber ser
Saber ser e
fazer
Fonte: BRASIL, 2009
A priori estes trabalhos reúnem princípios
comuns e não contraditórios entre si desses
enfoques, seguimos de maneira sucinta por
razões de brevidade, aqui vão ser apresentadas
princípios gerais que perpassam todo o projeto
curricular e encontram um caminho lógico na
tentativa de entender a concretização de seus
elementos, nas decisões relativas à sua
estrutura formal e nas sugestões relativas ao seu
desenvolvimento e aplicação.
2.5.1 Principais contribuições de Vygotsky,
Leontiev e Davydov para o plano curricular
A teoria da atividade ou teoria material
dialético
consiste
em
explicar
o
desenvolvimento psicológico humano no
processo de apropriação da cultura mediante a
comunicação e as funções psíquicas que se
desenvolvem através das relações interpessoais
e em seguida pela atividade individual, mediada
pela consciência. No processo de internalização
da atividade há a mediação da linguagem, em
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
que os signos adquirem significado e sentido
(VYGOTSKY, 1984).
Ou seja, os alunos recrutas apenas
aprendem como desenvolver suas habilidades
tendo contato com outros policiais mais
experientes,
desenvolvendo
conteúdos
conceituais e ainda praticando atividades
policiais através de experiências adquiridas em
situações
problemas
e
role
playing,
demonstrações e etc... dentro da sala de aula ou
em estágios supervisionados6, resultando em
conhecimentos incorporados inconsciente de
certos padrões, ideias, atitudes, práticas,
personalidade ou valores dos membros da
caserna.
2.5.2 Principais contribuições da Psicologia
Cultural para o plano curricular do Curso de
Formação de Soldados
dúvida, frequentemente ajustado as exigências
das novas situações de aprendizagem. Diante
deste eixo, é necessário escolher a sequência
dos conteúdos, de como abordar cada disciplina
são questões fundamentais para o sucesso na
formação policial, sempre pautado de uma
estrutura que leve o aluno do estado menor
nível para o de maior abstração e resolutividade
de situações problemas.
Faz-se necessário criar situações didáticas
variadas, em que seja possível retomar os
conteúdos
abordados
em
diversas
oportunidades. Isso implica um projeto que
debele diversas modalidades organizativas, tais
como:
projetos
didáticos,
atividades
permanentes e sequências didáticas. Sem
esquecer a contínua e sequenciada apresentação
de símbolos e rituais militares capazes de
inculcar o hexis e ethos militar.
Por certo, a psicologia cultural é o estudo
da maneira pela qual as tradições culturais e
práticas
sociais
regulam,
expressam,
transformam e permutam a psique humana. E
esta maneira especial de dá atenção aos desejos,
sentimentos, pensamentos e valores é a forma
de delinear uma classe de membros, e a partir
disto são requeridos todas às vezes para o
reconhecimento na corporação.
Logo, as práticas cotidianas de uma
comunidade, historicamente reconhecida têm a
habilidade de inculcar aos novos membros suas
tradições numa tentativa de perpetuação. Sob a
batuta de M. Cole, Bruner e Gottlieb a
psicologia social tornou-se um campo
interessante na relação dos símbolos e
significados. Supõe-se que o funcionamento
mental é uma propriedade que emerge como
resultado de experiências simbólicas mediadas
por comportamentais e ideias acumuladas,
historicamente.
Doravante, o currículo dos membros da
corporação militar constitui-se em parte de
ritualística,
tornando-se
um
poderoso
instrumento de transmissão de cultura, sem
2.5.3 Principais contribuições da teoria da
aprendizagem verbal significativa
Estágios supervisionados - Esta fase do
aprendizado deve propiciar a complementação do
ensino e da aprendizagem, em conformidade com os
currículos, programas e calendários escolares, a fim
de se constituírem em instrumentos de integração,
em termos de treinamento prático, aperfeiçoamento
técnico-cultural-cientifico
de
relacionamento
humano, Lei Federal nº 6.494/77.
2.5.4 Principais contribuições da Teoria dos
esquemas para o plano curricular do Curso de
Formação de Soldados
6
A
retumbância
das
experiências
educativas formais sobre o desenvolvimento
subjetivo do aluno também está dependente
pelas informações prévias relacionadas com as
quais inicia sua participação nas mesmas
(AUSUBEL, 1977; REIF & HELLER, 1982).
Tais quais esses conhecimentos podem
ser decorrência de experiências educacionais
prévias, do mesmo modo podem estar mais ou
menos acomodados às requisições das novas
situações de aprendizagem. Em qualquer caso,
não existe nenhum equívoco de que o aluno que
inicia uma nova aprendizagem o faz a partir dos
conceitos, concepções, representações e
conhecimentos que estabelece em sua
experiência anterior, utilizando-os como
máquina de leitura e interpretação que
condicionam o fruto da aquisição.
É preciso, portanto, analisar o desenho
muito no estabelecimento de sequência de
aprendizagem, porém ele também possui
implicações para o processo do ensino e para a
avaliação.
