LÍNGUA MATERNA – 3º ano

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Objetivo Pedagógico e Metas de Ensino de uma Escola Waldorf - Tobias Richter
LÍNGUA MATERNA – 3º ano
ASPECTOS PRINCIPAIS E METAS PEDAGÓGICAS GERAIS DO 1° AO 8° ANO
RUDOLF STEINER ATRIBUIU GRANDE IMPORTÂNCIA A TUDO QUE SE RELACIONA ao ensino da língua
materna. No abrangente capítulo do seu "O estudo geral do Homem" dedicado ao homem como ser falante,
diz em certa passagem: "A fala é movimento transformado do ser humano e equilíbrio transformado do ser
humano".
Rudolf Steiner apontava, por meio de muitos fenômenos, para as relações que existem entre o aprendizado
do andar da criança pequena e a maneira como ela aprende a falar. Quando ela procura passar do rastejar a
posição ereta, o desejo de fazê-lo nasce das forças da imitação que se orientam nos adultos ao redor. Mas a
capacidade de corresponder a esse desejo tem sua origem no cerne espiritual do indivíduo, em seu eu. "É o
eu que coloca o ser humano na vertical...". (Rudolf Steiner, Op. cit.) Através desse processo ocorre "a
integração espacial do ser humano, a orientação ... de uma forma que todo o equilíbrio do próprio
organismo e de todos os seus possíveis movimentos se integra no equilíbrio e nos possíveis movimentos do
universo, na medida em que dele fazemos parte. Enquanto aprendemos a andar, procuramos aquela posição
de equilíbrio em relação ao mundo própria do ser humano."
Algo parecido acontece quando a criança aprende a falar; ela vem a fazer parte do ambiente anímico,
procura encontrar sua "vertical" e as várias maneiras de movimentar-se neste ambiente.
O equilíbrio estabelece-se entre forças opostas (gravidade — superar a gravidade) ou direções (em cima em baixo, frente - trás; direita - esquerda). Mas pode também ser conquistada através do antagonismo e da
combinação de âmbitos diferentes. Manifestações desse tipo estão ligadas à fala de várias maneiras: há o
falar e o escutar; existem na fala um elemento plástico, relacionado à formação dos fonemas, e um
elemento rítmico-melodioso, um elemento musical, que permeia palavras e frases. Existem ainda os dois
âmbitos que mais caracterizam, cada um de sua maneira, a língua: a palavra poética (conhecida desde
tempos mais remotos em mitologias e textos de cultos antigos) e formas e estruturas lingüísticas - que
formam os textos, mas são algo especial, algo à parte.
É dentro dessa variedade que a criança passo a passo se habitua, através do desejo de se sentir à vontade,
de vivenciar a harmonia no equilíbrio para poder criar cada vez mais o seu próprio campo: sua linguagem. Ao
começar a aprender a falar, predomina o anseio - inconsciente - de encontrar o equilíbrio entre as próprias
manifestações e a recepção de comunicados e mensagens faladas do seu ambiente, as quais devem
estimular a criança a expressar-se de forma própria. Aqui, como sempre, vale: quanto mais os lados opostos
medem suas forças, mais se estende o "meio-campo", pois a fala se torna mais eficiente e convida a criança
a servir-se dela. Aquilo que vive em boas rimas infantis - a alegria nos fonemas (vogais e consoantes) por um
lado, ritmo e melodia da entoação do outro - deve ser ampliado, de acordo com a idade da criança, em
poesias, baladas, na prosa artística e nos primeiros exemplos dramáticos; ao mesmo tempo deve ser cada
vez mais diversificado e conscientizado. Um pólo é, portanto, constituído pelo conjunto da "poesia"; a
observação da estrutura da língua e a gramática correspondem ao outro. Aquilo que surge do vai e vem, da
força de ambos, se apresenta como capacidade da comunicação oral, como conversa e como afirmação da
própria personalidade por meio da fala.
Quando a criança em idade escolar apresenta deficiências nesse meio-campo, quando não gosta de falar ou
o faz de maneira rudimentar, pode parecer indicado corrigir esse defeito lá onde se manifesta, ou seja,
procura-se, através de um esforço, preencher o meio-campo fraco e raso. Mas a pedagogia Waldorf segue,
desde há muito tempo, um caminho diferente: ela procura vivificar e fortalecer os dois pólos. Desde o
primeiro dia escolar ela se esforça de militas maneiras a treinar e desenvolver a sensibilidade de todos os
aspectos artísticos da fala. — No terceiro ano começa então o ensino da gramática que ocupa um grande
espaço. Todo o resto (a capacidade de recontar uma história, de descrever, a ampliação do vocabulário, a
capacidade de ler e a segurança na ortografia) é treinado no espaço intermediário entre os dois pó-los,
alimenta-se do "equilíbrio" entre os dois, sendo determinado, ora mais por um, ora mais pelo outro.
