A Crise na Europa e seus efeitos sobre o Brasil Arquivo

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A Crise na Europa
A indisciplina fiscal e o descontrole das contas públicas em países da zona do euro, em
particular na Grécia, arrastaram o bloco para uma crise financeira sem precedentes.
Após a revelação de que os gregos maquiavam seu nível de endividamento, títulos
soberanos de diversos países da zona do euro foram rebaixados pelas agências de
risco, e a moeda comum caiu ao nível mais baixo em quatro anos. Para tirar a Grécia
do buraco, União Europeia e FMI impõe um duro e impopular plano de austeridade, a
que condicionam o socorro financeiro.
Eliminar da zona do euro economias em recessão - mas de grande importância, como
a Itália - resultaria em conflitos diplomáticos incalculáveis naquela região
A Europa, sempre lembrada como uma região de altíssimo desenvolvimento
econômico e bem-estar social, agora tem sua imagem associada a turbulências de
mercado. Entenda como o descontrole das contas públicas e as particularidades
políticas do continente conduziram a zona do euro a uma crise financeira que levará
anos para ser totalmente superada.
1. Por que a Europa passa por uma crise?
A formação de uma crise financeira na zona do euro deu-se, fundamentalmente, por
problemas fiscais. Alguns países, como a Grécia, gastaram mais dinheiro do
conseguiram arrecadar por meio de impostos nos últimos anos. Para se financiar,
passaram a acumular dívidas. Assim, a relação do endividamento sobre PIB de muitas
nações do continente ultrapassou significativamente o limite de 60% estabelecido no
Tratado de Maastricht, de 1992, que criou a zona do euro. No caso da economia grega,
exemplo mais grave de descontrole das contas públicas, a razão dívida/PIB é mais que
o dobro deste limite. A desconfiança de que os governos da região teriam dificuldade
para honrar suas dívidas fez com que os investidores passassem a temer possuir
ações, bem como títulos públicos e privados europeus.
2. Quando os investidores passaram a desconfiar da Europa?
Os primeiros temores remontam 2007 quando existiam suspeitas de que o mercado
imobiliário dos Estados Unidos vivia uma bolha. Temia-se que bancos americanos e
também europeus possuíam ativos altamente arriscados, lastreados em hipotecas de
baixa qualidade. A crise de 2008 confirmou as suspeitas e levou os governos a
injetarem trilhões de dólares nas economias dos países mais afetados. No caso da
Europa, a iniciativa agravou os déficits nacionais, já muito elevados. Em fevereiro de
2010, uma reportagem do The New York Times revelou que a Grécia teria fechado
acordos com o banco Goldman Sachs com o objetivo de esconder parte de sua dívida
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pública. A notícia levou a Comissão Européia a investigar o assunto e desencadeou
uma onda de desconfiança nos mercados. O clima de pessimismo foi agravado em
abril pelo rebaixamento, por parte das agências de classificação de risco, das notas
dos títulos soberanos de Grécia, Espanha e Portugal.
3. Quais países se encontram em situação de risco na Europa e por quê?
Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - que formam o chamado grupo dos PIIGS são os que se encontram em posição mais delicada dentro da zona do euro, pois foram
os que atuaram de forma mais indisciplinada nos gastos públicos e se endividaram
excessivamente. Além de possuírem elevada relação dívida/PIB, estes países
possuem pesados déficits orçamentários ante o tamanho de suas economias. Como
não possuem sobras de recursos (superávit), entraram no radar da desconfiança dos
investidores. Para este ano, as projeções da Economist Intelligence Unit apontam
déficits/PIB de 8,5% para Portugal, 19,4% para Irlanda, 5,3% para Itália, 9,4% para
Grécia e 11,5% para Espanha.
4.Por que o bloco europeu não consegue regular sua política fiscal como os
Estados Unidos, por exemplo?
Apesar de ter um órgão responsável pela política monetária, o Banco Central Europeu
(BCE), que estabelece metas de inflação e controla a emissão de euros, a União
Européia não dispõe de uma instituição única que monitora e regula os gastos públicos
dos 16 países-membro. Dessa maneira, demora a descobrir os desleixos
governamentais e, quando isso acontece, inexistem mecanismos austeros de punição.