O arcabouço cognoscitivo do aluno, cuja
função central na efetivação das aprendizagens
significativas foi observada anteriormente, pode
ser concebida como um conjunto de esquema
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
de
conhecimento
(ANDERSON,
1977;
MERRILL et ali, 1981; HEWSON & POSNER,
1984).
Os esquemas são “um conjunto
organizado de conhecimento [...], podem conter
tanto conhecimento como regras para utilizá-lo,
podem estar compostos de referências a outros
esquemas [...], podem ser específicos [...] ou
gerais” (ANDERSON, 1977; MERRILL et ali,
1981; HEWSON & POSNER, 1984).
Os esquemas são estruturas de dados para
representar conceitos genéricos armazenados
na memória aplicáveis a objetivos, situações,
acontecimentos, sequências de acontecimentos,
ações e sequências de ações. Os díspares
esquemas de conhecimento que cultivam a
estrutura
cognoscitiva
podem
manter
afinidades de extensão e complexidade diversas
entre si.
Todos os lugares atribuídos à estrutura
cognoscitiva do aluno na realização de
aprendizagens sugerem inteiramente os
esquemas de conhecimento: a nova informação
adquirida é contida na memória mediante sua
inclusão e apropriação a um ou mais esquemas;
a obras das aprendizagens anteriores é alterada
pela construção de novos esquemas: assim, a
memória é construtiva; os esquemas podem
induzir a nova informação forçando-a a
acomodar-se às suas exigências; os esquemas
permitem fazer inferência em situações novas;
os
esquemas
integram
conhecimentos
puramente conceituais com habilidades,
valores, atitudes etc.
Com isso, pode-se concluir que aprender a
avaliar e a modificar os próprios esquemas de
conhecimento é um dos componentes essenciais
do aprender a aprender (DICK, 1983).
3 CONCLUSÃO
As transformações dos esquemas de
conhecimento dos alunos soldados seguem pelo
caminho cognitivo da revisão, enriquecimento,
diferenciação, construção e coordenação
progressiva, tendo o objetivo da formação
forjando-os
no
modelo
de
educativo
militarizado
podemos
caracterizar
a
modificação dos esquemas de conhecimento no
contexto militar como um processo de
equilíbrio
inicial/desequilíbrio/reequilíbrio
posterior (COLL, 1983).
Um dos primeiros passos para alcançar o
êxito no aprendizado significativo consiste em
romper o equilíbrio inicial de seus esquemas
com
relação
ao
novo
conteúdo
de
aprendizagem.
Sobre este tema as corporações policiais
militares brasileiras adotam um rito de
passagem de certa forma institucionalizada e
regulada que configuram uma categoria
destacada diferente de passagem ou iniciação.
Este mesmo evento desencadeia um conjunto
de tarefas que levam a exaustão, mudança
brusca de comportamento e mudança no
mecanismo psicológico do novo aluno policial.
Estes eram os ritos de iniciação7 dos xamãs ou
dos heróis. Após a travessia incólume pela
experiência traumática, que poderia ter
provocado a sua morte, os mesmos são
consideradas como pertencendo a uma classe
especial. Um apoderamento do Estado e a
morte do “eu”. As exigências desta ritualística
rompem o equilíbrio inicial do aluno, pois a
utilização de incentivos motivacionais favorece
um desequilíbrio ótimo.
O construtivismo se refere à reunião das
correntes psicológicas mencionadas nesta obra,
porém não tendo obrigatoriedade de uma
relação de complementação. Para o autor, o
Construtivismo é uma teoria a respeito do
processo ensino e aprendizado. Uma construção
do conhecimento sob os olhares da psicologia é,
sem dúvidas inconciliável com a concepção de
transmissão de conhecimentos por depósitos.
Ela exige uma interpretação imaginativa por
parte docente de uma casa em construção feita
tijolo a tijolo, começando por um alicerce.
E neste constructo a viga base consiste em
criar as condições adequadas para que os
esquemas de conhecimento sejam construídos
pelo aluno no decorrer das suas experiências
sejam os mais corretos e ricos possíveis.
Entretanto, uma concepção construtivista
de intervenção pedagógica não renuncia a
formular prescrições concretas para o ensino
nem a planejar cuidadosamente as atividades
de ensino aprendizagem. Uma ideia dessa
estirpe também se impõe às questões
tradicionais do projeto curricular, tais como:
avaliações, metodologia, didática, objetivos
gerais, específicos, conteúdos, estabelecimento
de sequência de aprendizagem e etc. Contudo
7
O ritual de passagem, como indica o termo, simboliza a
passagem de um grupo para outro, ou seja, o
desligamento do indivíduo de seu antigo grupo para a sua
inclusão em um outro. Como exemplos de nossa
sociedade, temos a “festa de 15 anos” e a “despedida de
solteiro”.
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Uma abordagem psicopedagógica do currículo do curso de formação de soldados
cada elementos adquirem uma dimensão
diferente quando abordadas sob a ótica
construtivista.
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