Esta observação preliminar explica porque o currículo do 1° ao 8° ano é dividido, a seguir, entre os grupos de
"cultivo e educação da fala", "gramática" e "expressão oral e escrita". (Isso inclui o ensino inicial, redação,
ortografia, vocabulário etc.) Os "critérios e princípios" ocupam bem mais espaço que os "possíveis
conteúdos".
3° ANO
CULTIVO E EDUCAÇÃO DA FALA
No decorrer do 3° ano, as crianças dão um passo importante em seu desenvolvimento. O professor o
percebe claramente quando um número maior de alunos passa do 9° ano de vida para o 10°. Rudolf Steiner
aponta repetidamente para a importância desse passo: "A criança vem a distanciar-se, cada vez mais, do seu
mundo ambiente."
Mais intensamente do que antes, a sensação do eu se transformação em consciência do eu. "O inconsciente
da criança testa o professor de maneira incrível... Ela o examina para saber se ele realmente traz o mundo
em si."
A criança quer ter a "convicção emocional": "Sim, (o professor) sabe muito mais do que até agora pensei!...
O professor é capaz de crescer".
O currículo leva em conta essa situação peculiar do desenvolvimento infantil, "colecionando", de um lado,
aquilo que já foi treinado e aprendido, aperfeiçoando-os e, de outro lado, apresentando aspectos
inteiramente novos.
Na parte rítmica, poesias sobre a natureza são adequadas, pois correspondem ao estado anímico das
crianças. Ainda é cedo para a poesia romântica. Mas elas gostam de recitar poesias mais narrativas,
mormente quando seu ritmo e rima ressoam com leveza. Já se pode exigir das crianças obras maiores. Mas
nunca se deveria deixar de lado poesias engraçadas. Das épocas de ciências práticas desse ano (construção
da casa; preparação de argamassa, atividades artesanais como um todo; o trabalho rural) podem resultar em
textos, eventualmente alguns redigidos pelo próprio professor; p. ex. em forma versos rimados. Pequenas
peças de teatro são possíveis.
O conteúdo da hora do conto constitui-se de histórias do Antigo Testamento. A criação do mundo e do ser
humano - o ser que recebeu de Deus a terra como campo para a atuação humana - dirigem o olhar à
natureza criada. É o professor de classe que determina e escolhe o que vai contar sobre os acontecimentos
que se seguem à expulsão do paraíso - considerando também as grandes figuras de Noé, Abraão, Moisés etc.
Todavia, é imprescindível que mantenha, através da linguagem poderosa do Antigo Testamento, os fatos na
altura e na distancia que convém ao seu verdadeiro caráter. Ao escutar e recontar os alunos enriquecem sua
sensibilidade em relação a mais um elemento estilístico. - Existe para este ano escolar um livro de leitura
com o título: "E Deus falou." Encontram-se aspectos interessantes também nas lendas judaicas.
LINGÜÍSTICA (GRAMÁTICA)
O 3° ano traz a primeira época de gramática. É bom colocá-la no segundo semestre, quando a maioria dos
alunos já atravessou o limiar dos nove anos.
Rudolf Steiner forneceu impulsos inteiramente novos para o ensino da gramática, esperando sempre que
fossem realizados e que pudesse vê-los concretizados. Essa mudança não foi fácil para os professores presos
ainda às antigas concepções gramaticais. Testemunha disso são as últimas reuniões das quais ele podia
participar. Mas a pedagogia Waldorf deve algumas indicações preciosas ao seu descontentamento depois de
ter assistido a algumas aulas. - Uma delas foi feita na conferência de 06/02/1923. Rudolf Steiner aponta,
então, para o que ele chamou de fundamento para uma "gramática viva": as crianças deveriam poder se
ligar emocionalmente com tudo que aprendiam a designar por termos (alemães ou latinos), deveriam "sentir
a natureza de um tempo perfeito, de um presente". Essa exigência pressupõe os conhecimentos necessários,
mas estes não são suficientes para o que se pretende em termos pedagógicos.