Em 1999, os países da região encerraram um ciclo de discussões chamado Pacto de
Estabilidade e Crescimento. Em resumo, as nações comprometeram-se com a questão
do equilíbrio fiscal. Àquelas altamente endividadas ficou a imposição de apresentar
„planos de convergência‟ para patamares de dívida mais aceitáveis. As sanções seriam
recolhimentos compulsórios e multas. Contudo, sua aplicação não seria automática,
ficando na dependência de uma avaliação pelo Conselho Europeu. A política mostrouse insuficiente para controlar os gastos públicos dos PIIGS.
5.A crise financeira pode afetar a economia real da Europa?
A desconfiança em relação à Europa pode disseminar pânico no mercado e fazer com
que bancos fiquem excessivamente cautelosos ou até parem de liberar crédito para
empresas e clientes. Os investidores, ao venderem ações e títulos europeus, provocam
fuga de capitais da região. Sem poder provocar uma maxidesvalorização do euro, haja
vista que isso prejudicaria aqueles países que têm as contas controladas, a opção é
impor sacrifícios à população, como corte de salários e congelamento de benefícios
sociais. Tudo isso implica menos dinheiro para fazer a economia girar - justo num
momento em que a zona do euro precisa crescer e aumentar sua arrecadação para
diminuir o endividamento. O risco é a criação de um círculo vicioso, em que uma
estagnação ou, até mesmo, uma recessão, prejudique os esforços de ajuste fiscal - o
que levaria a medidas de austeridade ainda mais severas, mais recessão, e assim por
diante. Num segundo momento, a Europa, como um dos maiores mercados
consumidores do mundo, diminuiria o ritmo de importação de bens e serviços e
prejudicaria a dinâmica econômica global.
6. Por que o euro se desvaloriza?
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A possibilidade de que governos e empresas da região tornem-se insolventes faz com
boa parte dos investidores simplesmente não queira ficar exposta ao risco de ações e
títulos europeus. Na primeira metade do ano, o que se viu foi um movimento de venda
destes papéis e fuga para ativos considerados seguros, como os títulos do Tesouro
norte-americano. Tal movimento, de procura por dólares e abandono do euro, fez com
que a cotação da moeda européia atingisse valores historicamente baixos. As moedas
também refletem o vigor das economias. Assim, argumentam os analistas, a tendência
de longo prazo é de fortalecimento do dólar e das moedas dos países emergentes (real
inclusive), enquanto a Europa não conseguir resolver seus problemas fiscais e criar
condições para um crescimento econômico mais acentuado.
7. O que foi feito para evitar a derrocada do euro?
Dois pacotes de socorro foram aprovados com o intuito de ganhar tempo para a tarefa
de reorganizar as contas dos países mais endividados e restabelecer a confiança dos
investidores na região. O primeiro voltava-se exclusivamente à Grécia e somou cerca
de 110 bilhões de euros. O montante, levantado pelo Fundo Monetário Internacional (€
30 bilhões) e pelos governos dos países da zona do euro (€ 80 bilhões), deve ser
liberado de forma progressiva num prazo de três anos. O segundo foi a constituição de
um fundo emergencial de 750 bilhões de euros para situações de crise na União
Européia. Qualquer país da região estaria apto a recorrer a ele. A maior parte, € 500
bilhões, virá de países europeus e o restante, € 250 bilhões, do FMI.
8. Como a crise Européia pode atingir o Brasil?
A crise na Europa pode atingir vários países inclusive o Brasil. As dificuldades
enfrentadas por países como Grécia, Portugal e Itália e o complicado cenário políticoeconômico nos Estados Unidos podem, em algum momento, nos atingir diretamente.
Assim como ocorreu em 2008, a crise internacional pode afetar o mercado de trabalho
brasileiro. Isto pode produzir prejuízos no mercado de ações, aumento na cotação do
Euro e aumento dos preços nas viagens internacionais, além de endividamento e até
mesmo a perda do emprego estão entre os possíveis efeitos da crise internacional na
vida dos brasileiros.