A primeira época já começa com uma inovação na didática da gramática. Rudolf Steiner estimulou este início
numa observação já parcialmente citada acima (vide pp. 49; 60; 66) Ali se falou a respeito da formação de
uma sensibilidade estilística, "se possível até o 9° ano de vida". Mais adiante, Rudolf Steiner continuou:
"Nós o conseguimos quando levamos à consciência da criança a diferença entre uma oração afirmativa, uma
interrogativa e uma emotiva, e se fizermos com que ela pronuncie a oração emotiva com uma entonação
diferente de uma afirmativa; conseguimos isto se alertamos a criança para o fato de que a oração afirmativa
se fala de uma maneira neutra, indiferente, que a oração emotiva se fala (...) com um certo colorido
emocional, se trabalhamos em direção a esse elemento artísti-co da fala, e se desenvolvermos , somente a
partir do elemento artístico, os aspectos gramaticais e sintáticos."
Esse tema volta, em muitas variações, até o fim do 8° ano (e ainda mais adiante!): desenvolver o mundo
todo das formas gramaticais a partir do elemento artístico — com ajuda do sentimento.
Rudolf Steiner se refere à oração "declarativa" denominando-a de oração "afirmativa". A descrição "neutro,
falado com indiferença" o confirma inequivocamente. Mas a enumeração de Rudolf Steiner difere das
tradicionais claramente no terceiro tipo de orações: "oração emotiva". Em seu lugar figura geralmente a
"oração imperativa". Este não é o momento para discutir sobre a legitimidade da classificação dos tipos de
orações de Rudolf Steiner. (22) Na prática, a oração emotiva é uma fonte de interesse e alegria nas aulas.
Além disso, oferece, como acesso a toda gramática, a oportunidade de despertar, diferenciar e intensificar a
sensibilidade das crianças. - Os três tipos de oração são o único assunto da primeira época (durante
aproximadamente duas semanas). Ao lado dos dois outros tipos de oração, e pela comparação com eles, fica
presente que o ganho cognitivo decorre exclusivamente do aspecto artístico: entoação, acentuação, melodia
apontam para a forma gramatical.
Uma segunda época introduz as três principais classes de palavras: o substantivo, o adjetivo e o verbo. As
crianças devem ficar conscientes de que essas classes existem. A novidade reside na maneira como, de
acordo com Rudolf Steiner, o professor de classe deve se preparar para dar essa época.
"Tudo que se exprime por meio de substantivos., nos torna conscientes da nossa autonomia como seres
humanos. Aprendendo a designar as coisas por meio de substantivos separamo-nos do mundo exterior. ... É
muito diferente quando caracterizamos os objetos por meio de adjetivos. Quando digo: a cadeira é azul exprimo algo que me une com a cadeira. A qualidade por mim percebida me liga à cadeira. ... Ao pronunciar
o verbo: o homem está escrevendo - eu não me ligo, apenas, ao ser de cuja atividade estou falando, eu
participo daquilo que o outro faz com o seu corpo físico, ... o meu eu toma parte nisso."
É uma abordagem insólita de aproximação ao assunto "classes de palavras". Rudolf Steiner a justifica da
seguinte maneira:
"Sabendo isso, ... os senhores falarão de substantivos, adjetivos e verbos com um timbre interior bem
diferente do que se não estivessem conscientes disso."
Disso resulta que, em vez de almejar a integração num sistema (classes de palavras), a atenção é dirigida ao
ser humano com a pergunta: qual é o efeito da fala sobre o homem quando lhe são oferecidas as três classes
principais de palavras? Como é que a fala ajuda ao ser humano, através do que foi dito, para que este tenha
consciência da sua situação em relação ao mundo exterior? A tarefa, que resulta das palavras de Rudolf
Steiner para o professor, obviamente diz respeito ao professor e não às crianças. Estas apenas ouvem a
"entoação muito diferente", a qual, porém, não deixa de marcar o ensino. É importante criar um ambiente
onde as crianças podem experimentar que na sua língua, na sua fala há substantivos, adjetivos e verbos.
Um princípio válido para todos os exercícios e também para a introdução de qualquer assunto é evitar
buscar exemplos "interessantes", e muito menos em poesias ou outro tipo de "literatura"! Isso apenas
desviaria o olhar da forma gramatical a ser descoberta. É ela que deve tornar-se interessante. - Convém
partir de uma realidade, existente ou imaginada, e contemplá-la formulando estas perguntas: o que é que
existe? Como são as coisas? O que faz isso ou aquilo? Para se conseguir uma verdadeira compreensão, um
campo de observação não será suficiente para fazer compreender que, como respostas às nossas perguntas,
recebemos os nomes das pessoas, animais, objetos (substantivos); que sabemos como são (adjetivos) e,
finalmente, o que fazem (verbos). Nos exercícios, o emprego de rimas pode ajudar e tornar a aula mais viva.
Um passo seguinte é a observação da transformação do substantivo (declinação) e do verbo (conjugação).
Enigmas são expostos com o emprego dos pronomes interrogativos: "Quem? De quem? A quem?" Exemplos:
Quem existe apenas enquanto se move e mexe? A forma de quem ainda ninguém viu? A quem a mãe
entrega sua roupa molhada para secar? Quem sinto ao meu redor embora não o possa pegar? -Quem: o
vento; a forma de quem ...? a forma do vento; A quem: ao vento. Quem (complemento direto): o vento ... —
Aqui não pode haver enigmas demais, o professor precisa de muita criatividade!
Ainda não é dado um nome (termo técnico) às diferentes formas nem ao processo inteiro; os alunos
aprendem apenas as transformações e a relação correta entre perguntas e respostas. - Esta observação se
aplica também ao primeiro contato com a conjugação.
EXPRESSÃO ORAL E ESCRITA - ESCRITA E LEITURA
Pela introdução da letra cursiva, a escrita da criança chega à fase em que se pode realmente considera-la
uma escrita. A nova técnica pode induzir algumas crianças a escrever "como os adultos" e com isso
entendem escrever "com pressa", dando, às letras, formas rabiscadas e garatujadas. É preciso reagir contra
isso. - Para treinar as novas letras, entrelaçadas para formar uma palavra, convém usar cadernos com pautas
delicadamente coloridas que indicam os limites da faixa do meio e dos tamanhos máximos das letras, em
cima e em baixo. A observação desses três limites já era necessária na justaposição de letras maiúsculas e
minúsculas na escrita impressa, mas ainda podia, naquele período, ser feita sem muito rigor. Neste
momento, a mão da criança se acha diante de uma nova incumbência. É decisivo, nesta fase, que o professor
dirija a consciência dos alunos para a necessidade de observar atentamente a posição e o movimento da
mão; ao mesmo tempo, os olhos devem controlar se aquilo que aparece, também é bonito. Rudolf Steiner
chama isso de "escrever pintando", onde o escrevente "dirige seu olhar sempre à escrita" e tem , "em
relação à própria escrita, uma postura 'estética', ainda que discreta". Após um período de treino
suficientemente longo, as crianças podem usar uma caneta tinteiro. Isso oferece a oportunidade de se
verificar e melhorar, mais uma vez, toda a postura. É necessário frisar expressamente que a escrita deve ser
bonita porque o escrevente quer exprimir seu respeito àquele que vai lê-la, apresentando-lhe letras e
palavras bem escritas.
Na leitura, ler em voz alta se torna cada vez mais importante e precisa ser treinado.
A ortografia passa a merecer atenção maior do que antes. Escrever "corretamente" significa obedecer às
convenções estabelecidas pelos homens no sentido de facilitar a leitura. Esse aspecto "social" da ortografia
precisa ser enfatizado. A pronuncia clara e integral daquilo que é falado é importante também para a
ortografia. É pelo ouvido que se treina a capacidade de distinguir os fonemas.
"As capacidades se auxiliam reciprocamente... Adquire-se uma tendência de memorizar também a imagem,
a imagem interior quando se tem o costume de escutar atentamente." E convém acrescentar: isto ocorre
quando nos acostumamos a pronunciar cada palavra corretamente até a última sílaba.
Os exercícios de ortografia deverão ainda, por longo tempo, ser cautelosamente separados daquilo que as
crianças (alegres em decorrência de sua nova conquista) anotam espontaneamente, tal como cartinhas ou
também como histórias recontadas e cuidadosamente preparadas.
A nova escrita, o escrever fluente, permite -o registro de textos mais longos, inclusive nos cadernos de época
das várias matérias. É o professor de classe que redige os textos que serão repassados nestes cadernos; são
esses textos que, em parte, servem para a leitura.
As primeiras "redações" aparecem no 3° ano em forma de resumos diligentemente preparados. Ao mesmo
tempo, os alunos se exercitam na redação de cartas.
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