“Muitas pessoas, ao acompanharem o noticiário, perguntam de maneira irônica o que a
Grécia tem a ver com o Brasil, sem levar em consideração o fato de que a economia
global hoje está completamente interligada. Se o cenário econômico internacional se
deteriorar, é possível que tenhamos que enfrentar fenômenos semelhantes aos
vivenciados em 2008”, diz Creomar Lima de Souza, professor de Relações
Internacionais no Ibmec Brasília e especialista em economia internacional e dos EUA.
Quem sentiu na pele os efeitos da crise de 2008 não tem dúvidas de que os brasileiros
têm muito a perder diante de um tropeço na economia européia ou americana. É o
caso da ex-gerente de recrutamento e seleção de uma consultoria internacional
presente no Brasil. A crise atingiu em cheio a empresa, que demitiu quase 20% de seu
quadro de funcionários entre o final de 2008 e o início de 2009.
À época liderando um time de profissionais orientados para selecionar novos
funcionários, a executiva não apenas teve que suspender novas contratações, como
acabou também sendo vítima dos cortes realizados pela consultoria. “De uma hora
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para outra, a empresa paralisou os planos de expansão e começou a demitir,
eliminando vagas em todas as áreas e cargos, incluindo boa parte da equipe de
Recursos Humanos”, diz a executiva, que prefere não se identificar.
Ainda é cedo para prever movimento semelhante, mas a luz de alerta está acessa em
grande parte das empresas, diz o consultor em recrutamento e seleção de executivos,
Luis Henrique Hartmann. “Ao menos por enquanto, não é possível falar em impactos
significativos no mercado de trabalho brasileiro. Mas é óbvio que a crise na Europa
pode, em algum momento, levar as empresas multinacionais a reduzirem os
investimentos no Brasil. Na prática, isso implica não apenas na redução de novas
oportunidades de trabalho e na diminuição de salários, mas também em demissões em
massa”, diz Hartmann.
Em 2008, muitos investidores brasileiros – alguns já desempregados - tiveram que lidar
também com perdas significativas no mercado de ações em 2008. Em questão de
meses, o ex-executivo de uma empresa de telecomunicações perdeu o emprego e
mais de 50% de seu patrimônio investido na Bolsa de Valores.
“A crise de 2008 me pegou de surpresa e, de uma hora para outra, me vi sem emprego
e com apenas metade do dinheiro que levei uma vida para economizar. Após meses de
procura, encontrei uma nova colocação e consegui manter as finanças em dia. Mas o
fato é que, quase quatro anos depois, ainda não consegui recuperar meu antigo padrão
de vida”, conta o executivo.
Brasileiros precisam poupar dinheiro e evitar dívidas
Diante do cenário atual e do histórico de efeitos da crise americana sobre o Brasil em
2008, os especialistas em finanças recomendam cautela. “A capacidade da economia
brasileira de reagir não está clara e ninguém é capaz de prever se a crise pode
contaminar todos os países da zona do euro. Tampouco se sabe se o presidente
Barack Obama será bem sucedido em sua tentativa de reduzir o déficit americano. A
incerteza é muito grande e não é aconselhável se arriscar nesse momento”, afirma
Leandro Ruschel, especialista em mercado financeiro.
Em momentos de grande instabilidade, é essencial conter os gastos pessoais, resume
o coordenador dos cursos de Gestão Financeira e Ciências Contábeis da Veris
Faculdade, Fabrício Ferreira. Definitivamente, diz ele, não é o momento de se
comprometer com dívidas de longo prazo, como compras de imóveis e veículos. “A
hora é de economizar e aumentar a reserva de recursos para eventuais emergências,
como a perda do emprego”, afirma.
Longas viagens internacionais também estão na lista de gastos que devem ser
evitados nesse momento, sobretudo se a ideia for utilizar o cartão de crédito como
principal meio de pagamento . Com a instabilidade do câmbio, alerta Ferreira, o
consumidor pode ter uma surpresa bastante desagradável no fechamento da fatura.
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